Olhos sobre a Bahia pelos olhos de Lina, 1958

Transcrição

Olhos sobre a Bahia pelos olhos de Lina, 1958
“OLHOS SOBRE A BAHIA” PELOS OLHOS DE LINA, 1958
Luiz Carlos de Laurentiz
Faculdade de Arquitetura, Urbanismo e Design – UFU
E-mail para contato: [email protected]
“OLHOS SOBRE A BAHIA” PELOS OLHOS DE LINA, 1958
Resumo
Entre setembro e novembro de 1958, o jornal Diário de Notícias, em Salvador/BA, publicou a página
domingueira Crônicas de arte, de história, de costume, de cultura da vida. Essa página cultural, um trabalho
inédito em jornais baianos, foi criada pela arquiteta Lina Bo Bardi, responsável pela redação, diagramação e
ilustração. E, para conversar cientificamente Lina no jornal, optamos por investir numa busca metodológica
onde, entre outras questões, estejamos promovendo a união de duas abordagens – as formais e as
sociológicas – na apresentação analítica dos textos periodísticos. Assim, justificamos a nossa escolha
temática, simplesmente, anunciando a dupla: texto e contexto. Porquanto, o nosso apoio metodológico,
ponto de partida da conversa, ampara-se em autores cujas visões científicas, da descoberta ao reconheci
mento, pesquisam a imprensa escrita: íntima e (cúmplice?) do campo das representações sociais. Um
pouco dessa história, menos conhecida, da imprensa moderna da Bahia, é o que nos propomos a
apresentar.
Palavras-chave:
1. Comunicação e cultura. 2. Linguagem e cultura. 3. Cultura – Salvador. 4. Cidades e vilas na literatura.
"EYES ON THE BAHIA" THROUGH THE EYES OF LINA, 1958
Abstract
Between September and November 1958, the newspaper Diario de Noticias, in Salvador, Bahia, published
the page domingueira Chronicles of art, history, custom, culture of life. This page has cultural, a new piece in
Bahian newspapers, was created by the architect Lina Bo Bardi, responsible for writing, editing and
illustration. And to talk scientifically Lina in the paper, we chose to invest in a search methodology which,
among other issues, we are promoting the union of two approaches - the formal and sociological - in the
analytical presentation of the texts periodÃsticos. Thus, we justify our choice of subject matter, simply
announcing the pair: text and context. Because our support methodological starting point of the
conversation, is based on authors whose views scientific discoveries into recognition treatment, research the
press: intimate (accomplices?) From the field of social representations. A bit of history, less known, the
modern press of Bahia, is what we intend to present.
Keywords:
1. Communication and culture. 2. Language and culture. 3. Culture - Salvador. 4. Cities and towns in
literature.
“OLHOS SOBRE A BAHIA” PELOS OLHOS DE LINA, 1958
pra começo de leitura
Quando nos propusemos a pesquisar o trabalho jornalístico de Lina Bo Bardi1, à frente de uma
página cultural denominada, Crônicas de arte, de história, de costume, de cultura, da vida,
criada, escrita, diagramada e ilustrada pela arquiteta romana, no extinto jornal, Diário de
Notícias, de Salvador, em 1958; as informações, até então, conhecidas, eram poucas.
Tudo o que tínhamos concentrava-se, em ser e em estar, em algumas passagens integradas às
pesquisas, bobardianas, publicadas. Ao lado de quatro páginas ilustradas com reproduções
fidedignas de alguns números de, Crônicas (...), inseridas no interior do belo e completo catálogo,
Lina Bo Bardi (Carvalho Ferraz, 1993, pp. 130-133).
Assim, não encontrando referências com conteúdos mais extensivos sobre o início da produção
jornalística de Lina na Bahia, em 1958, ano em que a arquiteta vive alguns meses capital,
Salvador, em função de um convite de Diógenes Rebouças para ensinar Filosofia e Teoria da
Arquitetura na Escola de Belas Artes da Universidade da Bahia (Risério, 1995, p. 79), ficamos
seduzidos e desejosos em atender aos nossos estímulos passionários ao assunto.
... retomando a razão, complementamos ao porquê da importância de investigarmos, enquanto
uma pesquisa universitária, esse quase inédito assunto sobre Lina na Bahia.
Às justificativas da nossa escolha temática, nesse começo de leitura, simplesmente, anunciamos
pela dupla, texto e contexto. Porquanto, fizemos nossa, a expressão de José Luiz Braga (1997,
p. 323), Queria assim falar sobre o discurso do jornal - e contar a sua história. Bem, mas o que
significa uma citação, assim, tão compendiada?
O desdobramento à questão recorre às palavras chaves da mensagem, anteriormente, anunciada:
discurso e história, no objeto, jornal. Se, por princípio, fica posto e estabelecido, a dupla chama;
mais adiante (esperamos) escrever porquê, tal significado em escolha, para o tom científico do
nosso trabalho universitário, foge à única opção de uma análise, estritamente formal2, da e na
leitura do jornal.
Porquanto, o nosso apoio metodológico, ponto de partida à pesquisa, ampara-se em autores,
cujas visões científicas, da descoberta ao reconhecimento, pesquisam a imprensa escrita, íntima e
(cúmplice?), ao campo das representações sociais.
A intuição nesse estudo, Lina no jornal, move-nos a arriscar na busca metodológica, entre outras
questões, à celebração da união das duas abordagens - as formais e as sociológicas – à análise
dos textos periodísticos.
Pois, vejamos os nossos primeiros passos... A "descoberta" de Crônicas de arte, de história, de
costume, de cultura da vida, como folha autoral bobardiana, e como mergulho investigativo e
1
Lina Bo Bardi (1914-1992), graduada em Arquitetura, pela Universidade de Roma/Itália. Veio para o com seu marido Pietro Maria
Bardi (1946), a convite de Assis Chateaubriand, para criar O Museu de São Paulo. Naturalizou-se brasileira em 1951. Desenhou
móveis, lecionou na FAUUSP (1955-1959), e dirigiu a revista Habitar (1950-1955). Projetou e construiu: o Museu de Arte de São Paulo
- MASP (1957-1968). Em Salvador, restaurou o Solar do Unhão, transformando-o em Museu de Arte Popular (1959-1964). Dirigiu os
projetos de recuperação do Centro Histórico da Bahia (1986-1989), realizando a Casa Benin, Teatro Gregório de Mattos, Ladeira da
Misericórdia e Casa do Olodum. Em São Paulo, restaurou, também, uma fábrica do início do século para abrigar o centro cultural e de
fazer - SESC Fábrica da Pompéia (1977-1986), e restaurou o Palácio das Indústrias para o Conjunto/Sede da Nova Prefeitura de São
Paulo (1990-1992). (Dados curriculares extraídos da 'orelha' do livro Tempos de grossura: o design no impasse. Lina BO BARDI,
1994).
2
Segundo José Luiz BRAGA, Questões metodológicas na leitura de um jornal, p. 321: a opção entre uma análise formal,
geralmente de inspiração estruturalista - concentrando a observação no texto em si; e uma análise sociológica, geralmente de
inspiração marxista - concentrando a observação no conteúdo e nas suas relações com o social.
científico a ela, ocorre após termos pesquisado o período mais longo, em que Lina vive e trabalha
na capital baiana, entre 1958 e 19643.
Durante essa temporada, a arquiteta participa da criação de um movimento cultural vinculado à
realidade popular da Bahia e engajado na vida contemporânea (Risério apud. Wolf, 1986, p. 19).
E, o objetivo principal do movimento baiano, é fazer da Bahia, um centro nacional de cultura. (Lina
Bo Bardi apud. Marcelo Carvalho Ferraz, 1993, p. 161). Daí, para a criação desse centro, segundo
a arquiteta, o vento a favor, está no tripé: uma Universidade em expansão..., uma classe
estudantil, mas, sobretudo o caráter profundamente popular da Bahia e de todo o Nordeste (apud.
Marcelo Carvalho Ferraz, 1993, p. 161).
Resumidamente, isso é (quase) tudo, enquanto ilustração de nossa pesquisa maior, sobre LinaBahia-1958/1964. Mas, de volta ao começo ao assunto jornalístico.
