Faça AGORA! - Arquidiocese de Vitória

Transcrição

Faça AGORA! - Arquidiocese de Vitória
vitória
Ano X
•
Nº 116
•
Abril de 2015
Revista da Arquidiocese de Vitória - ES
D iá l o g o s
A n ú n ci o e
al
te ste m u n h o p a sc
reportagem
O sustento, a vida e o
lazer que vem dos
manguezais
Atualidade
Silenciosa ... sem endereço certo... mortal!
editorial
“Conhecer histórias é
descobrir sentimentos,
paixões, outras
importâncias, outros
significados e isso é dar
novos sentidos à vida
que rodeia.”
Maria da Luz Fernandes
Editora
É bom sair do lugar
P
ara cada um a vida tem um sentido próprio e único.
Aquilo que para uns parece fundamental às vezes
não significa nada para outros. Assim elegemos,
ou melhor, hierarquizamos os significados do cotidiano.
Deslocar-se desse lugar construído a partir da experiência e realidade pessoal não é simples, mas é uma
aventura que vale a pena. O mangue é trabalho? É sustento? É lazer? Para quem vive em áreas de risco maior
o que significa caminhar a pé? Cobrir a Festa da Penha é
uma prova de faculdade? Anunciar Jesus Cristo na África
é sofrimento, é alegria? Dar passagem ao pedestre é um
aborrecimento?
Conhecer histórias é descobrir sentimentos, paixões,
outras importâncias, outros significados e isso é dar novos
sentidos à vida que nos rodeia.
Boa leitura! n
fale com a gente
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vitória
Revista da Arquidiocese de Vitória - ES
Ano X – Edição 116 – Abril/2015
Publicação da Arquidiocese de Vitória
03
05
Atualidade
Silenciosa... sem enderço certo... mortal!
18
caminhos
da bíblia
Aqueles que viram
e acreditaram
08 Micronotícias
12 ideias
16 Espiritualidade
21 Arquivo e memória
24 Diálogos
editorial
11
15
17
comunicação
A imagem da Igreja na mídia
20
22
Especial
Jovens: entre ficar ou sair do ninho?
27
carismas religiosos
Salesianos
Monjas Carmelitas
O carisma de Daniel Comboni
Carmelitas da Divina Providência
34
Reportagem
O sustento, a vida e o lazer que vem dos
manguezais
40
ensinamentos
A devoção a Nossa Senhora
45
Cultura Capixaba
Toponímia Capixabas
de origem indígena
28 pensar
32 Mundo Litúrgico
39 reflexões
42 prática do saber
Economia política
Reformas necessárias
aspas
Inezita Barroso
viver bem
Os benefícios da atividade física ao ar livre
29
entrevista
O aprendizado e as
lições de um povo
simples
Arcebispo Metropolitano: Dom Luiz Mancilha Vilela • Bispos Auxiliares: Dom Rubens Sevilha, Dom Joaquim Wladimir Lopes Dias
Editora: Maria da Luz Fernandes / 3098-ES • Repórter: Letícia Bazet / 3032-ES • Conselho Editorial: Albino Portella, Alessandro Gomes,
Edebrande Cavalieri, Gilliard Zuque, Marcus Tullius, Vander Silva • Colaboradores: Dauri Batisti, Giovanna Valfré, Raquel Tonini, Pe.
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Atualidade
Gilliard Zuque I Vander Silva
Silenciosa
... sem
endereço
certo...
mortal!
R
ádio, TV, jornal ou internet: nos dias de hoje é
difícil acessar os meios
de comunicação e não se deparar com notícias de mortes
causadas por bala perdida. Pior
ainda quando elas acontecem
em nossa cidade, bairro ou rua,
enfim ao nosso lado.
Segundo um relatório da ONU divulgado em 2014, o Brasil é o segundo país
com mais ocorrências de bala perdida na
América Latina. E os casos acontecem,
na maioria das vezes, em ações da polícia. Em vítimas fatais, o Brasil está em
terceiro lugar, atrás da Venezuela e da
Colômbia. O ranking internacional foi
feito pelas Nações Unidas, entre 2009 e
2013, e mostrou que 22 brasileiros foram
mortos e outros 53 feridos, o maior número de ocorrências do continente. No
Brasil, 35% das ocorrências resultaram
em morte.
Em 2015, o Estado do Rio de Janeiro
acompanhou o ressurgimento do fenômeno da bala perdida, que durante a década
de 90 estampou diversas capas de jornais.
Nos primeiros 30 dias deste ano, foram
32 casos de pessoas inocentes atingidas
por disparos na região metropolitana do
Rio e na Baixada Fluminense, das quais
quatro morreram.
“Porque eu tô indo pro trabalho com medo da morte
Nessas horas eu queria ter um carro-forte (...)
E não ser encontrado por uma bala perdida”
Trecho da música ‘Bala Perdida’, de Gabriel O Pensador
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5
Atualidade
“Por favor, meu amor, eu não quero encontrar você morta se eu
voltar pra casa vivo Mas se eu não voltar não precisa chorar
Porque levar uma bala perdida hoje em dia é normal
Pra variar estamos em guerra”
Trecho da música ‘Bala Perdida’, de Gabriel O Pensador
A sensação da falta de segurança é generalizada. Antes visto
como um fenômeno característico
das periferias das cidades, muitas
vezes fruto da disputa entre bandidos, hoje a violência provocada
pelo conflito armado está presente
no centro das grandes cidades.
No Brasil, o maior número
de casos tem como origem algum
tipo de intervenção policial, como
perseguição a supostos criminosos (27% das ocorrências). Em
segundo lugar, estão os tiroteios
entre gangues ou quadrilhas, com
24%, acompanhados por disparos
efetuados durante assaltos (20%).
Em uma solenidade de formação de oficiais em São Paulo
um tenente, durante seu discurso,
usou a palavra “guerra” para se
referir ao trabalho que seria realizado pelos policiais nas ruas a
partir daquele momento.
Não é possível precisar se é
ação ou reação, mas os policiais
estão atirando mais. A cobrança
da população para que sejam mais
enérgicos acontece, os órgãos de
segurança que exigem de seus
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comandados ações mais efetivas
e a legislação criminal, muitas
vezes branda e obsoleta, podem
ser fatores que ajudem a explicar
este fenômeno.
Para conter casos em série
de balas perdidas, os especialistas defendem uma revisão nas
operações policiais. De acordo
com o professor Ignácio Cano,
coordenador do Laboratório de
Análise de Violência da Uerj
(Universidade Estadual do Rio
de Janeiro), em matéria publicada pelo Portal R7, o ideal é
investigar e planejar ações com
o objetivo de evitar os conflitos
armados.
Se por um lado a presença
ostensiva da polícia leva a con-
flitos, a ausência do Estado não
impede que os casos de bala perdida continuem acontecendo. Os
bandidos entram em conflito entre
si pelo domínio de territórios, e
a população é a vítima.
Uma professora de inglês
morreu após ser atingida nas
costas por uma bala perdida em
São Torquato, Vila Velha, em
fevereiro deste ano. Testemunhas contaram que a bala seria
de um tiroteio que ocorria em
frente à escola no momento em
que a professora saía do local. A
professora já havia demonstrado
receio em trabalhar naquele local
por conta da violência.
A ousadia dos bandidos também assusta. Os conflitos acontecem em áreas onde a polícia está
presente de maneira mais efetiva
e em locais com segurança particular. Em 2009 dois vigilantes
foram mortos quando bandidos
invadiram um shopping em Vitória para roubar um malote de
dinheiro. Um menor que não teve
ferimentos graves foi atingido
pelos disparos. No ano seguinte,
uma tentativa de assalto a uma
joalheria no mesmo shopping
levou pânico aos frequentadores.
Analisando as estatísticas,
outro dado chama a atenção: 10%
dos casos são devidos a conflitos
interpessoais. No entanto, em
40% dos casos não foi possível
determinar a causa dos disparos.
O fato levanta outra discussão: a
necessidade do desarmamento.
A partir do Estatuto do Desarmamento elaborado em 2003,
foi instituída a Campanha do Desarmamento. Segundo dados do
Ministério da Justiça, a campanha
resultou na entrega de quase 500
mil armas. Desde 2012, o Governo não faz nenhuma propaganda
pelo desarmamento e, nos últimos
sete anos, esse número caiu para
cem mil.
Houve, no Brasil, em 23 de
outubro de 2005, um referendo
que consistia em aprovar o artigo
35 do Estatuto do Desarmamento
que proibia a comercialização de
arma de fogo e munição em todo
o território nacional, salvo para
as entidades previstas no artigo
especifico da Lei.
A proibição pretendida não
alcançou apoio da maioria dos votantes. Os eleitores podiam optar
pela resposta “sim” ou “não”. O
resultado final foi de 59.109.265
votos rejeitando a proposta
(63,94%), enquanto 33.333.045
votaram pelo “sim” (36,06%).
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Diante da realidade, além
de cobrar do Estado ações efetivas no combate a violência, nos
protegermos das balas perdidas
é a saída mais rápida e prática.
Profissionais de segurança orientam que ao percebermos troca
de tiros, o melhor a fazer é nos
deitarmos no chão e nunca correr.
Isso reduz a possibilidade de sermos atingidos. Outra orientação
é evitar ficar próximo de locais
onde aconteçam operações policiais.
A polícia não tem um levantamento de quantos casos de
mortes por bala perdida são solucionados. A maioria das investigações acaba sendo arquivada por
falta de provas. São mortes que
muitas vezes ficam sem respostas.
Como se a expressão bala perdida fosse sinônimo de crime sem
solução. Um crime sem culpados.
A reportagem procurou a
Associação de Cabos e Soldados do Espírito Santo mas não
obteve retorno dos contatos até
o fechamento desta edição. n
No começo de 1990, em um período de dois
meses, a polícia contabilizava nove mortes
por bala perdida apenas na cidade do Rio
de Janeiro, sendo a maioria de crianças. À
época, as favelas eram verdadeiras fortalezas
do tráfico de drogas. Os criminosos travavam confrontos à distância, de um morro
para o outro, com projéteis luminosos - os
chamados tiros “traçantes”. Na ocasião, o
temor levou proprietários de apartamentos
e estabelecimentos comerciais a instalar
blindagem e chapas metálicas nas janelas.
micronotícias
Consciência corporal com luzes e sons
Um novo tipo de terapia, chamado ‘Lightscores’,
utiliza luzes coloridas aliadas a diferentes sons
para ajudar crianças cegas ou com problemas
de visão a se tornarem mais ativas e com uma
maior consciência corporal. Dispositivos sensíveis à luz são presos ao corpo das crianças
e, a cada movimento que elas fazem, o sensor
produz um som diferente. Isso as encoraja a se
aventurarem mais nas brincadeiras. A ideia é
criar um ambiente seguro para as crianças com
problemas de visão interagirem livremente com
o que está a sua volta. E o ato de se movimentar
é fundamental para criar conexões no cérebro
ligando a audição à coordenação motora.
