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hipertexto
Famecos/ PUCRS. Porto Alegre, outubro de 2007 – Ano 9 – Nº 59
Jaqueline Sordi/ Hiper
Gabriela de Oliveira/Hiper
Congresso de jornalismo vê aquecimento global
Enfim, ambiente é
pauta na imprensa
Página 8
Rafael Codonho/ Hiper
Diariamente,em sala de aula, Hohlfeldt transfere aos alunos da Famecos uma longa experiência em jornalismo, literatura e pesquisa acadêmica
Hohlfeldt é o patrono
da Feira do Livro 2007
Mototáxi, uma das alternativas de transporte
Criatividade chinesa
nas ruas de Pequim
Página 5
Parceria no futebol:
frustração e dívidas
Ele é escritor, jornalista, crítico literário e professor de graduação e pós
Páginas 2 e 3
Vinícius Carvalho/ Hiper
Superação
A arte na ponta dos pés
Fernanda Fell/ Hiper
Página 11
Sociedade
Cresce a
cruzada
pela
Lei Seca
no Estado
Primeiro foi o cigarro,
agora ganha força
entre os abstêmios
a campanha para
banir a bebida
Gaúcha radicada em Santa Catarina, Rita Boz produz pinturas vendidas na Europa. Pag. 9
Páginas 6 e 7
2 abertura
Porto Alegre, outubro de 2007
Especial/ Feira do livro 2007
Editorial
Artigo
Todas as emoções estão aqui
O mito do mercado
editorial gaúcho
Por Lidiana de Moraes, editora
Chegou a época do ano em
que Porto Alegre respira um ar
diferente. No dia 26 de outubro
começou a 53ª Feira do Livro. Enquanto a Praça da Alfândega fica
repleta de estandes, os visitantes do
evento sentem na pele a sensação
de participar de uma ocasião tão
tradicional.
Muito se discute quanto ao hábito dos brasileiros como leitores,
mas os 53 anos de história da Feira
de Porto Alegre não escondem o
interesse que pelo menos os gaúchos têm pelo mundo das palavras.
O mote da edição de 2007, “Todas
as emoções estão aqui”, não poderia representar melhor a busca
daqueles que permitem se perder
em meio às páginas de um livro.
Mais do que uma simples ação, ler
é uma experiência completa, que
mexe com todos os sentidos dos seres humanos e nos enriquece como
cidadãos em constante processo de
transformação.
O patrono da Feira deste ano
é o professor, jornalista, escritor
e político Antônio Hohlfeldt. Ser
patrono representa ser apaixonado pelas letras e trabalhar para
que elas atinjam profundamente o
maior número de pessoas e, neste
ponto, a escolha do professor
da Famecos não poderia ter sido
melhor. Quando estava na 6ª série,
lembro que um dos livros que tive
de ler chamava-se O Cavaleiro da
Rosa no Supermercado, escrito por
Hohlfeldt. Logo estava submersa
no mundo daquele jovem que teve
que trabalhar como empacotador
para ajudar a família.
Para marcar ainda mais a experiência literária que eu havia tido,
o escritor foi se encontrar com os
seus jovens leitores de uma cidadezinha da serra gaúcha. Pela primeira
vez me vi na situação de pedir um
autógrafo para alguém. Mais tarde
o escritor passou a ser meu professor. Como aluna, deixei de lado
o local de trabalho de Alexandre
e transitei por terras mitológicas,
cidades em guerra e sertões, sempre
guiada por grandes reportagens. É
dessa forma, independente da profissão, que é possível tornar-se uma
referência para aqueles que prezam
o valor de um bom livro.
Seja lembrando das histórias
que delineavam mundos fantásticos na minha infância ou vendo as
crianças que correm pela área de
literatura infanto-juvenil, é perceptível e irrefutável a importância de
criarmos o hábito da leitura desde
cedo. No fundo não são os livros
que nos acompanham, somos nós
que nos integramos a eles. Como
disse John Kieran: “Eu sou uma
parte de tudo o que li”.
Por Cássia Oliveira
O Rio Grande do Sul é referência nacional em matéria de leitura.
Enquanto o brasileiro lê, em média,
1,8 livro por ano, o gaúcho lê 5,5.
Nenhum lugar do Brasil é palco de
tantos encontros literários como a
cidade de Passo Fundo ou promove
maior feira do livro do que Porto
Alegre.
Com freqüência, se ouve que o
mercado editorial regional é exemplo
de auto-suficiência. Mas a idéia de
que o Rio Grande do Sul mantém
um mercado que supriria a falta
de espaço no centro do país, é, na
verdade, um grande mito. “Isso é
uma falácia. O que acontece é que
a maioria dos escritores gaúchos
publica apenas no RS e contenta-se
com isso”, explica a professora e
escritora Regina Zilberman.
O escritor gaúcho Charles Kiefer admite que, de fato, há um ciclo
fechado de autores, obras e público.
Mas o consumo de livros de escritores locais pelos próprios gaúchos
não é suficiente para movimentar o
mercado regional. Os leitores daqui
também lêem escritores nacionais.
As editoras e livrarias dependem, e
muito, do mercado nacional. Luís
Fernando Araújo, editor da Artes e
Ofícios, conta que o RS representa
apenas 35% das vendas da editora.
Kiefer completa que uma editora,
para ter um mercado na mão, precisa
trabalhar com uma literatura que só
vende aqui. “Isso vale apenas para a
Martins Livreiros, que sobrevive só
com o mercado gaúcho. Aí é autosuficiente.”
O próprio governo do Estado
há 20 anos não adquire obras para
bibliotecas públicas. “Não tem
política alguma para reposição das
obras e compras de novidades para
as bibliotecas públicas e escolares,
ao contrário de estados como o Rio
de Janeiro, São Paulo, Paraná, Minas
Gerais e Espírito Santo”, reclama
Araújo. Quem traz os livros para
o Estado é o governo federal, que
compra de editoras do centro do
país. Nesse ponto, se evidenciam as
conseqüências da falta de projeção
nacional de escritores gaúchos.
Kiefer, durante toda sua carreira,
publicou em editoras locais. Porém,
agora, na Record, editora de fora do
Estado, entra no Plano Nacional de
Biblioteca Escolar, projeto criado
em 1997 pelo Ministério da Educa-
hipertexto
ção em parceria com a Secretaria de
Ensino Fundamental (SEF).
Foi na última década que algumas editoras nacionais passaram
a publicar obras gaúchas. Charles
Kiefer conta que, em 1995, começou
a migração dos autores para o centro
do país. Atualmente, com as multinacionais entrando no mercado brasileiro (Sangwkrtilhana, Santa Maria,
Planeta, entre outras, que adquiriram
a Ática, a Moderna, a Objetiva, etc.),
as editoras nacionais acabam buscando alternativas nos escritores fora
do eixo Rio-São Paulo, e dando vez
aos gaúchos. Aliás, para Kiefer, um
segundo mito da literatura gaúcha
seria a velha desculpa do “podia ter
publicado lá e não publiquei porque
não quis”. Ele próprio admite não ter
ido para uma editora nacional antes
por motivos contratuais.
A situação gaúcha acaba virando
uma bola de neve. A auto-suficiência
é, na opinião de Regina Zilberman,
sinal de fraqueza, na medida em que
muitos escritores são lidos apenas
pelo público gaúcho. E os escritores,
por sua vez, contentam-se em limitar
sua publicação às fronteiras do Rio
Grande do Sul talvez por acreditarem
na suposta auto-suficiência.
Proposta de uma Reforma Ortográfica gera polêmica entre lingüistas
Tamara Carvalho/ Hiper
Por Natasha Centenaro
A reforma ortográfica pretende
unificar as diferentes grafias da Língua Portuguesa nos países que falam
o idioma. O português é a quinta
língua mais falada no mundo, mas
é a única que mantém duas grafias
oficiais, a do Brasil e a de Portugal.
O Congresso brasileiro mostrou
sinais de interesse na padronização
da língua quando aprovou as mudanças do acordo de 1990. Na época
era necessário que pelo menos três
países ratificassem a proposta. Isso
só ocorreu em 2006, com a confir-
mação de Cabo Verde e São Tomé
e Príncipe. A previsão para que a
mudança entre em vigor é no início
de 2008, ainda sem data definida.
A principal discussão que envolve intelectuais e gramáticos é sobre
as vantagens ou desvantagens para
o país quando colocar em prática a
proposta. Para os estudiosos favoráveis, as duas ortografias da Língua
Portuguesa dificultam a efetivação
do idioma como oficial na Organização das Nações Unidas (ONU) e
prejudicam o intercâmbio cultural,
com a redução de circulação de livros, inclusive científicos e didáticos,
por causa da necessidade de revisão
e adaptação para um “outro português”. Destaca-se também o ensino
da língua, pois a norma utilizada e
que serve de referência na comunidade internacional é a de Portugal,
diferentemente da empregada no
Hipertexto
Jornal mensal da Faculdade de Comunicação Social
(Famecos) da Pontifícia Universidade Católica do
Rio Grande do Sul (PUCRS).
Avenida Ipiranga 6681, Jardim Botânico, Porto
Alegre, RS, Brasil.
E-mail: [email protected]
Site: http:// www.pucrs.br/ famecos/ hipertexto/
045/ index.php
Reitor: Ir. Joaquim Clotet
Vice-reitor: Ir. Evilázio Teixeira
Brasil. Com a grafia unificada, a norma se padroniza e o ensino se torna
o mesmo em ambos. Nessa corrente
pró-mudança, a presença do presidente da Academia Brasileira de
Letras, Marcos Vilaça, intensifica a
aplicabilidade da reforma.
Gilberto Scarton, lingüista e
professor da PUCRS, argumenta
que a reforma ortográfica não é
implantada porque não é essencialmente necessária. “A reforma não é
implantada por conservadorismo,
é difícil mudar hábitos lingüísticos,
inclusive dos próprios usuários da
língua. Mas ela não se faz neces-
sária, é importante para colocar o
Português em contexto de idioma
mundial”. O professor é favorável
às mudanças para alcançar a máxima
unificação possível e, assim, garantir
visibilidade e difundir o Português
como língua estrangeira fortalecida.
“Favorável, mas não entusiasta da
reforma ortográfica”, frisa.
Os críticos do processo defendem a manutenção da ortografia,
sem alteração. Alguns indicam uma
perda significativa da grafia do modo
brasileiro, pois as modificações
cedem muito mais em relação às
perdas portuguesas.
Apoio cultural: Zero Hora. Impressão: Pioneiro, Caxias do Sul. Tiragem 5.000
Diretora da Famecos: Mágda Cunha
Coordenadora/ Jornalismo: Cristiane Finger
Produção dos Laboratórios de Jornalismo Gráfico
e de Fotografia.
Professores Responsáveis:
Tibério Vargas Ramos e Ivone Cassol (redação e
edição), Celso Schröder (arte e editoração eletrônica)
e Elson Sempé Pedroso (fotojornalismo).
ESTAGIÁRIOS:
Gerente de produção: Thais Silveira
Editora: Lidiana de Moraes
Editora de Fotografia: Fernanda Fell
Editor de Arte: Bruno Gazola de Paoli
Editora de Texto: Camila Schaedler
Repórteres: Ariane Jorej, Bernhard Friedrich Schlee, Bruna Ostermann, Bruna Weis Scirea, Bruno
Gazola de Paoli, Cássia Sírio de Oliveira, Camila Alves Schaedler, Camila Rinaldi, Clarissa Leite Caum,
Fernando Rotta Weigert, Guilherme Zauith, Helena
Wilhelm Eilers, Igor Elias Carrasco, Jamille Callai,
Luciana Birck, Maurício Círio, Natasha Centenaro,
Patrícia Lima, Rafael Lopes Codonho, Raiza Ismério
Roznieski, Tatiana Feldens, Thiago Oliveira, Vinícius
Roratto Carvalho, Yara Tropea.
