SSD - Doc`s Kingdom

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Doc’s Kingdom 2010 . A imagem-arquivo . Textos de apoio
Selecção e grafismo: Ana Eliseu, Joana Frazão
Textos originais: Chris Wahl, José Manuel Costa, Nuno Lisboa, Regina Guimarães
Traduções do alemão: Carmo Lobo, José Maria Vieira Mendes
Agradecimentos: André Dias, Daniel Ribeiro, Edgardo Cozarinsky, Frederik Lang,
Hartmut Bitomsky, Inês Sapeta Dias, João Amaral Frazão, Manuela Sousa Tavares,
Susana Sousa Dias, Sylvain George
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Doc’s Kingdom 2010
A imagem-arquivo
José Manuel Costa
Na preparação do seminário deste ano, foi com naturalidade que surgiu a ideia que viemos
depois a formular como imagem-arquivo. Mais do que um tema pré-estabelecido, tratou-se,
neste caso, de um tema encontrado, ou seja, algo que se foi impondo como elo de ligação
possível entre algumas das obras e alguns dos autores que, por si mesmos, tínhamos a
intenção de abordar. Ao apresentá-lo, há então que começar por sublinhar a diferença entre
este tema e aquele que poderia ter sido expresso pela mais habitual formulação dos “filmes
com imagens de arquivo”. Se tivéssemos ido por aí, aquilo de que estaríamos a falar seria
algo ao mesmo tempo mais concreto – porque materialmente mais definido – e mais vasto,
tendo em conta o horizonte histórico abordado. Estou a referir-me ao filme-compilação, ou
filme-de-montagem, que integrou a história do cinema desde, pelo menos, as vanguardas da
década de vinte do século passado. E estou obviamente a ter em conta que também essa
vertente se foi transformando com o século, vindo a assumir facetas inesperadas e originais
quando este se aproximou do seu fim: pela primeira vez, o balanço dum século foi passível
de articulação com um século de imagens, e a ideia de trabalhar sobre imagens anteriores
independentemente do estatuto original delas veio entretanto testemunhar outras tantas
mutações relativas ao conceito de património e à teoria da “imagem em movimento”. Não se
trata portanto apenas disso, mesmo que a génese do novo conceito não seja alheia a isso e
que entre os dois possam existir óbvias zonas de sobreposição. O que acontece é que, a par
da explosão do recurso aos arquivos para revisitar a História – ou as histórias, cruzando
memórias individuais e familiares com dimensões comunitárias, nacionais ou outras – foram
surgindo autores para quem a ideia de arquivo já tinha outra natureza, muito menos
memorialística do que seminal. Cruzando-se com movimentos oriundos da história de arte
ou com o trabalho de artistas plásticos que não raro integraram a fotografia e o cinema, estes
realizadores usaram a ideia em sentido lato – não só arquivos de imagens mas arquivos tout
court, colecções, listas, séries, ou simplesmente a seriação de um tema com as respectivas
variações… – ligando-a à busca de um novo fio condutor do seu próprio percurso.
Aquilo a que estamos a chamar imagem-arquivo tanto pode ser então uma imagem “de
arquivo” como uma imagem nova, sem que o princípio se altere com a passagem de uma a
outra. A imagem-arquivo pode ser uma releitura da História num sentido que rapidamente
anula, aliás, o próprio objectivo histórico: aquele que, como em toda a obra do par
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Gianikian/Ricci-Lucchi, as imagens são trabalhadas na sua absoluta contemporaneidade,
renascendo num processo de abstracção (que não é apagamento) face ao contexto original.
Pode ser também uma releitura da história do cinema e da arte – como em Cozarinsky, ou na
ponte que vai de Godard a Bitomsky. E pode ainda ser (de novo Gianikian-Lucchi, e de novo
Bitomsky) toda a imagem em que, na dimensão interna do plano ou na ligação entre planos,
se faz a exploração sistemática dum universo particular (que pode abarcar objectos, gestos,
comunidades, quaisquer elementos materiais, referências…) e em que esse universo é visto
como microcosmo, em termos metafóricos ou metonímicos. O arquivo é colecção de
referências, espaço de coisas ou ideias usadas em que se erguem inesperadas relações,
universo reconhecível em que se aborda o novo. O arquivo é o lugar donde se parte – aquilo
que, na história de arte e no mundo da criação em geral foi também o “atlas” alemão, de
Warburg a G. Richter. Na acepção que aqui nos interessa, é, sempre, um espaço refundador.
Esta é uma sugestão, entre várias possíveis, para entrar no mundo de alguns autores que
estarão connosco em Serpa - Harmut Bitomsky, Yervant Gianikian e Angela Ricci Lucchi,
Edgardo Cozarinsky, Susana Sousa Dias. Uma sugestão de arranque, não um tema fechado.
Como sempre, no próprio encontro, cada projecção individual será um novo ponto de
partida e o rumo das conversas será também aquele que o grupo de participantes
determinar.
Filmar, arquivar
Nuno Lisboa
Para além do filme com imagens de arquivo, a noção de arquivo na génese do acto de filmar.
Talvez a segunda parte desta equação seja a menos evidente, ao questionar o próprio gesto
de filmar, quando este surge associado às práticas da série, do inventário, da colecção ou do
catálogo (que seria preciso distinguir entre si), mas também quando a câmara se confronta
com o arquivo e as suas imagens, com o cinema propriamente dito, para decifrar os seus
efeitos ou potenciar a sua memória, ou quando, confrontada com o “o peso próprio das
coisas filmadas” (Peter Nestler), se propõe “articular” e “ligar” a realidade em vez de a
“revelar”, para empregar a formulação de Bitomsky sobre a tarefa do documentário.
A propósito desse peso (e de Joris Ivens carregando pedras para saber como filmá-las),
Bitomsky assinala que “as imagens não advêm apenas das coisas que representam, mas
também são originadas noutras imagens”, umas sobre as outras, como as cassetes VHS que os
seus assistentes empilham num dos capítulos sobre o documentário, na sua antologia do
cinema. Bitomsky acrescenta que essa origem (noutras imagens) não pode ser colocada, ou
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encontrada (?) (numa imagem). Porém, desta impossibilidade pressuposta, da recusa tanto
em aceitar o “sim” como o “não” de cada imagem ao mundo, é a genealogia (estética,
política, económica) de cada imagem que não deixa de ser perseguida em cada um dos seus
filmes. Estes funcionam como diagramas abertos que resultam do desenho traçado na
pesquisa. A busca e o resgate das imagens – sem saber o que se procura, quanto mais o que
se vai encontrar – parece ser o que constitui o ponto de partida e o processo dos seus filmes,
quando não o seu tema fundamental. Sob a forma do inquérito, que a cada passo revê os
seus procedimentos e confirma o ponto em que se encontra, Bitomsky trata as imagens
como objectos do mundo e os objectos como imagens a decifrar. Cada um destes objectos –
seja o bombardeiro B-52, o VW carocha, as auto-estradas do terceiro Reich ou, no limite do
objecto e no limite da imagem, o pó como matéria filmável – é uma constelação de imagens,
isto é, de actos e ideias, de uma época e de um lugar. Por outro lado, nos seus filmes sobre
as imagens, estas encontram-se entre a mundaneidade das coisas e dos gestos, passam entre
mãos, são manipuladas e manipuláveis, solicitadas, aceites, rejeitadas, ajustam-se e resistem
às ideias e aos gestos que as ligam e articulam, as imagens são matéria e mão de obra,
colaborando ou resistindo ao trabalho do cineasta e do espectador.
Assim, ao expor o arquivo do cinema, Bitomsky não pode deixar de expor o seu próprio
gestus: o gesto é um encadeamento de ideias, descrevendo(-se) e citando(-se), ao mesmo
tempo que espera uma “atitude científica” do espectador, solicitado a analisar argumentos e
a tomar partido, transformado em espectador de si próprio, passando-se “menos coisas nele
do que se passam com ele” (Brecht). Os gestos são sempre concretos: classificar, seleccionar,
articular podem corresponder a uma panorâmica, ao gesto de folhear, ou a carregar em
botões para rebobinar, abrandar, parar ou acelerar o fluxo de imagens. Ver, descrever, rever.
Falar é um gesto que se decompõe em múltiplos gestos, dentro ou fora de campo, sobre,
contra ou ao lado de uma imagem, ao ordenar um movimento de câmara ou do microfone,
ao solicitar outros gestos e outras imagens. O gesto que filma e o gesto filmado tornam-se
inextricáveis, confundindo deliberadamente as fronteiras entre ensaio e cena filmada, o que
está dentro e fora do filme, entre o que está perante e por detrás da câmara, entre imagens e
imagens de imagens, numa desmultiplicação em circuito fechado, onde nenhuma imagem
surge sem ser literalmente enquadrada.
Na caixa-negra de Hartmut Bitomsky, são raras (mas importantes) as irrupções do(s)
exterior(es): a “percepção pura” de uma janela ao fundo de uma sala em Playback, o passeio
mudo da equipa de cinema no final de Die UFA, por exemplo. No “exílio da realidade”, as
imagens não são janelas sobre o mundo mas superfícies a decifrar, conforme a lição de
Flusser. A pedagogia de Bitomsky também passa por esta recusa da inocência, de que lado da
câmara estiver. Se “só existem dois tipos de filmes: os que vimos e os que não vimos”,
também só existem dois tipos de imagens: as que estão feitas e as que estão por fazer.
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“Também precisamos de filmar as nossas próprias imagens”, diz Gianikian numa entrevista,
sabendo bem que, ao longo de trinta anos de trabalho nos arquivos a encontrar filmes
dentro de outros filmes, “tornámo-los filmes nossos”, como acrescenta Ricci Lucchi. No
mesmo sentido, sabemos que mesmo essas imagens de filmes encontrados não são
simplesmente reproduzidas, reapropriadas, mas justamente filmadas pela “câmara analítica”
que permite entrar em profundidade no fotograma, intervir na velocidade do filme, no
detalhe, na cor. Mas talvez possa entender-se o que Yervant Gianikian poderá querer dizer
com a necessidade de “filmar as nossas próprias imagens”, referindo-se porventura tanto ao
gesto de filmar como ao que é filmado, no âmbito de um imenso "trabalho que visa
constituir um gigantesco catálogo dos gestos do século” (Raymond Bellour).
Io ricordo: na sala familiar, a circulação da palavra acontece no triângulo entre o pai de
Gianikian que lê em primeiro plano as suas memórias; o próprio Gianikian que escuta, do
outro lado, ao fundo do plano; a câmara na mão de Angela Ricci Lucchi que filma o acto
rememorativo. As datas que se sucedem no ecrã – do cartão inicial ao genérico final: 1988,
1919, 1987, 1997 – enunciam esquematicamente o movimento da memória, referindo-se ao
presente da filmagem e à época dos factos descritos, mas pouco expõem da intensidade do
encontro entre “agora” e “outrora”. No plano-sequência que dura o testemunho, fixo mas
levemente oscilante nas mãos de Angela, nenhum dos gestos é indiferente: o homem que lê
o que escreveu antes, mas muito tempo depois do terrível crime que descreve, traduzindo da
língua do passado para a língua do presente, repetindo uma ou outra palavra, hesitando por
momentos na ordem das páginas; o homem que escuta, sentado, com a cabeça apoiada no
braço; a câmara que resiste, do lado de cá.
Ghiro ghiro tondo: Gianikian compõe e anima um catálogo de brinquedos de outra era; por
vezes, uma mão filma a outra manipulando uma das muitas dezenas de objectos que se
apresentam à câmara oriundos da Itália, da Alemanha, da Rússia ou do Japão, do período
entre as duas grandes guerras até aos anos 1950. Os brinquedos sucedem-se no ecrã – num
catálogo que não explica as suas regras de organização – para permanecerem apenas durante
alguns segundos perante os olhos. Seriam necessárias muitas linhas para descrever cada um
desses objectos feitos de madeira, papel, lata ou seda, gatinhos esquiadores, pequenas garças
que, ao serem abertas, deixam de resguardar homenzinhos que cabem entre o indicador e o
polegar, bolinhos pintados, pares de noivos, pintainhos, olhos de pedra embrulhados em
papel de seda, caixinhas de música, casas, caminhas, soldadinhos de chumbo. Cada um dos
muitos brinquedos é um fragmento de uma colecção, produzindo sentido na sua
acumulação serial e, simultaneamente, é uma miniatura, concentrando em si toda a memória
do mundo. É muito claro e muito denso o que fica fora de campo e que encontra breves
correspondências no que vemos em algumas imagens: um soldadinho a cavalo que faz a
saudação fascista; uma pilha informe de bonequinhas arruinadas pelo tempo, sem olhos,
braços, pernas ou cabeças; as “tatuagens” de fábrica – “Made in Germany” – no pescoço de
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alguns bonecos, que Gianikian descobre com um dedo e procura com o outro, através do
zoom do seu brinquedo. O que espanta não é o carácter de ruína, mas a própria
sobrevivência, a transmissão entre mãos, as que brincaram como as que fizeram o brinquedo,
e a multiplicidade de relações que podem surgir desta microfísica dos gestos. Nem
documento, nem monumento: cada um destes objectos é demasiado frágil para assumir um
ou outro estatuto, incluindo o filme, imensamente forte, profundamente frágil. Vídeominiatura, tourné-filmé, montado na câmara e sem voz nem diálogos, é um filme sobre o
século XX, feito como um bloco de notas preenchido à pressa, antes do fim, como uma lista
de tesouros resgatados à barbárie. Um “gesto rememorativo” contra o “carácter destrutivo”
(Walter Benjamin).
A experiência da rememoração está no centro do filme de Susana de Sousa Dias, 48, num
dispositivo que aceita o risco de integrar a condição do espectador dentro do próprio filme,
na “zona cinzenta” entre o carrasco e a vítima, difícil de explorar: por um lado, ao espectador
é necessariamente oferecido o ponto de vista do fotógrafo que enclausurou o instante que
agora despoleta a memória da palavra; por outro, a palavra do testemunho surge e ressoa no
próprio lugar do espectador, face às imagens e a partir delas. A espiral da memória que aí se
desenha poderia ilustrar o próprio processo de trabalho da realizadora, com círculos de
afastamento e reaproximação a um núcleo de imagens que, de filme para filme, parecem
constituir um centro atractor da memória política do século XX em Portugal.
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Sinopses
Edgardo Cozarinsky
La Guerre d’un seul homme
França-RDA, 1981, 106’| VO em francês com legendas em inglês
Feito a partir de imagens de filmes de actualidades e da
leitura dos diários parisienses do escritor alemão Ernst
Jünger, La Guerre… é um filme que se encontra no
cruzamento entre a ficção e o documentário e uma das
reflexões cinematográficas mais singulares sobre o
período da Ocupação nazi em França. Cozarinsky
escreveu sobre o filme: “Fazer um filme a partir de
citações… citações cujo o encontro as faça dizer mais do
que aquilo que dizem, um mais que significa outra coisa.
Recuso usar a voz da história (“isto era a verdade”).
Prefiro pôr em movimento a ambiguidade das mentiras a
fim de restituir o vivido ao momento histórico, sem
renunciar à perspectiva desse mesmo momento que nos
é dada pelo passar do tempo. Um prazer pessoal: o de
parar a imagem em alguns momentos anónimos para
tornar visível o gesto de um testemunho sem voz, de
uma vítima sem glória.” Na crítica ao filme, Pascal
Bonitzer considerou que “Cozarinsky inverteu –
genialmente, não hesito em dizê-lo – o princípio do
documentário: aqui são as imagens que constituem o
comentário da voz. […] Daí resulta paradoxalmente que
este filme expressamente baseado em mentiras (pelo
menos em dois tipos de mentira: aquelas, triviais, da
propaganda, e as mais subtis da literatura) surja como a
descrição mais verdadeira, mais rica e a mais cativante da
época da Ocupação.”
Made from images of current affairs movies and from the
reading of the Parisian diaries of German writer Ernst
Jünger, La Guerre… is a film that stands at the crossing
between fiction and documentary, and it’s one of the
most unique cinematographic reflections about the Nazi
occupation period in France. About the film, Cozarinsky
wrote: “Making a film from quotes… finding these
quotes makes them say something more than they
actually say, something more with a different meaning. I
refuse to use the voice of history (“this was the truth”). I
prefer to set the ambiguity of the lies in motion, in order
to return what was experienced to the historical
moment, without renouncing to the perspective of that
moment that is offered to us by the passage of time. A
personal pleasure: stopping the image in some
anonymous moments to give visibility to the gesture of a
voiceless testimony, of a victim without glory”. In his
review of the film, Pascal Bonitzer stated that
“Cozarinsky inverted – brilliantly, I do not hesitate to say
so – the principle of the documentary film: here, it’s the
images that serve as commentary to the voice. […]
Paradoxically, the result is that this film, which is
explicitly based on lies (at least two kinds of lies: the
trivial ones, from the propaganda, and the more subtle
ones, from literature) ends up being the richest, most
truthful and captivating description of the Occupation
period.”
BoulevardS du crépuscule Sur Falconetti, Le Vigan et quelques autres… en Argentine
França, 1992 , 65’ |VO em francês e espanhol com legendas em francês
“Nenhuma investigação é inocente, o detective acaba
sempre por descobrir algo sobre si próprio. De regresso
à Argentina depois de vários anos em França, percorro
os locais da minha adolescência cinéfila: cinemas de
bairro que foram demolidos ou transformados em salas
de jogo e em discotecas. Descubro também que
Falconetti (a Joana d’Arc de Dreyer) e Le Vigan (o actor
secundário mais genial dos anos 30) terminaram a sua
vida na Argentina. No seu rasto, vi-me confrontado com
o meu próprio caminho: ao fazer o trajecto inverso não
estaria a viver a mesma miragem, a de repartir do zero?”
“No investigation is ever innocent; the detective always
ends up discovering something about himself. Returning
to Argentina after spending several years in France, I visit
the places of my cinephile adolescence: local movie
theatres that were demolished or converted into arcades
or discos. I also discover that Argentina was the last
place where Falconetti (Dreyer’s Joan of Arc) and Le
Vigan (the most brilliant supporting actor of the 30’s)
lived. In following their trail, I was confronted with my
own journey: by doing the reverse path, was I
experiencing the same mirage, that of starting again from
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secundário mais genial dos anos 30) terminaram a sua
vida na Argentina. No seu rasto, vi-me confrontado com
o meu próprio caminho: ao fazer o trajecto inverso não
estaria a viver a mesma miragem, a de repartir do zero?”
(Edgardo Cozarinsky)
Vigan (the most brilliant supporting actor of the 30’s)
lived. In following their trail, I was confronted with my
own journey: by doing the reverse path, was I
experiencing the same mirage, that of starting again from
the beginning?” (Edgardo Cozarinsky)
Trabalho em curso
Argentina, 2010
Edgardo Cozarinsky vai apresentar em Serpa imagens do
seu novo filme.
Edgardo Cozarinsky will present in Serpa images from
his new film.
Hartmut Bitomsky
Deutschlandbilder
Alemanha, 1983, 60’ | VO em alemão com legendas em inglês
O filme é composto por fragmentos de mais de 30
documentários realizados e exibidos na Alemanha no
período que vai de 1933 a 1945. No texto do filme, o
realizador diz-nos que “Nunca existiu na Alemanha um
momento de iconoclasmo que destruísse esses filmes
num acto instintivo de indignação. Os filmes foram
confiscados, o que é diferente. Foram guardados, ainda
existia um plano para eles. Tal como se fossem reféns
resgatáveis, é-lhes permitido sair. Para que isso aconteça
tem de ser ter a certeza de que o contexto e o modo
cuidadoso como são utilizados os torna inofensivos. Esta
é uma das condições para a sua utilização como
documento, e enquanto tal, é-lhes confiada uma função
dupla. É suposto mostrarem o fascismo tal como era
realmente, dizerem-nos o que o fascismo nos dizia na
altura. A mesma e velha mensagem. Mas agora uma
mensagem de terror. É suposto testemunharem ao
mesmo tempo contra si próprios, tal como aconteceria
com os agentes desertores que fossem denunciados. Eles
falam e é um facto que ainda hoje os percebemos. Não
somos confrontados com o balbucio ou a hesitação no
falar de uma língua estrangeira que não entendemos.