Para não
esquecer
Alta da gasolina vira jogo
A alta no preço do combustível inspirou a criatividade
de um gaúcho para a criação
de um jogo. “Gasolina Cara”
coloca os usuários para juntar
dinheiro para poder abastecer o carro e andar o máximo possível por estradas em
más condições. Segundo o
criador, o jogo gratuito para
telefones celulares e tablets
é uma crítica bem-humorada
ao preço da gasolina. Na brincadeira, o carro percorre uma
via com três pistas e precisa
passar sobre vários símbolos de cifrão para aumentar a
quantidade de dinheiro acumulada e abastecer em postos
localizados em determinados
pontos da estrada. Uma barra
amarela simboliza a gasolina,
que rapidamente vai se extinguindo.
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Quem nunca esqueceu um
guarda chuva? Para resolver o
problema de memória, a startup
Davek desenvolveu um guarda-chuva com um chip Bluetooth.
Quando o usuário se afastar
do ‘Davek Alert Umbrella’,
receberá uma notificação no
smartphone dizendo que ele
está deixando o local sem levar
o acessório. O guarda-chuva,
basicamente, fica sincronizado
com um aplicativo da marca,
que funciona em Android e iOS.
Ao se afastar por mais de 9
metros, o telefone começa a
apitar. O software ainda exibe
notificações, baseado na previsão do tempo, sobre quando
vai chover.
Desligue o
celular
Os riscos de acidentes pelo uso
do celular ao volante se intensificaram consideravelmente
com a ampliação das funções
do dispositivo. Um estudo do
Departamento de Trânsito dos
Estados Unidos revela que o
uso de dispositivos móveis ao
volante aumenta em até 400%
o risco de acidente. Apesar da
gravidade, segundo especialistas, os riscos não são levados
a sério pelos motoristas, tampouco pelas autoridades por
falta de estatísticas que comprovem o efetivo envolvimento dos celulares em acidentes
de trânsito. A sua sugestão
é que os motoristas deixem
os celulares no silencioso, os
desliguem ou os deixem bem
longe para evitar que caiam na
tentação de darem uma espiadinha a cada notificação.
Internet sem fronteiras
Instalar cabos de fibra ótica no fundo dos rios da Amazônia é a nova aposta do Exército Brasileiro e da Rede
Nacional de Pesquisas para levar internet de alta velocidade a cidades ribeirinhas no meio da floresta mais
densa do mundo. Para driblar complicações de atravessar a floresta, engenheiros fixaram os cabos pelos rios.
Usar cabos subfluviais é a estratégia para conectar a
região e deve integrar o Programa Nacional de Banda
Larga. A tecnologia de fibra ótica permitirá conexões
de até 100 Gigabit por segundo: capacidade usada para
atender também o governo do Amazonas e órgãos como
Receita Federal e Ibama.
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comunicação
A imagem da Igreja na mídia
O Encontro Nacional de Comunicadores, Muticom, acontece em vitória de 15 a
19 de julho de 2015. Nas palestras da parte da manhã teremos participações
que prometem reflexões ousadas e importantes. O professor Elson Faxina, da
Universidade Federal do Paraná antecipa nesta edição por onde caminhará sua
exposição.
V
ivemos tempos novos,
em que já não basta mais
existir fisicamente para
pertencer à sociedade, para ocupar o espaço público; é preciso
estar na mídia para existir de
fato. Vivemos numa sociedade
em processo de midiatização;
isto é, uma sociedade que se
conhece e se reconhece a partir
do que é veiculado pela mídia.
Isso equivale a dizer que
o valor que as pessoas e instituições têm hoje para a sociedade depende da imagem
que a mídia lhes atribui. E essa
imagem se constrói a partir das
informações divulgadas, a partir
de um discurso presente nos
meios de comunicação. E aqui
valem todas as mídias, desde
os grandes meios - TV, rádio,
jornal, revista – como a internet e nossos veículos próprios
de comunicação, a partir do
pequeno boletim paroquial.
Aqui está o desafio para
nós, comprometidos em “anunciar sobre os telhados” a Boa
Nova, por meio das ações de
nossa Igreja. Devemos nos preocupar em estar na mídia com
a imagem real que nossa Igreja tem; essa imagem de Igreja
verdadeira de alguma forma
recuperada pelo Papa Francisco.
Isso nos leva a fazer duas
perguntas: qual é a imagem de
nossa Igreja que vem sendo
construída pelo discurso da
mídia? E qual é a imagem de
Igreja que estamos criando por
meio do discurso que estamos
fazendo, seja na grande mídia
ou mesmo em nossos veículos?
É para analisar esses dois
discursos – o nosso e o da mídia
– sobre a Igreja Católica que
convido você a discutir conosco no 9º Mutirão Brasileiro de
Comunicação, a realizar-se na
Arquidiocese de Vitória, em
julho deste ano.
Por meio da análise de
discurso – nosso e da mídia vou propor uma reflexão sobre
como enfrentar crises - como o
da pedofilia, que pode pegar de
soslaio toda e qualquer instituição humana – para criar uma
boa imagem de nossa Igreja. E
também, pela mesma análise de
discurso, vamos refletir como
criar uma ótima imagem por
meio da oferta de informações
importantes, de interesse da imprensa, que abundam em nossas
comunidades.
Eu estarei presente no Muticom e espero por você. n
Elson Faxina, jornalista e
professor da UFPR
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ideias
Indagações sobre o que temos
feito de nós mesmos
N
uma dessas manhãs de março, por volta das sete, quando o dia é apenas promessas, e o calor ainda não avançou sobre todos os poros, fui
atravessar tranquilo uma rua na faixa de pedestres como pede a boa e
civilizada vida urbana. Os veículos vinham longe e uma moto foi se aproximando
e reduzindo a velocidade até parar. Na faixa da direita vinha um outro veículo
e passou sem nenhuma preocupação em reduzir a velocidade, e ainda esbravejou enraivecido contra a motoqueira que havia feito apenas o que devia fazer.
Pensei: o que se passa no coração do homem que não só corrompeu a lei
do uso comum dos espaços urbanos, mas também repreendeu com buzina e
gritos aquela que não se sujeitou ao mesmo movimento de corrupção. Algo
nele se dava entre a irritabilidade, a impaciência e a raiva. É bem provável que
ele não quisesse sinalização nenhuma, norma nenhuma e pessoa nenhuma que
se interpusessem entre ele e o seu desejo, que no caso seria ir o mais rápido
possível entre um lugar e outro.
Foi do velho Freud que lembrei
depois, de seu pensamento que, entre
“Logo é trabalho de todos cuidar
tantas outras coisas, nos ajudou a admitir
para que os avanços da sociedade
que no fundo do homem civilizado fica
democrática – alcançados à custa
sempre um rancor contra a cultura.
Ninguém constrói justiça sem rede muitos esforços – não sejam
núncias, ninguém constrói civilidade
perdidos.”
sem disciplina. É na escola das renúncias
que aprendemos a transmutar o desejo em amor. É ali que nos treinamos para
sermos sócios da sociedade. E o sócio compreende – ou deveria compreender
– que a vida comum está sempre a nos pedir novos investimentos. Mas todo
esse esforço também fica em nós como um ressentimento. Em alguns momentos
críticos essa raiva emerge fortemente, como no motorista que queria a rua só
para ele, e que tinha apenas os seus interesses egoístas como merecedores de
realização.
Mas o fato da faixa de pedestre me põe em pensamentos sobre o Brasil.
Impossível neste momento não ser atravessado desses pensamentos/sentimentos. Tanto nas manifestações de 2013, quanto nas de agora umas franjas de
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rancor contra a cultura se apresentaram. Lá a quebradeira; aqui várias formas
de intolerância e desejos de regresso ao autoritarismo. É claro que o grosso das
manifestações não se apresentou assim. Mas nas manifestações de 2013 o que
era apenas um viés insignificante acabou por se tornar um importante elemento.
Estas fímbrias – que não são tão insignificantes assim – são representativas
“Ninguém constrói justiça sem
desse extrato de rancor. É interessante
renúncias, ninguém constrói
notar como a mesma mídia que superdimensionou a ação dos “vândalos” de civilidade sem disciplina. É na escola
2013 minimizou agora a participação
das renúncias que aprendemos a
destes outros que se propõem como
transmutar o desejo em amor.”
agentes políticos e que têm na intolerância, no desejo de golpe e ditadura
e na estandardização do desrespeito à mulher (que por “acaso” é a Presidente
da República) o seu mote. As situações críticas podem mobilizar essas forças
que facilmente aceitam indução (vide nazismo na Alemanha, e o que reflete
Malcolm X: “se você não tomar cuidado, a imprensa fará você odiar as pessoas
que estão sendo oprimidas, e amar os opressores”). Logo é trabalho de todos
cuidar para que os avanços da sociedade democrática – alcançados à custa de
muitos esforços – não sejam perdidos.
E por falar em cuidar, a modo de conclusão, recorro às intuições de outro
pensador, Michel Foucault, lá nos adiantados dos seus caminhos, na Hermenêutica do Sujeito. Lá ele pensa que, talvez, a única forma de resistência ao
poder (diríamos nós hoje no Brasil: poder político, poder das mídias, etc.) seja a
produção permanente de um Cuidado de Si. Bom é que se diga que esse Cuidado
de Si não é de modo algum uma forma de escape individualista aos desafios das
realidades. Longe de nós sugerir isto. Este cuidado implica numa permanente
atenção ao presente, numa constante indagação aos modos de viver que criamos,
e num questionamento sincero sobre o que temos feito de nós mesmos. n
Dauri Batisti
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CURIOSIDADES SOBRE A VISÃO
A PRESBIOPIA é popularmente conhecida como
“vista cansada” e ocorre por volta dos 40 anos
de idade.
A HIPERMETROPIA é o nome dado ao erro de
focalização da imagem no olho, fazendo com que
a imagem seja formada após a retina. Isso ocorre
pois o olho do hipermétrope é um pouco menor
que o normal. Geralmente apresentam boa visão
para perto.
A MIOPIA é o distúrbio visual que acarreta uma
focalização da imagem antes desta chegar à retina.
Uma pessoa míope consegue ver objetos próximos
com nitidez, mas os distantes são visualizados
como se estivessem embaçados (desfocados).