Só depois do referido estudo, pesquisado e executado, houve de nossa parte, a abertura do
caminho interessado à passagem documental da arquiteta jornalista, pela grande imprensa da
Bahia, nos três penúltimos meses de 1958. E, a respectiva abertura liberou-nos a investigar que:
A referida página contém a base e o movimento conceitual – pensado, imaginado, representado
e trabalhado pela arquiteta, Lina Bo Bardi, sobre a Bahia, antes do projeto cultural, anteriormente,
citado. Ela pontua o conceito de Salvador ser a única cidade do Brasil com tradição cultural4. Esse
conceito dimensiona-se pelo caráter profundamente popular da Bahia e do Nordeste.
Lendo a folha, Crônicas (...), principalmente, na seção, Ôlho sôbre a Bahia (sic.), a editora
chama à atenção do leitor à reflexão sobre a história, os costumes, a cultura da vida baiana;
as faces e interfaces da história da cidade da Bahia: entre as mais antigas às mais
contemporâneas à publicação do periódico no inicio dos anos 1950.
O conteúdo do item já bastaria uma atenção científica a ser escrita. Há que destacar um porém,
durante a elaboração e a execução da pesquisa, enfrentamos "tropeços" no campo investigativo.
Alguns exemplos... não foi possível ausentar e deixar pra lá, nesse nosso estudo, certas questões
pertinentes ao objeto-tema: O Jornal: o nome, os títulos, os escritores dessa folha impressa, e
como ela se estrutura enquanto área espacial. Outra busca de nossa parte: o que chamamos de
O texto jornalístico? E, por fim, O Contexto, corno principal aliado. O que deve ser relevado,
corno pontos vitais e ressonantes à folha cultural de Lina?
Sem sofreguidão, elaboramos o estudo científico sobre o jornalismo baiano, de Lina. Mas, de
nossa parte, a partir de tais dados novos, a serem introduzidos ao interior do texto, resultado da
pesquisa, estreitamos os nossos olhos aos apontamentos acima apresentados. Fundamentandoos e trabalhando-os como urna "cara" necessária para a leitura discursiva de urna folha de jornal.
O terna é mais vasto do que pensávamos. Por isso, damos por completo, urna parte da pesquisa
jornalística sobre Lina na Bahia, nos anos 1950. Leitura, mesmo, de seu discurso impresso:
tomando as palavras e as imagens nas crônicas e nas notícias publicadas das páginas, Crônicas
de arte, de história, de costume, de cultura da vida, do jornal, Diário de Notícias, continuam
fervendo em óleo de dendê, feito um acarajé, em nosso pensamento em brasa.
3
Antônio RlSÉRIO. Avant-garde na Bania, p. 79: após a volta de Lina para São Paulo. 1958, logo a seguir, deu de volta em terras
baianas por conta de um convite do governador Juracy Magalhães, que o convocou para a implantação do Museu de Arte Moderna.
4
Ver Maria do Socorro SILVA CARVALHO. Imagens de um tempo em movimento - cinema e cultura na Bahia nos anos JK (19561961). p. 67.
um OLHO:
questões estruturais (+) questões contextuais
A página, Crônicas de arte, de história, de costume, de cultura da vida, em seus nove
números publicados5, no período de setembro a novembro de 1958, sempre aos domingos, no
interior do Diário de Notícias, destaca-se, pelas diferenças impressas e expressas, do periódico
remanescente.
Encontramo-na, sempre ocupando a primeira página de um determinado caderno interno, cujas
folhas seguintes à Crônicas de arte, de história, de costume, de cultura da vida, apresentam
também uma outra qualidade gráfica correspondente ao jornal, como um todo6. Vez ou outra, em
um ou outro número do total dos nove publicados, encontramos artigos a serem continuados, em
outras páginas, não necessariamente no próprio caderno em que a página cultural de Lina salta
como uma composição geometrizada impressa.
Valemo-nos do lado formalista dessa expressão. A diagramação da folha, Crônicas de arte, de
história, de costume, de cultura da vida, paginada por Lina, (da primeira à nona e última,
publicadas), formaliza-se, no ultra-conhecido campo retangular de um periódico, como uma
construção estética impressa. E de referências construtivas modernas7.
A composição estrutural da página apresenta-se, claramente, com um diagrama de oito colunas
espaçadas na vertical. Por sua vez, a diagramadora, a partir dessa delineação geral da folha, abre
algumas janelas para entrar imagens: fundos coloridos para alguns textos, fotografias antigas e
contemporâneas, e desenhos8. Com as janelas abertas para as imagens que nunca estão soltas,
e sim, amarradas a seus artigos correspondentes, criam-se novos campos compositivos de
5
As datas das publicações das páginas, Crônicas de arte, de história, de costume, de cultura da vida. correspondentes, à primeira
e à última delas, são: 7 de setembro e 2 de novembro de 1958. lninterruptamente.
6 Segundo Maria do Socorro SlLVA CARVALHO. Imagens de um tempo em movimento - cinema e cultura na Bahia nos anos JK
(J956-1961), p. 69: A busca do moderno era, naquele momento, a tônica da imprensa baiana, acompanhando o fenômeno nacional de
renovação. (...), os Diários Associados também inauguraram à época sua nova fase, colocando a Bahia na etapa do mais moderno
jornalismo. Assim, reformaram suas oficinas - adquiriram uma rotativa que era a última palavra do gênero, além de outros
equipamentos que possibilitariam 'uma bela feição e uma nítida impressão, em cores, os seus dois jornais diários' - para que
ganhassem um aspecto gráfico que nada ficasse a dever aos grandes jornais do Sul do país e, (...). Complementando a citação,
relevamos: a bela feição e nítida impressão, em cores, do jornal, Diário de Notícias, que pesquisamos, pelo menos, no período,
referente à publicação da página, Crônicas (... ), observamos: a cor amarelo, na folha bobardiana, e a cor alaranjado, para outras
páginas do periódico. Quanto ao jornal, Estado da Bahia, também pertencente aos Diários Associados, esse, não consultamos.
7
A paginação gráfica da Crônicas (...), criada por Lina, pode receber uma leitura estética, cuja abordagem de referências construtivas
modernas enfoca características plásticas, herdeiras das vanguardas históricas européias do pós- primeira guerra até às artes visuais
dos anos cinqüenta. Todos conceituados como artes construtivas e industriais. Logicamente, cabendo assim, as artes gráficas e a
imprensa escrita. A seguir, algumas das etapas de arte moderna que, pelos seus conceitos e atos, plástica e racionalmente, interferem
no campo espacial da folha impressa. Por exemplo, na Crônicas de arte, de história, de costume, de cultura da vida, número um.
publicada em 7 de setembro de 1958, Lina tez publicar três amostras das vanguardas artísticas: urna Composição, do artista
holandês, Theo Van Doesburg, de 1918; seguida ao poema concreto de Décio Pignatari, beba coca cola de 1957; e, por fim, o poema
futurista italiano, Parole in Libertá, da revista Lacerba,1914. Uma outra leitura referenciada à modernidade lida na paginação da folha
cultural de Lina, aborda a imprensa contemporânea ao nosso estudo: a reforma, gráfica e textual, do Jornal do Brasil, no Rio de
Janeiro, em 1957 - um marco que, em momento futuro, aqui, enfocaremos.
8
No catálogo Lina Bo Bardi. organizado por Marcelo CARVALHO FERRAZ. encontramos páginas ilustradas do currículo de Lina, como
ilustradora e diagramadora de diversas publicações italianas e brasileiras. Todas anteriores à vinda da arquiteta à Bahia, em 1958.
Nesses exemplares, reproduzindo capas e páginas internas das revistas, percebemos o cuidado estético para com as mesmas. Ver pp.