Reside aí outro factor da sua disponibilidade: estes
filmes não só sobrevivem a este processo que os
converte em testemunhas principais – eles chegam-se à
frente para o fazer. Como se este fosse exactamente o
seu propósito: desempenhar o papel de evidência
documental.”
The film is made up of fragments from over 30
documentaries directed and screened in Germany
between 1933 and 1945. In the film’s text, the director
tells us “In Germany, there was never a moment of
iconoclasm in which those films were destroyed as a
result of an instinctive act of outrage. The films were
confiscated, which is different. They were stored, there
was still a plan for them. As if they were hostages that
could be ransomed, they are allowed to get out. For that
to happen, one has to make sure that the context and
the careful way in which they are used renders them
inoffensive. This is one of the conditions for their use as
documents and, as such, they have a double purpose.
They are supposed to show fascism as it really was, and
tell us what fascism told us at the time. The same old
message. But now, it’s a message of terror. At the same
time, they are supposed to act as witnesses against
themselves, just like what would happen to deserting
agents that were denounced. They speak, and the fact is
that, even today, we still understand them. We are not
confronted with the stammering or hesitation of
speaking a foreign language we don’t understand. And
there lies another one of the aspects of their availability:
these films not only survive this process that converts
them into main witnesses – they offer to do so. As if that
was precisely their purpose: to act as documental
evidence.”
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Das Kino und der Tod
Alemanha, 1988, 56’ | VO em alemão com legendas em inglês
Como se fosse um detective num qualquer film noir,
Like a detective in a film noir, Bitomsky undertakes an
Bitomsky leva a cabo uma investigação através de
investigation through movie frames and images, calling
fotogramas e imagens de filmes, apelando à memória e à on memory and on the viewing of films that were seen
revisão dos filmes vistos e por vezes esquecidos e que
and sometimes forgotten, that are here set apart from
aqui surgem destacados do exercício por vezes
the sometimes derisory exercise of “excerpt”. Alfred
derrisório do “excerto”. Torn Curtain (1966) ou Psycho Hitchcock’s Torn Curtain (1966) or Psycho (1960),
(1960) de Alfred Hitchcock, Une Chambre en Ville
Jacques Demy’s Une Chambre en Ville (1982), Robert
(1982) de Jacques Demy, Kiss me Deadly (1955) de
Aldrich’s Kiss me Deadly (1955)... or less known B
Robert Aldrich... ou filmes de Série B menos conhecidos movies in which someone always dies. In the film, we
e em que morre sempre alguém. Na banda sonora
can hear someone say: “Why does cinema need death, if
ouvimos dizer: “Porque é que o cinema sente
it cannot show it? Cinema seems to be inseparable from
necessidade da morte, se não a consegue mostrar? O
death, from dying, from ceasing to exist. We can say that
cinema parece indissociável da morte, do morrer, do
death is an axiom of cinema. Bazin called it the shroud
deixar de ser. A morte, podemos dizê-lo, é um axioma
of reality.”
do cinema. Bazin chamava-lhe a mortalha da realidade.”
Flächen, Kino, Bunker – Das Kino und die Schauplätze
Alemanha, 1991, 52’ | VO em alemão legendada electronicamente em inglês
Os lugares são aquilo de que a ficção cinematográfica
necessita para poder contar uma história. No seu
estúdio, o cineasta instalou um monitor para os
excertos, dispôs livros, cassetes de vídeo, um jogo de
xadrez, cópias de fotogramas e bilhetes postais que
fazem surgir uma história enquanto a sua equipa de
ajudantes lê, observa, manipula, propõe e pormenoriza.
O comentário percorre os lugares: descreve ou
reconstrói um fragmento, uma sequência: a cidade de
When the City Sleeps (1956) de John Huston, o prédio e
as escadas vazias de M (1931) de Fritz Lang, o campo de
milho de North by Northwest (1959) de Alfred
Hitchcock, a cabana de The Gold Rush (1925) de Charles
Chaplin, as ruas de Buñuel, as ruínas de Rossellini, a
Nova Iorque de Raymond Depardon... lugares de acção,
teatros indispensáveis para que a história aconteça,
lugares imaginários ou “reais”, inscritos ou construídos.
“Il n’y a lieu que le lieu.”
Places are what cinematographic fiction needs in order
to tell a story. In his studio, the filmmaker installed a
monitor for the excerpts, and placed books, video tapes,
a chess board, frame copies and postcards that produce
a story, while his team of helpers reads, observes,
manipulates, suggests and details. The commentary
travels through the places: it describes or reconstructs a
fragment, a sequence: the city in John Huston’s When
the City Sleeps (1956), the building and the empty stairs
in Fritz Lang’s M (1931), the corn field in Alfred
Hitchcock’s North by Northwest (1959), the cabin in
Charles Chaplin’s The Gold Rush (1925), the streets in
Buñuel, the ruins in Rossellini, Raymond Depardon’s
New York... places of action, essential theatres for the
story to take place, imaginary or “real” places, existing or
constructed. “Il n’y a lieu que le lieu.”
Das Kino und der Wind und die Photographie: Sieben Kapitel über Dokumentarishe Film
Alemanha, 1991, 52’ | VO em alemão com legendas em inglês
“Começamos por aqui” diz o cineasta colocando a mão
sob uma placa: Rue du premier film – Auguste et Louis
Lumière, 1894. Eles fizeram o primeiro filme. Era um
filme documental. Numa sala, o cineasta, rodeado pela
sua equipa de rodagem, percorre excertos, citações e
fotogramas, comanda as câmaras que mostram o seu
dispositivo e interroga a realidade dos (e nos) filmes e as
“Let’s start here”, the filmmaker says, placing his hand
over a plate: Rue du premier film – Auguste et Louis
Lumière, 1894. They made the first movie. It was a
documentary film. In a room, the filmmaker, surrounded
by his filming crew, goes through excerpts, quotes and
frames, commands the cameras that show his device and
questions the reality of (and in) the movies and in the
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filme documental. Numa sala, o cineasta, rodeado pela
sua equipa de rodagem, percorre excertos, citações e
fotogramas, comanda as câmaras que mostram o seu
dispositivo e interroga a realidade dos (e nos) filmes e as
teorias que os acompanham. De The River (1938) de
Pare Lorentz a fotos de Atget aos excertos e imagens de
Robert Flaherty, Robert Frank, Peter Nestler, Jean Vigo,
Buñuel ou Huston o filme é uma reflexão sobre o
cinema documental em 7 capítulos e um epílogo.
documentary film. In a room, the filmmaker, surrounded
by his filming crew, goes through excerpts, quotes and
frames, commands the cameras that show his device and
questions the reality of (and in) the movies and in the
theories associated to them. From Pare Lorentz’s The
River (1938) and Atget’s photographs, to excerpts and
images from Robert Flaherty, Robert Frank, Peter
Nestler, Jean Vigo, Buñuel or Huston, the film is a
reflection about documental cinema in 7 chapters and
an epilogue.
Staub
Alemanha, 2007, 90’ | VO em alemão com legendas em inglês
“Uma partícula de pó é apenas perceptível a olho nu. É o
tema mais pequeno acerca do qual se pode fazer um
filme – é um meio de desaparecimento e um critério de
percepção. Onde quer que vamos, leva-nos a melhor;
para onde quer que seja que nos viremos, segue-nos. É o
nosso passado, o nosso presente e o nosso futuro. É
universal e tem um nome em todas as línguas. Mantém
ocupadas as donas-de-casa, bem como os cientistas,
inventores, artistas e ramos industriais que a ele se
dedicam. Acusam-no de alimentar vermes e causar
doenças. Torna-se dono daquilo que é nosso, penetra
nos laboratórios, cria planetas e galáxias. Estamos
rodeados por ele, está dentro de nós e livramo-nos dele.
Aninha-se no desespero da sua própria existência”,
escreveu Bitomsky acerca do seu último filme. Ao
examinar muitos tipos de pó, incluindo partículas
microscópicas invisíveis a olho nu, Pó ausculta uma
variedade de cientistas – botânicos, biólogos,
meteorologistas e astrónomos – que investigam as
consequências sanitárias e ambientais do pó, desde as
tempestades de areia do Sahara à dust bowl dos anos 30
no Oklahoma, ao pó tóxico gerado na demolição das
torres do World Trade Centre. Os aspectos
fenomenológicos, filosóficos e mesmo artísticos da
cultura do pó são explorados em entrevistas com artistas
e coleccionadores. Ao examinar em detalhe algo que nos
rodeia na nossa vida do dia-a-dia mas ao qual não
prestamos grande atenção, Pó dá-nos uma nova
apreciação do modo como este afecta o nosso corpo, o
ambiente e mesmo o cosmos, permitindo-nos uma outra
forma de ver o mundo.
“A particle of dust is only perceptible to the naked eye.
It’s the smallest subject about which it’s possible to
make a film – it’s a means of disappearance and a
criterion of perception. Wherever we go, it takes the best
of us; wherever we turn, it follows us. It’s our past, our
present and our future. It’s universal and has a name in
every language. It keeps housewives busy, as well as
scientists, inventors, artists and industrial sectors which
are dedicated to it. It is accused of feeding worms and of
causing diseases. It becomes the owner of what we own,
it penetrates laboratories, it creates planets and galaxies.
We are surrounded by it, it’s inside of us and we get rid
of it. It nestles in the despair of its own existence”, wrote
Bitomsky about his latest film. In examining several
kinds of dust, including microscopic particles invisible to
the naked eye, this film questions several scientists –
botanists, biologists, meteorologists and astronomers –
who conduct research into the sanitary and
environmental consequences of dust, from sand storms
in the Sahara to Oklahoma’s Dust Bowl in the 30’s, to
toxic dust generated in the collapse of the World Trade
Centre. The phenomenological, philosophical and even
artistic aspects of the culture of dust are explored in
interviews with artists and collectors. By examining in
detail something that surrounds us in our daily life, but
to which we pay no attention, this film offers us a new
perspective on the way in which it affects our body, the
environment, and even the cosmos, allowing us to see
the world in a new way.
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Angela Ricci Lucci e Yervant Gianikian
Dal polo all’equatore
Itália, 1986, 101’ | Sem diálogos
O filme é dedicado a Luca Comerio, um pioneiro do
cinema italiano que morreu aos 66 anos em 1940,
completamente esquecido e a sofrer de amnésia. O filme
é composto por material encontrado num estado de
amnésia química (como refere o genérico). Foi na
Primavera de 1982 que Yervant Gianikian e Angela Ricci
Lucchi descobriram este tesouro inflamável que salvaram
da destruição. Demoraram cinco anos para compor esta
longa viagem pelo começo do século XX, o século do
comboio, o resultado e instrumento das suas conquistas,
do colonialismo e das guerras. O filme abre com as
imagens espantosas de um comboio a percorrer as
montanhas Tirolesas. Ao passar pelo primeiro túnel dáse uma passagem iniciática do preto para o vermelho
sangue, depois para o preto-e-branco – o comboio vai
conquistando a terra. Um travelling que é prolongado
pela imagem de um barco que quebra o gelo da
Antártica. Na superfície gelada, um caçador dispara à
queima-roupa sobre um urso polar. Atingido, transfixo,
cai e volta a levantar-se em toda a sua grandeza para cair
logo depois. Violência cometida pelos homens sobre os
animais, violência do homem contra o homem. Este é o
tema desenvolvido pelos realizadores ao som dos ritmos
repetitivos e assombrosos da música de Keith Ulrich e
Charles Anderson. Mostram-se aspectos da conquista do
mundo, das mentes, dos corpos e das massas; das
representações colectivas e dos sistemas de opressão.
Sentimos vontade de ver uma e outra vez este filme
inesgotável que percorre continentes, com passagem
pelas memórias das nossas histórias humanas,
comoventes e surpreendentes.
This film is dedicated to Luca Comerio, a pioneer of
Italian cinema who died in 1940 at age 66, completely
forgotten and suffering from amnesia. The film is made
up from material found in a state of chemical amnesia
(as mentioned in the opening titles). In the spring of
1982, Yervant Gianikian and Angela Ricci Lucchi
discovered this flammable treasure, which they saved
from destruction. It took them five years to compose this
long journey through the beginning of the 20th century,
the century of the train, the result and instrument of its
conquers, of colonialism and war. The film begins with
amazing footage of a train travelling through the
Tyrolean Mountains. When it passes through the first
tunnel, there is a passage of initiation from black to
blood-red, and then to black and white – the train
conquers the land. A tracking shot that is prolonged with
the image of a boat that breaks the ice in Antarctica. On
the frozen surface, a hunter shoots a polar bear pointblank. Hit, transfixed, the bear falls down, then stands
up again in all its greatness, only to fall down again
afterwards. Violence perpetrated by men against animals,
men’s violence against men. This is the subject explored
by the directors to the sound of the repetitive and
astonishing rhythms of Keith Ulrich and Charles
Anderson’s music. The film shows aspects about the
conquering of the worlds, of the minds, of the bodies
and of the masses; of collective representations and
oppression systems. We feel the urge to see, over and
over again, this inexhaustible film which travels through
continents and through the memories of our humane,
touching and surprising stories.
Io ricordo
Itália, 1997, 11’ | VO em italiano legendada electronicamente em inglês
Em primeiro plano, de perfil, vemos Raphaël, o pai de
Yervant Gianikian, a ler um excerto das suas memórias,
que vai traduzindo do arménio. Plano fixo de cerca de
oito minutos, no qual o filho ocupa um lugar ao fundo
da imagem. Impassível e concentrado, ele é o segundo
ponto que sustenta este triângulo, sendo o terceiro a
câmara, para onde Raphaël olha a um dado momento. É
Angela Ricci Lucci que filma e é sem dúvida uma cena de
família, em que se relata uma memória, que nos diz da
passagem da sua cultura original arménia à sua cultura
de adopção, italiana. Mas mais do que isso, Io Ricordo é
In the foreground, we see Raphaël, Yervant Gianikian’s
father, reading an excerpt from his memoirs, that he
translates from the Armenian. The camera is still for
about eight minutes, during which the son occupies a
space in the background. Impassive and focused, he is
the second point which sustains this triangle, the third
being the camera, at which Raphaël looks for a moment.
Angela Ricci Lucci is filming, and it’s undoubtedly a
family scene, in which a memory is told, a memory
which tells us about the passage from his original
culture, the Armenian culture, to his adoptive one, the
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Angela Ricci Lucci que filma e é sem dúvida uma cena de
família, em que se relata uma memória, que nos diz da
passagem da sua cultura original arménia à sua cultura
de adopção, italiana. Mas mais do que isso, Io Ricordo é
sobre a transmissão de uma narrativa de uma geração a
outra. Esta narrativa, na forma minuciosa como descreve
uma vingança sangrenta, põe em campo duas culturas,
arménia e muçulmana, nas quais serviu o pai do
realizador, escravo cristão numa comunidade curda. Os
três últimos minutos mergulham-nos na atmosfera de
recolhimento do mosteiro de Geghard na Arménia
soviética, num efeito de ruptura que ganha a dimensão
de uma reflexão metafísica: três velas e o canto grave de
um amigo é a resposta dialéctica e cristã ao absurdo da
violência humana.
Angela Ricci Lucci is filming, and it’s undoubtedly a
family scene, in which a memory is told, a memory
which tells us about the passage from his original
culture, the Armenian culture, to his adoptive one, the
Italian culture. But, moreover, Io Ricordo is about the
transmission of a narrative from one generation to
another. This narrative, in its detailed description of a
bloody revenge, presents two cultures, the Armenian
and the Muslim, in which the director’s father served, a
Christian slave in a Kurdish community. The last three
minutes immerse us in the secluded atmosphere of the
Geghard Monastery in soviet Armenia, with a rupture
effect that takes on the dimension of a metaphysical
reflection: three candles and the deep singing of a friend
– this is the dialectical and Christian response to the
absurdity of human violence.
Uomini, anni, vita
Itália, 1990, 70’ | Sem diálogos
Este filme que tem por base o diário do pai de Gianikian,
constitui um marco na obra do casal. Mostra através de
imagens de arquivos russos a história emblemática do
povo arménio. Mas o que é que se vê? 1915: o Cáucaso
em chamas, exércitos que desfilam, cenas de luto…
Depois volta atrás: São Petersburgo em 1906. O fim de
um reino faustoso pressentido através de uma marcha ao
mesmo tempo solene e fúnebre. Depois o triunfo do
comunismo. Paz aparente na Arménia. 1935, o realismo
soviético impõe a sua visão do mundo. Por fim, regresso
a 1918: o êxodo dos Arménios do Azerbeijão. Sobre o
filme, escreveram os realizadores: “É impossível não
recordar as longas esperas e as viagens, por vezes
inúteis, para encontrar os materiais para o filme. O
desejo de procurar documentos filmados sobre a história
dos arménios, dos seus contornos. Eventos transmitidos
pelas histórias de família e pelos diários no exílio. Reunir
material disperso, espalhado como o próprio povo
arménio, em perpétuo movimento. Durante a pesquisa
surgiram excertos de filmes perdidos que alargaram o
âmbito da ideia inicial. Vêm à luz imagens de
acontecimentos históricos em todo o continente russo,
escondidos até agora. O arco temporal da preparação e
da realização do filme começa em 1987 com uma viagem
na Arménia soviética e prossegue depois com um
pogrom e um terramoto, em paralelo com o terramoto
político na ex-União Soviética. Simbolicamente, no
prólogo do filme, num quadro vivo, surge a Santa Mãe
Rússia, figurada. Abraça e domina os povos do Cáucaso.
Cristãos e muçulmanos estão ajoelhados aos seus pés,
mantidos à distância pela sua espada.”
This film, which is based on Gianikian’s father’s diary, is
a milestone in the directors’ work. Using images from
Russian archives, it shows the emblematic story of the
Armenian people. But what is showed? 1915: the
Caucasus in flames, armies marching, scenes of
mourning… Then, we go back: Saint Petersburg in
1906. The end of an ostentatious kingdom sensed
through a march, both solemn and funereal. Afterwards,
the triumph of communism. Apparent peace in Armenia.
1935, Soviet realism imposes its world vision. Finally, the
return to 1918: the exodus of the Armenian people from
Azerbaijan. About the film, the directors wrote: “It’s
impossible to forget the long waits and journeys,
sometimes useless, that we had to endure to find
materials for the film. The desire to search for filmed
documents about the history of the Armenian people, its
contours. Events passed on by family stories and diaries
in exile. Gathering disperse materials, scattered like the
Armenian people, in perpetual motion. During the
research, excerpts from lost films were found, which
expanded the scope of the original idea. Images of
historical events from all over the Russian continent,
which had been hidden until now, come to light. The
timeline of preparing and making the film starts in 1987
with a journey in soviet Armenia, and continues
afterwards with a pogrom and an earthquake, together
with a political earthquake in the former Soviet Union.
Symbolically, in the film’s prologue, in a living picture,
Saint Mother Russia appears, figuratively. She embraces
and dominates the peoples of the Caucasus. Christians
and Muslims are kneeling down at her feet, and are kept
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Rússia, figurada. Abraça e domina os povos do Cáucaso.
Cristãos e muçulmanos estão ajoelhados aos seus pés,
mantidos à distância pela sua espada.”
Saint Mother Russia appears, figuratively. She embraces
and dominates the peoples of the Caucasus. Christians
and Muslims are kneeling down at her feet, and are kept
at a distance by her sword.”
