Esta Nota Técnica analisa a Proposta de Emenda à Constituição

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Esta Nota Técnica analisa a Proposta de Emenda à Constituição
Nota Técnica No 26
A PEC 186/2007 e sua Importância para a
Administração Tributária
Elaboração: Departamento de Estudos
Técnicos do Sindifisco Nacional
Brasília-DF, Outubro de 2013.
Diretoria Executiva Nacional
Presidente
Pedro Delarue Tolentino Filho
1º Vice-Presidente
Lupércio Machado Montenegro
2º Vice-Presidente
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Secretário-Geral
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Diretor-Secretário
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Diretor de Finanças
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Diretor-Adjunto de Finanças
Agnaldo Neri
Diretora de Administração
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Diretor-Adjunto de Administração
Gelson Myskovsky Santos
Diretor de Assuntos Jurídicos
Wagner Teixeira Vaz
1º Diretor-Adjunto de Assuntos Jurídicos
Sebastião Braz da Cunha dos Reis
2º Diretor-Adjunto de Assuntos Jurídicos
Luiz Henrique Behrens Franca
Diretor de Defesa Profissional
Dagoberto da Silva Lemos
1º Diretor-Adjunto de Defesa Profissional
Caetano Évora da Silveira Neto
2ª Diretora-Adjunta de Defesa Profissional
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Diretor de Estudos Técnicos
Luiz Antonio Benedito
Diretora-Adjunta de Estudos Técnicos
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Diretora de Comunicação Social
Maria Cândida Capozzoli de Carvalho
1ª Diretora-Adjunta de Comunicação Social
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2ª Diretor-Adjunto de Comunicação Social
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Diretora de Assuntos de Aposentadoria,
Proventos e Pensões
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Diretor-Adjunto de Assuntos de
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Diretor do Plano de Saúde
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Diretora-Adjunta do Plano de Saúde
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Diretor de Assuntos Parlamentares
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Diretor-Adjunto de Assuntos Parlamentares
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Diretor de Relações Intersindicais
Rafael Pillar
Diretor-Adjunto de Relações Intersindicais
Hélio Roberto dos Santos
Diretor de Relações Internacionais
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Diretor-Adjunto de Defesa da Justiça Fiscal e
da Seguridade Social
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Diretor de Políticas Sociais e Assuntos
Especiais
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Manoel Rubim da Silva
Conselho Fiscal
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Guido Negri
João Cunha da Silva
Membros Suplentes
Jayme de Castro Montenegro Filho
José Américo Espíndola Pimenta
José Aparecido Conceição
DIRETORIA DE ESTUDOS TÉCNICOS
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Diretor de Estudos Técnicos
Elizabeth de Jesus Maria
Diretora-adjunta de Estudos Técnicos
Equipe Técnica que elaborou este estudo:
Álvaro Luchiezi Jr. – Economista, Gerente de
Estudos Técnicos
Salomão Taumaturgo Marques – Advogado,
Assessor de Diretoria.
Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da
Receita Federal do Brasil
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Fone (61) 3218 5200 - Fax (61) 3218 5201
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1. Introdução
A Proposta de Emenda à Constituição – PEC 186/2007, de autoria do
Deputado Federal Décio Lima, visa acrescentar os parágrafos 13 e 14 ao artigo
37 da Constituição Federal, com a seguinte redação:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos
Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios
obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade,
publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
(...)
§ 13 – Lei complementar estabelecerá as normas gerais aplicáveis à
Administração Tributária da União, dos Estados, do Distrito Federal e
dos Municípios, dispondo inclusive sobre direitos, deveres, garantias e
prerrogativas dos cargos de sua carreira específica, mencionada no
inciso XXII deste artigo.
§ 14 - Às Administrações Tributárias da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios são asseguradas autonomia administrativa,
financeira e funcional e as iniciativas de suas propostas orçamentárias
dentro dos limites estabelecidos na Lei de diretrizes orçamentárias.
Assim, a proposta acima descrita, visa à criação de lei complementar
para definir normas gerais aplicáveis à Administração Tributária da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.
Após ultrapassar a Coordenação e Comissões Permanentes (CCP) e
Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara (CCJC) desde
2007, atualmente a PEC 186/07 está no aguardo do parecer da Comissão
Especial criada e destinada a apreciar e proferir parecer a respeito de sua
admissibilidade.
Conforme explicita o autor da proposição, tal reforma é respaldada na
necessidade de possibilitar a aplicação plena da previsão constitucional
responsável por estabelecer que “Administrações Tributárias da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, são atividades essenciais ao
funcionamento do Estado e serão exercidas por servidores especiais”.
O parlamentar acertadamente entende que a emenda à Constituição
Federal tem por escopo garantir uma uniformização procedimental às práticas
da Administração Tributária da União, dos Estados e do Distrito Federal, tendo
em vista a extensão do País e a complexidade de sua economia, razão pela
qual a adoção de uma norma geral destinada à criação de “uma identidade
nacional de seus servidores, respeitadas as competências específicas,
dotando-lhes da unicidade de direitos, deveres, garantias e prerrogativas”.