26-31 e Habitat, pp. 64-67. Quanto à primeira página de Crônicas (...), publicada, em setembro de 1958, a sua diagrarnação tem
muito a ver com as chamadas características gráficas modernas do jornalismo brasileiro, implantadas pela reforma ocorrida no Jornal
da Brasil, entre 57 e 60, por Odylio Costa e Alberto Dines, redimensionando o estilo e a organização do jornal, simplificando a
paginação, e tornando-o mais limpo de ler, bem como, um maior destaque à fotografia, aos títulos curtos e concisos, num projeto que
conseguiu conjugar a parte gráfica com o texto do jornal. Suênio CAMPOS DE LUCENA. Imprecisão e técnica na Linguagem
jornalística - uma análise do Jornal da Bahia (1958-60), p. 57. Se muito vale a atenção comparativa entre as próprias obras
bobardianas, isto é, as diagramações das referidas revistas com a nossa folha cultural: a comparação dessa com o ambiente gráfico
modernizador do Jornal do Brasil, é relativa. Pois não engloba, por exemplo, a análise jornalística entre as linguagens desses jornais.
Da mesma forma. não apontamos que Crônicas (...) tenha qualquer cópia do jornal carioca; porque, simplicidade. racionalidade
destaque às imagens fotográficas são referências da diagramação de nossa arquiteta – jornalista, desde outras passagens editoriais,
anteriores à reforma do JB.
enquadramento, permitindo assim, na leitura final da página, uma estética distinta do jornalismo
trivial9.
Na folha Crônicas (...), verificamos que a sua estrutura jornalística apresenta uma dupla de
estabilidades10, tanto pela permanência de seções temáticas, como, pela equipe fixa que
responde por matérias e por fotografias publicadas. Esporadicamente, há a presença de
colaboradores.
Porquanto, listamos, do número um à penúltima das páginas publicadas, a oitava11, a
permanência das seguintes seções: Ôlho sôbre a Bahia (sic.), Documentos, Antologia, e
sempre, um espaço reservado para uma crônica em desenho, de Lina.
Quanto à participação dos responsáveis pelos escritos e pelas imagens na folha cultural em
destaque, em primeiro lugar, encontramos os nomes próprios de estrangeiros extremamente
atuantes na vida cultural de Salvador, em 1958; e também participantes desse projeto junto à
nossa arquiteta jornalista. São eles: o músico alemão, Hans Joachim Koellreuter12, diretor dos
Seminários de Música da Universidade da Bahia, gestão Reitor Edgard Santos e o
fotoetnôgrafo francês, Pierre Verger13. Enquanto Koellreuter, exatamente, nos nove números páginas, escreve sobre música contemporânea, folclore, canto orfeônico, educação musical etc.,
Verger como autor de fotografias significativas retratando a Bahia, daqueles anos quarenta e
cinqüenta, empresta os seus documentos fotográficos para, mais do que ilustrar, comprometer-se
aos artigos escritos por Lina.
Porém, continuemos com a lista de fazedores de notícias e de imagens contribuintes às Crônicas
(...). Há três nomes destacáveis, o do artista plástico, Mário Cravo Júnior14, assinando artigos
sobre arte moderna - em alguns deles, polemizando também -; junto dos nomes dos, então,
estudantes de Arquitetura da Universidade da Bahia, alunos de Lina no respectivo curso.
Sendo os mesmos, os jovens fotógrafos, Sílvio Robatto e Ennes S. Mello15, responsáveis pelas
fotografias, em sua maioria, de temática urbana, estampadas na coluna editorial, Ôlho sôbre a
Bahia (sic.), escrita, porém, nunca assinada, em nenhuma das edições da página cultural, pela
9
Insistimos no conteúdo estético diferençável, entre a página diagrarnada por Lina, no Diário de Notícias, com o outro tanto de
páginas do mesmo periódico não diagramadas por ela.
10
A adoção do termo "estabilidade", aqui, enfocado, é extraído dc Leny WERNECK. Os suplementos literários nos jornais
parisienses: uma análise de discurso. pp. 147-147.
11
Quanto à derradeira página publicada sobre assuntos culturais, no Diário de Notícias, em 2 de novembro de 1958, há estritamente
quatro matérias: o editorial, Ôlho sôbre a Bahia (sic.); o Explicando - artigo informativo e agradecido ao papel contribuidor de Lina
para a imprensa baiana, por criar a Crônicas (...); e mais duas matérias dos colaboradores mais assíduos à folha, uma de H. J.
Koellreuter (música) e outra de Mário Cravo Júnior (artes plásticas).
12
Maria do Socorro SILVA CARVALHO, op. cit., p. 82: HansJoachim Koeflreuter funda, a partir de 1955, com o apoio de Sebastian
Benda e Ernst Widmer, os Seminários Livres de Música. O propósito pedagógico dos Seminários segundo Koellreuter defendia uma
escola viva que apresentasse sempre problemas novos, cujas soluções fossem buscadas por todos - professores e alunos - que dela
participassem. Por isso, da dúvida - a procura - que investiga - e pesquisa. Sobre Koellreuter (e Lina) ver a importante pesquisa
publicada de Antonio RlSÉRlO. Avant-garde na Bahia, pp. 89-111.
13
Fotoetnografo é uma palavra combinada entre fotógrafo e etnógrafo, retirada da nota prévia do livro de Antonio RlSÉRIO,op. cit., s/p,
e "inventada" por Marcelo Carvalho Ferraz, exatamente para denominar, o etnógrafo - babalaô franco - baiano Pierre Fatumbi Verger,
Oju Obá, ministro de Xangô no candomblé da Bahia, p. 89. Sobre Verger, há muito que consultar, porém, bibliograficamente, adotamos
o próprio e a própria Lina escrevendo, como, quando e com quem, ela conheceu-o, na Bahia, em 1958: doze anos após a chegada do
fotoetnografo à Salvador/Ba. Ver Pierre VERGER. Retratos da Bahia, s/p e Marcelo CARVALHO FERRAZ (org.), op. cit., p. 300.
14
Antonio RlSÉRlO. op. cit., em duas passagens literárias sobre "quem é quem" e, acima de tudo quem pertence à modernidade
estética - intelectual da Bahia, nos anos cinqüenta, aponta Mário Cravo Júnior, como um dos representantes da nova geração de
pintores e escultores, p. 103, e (que praticamente levou para a Bahia a arte moderna, com suas esculturas e seu trabalho em materiais
como ferro, ... ), pp. 23-24.
15
Sílvio Robatto, além da fotografia e da formação em Arquitetura, na Universidade da Bahia; o jovem realiza, no período em estudo,
o exercício de cineasta de curta-metragem, E outra informação destacável, seu pai é Alexandre Robatto Filho, considerado o pioneiro
do cinema - documentário baiano. Ver Maria do Socorro SILVA CARVALHO, op. cit., pp. 138 e 157. Quanto à Ennes Mello, o outro
jovem fotógrafo e amigo de Robatto, ambos colaboradores assíduos na página de cultura de Lina, o que podemos informar é pouco:
paulistano que vem, nos anos cinqüenta, estudar na Universidade pública baiana e, após sua formatura, volta para São Paulo.
arquiteta - jornalista16. Dos colaboradores eventuais da folha periódica, encontramos,
significativamente, os nomes teatrais de Martim Gonçalves e Gianii Ratto17, escrevendo sobre
esse universo em desfile.
Assim, após a exposição da "equipe redatora" mais atuante, responsável por textos e imagens
publicadas na, Crônicas de arte, de história, de costume, de cultura da vida, sob a direção da
arquiteta e jornalista, Lina Bo Bardi, constatamos entre aqueles nomes citados, não haver
profissionais graduados em Jornalismo, diploma esse que nem mesmo Lina obtivera.
A pesquisa sobre uma página cultural de um periódico, criada e participada por jornalistas, "sem a
formação de..."; e, página essa, de uma fase histórica, considerada, pioneira do jornalismo
brasileiro, leva-nos a buscar leituras sobre o assunto. Assim, em Campos de Lucena (1996, p. 27),
há: O ensino do jornalismo em nível universitário começou em 1948, (...). Parte do romantismo
que via o exercício jornalístico como oficio que perdurava desde o início do século, dá espaço a
uma prática profissional que tem a objetividade como uma condição a ser alcançada. Quanto à
Bahia, anotamos a significativa passagem: a Faculdade de Filosofia da Universidade da Bahia
aprova, em abril de 1949, a criação do curso de Jornalismo. O primeiro curso é instalado no ano
seguinte, (...). Os primeiros formados em jornalismo colam grau em 52. No período 53/61, o curso
foi desativado. Daí, entende-se as migrações, espontâneas e apaixonadas, dos jovens e
estudantes universitários de outros cursos, em trabalhar na redação de um jornal baiano, no
período que estamos abordando.