Nocturne
Itália, 1997, 18' | Sem diálogos
“Tout pour moi devient allégorie.” – é com esta citação
de Baudelaire que os realizadores começam nocturne,
filmado na antiga Jugoslávia. O filme é composto por
três sequências filmadas à noite, fragmentos do
quotidiano em que a guerra é invisível. O primeiro
mostra uma reunião de ciganos, a segunda um grupo de
jovens numa varanda a desempacotar uma aparelhagem
e a terceira encerra o filme com imagens de arquivo que
mostram uma mulher em imagens lentas e tintadas de
azul. Estas cenas apenas se relacionam com a guerra
através da sua interpretação alegórica. Os realizadores
parecem querer dar a quem vê um grande espaço de
interpretação. Os planos dos ciganos a celebrar podem
ser lidos quer como imagens de uma minoria
perseguida, quer como uma metáfora de uma
coexistência pacífica em sociedade. “Je ne vois qu’infini
par toutes les fenêtres,” diz uma legenda. Em nocturne,
a vista através de uma janela abre literalmente mundos e
interpretações infinitas.
“Tout pour moi devient allégorie”. It’s with this quote
from Baudelaire that Nocturne, filmed in former
Yugoslavia, begins. The film consists of three sequences
filmed at night, fragments of everyday life in which war is
invisible. The first one shows a gipsy meeting, the
second shows a group of young people on a balcony
unpacking a stereo, and the third concludes the film
with archive images that show a woman in slow, blue
tinted images. These scenes only relate to war through
their allegorical interpretation. The directors seem to
want to offer the viewers a large space for interpretation.
The images of the gypsies celebrating can be read as
images of a persecuted minority, or as a metaphor of a
peaceful coexistence in society. A subtitle says: “Je ne
vois qu’infini par toutes les fenêtres”. In Nocturne, the
view seen from a window literally opens up infinite
worlds and interpretations.
Ghiro Ghiro Tondo
Itália, 2007, 61’ | Sem diálogos
Uma colecção de brinquedos de criança feitos de
diferentes materiais: madeira, metal, papel, tecido, giz,
plástico e cera. O filme engloba o período que vai desde
o fim da Primeira Guerra Mundial até aos anos 50. Todos
os objectos foram encontrados nas Dolomitas, a cadeia
montanhosa dos Alpes orientais no norte de Itália, numa
aldeia que até à Primeira Guerra Mundial pertencia à
Áustria. Os objectos têm origem na Europa Oriental,
Norte de Itália, Rússia e Japão. As características comuns
destes objectos de diferentes regiões são evidentes. A
colecção é formada por categorias: humana, animal e
vegetal de diferentes tamanhos. A qualidade intrínseca
destes objectos reflecte o período histórico que medeia
entre o Fascismo, o Nazismo e o pós-guerra. As imagens
são vistas através de uma lupa. Através destes objectos
enrugados e diminuídos emergem elementos não só de
um mundo rural e camponês, de um mundo de trabalho
agrícola relacionado com os animais e os bosques, mas
também de um mundo de tarefas domésticas
relacionadas com a casa e os seus espaços, do artesanato
tradicional e do seu comércio. Distinguimos igualmente
A collection of children’s toys made from different
materials: wood, metal, paper, fabric, chalk, plastic and
wax. The film covers the period from the end of World
War One until the 50’s. All the objects were found in the
Dolomites, the mountain chain in the Eastern Alps, in
Northern Italy, in a village which, up until World War
One, was a part of Austria. The objects originate from
Eastern Europe, Northern Italy, Russia and Japan. The
common features between these objects from different
regions are obvious. The collection is formed by
categories: human, animal and vegetable world, of
different sizes. The intrinsic quality of the objects reflects
the historical period between Fascism, Nazism and the
post-war period. The images are seen through a
magnifying glass. From these wrinkled and damaged
objects emerge elements not only of a rural, farming
world, a world of agricultural work related to the
animals and the woods, but also of a world of household
tasks related to the home and its spaces, a world of
traditional craftsmanship and its trade. We can also
recognize elements of folklore and of popular and
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também de um mundo de tarefas domésticas
relacionadas com a casa e os seus espaços, do artesanato
tradicional e do seu comércio. Distinguimos igualmente
elementos de folclore e dos costumes populares e
religiosos. Um catálogo de 10.000 brinquedos que
sobreviveram à infância destruída pelas duas grandes
guerras, a miniaturização de materiais humildes com a
sombra ameaçadora do fascismo e do nazismo sempre à
espreita. Mas que relação tem o filme com a obra dos
realizadores que passaram vinte anos a reescrever a
história do século XX através da montagem de arquivos
documentais ou privados, denunciando as ideologias
fascistas e belicistas sempre à beira da eclosão? Mais uma
vez a tentativa de esquemas redutores, quer sejam
sociais, políticos, religiosos através dos brinquedos
“inocentes”. Foi Roland Barthes que nos lembrou que
outras mãos usaram estes jogos, mãos hoje
desaparecidas, feridas ou instrumentalizadas pela
loucura dos homens.
tasks related to the home and its spaces, a world of
traditional craftsmanship and its trade. We can also
recognize elements of folklore and of popular and
religious traditions. A catalogue of over 10,000 toys
which survived the childhood destroyed by the two
World Wars, the miniaturization of humble materials
with the threatening shadow of fascism always hanging
over them. But what is the relation between the film and
the directors’ work, who spent twenty years rewriting
the history of the 20th century through the editing of
documental and private archives, denouncing fascist and
warmongering ideologies constantly on the verge of
outbreak? Once again, attempting reductionist schemes,
whether social, political or religious, through “innocent”
toys. It was Roland Barthes who reminded us that other
hands have used these toys, hands that disappeared,
were hurt or instrumentalised by men’s insanity.
Frammenti Elettrici n.4 - n. 5 Asia - Africa
2005, 63'
"Frammenti Elettrici n. 4 e n. 5 Asia - Africa consiste de
imagens de arquivo dos anos 70 que revelam a
turbulência social e as diferenças entre os povos em
diferentes países asiáticos e africanos. Os planos, feitos
por amadores reflectem as condições económicas e
sociais nestes países antes do seu desenvolvimento como
áreas turísticas, e dos seus povos antes de serem
afectados pela devastação e pela guerra. As imagens são
indiferentes a um sofrimento que parecem ignorar e que
tem de ser revisto com o conhecimento e a distância da
actualidade." (Yervant Gianikian e Angela Ricci Lucchi)
Estamos no início dos anos 70 e o turismo de massas
substitui as expedições coloniais. As câmaras de Super 8
tomaram o lugar das armas que marcaram a sua obra
mais conhecida Do Pólo ao Equador. Uma vez passada a
surpresa – pela primeira vez somos quase
contemporâneos destas imagens e as viaturas que
cruzamos no Paquistão e que vemos hoje em inúmeras
reportagens –, encontramos o gesto cinematográfico, à
vez poético e político, dos cineastas. Por um lado, somos
mergulhados no fascínio das imagens, embalados pelo
ritmo hipnótico da montagem e por outro na
perplexidade: para lá da beleza destes belos e cuidados
reenquadramentos, os cineastas instalam a dúvida. E se
estes turistas, que também nós somos tantas vezes,
fossem os herdeiros desses conquistadores do espaço e
do tempo que foram os nossos antepassados? Numa
homenagem aqueles que foram filmados, capturados por
essas imagens, os Gianikian retêm um olhar, uma pose
"Frammenti Elettrici n. 4 e n. 5 Asia - Africa consists of
archive images from the 70’s which show the social
turmoil and social differences between people in several
Asian and African countries. The images, filmed by
amateurs, reflect the economic and social conditions in
these countries before their development as touristic
destinations, and the conditions of their people before
they were affected by devastation and war. The images
are indifferent to a suffering they seem to ignore, which
has to be reanalysed under the light of the knowledge
and the distance of the present." (Yervant Gianikian and
Angela Ricci Lucchi)
It’s the beginning of the 70’s and mass tourism replaces
colonial expeditions. Super 8 cameras replace the guns
that marked their most well-known work, From the Pole
to the Equator. After the surprise – for the first time, we
are contemporary with these images and with the cars
we come across in Pakistan and see in several news
reports –, we find the filmmakers’ cinematographic
gesture, at times poetic and at times political. On the
one side, we are immersed in the fascination of the
images and charmed by the hypnotic pace of the editing,
and, on the other hand, in perplexity: beyond the beauty
of these amazing and careful reframings of the images,
doubt sets in. What if these tourists (ourselves,
sometimes), were the heirs of those conquerors of time
and space – our ancestors? In a tribute to those who
were filmed, captured in those images, the Gianikian
retain a vision, an attitude, which is a form of challenge.
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fossem os herdeiros desses conquistadores do espaço e
do tempo que foram os nossos antepassados? Numa
homenagem aqueles que foram filmados, capturados por
essas imagens, os Gianikian retêm um olhar, uma pose
que nos diz de uma forma de desafio. Quer estejamos na
Indonésia, perto desses palácios destruídos há poucos
anos pelo tsunami, ou no Senegal, os olhares defendemse e por vezes acusam. Entretanto surgem novos troféus,
as piscinas aparecem cheias de gente e o comércio
parece funcionar como sempre... (Bertrand Bacqué)
sometimes), were the heirs of those conquerors of time
and space – our ancestors? In a tribute to those who
were filmed, captured in those images, the Gianikian
retain a vision, an attitude, which is a form of challenge.
Whether we are in Indonesia, near the palaces destroyed
a few years ago by the tsunami, or in Senegal, the eyes
defend themselves, and sometimes, they accuse. In the
meantime, new trophies appear, the pools are filled with
people and business is done as usual... (Bertrand
Bacqué)
Susana de Sousa Dias
48
Portugal, 2009, 93' | VO em português com legendas em inglês
O que pode uma fotografia de um rosto revelar sobre
um sistema político? O que pode uma fotografia de um
rosto tirada há mais de 35 anos dizer sobre a nossa
actualidade? Partindo de um nucleo de fotografias de
cadastro de ex-prisioneiros políticos da ditadura
portuguesa (1926-1974), 48 procura mostrar os
mecanismos através dos quais um sistema autoritário se
tentou autoperpetuar. “48 procura, assim, operar na
zona entre o que a fotografia mostra e o que ela não
revela; mas também entre a analogia e o estranhamento,
o enunciado e o vivido, a imagem e a memória. Pois
estas fotografias também são tempo: o tempo contido
dentro da fracção de segundo em que o preso enfrenta o
opositor; o tempo que nos permite entrar dentro do
universo enclausurante das prisões políticas e estar
dentro do instante onde se cruza o outrora com o agora;
um tempo múltiplo que extravasa as noções de passado,
presente e futuro.” (Susana de Sousa Dias)
What can a photograph of a face reveal about a political
system? What can a photograph taken over 35 years ago
say about the present? Starting off from a set of
photographs from the criminal records of former
political prisoners during the Portuguese dictatorship
(1926-1974), 48 tries to show the mechanisms through
which an authoritative system tried to perpetuate itself.
“48 tries to work in the area between what the
photograph shows and what it doesn’t reveal; but also,
between nostalgia and strangeness, between what is
stated and what is experienced, between image and
memory. Because these photographs are also time: the
time contained inside de fraction of a second in which
the prisoner faces his opponent; the time that allows us
to enter the suffocating universe of political prisons and
remain inside that moment in which yesteryear meets
nowadays; a complex time which goes beyond the
notions of past, present and future” (Susana Sousa Dias)
16
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Hartmut Bitomsky
Restoring the quality of realness to the cinema: an interview with
Harmut Bitomsky
Theo Bromin
You have been classified among those referred to as essay film-makers.
Perhaps that is a misunderstanding. I make documentary films, and the documentary film is
for me still a useful concept, which covers a very large number of possibilities. An essay film
creates its own subject; in a way it invents its subject in the process of making the film. It
establishes and determines the subject.
Whereas the documentary film refers to a subject that exists independent of it and has been
established by reality. But can you clearly separate the two?
That’s a very good question. They can’t be clearly separated because film is not a science and
it’s not literature. I recall something that Pavese wrote in his diary, a demand he made on
writing which film is actually much better capable of satisfying. He demands that the analysis
should not be openly pronounced, but rather it should be allowed to develop, in a rhythmic
way, from an intricate, connected grasp of reality. Intricate and connected! The analysis must
be included in life.
Sometimes life is also enveloped by the analysis... I’m thinking about Chris Marker.
Nothing against Chris Marker, Joli May is a wonderful film. Even if everything in it really
refers to Sans Soleil.
At first sight Joli May appears to be quite formless.
The film is actually a deterioration of form.
It is a television documentary, a film made of compiled material, a report, a travel film, a
documentary film, a propaganda film, a newsreel, an essay...
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… And a film d’auteur, mixed with the author’s own private mythology. All of this can be
discovered in it. It creaks at the joints and bursts at the seams, like an animal before shedding
its skin. And the flow of speech of the commentary, enhanced and inspired by the pictures, is
spoken over it, here it is spoken over the pictures, yes, and at the same time it is a bit like
reflecting in public.
And he has a political passion, an absolute, unbroken vote, and he speaks out.
Then there is the unforgettable scene of the man painting the mountain while hanging from
a rope, as if the rock were a canvas – the painter is sitting down below in the valley on the
veranda with a microphone in his hand and is giving him instructions over the loudspeakers.
His orders are heard echoing throughout the valley.
There is also something that recalls your films – the compilations, quotations from other
films, found footage that was reactivated, Castro in the Sierra Madre. And comics,
animated freeze frames, just for fun in between times.
You won’t find comics in my films...
But the commentary sometimes comes like a speech balloon, and then it floats like a
strange distortion, as imagination above the pictures.
Hmm.
Did Chris Marker influence you?
Yes, he did, but only later. Of course the French cinema of the sixties influenced me. Going
to the cinema back then meant coming to terms with the Nouvelle Vague.
That was Breathless, Les Quatre Cent Coups, Godard. Truffaut...
And The Little Soldier, Carabineri, Nana S., and Chabrol – Les Bonnes Femmes, and a couple
of people in the wrong place like Rouch and Rozier. The Nouvelle Vague turned the whole of
the cinema, as it had been viewed up to then, upside down. We had to approve of it and also
to deny it. All of a sudden everything appeared to present itself to our view as something new
and unscathed. And this view divided the cinema. Depending on your position, you had to
say yes to one thing but then also say no to something else.
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As a general fact you could rediscover that the basis of film is the camera shot. A film is a
series of camera shots that sometimes hang together and sometimes move apart from each
other. That is a lesson that I’ll never forget. Unfortunately, the camera shot has sort of got
lost in the documentary film, under the influence of the Direct Cinema in the United States.
The Americans have said that it should be thrown out, that nothing should indicate that a
film is being made, and everything should appear as if at the moment of filming no camera
had been at hand. First and foremost, I view myself as a film-maker, as someone who takes
pictures of things and deals with pictures of things.
What other lessons did you learn from the Nouvelle Vague?
That you have to keep pace on an intellectual level with what you do as an artist; that you
have to know that every story has already been made into a film and that only new variations
are being told; that a camera shot in a film not only forms the one situation that has taken
place in front of the camera, but it also forms other camera shots that come from other films.
Pictures are made from things, but they are also made from other pictures. A film, I once
wrote, is the struggle between reality and symbol.
A view that Bazin and Rossellini would attack...
I know. They have not considered that there are lost forms, which are destroyed when they
are removed from the cast.
Is not the scene in Viaggio in Italia overwhelming, where Ingrid Bergmann breaks down
crying and runs away when in Pompeii the lovers, in a nocturnal embrace, are removed from
the two thousand-year-old ashes covering them? That is one of the greatest moments that
there has ever been in film. Because Rossellini doesn’t tell you this, you have to learn to
understand yourself what you are seeing on the screen. You have to experience despair
yourself.
I don’t quite follow you. Do you mean that there is an unconscious film story which is lost
in every new film and yet is kept and reproduced? And does that mean that every new film
is nothing more than a new form that will become lost?
That’s right. Most of the time it is even an undeserved favor when a film is lost and no one
can remember anything about it, not even all the reasons why it was once showered with
praise.
Rossellini...
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This is the warm current that went through the Nouvelle Vague. Without his films the cinema
would have got stuck in the B-pictures in Hollywood or with Hitchcock. Rossellini gave back
to the cinema concreteness and realness, the material namely that photography and
cinematography need. Now you have to ask me about my documentary method.
Your films have always been solidly researched.
First of all, you have to press forward and reach the object – it doesn’t just present itself on a
silver platter, but rather it needs to be conquered. First you have to develop knowledge,
study things from all angles and then accumulate ideas, accumulate them and forget them
and then discover them again. There are no rules written down somewhere, and this is how
the work on a documentary film begins.
From this, some draw the conclusion that it would be best to know nothing at all in advance,
so as to approach the subject with a totally unbiased attitude and to put oneself and the film
at its mercy. However, I believe that every kind of ignorance is dreadful and leads to nothing
but stupidity.
With a documentary film there is no script, at least not beforehand. Doesn’t this mean that
you are necessarily stupid and ignorant?
You don’t yet know the script – it has to be developed during the filming. The author of a
film writes his script from the future back into the present time of the filming. You shoot the
film, but you don’t know what you’re creating. In a certain sense the film is buried in all the
material that is acquired when filming, and later during editing it first has to be dug out again
from among all the pictures and sounds that are all rolled up in those cans and boxes. This
leads then to this other idea, that actually every documentary film is made twice. First if is
made during shooting – that which in the moment of filming you have access to, that which
offers itself to the camera and which is the situation. And finally when the material is edited,
a very specific version is worked out. When editing, all the material is found footage, that is,
pictures that were made for a specific purpose, intended for specific contexts and provided
with a meaning and an idea – but all this doesn’t necessarily mean that this has been
accomplished in the material. Maybe there’s a totally different film buried in the material
than was envisaged during the shooting, and this film first needs to be discovered. When
editing, I treat everything that I’ve filmed like a quotation, like a film clip that has been
passed on to me, and now I first have to look at what it wants to show me.
Every documentary film thus becomes a compiled film, one that is made of found material.
21
Exactly. So, when in a documentary film there is the chance to cast an innocent look at the
object, a look which approaches it in a completely unbiased manner, then it is when the film
is being edited. Unfortunately, most of the time an attempt is made through the editing to
make the evidence conclusive that usually the film-maker has already offered before shooting
the film, regardless of whether the material can provide this or not. Sometimes a completely
different film was made than the film-maker thought and wanted to admit, and then this film
is suppressed in the editing room.
I have noticed that your films always embark on a path. The subjects suggest a distance,
and they have an extended way, a route, which the film then follows.
The connecting thread, the narrator that is worked into the story, the guide. Dante needs
Vergil in order to show us what hell looks like. I think that every film is a map on which a
way has been marked out. In a good film a clever way has been chosen, which leads us past a
number of places that invite us to cast a look aside. That is why I look for subjects that mark
out this path for us, like the production lines in The VW Complex. When the subject has this
sort of extending movement, then the film sets, so to speak, itself in motion. It’s like a river
that passes by the camera.
in Hartmut Bitomsky: Retrospective, Goethe Institut München, 1997
The documentary world
Hartmut Bitomsky
Films are not alone. They live in an environment of wonderful moments. One, for example,
is in Flaherty’s The Land, when a child takes a little piece of bread and wipes the last
remaining bit of sauce from his plate. There is the scene of a sandstorm in Turksib by Viktor
Turin: the figures are seen crouching down behind the bodies of the camels, and the bulging
bales of cotton burst open. The sand buries and suffocates a whole caravan. At the end only a
couple of pieces of white fluff remain, which are blown about over the dunes by the wind.
We know nothing about the people nor about the covering letters that they were carrying
under their jackets. The greatest tragedies always probably occur in a state of anonymity; it is
not necessary to have individuals and persons in order to speak about the human condition.
22
There is the smile of Nanook, the Eskimo whom Flaherty got to play himself, but who in
smiling into the camera stepped out of his role, and in doing so created what many would
like to call the documentary moment, the moment of truth that only cinematography can
create.