O ASTIGMATISMO é uma deficiência visual, causada
pelo formato irregular da córnea ou do
cristalino. Neste caso, todos os objetos, próximos
ou distantes, ficam distorcidos, desfocados.
Economia Política
Reformas necessárias
A
“Projetos em
tramitação no
Congresso Nacional,
indicam que essas
reformas só serão
efetivas na busca
do bem comum se
forem negociadas
fora da atual
conjugação de forças
ali existentes.”
Arlindo Vilaschi
Professor Associado de
Economia da Ufes
Constituição de 1989 buscou
superar uma ordem exageradamente centrada na segurança
nacional dos tempos do regime militar,
e dotou o País de um estatuto voltado
para a cidadania. Fez isso tanto no que
se refere à participação política quanto
no que diz respeito a acessos a serviços
como educação, saúde, áreas em que
a dívida social brasileira se acumula
ao longo de séculos.
Mesmo com avanços no processo
de escolha de representantes, a qualidade da representação da vontade popular
expressa pelo voto é alvo crescente de
críticas. Essas também se acumulam
com relação à qualidade dos serviços
de educação e saúde. Evidencia-se que
tanto representação política quanto
serviços essenciais estão longe do desejável para um país com as riquezas
naturais e humanas do Brasil.
Isso leva a frustrações tanto com
relação ao regime democrático em si
quanto às possibilidades do País realizar efetivas mudanças sociais. Daí
as celebrações das bodas de prata da
‘Constituição Cidadã’ terem ocorrido
em meio a demonstrações de insatisfação generalizada em ruas das principais
cidades brasileiras. Indicação de que
é fundamental a ação política voltada
para respostas necessárias às legítimas
frustrações da população.
Diante desse quadro, o País precisa estabelecer novas referências que
respondam de maneira efetiva, por um
lado, às críticas ao funcionamento da
democracia; e que, por outro, estaberevista vitória I Abril/2015
15
leçam condições objetivadas para
um futuro melhor para a maioria da
população. Para tanto, necessário se
fazem as reformas política e tributária.
Tentativas no passado nesses
campos e projetos em tramitação no
Congresso Nacional, indicam que
essas reformas só serão efetivas na
busca do bem comum se forem negociadas fora da atual conjugação de
forças ali existentes. Essa conjugação
está cada vez mais cristalizada em
torno de interesses de grupos específicos e muito longe de contemplar
legitimas expectativas de mudanças
nos campos político e social do País.
A convocação de uma assembleia constituinte específica para essas
duas reformas pode ser um importante
passo para o Brasil construir bases
sustentáveis para a democracia política, social e econômica. Para diminuir
o poder de interesses cristalizados na
representação política em vigência, é
fundamental que essa assembleia seja
eleita a partir também de candidaturas
avulsas.
Uma assembleia com mandato
específico e contando com a participação de pessoas fora do quadro
partidário pode ser instrumento para
a superação da crise pela qual passa
a sociedade brasileira. Como dizia
Churchill, ‘não se deve desperdiçar
uma crise’. Oportuno, portanto, que
o Brasil use o atual impasse político
e econômico para melhor se preparar para desafios do presente e do
futuro. n
espiritualidade
Eu vi
A
você
cordei não muito bem e tinha uma longa cerimônia de Crisma para realizar. Ao
terminar a missa e dirigindo-me ao carro,
ainda mais cansado, eis que vem correndo de
braços abertos para se despedir de mim, uma
criança de seis ou sete anos, abraçou-me como se
eu fosse da família dele e cheio de alegria e com
um sorriso enorme me disse somente isso: “Eu vi
você...”! Imagino que ele tenha me visto no altar
durante a missa. O fato é que aquelas palavras,
aquele abraço, aquele sorriso e olhar brilhante
infantil transformaram totalmente meu cansaço
em alegria.
Uma das coisas importantes da vida é o poder do
olhar. No início da vida, toda
a segurança da criança está no
olhar do pai e da mãe. Basta
um olhar e tudo se resolve e
se acalma. Depois de adulto,
continuamos procurando o
olhar dos outros: das pessoas
que amamos, dos superiores,
dos amigos. Creio que a pior
dor e pior pobreza é ser “invisível” para os outros. Daqui o
desespero de alguns para atrair
o olhar sobre si através das
coisas ilusórias: ostentação
material (símbolos de riqueza),
querendo ser importante (símbolos de poder), dominando e
possuindo coisas e pessoas.
Resumindo, o ser humano
passa toda a sua vida desejando
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16
o olhar do Pai-Mãe. Todos os
outros olhares são tentativas
frustradas de encontrar o grande e único olhar verdadeiro:
o olhar de Deus. Durante a
oração você se coloca conscientemente diante dos olhos
de Deus. Ele está lhe olhando.
O que você sente diante do
olhar de Deus? Medo? Sente-se acolhido e amado pelo Pai?
Se durante a oração e, também
durante o seu dia a dia, você
não se percebe olhado amorosamente por Deus, então você
se sentirá sozinho, invisível,
abandonado. Daqui a tentação
de buscar outros olhares, por
exemplo, a busca ilusória de
riqueza e poder para camuflar
o vazio e tristeza da alma que a
invisibilidade espiritual causa.
Só na eternidade, no céu,
estaremos olhos nos olhos com
Deus. Por enquanto podemos
somente vislumbrá-lo através
do véu ou nuvem da fé. Todavia, basta-nos saber que Ele nos
olha para que o nosso coração
e nossa vida fiquem felizes. O
olhar de Deus nos basta. n
Dom Rubens Sevilha, ocd
Bispo Auxiliar da Arquidiocese de Vitória
aspas
Inezita Barroso
A música caipira perdeu um de seus maiores ícones no pais. No último dia 8 de março,
morreu aos 90 anos a grande dama da moda de viola, Inezita Barroso. Por mais de
30 anos apresentou o programa “Viola Minha Viola” da TV Cultura. Vamos relembrar
algumas frases marcantes desta apaixonada da música de raíz.
Quando eu tinha 10 anos, montei uma
biblioteca na garagem da minha casa.
Era ótima, só com histórias infantis como
Monteiro Lobato e outros grandes autores
da época. Vinham todas as crianças para ler
livros. Não tinha computador, vídeo game
e nossa diversão era ler. A gente adorava.
Eu encapei todos os livros, recebi doações e
comecei minha biblioteca particular. Quando
cresci, fui estudar biblioteconomia.
Em entrevista ao programa infantil “Cocoricó”,
da TV Cultura, em 2012
Eu cantava todos os gêneros porque estudei
música, mas resolvi partir para a música
caipira. Era discriminada, era horrível.
Imagina uma menina cantando com viola. Eu
era, inclusive, discriminada pelos caipiras.
Diziam que viola não era para mulher.
Eu não tenho computador e nem quero.
Tenho celular, mas só sei receber e fazer
ligação. Não sei mais nada. Essas coisas
[tecnologia] me irritam muito. Engraçado
isso. Prefiro ir pessoalmente perguntar para
as pessoas.
Em entrevista ao programa “Vitrine”,
da TV Cultura, em 2010
Em entrevista ao “Todo Seu”, em 2010
“O caipira é ligado à tradição, à raiz, ao amor
a terra, a qualquer coisa que ele tem dentro e
tem necessidade de exprimir.
revista vitória I Abril/2015
17
caminhos da bíblia
“Aqueles que
viram e
acreditaram”
N
o Quinto Domingo da Quaresma, um grupo
de gregos é levado a Jesus, depois de manifestarem seu desejo a Felipe: “Queremos
ver Jesus” (Jo 12,21). Esses homens, segundo o
Evangelho de João, tinham ido a Jerusalém para
a Festa da Páscoa dos judeus, a fim de adorarem
a Deus. A quem procuravam? O que desejavam
encontrar? O que buscavam? O pedido é simples
e direto: “Queremos ver Jesus”.
Já no Domingo de Páscoa, mais uma vez, o
Evangelho de João nos presenteia com uma maravilhosa cena, na qual Pedro e o discípulo amado
correm ao sepulcro com a notícia que o Senhor não
estava mais no túmulo (Jo 20,1-9). Neste caso, o
discípulo amado entra no túmulo vazio, depois de
Pedro, assim, ele vê e acredita na Ressurreição do
Senhor. O verbo que aparece, indicando a ação de
ver do discípulo amado foi o mesmo utilizado na
descrição do desejo dos gregos de verem Jesus.
Os verbos gregos mais usados para indicar o
ato de “ver” são dois: um deles diz respeito simplesmente ao gesto de ver, o olhar comum, isto é,
o modo como vemos as coisas. O outro, por sua
vez, exprime um olhar profundo, como o ato de
contemplar, ou seja, expressa uma ação que vai
além das aparências, como o ato de perscrutar
os corações das pessoas, um olhar em profundi-
dade. Esse segundo verbo é o que encontramos
em ambos os textos do Evangelho de João acima
referidos, isto é, o evangelista deixa claro que tanto
os gregos, quanto o discípulo amado queriam ver
e viram o coração de Cristo, queriam vê-Lo em
profundidade, ansiavam por fazer a experiência
de sua Ressurreição e desejavam também serem
vistos por Ele da mesma forma.
Ao buscarem Jesus, os gregos encontram o
Senhor que lhes fala de sua morte, por meio da
imagem do grão de trigo que se abandona e morre, a fim de que outros grãos pudessem nascer e
crescer. Ele fala de sua entrega na cruz, de seu
serviço gratuito pela salvação de todos e de como
a sua morte faria nascer, pela fé, novos filhos e
filhas de Deus. Jesus é o verdadeiro grão de trigo
que se entrega, para que os novos filhos e filhas
de Deus, os novos grãos de trigo, possam ter a
vida nova em comunhão com o Pai. Ao irem até
Jesus, os gregos encontraram alguém capaz de
uma entrega total e sem limites e, por isso, foram
levados a contemplar o coração aberto de Cristo,
cheio da compaixão que o movia em todos os seus
gestos e sinais.
Da mesma forma, o discípulo amado ao entrar
no sepulcro vazio busca Aquele que o amava, a
quem ele tinha entregue a vida no seguimento do
revista vitória I Abril/2015
18
discipulado. No olhar profundo
da experiência de fé, ele é capaz
de ver além das aparências, consegue contemplar uma realidade
mais ampla que aponta para a
vida que supera a morte, para a
ressurreição do Senhor. O olhar
do discípulo amado é iluminado
pelo gesto da entrega na cruz,
que não se resumiu na noite da
morte do Senhor, mas que se
abriu para a luz do dia feliz da
Páscoa da ressurreição. Também
ao discípulo amado o grão de
trigo é apresentado em toda a
sua entrega, como também em
toda a sua vitalidade e vitória
sobre a morte e as trevas.