Para o nosso estudo, o que nos cabe complementar em tal passagem, é expressá-Ia, relativandoa. Daí é necessário ampliar a nossa busca de pesquisa, em um giro no contexto histórico
brasileiro daqueles anos.
Leandro Konder (1997, p. 355) escrevendo, ensaistamente, sobre a história dos intelectuais nos
anos cinqüenta, vê, principalmente, no fim dessa década, um 'ambiente cultural' mostrando uma
fisionomia mais animadora do que no começo18. É justificável. E se nos apropriarmos de um
quadro cronológico da segunda metade da década, encontraremos entre vários novos projetos de
ações culturais, o processo de modernização do jornalismo brasileiro19.
16
A seção, Ôlho sôbre a Bahia (sic), caracterizada como uma matéria editorial da página de cultura do Diário de Notícias,
naturalmente, Lina, corno editora responsável do periódico, não as assina. Há muitos artigos, dentre outros, não assinados, e com
fortes probabilidades de serem de autoria de Lina. As exceções vão para o artigo Exposição Didática da Escola de Teatro, publicado
na folha de número três, em 21 de setembro de 1958, pois, ao pé do artigo há as iniciais - LB. (Lina Bo? Ou Lina Bardi?); bem como,
em cada um dos desenhos publicados, nos oito dos nove números, encontramos, sempre, as iniciais - B.B. (Bo Bardi). Pesquisando
em Maria de Fátima de MELLO BARRETO CAMPELLO, Lina Bo Bardi: as moradas da alma, p. 33, anotamos: a particularidade da
arquiteta, enquanto jornalista, não creditar os seus textos quando publicados. E a pesquisadora nos dá exemplos: na revista Habitat,
dirigida por Lina, desde a sua criação em dezembro de 1950, em São Paulo, nos primeiros quinze números, há textos não assinados
sobre arquitetura popular. Conforme depoimento de Flávio Motta à MELLO BARRETO CAMPELLO, esse, como colaborador da revista
no período, afirmou ser autora dos textos, Lina. Outra forma identificável dos textos bobardianos, segundo MELLO BARRETO
CAMPELLO, mora na peculariedade da escrita da arquiteta, que contém certos italianismos. Marcelo SUZUKl prefaciando Tempos de
grossura: o design no impasse, p. 9.
17
Maria do Socorro SILVA CARVALHO. op. cit., pp. 86-89: O nome do professor pernambucano, Eros Martim Gonçalves, que chega a
Salvador, em 1955, para estruturar os Cursos de Interpretação e Direção da Escola de Teatro da Universidade da Bahia, é de uma
presença extremamente expressiva e participante com o seu trabalho teatral, tanto para a magnífica Universidade da Bahia nos anos
dourados baianos; como para a futura parceria com Lina, em tal ambiente cultural. Aos fatos: dentre as muitas atividades
desenvolvidas por Lina, na capital baiana, destacam-se: a colaboração em diversas montagens para teatro, ao lado de Martim
Gonçalves. Assim, em 1960, ela faz a cenografia para a Ópera dos três tostões, de Bertolt Brecht; em 1961, a cenografia e o figurino
para Calígula, de Albert Camus. Dois anos antes, em 1959, juntos, o professor - diretor da Escola de Teatro e a arquiteta unem-se
para organizar a exposição, Bahia no lbirapuera, na V Bienal de São Paulo. Ao nome de Gianni Ratto, aqui enfocado porque
colaborador na folha cultural, objeto de nosso estudo, anotamos: integrante de um quadro significativo de jovens artistas na Bahia, na
área teatral, e também se integra ao corpo docente da Escola de Teatro nesse período. (SILVA CARVALHO. op. cit. p. 86).
18
Leandro KONDER, História dos intelectuais nos anos cinqüenta, p. 355: Num exame preliminar, sem necessidade de maiores
aprofundamentos, pode-se constatar, com facilidade, que a fisionomia do começo da década era uma e a do final já era outra, bastante
diferente. Observando o que se passava no início da segunda metade do século a partir do ponto de vista que nos é proporcionado
pelas condições históricas atuais, neste fim do século XX, não podemos deixar de nos impressionar com as transformações aceleradas
e imprevistas que se desencadearam naquele momento.
19
Para o tema, novos projetos de ações culturais no Brasil, consultar: Aracy A. AMARAL. Arte para que?: a preocupação social na
arte brasileira, 1930-1970, pp. 410-425. Leandro KONDER, op. cit., pp. 356-358, e Maria do Socorro SlLVA CARVALHO, op. cit., 16103. E para o processo de modernização do jornalismo brasileiro vamos por partes. Enquanto SlLVA CARVALHO, op. cit., p. 30,
Por isso, do período abordado, especificamente, em 1958, na Bahia, Campos de Lucena (1996)
dissertando sobre as maneiras, no local, de se fazer jornalismo impresso escreve os amantes das
letras, de literatura e do direito irão exercitar um discurso... (pp. 62-63)20 jornalístico que oscila
entre a informação e a opinião.
A década de 90 é, fortemente responsável, por pesquisar (para recuperar) na documentação
histórica da cidade de Salvador, o mapa de modernizações acontecidas, principalmente, dos anos
1950 em diante. Assim, há muitas direções para caracterizar na Bahia, as expressivas mudanças
políticas, sociais, e particularmente, culturais em nome do brevíssimo século XX (Miguez, 1999,
s/p). A temática da inquietação da juventude baiana participativa na vida cultural da cidade, no
referido período, é exemplar, como um dos enquadramentos propostos. Pois vejamos, se a
Avant-garde na Bahia (Risério, 1995), nos primórdios da Universidade e a Cultura (Rubim,
1996) na Era "Edgard Santos", concentra-se nas personalidades, particularmente influentes, sobre
o meio intelectual baiano, do músico alemão, Hans Joachim Koellreuter, e na arquiteta italiana,
Lina Bo Bardi. Dessa particularidade, às iniciativas universitárias - modernas - implantadas e
conhecidas como as 'pupilas do senhor reitor', como eram conhecidas as escolas de Música, de
Teatro e de Dança. Antonio Albino CARVALHO RUBIM CANELLAS. Os primórdios da
Universidade e a Cultura na Bahia, p. 22, a Faculdade de Direito não fica atrás das
destacadas. A atitude e o espírito, inquietadores, dos jovens estudantes do curso de Direito, são
participantes, em duas publicações referenciais, em importância, para o meio intelectual baiano,
dos anos 1950. São elas, a revista de cultura, Ângulos, criada no início da década pelo Centro
Acadêmico Ruy Barbosa (CARB), protagonista de muitas lutas políticas e gerador de líderes na
Bahia. Maria Conceição SILVA CARVALHO. op. cit., p. 79; e a outra publicação, cujos editores e
colaboradores mantém laços muito estreitos, com a Ângulos, é a revista literária, de nome muito
poético e bonito, Mapa, cujo primeiro número é de 1957. Enfim, cabe destacar o surgimento
oportuno, do Jornal da Bahia, em 1958, por parte da juventude ativista, tanto como fora da
Universidade, \ simpatizantes e com integrantes do Partido Comunista Brasileiro21.