There is the circle of faces that Eisenstein in The General Line has gathered around a
separator, the device that removes cream from milk. In the spinning movement of critical
emotions a clarity shows in the faces of the farmers. One can see the smoothness of the
features, the swaying of firm opinions and the hardness of the singular character.
Another film is Las Hurdes [Land Without Bread], which impresses me because of its
incorruptible pitilessness. It does not ally itself with poverty, nor does it blur the difference
between film-making and the filmed subject
There is the bird that flies up from a branch, startled in anticipation of the pealing of a bell,
which Basil Wright only includes later in the film when he adds the sound track to Song of
Ceylon.
From Franju we learn that even in the cruellest moments, there is something like a condition
of mercy in which everything has a part – people and things – even in the shabbiest and
most despicable state.
There is Vigo, who during every take in A propos de Nice cannot conceal how filming has
made him so excited, and the cheerfulness that overcomes him in view of the fact that
someone with a maimed hand takes part in a game that nonetheless requires dexterity.
In Forest of Bliss Gardner describes to us the world in its total unintelligibility and
incomprehensibility. People develop activities, carry out plans and ritually obey regulations
and laws, and yet there is no real reason why things have to happen the way they happen.
Nothing must be the way it is.
In a Kinopravda [cinema-truth] by Vertov, a person is seen crossing the wide street, and the
camera moves with him showing his movement in great detail, in order to let us see exactly
how crossing a street takes place – as if this walking movement were the most important
event happening at this moment in the world. There is Grierson, who in Drifters, as sailors at
sea wake up in the morning blinking their eyes, inserts shots of houses situated on the
beach, as if the seamen with a feeling of longing are trying to salvage their last dreamy
thoughts or home from the depths of sleep into the reality of the day.
And there is also the cheerfully light, almost carefree film-making style of Jean Rouch in
Chronique d’un Été, with his nearly brazen use of an obsolete grammar of film to treat a
unsuitable subject.
We also have the media of film to thank for showing us that people are no more than masks,
masks that bear an extraordinary resemblance to themselves. What they do in film are simply
23
attempts to acquire a physiognomy through their work – one could also say, attempts to
make a grimace at the world.
That is the society in which I see my films.
1.
The work of an artist, says Lévi-Strauss, is engaged in a threefold dialogue. First of all there is
the dialogue with the audience or, as it is referred to these days, with the user, which is a
halfway acceptable term. However, when we consider the many misunderstandings, the
wrongly understood and forgotten and rediscovered works, the outrage of scathing reviews,
the condemnations, the attacks of the censors, the scandalous events, the ridiculing and
mutilation, then it becomes clear how difficult and controversial this dialogue is. And
perhaps it must be this way, confused and erratic. This illustrates clearly the extent to which
indeed all communication also contains an element of unreconciled opposition and conflict.
In a work of art this might even appear to be enlarged.
The reason for this seems in part to lie in exactly the other two dialogues that the work
maintains. One of these dialogues refers to the depicted things, the represented objects, the
model (Lévi-Strauss uses the term model here, because he is referring to paintings and
sculptures in the fine arts; for similar reasons Bresson, incidentally, also calls his actors and
actresses models). From a broad perspective this is a dialogue with the world and with
reality, which the artist confronts together with his work of art, and which attempt to gain
entry to the work in various ways.
Finally, the third dialogue deals with the artistic material that the artist has, or does not have,
at his disposal he material that he must select or master. For the filmmaker this artistic
material consists of the camera, the lens, filters, light, sound and editing, and the whole
history of film and all methods of making a film that exist or that do not yet exist.
2.
In the dialogue with the artistic processes there appears something that in another place
would be called the aesthetic resistance. The work of art gives to things a particular form,
one that they do not bring with them naturally – it first has to be given to them, and
sometimes in a really violent way. A situation is not simply filmed; the images, the shots have
to be worked out. Eisenstein speaks of the film shot, and thus of filmmaking in general, as
knocking out a piece of reality by means of the lens. This is related to Michelangelo’s dictum,
according to which the statue may indeed already be contained within the block of marble,
but the superfluous parts would still have to be hammered away. In Man of Aran Flaherty
shows how a small boy catches fish from high above in the cliffs. The boy is wearing a
24
balloon-like cap. He smiles as he removes it, and he has to take it off because under the cap
he keeps his bait – live shrimps. Having no fishing rod, he extends his leg outward and
lowers the line down to the water between his toes.
In order to show all of this, perhaps three of four shots would have sufficed. One long shot
for general information, a close-up of the boy, another one of the foot, then another long
shot and the episode would have been clear to anyone. Flaherty, however, shot the scene
from all sides, from the front, from the side, from the back and again from the front, from
above and from below; he repeats takes, re-edits and cross-edits them. He really has the boy
work in front of the camera.
This method has, of course, a delaying effect, completely in the style of Flaherty’s slow
procedure, referred to as slight narrative. This can be called the putting up of aesthetic
resistance. Just as in music a phrase is modulated again and again, the film images, as if they
wanted to be heard from all sides, spread out in every conceivable direction, until it becomes
evident that here Flaherty is comparing the work of the boy with that of film-making, and that
the one type of work is just like the other, as if there is a close affinity between them.
3.
The third dialogue is the dialogue with the subject, with the object in the lens, with reality,
the dialogue with the world. What happens in front of the camera at the moment of filming is
the domain of the documentary film. The camera is aimed at objects that exist independent
of it and of the situation in which the filming is taking place. It is fixed on the material world,
in a visibility of its own.
With a certain justification it can be assumed that the documentary film works with readymade objects: things that already exist, that are prefabricated in a particular, already
developed form and state, and with a separate history; things that have their own distinctive
right to exist, that have developed in a specific (even if perhaps unknown or only vaguely
suspected) context to become what they are. I call this development a primary production,
by which I also truly understand the process of a person’s life, the production of his
biography and physiognomy, his individuality, his character and his fate.
The film-maker – by making a picture and by recording a sound – tears the subject out of its
original context, sometimes in quite a violent way but sometimes without leaving behind a
distinct mark (which is what happens with ready-made objects in the strict sense of the
term), and places them in a new context and into another structure. This is what I term
secondary production or the aesthetic production (it can well be minimalist or, in
accordance with the theories of Direct Cinema, consist more of an avoiding of the aesthetic
element).
25
Grierson once defined the documentary film as a creative treatment of actuality – whereby
creative treatment could indeed refer to what has here been called the second aesthetic
production and should certainly be associated with Levi-Strauss dialogue with the artistic
material. Behind the concept of actuality there appears once again the completed substance
of reality, as it is also suggested in the term ready-made object. It is from this consideration
that the idea of the primary production was developed
In keeping with this idea Siegfried Kracauer in his most important work, Theory of Film
(which bears the subtitle "The Redemption of Physical Reality”), distinguished between the
two fundamental categorical functions of film, namely a recording function and a revealing
function. This certainly goes along with Dziga Vertov’s dual appeal to film: it is to capture the
world as it is, and at the same time it must decipher it.
How can, however, this registering and the revealing, the reproduction and the deciphering
tally in this equation? When Joris Ivens unexpectedly encountered difficulties during the
production of a film a while ago, he believed to have discovered that the aesthetic
production was definitely derived from reality. The task involved filming some workers as
they were in the process of moving basalt rocks, but somehow Ivens was not able to correctly
capture the work in pictures. So, he looked for a way of gaining access to the action in that
he performed the work himself, and this gave him information about how to go about
filming the subject: "I noticed that the greatest exertion was in the shoulder muscles and in
the chin. Thus, to film this action, these places had to be emphasised because they are an
organic part of the work. From then on the camera, the angle of shooting and the
composition of the picture were all determined by these muscles and the chin. They became
something like two focal points of the action. The photography is determined by reality and
not by my aesthetic efforts to obtain a well-chosen balance between line and light. But then it
was precisely this realistic viewpoint that was the most beautiful one. I could not film the
stoneworkers before I had understood the physical exertion involved in their work."
Although it cannot be denied that Ivens insight has a certain, almost touching persuasiveness
about it, nevertheless there are doubts that the standpoint of the work and the standpoint of
the film-making could simply coincide. The reason for this is that pictures do no just come
from the things they depict; they also originate from other pictures, and this origin cannot be
placed in a picture.
4.
Another film by Ivens, namely De Brug (The Bridge was his first film, which one notices
because of his particular fascination with pictures) elucidates the problem from another
point of view. The film, as the title indicates, is all about only one thing: a bridge. The one
26
here is a lift bridge, which is raised so that large ships with high superstructures can pass
under it.
The film shows all views and aspects of the bridge, every single element and each individual
function during the construction of the bridge. One would almost like to say that each detail
corresponds to a camera shot, just as the bridge itself corresponds to the engineers’ detailed
plans according to which it was constructed. Indeed, one could say that the film is a blue
print of the bridge – it is created before our eyes a second lime, and this time it is not to be
used by pedestrians or by railway passengers, but rather to be looked at.
This leads us to consider that a documentary film does not simply reproduce reality, but
rather causes it to be created visually once again: it shows us how reality is created. What we
perceive is the creation of reality, the creation of a second reality.
Jean Rouch, who with his cinéma vérité worked on exactly the problem of how to record
and reproduce reality, was incidentally led to the concept of cinétrance by a similar
realisation. The concept cinétrance describes the fact that when a piece of reality and a
camera are brought together, something new is created, something that would not exist if the
camera were not present.
5.
This conclusion causes, of course, a certain uneasiness and invites us to contradict it. With
the documentary film there is an almost yearning expectation of reality, enlightenment and
truth. In the same way there is also its opposite, namely a disappointment and a discontent
of all those truths and realities that are brought to the surface in the documentary idiom.
Chris Marker once described this conflict as two fundamental ways of behaving, which the
documentary film synthesises. On the one hand the film-maker behaves in a modest way
towards reality and accepts it as it is. On the other hand, however, he determines beforehand
what reality has to be – and when in fact it does not correspond to this, then reality is just
wrong. In other words, first reality is accepted, and even more than that, it is held as if in a
tender embrace; then it is rejected and denied.
In "Let Us Now Praise Famous Men" written by James Agee there appears a photo of a pair of
torn-up shoes, which was taken by Walker Evans. This photograph puts the observer in an
almost paradoxical situation. It is apparent that the shoes have reached the end of their
usability, and they are looked upon as someone’s wretched belongings, as poverty that is
naked and above all dispossessed of its usefulness. We revolt at the sight of them.
Nevertheless, at the same time these shoes have a unique preciousness: they are real shoes
and they have a true life-story. They were not devised nor specially produced for the picture:
they are not props, not part of the scenery, and they have not been made instruments of
27
something. They simply are what they are. And they are beautiful, with an unmistakable
beauty all their own. Finally, it should definitely be added here that the shoes in the photo
no longer exist. They have rotted. The pictures show a reality that does not exist. Perhaps the
documentary is nothing more than a place of exile for reality, a home away from home.
What I am getting at is that the documentary, because of its subject, is a critical genre. It is
the expression of a crisis, because that which we call reality is itself something that is in a
crisis. This realness is always in the process of dissolving, breaking apart, breaking down and
breaking through, of developing and changing, of slipping away and of crossing over. The
concept of reality itself indeed concerns an object in its crisis.
6.
Franju, whose film Sang des Bêtes will remain unforgotten, although the slaughterhouses in
Paris no longer exist – they are now art exhibition halls – and although the animals in the
meantime are slaughtered in a completely different, namely industrial, way, Franju in a
discussion once emphasised the artificial aspect of realness as it appears in film. He said that
with a film the world had to be created again, because it was constantly running away from
us. "Reality denies reality" – this is the formula he reduced it all to, and for this reason the
artist always has to give reality an aspect of artificiality. Reality is always on the run. A
documentary film cannot keep a firm hold on it; it can only create it again.
In a metaphorical way Fellini once evoked this loss of reality as a wonderful albeit wistful
moment: In the film Roma, when a catacomb is opened during excavation work for an
underground, frescos are discovered which have survived there in the darkness for two
thousand years, but in that moment through the fresh air that streams in and the daylight
that filters in they are destroyed and vanish from the walls before our eyes.
7.
New York, N.Y. is a film whose subject refused being captured by the camera in another,
perhaps even more extreme way. It is an almost inconspicuous, casual little film by Raymond
Depardon, who made it in New York at the beginning of the eighties, and it consists of only
three albeit long shots.
The first one is a travelling shot high above the East River along a bridge full of traffic, taken
from the gondola of a cable railway that passes over the river at that location. The second
shot shows a street intersection in Manhattan in the twilight – a couple of pedestrians are
crossing the street. The third shot is again a travelling shot over the river, although in the
opposite direction and at a later time of day.
28
In a voice-over during the first shot Depardon says a few sentences about how the film came
about: A few years before, he had stayed in New York for a couple of weeks, and every day he
had set out with his camera to take shots of the city. After finishing he had gone into a little
café and looked out of the window at the intersection. At some point in time he had
discontinued shooting the film, had returned to Europe and had totally forgotten the film
about New York until he discovered these three shots during an occasional examination of
his film material.
These three shots became the film, but it is not about New York: it is the film that New York
made against the film-maker. He looked at the subject, but it did not look back at him; it
merely turned its back on him.
The filming was done in New York, but what it shows is not this city but rather a hazy
diffusion, which softens the three pictures with shadows, as if perceived through the
unwashed windowpane of a café. The passers-by at the street intersection are nothing else
but strange, anonymous silhouettes, who are wandering through a Nietzschean metropolis.
No one sees anyone else, and everyone is alone.
This film sticks like a thorn in the flesh of documentary film-making. It instantly caused all
other documentary films to age, so that the whole genre, in its self-confidence of being able
to capture what is real, has something strangely old-fashioned clinging to it. This is because
the documentary film has always seen itself as a driving force in the salvation of reality, and in
this regard it was always certain at the affirmation of the real object.
Here, however, the object manifests itself through its absence. It has vanished from the film.
8.
In order to continue developing the concept of disappearing reality (of the reality of
disappearing), we should remember the fact that there are astonishingly few film recordings
of the Gulf War. The explanation given is the rigid censorship of the military. The Vietnam
war had been accompanied by a flood of pictures – it has even been suggested that this flood
of pictures was a decisive factor which contributed to ending the war. This time history was
not to repeat itself, and thus the entire press coverage of the war was put under the massive
control of the military. In a way the censors functioned like a photo agency, which at their
own discretion did or did not make their material available to the press.
As a consequence the visuality of the Gulf War remained rather meagre. When new material
was released recently, which until then had been kept under lock and key, it was possible to
view scenes like the following: A group of tanks moving at high speed through the flat desert
(this shot was fairly long) suddenly came to halt and then fired a series of rounds in an
29
undefined direction. No target could be seen, and for that reason it was not possible to
determine what damage the barrage of cannon fire had caused. Finally, the tanks turned
around and returned in the direction from which they had come. Then there is a cut to
General Schwarzkopf, who said that they had hesitated for a long time before attacking the
heavily fortified lines of the Republican Guard, but then finally decided to proceed, and in
fifteen seconds the job had been completed.
What took place cannot be called a battle of tanks. To identify this event as a conflict between
two opposing military forces who resolved their differences with the use of weapons is
simply impossible. The kind of weapons and strategies used make traditional war invisible.
The soldiers are no longer engaged in action; they fight each other over enormous distances,
and instead of making contact with the enemy, they sit down in front of television monitors
on which combat targets appear as small dots of light.
Other pictures of this war – but should we not call them pictures? – were made by cameras
mounted on missiles, which glided through a milky darkness until the missile hit the target
and the transmission on the monitor died because the missile and with it the camera
exploded. Nothing was seen of what took place. It was necessary to resort to one’s
imagination in order to recognise again a reality in this softened representation, a reality that
at one time was powerful but now has been done away with.
In the television series Heimat [Home] by Edgar Reitz there was an aerial shot of Hunsrück,
which was supposed to show in one take the entire area where the action with its stories
would cover. The shot was filmed from a jet fighter, which flew at the speed of sound. It
lasted, I don’t know, for about two minutes, and what there was to see can no longer be
called a picture: it was a trembling, blurred shaking movement of visually perceived
elementary particles, crashing into each other grey in grey. Such enormous speeds
disconnect the cinematographic picture from every object, and the unit of measurement of
twenty-four frames per second can no longer capture it. Virilio will probably not have seen
this shot. Otherwise he would have rewritten his book “Cinema and War". Modern war and
cinematic pictures do not go together any more.
9.
With the advent of digitalised pictures, the detachment of reality from the cinematographic
and photographic image has again continued at an accelerated pace. Every digital element
can be substituted for another digital element without leaving any trace of this substitution. A
photograph (or what looks like a photograph) does not necessarily have to refer to a real
model, at least not entirely. Then we would be at the end of the age of a consubstantiality of
photography and object. The technique of retouching – for which photography in the Soviet
30
Union was condemned and ridiculed – has become a generally used, accepted and
commended process (Forrest Gump was still a bit chubby, but that will improve).
This situation is a challenging one. In the future the documentary film will have to change in
order to survive and to have new definitions for itself to develop. It will no longer be able to
exist by guaranteeing a truth that is based on the mechanical reproduction technology of the
camera and the film material. Authenticity has held the documentary film in shackles long
enough, and consuming reality instead of producing it more than ever will not be sufficient.
And it will become evident that the reality even of something documentary is not to be found
somewhere beyond the pictures but rather in them.
in Hartmut Bitomsky: Retrospective, Goethe Institut München, 1997
O vestido preto das coisas
Hartmut Bitomsky
A maior das felicidades
Em Let Us Now Praise Famous Man Agee descreve como aproveitou a ausência dos
rendeiros, em cuja casa se instalou, para a passar a pente fino e lhes vasculhar os pertences.
Faz um inventário penoso de todas as divisões. A certa altura comenta que tudo o que
pertence àquelas pessoas está no “fim da sua possibilidade de utilização”.
Ler isto toca-nos. Não é a pobreza precisamente o não possuir instrumentos de trabalho? Mas
também nos choca que para as pessoas as coisas, mesmo quando já não servem para nada,
não percam por completo a sua preciosidade. Demonstram ter uma validade que ultrapassa a
data da sua função e finalidade, e não são rejeitadas porque algo perdura nelas: uma
imagem.
E talvez seja com este fim da possibilidade de utilização, tanto das coisas como das pessoas,
que o trabalho documental começa.
“Parece-me”, escreve Sklovski, “que a maior das felicidades é o contacto original com a
realidade.”
31
A Propos de Nice
Jean Vigo estava ligado a Nice por uma relação de amor-ódio. Para receber algum dinheiro,
quis fazer um filme sobre a cidade. Estudou as ruas e a história, passeou com as ideias para a
frente e para trás e não sabia onde espetar a estaca e delimitar o tema.
Entregou o seguinte plano rudimentar para os trabalhos preliminares: “A. Nice vive do jogo.
B. Tudo em Nice conduz ao estrangeiro: 1. os grandes hotéis, 2. a chegada dos estrangeiros,
3. o jogo, 4. aqueles que vivem do jogo. C. A população de Nice é no geral tão
desinteressante quanto os estrangeiros. D. De resto, tudo em Nice se consagra à morte.”
Se o esboço de ideias, que contém também uma brincadeira silológica, está marcado por
uma recusa que ainda atravessa o filme, este veio a tornar-se outra coisa. Tinha que ser outra
coisa porque todas as filmagens pressupõem uma aproximação ao objecto.
Um filme documental tem de dizer “sim” ao mundo, mesmo quando o critica.
Na estreia do filme, Vigo proferiu um discurso em que descrevia Buñuel e Le Chien Andalou
de tal modo que parecia preferir assistir à exibição desse filme em lugar do seu.
E depois exigiu uma “arte cinematográfica mais precisa” – o filme documental social que
descreveu como “ponto de vista documentado”. Utilizou o termo point de vue, que pode ser
traduzido por ponto de vista, tomada de posição, visão ou perspectiva.