Aos cristãos de hoje é oferecida uma grande e importante
tarefa, um grande desafio: o de
indicar, mostrar Jesus, fazer com
que as pessoas sejam capazes de
encontrar Aquele que procuram,
como o fizeram os gregos e o
discípulo amado.
Qual é a resposta que se
pode dar quando as pessoas se
apresentam procurando Jesus?
O que lhes é oferecido? Nesses
momentos as palavras perdem o
seu sentido e seu valor, somente
o amor gratuito e compassivo de
Cristo gravado, como uma nova
Lei no coração dos discípulos,
pode mostrar o próprio Senhor a
todos aqueles que o procuram. O
que atrai os homens e mulheres
ainda hoje ao Cristianismo é o
amor total de Cristo e sua entrega
na cruz, principalmente quando
esse amor é vivido e praticado
pelos cristãos. Este é o espaço
onde nascem os novos grãos de
trigo, os novos cristãos e os novos discípulos amados. Quando
as pessoas pedirem “Queremos
ver Jesus”, que o Senhor nos
ajude a ser sinais de seu amor
compassivo e infinito, um amor
que se doa e sabe servir, a fim de
que, ao contemplarem tal gesto
de acolhida e doação, sejam conduzidos a professarem a fé como
discípulos amados do Senhor. n
revista vitória I Abril/2015
19
“Os verbos gregos mais
usados para indicar o ato
de “ver” são dois: um deles
diz respeito simplesmente
ao gesto de ver, o olhar
comum, isto é, o modo como
vemos as coisas. O outro, por
sua vez, exprime um olhar
profundo, como o ato de
contemplar, ou seja, expressa
uma ação que vai além das
aparências, como o ato
de perscrutar os corações
das pessoas, um olhar em
profundidade.”
Pe. Andherson Franklin, professor
de Sagrada Escritura no IFTAV e
doutor em Sagrada Escritura
especial
Jovens:
A
entre ficar ou sair do ninho?
juventude possui uma
base material relacionada à idade, que perpassa
um tempo e um modo particular de vivenciar e (re) produzir
a realidade. A condição etária
não está relacionada unicamente
aos aspectos biológicos, refere-se
também aos fenômenos culturais
e históricos vivenciados nesse
período, trata-se, sobretudo, do
momento peculiar de socialização
entre sujeitos, o que também configura o caráter de uma geração.
A história evidencia que na
Idade Moderna o universo da
criança mesclava-se com o do
adulto e a inserção em um ou
outro grupo era definida pela capacidade física desses assumirem
tarefas e responsabilidades, não
havendo, portanto, uma evidente distinção da juventude como
momento particular nesse interim.
Foi a partir da Revolução Industrial e da consequente exigência
por formação para o trabalho que
emerge e sugere-se uma vida própria juvenil, distinta dos adultos
e das crianças.
Nas últimas décadas, enten-
de-se que a transição para a vida
adulta já não é mais marcada pela
linearidade do modelo tradicional
que prevê escolarizar-se, entrar
no mercado de trabalho, sair da
casa dos pais, casar-se e ter filhos,
numa sequência de fatos. Hoje
as etapas desse processo ocorrem com idades mais ou menos
avançadas, a depender, principalmente, da sua classe social,
do gênero ou etnia.
Tal alteração evidencia-se a
partir dos anos 90, dada bruscas
modificações ocorridas no mundo
do trabalho diante do agravamento dos contextos econômicos
e sociais, incidindo largamente
sobre o desemprego e a competitividade do trabalho, aspectos
que atingem especialmente os
jovens. Com isso, há uma tendência mundial de ampliação do
tempo de juventude, inclusive da
sua faixa etária devido às dificuldades de ascensão social dos
jovens neste cenário. No Brasil,
por exemplo, são considerados
jovens os sujeitos entre 15 e 29
anos.
Contudo, os jovens pertenrevista vitória I Abril/2015
20
centes aos setores populares tendem a ter que ingressar mais cedo
no mundo do trabalho, ocupando
assim os espaços mais precarizados, o que, muitas vezes, os
impossibilita de darem continuidade aos estudos e realizarem
atividades de lazer. Esses jovens
assumem responsabilidades ‘típicas da vida adulta’ mais cedo
que os jovens dos setores médios
e altos, pois carecem de tempo e
recursos para realizá-los.
Nesse sentido, problematiza-se: Com essas transformações,
tornam-se adultos aqueles que
não saem de casa? Para se tornar
adulto não deveria ser necessária
apenas a passagem por determinadas etapas de vida, mas, sobretudo, a identificação do jovem
como um adulto, afinal, ambas as
condições são construções sociais
com significados atribuídos nos
diferentes contextos. n
Camila C. Valadão e Camila L. Taquetti
Assistentes Sociais
Mestres em Política Social
Professoras da Faculdade Católica
Salesiana do Espírito Santo
arquivo e memória
Padre italiano se emociona
ao visitar pela primeira
vez Convento da Penha
Trecho da carta diz: Se
o nosso Dante tivesse
tido a fortuna de visitar
o Sanctuário de Nossa
Senhora da Penha, por
ventura teria saído do seu
gênio, inspirado ao mais
alto ascetismo, um segundo
monumento semelhantea
Divina Commedia, que
teria eternada Victória, no
espaço dos séculos.
E
ntre as muitas cartas guardadas em nosso acervo,
encontra-se essa, enviada
a Dom Benedito Paulo Alves de
Souza, bispo do Espírito Santo, nos anos de 1918 a 1933,
datada de janeiro de 1927. O
sacerdote italiano, padre José
Bazzarella, chegou ao Espírito
Santo e visitou o Convento da
Penha. O padre escreve ao bispo
narrando sua emoção ao avistar
lá em cima, sobre aquele monte,
sobre aquela granítica rocha, o
Templo da nossa Mãe, a guarda
da terra, do mar, do céu. Padre
Bazzelatto, em março do mesmo ano foi nomeado pároco da
Paróquia do Divino Espírito
Santo em Muniz Freire. n
revista vitória I Abril/2015
21
Giovanna Valfré
Coordenação do Cedoc
viver bem
Os benefícios da
A
tualmente nos direcionamos cada vez mais
para a inatividade física (carros, elevadores
e etc.) que contribuem para o sedentarismo
que por sua vez contribui para diversas doenças;
pressão alta, infarto, diabetes e outras. Para reduzir
significativamente essas doenças existem duas soluções simples: mudanças de hábitos de atividade
física e a prática de exercícios físicos.
É importante dizer que existe diferença entre
atividade física e exercício físico. A atividade
física é qualquer movimento corporal que resulte
num gasto de energia acima do nível de repouso
(subir uma escada). O exercício físico é uma
forma de atividade física planejada, repetitiva,
com orientação profissional, visando a resistência
física e as habilidades motoras (musculação, lutas
marciais e etc).
Subir de escada ao invés do elevador ou escada
atividade
rolante, caminhar ou ir de bicicleta até o local de
trabalho, utilizar praças, parques e praias para diversão com a família com uma caminhada. Todos esses
são hábitos que devem ser criados e incentivados.
A prática de um exercício físico é de extrema
importância para gerar benefícios como melhora
da capacidade cardiorrespiratória e metabólica,
emagrecimento, ganho de força, equilíbrio. Esses
benefícios podem ser alcançados tanto em exercícios
“in door” (dentro de quatro paredes) quanto em
atividades ao ar livre.
Vivemos em um país tropical que nos permite
fazer exercícios ao ar livre durante várias partes do
dia e quase que durante o ano todo. Lembre-se que
é importante ser direcionado por um profissional de
educação física graduado. Com isso motivos para
ser exercitar é o que não faltam. Está esperando o
que para começar?!
revista vitória I Abril/2015
22
física
ao ar livre
Os exercícios ao ar livre são importantes:
Proporcionam sensação de liberdade
e contato com a natureza que atuam
diretamente em nosso bem estar mental.
Reduzem os barulhos de música alta, luzes
artificiais que normalmente vemos nas
academias.
Possibilitam a realização de movimentos que
as vezes não podem ser recriados facilmente
em ambientes fechados.
Estudos têm demonstrado que exercícios ao ar
livre são mais prazerosos, gastam mais calorias
e aumentam a vontade de treinar.
Além disso o contato com o sol contribui para
ativação de vitamina D muito importante para
fixação de cálcio no organismo. Lembre-se claro
de evitar o sol nos horários de 10h às 16h.
Renato Gomes Brunoro
Coordenador de Esportes “Tancredão” - PMV
revista vitória I Abril/2015
23
diálogos
Dom Luiz Mancilha Vilela, ss.cc. • Arcebispo de Vitória ES
Anúncio e Testemunho
T
A agressão
ideológica
não derrama
o sangue, mas
envenena alma.
O veneno das
ideias e sofismas
traiçoeiros, aos
poucos, geram
infiéis, idólatras e
heréticos sem que
a própria pessoa
perceba.
odos os anos
celebramos
com entusiasmo o Mistério da
Páscoa, a Festa da
Ascensão de Nosso
Senhor Jesus Cristo e
de Pentecostes. Tempo Novo, sob a Luz do
Espírito que conduz a
Igreja comunicadora
da Boa Notícia para
a humanidade. O Espírito Paráclito veio
para renovar a face
da terra! A missão e
o sentido da Igreja,
desde os Apóstolos
e discípulos de Jesus,
é ser instrumento do
Espírito Santo como
discípula de Cristo na
história da humanidade. É o tempo do
Espírito que renova
a face da terra.
Ser Sinal do Reino
não tem sido fácil na história da Igreja. Logo no
início, após o evento de
Pentecostes, surgiram os
primeiros mártires que testemunharam e anunciaram
Cristo Ressuscitado com
a própria vida. Palavra e
gesto!
Cada época da história é marcada pelo testemunho pascal, tendo como
consequência a imolação
cruenta de muitos irmãos
como também a imolação
incruenta de tantos outros
revista vitória I Abril/2015
24
irmãos e irmãs, os quais
são na história de nossa
fé reverenciados como
nossos heróis, testemunho e exemplo para todos
nós que desejamos seguir
no discipulado de Jesus
Cristo. Todos, a seu modo,
proclamaram Cristo Ressuscitado, todos movidos e
conduzidos pelo Paráclito
vencendo o pecado e colaborando pela expansão
do Reino de Deus.
Hoje, a Igreja se depara diante de desafios
semelhantes. Quantos ir-
Pascal
mãos são imolados nas
diversas partes do mundo
somente porque são cristãos! Outrora a violência
contra os cristãos acontecia pela agressão física,
fazendo verter o sangue
do cristão perseguido.