Repórteres Fotográficos: Andressa Vargas Griffante, Daniela Curtis do Lago, Fernanda Faria Correa, Fernando Sá Correa, Gabriel Pozzobom Silveira,
Gabriela M de Oliveira, Ingrid Guerra , Jaqueline O.
Sordi, Jessica Tarantino de Carvalho, Karoline Sara
Danardi, Laís Cerutti Scortegagna, Lucas Soares
Costanzi, Pedro de Oliveira, Raissa Genro, Tamara
Carvalho, Vinicius Roratto Carvalho.
hipertexto
Porto Alegre, outubro de 2007
Especial/ Feira do livro 2007
Antônio Hohlfeldt
Gabriela de Oliveira/Hiper
entrevista
“Fazer literatura
exige história
e narrativa”
Por Fernando Rotta Weigert e Clarissa Caum
Para contar uma história, não basta um bom discurso. A criança é
conquistada com boa história e narrativa qualificada, sustenta Antônio
Carlos Hohlfeldt, patrono da 53ª Feira do Livro de Porto Alegre. O escritor,
jornalista, professor e político foi escolhido dentre nove nomes destacados,
como Juremir Machado, Luiz Coronel, Jane Tutikian e Luis Augusto Fisher.
Ele substitui Alcy Cheuíche e sua escolha resultou da votação entre ex-patronos, representantes da área cultural, diretores da Câmara Rio-Grandense
do Livro e universidades.
Hohlfeldt se apresenta com “um militante da questão cultural” e considera que, nos anos 70, houve uma virada do jornalismo cultural brasileira,
quando a imprensa aderiu ao modelo da indústria cultural, abandonou os
suplementos culturais e reduziu os espaços para a crítica. “A política literária
ficou na academia. O grande problema é que, daqui a 30 anos, quem quiser
saber o que ocorria na cena cultural de Porto Alegre não vai ter onde buscar
essas informações”, alerta.
Formado em Letras pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul
e com mestrado e doutorado em Literatura pela PUCRS, foi professor na
Unisinos e Ulbra. Já trabalhou no Correio do Povo e no Diário do Sul,
na área de jornalismo cultural. Foi assessor nas Secretarias Municipal de
Cultura (1972) e Estadual da Cultura, Desporto e Turismo do Estado
(1978-1981). Também trabalhou na seção da Rádio Canadá Internacional,
foi assessor de imprensa da Fundação Sinfônica de Porto Alegre e do
Instituto Goethe (1976).
Hohlfeldt já publicou 23 livros infantis e ainda carrega uma bagagem
de atuação política. Foi vereador em 1983, reconduzindo à Câmara por
cinco vezes, e vice-governador na gestão de Germano Rigotto (2002-2006).
Atualmente, é professor na Faculdade de Comunicação Social da PUC e
crítico de teatro no Jornal do Comércio. Em entrevista ao Hipertexto, o
novo patrono expõe seus pontos de vista sobre literatura, jornalismo e
política, áreas em que atua.
Hiper: É um sonho ser patrono da feira do livro?
Desde que me convidaram para
ser um dos 10 patronáveis, tinha
10% de chance de me tornar um.
Como tenho muitas atividades, além
da literatura, achava que não tinha
muita chance ser escolhido. Imaginei
alguém mais vinculado à produção
literária. Foi uma surpresa e ao mesmo tempo uma alegria. A escolha
me dá responsabilidade pelos outros
nove, pelos antigos patronos e pelo
evento em si.
Quais são as atividades de um
patrono?
Uma série de atividades: fazer
visitas aos autores e bancas; ir aos
lançamentos dos livros; enfim, estar
fisicamente presente na feira. Eu
quero propor atividades descentralizadas, como ir a algumas escolas
de periferia, levando doações de
livros para as bibliotecas; visitar
crianças em hospitais, promovendo
momentos de leitura. Mostrar que a
feira não se concentra só na praça,
ela “anda” um pouco.
Tiveste influência de alguém
para ser assim?
Não. Quando fiz testes vocacionais, apontava que poderia ser desde
médico até professor, o que não me
ajudou em nada. Mas sempre gostei
de escrever, então transformei isso
gradualmente na vontade de ser
jornalista. Acabei fazendo jornal e
Letras por um absoluto acaso. Letras
porque um amigo queria cursar e
fiz vestibular. Entrei para o Correio
no momento que o jornalismo foi
dado como profissão. Tudo foi bem
casual, apesar de lá adiante sempre
ter a idéia da literatura.
Que ano começaste a dar
aula?
Desde guri eu dava aulas particulares, porque eu era bom aluno, aí
ganhava o meu dinheiro. Quando estava na faculdade, fiz estágio obrigatório no Colégio Aplicação (Ufrgs) e
comecei a lecionar no IPV, primeiro
curso pré-vestibular de Porto Alegre.
Na volta do Canadá, dei aula no
curso de Jornalismo da Unisinos.
No início dos anos 80, substituí um
professor na PUCRS.
Como surgiu a idéia de escrever para crianças?
No final da década de 70, surgiu
no Brasil uma literatura realmente
voltada às crianças, quando ocorreu
uma mistura de realidade com fantasia. Até então havia basicamente
o Monteiro Lobato. Livros que
causaram polêmica entre 1970 e
1980 foram “O menino e o pinto
do menino” e “Os rios morrem de
sede” de Vander Piroli. Na época, eu
fazia critica literária no Caderno de
Sábado do Correio do Povo. A partir
dessas publicações, me interessei
pelo assunto.
De onde veio a idéia do primeiro livro infantil?
Eu era professor na Unisinos e
me envolvi com a questão dos índios
no estado. Escrevi a história de uma
experiência que vivi em uma aldeia.
Então, surgiu meu primeiro livro,
Porã (1980). Em 1981, foi lançada
“A Guerra de Porã”.
Ao escrever para o público
jovem, existe a preocupação de
que sejam potenciais leitores
futuros?
Penso nisso, por que sou um
militante da questão cultural. Mas
quando vou escrever, meu objetivo
é contar uma história. Não adianta
fazer “discurso” se eu não tenho
uma boa narrativa, que prenda a
criança. Quando escrevo, duas fases
me preocupam muito: as primeiras
linhas que definem se, realmente,
o leitor irá ler o livro e o final, pois
quando a leitura termina, o que se
lembra é o fim. A história provoca
uma espécie de memória.
Por que hoje és o único critico
de teatro?
Tem um motivo histórico, que é
a virada do jornalismo cultural dos
anos 70, quando se adere ao modelo
da indústria cultural e se abandona
os suplementos culturais. Há poucos
remanescentes: Rascunho, do Paraná, Suplemento, de Minas Gerais. A
política literária ficou na academia.
O grande problema é que, daqui a
30 anos, quem quiser saber o que
ocorria na cena cultural de Porto
Alegre não vai ter onde buscar essas
informações.
Como a política entrou na
tua vida?
Eu sempre fui muito ligado à
política. Em 1974, escrevia no Correio, mas me incomodei com o Dops
(Departamento de Organização
Política e Social, do regime militar)
e a partir disso viajei para o Canadá.
Voltei em 1975, quando decidi participar da vida partidária, pois quando
Eu sou...
Curioso e organizado
Escrevo...
No meu Sítio.
Nas horas vagas leio...
Muita coisa, mas em especial poesia.
Livro de cabeceira:
Não tenho um especifico, leio de livros infantis até Gabriel Garcia
Marques.
Estou escrevendo no momento...
Sobre as palestras de cinema do projeto “Fronteiras do Pensamento”
Último livro infantil que escrevi...
“O velhinho que virou criança” – História do nascimento de Mário
Quintana até as primeiras namoradas.
Projetos futuros...
Estudar os jornais do período em que Portugal e Espanha estiveram unidos. Ver como foi a evolução do jornalismo em Portugal e no Brasil.
abertura 3
estava fora do Brasil convivi com
exilados políticos (brasileiros e chilenos). Havia muitos chilenos, pois
acabara de ocorrer o golpe (1973) do
General Pinochet, no país. Me filiei
ao PT, logo após seu surgimento, e
acabei sendo o primeiro vereador
do partido.
Ter sido governador do estado
influenciou nas outras atividades?
Sempre influencia, não sei exatamente em que, mais do que em
10 anos na universidade. Viajei
muito pelo Rio Grande, como vice,
conheci estruturas. Interfere, no
mínimo, como experiência de estar
do outro lado da comunicação, não
como jornalista, mas sendo fonte.
Ver como a autoridade tem que se
comportar junto ao jornalista, porque, às vezes, o mais importante eles
não perguntam.
Sendo político, escritor e
crítico, como administras essas
diferentes funções?
São momentos diferentes. Assim
que eu troco o espaço físico, eu também troco o registro, a cabeça. Para
fazer história infantil, tu tens que
mergulhar naquele mundo, naquela
lógica. Já me acostumei com essa
troca, pois desde muito cedo exerço
diferentes funções. O mercado de
livros para criança é interessante.
Obviamente, ninguém fica rico com
isso. Se eu me concentrasse mais, daria uma sobrevivência razoável, mas
como escrevo livros a cada dois/três
anos, tenho uma produção razoável,
nada que dê autonomia financeira.
Sobre a Feira do Livro de
Porto Alegre?
A diferença da feira do livro
daqui é que é na praça. Nos outros
lugares do mundo é em lugares fechados, paga-se ingresso para entrar.
Aqui, os escritores ficam no meio do
público. A criação da feira do livro
infanto-juvenil – no cais do porto - é
outra questão interessante. Tem programações especiais e a criança não
se perde no meio da feira. Os balaios
de livros é outro elemento de que
gosto muito, inclusive montei boa
parte de minha biblioteca a partir
deles. É um conjunto de elementos
que faz da feira de Porto Alegre um
evento especial.
Começa a 53ª
No dia 26 de outubro começou
a 53ª Feira do Livro de Porto Alegre.
O evento que ocorrerá até o dia
11 de novembro contará com 165
expositores: 117 na Área Geral, localizada na Praça da Alfândega, 31
na Área Infantil e Juvenil, no Cais do
Porto e 17 na Área Internacional, na
Avenida Sepúlveda. Além da venda
de livros, serão realizadas sessões de
autógrafos, oficinas e outros eventos
divulgados através da Voz do Poste,
um sistema de alto-falantes instalados na Praça da Alfândega. O horário de funcionamento se estenderá
das 13h às 21h, com entrada franca.
O espaço dedicado às crianças funcionará das 9h às 21h.
4 economia
Porto Alegre, outubro de 2007
hipertexto
Empresas gaúchas
As razões do sucesso e do crepúsculo
Grupos econômicos são vendidos para capital de fora, enquanto outros não param de crescer
Fotos Ingrid Guerra/ Hiper
Por Bernhard Friedrich Schlee
Sinônima de aviação comercial
por anos, a Viação Aérea Riograndense (Varig) surgiu no Rio
Grande do Sul em 1927 e por isso
era considerada gaúcha. Quase 80
anos depois, afundada em dívidas,
entrou em crise e, em julho de 2006,
foi comprada por outra companhia
aérea, a Gol. Deixou de ser gaúcha
e não foi a única. Nos últimos anos,
grandes e pequenas empresas nascidas no Estado foram engolidas:
o Grupo Ipiranga e a Caldas Júnior
são exemplos. Enquanto isso, outras
empresas genuínas do Rio Grande
do Sul conseguem sobreviver e,
ainda, progridem com sucesso como
o Grupo Gerdau. Por que tantas
empresas definham e são vendidas e
outras não param de crescer?