Então, da recepção oferecida aos perfis humanos enfocados nas redações baianas, e dentro do
fértil e pulsante ambiente cultural de Salvador, fertiliza-se a publicação de revistas literárias, novos
jornais engajados, e claro, a página de Lina no Diário de Notícias, e mais os “jovens animados”
(Ribeiro, 1994, p. 72)22, apontando e aprontando, cada vez mais, para a chegada da modernidade
na cidade da Bahia.
expõe, em mão única, os ventos da modernização do Brasil dos anos 1950 chegando também aos jornais. Daí, a atividade jornalística
ganha tratamento empresarial, pelas reformas gráficas e novas técnicas de apresentação de noticias; o pesquisador CAMPOS DE
LUCENA, op. cit., p. 28, vê o tratamento inovador, com o moderno e o novo, compromissado com o propalado estilo de vida norte
americano. E assim, o dissertador escreve, em mão dupla, a época realmente é marcada pela ambigüidade: assiste-se à renovação do
maquinário, de uma série de costumes antigos, à abertura de faculdades de jornalismo, à adoção de técnicas, como Lead e copydesk, da lauda padronizada, enquanto se vê a permanência praticamente inalterada das equipes que fazem jornalismo, (...) p. 65.
20
Interrompemos o texto de CAMPOS DE LUCENA, op. cit., p. 63, porque se continuássemos, leríamos sobre adjetivos destinados aos
discursos jornalísticos elaborados por literatos e estudantes de direito: discurso piegas, pseudo-Iiterário, jornalismo como gênero
literário. lnterrompemos porque, se a tradição era que os estudantes de Direito (muitos não chegavam a concluir o curso) ingressassem
nos jornais levados pela necessidade financeira ou pela paixão literária (p. 70). E se ser jornalista, nesse período, é ser: literato do
jornalismo; participante cultural político da cidade; ter certo status social e forma de publicar trabalhos, dentre outras. A dissertação de
CAMPOS DE LUCENA sobre a análise do discurso do Jornal da Bahia, entre 1958-1960, contextualiza sobre a equipe de jovens, com
tal perfil, formadora do referido jornal. Porém, a dessa juventude é elaborar um jornal distante dos rígidos padrões dos concorrentes (p.
72), e ser iornalista "com algo" diferente. como poderemos ver em seguida.
21
Segundo Suênio CAMPOS DE LUCENA, op. cit., p. 73: A redação do J.B. foi composta tendo a intenção de atrelar pessoas ligadas à
cultura em geral, que estivessem abertas às mudanças a serem efetivadas.
22
Lina ao fechar o seu testemunho, a sua experiência vivencial - profissional, na Bahia, entre 1958-1964. No documento Cinco anos
entre os 'brancos', Marcelo CARVALHO FERRAZ (org.). op. cit., p. 161, conclui, analiticamente, que dentre os esforços destacados e
participantes do seu projeto cultural, pensar, em um possível desenvolvimento da Bahia como centro nacional de cultura, nesse
período, há o apoio da participação de uma classe estudantil tensa, aliada à efetivação desse singular movimento. A seguir, Iistamos
mais alguns nomes de jovens, aprontadores e animados, pertencentes, de maneira geral, ao círculo cultural baiano dos anos 1950:
Glauber Rocha (estudante, jornalista e cineasta jovem), Noênio Spinola (universitário e líder estudantil da Faculdade de Direito da
Universidade da Bahia), Geraldo Sarno (universitário e jornalista), Vilvaldo da Costa Lima (antropólogo), Nilton Sobral (estudante
secundarista); Fernando Peres, Calasans Neto (artista plástico), Paulo Gil Soares, Florisvaldo Mattos, Sante Scaldaferri (artista
plástico), João Carlos Teixeira Gomes (escritor e jornalista), Lina Gadelba, Anecy Rocha e João Ubaldo Ribeiro, entre outros.
outro OLHO:
questões metodológicas (e +) questões contextuais
A faixa larga, de fora a fora, na parte superior da página do jornal, impressa em cor amarelo,
anuncia os dados apresentadores da folha cultural - editada, diagramada, dirigi da e escrita por
Lina Bo Bardi e colaboradores - no Diário de Notícias.
O nome, bastante longo, Crônicas de arte, de história, de costume, de cultura da vida (sic.),
impresso na faixa colorida, merece, aqui, uma atenção descritiva. A primeira palavra, Cronicas
(sic.)23, tem um peso, graficamente, particularizado, pois sua impressão em caixas, alta e baixa,
com as letras cheias e em negrito, mantém uma distância, por respiração à palavra ou por
simplificação ao nome longo, restante, do cabeçalho: (...) de arte, de história, de costume, de
cultura da vida24. Que, por sua vez, está impresso em caixa baixa, em letras miúdas, e em uma
linha horizontal contínua e corrida.
Após o titulo da página, ainda, na faixa, está estampada, de cima para baixo, o rol de áreas
artísticas escolhidas pela editora a serem problematizadas, nos assuntos de crônicas que o
cabeçalho enverga. São elas: Arquitetura, Pintura, Escultura, Música e Artes Visuais25. E,
para complementar o letreiro principal da folha jornalística, lê-se: a numeração, em ordem
crescente, de cada domingo publicado, impresso em caixa alta e cheia; sobre duas linhas escritas,
em um campo gráfico, corrido e em caixa baixa. O conteúdo escrito traz o nome do jornal, Diário
de Notícias; junto a uma pitoresca.e ambígua (por isso, também.L humorística) expressão:
Cidade do Salvador; e por fim, a data correspondente a ~a edição dominical.
23
Nos dois primeiros números da página de Lina, publicados em, 7 e 14 de setembro de 1958, a palavra, Crônicas, no cabeçalho
principal, está impresso sem o acento circunflexo. Encontramos, também, o título, Cronicas (sic.), em páginas internas da revista
Habitat, criada por Lina e Pietro Maria Bardi, em dezembro de 1950, em São Paulo. Em tal seção, o casal Bardi, responsável pela
escritura das páginas, utilizando o pseudônimo, Alencastro, representado pelo desenho de dois olhos, (ou serão óculos, ou uma
máscara?), assinam diversas matérias curtas e informativas; porém, em tom critico, sobre arquitetura, artes visuais e urbanismo. Na
Habitat, outra seção destacável, pela nomenclatura em questão, é a Cronicas Sociais (sic.). Segundo, Maria de Fátima de MELLO
BARRETO CAMPELLO, Lina Bo Bardi: as moradas da alma. p. 54. Porquanto, a cronista social, a partir dos próprios titulas dos
pequenos ensaios, sugerem o referencial popular acolhido pela Arquiteta para tratar o tema da habitação dos tempos modernos no
Brasil: Amazônas (sic.) - o povo arquiteto, Porque o povo é arquiteto?, Casa de 7 mil cruzeiros, entre outros. É importante
registrar certas passagens de interesse da nossa arquiteta e jornalista, pela cultura brasileira. Por exemplo. a iniciação. aqui,
registrada, pelo referencial popular. Porque, para o estudo, quando se assunta, Lina e a Bahia, há muito o que pensar e escrever
sobre tais referências. Antes de Lina, no Brasil, o desejo e a inspiração populares produziam coisas, não arte. Maria da Conceição
ALVES DE GUlMARAENS, Dois olhares sobre o Patrimônio Cultural Brasil: Lina e Lygia, p. 64. Daí, é preciso saber sobre e como,
Lina, se introduz ao nosso universo de cultura popular. Então, torna-se, muito importante, consultar Maria de Fátima de MELLO
BARRETO CAMPELLO, op. cit., pp. 53-65, sobre o conteúdo jornalístico de Lina, versando assuntos do patrimônio popular. antes de
aportar na Bahia. em 1958.