No final disse: “E o objectivo é alcançado quando se consegue destapar as causas secretas,
quando se é capaz de revelar a beleza ou a caricatura de uma pessoa normal, uma pessoa
qualquer, quando se é capaz de expor o seu espírito recorrendo à pura demonstração física
de um movimento colectivo. E isso com uma força tal que se mostra o mundo, onde até aqui
vagueávamos indiferentes, contra a sua vontade e para lá da sua mera aparência.”
Pintar imitando a Natureza
Cézanne espantava-se com um pintor que executava os seus estudos imitando a Natureza.
Dizia: “Uma árvore tem mais folhas, e todas diferentes, do que o homem alguma vez
consegue imaginar.”
O mesmo se passa com o documentarista e a realidade. Há mais factos, motivos e condições
numa obra do que alguma vez ele possa imaginar ou até esteja pronto a admitir.
A sua contribuição, a nível do entendimento ou da explicação, só pode ser uma redução
daquilo que encontra.
Dantes, a Natureza era um conceito generoso, Hegel aliás designava, e talvez com alguma
irritação, toda a realidade que se encontra diante do Homem como “a alteridade da ideia”, e,
num outro passo, “a contradição sem solução”.
32
Justi, que Veláquez tanto admirava, apesar de demonstrar nos seus quadros uma falta de
elevação, nobreza e transcendência, defendia o realismo do pintor desta forma: “Se ele
coloca nas coisas menos do que todos, vê nelas, em compensação, muito mais.”
A primeira frase de Grierson
O filme documental é um tratamento criativo da realidade; no original inglês, a creative
treatment of actuality – o que deixa entrever outros significados paralelos. Actuality é a
realidade no sentido dos factos e dos acontecimentos; também tem qualquer coisa de acção,
que ecoa igualmente na palavra treatment, e ainda algo de presente e actualidade.
Assim deve ser entendida a crítica de Grierson a Nanook, o esquimó de Flaherty; o arpão
erguido de Nanook não conseguirá nada contra um corretor da bolsa. Não há aliás nada no
seu reportório de armas que possa ser utilizado contra o mundo das finanças. E não há
corretores da bolsa a viver no Árctico, o que teria provavelmente contribuído para que os
esquimós desenvolvessem alguma arma contra eles.
Claro que aquilo que Grierson quer dizer é que Nanook não é o objecto ideal para um
documentário porque tem muito pouco que ver com a realidade do século XX.
Mas a realidade contemporânea também tem muito que se lhe diga. Não é igual em todo o
lado e também não é estável. A pesca, tal como Grierson a mostra no seu filme Drifters, já
não existe hoje.
Será que o filme morre? Não me parece. Sobrevive e vai continuar a sobreviver e mais tempo
ainda do que qualquer realidade em que Grierson o colocar. Vemos o filme hoje e ele ainda
nos ajuda a perceber muita coisa. E também não caiu numa categoria museológica que
poderia disponibilizar um mundo histórico a quem se interessasse por isso.
A defesa de Flaherty
Grierson: “Ele referia-se […] a uma frase que eu uma vez disse em Nova Iorque, em sua
defesa […]. Tratava-se da descrição platónica da metafísica, em que Platão afirma que não há
fogo que se acenda e chama que queime sem que primeiro haja um longo diálogo com a
matéria e sem que se tenha vivido com ela.”
Durante a produção de Nanook, o esquimó, Flaherty usou a câmara também para tirar uma
cópia e projectá-la. Revelou ele próprio o material, fez a cópia e apresentou-o ao esquimó.
Tentou compensar a perda de realidade com um modo de fazer cinema que fosse total.
Uma destas projecções poderia ter sido uma cena central do filme, mas a câmara estava a ser
usada como projector e portanto não podia gravar o momento. O episódio com o gramofone
substitui a cena em falta.
33
Durante a rodagem, dedicada sobretudo à caça, Nanook não podia ir caçar, tinha de
representar a caça. Antes que a vida possa aparecer à nossa frente, tem de ser composta.
Nanook e a sua família subsistiram durante este período à custa de Flaherty. Anos mais tarde,
Nanook morreu à fome. Quando se soube disto, Flaherty foi acusado. O seu filme tinha
entrado com demasiada profundidade na vida dos esquimós.
Man of Aran
Primeiro, apenas o mar nas suas muitas variantes, em diferentes locais. Nenhuma vaga se
assemelha a outra. Flaherty gostava da repetição, da distensão, da insistência no sempre
igual. É preciso algum tempo até que a qualidade simbólica da força da natureza se imponha
e parece demasiado montado.
Depois a casinha, a mãe, o bebé, o rapaz. Espreitamos para fora através de uma janela
minúscula. Vemos os homens a regressar da pesca. O barco desaparece uma e outra vez por
trás da crista das ondas. A rebentação atira-o para a costa e puxa-o em seguida de novo para
o mar alto. É difícil remar contra a maré.
Parece ser uma praia, quando finalmente conseguem trazer o barco até terra. Notamos que
vem danificado. Reparamos que é sempre assim e que de cada vez que acontece é quase uma
catástrofe.
Salvou-se a pescaria. Puxam a rede uns quantos metros para a costa e quando a vaga seguinte
rebenta, largam a rede e põem-se a salvo. Quando a água recua, correm atrás da rede,
puxam-na mais uns metros e voltam a largá-la quando a massa de água se aproxima.
E é assim, para a frente e para trás. Ganham uns quantos metros, perdem uns quantos
metros. E assim se percebe de onde vem a expressão “luta da vida”.
Só com sorte podemos ganhar.
Mais tarde vemos a caça às baleias. Aparentemente os animais concentraram-se numa baía
sossegada para que Flaherty pudesse filmar. No mar alto não seria possível. Para clarificar
que o acontecimento é mesmo dramático, Flaherty divide-o em vários planos o mais
aproximados possível. Vai passando dos pescadores para as baleias, de uns para outros.
É a montagem que torna a acção tensa, a tensão está pois no filme e não no acontecimento.
Nada se passa, tudo se evoca.
Coup de Boule
Música de marcha na penumbra; uma lanterna fraca junto ao chão; adivinham-se botas de
soldados a marchar. A luz espalha indistinção na imagem, um material sem definição.
34
Mas este defeito é também a verdade do filme. É disso que ele trata.
Jovens soldados franceses na caserna – paredes, camas, cacifos e portas. No meio, caras
jovens e saudáveis que deixam adivinhar a sua origem mas nada da sua biografia.
Têm nomes, patentes e tarefas. Um deles é Chasseur mas ajuda na cozinha, outro é Caporal
e conduz. O filme apresenta-no-los um a seguir ao outro. Eles dão-se orgulhosamente a
conhecer: ser um nada, também isso se preenche com uma autovalorização.
Correm com a cabeça contra a parede, martelam a testa contra o cacifo. Coup de boule, é
assim que se diz. Não o fazem para a câmara. Fazem-no entre eles e consigo próprios.
São corajosos e insensíveis à dor. Nalguns deles cresce um galo. Um deles cambaleia, tonto,
fez um K.O. a si próprio.
São jovens e indomáveis na sua vontade de viver. Como é que podemos aceitar ser
humilhados e denegridos e desprezados? Temos de ser mais fortes do que a dor se não
queremos conhecer o inimigo, e temos de nos anestesiar.
As mãos negativas
Marguerite Duras viaja manhã cedo pelas ruas de Paris e aponta a câmara às casas. Vemos as
fachadas, janelas, pilares a passar.
Há pessoas a viver aqui. Não se vê grande coisa delas. Na berma da estrada, sacos do lixo à
espera. Quando as pessoas abandonarem a cidade e o mundo inteiro, a primeira hora será
como esta, e a cidade vai ser um mar de pedra e as casas uma rebentação hirta.
“Eu chamo”, diz Duras neste vazio, “eu chamo aquele que me vai responder”.
A primeira vez que vi o filme, na versão alemã, percebi outra coisa. “Eu chamo aquele que
me ouve”, e não era uma tautologia, mas sim uma conclusão desumana e uma sabedoria que
causava uma rara impressão, porque as palavras vinham da solidão desesperada de um
trabalho artístico e ainda assim ecoavam num milagre que evocava toda a percepção.
Urgences
O filme intromete-se na conversa entre o médico e o paciente num serviço de urgências
parisiense. O diálogo é antiquíssimo, não há novidades na conversa.
Os problemas que as pessoas trazem para este local não querem ser resolvidos. Por isso os
médicos fazem perguntas idiotas, perguntam por exemplo que dia é hoje e coisas assim. Os
pacientes respondem socraticamente. Aos médicos resta apenas representar um papel
ridículo, o papel daquele que não faz ideia e a quem se tem de explicar tudo.
35
A doença não encerra apenas sofrimento e preocupação, mas também uma resistência
enérgica, uma força que fala contra a vida, uma filosofia enraizada numa praxis sem chão.
A mulher preguiçosa que se sente abusada sexualmente e que preferia falar do Péguy. O
jovem que diz que não sabe de nada mas que domina a situação de tal maneira que pergunta
ao operador de câmara se quer que ele ria.
A bêbeda que tem mesmo de se ir embora porque tem de ir tomar conta de uma alcoólica
em estado avançado.
O velho que pede cianeto, o azul amargo, para não chatear ninguém.
Deram todos nas vistas. E dão nas vistas porque não se entregam ao hábito imutável de estar
no mundo. Escapam-nos, a nós que vemos e ouvimos, sem que consigamos achar justificação
para o seu comportamento, para tudo aquilo que parece ser importante. Puxam-nos para a
sua fatalidade. Mostram com clareza que é possível desaprender tudo o que aprendemos.
O serviço de urgências psiquiátrico concentra o mundo e como é viver nele. O local é um
foco e foca-se uma luz sombria. O filme de Depardon é um papel que se inflama com as
temperaturas mais frias.
A mulher que foi violada num elevador e que teve depois o bebé. Ama a criança mas não
suporta o choro, trabalha, há que dizê-lo, num infantário…
Fala disto com uma voz suave enquanto espera pelo médico. À falta de um ouvinte
competente, conta-o ao homem do som que segura o microfone.
É o único que quer ouvir profissionalmente o que ela diz. Deve tê-lo percebido
instintivamente.
A cor da fotografia
A 4 de Junho de 1857, os irmãos Goncourt escreveram no seu diário a propósito da visita a
um leilão de fotografia: “Neste século tudo é preto. Não será a fotografia o vestido preto das
coisas?”
Uma metáfora que merece reflexão. O vestido cobre o corpo e também lhe dá forma. Tem de
se adaptar ao corpo e também tem um corte próprio. É protecção e embelezamento e, tal
como dá visibilidade ao corpo que se cobre com ele sem o mostrar, também é meio de
reconhecimento.
Mas o vestido que veste as coisas é preto, dizem os Goncourts: a fotografia é um traje da
tristeza.
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San Pietro
O filme foi filmado em 1944, sendo lançado um ano mais tarde e com bastantes
modificações. O exército tinha objecções e foi anteposto ao filme o discurso de um oficial
para suavizar o efeito desmoralizador ou para o evitar.
Paul Rotha notou, a propósito disto, que o filme de Huston demonstra a grande diferença
entre as necessidades das estratégias militares e a coragem humana, a capacidade de
sacrifício dos homens que realmente lutam mesmo tendo medo.
“A vida destes homens era valiosa – valiosa para o seu país, valiosa para os seus entes
queridos e valiosa para os próprios homens”, diz-se em off quando os cadáveres são metidos
nos sacos.
O filme tem então dois objectos: a batalha por San Pietro tal qual ela aconteceu. Ou mais
precisamente: trata da relação entre a conquista da terra e as perdas militares.
É uma conta terrível. A vitória custou mil cento e cinquenta soldados americanos, já para não
falar da vida dos alemães, e no final a pequena cidade de San Pietro, com setecentos anos de
história, encontrava-se completamente destruída. Aqueles que lá viviam não tinham qualquer
motivo para considerar isso uma vitória.
Podemos ver como as operações militares são abstractas e concretos os seus resultados. E
com isto passamos ao segundo objecto do filme: a relação da câmara com a guerra.
Guerra é action, e por isso aparentemente o tema preferido do cinema. Só que a câmara não
a pode mostrar. Pelo menos não por completo, pois acha-se sempre de um dos lados do
acontecimento. É cinema sem contracampo, não há relativização, equilíbrio de armas, há
apenas esta intransponível linha de demarcação.
Não passamos para o outro lado, o dilema de qualquer filme documental.
O Sangue dos Animais 1992
Será o sangue dos animais hoje diferente? Era vermelho, ou pelo menos avermelhado,
quando filmado a cores. Será o frígido requinte, característico de Franju, ainda concebível
nos dias de hoje?
Vivemos no futuro do filme. Os seus temas, dizia Franju, são aquilo de que ele mais medo
tinha, aquilo que ele nunca viu.
O matadouro do filme já não existe – resistem alguns edifícios que são usados como locais
de exposição e temos de ficar na bicha para lá entrar e olhar para as obras de arte.
O filme captou um mundo de que já não resta grande coisa. O mercado junto ao canal foi
substituído por um bloco de apartamentos.
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Franju dizia que com um filme o mundo tem de ser construído de novo, pois ele afasta-nos
do mundo. “A realidade desdiz a realidade”, resumia-o nesta fórmula, e por isso um artista
tem de dar sempre à realidade um aspecto artificial.
Franju referia-se aos seus filmes, que nunca são convencionais; mas a realidade também diz
isso em relação a si própria: aquilo que na altura Franju conseguiu descobrir, já não o
encontramos hoje em lado nenhum a não ser no seu filme. Vivemos no seu futuro.
Ainda há o Canal d’Ourc. No final do canal há a alfândega, construído por Bullé, e com a
arquitectura do edifício permanece o velho desejo de mudar o mundo. Porque aquilo que
nunca vimos é o nosso futuro.
in Die Wirklichkeit der Bilder. Der Filmemacher Hartmut Bitomsky, Jutta Pirschtat (org), Essen,
filmwerkstatt, 1992
Tradução de José Maria Vieira Mendes
A morte e o cinema
Hartmut Bitomsky
Os iconoclastas
Ao escavarem um novo metropolitano os trabalhadores encontraram uma catacumba pintada
com frescos. Os trabalhos foram suspensos, vieram os engenheiros e olharam para a obra de
arte.
Resistira duzentos anos sem ser descoberta, mas agora as cores desaparecem de repente,
como se um sopro as tivesse aspirado.
A gruta está aberta, e o ar, em que vivemos, entra e destrói os frescos. Vêem-se os frescos a
desaparecer. Este pequeno episódio de um filme de Fellini deixa que a morte nos fale, é
uma morte que tem a ver com a essência do cinema. No seu terrível segundo torna visível
como os homens são desajeitados e incapazes. Encontram um mundo inteiro e, contudo,
ficam sem recursos. Confrontados com aquilo que já foi feito, pouco podem fazer: causar
danos é o que melhor sabem fazer.
Mas teria sido então melhor que o fresco não tivesse sido pintado?
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Numa imagem vê-se sempre mais do que aquilo que os olhos conseguem compreender, a
imagem pretende fazer desaparecer o olhar.
O cinema fez da volatilidade a sua arte, desmaterializa as imagens. Mergulham como
estrelas cadentes no universo nocturno. Se nos fosse concedido um desejo… Antes que
ele seja formulado, já a luz se extinguiu. Por isso o desejo de imagens é insaciável: somos
iconoclastas e gostaríamos de estragar aquilo que desejamos.
Desejamos um outro mundo.
Múmias em movimento
Fenton pegou nas balas espalhadas dos canhões da guerra da Crimeia. Estavam por todo o
lado como se tivessem sido disparadas em vão. Não há propriamente imagens dos
acontecimentos da guerra, não eram para ser fotografados.
Aconteceu o mesmo com Brady, O’Sullivan, Barnard e os outros fotógrafos que fizeram
fotografias da guerra civil americana. Mostram os cadáveres que, atirados para baixo dos
ramos, se estendiam à beira dos caminhos, mostram ruínas de casas, os bocados das
colunas das casas senhoriais, pontes destruídas e as locomotivas rebentadas nas vias
férreas.
Também fizeram imagens dos militares. Antes ou depois da batalha, os oficiais
apresentavam-se e ficavam em sentido para serem fotografados. Estas imagens seguem a
tradição pictórica do retrato, que não representa o facto histórico mas sim os actores
principais para ele preparados.
A fotografia dos primórdios preferia as coisas mortas, um utensílio em cima da mesa,
fachadas de casas, tudo o que estava em descanso. Em muitas imagens de cenas de rua
descobrem-se coisas disfarçadas, enevoadas, como retoques em segundo plano que não
foram bem absorvidos: aí encontravam-se seres vivos, pessoas ou animais, que se mexeram
no momento mais prolongado da fotografia.
Nessa altura o movimento ainda não existia para a fotografia, uma fotografia precisava de
mais tempo do que aquele que alguém consegue ficar imóvel. Assim passaram a fazer-se
estruturas onde as pessoas se tinham de meter. Então já ficavam quietas e podiam fazer-se
imagens delas, que as mostravam como elas não são: rígidas, concentradas e solenes, a
fronte velada pelo pressentimento da morte.
As estruturas eram postas atrás e não ficavam visíveis na imagem, a encenação está
escondida, e assim podia-se afirmar que a fotografia e o filme reproduzem a vida.
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Na casa vazia
O assassino persegue o barman Cosmo Vitelli através da casa, vai por corredores e quartos
que há muito não são habitados. Pára hesitante em frente de uma porta; nessa altura um
plano picado mostra a proximidade das suas mãos, que se estendem na sua incerteza. Vê-se
a soleira da porta e uns degraus que sobem para outro quarto. O quarto é escuro, talvez lá
o espere a sua vítima.
O que se vai passar não se pode imaginar. Um movimento cauteloso, um passo leve, aquilo
que o assassino sempre faz, pode ser exactamente a coisa errada.
Tem de ultrapassar a soleira. Na mão direita tem o revólver, a outra mão não tem arma,
polegar e dedos ligeiramente afastados, preparados para saltar para a frente e agarrar.
Ambas as mãos estão suspensas num equilíbrio nervoso e incerto. O revólver é uma arma
para a distância, põe distância entre o assassino e a morte que vai causar. A outra mão está,
no entanto, preparada para um embate corporal, inicialmente o tocar e de seguida o
agarrar rapidíssimo.
É assim o equilíbrio intelectual que o cinema possui. Promove, com cada filme, um
distanciamento último em relação à vida, e simultaneamente deseja a maior proximidade
possível dos corpos que se agarram e se abraçam uns aos outros.
Houve quem dissesse que o cinema é a arte da presença física: é bem verdade, mas há que
acrescentar: através da ausência total do corpóreo.
O cinema revela-se então realmente na sua impossibilidade dialéctica.
Todas as artes assentam na presença das pessoas, escreve Bazin: só a fotografia tira
proveito da sua ausência. É o aparelho que faz a imagem, o fotógrafo pô-lo a trabalhar. Não
se objectifica da mesma forma que um pintor no seu quadro.
O pensamento da distância da pessoa na fotografia vai mais longe: aquilo que uma
fotografia mostra já não existe. É verdade que se pode voltar ao local que uma foto
reproduz, mas não no momento em que foi feita.
A partir daqui, Bazin deduz, tanto para a fotografia como para o cinema, um complexo de
múmia, chama às imagens cinematográficas múmias que se movem. Embalsamaram o
instante e guardam-no, ele continua a existir na imagem e contudo já lá não está.
A fotografia oferece o passado concluído e afasta a morte para o futuro: as reflexões de
Roland Rarthes giram à volta do ponto em que a fotografia acciona o seu característico
desaparecimento da pessoa. A própria fotografia é a testemunha que garante este
desaparecimento.
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O singular Além presente na fotografia pertence sem dúvida àquele discurso filosófico
sobre o tempo que escapou, se esgotou, se desperdiçou e morreu. O facto de nesta
filosofia também se encontrarem traços de uma viscosidade híbrida, mostram-no muitas
recordações não-realizadas em polaróides, que têm primeiro de desprezar o presente para
depois sentirem saudades dele.