O Grupo Gerdau, um dos maiores produtores de aço do mundo e
maior empresa do sul do país (como
indica a revista Amanhã em sua
edição Grandes&Lìderes), expandiu
suas atividades, atuando em 13 países e, agora, volta sua atenção para a
Ásia. Além da Gerdau, ainda se pode
citar Borrachas Vipal, Grendene e o
Grupo RBS.
Entre os diversos fatores que
agem para que esse panorama ocorra, se destaca a globalização, por
criar uma competitividade muito
mais acirrada entre as empresas,
principalmente quando entra em
cena o mercado asiático, com seus
produtos de baixo custo. “Algumas
empresas que conseguem se preparar para conviver com a área internacional, como é o caso da Gerdau,
com base nos Estados Unidos e
em vários lugares, têm condições
para competir, e essa competitividade permite que possa concorrer”,
afirma Antônio Carlos Coitinho
Fraquelli, economista da Fundação
recortes
Professores
acorrentados
Uma comissão de professores,
servidores ligados à educação, alunos e pais representando o CpersSindicato ficaram seis horas, dia
11 de outubro, acorrentados em
frente ao Palácio Piratini até serem
recebidos pelo chefe da Casa Civil,
deputado Luiz Fernando Záchia.
Os manifestantes queriam
discutir com o governo questões
como investimento em educação, salários, falta de pessoal nas
Sinônimos de sucesso, Varig e Gerdau traçaram caminhos muito diferentes: a gaúcha da aviação enfrentou dura crise e a líder do aço não pára de crescer
de Economia e Estatística. Fraquelli
destaca ainda que é importante que a
empresa saiba se encaixar no contexto da globalização. “Se possuir uma
mentalidade regional, como algumas
empresas gaúchas, provavelmente
será engolida por uma organização
que cobre uma área nacional ou até
mesmo internacional”, prevê.
A inflação também é um agente
relevante. Ao ter que lidar com
uma inflação que atinge níveis astronômicos, como ocorreu no final
dos anos 1980, torna-se difícil criar
estratégias de mercado concretas.
Segundo Fraquelli, todas essas
empresas que conviveram com o
período da superinflação sofreram
as conseqüências. “Quando você
está voltado só para o mercado
interno, não tem referência externa,
corre apenas para equilibrar preços.
Não é o que acontece com a empresa
voltada para o exterior, como é o
caso da Gerdau”, exemplifica. As
empresas que atuam no mercado
interno, como a Varig, passam por
dificuldades nessas situações.
Apesar da série de fatores externos que interferem no rumo que
uma empresa toma, é, internamente,
ou seja, na sua própria gestão, que
se decide se ela afunda ou decola.
Se não possui capacidade de se
precaver, de agir de acordo com o
rumo do mercado financeiro, de
acompanhar a globalização, não
há nada que possa ser feito para
salvá-la, garantem os especialitas
de mercado. Assim algumas empresas gaúchas acabaram engolidas.
“As empresas gaúchas dormiram
em berço esplêndido porque não
perceberam ou não acreditaram ou
não se prepararam para o processo
de globalização da economia. A
economia, hoje, já é uma economia
global”, explica Leandro Antonio
de Lemos, professor da Faculdade
de Administração, Contabilidade e
Economia da PUCRS.
Ao mesmo tempo em que uma
empresa fecha suas portas devido à
ineficiência de gestão, outras obtêm
sucesso ao identificar a situação do
panorama econômico mundial e se
adequarem a ele. O diretor de redação da revista Amanhã, Eugênio
Esber, considera que o fator que
define o sucesso ou o fracasso da
organização é sua gestão: “Tudo se
resolve numa empresa, para o bem
e para o mal, pela gestão. Uma empresa que tem problemas financeiros
provavelmente é por má gestão.
Uma empresa com produto tecnologicamente defasado é por má gestão”. Para ele, o que vai determinar
o sucesso de umas e o fracasso de
outras é a qualidade das decisões que
uma empresa toma ao longo do tempo. “Seus gestores devem perceber
oportunidades e definir uma forma
correta de explorá-las. É importante
identificar ameaças e perceber de
que maneira neutralizá-las. Só assim,
cresce a capacidade da empresa de
construir vantagens em relação aos
concorrentes”, enumera..
Sem sotaque
O fato de uma empresa ser
gaúcha importa ou não? Esber é
da opinião de que se uma empresa
gaúcha não consegue competir,
e a alternativa de sobrevivência
é ser incorporada por um grupo
pernambucano, cearense, mineiro
ou paulista, as pessoas não darão
“a menor pelota” para o fato de ser
controlada por não-gaúchos. “Elas
querem é que a empresa invista no
Estado, gere empregos, recolha
impostos, movimentando a economia local, e seja próspera”, diz.
A “desgauchização” das empresas
também pode gerar alguns problemas, pois as de fora não possuem a
mesma preocupação social do que
as oriundas do próprio Estado. Lemos entende que algumas empresas
transnacionais não têm o vínculo
com a comunidade local e podem
destruir o meio-ambiente, o tecido
local de relacionamentos. “Pode ser
que essas empresas transnacionais
não tenham carinho, cuidado, esse
zelo de querer preservar e incentivar
a cultura local”, supõe.
O futuro das empresas gaúchas
é incerto. Não é possível dizer se
surgirão mais Varigs ou Gerdaus.
Depende delas e da habilidade de enfrentar os problemas, da capacidade
de gerenciar as crises e de aproveitar
as oportunidades. Quando sua competência ou ineficiência tornarem-se
evidentes, se saberá o caminho. As
crises sempre são precursoras da
falência de grandes empresas, mas
saber contorná-las é garantir a sobrevivência no mundo dos negócios.
É a aurora de um futuro promissor,
ou o crepúsculo.
Thais Silveira
escolas, além do pacote contra o
déficit do Estado. Záchia explicou,
após receber ofício como pedido
de agendamento da conversa, que
os servidores serão recebidos pelo
governo. Parte do grupo permaneceu na Capital para participar do 20°
Encontro de Educação do CpersSindicato, de 11 a 14 de outubro, no
Teatro Dante Barone, na Assembléia
Legislativa.
País das indenizações
Para cada jornalista que trabalha
nos cinco principais grupos de comunicação brasileiros (Folha de S.
Paulo, Organizações Globo, Grupo
Abril, O Estado de S. Paulo e Editora Três), existe cerca de um pedido
de indenização de pessoas citadas
em reportagens. Se a estimativa da
ONG “Article 19”, de Londres, for
comprovada, o Brasil baterá o recorde mundial. Segundo o editor do
site que realizou a pesquisa, Márcio
Chaer, os processos caíram de 3.342
para 3.133 entre 2003 e 2007, mas o
valor médio das indenizações subiu
de R$ 20 mil para R$ 80 mil.
Tragédia em
Santa Catarina
A segunda maior tragédia rodoviária do Sul do Brasil ocorreu em
Santa Catarina na noite do dia 9 de
outubro. Na BR-282, em Descanso,
no sentido São Miguel do Oeste-Maravilha, dois acidentes mataram 27
pessoas e deixaram 88 feridos.
A primeira colisão foi entre um
ônibus e uma carreta onde morreram 11 pessoas e outras 40 ficaram
feridas. Logo após, policiais rodoviários e bombeiros chegaram ao local
e sinalizaram a rodovia. Duas horas
depois, um caminhão MercedesBenz, guiado por Rosinei Ferrari
a mais de 100km/h, ignorou os
cones sinalizadores, trafegou por
pelo menos 1,5 quilômetro na
contramão, colidiu em uma ambulância, arrastou dois caminhões de
bombeiros e um guincho, matando
16 pessoas e ferindo mais 50. Entre
os atingidos, policiais, bombeiros,
socorristas, médicos, enfermeiros
que prestavam socorros a vítimas
do outro acidente e repórteres que
faziam cobertura.
hipertexto
mundo 5
Porto Alegre, outubro de 2007
Crônica da China
Os estranhos carros de Pequim
Por Rafael Codonho
Lembranças da China
Para conhecer uma cidade e
seus habitantes, a melhor escolha é
conversar com o taxista. Na China,
não é diferente. Os motoristas de
táxi de Pequim gostam de bater papo
com os estrangeiros, mas o sotaque,
recheado de “erres”, dificulta um
pouco. Uma coisa engraçada é que
ao menor “ni hao” (oi, em chinês), o
interlocutor nem pensa em reduzir a
velocidade da fala ou evitar palavras
difíceis. Resta sorrir e concordar,
além de supor que a pessoa seria
incapaz de estar te xingando. A
bandeirada na capital chinesa custa
10 yuans (R$ 2,40) e é mantida por
bastante tempo, até chegar a um
limite e começar a aumentar o preço. Como a tarifa do metrô custa 4
yuans (R$ 0,96), o táxi é uma boa
escolha para curta e média distâncias
e, é claro, quando não tem trânsito
congestionado.
O taxista de Pequim é conhecido por seu mau humor, mandarim
difícil de ser entendido e picaretagem. Comprovei os três. Quando
se deparam com um estrangeiro,
geralmente pensam ser um turista
recém-chegado e há grande possibilidade de terem o maior lucro possível. Eles dão voltas e mais voltas
e pegam os caminhos mais longos.
Um amigo de Seattle volta para casa
com amigos chineses e, após todos
serem deixados em casa, ele indicou
o endereço para o taxista. Passou alguns segundos e o motorista apertou
um botão que acelera o taxímetro. O
norte-americano recém-chegado a
Pequim, como estava sozinho, preferiu evitar problemas e pagou o preço
exorbitante. Quando o passageiro
desceu do carro, o taxista retirou a
placa “táxi” do carro e a guardou.
Era um táxi falso.
Na China, há outro tipo de táxi,
chamado heiche (carro negro). O
“negro” indica do que se trata: é
táxi ilegal. Parece um carro normal,
não há indicadores de que se tratar
de um táxi. Costumam ficar perto
de faculdades, shoppings, estações
de trem, entre outros locais movimentados. Quando alguém chega
perto, oferecem a corrida com certa
discrição. A polícia, ao se deparar
com um carro negro, não hesita em
prender o motorista. A vantagem
do táxi ilegal é que o preço pode
ser determinado antes, isto é, não
há mais perigo de ser enrolado com
muitas voltas.
No cenário chinês, existem as
sanlunche (carro de três rodas), que
circulam em todas as cidades que
visitei. São adaptações de bicicletas
e motos para comportar de dois a
quatro passageiros. O preço varia
conforme a quantidade de pessoas
e costuma ser três vezes mais barato
que o táxi convencional. São adequadas para conhecer a paisagem da
cidade e percorrer distâncias curtas,
mas cada uma tem seu potencial: a
bicicleta oferece um passeio de volta
ao tempo; a moto é ágil e costura o já
complicado trânsito. As vantagens se
contrapõem com sua fragilidade. Há
menos de três anos, uma estudante
da minha universidade foi vítima fatal de um acidente, enquanto estava
no veículo.
Geralmente, os motoristas dessas bicicletas e mototáxis migraram
do interior, onde eram camponeses.
Nas cidades, encontram um trabalho
mais rentável. Em Pequim, a maioria
desses veículos é ilegal e, com freqüência, são apreendidos pela polícia.
Na capital chinesa, apenas em poucos pontos turísticos, o veículo é
legalizado e o preço supera o do táxi
por ser exótico. Em outras cidades,
como Changxing, no interior da
província de Zhejiang, sudeste da
China, os motoristas vestem uniformes, seguindo a lei que autoriza
a profissão.