24
Primeiramente, contemos, urna passagem do currículo editorial de Lina. A publicação italiana, intitulada A. é idealizada por Lina Bo
Bardi, Carlo Pagani e RaJfaelo Carríeri, em 1946, logo após a Segunda Guerra Mundial. Tem o foco direcionado a ser uma revista de
arquitetura, impressa em papel jornal, voltada ao grande público, e não só a arquitetos. Dentre os propósitos da revista, seus
idealizadores querem levar o problema da arquitetura ao viver de cada um, de modo que cada um pudesse chegar a se dar conta da
casa na qual deveria viver, da fábrica onde deveria trabalhar, das ruas onde deveria caminhar. Lina BO BARDI apud. Marcelo
CARVALHO FERRAZ, op. cit., p.11. A partir da edição número sete. o seu subtítulo – atualizará architettura, abitazione e arte transforma-se em, cultura della vita, Ponto de chegada, para um desdobramento. Olhando o nome completo da página bobardiana do
jornal, Diário de Notícias, vemos/lemos, ao seu final, a expressão cultura da vida. Se, para a respectiva expressão da revista italiana
pós-guerra, cabe as palavras autorais: Devemos recomeçar do começo, da letra A, para organizar uma vida feliz para todos. Nós nos
propomos criar em cada homem e em cada mulher a consciência daquilo que é a casa, a cidade (...). Lina BO BARDI apud. Marcelo
CARVALHO FERRAZ, op. cit., p. 30. A cultura da vida, no periódico baiano, manifesta-se, também, pela construção da consciência
social, a partir do legado histórico: Precisamos impedir que os valores da cultura sejam destruídos pela indiferença à Humanidade, à
História, à Tradição (...). A base para isso está no dever fundamental dos técnicos, dos urbanistas, dos arquitetos, estudar e
compreender, no seu profundo sentido espiritual, aqui o que se poderia chamar a alma de uma cidade (...). A palavra-chave em uma
nota só é a Casa, mas é preciso salvaguardar o patrimônio espiritual do povo (...) Ôlho sôbre a Babia (sic.). DIÁRIO DE NOTÍCIAS.
Salvador, 7 de setembro de 1958. Cultura da vida, uma expressão - cabeçalho, em duas publicações de dois países. Para o periódico
brasileiro, o tom pedagógico da editora aponta aos profissionais de Arquitetura, a colaboração para um trabalho com compromisso
social e cultural sobre a cidade da Bahia.
25
Quanto aos assuntos artísticos, listados no cabeçalho da folha, têm-se, dentre outras, Pintura, Escultura e Artes Visuais; o que. a
princípio, pode parecer redundante, leva-nos a imaginar para a área Artes Visuais, outras formas de artes plásticas, como, a
Fotografia, a Xilogravura, e o próprio Desenho .
Pronto! Esse anúncio descrito, do cabeçalho da página bobardiana, é o nosso ponto de partida
para a organização de questões metodológicas e contextuais, para análise e compreensão do
discurso jornalístico de Lina, em uma de suas seções da folha em pesquisa. O recorte escolhido é
o Ôlho sôbre a Bahia (sic.)26. E como cada texto dessa seção editorial, é construído pela editora,
à partir de, uma imagem fotográfica do território urbano baiano27, escolhida a olho pela jornalista e
arquiteta, como tática e missão de veicular, enquanto texto visual, o discurso escrito. Então,
adotamos o fotoperiodismo enquanto elemento discursivo28, nessa nossa investigação e estudo .
Mas, exploremos um pouco mais, onde queremos chegar...
José Luiz 8raga (1997, p. 330) escreve, se tomarmos o discurso jornalístico como nível principal
de uma pesquisa, em torno deste nível devemos considerar outros que lhe possam ser referidos.
Do referimento já mencionado ao texto e às fotos, como partes, dentre outros, no discurso; quanto
aos desenhos de Lina estampados em todas as edições da página, Crônicas (...), - com exceção
do número 9 -, eles não podem ficar externos ao registro da leitura discursiva. Visto que, a
orientação autoral diz que sim29.
Abrindo um parêntese para uma particularidade, a de quem está investigando o assunto
bobardiano, enquanto momento de intuição do pesquisador, descobrimos que os desenhos de
Lina na folha cultural, são paisagens urbanas e humanas, cuja interpretação, a mais simples (e
intuitiva) diz, tanto quanto, as tais fotografias expostas nas matérias jornalísticas. Pelo olhar e pelo
traço da arquiteta, há a apresentação e a representação de aspectos do cotidiano social baiano30.
Fechando o pequeno parêntese, é dele, e principalmente de seu final que continuamos a nossa
trajetória investigável. Porque, se - da natureza da intuição - que abre caminho para toda
pesquisa. (Braga, 1997, p. 332), a partir de aspectos citados, tais como, a representação do
cotidiano social o que, também, queremos abordar na análise do discurso jornalístico, é apreender
uma história.
Mas, história de que e de quem? História da folha cultural bobardiana? História da cidade e
das pessoas que leram (ou não) a folha de Lina? Enfim, quais são as fronteiras de
entendimento sobre a história a ser apreendida?
Vamos por passos, e possivelmente, tropeços, na caminhada textual...
De alguns apoios teóricos recorridos lançamos -
26
Vale destacar os deslizes do gráfico, (ou da diagramadora italiana?), na impressão do título do editorial, Olho sobre a Bahia. Em
alguns números, a palavra Olho tem acento circunflexo, e em duas das nove páginas respectivamente, na primeira e na quarta, a
mesma palavra não apresenta o acento. De nossa parte, "a uma atenção ortográfica, se, em 1958, a palavra Olho tinha ou não acento
circunflexo. De nossa parte, porém, adotamos a expressão/a impressão, Ôlho sôbre a Bahia, ladeada a um (sic.).
27
Apenas a foto da página 5, publicada em 28 de setembro de 1958, não é uma imagem da Bahia, ou, em particular, de Salvador. Mas,
segundo o texto crítico da arquiteta, poderia ser - por isso, essa escolha curiosa. Pois, enquanto as outras imagens fotográficas,
apresentadoras do edital, Ôlho sôbre a Babia (sic.), representam, para Lina, as boas soluções, arquitetônicas e urbanísticas,
encontradas no território baiano; a imagem fotográfica, selva de pedra urbana, aqui, destacada foge à regra e serve de denúncia. Ver
Ôlho sôbre a Bahia (sic.) DIÁRIO DE NOTÍCIAS. Salvador, 28 de setembro de 1958.
28
A adoção do fotoperiodismo, como fonte analítica do discurso, tem como sustentação as leituras de três autores. São eles: José Luiz
BRAGA, Maurice MOUILLAUD e Silva Helena ZANIRA TO MARTINS. Durante a leitura do trabalho apresentaremos os seus
pensamentos teóricos, como suportes ao nosso interesse metodológico.
29
Conforme José Luiz BRAGA: Questões metodológicas na leitura de um jornal. p. 330: Em uma escola crescente de complexidade ou de integração entre 'partes' e 'estruturas' que encaixam sucessivamente – teríamos: NO DISCURSO a) os textos. os desenhos, as
Jatos do jornal; (...)
30
O que Silvia Helena ZANlRATO MARTINS. Metodologia de análise de fonte diferenciada: o fotoperiodismo enquanto elemento
discursivo. p. 2, escreve para a ligação, texto/foto, pensamos para os nossa arquiteta, e suas "opiniões visuais" radiografando
Salvador: o casario: os costumes da burguesia soleropolitana, a nova arquitetura dos anos 1950, e o que é que a (nova) baiana faz e
tem.
“A imprensa escrita constitui fonte privilegiada para os estudos no campo
das representações sociais. Veiculando informações, a imprensa formula
lima 'visão de mundo' com discursos que, de modo algum, podem ser
tomados como neutros ou transparentes, mas sim como um olhar a registrar
fatos do cotidiano social.” (Zanirato Martins, 1998, p. 1).
Desdobrando a citação da historiadora, sabemos por E. P. Thompson (1981, p. 58) que, "fatos"
(aspas do autor) são os objetos imediatos do conhecimento histórico, e que as evidências (outra
palavra thompsoniana)31 - enquanto existência real - quando registros posteriores, como o caso da
imprensa, em palavras e imagens, são e estão intencionados: por quem as escreve, e por quem
as recebe32.
Porquanto, chegamos a mais um endereço para um socorro teórico. Como o discurso jornalístico
é público, é dirigido a uma pluralidade de leitores - e de leituras. Esta pluralidade pode ser
considerada pelo menos como uma dupla recepção: pelo leitor cúmplice e pelos adversários.
(Braga, 1997, p. 329).
Abrimos um novo parêntese, mais do que criar uma nota, para tocarmos ao assunto, a recepção
que a página, Crônicas de arte, de história, de costume, de cultura da vida, tivera pelo leitor
da Bahia, quando editada no jornal, Diários de Notícias, entre setembro e início de novembro de
1958. E através do parêntese, contamos fatos históricos, que, quiçá, nos aproxime das fronteiras
necessárias para a demarcação do terreno investigante.