Segundo a justificação da PEC 186/2007, a modernização da
Administração Tributária de todos os entes federativos está atrelada à
necessidade de que os órgãos que a compõem usufruam de autonomia
funcional, administrativa e orçamentária. Esta autonomia se concretizará
através da “capacidade de definir suas próprias políticas, organizar seus
próprios serviços, dispor dos próprios recursos e estabelecer suas propostas
orçamentárias”.
Assim, o poder constituinte reformador promoverá melhorias no Sistema
Tributário pátrio, uma vez que as normas de regência serão unificadas,
permitindo, com isso, a melhor compreensão dos direitos e obrigações fiscais,
além de fortalecer a Administração Tributária por intermédio da concessão de
autonomia nos moldes mencionados.
2. Administração Tributária: objetivo, funções, atribuições e órgãos.
A Administração Tributária tem como objetivo promover a arrecadação,
provendo o Estado dos recursos necessários ao cumprimento de suas funções,
enfatizando a participação de cada cidadão na sua manutenção. Esta ação
representa a promoção indireta do serviço público e da justiça social na medida
em que propicia os recursos necessários para financiá-los.
A Emenda Constitucional nº 42/2003, inseriu o inciso XXII no artigo 37
da Constituição Federal, considerando as administrações tributárias da União,
Estados, Distrito Federal e Municípios como atividades essenciais ao
funcionamento do Estado, a serem exercidas por servidores de carreiras
especificas.
A Administração Tributária é a atividade do poder público que realiza a
fiscalização e arrecadação tributária1. Tem como principal objetivo administrar
1
HARADA, 2010, p. 534
as leis tributárias aproveitando o máximo do potencial tributário do ente
tributante. Ela compõe o Sistema Tributário. Na maioria dos países as
Administrações Tributárias compreendem quatro macro funções básicas:
Fiscalização
–
programação
das
atividades
de
fiscalização,
aperfeiçoamento das técnicas de fiscalização, auditorias e controles
fiscais;
Tributação – elaboração de normas e procedimentos tributários,
aplicação da legislação tributária, contencioso fiscal e consultas;
Arrecadação – previsão da receita, aperfeiçoamento das técnicas de
arrecadação, controle de lançamentos de créditos tributários, controle
dos
agentes
Informações
arrecadadores
econômico-fiscais
armazenamento
de
informações
e
–
cobrança
administrativa;
programação,
econômico-fiscais,
registro
controle
e
dos
cadastros de contribuintes e controle de documentos fiscais.
Estas funções inter-relacionam-se e são interdependentes. Sua
viabilidade, portanto, reside no funcionamento equilibrado e harmônico do
processo fiscal.
Embora
a
terceirização
de
algumas
atividades
relacionadas
à
arrecadação e cobrança tenham sido terceirizadas em alguns países. a partir
da década de 1990 pesquisadores e doutrinadores concordam que a
fiscalização, a tributação e a geração e disseminação de informações
econômico-fiscais são privativas de agentes públicos, fiscais do setor público2.
No Brasil, a Administração Tributária é regida pela legislação tributária
que, conforme disposto no artigo 96 do Código Tributário Nacional compreende
as leis, os tratados, as convenções internacionais, os decretos e as normas
complementares.
No que diz respeito à Administração Tributária da União, o Ministério da
Fazenda é o órgão máximo e a ele subordina-se a Secretaria da Receita
Federal do Brasil (RFB), órgão responsável pela administração dos tributos de
competência da União, inclusive os previdenciários, e pelos incidentes sobre o
comércio exterior. A RFB também auxilia na formulação da política tributária
2
SILVA, 2011
brasileira embora, no Brasil, ela seja realizada em grande parte “fora do
ambiente da administração de tributos3”. A RFB também atua no combate e
prevenção da sonegação fiscal, contrabando, descaminho, pirataria, fraude
comercial, tráfico de drogas e de animais de extinção e outros atos ilícitos
relacionados ao comércio internacional.
Na esfera estadual as estruturas podem ser diferentes, dependendo do
Estado. A título de exemplo, o Estado de São Paulo tem como o órgão máximo
a Secretaria de Fazenda. A ela subordinam-se, hierarquicamente, a
Coordenadoria da Administração Tributária (CAT) e o Departamento Executivo
da Administração Tributária (DEAT) que controla as Delegacias Regionais.
Cada Delegacia é subdividida em Inspetorias e essas em Postos Fiscais. No
âmbito dos procedimentos administrativos fiscais, há as Secções de
Julgamentos, subordinadas às Delegacias Regionais, sendo o órgão colegiado
o Tribunal de Imposto e Taxas, subordinado à Coordenadoria de Assistência
Tributária4.
A
hierarquia
nos
municípios
pode
ser
diferente
ou
receber
nomenclaturas diversas. No município de São Paulo, por exemplo, o órgão
máximo é a Secretaria de Finanças, de cuja estrutura fazem parte os
Departamentos de Rendas Mobiliárias e Imobiliárias. Cada um desses
departamentos é dividido em Inspetorias Fiscais, que são subdivididas em
Subinspetorias Fiscais. No procedimento administrativo fiscal inexistem órgãos
julgadores colegiados de segunda instância. Como exemplo, na cidade de
Florianópolis/SC o órgão responsável pelo julgamento é o Conselho Municipal
de Contribuintes5, inexistindo outras instâncias.