A experiência com estes motoristas faz com que os estrangeiros
sempre perguntem antes o preço da
corrida. Quando isto não ocorre, a
Fotos Rafael Codonho/ Hiper
Mototáxi, um dos múltiplos veículos da cidade, circula próximo à Universidade de Comunicação da China
chance de haver inflação é grande e
foi isto que aconteceu comigo diversas vezes. Na mais emblemática,
quando cheguei ao ponto desejado,
ofereci ao condutor mais do que
o normal, devido ao esforço em
pedalar. O que se assemelhava a um
esboço de felicidade foi transformado quando ele desceu da bicicleta e
indicou oito com a mão, exigindo 8
yuans, quase o equivalente ao preço
de um táxi normal. Respondi que
não ia pagar tanto, pois sempre me
locomovia com este veículo e sabia
o preço. Ele começou a ficar mais
nervoso e gritou que eram duas
pessoas. Vendo que ele parecia estar
fora de controle, entreguei 10 yuans
e falei que ficasse com o troco. Uma
retirada covarde.
As histórias nem sempre são
cômicas. Um senhor muito idoso,
com o corpo visivelmente debilitado, mantinha uma bicicleta-táxi
e trabalhava todos os dias. O preço
cobrado por ele era abaixo dos seus
colegas. Certo dia, se envolveu num
acidente e quebrou a perna. Além de
ficar meses sem trabalhar, gastou 10
mil yuans (R$ 2.400) no tratamento,
sem nenhum apoio do sistema de
saúde pública, que cobre apenas os
funcionários do governo.
Foto Vinicius Carvalho/ Hiper
Feira das Profissões reúne milhares de jovens
Mais de 16 mil pessoas visitaram os estandes da Feira das
Profissões 2007 da PUCRS. O
público teve a oportunidade de
conhecer detalhes sobre os 71
cursos da Instituição e conferir o
desafio de robôs, experimentos do
Museu de Ciências e Tecnologia,
atividades do Parque Esportivo,
entre outros. Também foi realizado o Concurso Vestibular Simulado da PUCRS, que teve mais de
2 mil participantes. Os estudantes
responderam a 45 questões inéditas, das 9h às 12h, simultaneamente no Campus Central e nas
cidades de Uruguaiana, Alegrete,
Quaraí e Itaqui. Após, as questões
foram comentadas e corrigidas
pelos professores. Todos os que
fizeram o simulado terão direito a
um desconto de 50% na inscrição
do Vestibular de Verão da PUCRS.
(Thais Silveira)
6 sociedade
Porto Alegre, outubro de 2007
Lei Seca,
os dois lados
da polêmica
Secretário gaúcho de Segurança
propõe uma Lei Seca para combater
a violência, a exemplo do que fez
a cidade paulista de Diadema. Críticos
asseguram que não basta a medida
Por Fernando Rotta Weigert
Álcool é sinônimo de violência?
A Organização Mundial da Saúde
(OMS) registra que 78% das mortes
em acidentes de trânsito no Brasil
têm a presença de uso de bebidas
alcoólicas. Uma em cada três pessoas que morre na região da Grande
Porto Alegre apresenta álcool no
sangue. Além de ser responsável por
mais de 60 doenças. Todos estes motivos avalizam o secretário da Segurança, José Francisco Mallmann, em
sua cruzada pela aprovação de uma
“Lei Seca” para todo o Estado.
A idéia inicial do secretário
era que os dez municípios mais
violentos fizessem leis municipais,
proibindo o consumo de bebidas
alcoólicas, da meia-noite às seis
da manhã, nos finais de semana.
Depois de encontrar resistência nas
cidades, Mallmann decidiu criar uma
lei estadual.
O esboço da lei prevê a restrição
à venda de bebidas alcoólicas, de
domingo a quinta, a partir da meianoite. Nas sextas, sábados e feriados,
depois da uma hora da manhã. A
proposta continua em discussão,
sem que o governo do Estado a
adote e a converta em projeto de lei.
O secretário de Segurança defende a
proposta com base em uma experiência no interior de São Paulo.
A cidade paulista de Diadema
era uma das mais violentas do Brasil,
e hoje é um exemplo de segurança
pública, segundo dados do Sindicato
hipertexto
Laís Cerutti Scortegagna/ Hiper
Idéia de 1919
Proposta é restringir o horário de venda de bebida alcoólica no Estado
Médico do Rio Grande do Sul (Simers). No município, como explica
Ana Maria Martins, coordenadora
das Políticas Públicas para o Álcool
do Simers, a Lei de Fechamento de
Bares fui estipulada às 23h. “Antes
de colocar a lei em prática, a secretária de Segurança de Diadema, Regina
Miki, fez mais de 100 reuniões com a
comunidade para discutir a questão
e obter apoio. Depois do amplo
debate, instituíram então a lei com
fiscalização”, assegura Ana Maria.
A fiscalização ocorre de forma
aleatória. Para o estabelecimento
ser fechado definitivamente tem
que sofrer quatro autuações. Hoje,
dos 4,8 mil bares da cidade, apenas
32 funcionam durante o horário de
restrição, pois cumprem os requisitos impostos pela Prefeitura, como
segurança própria e isolamento
acústico.
Contudo, os resultados da restrição à venda de bebidas naquela
cidade são contestados. “É uma
falácia o modo como a Lei Seca de
Diadema é apresentada por aqueles
que estão de acordo com a medida”,
reage Daniel Antoniolli, presidente
do Sindicato dos Hotéis, Bares,
Restaurantes e Similares de Porto
Alegre. “O que aconteceu naquela
cidade foi uma mudança estrutural
na polícia. Os índices de violência já
eram menores dois anos antes de ser
implantada a medida”.
A deputada estadual Stela Farias
(PT) também se posiciona contrária ao secretário e alega que a lei
como única medida de segurança
pública não basta. Lembra que, em
Diadema, a ação funcionou, pois
não foi isolada, houve um amplo
levantamento da criminalidade e um
investimento pesado na inteligência
da Polícia. “Dizer que a lei seca
diminuiu a violência é simplificar o
caso”, contrapõe.
No Estado
Dos mais de 400 municípios
gaúchos, apenas quatro aderiram à
sugestão do secretário: Dois Irmãos,
Santa Rosa, Canela e Vacaria. Em
Canela, restaurantes e estabelecimento que funcionam dentro de
hotéis e pousadas, base do turismo,
ficam fora da restrição de horário.
Bares e lanchonetes só poderão
funcionar até 22 horas, reabrindo às
6 horas. Boates e danceterias ficam
abertas até às 22h de segunda a quinta, domingo e feriado. Sexta, sábado
e véspera de feriado, funcionam até
as 4 horas. Lanchonetes, casas de chá
e de sucos servem bebida alcoólica
até às 22 horas, podendo funcionar
até a meia-noite. “Ao respeitar situações peculiares, Canela fortalece
a legislação”, lembra Floriovaldo
Nunes, diretor de Relações Comunitárias da SSP, em entrevista ao site do
Simers. Para Antoniolli, aprovar a lei
em cidades que têm ampla atividade
comercial durante a noite é provocar
o fim da vida noturna do lugar.
A Assembléia Legislativa está
dividida quanto à medida. Para a
deputada Stela Farias, falta uma
política de Estado para combater
a violência. “Em Diadema, por
exemplo, a cultura de paz passa por
todas as secretarias. No Rio Grande
do Sul, cada vez que entra um novo
secretário, ele vem com uma medida
salvadora, a lei simplesmente não
adianta”, rechaça a parlamentar. O
deputado Giovani Cherini (PDT),
em artigo, defendeu a medida, pois
O termo “Lei Seca” é mundialmente famoso porque, em
1919, os Estados Unidos adotaram a restrição à bebida álcoolica.
A lei que vigorou naquele país
por quase 14 anos condenava
a fabricação, venda, transporte,
importação e exportação de bebidas alcoólicas em toda a área dos
EUA e dos territórios judicialmente submetidos a eles. Entretanto, a medida foi amplamente
burlada. Criaram-se fábricas de
bebidas clandestinas, e o crime
organizado viu no contrabando
uma oportunidade de faturar altas
quantias. A cidade mais afetada
pelos gansters foi Chicago. O
grande chefão da Máfia naquela
época, Al Capone, no entanto
somente pôde ser acusado de
sonegação de impostos, pois a
justiça se mostrou incapaz de
reunir provas criminais contra
ele. Em dezembro de 1933, o
presidente Franklin Roosevelt
revogou a lei, levando boa parte
dos delinqüentes à falência.
crê que ela terá um efeito imediato.
“Apenas quatro municípios gaúchos
adotaram a medida: Canela, Vacaria,
Santa Rosa e Dois Irmãos, estes dois
últimos com registro de redução de
50% nos delitos”.
O país hoje gasta 7,3% do Produto Interno Bruto (PIB) com perdas causadas pelo álcool, e a indústria de bebidas recolhe apenas 3,5%,
conforme o Simers. Mas Diadema
é o único município que mostra
êxito na questão. Em Recife, a única
capital em se tentou implantar a lei,
um ano depois foi revogada. Faltou
fiscalização e também se formou um
comércio paralelo de bebidas, o que
baixou a qualidade do produto.
Os opositores à medida alegam
que outras leis já existem, como as
que proíbem a venda de bebidas
alcoólicas para menores de idade e
dirigir após ter bebido. O presidente do Sindicato dos Hotéis, Bares,
Restaurantes e Similares lembra que
a polícia não tem contingente para
defender a população, logo, como
fará para controlar a venda de bebidas? Os defensores rebatem dizendo
que ela terá um efeito imediato, pois
será proibida a venda para todos, e as
prefeituras poderão firmar acordos
com a SSP para fiscalizar os estabelecimentos.
Enquanto a polêmica segue,
vale lembrar que Diadema, quando
aprovou a lei, tinha 80 % da população favorável à medida, o que não
acontece no Estado. O município
paulista é considerado uma cidade
dormitório e tem em média 380 mil
habitantes. As grandes cidades do
Estado, como Porto Alegre e Caxias,
têm populações maiores e intensa
vida noturna. Por enquanto, a Lei
Seca segue em discussão, mas o que
se nota é que onde ela já é fato não
há consenso sobre sua eficácia.
hipertexto
diversão 7
Porto Alegre, outubro de 2007
Gabriela Oliveira/ Hiper
Seminário alerta para o uso
de álcool na adolescência
Por Luciana Birck
Os jovens começam a ingerir
bebidas alcoólicas cada vez mais
cedo. As conseqüências são aumento
de acidentes de trânsito, da violência, de brigas, principalmente nas
madrugadas dos finais de semana.
O consumo excessivo de bebidas alcoólicas e suas conseqüências foram
debatidos no 3º Fórum Qualidade
de Vida e Saúde, realizado dias 4
e 5 de outubro, em Porto Alegre.
Uma das palestrantes foi a psiquiatra
Analice Gigliotti, que contextualizou
o problema: “Vivemos no país que
é o terceiro maior produtor de bebidas alcoólicas do mundo. Aqui se
compra e se consome bebidas sem
fiscalização efetiva. Diante disso, é
complicado controlar o abuso do
consumo de álcool”.
O problema do álcool inicia
com o consumo social. “Os jovens
começam a beber para fazer parte
de um grupo, por curiosidade,
prazer, influência dos pais, pela
cultura do beber social ou por incontáveis motivos. O uso precoce
da bebida está ligado às maiores
causas de morte na adolescência”,
alertou o psiquiatra Félix Kessler.