Hoje, há em alguns lugares, agressão física com o
derramar do sangue, como
o Mestre e Senhor, porém,
em boa parte do mundo,
há outras maneiras de se
opor a Jesus Cristo. Há a
agressão de ordem psicológica e ideológica. A
agressão ideológica não
derrama o sangue, mas
envenena alma. O veneno das ideias e sofismas
traiçoeiros, aos poucos,
geram infiéis, idólatras e
heréticos sem que a própria pessoa perceba.
Hoje, mais do que
nunca, faz-se necessário
o testemunho pascal no
meio deste ambiente, das
ideologias sem se deixar
influenciar pelo mal. O
testemunho cristão pascal
é a força do Espírito Santo
que provoca conversões
onde não se poderia ima-
ginar que fosse possível.
O mistério da páscoa deve
ser vivido e anunciado
também nos ambientes
hostis à notícia cristã.
Veja como invadem
nossas famílias através de
uma mídia empenhada em
desvalorizar e por em ridículo valores ensinados
pelo Evangelho, seja a
respeito do sagrado matrimônio ridicularizando
a vida conjugal e familiar,
seja depravando a sexualidade humana e cristã e
o desrespeito à vida.
Ora, o testemunho
pascal exige do discípulo
cristão, hoje como ontem,
uma posição corajosa sem
medo de mostrar a convicção cristã, correndo risco
ou de ser preso ou de ser
condenado e/ou, de ser
considerado ignorante,
atrasado e ridicularizado.
A fidelidade evangélica hoje se dá muitas
vezes na coragem da contradição diante de quem
opte pela violência. A coragem evangélica é a não
violência ativa diante da
violência. A coragem da
não violência ativa gera a
paz, como por exemplo,
diante de um canal de TV
que defende e ensina antivalores, faz com que eu
mude de canal ou simplesmente valorize outras
emissoras que respeitam
a vida, a cultura cristã,
arraigada em nossa gente.
Com tristeza vejo que
muitos cristãos estão perdendo vigor da fé porque
bebem deste veneno anti-cristão e passam a mudar
não só de religião, mas assumem outra cultura, a do
indiferentismo e relativismo. Surgem novos ateus
práticos, indiferentes,
como também surgem novos discípulos missionários imbuídos da coragem
apostólica anunciando e
testemunhando o Mistério
da Páscoa nas Comunidades Eclesiais e dentro
delas novos movimentos
de leigos corajosos e
destemidos. Tempos novos e época
nova. Quem puder compreender, compreenda! n
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25
A arte sacra é uma
forma de evangelização,
evangelizar por meio da
beleza.
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A arte é um instrumento de evangelização, já que ela atrai o olhar do público auxiliando na catequização
e evangelização, logo a arte sacra é uma atividade pastoral.
Esta atividade não pode paralisar, as novas cidades, os novos bairros merecem este mesmo acesso, o que
demonstra o zelo, originalidade e criatividade do povo o que incentiva o enriquecimento cultural e vital
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carismas religiosos
“Desde os inícios do primeiro monaquismo até às ‘novas comunidades’ de hoje, cada forma de
vida consagrada nasceu da chamada do Espírito para seguir a Cristo segundo o ensinamento do
Evangelho.” (cf. Perfectae caritatis, 2) Educação e juventude, missão e oração: três formas de vivenciar
este ensinamento. Assim são os carismas dos Salesianos, Combonianos, Irmãs Carmelitas da Divina
Providência, Irmãs Combonianas e Irmãs Carmelitas Descalças.
O carisma de Daniel Comboni
Salesianos
São João Bosco,
fundador dos salesianos, compreendeu esta
mensagem do Evangelho e destinou as
atividades da congregação à educação da
juventude, desde 1859.
Estão em Vitória desde
1942, quando iniciaram o trabalho com um
colégio, e no ano de
1969, o bispo de Vitória conferiu-lhes o cuidado da Paróquia Nossa Senhora das Graças,
em Jucutuquara.
Com o objetivo primeiro de
enviar missionários para a África,
São Daniel Comboni dá início, no
ano de 1867 ao seu instituto masculino. Alguns anos depois, em 1872,
cria o ramo feminino. A inspiração
sempre foi missionária. O que, primariamente, seria só para a África se expandiu. Os Combonianos
chegaram na Arquidiocese no ano
de 1951, trabalhando em várias paróquias e, atualmente, na Paróquia
São José Operário, na Serra. As
Irmãs Missionárias Combonianas
chegaram em Vitória no ano de
1961 e realizam trabalhos na área
missionária, como é próprio do carisma. A comunidade composta por
12 irmãs é a sede provincial, acolhe
irmãs idosas e auxilia em diversos
trabalhos pastorais.
Carmelitas da Divina Providência
As Irmãs Carmelitas da Divina Providência foram fundadas no
Rio de Janeiro por uma jovem viúva que começou os trabalhos
em educandários, hospitais. Estão presentes em Anchieta desde
1932, a pedido de Dom Helvécio Gomes de Oliveira, então
Arcebispo de Mariana. Trabalharam com colégio até o ano
de 1999 e atualmente a comunidade acolhe as irmãs idosas e
enfermas e as que têm condições ajudam nos trabalhos pastorais
da Paróquia Nossa Senhora da Assunção.
Monjas Carmelitas
De dentro da clausura, a oração, a consagração e todas as energias de uma carmelita descalça
estão orientadas para o bem da Igreja e da humanidade. Essa foi a inspiração de Santa Teresa
de Jesus ao fundar essa ordem religiosa para que as mulheres, em intimidade total com Deus,
pudessem rezar pelo mundo e pelas suas necessidades. O Carmelo de Nazaré, localizado no
bairro Tabajara, em Cariacica, foi fundado em 1981 e atualmente é composto por 12 irmãs,
sendo uma postulante.
revista vitória I Abril/2015
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Foto: Magno Lima
pensar
entrevista
Leticia Bazet
O aprendizado e as
lições de um povo simples
Graça Neves é uma leiga, missionária por vocação. Nessa entrevista ela
conta, entre outras, a experiência vivida durante 33 dias na Província de
Tete, no Moçambique. A missão em meio a um povo simples e acolhedor,
fortaleceu seu lado espiritual e a sua vocação de se colocar a serviço.
vitória - Como surgiu a oportunidade de ir
vitória - Você já havia feito uma experiência
para essa missão?
missionária antes?
Graça Neves - Tenho um irmão que é jesuíta e
Graça
Neves - Quando eu tinha 22 anos fui para a
está lá na África há 12 anos, mas eu nunca pensei
Ilha de Marajó. Fui com essa coisa de querer viver.
em ir, apesar dele sempre chamar. É uma viagem
Tinha terminado meu curso de Letras e queria ir
muito longa, faltou coragem. Mas um dia eu depara uma região onde não tivesse
cidi. Acordei em um domingo e
um mercado saturado. Entrei em
disse: eu vou pra África, a partir
daí eu não tive medo, me enchi
A pessoa que contato com esse meu irmão e pedi
para que ele me indicasse um local
de coragem e fui.
não consegue
onde uma pessoa com licenciatura
fosse necessária. Ele me mandou
entender
esse
vitória - Como foi a sua exrelação de lugares, inclusive
periência?
estar para o outro uma
aqui
em
Vitória. Quando chegou a
Graça Neves - Quando eu saí dadeve
ser
muito
carta e eu li as indicações, também
qui sabia da necessidade de se
montar o Centro de Formação
triste. Eu gosto não sei explicar por quê, escolhi
dos Jesuítas e meu irmão man- de servir estando Ilha de Marajó. Foi uma experiência fantástica, lá eu me reconheci,
dou uma relação de coisas que a
no
meio
das
conheci o meu marido, lá nasceu
gente poderia fazer para ajudar:
meu primeiro filho, fui diretora
decorar, organizar a rouparia,
pessoas.
de escola, tenho minhas comaforam 33 dias dedicados a orgadres, e hoje pelo Facebook tenho
nizar esse local. O Centro fica em
ex-alunos que estão formados, foi um trabalho
Moçambique, se chama Centro de Formação de
maravilhoso. Fui para fazer um ano de experiência
Satemua. Lá possui vários alojamentos, casas de
e fiquei por anos.
apoio, auditório, e já estava em funcionamento
mesmo com toda a precariedade. O Centro recebe grupos para encontros de igrejas e ONGs.
A Igreja lá é muito atuante, como diz o nosso
Papa, o pastor tem que ter o cheiro das ovelhas
e eu senti isso muito de perto lá.
revista vitória I Abril/2015
29
vitória - A partir da vida que levou e a sua
mais recente experiência, qual o maior aprendizado que carrega?
Graça Neves - Acho que não tem caminho me-
entrevista
lhor para a gente crescer do que
estar aberto a esse serviço. É um
amadurecimento como ser humano. Eu voltei da África mais
humana, entendendo melhor as
coisas, as questões sociais. Porque
o que eu vi lá, com toda aquela
diversidade, por exemplo: a noite
caía uma chuva, tempestade e a
gente bem protegido no Centro,
mas eu pensava naquelas casas
das comunidades cobertas de palha. No outro dia, eles chegavam
como se nada tivesse acontecido,
cumprimentando a gente com um
sorriso largo, com alegria, quer
dizer, eles convivem com aquilo e
continuam felizes. Tudo é motivo
para eles cantarem. Quando eu
distribuí roupas lá, porque um
dos trabalhos era organizar umas
doações que chegaram da Itália,
no final eles começaram a cantar
e eu não entendia muito bem.
Meu irmão me disse ‘olha, eles
estão cantando para você, estão
te agradecendo, é a forma deles
agradecerem’. Em outra ocasião
eu fui até uma casa mais afastada
com eles e no carro era aquela
cantoria pela estrada, naquela alegria. Um dos funcionários que
estava lá traduziu para mim e eles
cantavam: Obrigada, visita! Eu te
estendo as mãos, eu te recebo de
coração. Nossa, como eu chorava!
Só de olhar aquele carinho, eles
têm muito do toque, de abraçar.
Com essas pessoas eu aprendi que
o que dá serenidade é o próprio
Deus. Você tem que fazer alguma
coisa, mas não é a minha presença
lá, não é a presença do padre, quer
dizer a gente ajuda, mas se a gente
sair eles vão continuar sendo felizes do modo deles. Aí a gente vai
ver porque a opção de Jesus pelos
pobres. Eles conseguem ser muito
mais fraternos do que a gente.
vitória - A mística da celebração é muito diferente da nossa?
Graça Neves - Completamente!