O jornal, Diário de Notícias, de 1875, matutino pertencente aos Diários Associados, vem a
ocupar um posto de classificação, como um dos quatro principais jornais de Salvador, em 195833.
Conforme depoimentos de jornalistas e participantes da vida cultural da cidade, nesse período34;
testemunhos que, ao lado de estudos elaborados por novos pesquisadores, sobre a imprensa na
Bahia, nos anos 1950, O jornalismo baiano, (...), exercido entre 1958/1960, está tencionado por
uma prática que se quer ser moderna, atual e inovadora, mas que não consegue se realizar
plenamente face às injunções técnico-lingüísticas (...) (Campos de Lucena, 1996, p. 83).
Então, sob a predominância da ambigüidade, entre o arcaico e o moderno jornal, na capital da
Bahia, que reclama uma imprensa ao seu progresso, vimos surgir a folha cultural de Lina Bo Bardi
31
Segundo o historiador inglês Edward THOMPSON. A miséria da teoria. p. 49. uma de suas proposições, (em defesa do
materialismo histórico) é, sobre a natureza do conhecimento histórico. Assim, a autor expõe três subitens: Ele, o conhecimento
histórico é, pela sua natureza, (a) provisório e incompleto (mas não, por isso inverídico), (b) seletivo (mas não, por isso, inverídico), (c)
limitado e definido pelas perguntas feitas à evidência (e os conceitos que informam essas perguntas), e, portanto, só 'verdadeiros'
dentro do campo assim definido. Quarenta e um anos depois da publicação de Crônicas de arte, de história, de costume, de cultura
da vida, provavelmente, pela teoria de THOMPSON, estamos elaborando lúpóteses. e novas perguntas à história dessa página
cultural do, Diário de Notícias, através do discurso jornalístico de Lina. Ver, melhor, o texto de Edward THOMPSON, favor consultar,
INTERVALO: A LÓGICA HISTÓRICA.. pp. 47-62.
32
. Enquanto Silvia Helena ZANlRATO MARTINS, op. cit., p. 2, expõe, que é preciso perceber que a crônica jornalística, ao tomar
como objeto determinados atores sociais, é também agente e atua diretamente na elaboração de opiniões e tomadas de
posicionamento político, tanto do ponto de vista dos personagens retratados, quanto do público leitor que se identifica com a notícia
produzida. José Luiz BRAGA, op. cit .. p. 329, escrevendo sobre o público leitor diz que, há o leitor cúmplice e o leitor adversário. E,
ambos autores comungam da referência às formações ideológicas posicionadas, pelo jornalista e as condições de produção, dentro do
jornal, e o leitor, as condições de sua leitura intervêm na interpretação que ele faz dos enunciados (...). José Luiz BRAGA, op. cit., p.
328.
33
Conforme Maria do Socorro SlLVA CARVALHO. op. cit., p. 12: Os quatro principais jornais diários que compunham a imprensa
baiana ao final da década de J 950: os dois jornais dos Diários Associados - o matutino Diário de Notícias e o vespertino Estado da
Bahia - o vespertino A Tarde, o jornal de maior circulação, e o recém-fundado matutino Jornal da Bahia.
34
A caracterização dos principais jornais, de Salvador, no período, segundo o depoimento de João Carlos Teixeira Gomes. à época
repórter do Jornal da Bahia: A Tarde era um jornal como hoje, de prestígio, mas conservador. Tinha uma linguagem cartorial, com
poucas fotografias e nariz-de-cera. Era um jornal velho. O Diário de Notícias adotava uma linha mais popular, mas não tinha
expressão. E o terceiro, o Estado da Bahia; era voltado basicamente para o esporte. Então, o jornal veio preencher lima lacuna. Suênio
CAMPOS DE LUCENA. op. cit., p. 70. O jornal a preencher uma lacuna, que o entrevistado se refere, é o JornaJ da Babia. Vale
acrescentar unta declaração de Glauber Rocha, do, Jornal da Bahia, no período. Porém, antes, uma informação sobre o Glauber,
jornalista; como um dos escritores, revisores e gozadores, diariamente, do café society baiano e mundial, na coluna Krista, escrita por
Helena lgnês, no Diário de Notícias. Maria do Socorro SlLVA CARVALHO. op. cit., p. 58. Agora, a declaração glauberiana: Eu pelo
menos fazia propaganda comunista diariamente nas páginas dos Diários Associados que era centrista (...). Glauber ROCHA.
Revolução do Cinema Novo, p. 294.
e colaboradores, no Diário de Notícias. Tal qual, outras inúmeras páginas de cultura que se
difundiram à época pelos jornais brasileiros, foram uma peça importante da movimentação cultural
experimentada pelo Brasil dos anos 1950 (Silva Carvalho, 1992, p. 30)35.
Vale lembrar, que pesquisadores do período cultural baiano em foco, os anos 1950 - seja dos
temas: Era Edgard Santos; ou a imprensa; ou por uma (ou mais de uma) área artística e cultural
na Bahia -, nem sequer noticiam "a existência" da folha dominical, Crônicas (...), junto às
publicações, consideradas modernas e fomentadoras de idéias, tais como: Ângulos e a Mapa, e
o Jornal da Bahia, as três contemporâneas à página de Lina36. Daí, o nosso dever, enquanto
pesquisadores bobardianos, trazer à frente, ao lado do que se pesquisa sobre a passagem da
arquiteta na Bahia, a sua atividade de jornalista.
Os nove números publicados de, Crônicas de arte, de história, de costume, de cultura da vida,
tiveram pelos seus leitores, a dupla recepção (Braga, 1997, p. 329): cumplicidade e adversidade.
Uma dupla chama manifestada tanto pelo grupo do Novo como pelo grupo provinciano baiano.
A manifestação adversa à página bobardiana por um grupo do Novo, tem a participação dos
jovens intelectuais (universitários, literatos e jornalistas), responsáveis pela revista literária, Mapa.
Pois, a revista, em seu terceiro número publicado, em conternporaneidade, às páginas de Lina,
em 1958, é editada por Glauber Rocha. A manifestação do grupo intelectual é uma réplica
publicada no próprio, Diário de Notícias, a um pequeno artigo, o Intolerância, escrito, porém,
não assinado por Lina. O teor jornalístico desse artigo, versa sobre o lançamento da Mapa, que
segundo a nossa arquiteta, é uma revista universitária, (os editores não gostaram), e também,
uma publicação de jovens cuja intolerância é extremamente acomodaticia, (mais um desagravo
aos editores). Daí, Paulo Gil Soares, redator fundador da revista Mapa, “diz tudo o que pensa de
Crônicas (...)”, em sua réplica publicada37.
E, quanto a uma manifestação adversária pelo grupo provinciano baiano, melhor ampliarmos o
assunto, e consultarmos o texto de Lina Bo Bardi, Cinco anos entre os 'brancos' (Carvalho
Ferraz, 1993, pp. 161-162). Nele, Lina expressa-se sobre a cultura no Brasil, antes e depois do
golpe militar de 1964. A arquiteta expõe, descritiva, corajosa e reflexivamente, sobre as
conseqüências acontecidas no e para o Brasil, após 64, mas antes, expõe o papel do Museu de
Arte Moderna da Bahia, no cenário cultural baiano, como um projeto político, como Centro, e
como movimento cultural pré-64. Para Lina, o enfretamento que o M.A.M.B., fundado por ela,
em janeiro de 1960, (com a participação de estudantes e líderes políticos universitários, políticos,
intelectuais, artistas, cineastas, professores universitários e jornalistas - inclusive, com os
35
Para Suênio CAMPOS DE LUCENA. op. cit., p. 63: Alguns jornais se tornam conhecidos na década de 50 por suas páginas culturais.
como o Diário de Minas, onde trabalham Otto Lara Resende, Carlos Drummond de Andrade, Fernando Sabino e Paulo Mendes
Campos. Da mesma forma. Correio da Manhã, DC e Jornal do Brasil, no Rio de Janeiro, acolhem escritores e jornalistas os mais
diversos: José Louzeiro, Cfarice Lispector, Hélio Pólvora. José Ramos Tinhorão, Marina Colasanti, Wilson Martins, Assis Brasil.