Ele explica que quanto mais cedo o
Vinícius Carvalho/Hiper
Mallmann: cruzada contra bebida
jovem tem contato com as drogas,
mais cedo seu cérebro assimila. “O
prazer imediato, sem postergação,
torna-se um hábito, um valor”. Ele
chama a atenção das pessoas para as
propagandas de bebidas alcoólicas
que trazem personagens infantis.
As crianças são estimuladas desde
cedo, preparadas psicologicamente
para consumir bebidas. Quando
chegam à adolescência já estão com
a idéia de que beber cerveja é legal.
“Estatísticas mostram que crianças e
adolescentes começam a beber entre
10 e 12 anos. Precisamos reverter
essa situação”, propõe.
Com o cigarro quase banido do
convívio social, agora é o álcool que
ultrapassa os limites da conveniência.
Os críticos alertam que ele não é pe-
rigoso só para quem bebe. Qualquer
pessoa pode sofrer as conseqüências
da violência e dos acidentes de trânsito causados pelo consumo abusivo
de álcool. O promotor de Justiça
do Ministério Público Estadual da
Infância e Juventude, Miguel Velásquez, acredita que o álcool possa ter
o mesmo destino do cigarro. “Há
algum tempo, as pessoas diziam ser
impossível combater o fumo, porque
fumar era uma questão cultural. O álcool caminha nesse sentido. Há pouco tempo era glamourizado e agora
passa a ser visto como nocivo”.
O álcool é causador de mais de
60 doenças, segundo o Sindicato
Médico do Rio Grande do Sul
(Simers). Entre elas, estão cirrose,
demência, miocardite, desnutrição,
hipertensão arterial, infarto e certos
tipos de cânceres. As propagandas de
bebidas mostram o lado descolado,
divertido e prazeroso de beber com
os amigos e fazem questão de não
alertar os consumidores para os riscos da ingestão de bebidas alcoólicas.
A propaganda é eficiente na venda
de bebidas, mas o problema está no
fato de que o enfoque são os jovens,
principais vítimas de acidentes e
mortes causadas pelo álcool. Hoje
já existem campanhas que informam
as pessoas sobre o perigo do abuso
alcoólico, mas não são suficientes
para conscientizar a sociedade.
O médico Jairo Bouer critica a
legislação brasileira: “Há um exagero
na publicidade. Teria que ter uma regulamentação maior. Só existem leis
rigorosas para bebidas de alto teor
alcoólico. As de baixo teor nem são
consideradas como bebidas”. Para
ele, é irreal pensar em uma sociedade
sem álcool. “É preciso fazer com
que o jovem aprenda a beber. Essa
situação que estamos vivendo só será
revertida quando cada um entender
os riscos do álcool.”
No 3º Fórum Qualidade de Vida,
foram levantadas algumas soluções
como a redução da oferta de bebidas alcoólicas, dificultar as vendas,
restringir a propaganda focada nos
jovens e criar campanhas de conscientização dos males causados pela
bebida. José Francisco Mallmann,
secretário de Segurança do Estado,
finalizou o evento sugerindo que
a Lei Seca seja adotada e que haja
uma fiscalização eficaz. Para isso, o
dinheiro arrecadado com multas deveria ser revertido para a própria polícia. Mallmann exemplifica: “Quando o uso do cinto de segurança em
automóveis se tornou obrigatório,
as pessoas se obrigaram a usá-lo,
porque havia fiscalização e multa
para quem desobedecesse a lei. O
que aconteceu? Hoje há a cultura do
uso do cinto. Pode ser assim também
com o problema do alto consumo de
bebidas alcoólicas. Cria-se uma lei e
aplicam-se multas pesadas em quem
deixar de cumpri-la”.
Pepsi on Stage
O chão
tremeu ao
som de Black
Eyed Peas
A musa da música Pop, Fergie, em apresentação no Pepsi on Stage ao lado dos companheiros do Black Eyed Peas
Por Camila Rinaldi
Quatro mil e cem metros quadrados. Capacidade para seis mil
pessoas. Lounge, pista e treze metros
de palco. Uma mega infra-estrutura,
igualada a lugares como Amsterdã,
na Holanda, Albany e Indianápolis,
nos Estados Unidos, também em
Porto Alegre.
Estas e outras vantagens estão
no Pepsi On Stage. Localizado na
Avenida Severo Dullius, n.º1995, em
frente ao Aeroporto Salgado Filho, é
o local de grandes produções, shows
nacionais e internacionais da Capital.
Ali houve a única apresentação da
banda americana Black Eyed Peas
no país em 2 de outubro, no Pepsi
On Stage.
Com direito a tombos e canções
de outras bandas como Sweet Child
O´Mine, do Guns N´Roses, o Black
Eyed Peas oferece três turnês em
uma. Como assim? Além das músicas com Apl.de.ap e Taboo, Fergie
e Will.I.am estão construindo uma
sólida carreira solo. Durante o show,
que diga-se de passagem teve um
inicio britânico, a cantora mostrou
canções do seu álbum solo The
Dutchess, pelo qual recebeu, durante
a coletiva de imprensa, o disco de
ouro conquistado com a venda de
50 mil cópias só no Brasil. Entre os
sucessos estavam: Glamorous, Big
Girls don´t Cry, London Bridge e
Fergalicious. Will.I.am, que acabou
de lançar Songs About Girls, cantou
a música de trabalho: I got it from
my Mama.
Com um público estimado de
três mil pessoas, grande parte formada por jovens entre nove e 14 anos,
acompanhados pelos pais, a turnê
Black, Blue and You foi embalada
pelos maiores sucessos da quarteto.
O chão tremeu ao som de Shut up,
Let´s get Started, Don’t Phunk with
my Heart, My Humps, Pump it,
Where is the Love?, e Hey Mama,
está última uma parceria com o brasileiro Sérgio Mendes.
Pitada brazuca
Os guris da Banda Mr. Marx subiram ao palco um pouco depois da
metade do show para cantar a música
More ao lado dos integrantes do
BEP. O baixista Alexandre Martins,
18 anos, o baterista Luis Fernando
Martins, 14, o guitarrista Hikari Sacamoto, 19, e o vocalista Guilherme
Brodt, 18, foram os vencedores de
um concurso de bandas de colégios
da Capital, promovido em agosto,
numa parceria entre a Pepsi e o
Kzuka. “Fiquei sabendo do concurso
e a gente foi tocar no colégio. Uma
semana depois já estávamos na final,
aí entramos no concurso, tocamos e
estamos aqui... é uma loucura!”, diz
Luis Fernando.
No palco, a versão rock de More
feita pelos gaúchos não pôde ser
bem entendida pelo público, devido
à acústica do local e aos ensaios que
não ocorreram. Contudo, percebia-se a excitação e a incredulidade
dos meninos no palco. A tensão
era tamanha que Fergie, vocalista
do BEP, tentava se aproximar dos
garotos para cantar abraçada a eles,
mas os quatro não conseguiam sair
do lugar e pareciam estar grudados
feito irmãos siameses.
Acústica
Com estrutura de acesso para
pessoas com necessidades especiais,
como rampas e banheiros adaptados,
equipamentos de segurança, ambulância equipada e apta a prestar os
primeiros socorros e estacionamento
com e sem manobrista, o Pepsi On
Stage parece um local ideal para shows do porte de bandas como Black
Eyed Peas, porém, peca no quesito
qualidade sonora.
8 natureza
Porto Alegre, outubro de 2007
Meio ambiente
ganhou pauta
no jornalismo
hipertexto
Foto Fernanda Corrêa/ Hiper
A imprensa supera o preconceito
e investe na cobertura do assunto
Por Tatiana Feldens
“As mudanças no clima do planeta só entraram na agenda internacional quando a imprensa superou o
preconceito para com ambientalistas
e cientistas e se engajou na cobertura
do tema. Deu-lhe primeiras páginas,
investiu na procura de especialistas
e destacou cenários sombrios do
IPCC, grupo de cientistas reunidos
pela Organização das Nações Unidas (ONU) para avaliar a questão.
Resultado: a opinião pública, os
políticos, os gestores públicos e as
grandes empresas privadas finalmente se pronunciaram, e o assunto
não sai mais da pauta”.
A afirmação do jornalista Carlos
Tautz, da Rede Brasileira de Jornalismo Ambiental, resume a questão
central abordada pelo 2º Congresso
Brasileiro de Jornalismo Ambiental,
realizado na segunda semana de
outubro na Universidade Federal do
Rio Grande do Sul, em Porto Alegre, e o tratamento dispensado pela
mídia impressa às questões com o
agravamento dos efeitos produzidos
pelo aquecimento global no mundo.
Muitas críticas foram tecidas aos
meios de comunicação. Profissionais
do Estado, do Brasil e, até mesmo
do exterior, conduziram o debate ao
longo dos três dias de Congresso.
O jornalista Eduardo Geraque,
do caderno de Ciências do jornal
Folha de São Paulo, compara a mídia
de São Paulo com a da Cidade do
México (México). “Naquele país,
as discussões sobre meio ambiente
estão mais presentes. Quando há
eleição, questionam-se as políticas
ambientais que serão adotadas pelos candidatos”. Segundo Geraque,
ao contrário da mídia brasileira, a
mexicana se envolve com qualquer
medida adotada pelos governantes.
O jornalista atribui isso ao fato de
que, na Cidade do México, a cultura
ambiental faz parte do dia-a-dia das
pessoas, que se mobilizaram, a partir
da década de 80, em decorrência dos
altos níveis de poluição.
Nas redações dos jornais brasileiros, “não existe alguém pensando a questão ambiental”, explica
Geraque, acrescentando que, “além
da cobertura não ser constante, é
muito fragmentada”. No México,
há repórter e editor voltados apenas
para meio ambiente, mesmo que não
haja um espaço físico reservado,
diariamente, específico para isso.
“Os jornalistas são incentivados a
escrever sobre o tema para as demais
editorias e há uma cobrança do leitor pela publicação dessas matérias.
Nenhum dos jornais de grande
circulação do país – Folha, Estadão
e Globo – lança mão do sistema”,
aponta Geraque.
Falta “olhar sistêmico” dos
profissionais brasileiros, por isso
“a cobertura ambiental é muito mal
feita na imprensa de hoje. Falta o
repórter interligar os fatos com as
questões sociais, culturais e econômicas do país. Falta trazer a questão
para o dia a dia do leitor”. Segundo
ele, é preciso construir uma cultura
em que o problema ambiental tenha
trânsito livre na temática ecológica
das redações e não seja abordado
apenas quando grandes desastres
acontecem.
Parcialidade
Wilson da Costa Bueno, jornalista e professor da Pós-graduação
em Comunicação Social da UMESP
e do curso de jornalismo da ECA/
SP, conhecido pela posição crítica,
destacou quatro síndromes que
considera “as mais dramáticas do
ponto de vista da nossa cobertura
ambiental: a síndrome da isenção,
do zoom, do bandaide e da baleia
encalhada”. O jornalista acredita que
a pretensa objetividade jornalística
acaba por tornar a cobertura ambiental despolitizada. “Ser imparcial
e ouvir todos os lados é impossível.
No jornalismo ambiental é preciso
assumir posição”, pondera.
Bueno critica a proposta de
jornalismo isento na cobertura de
questões ambientais. “Não existem
fontes isentas tentando passar as
duas visões de uma mesma questão.
Sempre estão comprometidas com
algo ou com alguma empresa. É
preciso sempre verificar quem de
fato são as fontes”. Assim como
Geraque, cobrou uma abordagem
globalizada (zoom maior) dos assuntos tratados. “Precisamos parar de
ver a questão ambiental meramente
pela visão econômica. É preciso
ser sistêmica”. Bueno exemplifica
com a questão dos biocombustíveis.