A despedida
O homem velho e gordo está pesadamente sentado junto à margem de um lago. Está a
anoitecer e as nuvens pintam-se com uma luz cor de framboesa. Um vento sedoso faz
estremecer levemente a água.
O velho está sentado no chão e olha admirado à sua volta. Com ambas as mãos segura a
barriga gorda, como se tivesse dores de estômago. Na barriga do Xerife Baker está espetada
uma bala.
Katy Jurado, que no filme é a mulher de Slim Picken, arrasta-se de gatas até ele. Já
pertenceu às belezas exóticas de Hollywood, mas agora é uma velha, e vemos que há uma
outra existência por trás dela.
Ela estica as mãos em direcção ao moribundo, os últimos centímetros como que duas
linhas de vida. Ao longo de muitos anos tentaram aproximar-se, mas ainda não se
conseguiram encontrar.
O momento é longo, sustemos a respiração. Eles partilham um com o outro o que é
partilhável, mas as forças falham.
A memória branca
O filme começa nos minutos que antecedem a morte do herói: um homem idoso,
afundado na poltrona. Tem um brinquedo na mão, a bola de cristal da infância, e aí está o
segundo começo do filme. Neve artificial cai levemente sobre uma cabana de telhado
inclinado.
Uma boca enorme abre-se por baixo de um bigode e murmura uma palavra ininteligível.
Então a bola desprende-se, salta pelos degraus, um mundo despedaça-se em mil cacos. No
fogão, o verniz do trenó derrete-se e as chamas apagam a palavra, a última palavra, uma
palavra-chave.
Neste ponto de partida, o filme dá uma curva e volta a aproximar-se gradualmente –
enquanto investiga o percurso de vida do homem poderoso – do momento da morte.
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As histórias que o cinema conta tendem a entender a morte de uma forma moralista,
tendem a apresentá-la como um acerto de contas. Este é um processo de pensamento
subtractivo. Uma cor priva as outras, por fim é um rangido num ruído branco o que dá
felicidade.
Escuridão, Inverno, neve, um trenó de criança, neva no cinema: porquê, pergunta-nos
Bazin. A sua resposta: “Nada casa tão bem com a neve como a cor do sangue”. No cinema
de Bazin o sangue tinha a cor preta. Ele diz que a neve é fotogénica e reconcilia
secretamente a morte com a vida.
Na morte a vida desfila perante os moribundos como um filme, dizem: como se a memória
se quisesse fortemente libertar das coisas que acolhe, para nada levar consigo, mas antes
devolver tudo o que recebeu.
Como é sabido, o ruído branco contém todas as frequências acústicas, mas no estado de
inocência e sem qualquer articulação.
O fim da História
Um filme pode comprimir uma história de vida inteira em hora e meia. Um ano passa num
bom minuto. Para isso exige-se grande aceleração, uma enorme compressão, mas também
abreviação.
Talvez os contadores só precisem da ficção para nos dar a ideia da integridade de uma
história, apesar destes processos. O fecho só muito raramente coincide com o fim. Está
sempre ligado a algo violento.
O porquê da vida ser curta é aquilo que muitos mitos têm querido explicar. Talvez seja
porque a vida, de qualquer modo, é apenas adiada e acarreta uma hipoteca depressiva que
ninguém pode pagar.
Todos sabem que a sua vida é um caso único, uma excepção entre inúmeras excepções, um
exemplo que não é exemplar, ramificado ao acaso por uma ampla torrente universal da
vida.
A morte é o sinal que fecha este parênteses. O indivíduo constitui-se através das suas
limitações. Existem maiores unidades do que as das biografias. Quando uma pessoa morre,
o mundo vai continuar a existir, já existia aliás antes dela.
Então o que desaparece do mundo com um morto? Muito, pouco, nada? Fazemos as nossas
cruzes.
Assim, não é de admirar que os filmes nunca questionem o sentido da vida através de uma
morte. Perguntam sim se a partir daí surge uma história.
42
Mas não gostamos desta espécie de pergunta. O toque dos despertadores modernos pode
ser desligado com um bater de mãos: um aplauso único que põe termo à peça.
No futebol gritam mesmo a meio “Acabou!”, mas continuam a olhar, e continua-se a jogar.
Bastava que se fossem embora, e tudo acabaria.
O arrepio do real
Os filmes são muitas vezes montados para serem vistos por jovens, e pode acontecer que
apareça um revólver preparado, e haja um corte para a vítima que cai no chão sem que o
tiro tenha sido disparado. O sangue do filme é comprovadamente imaginário.
Isto não prejudica a história, apareceu um hiato. Mas o cinema sabe lidar com a arte dos
hiatos e conjecturas e evoca a sua própria realidade ao modo de Kuleshov.
Neste ponto, o cinema e a censura são aparentados. Com o primeiro corte que se fez no
material filmado, foi o método apresentado à censura. Pois também a censura sabe como
criar hiatos e, em compensação, ligar de novo a realidade do filme à própria realidade.
Isto só pode funcionar se alguma coisa for omitida. Fizeram-se listas de como a morte não
deve ser mostrada, o código do “Don’t” exprime de forma jurídica o que é um facto
mimético: num filme cinematográfico não há mortos.
A sexualidade foi muito mais fortemente censurada do que matar e morrer. Durante
séculos o acto sexual não foi para além de um beijo e cabelo despenteado.
Em Road House, Negulesco reservou de forma rigorosa o único grande-plano do filme para
o beijo dos protagonistas. Ele dominava de forma sublime esta forma de obscenidade
menopáusica e sabia, como mestre do seu ofício, que se obtém a máxima elipse através de
uma aproximação decidida.
Corre o boato de que Jessica Lange e Nicholson, no remake de The Postman Always Rings
Twice, se teriam entendido de verdade em frente à câmara, mas não vemos isso. As asas do
nariz estão vermelhas, a pessoa da bruitage faz a bruitage, e entretanto, podem fazer-se
outros grandes-planos.
A pornografia da alusão, que permanece nas caras dos actores, já quase se tornou
incompreensível.
A morte remete o cinema para o terreno do imaginário, um acto sexual chama-o de volta
para o domínio do real. Esta reciprocidade assenta na natureza diferente de ambas as
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coisas. Se alguém fosse realmente morto num filme, isso não seria tanto um caso para
censura como para julgamento.
Filmes desses circulam, os preços de entrada são altos. Contratam-se pessoas
desprevenidas para filmagens, e enquanto a câmara trabalha são massacradas e chacinadas.
Os espectadores estão sentados como jurados, apreciam a execução de uma sentença que é
dada em seu nome e sentem o arrepio do real, quando o documentário vai até à agonia da
percepção.
Filme-KZ
Os nazis fizeram filmes nos campos, filmaram como os corpos pálidos e consumidos
escorregavam para as covas escavadas e lá em baixo se ajustavam uns aos outros em
abraços apáticos e ternos. Os membros ainda estão maleáveis e ninguém sente o peso do
outro.
As imagens nunca foram mostradas nessa altura, possivelmente não se ousava apresentá-las
aos olhares. Talvez ninguém soubesse por que razão foram feitas. Ainda hoje não se sabe.
Mas são mostradas: como terríveis troféus que foram arrancados ao inimigo infame e que
demonstram a sua horrível inferioridade e a superioridade da ética do vencedor.
Usam-se os filmes nazis, e fazem-se filmes inteiros com as imagens dos cadáveres. Diz-se
que Hitchcock foi responsável pela montagem de um desses filmes, choca ouvir isso. É
repugnante o facto de se contratar Hitchcock para estas imagens: há uma comparação dos
seus filmes com o material cinematográfico dos nazis, uma semelhança que foi assim
farejada.
Mas ainda mais revoltante é a convicção implícita e desavergonhada de que as imagens
nazis não se bastam a si próprias. Têm antes de ser submetidas a um procedimento mais
eficaz, que delas retire tudo o que é possível, e que reforce ainda mais a crueldade, o terror
e o horror.
Esta infâmia é inteiramente culpa dos nazis. As imagens devem provar não só a pior das
injustiças mas também devem cometê-la uma segunda vez perante os olhos dos
espectadores.
Mouchette
“Falo com os mortos, e eles respondem-me com um murmúrio, com um sopro”, diz a
mulher áspera e velha, e vira-se para Mouchette, cuja mãe acabara de morrer.
“E tu, já alguma vez pensaste na morte?”
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Há um mau pensamento nesta pergunta. Mouchette raspa com os pés. Os seus tamancos
de madeira estão sujos, quer sujar o tapete.
Mouchette é uma criança teimosa, educada por Dostoiévski, desobediente e pouco
afectuosa. Aquilo que sente, guarda-o para si, debaixo de um grande peso, para que nada
possa desaparecer.
Só uma vez teve um gesto terno, para com o guarda-florestal. Ele é epiléptico e violou-a.
As pessoas são criaturas confusas, provocam medo e espalham terror e dor. Mas por vezes
uma verdade é disparada através delas, como um átomo que rasga buracos invisíveis no
tecido corporal.
Mouchette vai com a caneca do leite e as roupas fúnebres para a floresta. Experimenta o
vestido que a velha lhe ofereceu para o enterro. O vestido é branco, o vestido de uma
pequena noiva, não lhe fica bem.
Poisa a caneca do leite e deita-se no chão. A terra transforma-se em água, um ribeiro largo
sem fundo nem corrente. Ela rola pela encosta abaixo. Mas o declive é pouco inclinado e
não acelera a rotação.
Mouchette sobe outra vez e de novo rola para baixo, e é outra vez apanhada. Os ramos de
um arbusto baixo agarram-se ao vestido.
É difícil matar-se, uma brincadeira de crianças. É preciso fazê-lo com perseverança. A água
esguicha, como se lá tivesse caído uma pedra pesada. Um suicídio coloca o mundo em
posição de injustiça, mas isso não é nada de novo, e também não é para perceber por que
razão tudo fala contra a vida.
Metal precioso
Será que ainda existem cópias dos filmes de que me consigo lembrar?
Talvez já só sejam pó de ferro, mantidos na ordem por ímanes durante algum tempo, e em
breve o magnetismo vai enfraquecer, e vai só tremeluzir e fervilhar nos ecrãs.
Escrevo sobre os filmes como se eles fossem indestrutíveis, os seus negativos duráveis e
conservados, e a química das imagens nunca se decompusesse.
Os críticos de cinema esfalfam-se para pôr filmes no mercado ou para os retirar de lá outra
vez. O voluntarismo gosta de bater na mesa, é lastimável.
Quantos filmes enferrujam em latas ferrugentas, decompostos por bactérias como partes
de cadáveres decompostos, que já ninguém vai conseguir identificar.
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Quantos filmes são destruídos eficazmente, como se a crítica mais feroz o tivesse querido,
passados pela máquina destruidora e triturados e desfeitos.
A prata em que as imagens estavam registadas foi recuperada.
in Kinowahrheit, Berlim, Vorwerk 8, 2003
Tradução de Carmo Lobo
Cinéma, vidéo et histoire
Hartmut Bitomsky
1.
Naguère, un élève vint me voir après un séminaire sur les films documentaires. Nous avions
visionné un film de Joris Ivens datant des années trente et il se plaignit que l’on montre
toujours ces vieux films et rien de neuf. Je lui demandai s’il avait déjà vu le film, ce qui n’était
pas le cas. “Alors, c’est donc un nouveau film”, lui dis-je. En peinture, il est évident qu’un
tableau de Titien peut toujours être vu, bien que la république des Doges n’existe plus.
2.
En 1992, j’ai assisté à un congrès sur le film documentaire qui était organisé par l’académie
de Motion Pictures Arts and Sciences. Il apparut rapidement que le documentaire n’était
qu’un véhicule pour propager la mise en œuvre et l’utilisation de nouveaux médias et
technologies dans ce domaine. Un cinéaste plaça le pellicule d’un film de 35mm dans la
lumière des projecteurs et dit qu’elle conservait la lumière d’un autre temps et d’un autre
lieu. Il pensait avec mépris que la vidéo n’était que de la limaille de fer rouillé collée sur un
morceau de plastique. Je partage complètement cette conception, bien que j’utilise aussi la
vidéo. On est obligé de travailler avec la vidéo pour baisser les coûts de production. Mais on
ne peut pas comparer le film et la vidéo car la vidéo n’est pas seulement un médium de
remplacement. Elle a des propriétés que le film n’a pas. Le fil est un médium restreint et
restrictif. On doit se concentrer sur l’image invisible tant qu’elle n’est pas développée. Alors
que la vidéo ne connaît pas d’image latente. L’image est immédiatement là, interrogeable, À
corriger ou à laisser. Ce qui signifie, entre autre, que l’on peut accorder une place au hasard,
à l’imprécision, qui sont interdits dans le film. La vidéo est une forme transitoire. Elle se
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réclame de l’époque des instants morts, des moments non vécus. Le cinéma direct/cinéma
vérité cherche en vain à y parvenir (comme le disait Christian Metz)..
Un autre cinéaste du congrès évoquait le futur avec l’image du caméraman doté d’une
caméra numérique devant les yeux et d’un ordinateur sur le dos, relié avec le studio de
télévision, le journaliste, la centrale, et pouvant assurer une diffusion dans le monde entier.
Cette perspective est en fait très vieille, elle date des débuts du cinéma. Le cinématographe
Lumière était à la fois caméra, copieur et projecteur en une seule vraie machine universelle.
Les Lumière envoyaient leurs caméramans dans le monde. Durant leurs voyages, ceux-ci
agissaient comme des caméramans, copistes, projectionnistes et monteurs, caissiers, agents,
concessionnaires, transporteurs, responsables des brevets, bailleurs de fonds et
propagandistes. Ils incorporaient et anticipaient tout ce que l’économie cinématographique
future devrait laborieusement développer à un échelon plus élevé.
Cinéastes complets, ils concentraient en eux la production et la distribution. Les Lumière
décrivaient le but de toutes leurs entreprises comme le devoir de restituer intégralement la
vie. La récréation du monde à son image.
3.
Les Lumière étaient des fabricants. Ils ont vite abandonné et délégué à d’autres le travail
qu’ils savaient très bien diriger, embellir, voire piller. Le pauvre Méliès, en revanche, devait
autant que possible tout faire lui-même. Il avait l’idée de ses films, esquissait et peignait les
décors, mettait en scène et incarnait le personnage principal. Il était un auteur et un homme
d’affaires instable – un spéculateur qui voulait rapidement faire fortune car il perdait l’argent
aussi vite qu’il le gagnait. Il était astucieux, intelligent, plein d’imagination. Il produisait et
voulait vendre, et pour vendre beaucoup il devait énormément produire, beaucoup trop. De
cette entreprise, il ne reste plus rien si ce n’est quelques-uns de ses films, dix, vingt trucs et
leur utilisation dans des centaines de films – sorte de cosmos avec le diable au centre, qu’il
jouait de préférence lui-même, en gros plan. Le diable comme auteur, ou le contraire : c’est
une antinomie désespérée.
4.
Flaherty, quand un réglage semblait inapproprié ou ne voulait pas réussir, parlait de la
caméra à la troisième personne : “Elle ne veut pas photographier ceci ou cela.” Il ressentait la
caméra comme un être humain pourvu de qualités particulières, presque magiques, qui peut
voir ce qui reste caché à l’œil désarmé. Pour décrire sa méthode, il citait Platon : “Aucun feu
ne peut être allumé, aucune lumière ne peut brûler, tant qu’il n’y a pas eu un long dialogue
avec la matière.”
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Flaherty compte parmi les cinéastes complets. Lorsqu’il tournait Nanook of the North, la
caméra lui servait non seulement d’enregistreur mais aussi de copieur et de projecteur.
Flaherty développait son matériel lui-même. Sur le lieu de tournage, il projetait aux
Esquimaux les extraits tournés avec eux. Les images ne devaient pas s’éloigner de ce qu’elles
reproduisaient. De là provient peut-être la lenteur de ses films, qu’il nommait slight
narrative et décrivait comme faisant partie de son matériel documentaire : une action juste
esquissée, qui se déplace à peine. Flaherty exposait un jour les différents angles décrits par la
lance que Nanook dirige vers ses proies. Grierson objecta qu’avec une telle lance on ne
pouvait rien faire contre un agent de change. Il insinuait ainsi que Nanook n’était pas un
sujet correct pour un film documentaire car il n’avait que peu de rapport avec la réalité di
XXe siècle.
Selon le premier théorème de Grierson, un film documentaire est un traitement créatif de la
réalité ; A creative treatment of actuality, en anglais, laisse paraître quelques nuances.
“Actualité” est à traduire par “réalité”, mais au sens de faits impliquant un peu d’actualité et
de présent et un peu d’action, réalité par ailleurs évoquée dans le mot “treatment”. Chez
Grierson, la caméra est ou n’est pas efficace. Pour lui, un bon film n’est “pas beau, mais
correct”. Dans un certain sens, Grierson appartient déjà à l’avant-garde du mouvement
antiesthétique du film documentaire, qui devait voir le jour après la Deuxième Guerre
mondiale.
Je ne veux pas utiliser Flaherty pour attaquer Grierson, et en cela oublier que Grierson était
aussi un grand cinéaste.
Mais la réalité est affaire personnelle. Elle n’est pas partout la même et ne dure pas. La
pêche, telle que nous la montre Grierson dans Drifters, n’existe plus aujourd’hui. Le film
s’est-il pour autant épuisé ? Heureusement non, il persiste et continuera à persister, et
certainement plus longtemps que la réalité à laquelle Grierson fait référence. Nous pouvons
apprécier le film aujourd’hui et il peut encore nous faire réfléchir, même si son monde
d’origine a disparu.
Selon l’autre théorème de Grierson, le fil documentaire doit enseigner comment les autres
vivent. “Teaching how the other half lives”, dit-on plus précisément en anglais. Un livre de
photos de Jacob Riis, paru en 1890, porte justement ce titre : How the Other Half Lives. Il
montre la misère, l’oppression et la pauvreté du prolétariat américain à la fin di XIXe siècle.
“The other half”, expression consacrée, désigne la bipartition de la société, sans euphémisme
et très objectivement. Grierson considère le film documentaire comme la composante,
l’instrument et l’élément fonctionnel de la communication de masse. Il veut éduquer par le
fil, enseigner, donner mauvaise conscience.
48
Avant d’être cinéaste, il est sociologue. Les rapports de la distribution lui importent plus que
ceux de la production. L’hypothèse d’une nouvelle répartition des richesses n’est pas
vérifiable. Une moitié de la société regarde l’autre dans la pauvreté.
5.
Nous contemplons la misère. Nous regardons le malheur. Nous le voyons avec des
sentiments ambigus – avec indignation mais aussi avec satisfaction. Le spectacle de la
pauvreté, du besoin, de l’oppression, de la spoliation, des êtres méprisés et avilis, attire
volontiers notre regard et exerce un magnétisme esthétique. Nous voulons le voir.
Lorsque Agee examina, durant leur absence, les biens qui l’hébergeaient, il constata presque
étonné que tout ce qu’ils possédaient était parvenu à la fin d’une utilisation possible. Les
objets ne servaient plus à rien, ils étaient obsolètes. On doit quand même considérer que
tous ces objets, dans le texte de James Agee et dans les photos de Walker Evans, reviennent,
et certes de leur propre gré, pour leur beauté et non pour leur instrumentalité perdue.
Le concept de bricolage s’impose. Des choses qui ont servi dans un but précis, qui furent
utilisées et laissées de côté, peuvent revivre dans un autre rapport. En effet les chaussures é
culées d’Evans sont vouées à une deuxième existence.
On ne peut plus les porter ni les utiliser, juste les voir, les contempler. Elles reçoivent une
deuxième vie. Elles sont devenues sujet d’observation.