Ascendino Leite e muitos outros. CAMPOS DE LUCENA "esquece" de citar, o importante, Suplemento Literário, de o Estado de São
Paulo, publicado de 1956 a 1967, dentre suas páginas culturais literárias. destacadas. E, concordamos com a orientação advinda de
Maria do Socorro SILVA CARVALHO. op. cit., p. 30, quanto a divulgação e crítica, mais ampliada, dos Suplementos Culturais, em torno
das diversas expressões artísticas que então se formavam ou se transformavam, junto à literatura.
36
Os pesquisadores do período cultural baiano, ou dos anos 1950, que acompanhamos, como leitura obrigatória e fundamental, para
elaboração dessa pesquisa, foram: Antonio Albino CANELAS RUBIM. Antonio RlSÉRlO. Maria do Socorro SILVA CARVALHO, Selma
COSTA LUDWIG, Olívia FERNANDES DE OLIVEIRA e Suênio CAMPOS DE LUCENA. Dos seis autores estudados, somente
RlSÉRlO op. cit., pp. 115-116, e FERNANDES DE OLIVEIRA. op. cit., p. 180, fazem menções honrosas à página bobardiana.
Enquanto Maria do Socorro SILVA CARVALHO. op. cit., p. 43, notifica: Vale lembrar que, na Bahia, coube ao Suplemento de Artes e
letras do Diário de Notícias, (..), essa Junção de fomentador de idéias. É preciso citar: o primeiro suplemento, Artes e Letras, foi
publicado em 9 de novembro de 1958, uma semana após o último número da página de Lina Bo Bardi. E, conforme lemos, no trecho
da matéria. Explicando, da Crônicas de arte, de história, de costume, de cultura da vida, número nove, a passagem que se
explica/justifica: A sociedade, a propriedade com que assuntos dos mais importantes para esta Cidade foram aqui tratados refletem o
interesse enorme que se verificou. nos circulos culturais, por esta página. Se a sra. Una Bardi não mais a dirige. se não é possível
mantê-Ia dentro do rígido critério técnico que a vinha conduzindo, o espírito realizador da grande jornalista e grande arquiteto será
mantido. Serão mantidos os colaboradores que aqui ocorreram ao seu chamado. E aproveitando aqui assuntos de artes com as de
literatura sem aspas, no próximo domingo em diante, neste mesmo local, registraremos o belo esfôrço Lina Bardi, que, por sinal,
manterá, para nós, de São Paulo, uma colaboração permanente e exclusiva.
37
Ver A INTOLERÂNCIA. Diário de Notícias. Salvador. 19 de outubro de 1958, e Ver "MAPA" responde a "Intolerância". Diário de
Notícias. Salvador, 26 de outubro de 1958.
participantes dos jovens da revista Mapa), o grupo teve que encarar, a hostilidade de uma 'classe
cultural' constituída em moldes provincianos, e a 'celebridade nacional' de artistas reunidos em
grupos folclóricos (dado o caráter turístico da cidade) e a imprensa local.
Fechamos o parêntese, porque dele com a contribuição de uma premissa básica à pretendida
aproximação às fronteiras demarcadoras da terreno investigante, há o devido desdobramento à
nossa linha de raciocínio teórico.
A base contribuinte expressa-se pelo contexto38, que, ao lado do discurso jornalístico,
anteriormente explorado, o que ambos demarcam?
A resposta é dada por Braga (1997, p. 330): As fronteiras entre estes níveis são dinâmicas. De
início, no momento da criação do discurso e das representações: o nível mais amplo envolve e
produz incidências sobre o nível englobado, ao mesmo tempo em que este participa da geração
daquele.
O desdobre a essa passagem autoral orienta a uma outra: é chegada a hora de enxergarmos pelo
olho do leitor. Do leitor, poder-se-ia dizer que ele é 'posto no mundo' pelo jornal (seja qual for a
escala, planeta 011 vi/arejo) na mediada em que é referido a uma totalidade que o envolve
(Mouillaud, 1997, p. 69).
Com isso, hipoteticamente, julgamos que o leitor da página de Lina, Crônicas (...), tem, à
disposição, no interior do jornal, Diários de Notícias, muitos títulos com muitos assuntos, e com
tipos jornalísticos, habituês39; da redação do jornal matutino dos Diários complemento do
periódico. Porque, Lina, enquanto, redatora e diagramadora, instituiação na área espacial
(Mouillaud, 1997, p. 25) do campo do papel40.
Em tal "suporte" estético, como Mouillaud escreve sobre uma definição do jornal em sua
materialidade de papel, seu formato, sua diagramação etc. (...) (1997, p. 29), nossa arquiteta
imprime, e se expressa, com uma arte gráfica construtiva e em estabilidade racional.
E na hora e vez de Lina discursar, pela escrita e pelas imagens, nas páginas culturais, aqui, em
estudo; dentre outros assuntos; educação, artesanato, arte industrial, cultura, arquitetura,
invasões e casas populares, são temos em destaque. Sobretudo, a editora e jornalista quer
chamar a atenção dos problemas que são da Bahia, mas que são muitos deles problemas
brasileiros, problemas universais - conforme se lê na matéria jornalística, Explicando, na,
Crônicas (...)41, em seu último número, a dois de novembro de 1958.
O que Lina pensa, propõe, vê, imagina e constrói sobre o assunto baiano está registrado em a
seção editorial, Ôlho sôbre a Bahia (sic.), nos nove números do periódico.
Então, é com esse Olho, que, em próxima oportunidade, no estudo analítico (de caso) no discurso
da arquiteta e jornalista, focalizaremos as linguagens textuais impressas: palavras e imagens, em
seus conteúdos. Bem como, as ressonâncias do texto com o contexto do lugar, no caso, Salvador.
38
Segundo José Luiz BRAGA. op. cit., p. 330: No CONTEXTO cabe: - os acontecimentos que, na empresa ou na sociedade, servem
de referência ao jornal para a criação de suas representações do contexto; - a imprensa alternativa contemporânea à (..); - a imprensa
brasileira em geral; - o contexto social, enquanto jogo de forças do poder político e da economia (dominação e trabalho).
39
Conforme Maurice MOUILLAUD. op. cit., p. 100: os títulos tais como aparecem na superfície do jornal em um percurso linear da
página, e de página em página. Tudo acontece como se desdobrássemos o jornal pondo lado a lado as unidades que aparecem no
mesmo nível. Porém, o próprio MOUILLAUD escreve sobre o desdobramento, até então, linear da página: tudo se passa como se o
jornal fosse escrito sob dois registros: uma superfície dada a ler, e um estoque de paradgmas mantidos em reserva à maneira de um
arquivo. O trabalho do paradgma é ora manifesto, ora latente. É ele que aparece sob a forma de assuntos que, sob cada
acontecimento, identificam um esboço 'político '. 'social', 'econômico', 'financeiro' etc.
40
Maurice MOULLLAUD. op. cit., p. 91 escreve: falou-se de uma escritura no espaço, deve-se compreendê-la ao pé da letra: a unidade
jornalística só pode acontecer por meio de um dispositivo espacial. Ele substitui uma unidade que não tem outra expressão.
41
Ver EXPLICANOO. Diário de Notícias, Salvador 2 de
novembro de 1958.
Visto que, na presente oportunidade universitária, exploramos, como parte de uma pesquisa maior
sobre “Lina na Bahia, as questões: estruturais, contextuais e metodológicas para leitura do
discurso jornalístico” de nossa arquiteta.
Bibliografia:
1. FONTES BÁSICAS
1.1 PERIÓDICOS:
Diário de Notícias
Diário de Notícias
Diário de Notícias
Diário de Notícias
Diário de Notícias
Diário de Notícias
Diário de Notícias
Diário de Notícias
Diário de Notícias
Salvador
Salvador
Salvador
Salvador
Salvador
Salvador
Salvador
Salvador
Salvador
07/09/1958
14/09/1958
21/09/1958
28/09/1958
05/10/1958
12/10/1958
19/10/1958
26/10/1958
02/11/1958
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