“Propagam os benefícios do etanol,
mas não associam que cada vez mais
incentivam o uso do automóvel. Para
atingir a sustentabilidade é preciso
ensinar a não usar”, alerta.
Outra síndrome apontada pelo
jornalista diz respeito às soluções
Eduardo Geraque, da Folha de SP, e Wilson da Costa Bueno, da USP, palestraram no segundo dia do Congresso
cosméticas propagadas pelos meios
de comunicação. “Não é possível
que ainda se privilegie o conserto
às abordagens educativas”, sintetiza
Bueno. A notícia inusitada e esotérica continua sendo mais importante.
“A mídia nunca deixa de noticiar a
baleia que encalhou, mas não discute a pesca indiscriminada desses
animais”, critica.
Bueno apresentou uma pesquisa
que realiza sobre o “Meio Ambiente
na Mídia Impressa’, focando a Folha
de São Paulo, o Estadão, O Globo
e JB. Constatou que os homens
dominam a cobertura das questões
ambientais, “o que significa que perdemos e muito do olhar feminino e
isso faz muita diferença”. De acordo
com o estudo, a maioria dos artigos
feitos por colaboradores são assinados por professores, jornalistas,
políticos e autoridades. “Artigos es-
critos por representantes de ONGs
são muito reduzidos”, informa. Para
ele, o jornalista ambiental deve estar
comprometido com o leitor e não
com determinadas empresas. “Não
adianta o profissional que atua na
editoria de Economia achar que
plantação de eucalipto é floresta.
Também não há qualquer avanço
se, no caderno de Ciência e Tecnologia, forem entrevistados somente
cientistas e não ter uma visão social,
com olhar voltado para o povo e o
meio ambiente”.
Ocupação da Amazônia
A cobertura das mudanças climáticas sob o ponto de vista brasileiro “é um desafio que vai deixar
a mídia com muita dor de cabeça”.
A opinião é do britânico Adrian
Cowell, que se dedica a documentar
a destruição da floresta amazônica.
O documentarista apresentou, no
Congresso, partes de filmes em que
reconstituiu os principais eventos
que marcaram a ocupação da Amazônica por agricultores, promovida
pelo regime militar, a partir da década de 80, até a situação atual, em que
o governo tenta delinear estratégias
de monitoramento e melhoria do
aproveitamento de áreas, ao mesmo
tempo em que luta contra a depleção
causada pelas madeireiras e pela
criação extensiva de gado.
Na avaliação do jornalista uruguaio Vitor Bacchetta, da Rede de
Comunicação Ambiental da América latina e do Caribe (CALC), o
desafio para o jornalismo ambiental
é contribuir para a tomada de consciência e abrir caminho em direção a
mudanças de verdade, em harmonia
com o ambiente, com equidade e
justiça social.
Conselho Tutelar
Novos guardiões dos direitos das crianças
Por Ariane Jorej
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) diz que o Conselho
Tutelar dever ser o guardião dos direitos nele consignados. Conscientes
disso, em 30 de setembro, quase 70
mil pessoas escolheram os novos
conselheiros tutelares que deverão
atuar até 2010, em Porto Alegre.
Mais de 450 candidatos disputaram
as 50 vagas disponíveis. O voto não
era obrigatório, mas os votantes estavam cientes da importância desse
ato. Crianças e adolescentes em situação de rua é um problema social, e o
conselheiro tutelar existe para atuar
em benefício da sociedade.
Algumas inovações na escolha
dos novos conselheiros foram postas
em prática, como exigir que os candidatos tenham o ensino fundamental
completo e um certificado de 80
horas em cursos, seminários ou palestras sobre o tema da criança e do
adolescente. Antes, não era exigido
nenhum grau de escolaridade como
pré-requisito, qualquer pessoa podia
se candidatar.
O líder da bancada do PT na
Câmara Municipal de Porto Alegre,
Adeli Sell, acredita que a qualificação do conselheiro ainda não é a
ideal. “Atualmente, a qualificação é
péssima. Talvez melhore um pouco
agora, depois da nova lei que aprovamos aqui, com exame sem consulta,
tanto que vários conselheiros atuais
nem passaram na prova”, ressaltou o
vereador. Mas passar em um exame
não significa garantia de ser um bom
conselheiro. O próprio vereador
afirma que há casos envolvendo
conselheiros com drogas lícitas.
“Temos denúncias de conselheiros
que têm problemas de alcoolismo,
o que é uma patologia, teria que ser
tratada, uma pessoa assim não tem
condições de exercer devidamente
sua função”, afirmou Adeli.
Os integrantes do Conselho
atuam, principalmente, a partir do
recebimento de denúncias de violação de direitos, como violência física,
psicológica e sexual, negligência e
abandono. Verificados elementos de
descuido familiar, agressões ou abusos sexuais, os conselheiros devem
buscar, nas Promotorias Especiais
da Criança e do Adolescente do
Ministério Público, apoio para levar
adiante os processos. Além disso,
devem denunciar essas questões
ao Departamento da Criança e do
Adolescente (DECA).
O conselheiro pode ser reeleito
somente uma vez. O salário de um
conselheiro ultrapassa os R$ 4 mil,
com vale-transporte e vale-refeição.
O plantão centralizado do Conselho
Tutelar funciona em horário comercial no Centro de Porto Alegre, na
Rua Demétrio Ribeiro, 581, e tem
um plantão noturno e nos finais de
semana.
hipertexto
artes 9
Porto Alegre, outubro de 2007
Inspiração e sensibilidade com os pés
Artista plástica expôs na Câmara de Vereadores, seu talento especial ao pintar telas
Fernanda Fell/ Hiper
Por: Patrícia Lima
Nascer sem os membros superiores não a deixou incapaz de ser
feliz e levar a vida como as pessoas
que se dizem “perfeitas”, conta a
artista plástica Rita Boz, que pinta
quadros com os pés. Aos 43 anos,
ela é um exemplo de superação da
dificuldade.
A gaúcha de Flores da Cunha
vive há 20 anos em Palhoça, Santa
Catarina. Vítima da Talidomida,
medicamento ingerido por gestantes
com efeito colateral que provoca
danos físicos ao feto, Rita não possui os braços, porém, não se privou
de casar, ter uma filha, hoje com
16 anos, cuidar da casa e trabalhar
fora. “Quando a menina nasceu,
cuidava dela com os pés, sempre
fiz todo o trabalho de casa com os
pés”, revelou.
A arte surgiu aos 38 anos, quando, nas folgas do trabalho como
telefonista de um banco em Florianópolis, fazia rabiscos e recebia
incentivos dos colegas para fazer
um curso. Por meio da Associação
dos Pintores com a Boca e os Pés
(APBP), realizou um curso de dois
meses para obter conhecimentos
básicos de sombra, luz e aproximação. A partir daí, desenvolveu uma
técnica própria utilizando tinta a
óleo e colagens.
Obras abstratas
Os quadros de Rita, todos pintados com os pés, variam do abstrato
ao figurativo, retratando paisagens,
elementos da natureza e imagens
sem forma definitiva. “Não gosto
de me inspirar em ninguém, prefiro fazer o que me vem à cabeça.
Quando surge a inspiração vou
criando”. diz.
Suas obras são conhecidas e vendidas em vários países do mundo,
como Alemanha, Itália e Portugal,
através da ABPB, que mantém sua
filial na Suíça. “No começo pintava
a óleo e eram telas mais figurativas.
Depois, pela necessidade de enviálas ao exterior e a tinta a óleo demorar muito mais tempo na secagem,
mudei a técnica para tinta acrílica.
Agora, já faço um trabalho mais
abstrato”, explica.
A artista exibe suas telas re-
gularmente em Florianópolis e já
fez exposições em Curitiba. Em
setembro, esteve em Porto Alegre,
quando divulgou seu trabalho na
Câmara dos Vereadores e vendeu
quase todas as obras. Ela conta que
gosta de ser convidada para palestrar
em escolas, pois tem a possibilidade
de incentivar outras pessoas a fazer
alguma arte.
“Meu trabalho é voltado para o
social, para as pessoas se sensibilizarem e verem que muitas pessoas que
têm todas as condições e se dizem
perfeitas, muitas vezes, não são felizes. Mesmo tendo uma deficiência, a
gente pode ser feliz e passar isso para
outras pessoas”, conclui Rita.
Rita Boz superou limitação física e produz quadros usando os pés
Associação reúne artistas em 60 países
Fundada por Arnulf Erich
Stegman, em 1956, no Principado
de Leichtenstein, a Associação
de Pintores com a Boca e os Pés
(APBP) não é uma associação beneficente, mas sim uma sociedade
de membros especiais importantes.
Possui mais de 700 artistas em
60 países. Todos seus integrantes
aprenderam a pintar sustentando o
pincel com a boca ou com os dedos
dos pés, por não possuírem as mãos.
Os artistas entram para associação
como bolsistas e se mantêm com
Andressa Griffante/ Hiper
Bienal amplia espaços e mostra
arte em diálogo com o público
Por Bruna Ostermann
A 6ª edição da Bienal do Mercosul, que iniciou em setembro e vai
até o dia 18 de novembro, tem fortes
apelos para ser visitada. O primeiro
e evidente é as inovações, entre essas, a divisão em três espaços: Cais
do Porto, Museu de Artes do Rio
Grande do Sul (Margs) e Santander
Cultural. O segundo motivo para
comparecer é que, neste ano, as instalações vão além das exposições de
arte contemporânea com o projeto
curatorial da Biena, 2007.
O projeto está baseado em uma
proposta pedagógica que é vista na
própria amostra. Há um cuidado
com o visitante, percebido nos
espaços reservados para descanso.
As obras estão divididas em espaços fechados, para que haja uma
distinção de quando se passeia e
quando se vê arte e, ainda, têm uma
explicação textual. Existe também
um espaço para o artista dialogar
com o público, expondo suas idéias,
contextualizando o seu trabalho, de
forma que o espectador tenha voz
ativa para críticas e sugestões. Em
cada mostra se encontram diversos
mediadores, que trabalham com a
intenção de ligar a idéia do artista
com o público e mediar o diálogo.
Entre outras instalações, há 20
estações pedagógicas, com salas de
aula, bibliotecas e oficinas, destinadas especialmente a estudantes e
artistas locais.
“A preocupação mais intensa
com o público foi baseada em um
projeto pedagógico que invoca uma
participação efetiva dos visitantes, de
forma que eles não recebam apenas
as informações passivamente”,
explicou o curador-geral Gabriel
Perez-Barreiro, doutor em História e
Teoria da Arte, nascido na Espanha.
“A proposta se estende a uma internacionalização, é uma Bienal a partir
do Mercosul, trabalhando o diálogo
entre os países que participam e o
resto do mundo”, completou.
A Bienal do Mercosul apresenta
67 artistas, vindos de 23 países, expondo seus trabalhos divididos em
seis mostras. Três são exposições
monográficas, que este ano substituem a exposição do artista homenageado. A obra do uruguaio Francisco
Matto e do brasileiro-sueco Öyvind
Fahlström estão no Margs e a mosGabriel Pozzobom Silveira/ Hiper
locais
A 6ª Bienal do Mercosul funciona todos os dias da semana, das
9h às 21h, com entrada franca. O
Margs fica na Praça da Alfândega,
o Santander Cultural é na Rua Sete
de Setembro 1028, e o Cais do
Porto é na Avenida Mauá 1050.
Artistas explicam obras aos visitantes que ganham salas pedagógicas
a venda de pinturas em forma de
cartões, calendários e outros artigos.