A formulação de políticas tributárias fica a cargo da União, dos Estados,
do Distrito Federal e dos Municípios, detentores de capacidade política, por
meio de seus órgãos tributantes (Ministério e Secretarias Estaduais e
Municipais da Fazenda, respectivamente), os quais também regulam os
3
Id., ibid.
HARADA, 2010, op. cit., p. 535, citando exemplo do Estado de São Paulo.
5
No município de Florianópolis/SC a Lei Complementar nº 70/00 suprimiu instâncias, deixando
somente para o Conselho Municipal de Contribuintes a missão de analisar e julgar as
reclamações interpostas pelos contribuintes, criou a possibilidade de interposição do recurso
para o Pleno (Câmaras Reunidas), recurso inexistente até então, porém, não avançou muito na
sistematização recursal.
4
poderes
e
as
atribuições
das
autoridades
administrativas
tributárias
relativamente à arrecadação e ao controle6.
A eficácia da atuação da Administração Tributária não depende nem é
compatível com burocráticos e retrógrados sistemas baseados na hierarquia
funcional vertical. Muito ao contrário, é compatível e depende de uma
legislação a ser criada e que lhe confira e aos seus membros, os AuditoresFiscais, em nível federal, e aos seus congêneres, fiscais de arrecadação, em
nível estadual, distrital e municipal, condições de exercer essas funções de
Estado prevendo: a) garantias e prerrogativas especiais para o exercício do
cargo; b) autonomia e independência funcional para fiscalizar o cumprimento
das leis; e c) tratamento administrativo compatível com a relevância e com a
magnitude dos números envolvidos em seus trabalhos.
Até o presente momento, porém, em prejuízo ao Estado, à sociedade e
à própria Receita Federal do Brasil, nenhuma lei veio ao mundo jurídico
regulamentar a precedência das Autoridades Fazendárias, citada desde 1988
no inciso XVIII do artigo 37 da Constituição Federal; tampouco foi editada uma
Lei Orgânica que disponha sobre o regime jurídico especial de tais Autoridades
Fiscais que, à semelhança das Autoridades Ministeriais, são essenciais ao
funcionamento do Estado Brasileiro7.
Na esfera federal as Autoridades Fazendárias são os Auditores-Fiscais
da Receita Federal do Brasil que, apesar de todas as normas de status
constitucional e legal acima mencionadas, sequer são tratados pelas leis e pela
Administração Pública como autoridades, permanecendo indevidamente
regidos pela Lei Nº 8.112/90, a lei geral dos servidores públicos. São
totalmente desprovidos de autonomia funcional e de prerrogativas e garantias
próprias de autoridade de Estado. Seus poderes para fiscalizar e o tratamento
outorgado hodiernamente são incompatíveis com a relevância de suas funções.
Na regulamentação das Administrações Tributárias torna-se necessário
que as Autoridades Fiscais das três esferas de governo gozem de autonomia
técnica e independência funcional no exercício da função, sendo-lhes permitido
6
7
SILVA, 2011.
Compare-se a letra do art. 37, XVIII e XXII, com a do art. 127, caput, da Constituição.
e garantido atuar independentemente de qualquer autorização, ordem ou
ingerência interna ou externa.
3. Marco Legal da PEC 186/2007
A PEC 186/2007 tem como marco legal o disposto no art. 37, incisos
XVIII e XXII da Constituição Federal, que diz:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos
Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios
obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade,
publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela
Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
(...)
XVIII - a administração fazendária e seus servidores fiscais terão,
dentro de suas áreas de competência e jurisdição, precedência sobre
os demais setores administrativos, na forma da lei;
(...)
XXII - as administrações tributárias da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios, atividades essenciais ao funcionamento do
Estado, exercidas por servidores de carreiras específicas, terão
recursos prioritários para a realização de suas atividades e atuarão de
forma integrada, inclusive com o compartilhamento de cadastros e de
informações fiscais, na forma da lei ou convênio.
Além desses dois dispositivos, a Constituição Federal também prevê que
não haverá vedação à vinculação de impostos para a realização das atividades
tributárias. In verbis:
Art. 167. São vedados:
(...)
IV - a vinculação de receita de impostos a órgão, fundo ou despesa,
ressalvadas a repartição do produto da arrecadação dos impostos (...)
para realização de atividades da Administração Tributária, como
determinado, respectivamente, pelos arts. 198, § 2º, 212 e 37, XXII,
(....);
Desse modo, a base estrutural da PEC é permitir que a administração
pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do
Distrito Federal e dos Municípios possam obedecer ao disposto nos incisos
XVIII e XXII do art. 37 da CF/88 eis que a base da boa governança está
intrinsecamente ligada ao bom desenvolvimento do colhimento, administração
e cobrança judicial/administrativa dos tributos entabulados na Constituição
Federal.
Assim, a aprovação da PEC significa fazer valer a precedência contida
no inciso XXII do art. 37 onde consta que as administrações tributárias terão
recursos prioritários para a realização de suas atividades e atuarão de
forma integrada, inclusive com o compartilhamento de cadastros e de
informações fiscais, na forma da lei ou convênio.