A missa dura quase duas horas,
revista vitória I Abril/2015
30
mas se o mundo acabar naquela
hora, você nem vai sentir falta,
porque a alegria e o sorriso com
que eles falam é maravilhoso. Eles
não têm missa como a gente, que
se quiser assiste todos os dias da
semana. São muitas comunidades
e poucos sacerdotes, então é uma
ou duas vezes por ano. É tudo
muito simples, mas muito bem
organizado. A liturgia é uma festa
para eles, é a oportunidade deles
valorizarem aquele momento. Não
têm energia na Igreja, pelo menos
nas duas comunidades que eu fui,
mas eles levam o teclado e ligam
em bateria de carro. Talvez a gente
precise enriquecer mais o nosso lado espiritual, para entender
como eles conseguem manter a
sintonia. Depois, a mesma mesa
que serviu de altar, é a que serve o
alimento. Eles preparam a massa
e todos comem juntos em volta,
com a mão, na maior simplicidade.
vitória - Essas crianças moram
no Centro de Formação?
Graça Neves - Não. O mês de janeiro é de férias escolares lá, então
eles ficam como colônia de férias.
São crianças órfãs e os jesuítas têm
um programa que chama Casa
Lar. O programa mantém com um
salário, geralmente viúvas ou mulheres que não tiveram filhos, que
se dedicam a serem mães postiças
desses órfãos. Eles estão inseridos
em uma comunidade, que ajuda
também a manter aquelas crianças. Lá não tem casas isoladas,
eles estão sempre juntos ali. As
crianças levam uma vida normal,
chamam as mães de mãe mesmo,
é um projeto muito bonito.
vitória - O Papa Francisco fala
da Igreja em saída. Isso representa o seu sentimento?
Graça Neves - Olha, isso é de cada
um. Estar vivo nesse mundo tem
que despertar esse sentimento,
senão a gente cai no vazio, numa
falta de sentido. A pessoa que não
consegue entender esse estar para
o outro deve ser muito triste. Eu
gosto de servir estando no meio
das pessoas, sempre procuro me
engajar em alguma obra, mas eu
acredito que as pessoas sejam assim, cada um do seu jeito.
vitória - Você também desen-
volve um projeto social em Laranjeiras. Como surgiu?
Graça Neves - Ao sair da Ilha de
Marajó, eu continuei morando
no Pará com minha família. Saí
de toda aquela história, daquela
cidade onde a gente idealiza tudo
junto, sempre engajada em projetos sociais e quando cheguei aqui,
arrumei minha casa, achei ótimo,
mas passou. E começou aquilo
que eu disse, um vazio, questionamento sobre o que fazer da minha
vida. Pedia a Deus para que eu
me engajasse em alguma coisa,
até que um dia eu acordei com o
projeto montado na minha cabeça.
Começamos e já estamos há nove
anos. A ideia foi reunir pessoas
que estavam na mesma situação
que eu para produzir algo para os
bebês e gestantes carentes.
vitória - A Igreja teve influência na sua caminhada?
Graça Neves - Eu acho que foi
a Igreja doméstica. Eu nasci na
roça, minha mãe era professora.
Eu aprendi com ela e com meu pai
o jeito de rezar, porque eu cresci
com a família reunida na copa
rezando o terço todas as noites e
vendo a maneira como eles repartiam tudo o que tinham com os
meeiros na época. Quando chegava Natal fazia aquela fila, sempre
tinha alguma coisa para dar pra
cada família. E eu fui crescendo
vendo aquilo. Minha família foi
meu grande exemplo.
vitória - Você consegue classi-
ficar uma experiência na África
que mais te tocou?
Graça Neves - Eu tive uma experiência que precisei ter muita fé.
Faltava uma semana para eu voltar
e comecei a sentir muita fraqueza,
a minha voz quase não saía mais,
eu tremia muito e, há menos de
2 anos eu tivera arritimia, então
fiquei com muito medo, pois nessa manhã eu acordei ouvindo o
barulho do meu coração. Após
alguns dias me sentindo muito
mal, o rapaz no Centro falou que
era malária. Fui para a vila, fiz
os exames e eu estava realmente com malária. Foram três dias
tomando 8 compridos por dia.
revista vitória I Abril/2015
31
Eu fiquei acabada no quarto, não
tinha coragem para nada, eu suava muito, não comia, só tomava
água. Dois dias depois eu estava
um pouco melhor, mas quando
eu cheguei no quarto à noite, a
minha perna estava toda vermelha, cheia de placas, de reação ao
remédio. Isso era na quinta-feira
e eu viajava no domingo. Então
eu digo que foi uma experiência
marcante, porque você não espera isso depois de terminar um
trabalho desse, e foi a hora que
Deus foi mais carinhoso comigo.
Eu vim de lá com minhas pernas
inchadas, vermelhas, correndo o
risco deles não me deixarem viajar
por causa da doença. Meu irmão
queria dar uma lembrança para
eu trazer, e na última missa lá, eu
pedi para ele me dar uma bênção
e fazer o meu envio, porque eu
queria me sentir forte. Quando
eu saí daqui o padre João Marcelo
me abençoou e disse que
daria tudo certo, e eu
me apeguei nisso: vai
dar tudo certo. Mesmo
com a doença e minha
fraqueza, em nenhum momento
eu me senti chateada, porque
eu não queria
tirar a beleza
de tudo que eu
tinha vivido ali.
Deus me preparou muito bem
para isso. n
Mundo Litúrgico
Nossa Senhora das Alegrias
“Trazia o burel a cobrir-lhe o corpo, uma sandália
nos pés e um quadro de Nossa Senhora das
Alegrias em uma das mãos”.
Assim nos conta a história
da chegada de frei Pedro Palácios com o painel da Mãe de
Deus, cuja primeira morada foi
a gruta na beira do mar, visitada
ainda hoje, à entrada do portão
da ladeira das “Sete Voltas”.
O estranho desaparecimento
do quadro, por três vezes, deu
origem à primeira lenda da Vila
Orações para pedir chuva
A liturgia da Igreja esteve sempre atenta às necessidades
dos homens e das mulheres de seu tempo, fazendo com que o
mistério de Cristo atualizado na Eucaristia se perpetuasse na
vida dos fiéis de maneira perene. Para os tempos de seca, por
exemplo, tanto a liturgia oficial da Igreja quanto a piedade popular expressam sua confiança em Deus para que lhes alcance
as chuvas. O Missal Romano traz uma oração própria para a
missa: “Ó Deus, em quem vivemos nos movemos e somos,
concedei-nos as chuvas necessárias, para que, auxiliados quanto
aos bens da terra, desejemos com mais confiança os do céu.”
O Beato Paulo VI, na oração do Angelus de 04 de julho de
1976 também incentivou que os fiéis pedissem chuva quando
a Itália passava por uma grande seca. No interior, as pessoas
costumam se dirigir ao Cruzeiro – geralmente erguido em um
lugar de destaque – e jogam água aos seus pés, na certeza de
que a água jogada na Cruz chegará à terra.
revista vitória I Abril/2015
32
do Espírito Santo. Nossa Senhora dos Prazeres ou Alegrias
tinha em Portugal o cognome
de Nossa Senhora da Penha de
Cintra, por estar no alto de uma
rocha. Título amplamente venerado pelos portugueses, esta
tela foi a primeira imagem de
Nossa Senhora, existente na
Capitania e ficou conhecida
O círio Pascal
O Círio Pascal é a grande
vela acesa na Vigília Pascal –
noite de Sábado Santo – e fica
aceso durante o Tempo Pascal,
que compreende “os 50 dias entre o domingo da Ressurreição e
o domingo de Pentecostes, que
devem ser celebrados com alegria e exultação, como se fossem
um só dia de festa, ou melhor,
como um grande domingo” (cf.
Normas Universais do Ano Litúrgico e Calendário, n. 22). É
o principal símbolo da Páscoa e
a palavra “círio” vem do latim
cereus e significa “cera”, pois
é confeccionado com cera de
pelos milagres realizados.
O quadro é uma pintura barroca da arte espanhola,
de autor desconhecido e está
pendurado na parede lateral da
nave do Convento da Penha, no
‘lado do Evangelho’, onde pode
ser contemplada. Foi posteriormente adornado com moldura
de madeira talhada pelo artista
português José Fernandes Pereira, aqui presente nas obras
de restauro.
A imagem de Nossa Senhora
da Penha é outra obra de arte encomendada por Pedro Palácios e
encontra-se no retábulo. Peça de
grande valor artístico do Brasil
Colônia é entalhada em madeira
e trazida de Portugal em 1569.
Aproveitemos a proximidade da Festa da Penha para
contemplar esta bela obra de
arte que nos recorda as Alegrias
da Mãe da Deus: a Anunciação do Anjo; a Visita a Isabel; o Nascimento de Jesus;
a Adoração dos Reis Magos;
abelhas. Durante o Tempo da
Páscoa, “o círio pascal, colocado
junto do ambão ou perto do altar,
permaneça aceso ao menos em
todas as celebrações litúrgicas
mais solenes deste tempo, tanto na missa como nas laudes
e vésperas, até ao domingo de
Pentecostes. Depois, o círio é
conservado à devida honra no
batistério, para acender nele as
velas dos neobatizados. Na celebração das exéquias o círio
pascal seja colocado junto do
féretro, para indicar que a morte
é para o cristão a sua verdadeira
Páscoa. Fora do tempo da Páscoa
não se acenda o círio pascal nem
seja conservado no presbitério”
(cf. Paschalis Sollemnitatis, 99).
o Encontro do Menino Jesus
no Templo; Maria vê a Jesus
Ressuscitado; a Assunção de
Maria e sua Coroação no Céu.
Seja para nós oportunidade de
crescer na fé e na intimidade do
Senhor, fazendo-nos cada vez
mais, sinais do Reino, sinais da
paz e alegria.
No Círio Pascal estão as letras alfa e ômega, a primeira e a última do alfabeto grego e
significam que Deus é eterno e se fez inteiro no meio de nossa humanidade. Também
é colocado o número do ano corrente, explicitando que Ele é o senhor do tempo e da
história. Os cinco grãos de incenso incisos na cruz nos falam das marcas da Paixão
(5 chagas de Cristo). Em síntese, os sinais contidos no Círio Pascal remetem-nos à
Paixão de Jesus e eternidade de Deus.
revista vitória I Abril/2015
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Raquel Tonini, membro da Comissão de
Arte Sacra da Arquidiocese de Vitória
e Grupo de Reflexão do Setor Espaço
Celebrativo da Comissão Litúrgica da CNBB
Marcus Tullius
Comissão Arquidiocesana de Liturgia
Reportagem
O sustento, a vida e o
O
manguezais
mangue, além de sua
função natural no ambiente, é também fonte
de renda e sustento para pelo
menos duas comunidades em
Vitória: Goiabeiras e São Pedro.