A principal preocupação da APBP
é incentivar pessoas com essas deficiências a terem uma atividade e se
aperfeiçoarem nela, proporcionando-lhes uma bolsa de estudos.
Perez-Barreiro, curador geral da 6ª Bienal, na abertura, em setembro
tra de Jorge Macchi se encontra no
Santander Cultural.
As outras três mostras, Conversas, Zona Franca e Três Fronteiras
estão expostas nos armazéns do Cais
do Porto. A primeira traduz as relações entre os artistas do Mercosul
e o cenário global, a partir de obras
de arte. “A escolha dos artistas também ocorreu de forma diferenciada,
pelos curadores do projeto, para dar
melhor a idéia de diálogo”, como
conta um destes curadores, Moacir
dos Anjos. Nessa mostra se destacam as obras de Jesús Rafael Soto
Venez, com seu trabalho Cubo de
Nylon; Magdalena Átria, que criou
um trabalho abstrato todo composto
com massa de modelar recortada,
denominado Uma vez, cada vez,
todas as vezes; e o vídeo de Peter
Fishli e David Weiss, Do jeito que as
coisas vão, como conta o mediador
Emanuel Alves.
O projeto Zona Franca traz
ao público trabalhos recentes de
artistas brasileiros, americanos,
alguns europeus e asiáticos considerados marcantes na atualidade.
Obras polêmicas são encontradas
nessa exposição, como A Lot(e), de
Nelson Leirner, que se detém especialmente a uma crítica aos Estados
Unidos. Além deste, outra obra que
surpreende o público é a de Harrell
Fletcher, que expõe fotos sobre a
Guerra do Vietnã e textos bastante
efêmeros.
Por fim, a mostra Três Fronteiras
trata de um programa internacional
que abrange artistas que residem na
zona da tríplice fronteira do Mercosul: Paraguai, Brasil e Argentina. Os
trabalhos mais visitados, segundo
o mediador Alex Sandre Andrade,
são: Máramo Posto de Troca, de
Daniel Bozhkov,e Projeto T.axi, de
Jaime Gili.
10 esporte
hipertexto
Porto Alegre, outubro de 2007
Surfe é ensinado de pai para filho
Nova geração de surfistas investe em família no esporte para garantir a carreira no mar
Helena Wilhelm Eilers/Hiper
Brincadeira de criança é busca pela profissionalização no esporte
Por Helena Wilhelm Eilers
Nos anos 70, quando o surfe
se difundiu no Brasil, muitas mães
ficavam de cabelo em pé ao imaginar
que seus filhos pudessem ser surfistas, até então sinônimo de desocupado e possível maconheiro. Hoje
isso mudou. Aqueles que na época
eram “desocupados” viraram pais de
família e agora têm a possibilidade,
não só de passar sua experiência,
mas também o espírito desse esporte
para os filhos, possibilitando uma
completa interação e fazendo com
que a recente geração de surfistas
radicalize nas ondas do litoral do
Rio Grande do Sul
Em um Estado onde o inverno
é rigoroso, a água é gelada com a
famosa cor “chocolatão” e o vento
sopra insistentemente, muita gente
pode se desencorajar até a molhar
o pé. Porém, o que pode parecer
loucura para uns é diversão para
outros, e é com esse sentimento que
o esporte continua crescendo no
Estado, através das gerações.
Álvaro de Bortoli é um exemplo
disso, pai de João Pedro e Mariana,
de 11 e 10 anos, ele sempre incentivou os dois a surfarem. Com três
anos de idade os irmãos já davam
seus primeiros passos e os primei-
ros tombos em cima da prancha. A
esposa de Álvaro, Andrea Gervine,
sempre apoiou o esporte e os acompanha em todos os campeonatos,
nos quais as crianças participam
desde os cinco anos de idade. Ela,
porém, prefere ver tudo da areia, seu
único contato com o surfe foi quando estava grávida dos dois “acho que
é por isso que eles são surfistas hoje,
foi meu surfe barriguda”, brinca.
O investimento valeu a pena e os
dois já acumulam prêmios nas suas
recém começadas carreiras: João
Pedro é bicampeão gaúcho e foi
bicampeão Billabong Colegial na categoria Petiz, na qual pessoas até 10
anos de ambos os sexos competem.
Mariana é uma das poucas meninas
que disputa nessa categoria, mas já
com discurso de profissional contorna a situação “é difícil, mas às vezes
eu consigo uma boa colocação”. Na
Petiz ela está em 3º lugar no ranking
da Federação Gaúcha de Surf e foi
campeã no Billabong Colegial 2006
pelo colégio Maria Auxiliadora de
Canoas.
A família de Canoas procura ir
todos os finais de semana para praia,
mas pegar onda não é a única atividade deles. Super atletas, também
praticam tênis, ginástica olímpica,
judô, futebol, andam de skate entre
outros, e a mãe garante, são competitivos em tudo “chegam a disputar até
quem chega para escovar os dentes
Ascensão do judô
primeiro!”. E essa competitividade
rendeu frutos, entres premiações e
patrocínio, diminuindo um pouco o
conhecido “pai”trocínio.
Também entre os mais novos
competidores gaúchos estão Mauí,
de 12 anos e Gabriel Machado, de
11. Os dois guris estão liderando
o ranking nas categorias Grommetz (até 12 anos) e Petiz. Eles
que começaram a competir no ano
passado, mostram que vieram com
força total, para o orgulho do pai,
Reinaldo Petzold Machado. Mauí e
Gabriel tiveram a sorte de aprender
a pegar onda não só com o pai, mas
com dois talentos do surf profissional, os também irmãos Alejo e
Santiago Muniz. Além disso, cristãos
de carteirinha, dedicam a Deus suas
consecutivas vitórias
Os pequenos competidores
garantem que participar dos campeonatos é pura diversão, e apesar
de todos serem adversários dentro
da água, fora são amigos ligados
pelo mesmo sentimento de amor
ao mar. Os pais também se apegam
ao estilo grande família. Andréa e
Álvaro garantem estar sempre com
a casa cheia de crianças. Petzold, pai
de Mauí e Gabriel, comenta: “Nós
acabamos amando e torcendo da
mesma maneira para os meninos que
correm aqui, mesmo que tu queira
que teu filho chegue em primeiro.”
Mas ser surfista não é só viver
de bons momentos, ainda mais se
tratando do Rio Grande do Sul. “A
água é muito gelada, principalmente
quando a gente vai correr no Cassino”, reclama Mauí.
Também é preciso levar em
conta a falta de reconhecimento que
ainda existe aqui no Sul. Álvaro lembra um recente episódio envolvendo
Rodrigo Dornelles “Pedra”, único
gaúcho participante do mundial de
surfe, o WCT (World Championship
Tour). Voltando de viagem, Pedra
chegou no Aeroporto e nenhum táxi
queria levá-lo até a rodoviária por
causa das pranchas. Quando conseguiu chegar à rodoviária teve que
pagar uma taxa para o transporte e
quando voltou o ônibus já tinha ido
embora. “Algumas empresas começam a se destacar e dar um pouco
de incentivo, mas isso não está nem
perto de outros países.” conclui.
Apesar das dificuldades Mauí
e Gabriel não escondem a vontade
de se tornarem profissionais com o
apoio dos pais. Um dos destaques
do surf gaúcho, Vinícius Fornari,
também acredita nos novos talentos:
“Um dia eu fui um deles e sempre
contei muito com o apoio dos meus
irmãos. Como eu não tenho irmão
mais novo tento passar essa pouca
experiência para essa molecada e
que se Deus quiser eles se tornem
mais um surfista para representar o
nosso Estado”.
Gabriel Pozzobom Silveira/Hiper
Equipe da Sogipa, comandada pelo treinador Antônio
Carlos Pereira acumula três títulos mundiais
Por Bernhard Friedrich Schlee
O ano de 2005 foi histórico
para o judô nacional. João Derly de
Oliveira Nunes Junior conquistou
o campeonato mundial na categoria
meio-leve no Egito. Um feito inédito
no país. Em 2007, a situação não
só se repetiu como melhorou. No
mundial de judô do Rio de Janeiro,
João Derly se tornou bicampeão
mundial e Tiago Camilo, na categoria meio-médio, também ganhou
a medalha de ouro. Em comum,
os dois possuem o local de treinamento: o departamento de judô da
Sociedade de Ginástica Porto Alegre
(Sogipa).
O judô na Sogipa pode ter tido
grande destaque apenas recentemente, mas o trabalho que vem sendo
feito é de longa data, propiciando as
vitórias: “o crescimento na Sogipa,
os últimos resultados, eles são frutos de um trabalho bem planejado,
um trabalho estruturado que nós
estamos desenvolvendo há muitos
anos”, afirma Antônio Carlos Pereira, o Kiko, treinador da equipe de
judô da Sogipa.
Dentre as contribuições para que
o esporte ganhasse esse patamar está
a boa estrutura da Sogipa, um forte
trabalho de base, a amizade entre
os atletas, a vontade da equipe de
procurar atingir os seus sonhos e o
treinamento duro, como confirma
o judoca de categoria leve, Luiz
Francisco Camilo: “os atletas, os
técnicos, todos os que estão aqui
no clube vivem o sonho de fazer
a Sogipa campeã do mundo. E um
acreditar no trabalho do outro,
se sentir motivado, não ter briga
dentro do grupo, cada um tem seu
espaço e ninguém tira o brilho de
cada um aqui, todo mundo brilha
junto. Quando a gente consegue resultados como esses aí que estamos
alcançando, no pan-americano e no
mundial, só provam que o trabalho
está sendo bem feito”. Outro fator
se destaca: o treinador da equipe,
Antônio Carlos Pereira.
Kiko começou treinando crianças, em 1986. Mas o seu treinamento
era diferente, pois era quase comparável ao dos adultos. Esse sistema de
treino faz com que muitas crianças
acabem abandonando o judô, mas
as que ficam conseguem chegar à
sênior, o posto mais elevado do
judoca. O treinador dos juvenis,
Jefferson Carvalho ressalta a eficácia o acompanhamento que torna
os atletas mais regrados e frisa a
importância de Kiko: “Eu acho que
deve ter uns dois ou três professores
aqui, no Brasil, que sabem tanto ou
mais que ele de judô. Só que nenhum
deles tem a força de vontade que ele
tem de cuidar do cara o tempo todo,
de ir atrás, abraçar os guris, ficar
cuidando deles mesmo”.
Tiago Camilo se referindo ao
Dedicação e amizade ajudam a Sogipa a treinar campeões do judô
treinador, diz que ele é “um cara que
tem visão do judô, tem acompanhado a evolução do judô e está muito
em cima de cada um e trabalhando
no que a gente tem que melhorar.
Muito atuante e sempre nos orientando e mostrando o caminho”. Segundo Luiz Francisco Camilo, “Eu
acho que a maior característica do
Kiko é a amizade que ele tem com
os atletas. Ele vive o nosso sonho
às vezes mais do que nós mesmos.
Então, eu acho que isso é um fator
determinante para que nós alcancemos esses grandes objetivos aí. Com
certeza, a vontade e a dedicação do
Kiko são fatores primordiais para
essas conquistas”.