Os servidores fiscais da administração fazendária gozam de precedência
sobre os demais setores administrativos. A palavra “precedência” significa a
qualidade ou condição de precedente, aquele ou aquilo que antecede, que tem
preferência ou primazia. O objetivo da norma seria, então, o de não permitir a
subjugação da Administração Fazendária e de seus servidores fiscais às
pressões internas que venham a cercear ou criar dificuldades ao exercício de
suas funções. Até mesmo ordens formais, por decretos, portarias ou ordens de
serviço, não possuem eficácia plena de impedir o direito de fiscalizar dos
servidores fiscais. Isto significa dizer que a eficácia de uma norma contrária à
Constituição perde subsistência e impede a sua executoriedade.
Em termos práticos, seria aquilo que costumeiramente acontece: ordens
de cima que proíbem o exercício da fiscalização em determinados
contribuintes, ou suspensão da fiscalização em períodos eleitorais, ou o
afastamento peremptório do servidor de uma ação fiscal, porque está
incomodando e prejudicando um relacionamento político ou interesses
escusos.
A PEC vem garantir também, a importância da Administração Tributária
perante o Estado, já que é uma atividade essencial pra sociedade e para a
administração governamental como um todo, eis que com os recursos
advindos da organização prioritária do FISCO, o Governo Brasileiro pode
conceder aos cidadãos um País mais justo e igualitário. Além disso ela
evidencia a cooperação que haverá entre o Estado, a sociedade e o Fisco
com o objetivo primordial de crescimento da nação e de seu povo.
Diz o inciso XXII do art. 37 que a Administração Tributária é atividade
essencial e deve ser exercida por servidores de carreiras específicas. Vale
registrar que a norma não se refere, conforme a outra, à administração
fazendária, mas, sim, à Administração Tributária. Há uma grande diferença
entre administração fazendária e Administração Tributária. A expressão
fazendária está relacionada com finanças e, na área pública, é o setor ou
Secretaria que cuida das finanças públicas, o que cuida do dinheiro público,
aquela que controla o caixa e planeja os pagamentos. Já a Administração
Tributária é aquela que cuida da arrecadação de tributos, especificamente. Sua
obrigação é a de lançar, fiscalizar e cobrar tributos. Se quisermos comparar, é
mais ou menos a distinção que ocorre, em nível federal, no Ministério da
Fazenda: Secretaria do Tesouro cuida das finanças públicas; Secretaria da
Receita cuida da arrecadação tributária.
Essa distinção é importante. A Administração Tributária deve ser
exercida por servidores de carreiras específicas, ou seja, carreiras não
aplicáveis nos demais setores da Administração Pública. Absolutamente
incabível, portanto, um servidor de carreira específica da Administração
Tributária ser removido, ou transferido para outro setor da administração.
Ocorre, porém, que a maioria das Prefeituras é estruturada de forma a
misturar as funções fazendárias com as tributárias. Chama-se Secretaria de
Finanças, ou Secretaria de Fazenda, constando de sua estrutura o setor
tributário. Este deve ser independente, reportando diretamente ao Prefeito.
O Poder Público deve conceder ao Fisco autonomia administrativa,
financeira e funcional para dar continuidade ao seu dever constitucional de
permitir que o Estado possa desenvolver-se, e, conjuntamente a sociedade em
geral. A próxima seção trata da questão da autonomia, aplicada ao contexto da
PEC 186/2007.
4. Autonomia Administrativa, Financeira e Funcional: a essencialidade da
Atividade Tributária.
Primeiramente, cabe destacar que a inclusão dos parágrafos em
questão ao artigo 37, da Constituição Federal, é extremamente relevante para
assegurar a eficácia plena dos incisos XVIII e XXII, destacados na seção
anterior.
Desse modo, situada dentro do capítulo destinado à disciplina
constitucional
da
Administração
Pública,
tais
previsões
destacam
a
necessidade de conceder ao Fisco Federal preferência no exercício de suas
funções, objetivando, com isso, destacar a necessidade de se compreender a
atividade fazendária como primordial e basilar ao desenvolvimento das demais
atividades administrativas do Estado, além de destacar a essencialidade da
atividade e de seus servidores.
Em outras palavras, a previsão constitucional em menção implica dizer
que a atividade fiscal é essencial ao desenvolvimento do Estado, por ser ela,
obviamente, responsável pelo fomento às demais atividades e políticas
públicas responsáveis pela consecução de ações em prol do interesse público.
Assim sendo, a autonomia funcional, orçamentária e administrativa
permitirá às
Administrações
Tributárias
o
exercício
pleno
de
suas
competências, mormente de sua precedência, permitindo que o trabalho
de fiscalização e arrecadação se realize de forma planejada, conforme relatado
por Pacheco8. A autora entrevistou servidores e ex-servidores da Receita
Federal do Brasil com intuito de identificar os mecanismos que dificultam a
melhoria da comunicação entre a RFB e contribuintes. A pesquisa também
contemplou as práticas que, sendo consideradas como nocivas à vinculação
entre função arrecadatória do Estado e democracia, também são, por
conseguinte, à participação dos contribuintes na formulação e concretização
das políticas tributárias. Vários entrevistados mencionaram a interferência dos
gestores políticos nas ações tributárias:
A tarefa que se faz presente é pensar o projeto de ação da Receita
Federal (expresso no referido Decreto) de modo integrado com ideais
de democracia protegidos pela Constituição Federal e em um contexto
em que há setores sociais comprometidos com o fortalecimento de
práticas mais participativas e que acreditam que questões de interesse
público não dizem respeito apenas ao Estado, mas sim a toda
sociedade. A demanda é por mais transparência, accountability e
mecanismos administrativos que, de toda forma, garantam porosidade
da Administração Pública a demandas sociais.