Quiconque aura regardé ces photos ne pourra dire que leur vue ne provoque pas un plaisir
esthétique. Plaisir est un terme trop faible. Pourquoi en est-il ainsi ?
Cette deuxième vie, au-delà de l’utilisation, l’instrumentalité, correspond à l’idée qu’à la fin
des possibilités d’utilisation on arrive à un point zéro de la propriété, et que les choses sont
assignées dans un lieu qui les consacre. Dans une certaine mesure, les gens sont purifiés de
tout ce qui est relatif à la propriété et à la possession. Ceci évoque la vieille idée du nonattachement, de la dépossession, qui nous fait mieux comprendre la pure matérialité du
monde. Hegel disait que “La servitude devient seulement dans son plein aboutissement le
contraire de ce qu’elle est vraiment”.
6.
Marker a dit un jour que deux types de comportements se trouvaient synthétisés dans le film
documentaires : l’un détermine ce que doit être la réalité (et si elle n’est pas ainsi, elle a
tort) ; l’autre se comporte humblement vis-à-vis de la réalité et l’accepte telle qu’elle est.
Le San Pietro de Huston décrit en détail comment les militaires prévoient étape par étape la
conquête d’un massif montagneux. C’est comme un scénario pour un long métrage. Huston
49
tire de sa simulation ses directives de régie. Il poste ses caméramans d’après les indications
de ses prévisions stratégiques. Ils suivent la progression des soldats. Le scénario est une
chose, et sa réalisation est une autre. Ainsi on voit l’envers du décor, la faillite constante des
plans dans les faits, qui s’écartent de ce que les stratèges avaient déterminé. Comme dans
une pièce de théâtre qui, répétée d’après un texte, irait tout de travers une fois dur la scène.
Tout se passe différemment que prévu. Les opérations militaires sont abstraites, leurs
résultats concrets.
Le film a encore un deuxième objet : le rapport que la caméra entretient avec la guerre. La
guerre est, dans une certaine mesure, le sujet privilégié du film. C’est une intervention
dramatique dans le monde. Elle bouleverse la réalité, la transforme considérablement : elle
est mise en scène de la réalité, d’une réalité forte. La guerre est réalité in statu nascendi, et
la caméra vit le moment de sa naissance sur le même plan que n’importe quelle action. La
caméra est immédiatement impliquée. Elle est absorbée par la guerre comme les soldats ; en
d’autres termes, le fait de filmer ne change pas la situation qui est filmée.
Après la guerre l’objet fort a été retiré au film. Il devait être reconstitué. Franju a avoué
franchement que beaucoup de séquences dans Le Sang des bêtes ont été, et devaient être,
mises en scène.
Beaucoup pensent qu’il s’agit là d’un péché mortel pour le film documentaire que
l’authenticité du matériau est trahie. La réalité se déforme elle-même, commente Franju, elle
disparaît devant nos yeux avant de pouvoir être filmée et ne peut être rendue à l’image
qu’avec une certaine mise en scène.
L’abattoir de Sang des bêtes n’existe plus. Il reste bien quelques bâtiments, mais ils sont
utilisés comme pièces d’exposition devant lesquelles on doit faire la queue pour entrer. LA
plus grande partie est démolie. Presque rien ne subsiste du monde représenté dans le film.
Là où se trouvait le marché aux puces, le long du canal de l’Ourcq, se dressent maintenant
des immeubles d’appartements, et ces barques qui paraissaient avancer sur la terre ne
circulent plus. Selon Franju, la réalité renie la réalité : on doit recréer le monde avec un film
car la réalité s’éloigne de nous.
7.
Les théories du cinéma direct (et dans une certaine mesure aussi sa pratique) me paraissent
dériver directement de la logistique du film de guerre documentaire.
a) Réduction du poids technique dans le travail du film. Appareils légers, portables. Caméra
manuelle, Nagra-Syncron-Pilotton. Format 16 mm. Matériel de film extrêmement sensible qui
doit rendre le réglage de la lumière superflu. L’équipe n’est plus composée que d’un
caméraman et d’un ingénieur du son. Réduction de la division du travail différenciée et
50
coopération. Coût réduit de la production. Utilisation maximum du matériel et du temps de
tournage.
b) Caméra mobile dans la logique de l’intervention militaire. La caméra doit accompagner,
disparaître, voire plonger pendant le tournage. Le cinéaste est dans la même situation que
les combattants. Les questions ne sont pas posées, on attend les évènements.
c) Réduction de la résistance esthétique. Tout comme la fabrication du film ne contrôle pas
la situation, la fabrication elle-même est incontrôlable. Des formes de travail artistique
doivent être abandonnées. Plus de cadrage, pas de planification préliminaire de séquences.
Roland Barthes a nommé “adamisme iconique” ces formes de dissolution de l’image. L’image
redevient innocente. Le cinéaste intervient moins dans le travail du film. Le film n’est plus
structuré par les cinéastes, mais par les évènements auxquels ils prennent part. Le tournage
se fait selon le principe du “trial and error” (“par tâtonnements”) dans la croyance que la
vie, la réalité fonctionne ainsi. On repère l’instant vrai, celui où la caméra doit tourner.
d) Le film doit être l’expérience directe des évènements. Quand quelqu’un est filmé, ce n’est
pas pour parler mais pour faire quelque chose : il doit accorder plus d’importance à cette
occupation qu’au fait d’être filmé. Pas de commentaire, pas de médiatisation. Ce
renoncement met en évidence l’événement nu dans la simplicité de son déroulement,
comme dans un long métrage. Tout doit être comme dans un long métrage : un spectacle,
seulement un spectacle vrai et authentique.
Il n’est pas trop évident que les films du cinéma direct ont une préférence pour des sujets
théâtraux. Ils ont besoin d’une réalité qui se pose en spectacle, avec une mise en scène
préalable et “pathologique” qui, engendrée par la caméra, devient représentation. C’est
toujours un théâtre impliqué dans la vie, pleuplé de plus ou moins bons interprètes. Rien
d’étonnant à ce qu’aucun film de cinéma direct ne soit muet. Ils dépendent directement de
la langue parlée.
En “temps de paix” la parole remplace l’action militaire : le lieu du combat est la lutte pour
l’expression. Les films sont organisés autour du langage : tout comme les films
documentaires des années trente sont organisés autour de la musique et du commentaire.
8.
Rouch est très volontiers un protagoniste de ses propres films, qu’il y apparaisse ou non. Il
est ethnographe, et le problème de l’ethnographie est qu’elle intervient en permanence
quand elle essaie de décrire et comprendre une autre culture. Dans ses films, il inverse si
souvent le rapport qu’il associe les figurants du film en tant que coauteurs et intègre leurs
réactions au film en mots et e images. La réception réagit sur le message, dirait le spécialiste
en sciences de la communication. En cela je soupçonne la tentative, peut-être un peu
51
compliquée, conceptuellement irritante, d’une ingérence de la distribution dans le film luimême. Le film voudrait revenir vers ceux qui en sont les protagonistes, comme pour corriger
une faute de la réalisation.
Par exemple, Chronique d’un été est un film sur les questions, Les interprètes sont
questionnés, ils interrogent à leur tour d’autres personnes, à la fin ils se questionnent et
questionnent le film et, durant l’épilogue, Rouch et Morin, interrogent l’œuvre. C’est la
préoccupation du bonheur, mais on ne voit en fait que le malheur. Rouch est parfois visible,
à l’écoute quand d’autres parlent, amusé, tendu, dans l’expectative, presque amoureux. Son
visage est un livre ouvert.
Edgar Morin a des des interprètes du film qu’ils se glissent dans leur propre identité (comme
si l’identité était un rôle). Ils portent des masques qui ressemblent beaucoup à leur
physionomie. Richard Leacock reproche à Chronique d’un été que les gens, dans le film,
agissent exclusivement pour le film. C’est un peu vrai. Rouch a associé cette critique à la
théorie du cinéma vérité : au moment de filmer, quelque chose se produit qui n’aurait jamais
lieu sans l’acte de filmer. Il l’explique dans la scène où Marceline Loridan, un Nagra avec
micro à l’épaule, est envoyée dans un marché couvert. Elle commence à se souvenir, du
père, du frère, du camp de concentration. La caméra passe devant sa silhouette. Sans caméra
et magnétophone, a dit Rouch plus tard, cette scène n’aurait jamais eu lieu. Le travailleur qui
a une conscience de classe s’entraîne dans l’arrière-cour étroite de l’art de l’autodéfense
inoffensive.
9.
L’objet du film documentaire a longtemps été plus ou moins métallique et enduit de suie,
maculé d’huile, taché de goudron, couvert de poussière et de tuiles cassées. Mais les sujets
changent. L’ère du métal touche sa fin ; à la place nous voyons des substitutions, succédanés
et matières synthétiques. Parallèlement, les gens se transforment, et le fonctionnement
humain se modifie ; dans un certain sens, les réalisateurs de films documentaires ne l’ont pas
encore du tout compris – avec un moral inébranlable, ils vont au travail et oublient que leur
travail doit changer avec le sujet. Quelque chose de terriblement démodé entoure
aujourd’hui le film documentaire. Les gens sont influencés par l’extérieur, se conforment aux
médias : ils sont interviewés et n’ont presque palus de paroles et de pensées qui leur soient
propres. Mais le film documentaire les cautionne infatigablement en les prenant à témoin.
Schwarzenegger se décrit dans Terminator 2 comme du métal liquide. Mon film sur
Volkswagen, VW, a été critiqué, entre autres, à cause des gens qui s’y produisaient. Il y
manquait les travailleurs dont il était question, une image humaine avec ses contradictions,
ou tout du moins des plaintes et de l’indignation. En fait les êtres dans cette usine étaient
éduqués. Les mangers étaient formés par le travail, et les travailleurs par le syndicat. En
52
congé de formation, on leur serinait des formules, des slogans et des gestes conventionnels.
Parfois, le vieux Michel émergeait, intimidé, embarrassé et troublé, et anéantissait tout le truc
appris. Cet étiolement de la personnalité était intéressant à observer.
Le livre d’Agee s’appelle Let Us Praise Now Famous Men. On ne pourrait utiliser un tel titre
aujourd’hui. Les écrivains et réalisateurs actuels ne sont ni Agee ni Evans, ça c+est certain.
Mais les prolétaires ne sont pas non plus les mêmes. Ils vivent certes presque sans exception
dans la pauvreté et la misère, mais la pauvreté a changé. Il leur manque, dans leur rapport
avec la caméra, toute trace de dignité et de grâce qui caractérisaient, avant Evans, leurs
parents et ancêtres. Leurs appartements croulent sous le mobilier, deux frigidaires
défectueux attendent sur la véranda, leur vie est pleine comme une poubelle. Là où autrefois
la faim, l’injustice, l’appauvrissement étaient directement visibles, corporellement et
physiquement, aujourd’hui on s’est confortablement accommodé, avec la merde dans le
salon. De ce point de vue, les films documentaires ne sont pas différents. La pauvreté et la
misère ne sont qu’une citation heureuse, qu’on trouve sans peine.
Depardon a séjourné quelques semaines dans les années quatre-vingt à New York, pour faire
un film sur cette ville. Chaque jour il partait en tournage, sans savoir ce qu’il devait tourner.
Une fois installa la caméra à la fenêtre d’un café, à un croisement, et filma les gens qui
passaient au crépuscule. Il quitta la ville de New York, incapable de faire un film sur elle ou
parlant d’elle. Plus tard il découvrit qu’il avait son film depuis longtemps dans le matériau
accumulé. Il devait seulement en développer trois moments : une longue traversée en
gondole sur l’East River vers Manhattan (le fleuve, le pont, la circulation et, à la fin, les hauts
immeubles, la ville). Le même trajet de retour, la nuit. Et entre les deux, la séquence du café.
Plus tard il enregistra des sons pour les pas des passants, qui s’entendent comme si les gens
portaient des chaussons avec, en juxtaposition acoustique, les sons du film. Les trois
séquences sont des citations d’un texte inconnu. C’est un texte sans message, un film sans
objet. Les gens y évoluent comme des apparitions archaïques devenues histoire, une histoire
qui aurait enterré la lumière blafarde sous une pluie de cendres invisible.
10.
Naturellement le propagandiste du film documentaire (que j’ai cité au début) avec son
ordinateur sur le dos devait apparaître à nouveau pour que l’idée de la réalisation
informatisée, interactive et livrée à la distribution soit enterrée. Le comportement de
quelques artistes et professeurs informaticiens est certes étrange, comme s’ils étaient engagés
en tant que propagandistes par l’industrie concernée. Mais je sais qu’ils le font
volontairement. Comme des toxicomanes qui, ne pouvant garder pour eux leur obsession,
font du prosélytisme et doivent entraîner les autres à la consommation de leur drogues
favorites.
53
11.
Je continuerai à parler de la réduction continue de la résistance technique et esthétique, de
la pénétration en profondeur du système de distribution dans la production. Je dois donc
évoquer l’electronic imaging, la révolution numérique. Avant elle, il ne doit plus y avoir de
film, de négatif, d’évolution. La fin de la photographie approche. La capacité de contradiction
et d’acceptation du hasard objectif, qui à mon avis jouent un rôle considérable dans l’art,
sont réfractaires à l’informatique. Picasso fabriqua la tête d’un taureau avec une selle et un
guidon de bicyclette. C’est impossible sur le plan de la technique de l’informatisation. Avec
l’informatisation, il s’agit de la médiatisation de l’art. Mais sur la route étroite de la
communication, les arts se trouvent à l’extrémité opposée des médias. Les médias sont là
pour faciliter la compréhension, alors que les arts rendent la compréhension plus difficile.
Sklovskij dit : “La danse n’est qu’une marche, mais dans une forme compliquée.” En effet,
aucun ordinateur ne peut réaliser quelque chose d’aussi complexe que la vague d’Hokusaï.
On voit comment la vague va ensevelir le petit bateau, et comment les gens luttent pour leur
vie en ramant, déjà profondément enfoncés dans l’eau. D’un coup on voit la violente force
de la nature à l’œuvre, à laquelle s’opposent les moindres forces des humains. Le spectateur
imaginera parfaitement que les rameurs peuvent réussir à se dégager de cette épouvantable
contradiction.
L’ordinateur ne peut accomplir l’image. Il va décomposer l’objet selon le principe cartésien
dans ses plus petits morceaux – en cent heures de patient travail de bureau – alors que
l’artiste à un moment décisif peut faire un bond. Ce bond ne peut être numérisé. En fait la
médiatisation de la communication équivaut à une diminution de l’information. On peut dire
ce que l’on veut sur les autoroutes de l’information. Sur une seule pellicule d’un film de 35
mm, en une fraction de seconde, sont fixées tant de molécules qu’on ne saurait les
enregistrer économiquement dans aucune mémoire. Tout scanner est réducteur, il diminue
la masse des informations provenant du domaine sensible au profit d’une intelligibilité plus
simple.
Il faudrait encore dire un mot sur le modèle de l’interactivité tel qu’il est offert aujourd’hui
par l’industrie informatique. Il est évident que la manipulation d’un CD-ROM avec la souris
n’est qu’une image plate et éphémère, et même une image déformée de l’interaction. Peutêtre que le fondement de tout modèle interactif est le simple manque de respect du travail
artistique. Il m’est insupportable de penser que l’observateur continue à peindre le petit
tableau bleu avec la liseuse. Je crois que la notion critique de la communication unilatérale a
favorisé ce type de confusions. Comme si lire, regarder ou voir étaient des activité
inconvenantes ou serviles. Je suis sûr que le Voyage italien n’a pas besoin que quiconque y
54
insère ses propres aventures de voyage. Je suis tout aussi sûr que l’industrie informatique ne
veut pas nous impliquer dans les œuvres mais dans la distribution.
in Face à l’histoire 1933-1996, L’artiste moderne devant l’événement historique, trad. Isabelle Bellet,
Centre Pompidou, Paris, 1996
Passage le long de la ligne d’ombre. Farocki et les autres: approche
d’un style Filmkritik
Olaf Möller
Harun Farocki, Hartmut Bitomsky, Wolf-Eckart Bühler; Manfred Blank, Ingemo Engström,
Gerhard Theuring, Hanns Zischler; Rudolf Thome, le jeune Wenders de 3 amerikanische
LP’s (1969) et Summer in the City (1969-1971), avec Helmut Färber et Zischler, dedicated to
the Kinks, on retrouve des souvenirs de ces films dans Nick’s Movie – Lightning over Water
(1979-1980). Différents auteurs, des voix singulières, incomparables – et pourtant: tous
participent – plus ou moins – de quelque chose que l’on pourrait peut-être nommer le style
Filmkritik, comme il y a eu un style Warner ou un style des comédies musicales de la MGM.
Ce style ne s’applique qu’aux auteurs (dans tous les sens du terme) qui constituaient le
groupe Filmkritik, des années 1970 à sa fin, dans les années 1980: un collectif auquel le
magazine appartenait, même si tous n’en étaient pas membres ou associés. Il existait un
espace libre où l’on écrivait sur ce qui importait aux yeux des auteurs. Pour le dire autrement
et en toute clarté: Theodor Kotulla, qui fut l’un des auteurs déterminants de Filmkritikdans
la première moitié des années 70, n’en fait pas partie. Pourquoi? Voyez son film Aus einem
deutschen Leben (1977) et ensuite celui de Farocki, sorti l’année suivante, Zwischen zwei
Kriegen. Kotulla a réalisé un “vrai” film de fiction, avec beaucoup d’argent, une star (Götz
George), un film tributaire d’un certain réalisme qui raconte la biographie d’un homme en
des étapes simples et claires. Farocki montre, à partir d’un processus chimique et des
hommes qui ont à voir avec ce processus, quel développement a conduit l’Allemagneau
fascisme. Chez Kotulla les faits s’additionnent jusqu’à une somme finale, si bien qu’en résulte
une image fermée sur elle-même, conclusive; chez Farocki les contours se dissolvent,
rendent visible ce qui est latent dans toute construction, dans toute image.
Ce qui est constituant, très simplement, c’est le fait que ces auteurs écrivaient pour
Filmkritik, certains d’ailleurs très rarement, comme Engström, d’autres seulement pour une
brève période, mais très intense. Et il ne fallait pas seulement avoir écrit dans Filmkritik. On
55
écrivait, quand on ne filmait pas, on filmait quand on n’écrivait pas, écrire et filmer formaient
à la fin un flux continuel dans le cours de la vie. […]
L’ancien Filmkritik était très activement engagé dans les événements du jour, et son
orientation idéologique était claire et sans malentendu. Films et cinéastes étaient soumis à
l’épreuve de leur compatibilité avec cette idéologie; que l’on ait fermé les yeux de temps à
autre, qu’on ait soutenu Will Tremper, par exemple, malgré l’incompatibilité idéologique,
c’est la vie (de critique).
Le nouveau Filmkritik, dont il est question ici – ses protagonistes, ses idées, sa pensée, son
écriture, son cinéma – semblait davantage préoccupé de s’inscrire dans une histoire du
cinéma, comme avant eux les critiques des Cahiers du cinéma qui devaient ensuite former le
noyau, reconnu par la critique et tirant un argumentaire solide de l’histoire du cinéma, de la
Nouvelle Vague. On n’opérait pas une sélection sur la base de prédispositions idéologiques
manifestes (lesquelles souvent ne peuvent pas se soutenir dans une discussion esthétique),
on décrivait pour soi-même comment John Ford ou Jerry Lewis font partie de notre vie.