Agora, o próximo grande
desafio da equipe de judô da Sogipa
é a Olimpíada de Pequim. A dedicação do grupo pôde ser comprovada
quando Tiago Camilo recusou um
cachê de 100 mil dólares para lutar
na Sibéria e na Armênia para se focar
nos treinamentos para a competição
que acontecerá ano que vem na
China: “o dinheiro não é objetivo
agora, o sonho é mais importante,
maior que tudo” afirma o atleta.
hipertexto
Esporte 11
Porto Alegre, outubro de 2007
Os clubes topam
tudo por dinheiro
Convênios com empresas garantem balanço
de contas e sobrevivência de clubes brasileiros
Pedro Revilion/Hiper
A montadora General Motors, instalada no Rio Grande do Sul, mantém parceria com o Sport Clube Internacional
Por Thiago Oliveira
Os clubes de futebol do Brasil
amargam colapsos financeiros e
somam dívidas astronômicas já há
alguns anos. Debilitadas economicamente e até mesmo por causa da
polêmica Lei Pelé, as instituições passaram a vender seus jogadores para
o exterior. Com isso, a qualidade dos
times caiu, fato que resultou na fuga
do público dos estádios, inclusive em
função do crescimento das receitas
por televisão . Más administrações
quebraram os times. A solução foi
recorrer a quem tinha dinheiro: as
empresas privadas. Assim, diversas
corporações, nacionais e estrangeiras, passaram a investir nos clubes,
como patrocinadoras ou dividindo
a administração dos departamentos
de futebol.
O jornalista Hilton Mombach, do
jornal Correio do Povo, acha ótima
a idéia das parcerias, mas alerta para
a redação dos contratos: “os clubes
não podem ficar com as dívidas caso
o parceiro quebre. Nem vice-versa.
Como se resolve isto? Não sei. A ISL
era bilionária quando assinou com o
Grêmio, que passou a pagar salários
de até US$ 200 mil mensais, montou
um time milionário e, quando a empresa suíça quebrou, o clube gaúcho
ficou com todos os encargos. No
caso da MSI, sabia-se: era lavagem
de dinheiro. Política e politicagem. A
melhor parceria por aqui ainda se dá
entre a dupla (Gre-Nal) e o Banrisul,
mas este paga pouco”.
No Brasil, a experiência pioneira
desses convênios foi o contrato
entre a empresa de laticínios italiana
Parmalat e o Palmeiras, em 1992.
Esse talvez seja o único exemplo
cujo sucesso tenha sido mútuo:
naquele mesmo ano, a Parmalat faturava US$ 80 milhões e, poucos anos
mais tarde, rendia mais de US$ 1
bilhão, apenas no Brasil, além lucrar
em cima da valorização do passe dos
jogadores que comprava e vendia. E
o Palmeiras saiu de uma espera de
16 anos sem ganhar título e passou
a ter um time vencedor.
O final da década de 90 também
foi agitado. Em 1997, o Corinthians
firmou convênio com o banco Excel-Econômico por R$ 5 milhões
anuais. No Sul, a General Motors,
que instalou uma fábrica em Gravataí, região Metropolitana de Porto
Alegre, passou a patrocinar Grêmio
e Internacional, e a Sanyo investiu
no Coritiba. No ano seguinte, o
Banco Opportunity comprou 51%
do Bahia, a empresa Nations Bank
assinou contrato com o Vasco e
investiu US$ 30 milhões, e a ISL
acertou com o Flamengo e com o
Grêmio, enquanto o grupo italiano
Cragnotti fechava negócio com o
São Paulo. Em 1999, a empresa
de investimentos norte-americana
HMTF assinou um contrato de 10
anos com o Corinthians para injetar
R$ 53 milhões, com a previsão de
construção de um estádio multiuso
de 45 mil lugares. Também fez convênio com o Cruzeiro. A parceria
mais recente, feita em 2004 com a
empresa MSI, foi também entre os
corintianos.
Parcerias desastrosas
Resultados desastrosos não
faltam: ao se depararem com o
descalabro nas administrações,
alguns investidores romperam seus
contratos, vítimas também do baixo
poder aquisitivo dos brasileiros e
da incontrolável pirataria. Fernando Horacio da Matta, jornalista
esportivo e professor da Fundação
Mudes, é taxativo: “restou a televisão como o único financiador”.
Apesar de algumas propostas serem
ligeiramente diferentes, todas essas
empresas colocaram muito dinheiro
no futebol brasileiro para, teoricamente, montar grandes equipes.
Mas no mundo capitalista não existe
caridade: esses parceiros esperavam
retornos financeiros, que viriam da
venda de jogadores ao Exterior e do
marketing junto à população.
Em Porto Alegre, o Ministério
Público teve de optar por fazer um
pedido de diligências no caso que
apura o desvio de R$ 555,8 mil da
empresa suíça ISL que não chegaram
aos cofres do Grêmio. O endosso
dos cheques resultou na condenação
em primeiro grau por estelionato de
José Alberto Guerreiro, presidente
do clube na época, e Wesley Cardia, representante da empresa no
país, além de Jamel Nasser, doleiro
envolvido no caso. Os três tiveram
as penas convertidas em prestação
de serviços comunitários e ressarcimento financeiro ao Estado. A multinacional faliu internacionalmente,
abandonou também o Flamengo e
reclama na Justiça um buraco de US$
80 milhões do que injetou no clube
rubro-negro.
O Nations Bank deixou o Vasco
e pede judicialmente o ressarcimento
de quase 30% dos US$ 150 milhões
aplicados. Em apenas dois anos de
vínculo, o clube até conseguiu títulos, mas os projetos, principalmente
de reformas no Estádio São Januário, não foram concluídos.
Alberto Dualib, presidente do
Corinthians, forçou a assinatura de
contrato com a MSI sobre conselheiros corintianos, sem dar maior transparência à proposta. Parceria fechada, o clube recebeu investimentos de
mais de R$ 100 milhões, jogadores
como Gustavo Nery, Nilmar, Carlos
Tevez e Javier Mascherano, além
do polêmico título do Campeonato
Brasileiro, em 2005. No entanto, os
problemas já eram evidentes, com
acusações surgindo constantemente:
jogadores problemáticos, lavagem
de dinheiro da máfia russa, investigações da Polícia Federal, seis trocas
de treinadores e a velha promessa
de um estádio. Em 24 de julho de
2007, o Conselho Deliberativo do
Corinthians aprova, por 241 votos
a 0, o fim da parceria.
“Nossos clubes devem verdadeiras fortunas, e as empresas e investidores estão cada vez mais distantes
e com medo de serem enganados
como no passado”, afirma Renato
Chvindelman, pós-graduado em
Marketing pela ESPM - SP. Quem
se arrisca a uma nova parceria no
futebol?
12 ponto final
Porto Alegre, outubro de 2007
hipertexto
Cuba, uma ilha de contradições
Fotos Jaqueline Orgler Sordi/ Hiper
Por Jaqueline Orgler Sordi
Enviada especial
Vermelho. É assim que essa
pequena ilha, localizada estrategicamente entre a América do Norte e a
América do Sul, recepciona seus visitantes. Paredes, placas, teto e chão.
Tudo vermelho. A cor se tornou
símbolo de uma grande revolução,
de um estilo de vida, e de um país
singular que vive sua história nos
dias de hoje. Dona de uma beleza
natural única, Cuba é uma mistura de
alegria, cor, bons índices de cultura e
saúde, mas pobre de infra-estrutura
e de bases econômicas.
Carlos Alberto, 57 anos, é taxista.
Formado em engenharia mecânica,
optou pela profissão atual por ser
a única forma de ganhar dinheiro
dentro do país. Carlos, assim como
todos cubanos, reage da mesma forma ao ser questionado sobre Fidel
Castro: “Está bem e descansando
em sua casa. Ele é o nosso chefe.”
Essas poucas palavras demonstram
a admiração, ou medo, que o povo
tem de seu comandante. O taxista
explica que “um a cada três cubanos nasceu durante ou depois da
revolução. Sendo assim, não temos
como não gostar de Fidel Castro
e dos revolucionários. Aqui temos
pouco, mas nada nos falta”.
Os habitantes da ilha vivem de
forma quase precária. Prédios antigos e mal cuidados tomam conta das
cidades. Contradizendo essa imagem, é possível observar hospitais
bem desenvolvidos, universidades
bem cuidadas e um povo exalando
saúde. Em Cuba, todas as crianças
vão à escola. O índice de analfabetismo é quase zero. Depois de formados no ensino médio e de servirem
ao exército por dois anos, todos têm
direito ao ingresso na Universidade,
optando pelo curso que desejarem.
Apesar do grande investimento do
país em educação, os cubanos já
formados e qualificados optam por
trabalhar em atividades de turismo,
uma vez que neste setor podem obter algum ganho maior do que em
outras profissões. O salário de um
médico, por exemplo, fica em torno
de 300 pesos cubanos, o equivalente
a 20 dólares por mês, e não é muito
diferente do recebido por outros
trabalhadores que ganham em torno
de 15 dólares ao mês.
Parece estranho, mas lá é possível, sim, viver com um salário
ilusório. Isso porque, todo mês, o
governo fornece a cada cidadão
um bloco. Nele, consta uma lista
de alimentos, com suas respectivas
quantidades. Essa é a comida que
recebem durante os próximos trinta
dias, e que é suficiente para mantêlos alimentados. Uma peculiaridade
dessa divisão é que vizinhos criaram
o hábito de trocar alimentos com
País é pobre em infra-estrutura e bases econômicas, como em habitação
Nas ruas, a improvisação de um “automóvel”, a pedal
seus amigos quando necessário.
Visam, assim, seu bem-estar e o
do próximo. Além disso, eles têm
escola, assistência à saúde e transporte (precário) que são oferecidos
pelo governo, e muitas famílias
também ganham moradia. O salário
é usado para alimentação, compra
de vestuário, móveis, reformas e
entretenimento.
Em toda ilha, é possível observar
que a maioria dos carros é antiga, das
décadas de 60 e 70. Carlos Alberto
esclarece que cubanos não podem
comprar um carro novo, mas somente trocar com seus companheiros. Não há lojas de automóveis,
nem oficinas de conserto. Carros
novos que trafegam em áreas turísticas, como Varadero, são importados
pelas empresas que atuam nesse
setor associadas ao governo cubano.
Diante de um acidente entre dois
veículos, o taxista acrescenta: “Não
há onde consertar carros, porque o
nosso povo não teria como pagar
para tal”. E o que acontecerá com os
dois motoristas que bateram? “Eles
terão que botar seus carros no lixo
se não conseguirem consertar com
as próprias mãos”.
O sistema de Cuba não permite
o acesso do cidadão ao mundo exterior. O povo não pode sair do país
e toda informação que entra na ilha
é controlada. Cidadãos têm acesso
a apenas quatro canais de televisão,
todos do governo. Existem apenas
dois jornais diários, de poucas
alimentos. Parecem tendas do século
19. Mais modernas são as lojas para
turistas. Outdoors existem, mas
exibem fotos e frases pró-revolução. Policiais são encontrados nas
esquinas, monitorando os passos de
muita gente. Estar em Cuba é como
estar no Big Brother de George
Orwell, porém com humanos excepcionalmente treinados cumprindo
a função das câmeras. A pequena
páginas, também pertencentes ao
estado. A internet, tão comum para
o mundo ocidental, não é permitida
para o desfrute do povo. É possível
encontrá-la somente em hotéis exclusivos para turistas, onde cubanos
só entram como trabalhadores.
No país não há propagandas
nem um comércio efetivo. Mesmo
em Havana, as poucas casas comerciais existentes vendem basicamente
grande ilha, localizada na entrada
do Golfo do Méxi#o, exala alegria de
um povo culto, porém ignorante das
inovações mundiais. Conformados
às necessidades básicas atendidas,
olham para o horizonte cercado pelo
mar, revelando a vontade de querer
mais. Mostram uma curiosidade exagerada pelos estrangeiros e um amor
incondicional pelo seu país. Cuba é
assim, uma ilha de contradições.

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