8
Receita Federal do Brasil: desafios para a realização de um projeto de cooperação fiscal aprendendo com a experiência nacional e internacional, 2011.
Reuniões e entrevistas realizadas pelo NEF no segundo semestre do
ano de 2010 e no primeiro semestre do ano de 2011, com funcionários
e ex-funcionários da Receita Federal do Brasil,(24) ajudaram-nos a
compreender como os próprios agentes do Órgão percebem os
desafios que devem ser enfrentados. A principal questão em jogo, de
acordo com os entrevistados, diz respeito à constante pressão que o
governo exerce sobre a Receita Federal para que alcance, a qualquer
custo, metas de arrecadação. Isto implica, muitas vezes, em ações
debilmente planejadas que, de fato, aumentam a arrecadação em curto
prazo; mas que geram efeitos negativos em médio e longo prazo.
Alguns exemplos de atuação Administração Tributária voltada a
interesses meramente arrecadatórios são: (i.) as recentes anistias
fiscais e; (ii.) utilização de consultas fiscais para, ao invés de ampliar o
diálogo, gerar um aumento rápido de arrecadação. Estes dois tópicos
serão discutidos detalhadamente mais adiante.
Trata-se, portanto, de investigar tensões entre pretensões
exclusivamente arrecadatórias (em uma política imediatista de
governos) e forças internas e externas à Receita Federal dirigidas a
realização de um projeto que tem como escopo arrecadar de modo
eficiente e legítimo (uma política de Estado a ser realizada em longo e
9
médio prazo) .
O poder fiscalizatório incumbido aos fiscos constitui-se em verdadeira
materialização do poder de polícia estatal. Para que o exercício de tal poder
seja pleno, é forçoso reconhecer a necessidade de assegurar autonomia
administrativa, orçamentária e funcional aos agentes públicos. Evita-se, com
isso, que ações de fiscalização sejam embasadas em vontades meramente
políticas.
Essa autonomia certamente é essencial para que as atividades de tais
pessoas jurídicas sejam exercidas com base em critérios exclusivamente de
ordem técnica, permitindo ações ordenadas e eficazes de controle e regulação
dos setores fiscalizados.
Dessa maneira, a autonomia que a PEC pretende instituir é medida que
promove excepcional modernização no Sistema Tributário Nacional e garante o
exercício pleno da atividade fiscal. Por esta razão, sua implementação, por
intermédio de mecanismos que garantam prerrogativas especiais e liberdades
aos membros dos fiscos, certamente só trará benefícios ao Estado.
O CIAT – Centro Interamericano de Administrações Tributárias entende
que a as administrações tributárias devem atuar com autonomia e, para tanto,
devem se embasar nos seguintes pressupostos10:
9
10
Id., ibid.
ALINK e VAN KOMMER. 2011
Autonomia para definir objetivos – cabem-lhes total responsabilidade
para formular planos estratégicos e operacionais, definindo um horizonte
de planejamento a fim de alcançarem resultados
Autonomia para definir e implementar sua estrutura organizacional – a
fim de organizar suas atividades de maneira eficiente e efetiva as
administrações tributárias devem ter a possibilidade de adaptar, elas
mesmas, sua estrutura organizacional às suas necessidades.
Autonomia orçamentária – devem ser responsáveis por manejar seu
orçamento a fim de conduzir seus programas, contemplando a
possibilidade de gerar crédito orçamentário segundo os objetivos
atingidos e a distribuição de um percentual fixo das receitas tributárias
para financiar suas necessidades.
Autonomia na administração dos recursos humanos – capacidade para
definir uma política de recursos humanos flexível adaptada às
necessidades funcionais da organização.
Autonomia na administração de recursos materiais – capacidade de
administrar os recursos materiais, incluindo a compra de bens materiais
e a gestão própria de sistemas de tecnologia da informação, em lugar de
sua terceirização.
Autonomia na gestão de casos individuais e na interpretação da
legislação tributária – poder para tomar suas próprias decisões,
interpretando e decidindo os casos individuais conforme a lei, a
jurisprudência e as regras de política tributária com base no princípio da
igualdade entre contribuintes, sem ingerência política.
Conclui o CIAT que a autonomia é benéfica porque “permite um maior
grau de profissionalismo dos servidores civis e maior eficiência na gestão e
arrecadação de impostos ” (...) “permitindo a introdução de novos instrumentos
e de uma estrutura organizacional mais racional para lidar com eles tão logo as
autoridades tributárias possam tomar suas próprias decisões e assumir as suas
próprias responsabilidades”11.
11
Idem, p. 146-47 (tradução nossa)
Assim, ao assegurar a “autonomia administrativa, financeira e funcional
e as iniciativas de suas propostas orçamentárias (...)”, a PEC 186 introduz os
elementos necessários para assegurar às Administrações Tributárias Federal,
Estadual, Distrital e Municipais os requisitos mais modernos atuação conforme
recomendações e padrões internacionais.