Barro, tintura, caranguejo, siri,
peixes e todas as diversificações
que surgem deles, movimentam
famílias inteiras e perduram através das gerações.
No bairro Goiabeiras, uma
comunidade se organiza em torno
da tradição de fazer manualmente as panelas de barro. Nada de
tecnologia ou industrialização,
até porque isso é proibido pelo
Instituto do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), mas a
verdade é que a relação de
quem trabalha em torno
do mangue é tão natural e espontânea que
ninguém pensa em
transgredir as normas e a lei. A
comunidade organizou-se e tem
os responsáveis por cada parte do
processo, que se tornam também
guardiões. “Quando vamos retirar
o tanino, a gente só tira 15% da
planta e no barreiro a extração
é toda sem maquinário”, disse
Flávio Fernandes que fabrica panelas há 12 anos, mas aprendeu na
infância e a vida toda frequentou
o local onde hoje trabalha. Perguntado se aceitaria maquinário
para fazer extração, respondeu
que a comunidade mantem uma
relação sustentável com toda a
região e que é necessário manter
a tradição.
Para iniciar o processo de
confeccionar uma panela, alguns
se embrenham no mangue para
buscar barro e tinta. Depois de
uma hora de barco pelo manguezal, os tiradores retiram as cascas
vermelhas, levam para o galpão,
socam e as deixam de molho 3
dias para soltar a tinta. O outro
grupo que retirou o barro também
tem trabalho no galpão. Eles precisam tirar todas as impurezas do
barro, depois amassar até ficar
na consistência necessária para,
então, modelar as peças.
revista vitória I Abril/2015
34
Alguns participam de todo o
processo, mas o mais comum é os
artesãos comprarem o barro e a
tinta. Os que se arriscam em todas
as etapas dizem que ir para o mangue é menos estressante do que
ficar no galpão e os que escolhem
e moldam o barro preferem a arte
da produção. O serviço é intenso
e pesado, mas compensado com
os elogios de quem compra, o ambiente familiar de todo o grupo,
o desfrute do mangue e a alegria
de manter a tradição. Porém é o
dinheiro ganho ali que sustenta
as famílias. Flávio trabalha com
a esposa, a mãe e o sobrinho. Já
Evanilda Correia, artesã também
lazer que vem dos
ensinou aos filhos, mas eles vivem de outros trabalho. Quando
é necessário estão prontos para
ajudar a mãe. Entre eles todos
são primos, tios e amigos que
dividem com a comunidade o
parentesco real e adquirido pela
convivência.
Em pouco tempo dentro do
galpão das paneleiras percebemos que a presença masculina era
grande e indagamos sobre isso. A
resposta veio com uma história
curiosa. Recentemente os homens
que conversavam no campo de futebol revelaram o segredo antigo
encoberto por longos anos: eles
sempre fizeram panelas, mas as
mulheres vendiam e diziam que
eram elas por causa do preconceito. “No passado quase a metade
masculina fazia panela de barro
e ninguém dizia”, contou Flávio. Hoje, livres do preconceito,
homens e mulheres tocam seus
empreendimentos misturando
vontade e experiência, inovação
e tradição e, principalmente orgulho de dar a Goiabeiras Velha
o selo de comunidade das paneleiras. Encontramos gente da 3ª,
4ª e 5ª geração e todos animados
por terem seu próprio negócio,
trabalharem por conta própria
e sustentarem suas famílias. O
mais jovem que conversou conosco, Hascler, tem 21 anos e sente
alegria por trabalhar sem patrão,
sem pressa para moldar o barro
e transformá-lo em panela, com
tempo para caprichar nos detalhes
da tampa, sem hora para chegar
e diz que isso não faz dele um
preguiçoso: “estou aqui todo o
dia, escolho o barro, tiro as impurezas e também faço a panela”,
disse ele manifestando seu lado
artístico que comprovamos nas
peças prontas. Perguntamos se ele
já pensou em fazer outras peças e
ele disse “ sim, mas tem que ser
algo que dá pra terminar no dia
porque o barro seca. Pensei fazer
abajur e acho possível”.
Na divisão das tarefas algumas são consideradas mais pesadas e atribuídas aos homens,
como cuidar do tanino, extrair
Reportagem
o barro e queimar as panelas, mas
na hora que a reportagem esteve lá
eram elas, as mulheres, que queimavam as panelas. “Difícil não é,
é cansativo. Você queima, tira com
o garfo e põe a panela em cima
de uma mesa”, afirmou Evanilda,
com a convicção de quem sabe e
continuou, “eu só faço panela, é o
que eu gosto de fazer”.
“Fazer panela é igual
massa de pão, tem que
montar ela todinha. O
primeiro passo é modelar. Depois você coloca
a alcinha, ou orelhinha
como dizia meus pais”.
Evanilda discorre sobre tudo
com presteza. Falou da importância
da tradição e de sua preocupação em
mantê-la viva e diz que ensinou seus
filhos todo o processo: “Filho de paneleira tem que saber tudo, porque
se acabar as paneleiras, a tradição,
acabou Goiabeiras. A gente não
pode deixar morrer, senão aqui vira
um bairro igual todos são”. Quando
perguntamos que futuro ela deseja
para os filhos ela não hesitou “isto
aqui é o negócio da gente”.
Panela de barro fez-nos pensar em moqueca e perguntamos se
ali também tem pesca, caranguejo, siri. Evanilda diz que tudo tem
seu tempo, respeitam as andadas
e pescam para consumo próprio,
o que confirmaram Flávio e Carlinhos. Eles saem pra pescar sem
pretensões,apenas para curtir o
mangue.
Mas do outro lado, continuando
pelo mangue, outra comunidade
do Bairro São Pedro sustenta-se
exatamente da pesca, especialmente
o siri. Em comum, as duas comunidades têm o mar, o mangue, o vento
e a dependência das marés para a
pesca, e para colher o tanino e o
barro. Enfim, pescadores, barreiros
e tiradores são cientistas na prática.
Rogério Leonel, o Pirão, como é
conhecido,contou: “a gente trabalha
pela maré, pelo horário. Por exemplo, a maré grande começou a vazar
agora (16h) quando der 20h ela vira
de enchente. Então o horário bom
para a pesca é agora porque a maré
está baixando, mas amanhã a maré
já vaza 20 minutos a mais por causa
revista vitória I Abril/2015
36
da lua. O vento também influi muito.
Vento bom é norte e nordeste, quando o vento vira do sul ou noroeste o
pescador tem que ir embora porque
é mais forte, é perigoso”. Sim, mas
e o peixe? “Quando a maré baixa
bastante o peixe sai do mangue e é
melhor pra pegar, quando ela enche
o peixe entra pelo mangue adentro
e você não consegue pegar”.
Depois da aula sobre pesca
fomos procurar as desfiadeiras
de siri. Com tristeza descobrimos
que a associação não existe mais
e as mulheres que desfiam fazem
em suas casas, por conta própria.
Será que faltam incentivos? Por
que a associação das paneleiras
tem apoios, está organizada e a
associação das desfiadeiras desarticulada? Encontramos Euza Correia
que recebeu e acolheu a reportagem
em sua casa e nos acompanhou até
o local onde cozinham o siri quando
chega do mangue, um lugar com
pouca estrutura que no momento
servia de espaço para brincadeira de criança. Ela compra o siri
em caixas, encomenda feita aos
pescadores antes da pesca, ferve e
depois faz o resto do preparo em
casa: ferver, desfiar, temperar, embalar e vender. No caso dela o “ser
desfiadeira” começou por acaso, o
irmão pescava, ela desfiava e usava
para consumo próprio. Um dia um
senhor procurou siri desfiado e ela
começou a desfiar para vender.
Hoje vende para dois restaurantes
e a quem procurar em sua casa.
Próximo à semana santa as vendas aumentam, mas o siri é procurado o ano todo. Alguns
procuram inteiros para
fazer moqueca, outros,
desfiado e temperado
para assar no forno e
ainda para moquequinha ou torta.
No caso de Euza a venda do
siri não é a única fonte de renda,
mas ela afirma que muitas famílias
da região vivem do mar e do mangue e disse estar preocupada com
a falta do crustáceo, influenciada
pela ausência de chuva: “nunca
me preocupei porque sempre teve.
Aqui tem ostra, camarão, sururu,
siri e outros peixes, mas agora
nós estamos ruins de siri. Quando chove muito e vem o vento
sul, a água doce que desce do
rio parece que desenterra o siri.
Este ano todo o mundo rezou pra
chover pra desenterrar o siri. A
chuva custou a vir e quando veio
trouxe um pouquinho de siri, mas
já sumiu de novo”.
A cata do caranguejo parece
assunto proibido. “A comunidade
São Pedro vivia mais da pesca
do peixe, o siri não acrescentava nada. Já o caranguejo a gente
pescava muito e comia muito,
mas agora tem essa proibição,
revista vitória I Abril/2015
37
então não tem mais”, foi a informação mais clara que obtivemos
no bairro que apresenta a falta de
estrutura para continuar mantendo
viva a tradição, embora permaneça
na teimosia de alguns, como Rogerinho Ferreira,18 anos, que levanta
cedo para pescar e em 3 horas no
mangue abastece o restaurante
da família. Ele pretende continuar seguindo os passos do pai e
afirma “saía com meu pai desde
pequeno e aprendi tudo com ele
sobre maré e lua. Levantar cedo,
pescar, isso é a minha vida. Eu
nasci e fui criado com a pescaria,
nesse ambiente. Quero trabalhar
no meu comércio no restaurante
como meu pai fez”.
As tradições de Goiabeiras
Velha e São Pedro estão garantidas e a história vai desenhando
outros matizes, mas não apaga a
relação sadia e alegre de quem
se sustenta em harmonia com o
ambiente e a natureza. n
Reflexões
O Bispo é
pastor
em Cristo
F
oi com imensa alegria e
satisfação que aceitei o
chamado do Santo Padre
Francisco, nomeando-me Bispo
Titular da Diocese de Colatina,
no último dia 04 de março, quando completei 3 anos de ordenação episcopal.
Tenho consciência de que
o Bom Pastor, aquele que dá a
vida por suas ovelhas, de geração
em geração, vai chamando, escolhendo ministros e concedendo,
através do Espírito Santo, as graças necessárias para o exercício
do ministério episcopal.
O Pastor dos pastores é o
próprio Cristo.