Os modelos internacionais de autonomia das Administrações Tributárias
têm repercutido no Brasil ao longo das quatro últimas décadas por meio de
propostas de manifestações que visavam dar à Secretaria da Receita Federal
do Brasil novo status jurídico revestido de maior autonomia nos campos
administrativos, financeiro e funcional, algumas repercutindo no Congresso
Nacional, por meio de projeto de lei, de emenda ou de reforma constitucional.
Em síntese, tais modelos, e respectivas características, podem ser agrupados
da seguinte forma12:
Autarquia Especial – cujos exemplos são o Banco Central ou o INSS.
Quando se tentou implementar este modelo para a RFB a proposta13
previa o regime de autarquia de natureza especial, com personalidade
jurídica de direito público, autonomia administrativa e financeira14,
vinculada ao Ministério da Fazenda, com competências para fiscalizar,
cobrar e arrecadar os contribuições sociais federais e as de seguridade
social, assim como exercer o controle e a fiscalização das atividades
aduaneiras. Críticos deste modelo argumentam que ele teria sentido
apenas para obter os meios materiais para o seu desempenho. Esta
designação poderia ser substituída pela ideia de uma secretaria, a qual
teria o status, mas não a personalidade jurídica, de uma de autarquia,
com recursos provenientes do FUNDAF – Fundo de Desenvolvimento e
Aperfeiçoamento da Fiscalização, atuando como órgão singular15,
vinculado e não mais subordinado ao Ministério da Fazenda.
12
BORDIN, 2002. O autor descreve as características destes modelos, descrevendo
historicamente as tentativa de implementação.
13
Idem. Segundo o autor tal proposta foi formulada no início dos anos 1990 pelo então
Deputado Francisco Dornelles o qual a delineou num substitutivo apresentado e rejeitado pela
Comissão de Tributação da Câmara dos Deputados.
14
Mas sem prever a autonomia funcional!
15
O atual Regimento Interno da RFB, art. 1º, dá essa indicação, embora a mantenha
subordinada e não vinculada ao Ministério da Fazenda.
Agência Executiva – agência especial executiva
nos moldes da as
agências reguladoras (ANATEL, ANAC, etc.) enquadram-se neste grupo.
As críticas mais frequentes a este modelo centram-se no fato de que há
uma separação entre o núcleo estratégico, responsável pela formulação
de políticas públicas, e o núcleo de atividades exclusivas, responsável
pela sua execução. À Agência Executiva caberia apenas a execução, o
que implicaria em grandes perdas para a Administração Tributária se
houver uma grande dissociação entre os órgãos que formulam a política
tributária e aqueles que a normatizam e aplicam. Os seus defensores
argumentam que ela pratica de uma gestão descentralizada voltada
mais para a produção de resultado do que para o controle de
procedimentos. Neste modelo haveria um contrato de gestão prevendo
metas, condições de trabalho, condições operacionais diferenciadas em
relação às autarquias e fundações. Esse contrato seria monitorado por
avaliações de desempenho baseadas em indicadores específicos
amplamente disponibilizados para servidores, dirigentes, Governo e
sociedade em geral.
Secretaria Especial – aproximar-se-ia da atual situação da RFB,
vinculada e não subordinada ao Ministério da Fazenda, como reza o art.
1º do Regimento Interno da RFB. Na prática assume as características
de Autarquia Especial, com autonomia financeira.
“Tributadoria” – na linha de atuação do Ministério Público. Sua criação
necessitaria de uma alteração constitucional específica no capítulo IV do
título Organização dos Poderes, o qual passaria a disciplina não
somente as “funções essenciais à justiça” (Ministério Público) como
também aquelas referentes à Administração Tributária. Este entre do
Estado seria provido de fortes garantias institucionais (iniciativa de lei;
autonomia
administrativa,
funcional
e
financeira;
agentes
com
independência funcional, vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade
de vencimentos; etc.). Este modelo carrega em si uma analogia entre as
funções da Magistratura, do Ministério Público e da Administração
Tributária.
Ministério – assume o status de ministério em nível federal ou de
secretaria em nível estadual, distrital e municipal. Em nível federal seria
vinculado diretamente à Presidência da República constituindo um
Ministério da Tributação ou Ministério da Receita Federal.
Vale a pena discorrer sobre o modelo de autonomia fiscal utilizado na
Itália por meio de sua Agenzia delle Entrate, que possui personalidade jurídica
de direito público e é dotada de autonomia regulamentar, administrativa,
patrimonial, organizativa,
contábil e financeira, cabendo ao
Ministero
dell'economia e delle finanze a supervisão da Agenzia.
As relações entre o Ministério e Agência são reguladas por acordo com
duração de três anos, indicando os serviços, objetivos e os recursos
necessários para cada exercício mediante ajustes específicos.
A Agenzia promove e fornece serviços para a gestão de impostos de
competência das regiões e de outras autoridades, com o qual estabelece
acordos para a resolução, a avaliação, coleta e contencioso sobre os
respectivos impostos16.
Assim, a Agenzia é responsável pela resolução de todas as
controvérsias em matéria tributária, atuando em parceira com as políticas de
governo, mas sem a sua interferência, e sim por intermédio de acordos. Este
modelo italiano, em vigor desde 2001, se assemelha ao modelo de agência
executiva adotada pela doutrina administrativa brasileira, que se caracteriza por
uma qualificação dada às autarquias ou fundações públicas, que passam a
exercer suas atividades com maior autonomia gerencial e financeira para
aprimoramento de gestão.
A adoção de um desses modelos, ou de qualquer outro sistema
diferente, ou decorrente de características
desses
(“modelo
híbrido”)
dependerá do desenho que vier a ser adotado para a LOAT – Lei Orgânica das
Administrações Tributárias, a ser apesentada em até 180 dias após a
promulgação da PEC 186, conforme reza do seu artigo 2º. Alguns princípios
relativos à LOAT serão discutidos na próxima seção deste estudo.
16
Informações disponíveis no site da Agenzia delle Entrate (www.agenziaentrate.gov.it)
Acesso em 27 jun. 12
Qualquer que seja o modelo a ser adotado no Brasil, ele significaria
grande avanço para melhoria da atividade tributária. Pressões políticas,
legítimas ou não, exercidas sobre os Governos,
não se transmitiriam às
Administrações Tributárias, pois estas seriam autônomas e não serviriam de
instrumentos para batalhas jurídicas.
Ou seja, os Fiscos não poderiam ter suas atividades especializadas
utilizadas em ações que não traduzam o interesse público lato sensu, pois a
sua autonomia os protegeria de eventual tentativa de sobrepor o interesse
particular ou político sobre o público.
Com esta autonomia, a supremacia do interesse público seria reafirmada
e tal medida também implicaria em avanços significativos no Sistema Tributário
Nacional, dando continuidade ao processo de fortalecimento dos órgãos
fazendários iniciado com a com a promulgação da Emenda Constitucional
42/2003.
5. LOAT – Lei Orgânica da Administração Tributária
Lei Orgânica, em nosso Direito Constitucional, não tem um conceito
claro para e geralmente comparece com o mesmo sentido de Lei
Complementar. Vejam-se, a este respeito, dois artigos de nossa Constituição
(grifo nosso).
Art. 29. O Município reger-se-á por lei orgânica, votada em dois
turnos, com o interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois
terços dos membros da Câmara Municipal, que a promulgará,
atendidos os princípios estabelecidos nesta Constituição, na
Constituição do respectivo Estado e os seguintes preceitos: (...)
Art. 121. Lei complementar disporá sobre a organização e
competência dos tribunais, dos juízes de direito e das juntas
eleitorais.
Pelo art. 29 vê-se que há previsão constitucional expressa apenas para
leis orgânicas municipais para entes municipais.
Em geral a Lei Orgânica trata da organização de um órgão da
Administração Pública ou setor de atuação do Poder Público. As Leis de
Organização estão previstas para alguns setores da Administração Pública,
mas sem um detalhamento maior de conteúdo. São exemplos, dentre outros:
Lei Orgânica da Assistência Social, Lei Orgânica do Ministério Público da
União; Lei Orgânica do Tribunal de Contas da União, etc.
Uma Lei Orgânica deve prever, dentre outros, os seguintes conteúdos
básicos de um determinado setor ou órgão: organização e funcionamento;
natureza jurídica e suas prerrogativas funcionais (autonomia, custeio,
precedência,
privilégios);
direitos
e
garantias
dos
agentes
públicos;
competências e atribuições dos dirigentes e unidades da estrutura básica do
setor; proibições e vedações aos agentes públicos, e respectivo regime
disciplinar; requisitos para provimento de cargos de direção e efetivos;
estruturas de carreira e quadros de pessoal.
As Leis Orgânicas asseguram que os marcos normativos das
organizações sejam mais seguros, reduzindo-lhes a discricionariedade e o
casuísmo ao criarem novas normas e regulamentos, ao mesmo tempo em que
estruturam de forma integrada e sistêmica as normas de funcionamento de um
setor. Auxiliam, assim, a consolidação de seus instrumentos normativos,
conferindo-lhes um status institucional diferenciado.
Uma Lei Complementar necessita de previsão constitucional expressa e,
por conseguinte, trata normativamente um setor considerado essencial
vinculado ao poder do Estado. Tornou-se imperativo, portanto, que a PEC
186/2007 fizesse menção explícita a uma Lei Complementar para normatizar a
Administração Tributária. Sendo aprovada a PEC, cada ente federativo deverá
ter a sua própria LOAT – Lei Orgânica da Administração Tributária.
A LOAT regerá toda a organização do Fisco o qual gozará, como dito
anteriormente, de autonomia administrativa, financeira e funcional, tornando a
Administração Tributária mais presente na sociedade e com o mínimo de
interferências ou influências de outras esferas governamentais.
A LOAT dever estar imbuída de princípios fundamentais para a sua
organização como os da legalidade, impessoalidade, moralidade, eficiência,
entre outros, os quais também norteiam a administração pública como um todo.
O princípio da legalidade prevê que “ninguém será obrigado a fazer ou
deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”, sendo a expressão
maior do Estado Democrático de Direito como garantia de que a sociedade não
está presa às vontades particulares daqueles que a governam.
O princípio da impessoalidade, que possui duas conotações: a primeira
decorre do princípio da igualdade, previsto no artigo 5º da Constituição Federal;
e a segunda decorre da atuação da própria Administração Pública. A primeira
leitura deste princípio requer que no desempenho das funções públicas, o
tratamento seja indistinto entre todos os administrados, em obediência ao
corolário: “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”.