Alguns anos atrás, ouvi do
Santo Padre Bento XVI essas
palavras encorajadoras dirigidas
a dois novos bispos, e as guardei
no coração, “O bispo também
deve ser um homem inquieto,
que não se satisfaz com as coisas rotineiras deste mundo, mas
segue a inquietação do coração;
deve ser um homem vigilante,
que percebe a linguagem sutil de
Deus e sabe discernir a verdade
da aparência; deve ser repleto da
coragem e da humildade; deve ser
capaz de ir à frente, indicando o
caminho, seguindo Aquele que a
todos nos precedeu, Jesus Cristo”.
Louvo e agradeço o Senhor
por me enviar em tão bela missão,
para a qual me apresento como
aquele que serve, confiando na
assistência do Espírito Santo.
Como Administrador Apostólico da Diocese de Colatina
desde 14 de maio de 2014, tomei
conhecimento do Projeto Diocesano de Evangelização 20132016, “Ser uma Igreja fortalecida
na fé, samaritana e dinâmica na
sua missionariedade, ad intra
e ad extra, com lideranças renovadas” e agora, pela Graça
de Deus, continuo a fazer parte
dessa caminhada, na esperança
de evangelizar e servir, desejando exercer o meu ministério
episcopal conforme o coração de
Cristo.
Parto com o coração agradecido a Deus e aos presbíteros,
diáconos, consagrados e consagradas, seminaristas, leigos e
revista vitória I Abril/2015
39
Dom Wladimir,
a Revista Vitória
agradece a colaboração
do senhor nestes 3
anos e, junto com toda
a Arquidiocese, deseja
que sua nova missão
seja testemunho de
Deus e amor ao povo
da diocese de Colatina.
Deus abençoe o senhor
nessa nova etapa.
leigas, autoridades constituídas
e principalmente a Dom Luiz
Mancilha Vilela, pela acolhida
generosa na Arquidiocese, pelo
apoio e confiança que sempre
depositou em mim. Guardo no
coração com alegria minha convivência diária com Dom Luiz e
Dom Sevilha, amigo e irmão.
Considero os 3 anos que passei na Arquidiocese de Vitória,
um tempo de graça particular e já
sinto saudades do Povo de Deus
presente nesta Arquidiocese que
aprendi a amar como Bispo Auxiliar por mais de 3 anos. Envio
a todos a minha bênção. n
Dom Joaquim Wladimir Lopes Dias
Bispo Auxiliar da Arquidiocese de Vitória
ensinamentos
A devoção a No
N
o período de grandes festas marianas,
como a de Nossa Senhora da Penha,
é comum acusarem os católicos de
idolatria ou de mariolatria; e perguntarem onde
se encontram na Bíblia os argumentos para
cultuar Maria.
Os evangelistas, especialmente
Lucas, evidenciam o lugar especial
de Maria na vida de Jesus Cristo e
da comunidade cristã, explicitando a participação singular dela no
projeto de Deus.
Os dogmas marianos amparam-se na Tradição da Igreja – vinda
desde os Apóstolos, na Sagrada
Escritura – intrinsecamente vinculada à Tradição, e no Magistério
da Igreja – constituído pelo Papa
e pelos Bispos em comunhão com
revista vitória I Abril/2015
40
ele, que por força do poder conferido por Cristo tem autoridade para
interpretar a Sagrada Escritura.
Todos os dogmas marianos
estão vinculados à participação de
Maria no Mistério de Cristo, conforme se verifica na visão panorâmica
a seguir.
O Dogma de Maria, Mãe de
Deus foi proclamado no Concílio
de Éfeso (431), quando a Igreja
discutia questões cristológicas.
Maria é Mãe de Deus por Jesus
Cristo ser verdadeiramente homem
e verdadeiramente Deus.
O Segundo Concílio de Constantinopla (553) formulou o Dogma
da Virgindade Perpétua de Maria
declarando que o Verbo de Deus
“[...] desceu dos céus e se encarnou
da santa e gloriosa Mãe de Deus
ssa Senhora
e sempre Virgem Maria e dela nasceu
[...]”. O dogma vincula-se à concepção
de Jesus como obra do Espírito Santo.
O Dogma da Imaculada Conceição foi promulgado pelo Papa Pio IX,
por meio da Bula “Ineffabilis Deus”,
de 08/12/1854. O Papa afirma que Deus
preservou Maria do pecado original para
ser a Mãe do Seu Filho Jesus Cristo.
Quanto à Assunção de Maria ao
Céu, a proclamação do Dogma foi feita
pelo Papa Pio XII, por meio da Constituição Apostólica “Munificentissimus
Deus”, de 1º/11/1950. Em razão de ser
Mãe de Jesus Cristo, Maria foi levada em
corpo e alma à glória suprema do céu,
refulgindo como Rainha à direita do seu
Filho. n
Vitor Nunes Rosa
Professor de Filosofia na Faesa
Os dogmas marianos amparam-se na
Tradição da Igreja – vinda desde os
Apóstolos, na Sagrada Escritura –
intrinsecamente vinculada à Tradição,
e no Magistério da Igreja – constituído
pelo Papa e pelos Bispos em comunhão
com ele, que por força do poder
conferido por Cristo tem autoridade
para interpretar a Sagrada Escritura.
revista vitória I Abril/2015
41
Prática do saber
Procissão fotográfica
O
retrato da fé e da devoção do povo capixaba na maior festa religiosa do Estado
exposto no trecho da Rua Antônio Ataíde,
que dá acesso ao Convento e à Prainha, locais
onde milhares de fiéis se reúnem para a Festa de
Nossa Senhora da Penha. Desde 2012, é ali que o
trabalho e dedicação de alunos ganha visibilidade
e reconhecimento do público participante, que
pode se encontrar em alguma das imagens, no
caminho percorrido tantas vezes em oração nas
romarias.
revista vitória I Abril/2015
42
É na constante busca de envolver os alunos do curso de comunicação em uma experiência
de reportagem fotográfica, que
o projeto de extensão da Faesa,
Procissão Fotográfica, chega
ao 9º ano, sob coordenação da
professora e fotógrafa Zanete
Dadalto. Para além do conhecimento técnico, a experiência
provoca sentimentos e emoções
em quem está envolvido, até
mesmo em quem admite não
ter religião: “é comovente ver o
olhar do próximo, a importância
que aquela devoção tem para a
pessoa e a manifestação da fé na
Festa da Penha”. A declaração é
do aluno de Publicidade, Bruno
Barros, que está no 7º período e
participa da ‘Procissão’ desde
2012.
Para quem entrou despretensiosamente no projeto,
apenas por curiosidade e pela
paixão pela fotografia, o estudante já é presença garantida no evento, inclusive no
próximo ano, quando já estará
formado. Para Bruno, o que
mais o impressiona é a união
das pessoas pela fé, expressa,
principalmente na romaria dos
homens, quando a multidão caminha lado a lado, cada qual
com suas motivações.
Bruno também comenta
que a grande satisfação é retratar as manifestações da religiosidade e perceber como as
pessoas gostam de ser vistas, a
forma com que valorizam o trabalho produzido, e é pensando e
observando cada gesto singular
dos fiéis, que ele procura retratar por meio da fotografia.
O registro que Bruno escolhe
como o seu favorito está na
página ao lado. “As mulheres
carregando a imagem, a devo-
ção e emoção delas foram de um
grande significado para mim”.
O projeto
Um grupo de 50 alunos
realiza a cobertura fotográfica e jornalística da Festa da
Penha. A atividade acadêmica
resulta no maior acervo fotográfico de eventos no Espírito
Santo e é apresentada ao público em exposições, no jornal impresso Tendências e no
jornal online Faesa Digital. A
Festa é documentada desde os
preparativos, o Oitavário e todas as romarias que levam
milhares de pessoas ao
Convento. Durante o
evento, os alunos
interagem com os
fiéis, entrevistam,
fotografam e filmam os romeiros, põem-se em contato com
os organizadores dos festejos e
com os moradores do entorno
do morro do Convento. Para a
coordenadora Zanete, o mais
importante é o aluno “vivenciar
na prática o que ele vive na
academia e aprender que quem
faz jornalismo não pode ter preconceito religioso nem político.
É interessante também ver que
eles percebem e se emocionam
com a fé do povo capixaba,
isso dá um conhecimento real
sobre a nossa cultura e nossas
tradições”. A fala de Zanete é
endossada por Bruno: “é um
trabalho de grande importância
para a memória cultural, social
e religiosa do Espírito Santo,
muito bem coordenado e orientado pela professora, por quem
tenho grande admiração”. n
cultura capixaba
Toponímia Capixabas
de origem indígena
O
No Espírito Santo há
um vasto material
e conjunto de
palavras que dão
nome as cidades,
rios, montanhas,
lagos e localidades,
originalmente
povoadas pelos
índios
Diovani Favoreto
Historiadora
s estudiosos linguistas pesquisam, na toponímia, os
nomes próprios dos lugares, suas origens e evolução. E, no
Espírito Santo há um vasto material
e conjunto de palavras que dão nome
às cidades, rios, montanhas, lagos e
localidades, originalmente povoadas
pelos índios, e que com o tempo
formaram cidades ou localidades de
grande importância para o capixaba.
O pequeno livro de J. W. Emery de
Carvalho, Topônimos e Epônimos
Capixabas, editado em 1999 pelo
Instituto Histórico e Geográfico
do Espírito Santo, nos trás alguns
exemplos desses topônimos e seus
significados na língua tupi-guarani,
puri ou aimoré. n
revista vitória I Abril/2015
45
Vejamos alguns exemplos
Camburi – rio de leite, isto é, de
espuma branca;
Jucutuquara – buraco da ponta.
Também buraco de coruja;
Maruípe – caminho dos maruís;
Itapoã – pedra erguida
Jucu – espécie de canela
brasileira
Araçatiba – sítio dos araças
Itapoca – pedra furada
Carapina – tirar a casca grossa,
descascar, lavrar
Jacaraípe – caminho de jacaré
ou, em outra versão, rio dos
caraís
Itaúnas – a pedra preta, o ferro
Piúma – epiderme ou casca
escura
Itabapoana – pedra levantada,
pedra suspensa
Marataízes – canais do mar
Iúna – rio pardo
Itapemirim – caminho pequeno
de pedras
Ubú – a terra, o chão
Iriritiba – sítio das ostras
Araguaia – papagaios mansos
Aracê – a aurora
Bacutia – mudar de direção
Guarapari – curral das garças
Meaípe – torta de mandioca doce
Una – preto
Cariacica – pedaço de acarí
(cascudo)
Itanguá – baixa das conchas
Itaquarí – pedra furada

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