Já a segunda leitura do princípio da impessoalidade roga que não seja a
pessoa física do agente que atua, mas sim o próprio Estado, por ele
representado. Assim, a atividade estatal deve ser pautada pela lei e deve levar
em consideração os interesses individuais e coletivos de todos os
administrados, e não de pessoas determinadas. Este princípio pode ser
expresso também pela palavra imparcialidade, ou seja, a atuação do agente
público não deve ser pessoal e parcial, conforme o caso.
O princípio da moralidade administrativa reza que o procedimento
administrativo deve se desenrolar em conformidade de padrões éticos, com a
moral, os bons costumes, as regras da boa administração, os princípios de
justiça e de equidade e a ideia de honestidade. A moralidade administrativa é
princípio informador de toda ação administrativa, englobando o comportamento
que a coletividade espera da administração pública quando da consecução dos
interesses públicos. Refere-se a uma moral jurídica entendida como um
conjunto de regras de conduta obtidas da disciplina interior da Administração,
segundo a finalidade de sua ação, qual seja: o bem comum.
Segundo o princípio da eficiência, a Administração Pública deve oferecer
aos cidadãos mais serviços, com melhor qualidade e em menor tempo,
mediante adequada organização interna e com uma redução dos custos por
meio do melhor aproveitamento dos recursos disponíveis.
A edição de Lei Complementar, a LOAT, para estabelecer “normas
gerais aplicáveis à Administração Tributária da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios, dispondo inclusive sobre direitos, deveres, garantias
e prerrogativas dos cargos de sua carreira específica”, é de suma importância
para assegurar a aplicabilidade plena da previsão constitucional responsável
por estabelecer a especialidade e precedência das carreiras fiscais.
A LOAT assegurará o bom desempenho das atividades típicas de
Estado exercidas pelos Auditores-Fiscais, fazendo valer, de forma concreta, as
previsões do texto constitucional.
Desta forma, a aprovação e posterior promulgação de Emenda
Constitucional proveniente da PEC 186/2007 é importante para a eficácia fiscal
do Estado brasileiro. E, considerando a obrigatoriedade de preservação do
interesse público, é sensato conceder autonomia às Administrações Tributárias
para que haja a salvaguarda de suas atividades.
6. Conclusão
Para concluir, é imperioso reforçar que a concessão de autonomia às
Administrações Tributárias do País não implicará na criação de órgãos
autônomos e desvinculados da estrutura executiva dos governos federal,
estadual, distrital e municipal. Isto porque o Estado é uno. Admite-se a
fragmentação de suas atividades apenas para a melhoria na desenvoltura das
ações administrativas necessárias para o fomento dos interesses soberanos.
Reconhece-se, assim, a instrumentalidade da atividade administrativa e, por
conseguinte, da Administração Pública.
Isso implica dizer que não haverá nenhuma revogação do poder político
ou sua dizimação se os Fiscos obtiverem autonomia administrativa,
orçamentária e financeira, uma vez que o poder estatal, soberano e indivisível,
não será afastado em momento algum.
Aos Fiscos não será atribuída natureza de atividade afastada ou acima
da supervisão e submissão às políticas públicas governamentais. Mesmo
porque as normas que regulam a estrutura administrativa brasileira não
preveem nenhum órgão, seja da Administração Direta ou Indireta, localizado
fora da estrutura administrativa e sem qualquer sujeição às regras de direito
público.
O que se pretende com a autonomia dos Fiscos é assegurar que as
atividades tributárias exercidas pela União, Estados, Distrito Federal e
Municípios possam ser desempenhadas exclusivamente com caráter técnico,
impossibilitando que pressões de qualquer natureza possuam força para
determinar os rumos da atividade arrecadatória dos entes políticos.
A autonomia pretendida e a ser inserida em nossa Carta Magna pela
PEC 186/2007 permitirá que a Administração Tributária brasileira torne-se mais
forte e com alto poder coercitivo, alcançando, assim, os meios necessários
para, arrecadando os recursos de que necessita do Estado para atender suas
políticas públicas, permita-lhe também combater efetivamente, a fraude e a
sonegação fiscal, fontes desse mal que assola nosso País: a corrupção.
Referências
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Tributaria. Amsterdam, Holanda: CIAT, IBFD, 2011. Disponível em: <
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2002. Disponível em: <www.federativo.bndes.gov.br/bf_bancos/estudos>.
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19ª ed.
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a realização de um projeto de cooperação fiscal aprendendo com a experiência
nacional e internacional. Fiscosoft, São Paulo: Fiscosoft Editora, 2011, Artigo
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SP. Disponível em < http://www.fiscosoft.com.br/a/5hrf/receita-federal-do-brasildesafios-para-a-realizacao-de-um-projeto-de-cooperacao-fiscal-aprendendocom-a-experiencia-nacional-e-internacional-mariana-pimentel-fischer-pacheco>
Acesso em: 25 jun. 2012.
SILVA, Carla Caroline de Oliveira. Breve análise acerca da Administração
Tributária Brasileira. Boletim Conteúdo Jurídico, Brasília: 06 dez 2011.
Disponível
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<http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.35222&seo=1>.
Acesso
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SINDIFISCO NACIONAL. Tributação no Brasil: em busca da justiça tributária.
Brasília: Sindifisco Nacional, 2010.