Dans cette affaire, décrire est le maître mot. Chez ceux qui aiment, honorent et suivent avec
attention les auteurs Filmkritik, on ne trouve que rarement un jugement de valeur. Ils
consacrent plusieurs pages à décrire une scène, très précautionneusement, en pesant
soigneusement les mots et leurs implications, leur tonalité et le rôle qu’ils jouent dans la
logique et la poésie de la phrase et du texte. Les essais prennent la forme d’un filet que l’on
tisse: Bitomsky ouvre son chef-d’œuvre inachevé de critique de cinéma, Gelbe Streifen –
Strenges Blau [Stries jaunes – bleu rigoureux] avec une citation de Freud sur un cas de
névrose obsessionnelle, Bühler se fraye un chemin vers Jacques Tourneur à travers le
physicien atomiste Heisenberg, dont les écrits ont un écho dans le texte que Bühler consacre
à Irving Lerner, Tod und Mathematik [Mort et mathématique]. C’est particulièrement dans
les deux numéros sur Lerner qu’apparaît un autre trait commun aux auteurs de Filmkritik et
à ceux des Cahiers: les uns et les autres cherchaient à entrer en contact avec les gens qu’ils
admiraient, quelques-uns des plus beaux numéros de ces revues sont exclusivement
composés d’interviews. Ils montraient avec fierté les souvenirs qu’ils rapportaient de leurs
voyages, par exemple la belle photo de Hank Worden avec la dédicace à Bühler.
Il faut ajouter que Filmkritik n’a jamais consacré d’argumentaire en règle à un cinéaste
réactionnaire. On ne s’aveuglait pas non plus sur les impondérables idéologiques d’un John
Ford. Mais, et c’est qui fait en fin de compte la grandeur de la revue, elle prenait Ford tel
qu’il était, grand, inachevé – moralement sublime en dépit des doutes. Ses points de vue
étaient souvent strictement critiques, mais ils n’étaient pas pesamment moralisateurs. […]
Si l’on réunissait tous les maîtres et modèles dont les réalisateurs Filmkritik s’étaient euxmêmes entourés en une rétrospective où l’on verrait une sélection de leurs films les uns
après les autres, on apercevrait très vite les traits esthétiques communs et l’on pourrait en
56
retour dessiner à grands traits le style Filmkritik. Il vaudrait la peine, à partir de là, de décrire
les différences entre les cinéastes. Le grand consensus, le metteur en scène qu’ils vénèrent
tous, dans la même mesure, c’est Jean-Marie Straub. Parmi les classiques, ils aiment
Rossellini, Renoir, Ford; ils redécouvrent (pour eux-mêmes) Grémillon et Ophuls. Ils passent
par le pragmatisme de Hawks, de Tourneur et de Sirk – parmi les cinéastes reconnus – pour
définir leur éthique de travail, et cherchent en écrivant la proximité d’un Daves, d’un Lerner,
d’un Fejos ou d’un Hurwitz. Parmi les contemporains, ils fréquentent Pialat, van der Keuken,
Nestler.
Aucun de ces cinéastes ne vous impose un monde; ils s’en approchent, le décrivent. Ils
montrent des êtres au travail et dans leur temps libre, des groupes et leur dynamique. Leurs
images restent claires, leur langage sans fioritures; une exposition multiple, un fondu
enchaîné, c’est bien les plus violents des effets spéciaux destinés à manipuler l’image qu’on
trouvera dans leurs films. Ils refusent la représentation bourgeoise classique de l’art
fonctionnel qui absorbe à la fin toute chose et où toute chose trouve sa place et son sens.
“Le cinéaste qui ne peut pas ou ne veut pas s’exclure totalement du marché (ce qui, en tout
état de cause, signifie simplement qu’il doit se créer un autre marché, un “méta-marché”,
comme Straub, ou comme de nombreux collaborateurs de cette revue) mais qui ensuite se
refuse à faire ou à subir certaines choses, s’apparente nécessairement au tueur professionnel
qui s’en tient exclusivement à ses propres méthodes d’assassinat et qui ne marche sur les
cadavres qu’à condition que ce soient les siens.” (Wolf-Eckart Bühler) Il y a beaucoup de
collaborations: Bitomsky et Farocki co-signent des réalisations, Farocki fait de même avec
Blank, Engström ou Zischler. On apparaît dans les films des autres. Pour un style qui veut en
finir avec une dramaturgie naturaliste et réaliste et promouvoir un style proprement
cinématographique, le recours sans réserve, ininterrompue, à des comédiens professionnels
est déjà en soi très mauvais.
On pourrait creuser cette idée. Les auteurs Filmkritik comme un groupe de voyageurs,
d’archéologues, d’ethnologues, de criminologues. Abstraction faite des œuvres de Bühler,
qui sont sans exception des épopées de plusieurs heures, leurs films de voyages sont des
films qui exigent de la concentration et pour lesquels la forme spécifique de présentation
qu’est le cinéma a été créée. […] “The reading of many ghost stories has shown me that the
greatest successes have been scored by the authors who can make us envisage a definite time
and place, and give us plenty of clear-cut detail, but who, when the climaxis reached, allow
us to be a little in the dark as to the workings of their machinery.” (Montague Rhodes James)
L’idée de voir, en particulier dans les films de Farocki et de Bitomsky, des films de fantômes
fait froid dans le dos. La première réaction est un “noui” plein de circonspection, marqué par
un pragmatisme très Filmkritiket qui, après un examen plus approfondi, se transforme en un
“oui”. Un “oui” définitif et direct si on se réfère à la première moitié de la citation de James.
57
C’est l’exactitude du regard porté sur le monde qui fait jaillir devant lui un monde précis
jusque dans le détail. Le regard reste toujours calme, détendu, il a parfois le charme d’une
photo de police – le contour d’un corps dessiné à la craie et qui fixe le théâtre du crime dans
Zwischen zwei Kriegen, les traces que l’on suit dans Isaak Babel: Die Reiterarmee [Isaac
Babel, 1990 – Bitomsky]; ce regard fait parfois l’effet d’un regard de chercheur à travers un
microscope – ces séries de moments dans Leben – BRD [la Vie – RFA] ou dans Die
Umschulung [La Rééducation, 1994]. Mais James parle ensuite du mode de fonctionnement,
du fait qu’il ne doit jamais être entièrement explicite. Cela se réfère à deux choses. D’abord
aux fantômes eux-mêmes: qui ils sont, ce qu’ils font, pourquoi ils le font. Mais ensuite à la
description des fantômes et à leur apparition: le savoir-faire de l’auteur. On voit bien
comment, mais pourquoi faut-il que ce soit tellement marqué par… le mystère, the magic.
On aurait dû quand même penser que cela ne cadrerait pas du tout avec Farocki, qui est
manifestement, parmi tous les auteurs de Filmkritik, le dialecticien le plus froid, que ses films
ne sont si brillants qu’en raison de la rigueur de ses analyses. En tout état de cause, ses films
n’ont qu’en partie à voir avec ses qualités intellectuelles, et cela veut dire: ils ne sont pas
brillants, seulement parce que Farocki a pensé quelque chose de brillant. Ce qu’ils ont de
vraiment brillant tient à la présentation de la pensée, qui fait voir la beauté de pensées
profondément ressenties. Le fantôme de Leben-BRD c’est la beauté, la sensibilité à la vie
d’autres personnes; le fantôme est la valeur ajoutée esthétique.
Mais il y a quand même eu pour finir, une fois, une “apparition des esprits”. Dans Imaginäre
Architektur [Hans Scharoun, 1994], Bitomsky, au moyen d’expositions multiples, tente de
rendre visibles les différentes vues que l’on peut prendre des maisons de Scharoun. Cela
reste une tentative, Bitomsky fait de son “échec” son thème. Mais ces images à expositions
multiples deviennent des images fantômes, des prises de vue de ce qui n’est jamais vraiment
saisissable, une ombre sans évidence ni valeur indiciaire, et pour cette raison très suggestive.
Vivre avec des films, un peu comme on vit avec la musique; un peu à la façon dont c’est
montré dans 3 amerikanische LP’s: regarder le monde depuis le balcon, écouter Van
Morrison, ce que c’est de le voir ensuite.
Bitomsky “est de surcroît le conteur le plus savoureux du monde. Je crois d’ailleurs que c’est
surtout la musique qui l’a attiré vers les USA, par exmple un disque comme Highwayman
avec Willie Nelson, Kris Kristofferson, Johnny Cash et Waylon Jennings. Mais il m’a écrit,
maintenant, que là-bas personne ne connaît ce disque. C’est la triste vérité.”
C’est certainement vrai, mais il faut quand même bien voir la tranquillité avec laquelle
Bitomsky va dans un bar de truckers américains et s’y commande un hamburger with
everything ou avec quel amour il filme un gunslinger artist. Dans ce quotidien-là se
manifeste souvent un sens pur et simple de l’aventure, très ironique et absolument digne de
foi; qui nous rappellent que l’aventure et le secret existent. L’aventure ce n’est pas comme
58
on se l’était représenté, ce n’est pas comme chez Conrad ou London, c’est mieux, parce que
c’est quelque chose que l’on peut restituer et que l’on peut, en définitive, atteindre. Sur
Bühler, par exemple, le plus aventurier d’entre tous, on raconte qu’il a ouvert avec
quelqu’un un bar à Saigon qui s’appelle “Apocalypse Now” et qu’il travaille pour une chaîne
de télévision de Hongkong à laquelle il livre des reportages du monde entier (on l’a vu au
Yémen). “La patrie d’un homme qui peut choisir est là où s’amoncellent les nuages les plus
lourds.” (André Malraux)
Les nuages de Farocki s’amoncellent au-dessus de la RFA. Pour ses films, il ne voyage pas, ni
Marseille, ni l’Amérique, ni le Viêtnam; tout au plus prend-il son vélo pour, aller, dans une
banlieue quelconque, assister à une formation de sages-femmes. Alors que Bitomsky trouve
encore dans le quotidien de vagues traces d’un lien avec le passé, Farocki découvre le
démembrement du présent.
La cinéphilie romantique d’un Bitomsky lui est étrangère, ses films de cinéma ont à faire avec
Weiss, Kluge et sans cesse avec Straub, le regard qu’il pose sur les choses, dans ses œuvres
qui critiquent les médias, les décompose, tandis que celui de Bitomsky, certes tourné vers
d’autres thèmes, obéissant à une même méthode, est un regard constructif. Farocki a
toujours semblé le plus triste d’entre eux, ses textes, spécialement ceux qui abordent des
thèmes contemporains, sont corrosifs comme l’acide. Derrière cette tristesse se manifeste le
désespoir, c’est clair, mais aussi un étonnement devant le fait que les choses se présentent
comme elles se présentent. Encore une fois l’ombre dessinée à la craie sur le sol: la pluie qui
emporte les traces, et la musique de Mahler. Sans une raison – par-delà le raisonnement
purement rationnel – de continuer à avancer, sans le sentiment qu’on continue d’avancer,
analyser ne sert à rien.
in Histoire(s) Allemand(s), trad. Christophe Jouanlanne
Que cherche-t-on? (Au regard de l’histoire, le cinéma en question)
Jean-Pierre Rehm
“Que cherche-t-on?” Cette question simple est prononcée vers la fin du film sur la UFA, de
1992. Après n’avoir présenté qu’extraits de films d’époque sur des moniteurs télés pendant
plus d’une heure dans le huis clos de décors intérieurs à peine dévoilés, hormis de fades
fonds blancs ou de lourdes tentures rouges, des personnages sont enfin filmés en extérieur,
avec la chaleur des couleurs appuyées qui donnent l’impression d’une jungle domestiquée.
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On ne tarde pas à reconnaître dans ces figurants muets les artisans du cinéma d’aujourd’hui.
L’un porte un trépied, l’autre la valise du matériel d’éclairage, une femme suit un porteur
d’un cadre en aluminium, etc. Archéologues d’un nouveau genre, si leurs pas et leurs gestes
sont parfaitement audibles, c’est le sens de leur mission qui paraît plus indéchiffrable. Car “la
forme”, y est-il dit en conclusion, est “perdue”.
Et pourtant, Die UFA, comme tous les films de Bitomsky, appartient à un ensemble
homogène, de facture fort reconnaissable et à la fonction unanime. Quelle mission? Disons,
d’un mot, pédagogique. A la séduction, dont les films de propagande agencés dans Images
d’Allemagne (1983) lui ont confirmé qu’elle faisait si bon ménage avec le mensonge
politique, Bitomsky oppose la rigueur de la compréhension, la complexe stratification de
l’Histoire, la nécessité de la décomposition (à tous les sens du terme). Il y a
incontestablement chez lui comme chez Freud l’amour des ruines. Le complexe VW (1989) se
réjouit, malgré l’évidente austérité des images et du commentaire, de présenter une ruine
imminente, contemporaine, fin d’une usine, mais plus largement, disparition du travail, et
d’un monde qui s’est tout entier défini à travers lui. Ce que démontre impitoyablement B-52
(1989), qui articule posément la chronologie de la neutralité de la production industrielle
avec la froide logique de destruction. Mais cet amour est doublé, comme pour Freud, de la
volonté tenace de déchiffrer le langage plus ou moins muet de telles ruines pour mieux s’en
tenir quitte. C’est-à-dire de les accompagner dans leur devenir de ruines, pour certifier leur
disparition. Lecteur de Brecht et de l’Ecole de Frankfort autant que de Lotte Eisner, mais
aussi spectateur assidu de l’histoire du cinéma comme La mort et le cinéma (1988) et ses
suites l’exemplifient, Harmut Bitomsky a opté, contre tout cynisme, pour la transmission.
C’est là sans doute le sens des incessants travellings latéraux manifestes dans La UFA: passer
d’une chose à l’autre. Glissant sur la figure archaïque des rails du cinéma d’un moniteur télé
à l’autre dans le même plan, moniteurs quelquefois assemblés comme dans le Numéro Deux
de Godard, ou comme dans certaines œuvres de son compagnon de route Harun Farocki,
Bitomsky pose à la fois la question des archives et de leur possible montage. Ou plutôt,
d’une telle question, il propose résolution. Faire glisser le présent sur le passé en empêchant
de rendre à celui-ci la vie qu’il a dérobée. Coincer le passé dans des maigres citations qui
resteront lettres mortes, encadrées par le petit écran, et que pourtant nous pourrons lire:
c’est le pari paradoxal du cinéma de Bitomsky. Si les autoroutes ont été un jour bâties
comme de prétentieuses sculptures monumentales sans prévoir l’ampleur de leur oublieux
usage contemporain, comme il est montré dans Les autoroutes vers le Reich (1986), alors
rendons les aujourd’hui à leur vacuité et à leur vanité. Pareillement, que ce qui se veuille
technique de souplesse et de ralliement serve à mieux parcourir un paysage fait de tous les
accidents de par- cours. Tel travelling freine dans ses incessants allers-retours le romantisme
du voyage dans le temps à l’exotisme innocent. Plus complice des Histoire(s) de Cinéma de
Godard que de l’utopique panorama scorcesien, il accélère la nécessité d’une mémoire sans
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lacune, et qui ne montre de l’Histoire que ses trouées faites d’images. A l’inverse des
Histoire(s) toutefois, Bitomsky ne fait preuve d’aucune foi dans la grande mission de
révélation iconique. Les images sont fabriquées dans un contexte de survie économique et
d’aliénation politique qu’elles ne parviennent que rarement à surmonter. C’est pourquoi tel
livre (Kracauer, Eisner, etc.) peut être brandi par des mains fières de leur trouvaille, presque
des poings eisensteiniens, comme être présenté du bout des doigts, dégoûté d’en témoigner
(Veit Harlan). Il y a l’Histoire, certes, et son déroulé mat, mais chaque extrait, pouvant passer
du noir et blanc à la couleur, en dépit de l’original, joue comme métaphore du destin du
cinéma allemand dans son rapport au pouvoir.
On l’aura compris, à trop aimer les ruines, rien ne s’en trouve exempt, et c’est le cinéma
(même dans sa version progressiste vidéo) qui est emporté dans le mouvement de deuil. Ou
qui ne subsiste que pour raconter pourquoi et de qui il hérite, pourquoi il ne peut continuer
intact, pourquoi “la mort est son axiome”. Que ce postulat soit familier au cinéma allemand
n’est bien sûr pas sans importance. Fassbinder, Schröter ou Syberberg ont œuvrés dans les
mêmes eaux du désenchantement. Elles sont ici, comme Hegel le disait du pragmatisme,
particulièrement glacées. Cinéma refroidi, c’est la raison du systématique commentaire en
off. Qui ne vient jamais, ni sco- laire, ni indemne, par-dessus les images et leur désastre.
Comme le met en scène de manière sophistiquée Le cinéma et la mort, le commentaire, en
in cette fois, n’est lui-même que la bouée de sauvetage lancée au spectateur pour qu’il ne se
noie pas dans le naufrage. Hiatus irréconciliable du sauvetage, où seul le sauveteur, à
repêcher un cadavre, garantit son existence.
Que cherche-t-on? Deux réponses simultanées, toujours, s’emmêlent et contrarient les
fouilles. Hier et aujourd’hui. Le cinéma et l’Histoire. Le document et la réalité dont il se
revendique. Comment faire aujourd’hui ce qu’hier a interdit? Comment faire rentrer, sous
une autre forme que celle de l’archive bien-pensante, la veille dans la nécessité de demain?
Militer pour l’intelligence au prix d’y brûler les forces d’un art sali de ses compromissions,
voilà l’entreprise rare du cinéma, tout aussi rare, d’Hartmut Bitomsky. Comme il l’a déclaré,
semblant reprendre une fameuse analyse d’Adorno au sujet du succès problématique de
Mozart: “Un documentariste n’invente pas le monde, mais lui succède. Et le travail
documentaire, c’est de dire oui au monde, en même temps que de lui opposer un non”.
in Catalogue du FID Marseille, 2006, à l’occasion de la rétrospective Hartmut Bitomsky
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Deutschlandbilder: um processo imaginário de indícios
Klaus Kreimeier
Nos seus filmes, Hartmut Bitomsky utiliza com freqüência material fotográfico e fílmico
produzido durante a ditadura nazista. Isto tem a ver com os temas alemães dos seus filmes,
mas também com o fato de que seus filmes deram início a um processo imaginário de
indícios que provavelmente não vai chegar ao fim enquanto esse material estiver disponível.
Todo aquele que o utilize precisa lidar com o fato de que, por assim dizer, está interferindo
num processo de indícios ainda em andamento – ou mais que isso, está acrescentando a esse
processo sua própria contribuição hermeneütica. Famosos "filmes documentários" sobre
Hitler e o Nazismo são exemplos de que alguns autores (como Erwin Leiser ou Joachim C.
Fest) aceitaram inconscientemente esse procedimento, como se pode reparar, e lidaram sem
muito cuidado com o caráter indiciário do seu material.
Em relação a Bitomsky, cabe afirmar que, no mínimo, lhe interessam tanto os temas alemães
como os problemas que surgem do fato de que os temas alemães deste século encheram as
revistas e os arquivos com material fotográfico passível de reprodução. Deutschlandbilder
[Imagens da Alemanha] é, até agora, o seu filme mais conseqüente: o primeiro e até agora
único filme que faz deste processo de indícios, ininterrupta e cegamente conduzido, o seu
próprio tema. Assim, não se está discutindo o "nacional-socialismo", mas seu índice de
imagens, isto é, sua iconografia. Por muito tempo, o conceito de propaganda teve de
disfarçar o processo que estas imagens produzem em nós: em nós, os alemães que já
existiam antes de Hitler, que em 1933, na maioria, se decidiram por Hitler, e que como povo,
com o fracasso dessa política, reconhecidamente não desapareceram do cenário.
Como diz Bitomsky no início do filme Deutschlandbilder, as fotos e os filmes do período
nazista são parecidos com agentes que mudaram de lado e agora seriam "virados". Como
agentes inimigos, foram presos pelos Aliados, isto é, proibidos de serem publicados e
desapareceram em arquivos bem vigiados. Com o passar do tempo, foram liberados sob
certas condições: podiam ser "usados" para fins comprovadamente educacionais, mas este
uso foi atrelado a seu tratamento continuo para fins de identificação policial. Um exemplo
espetacular é o famoso filme de guerra "Kolberg", de Veit Harlan, que, na versão da
distribuidora Atlas, voltou a ser exibido nos cinemas com comentários instrutivos e
assustadores. Ao mesmo tempo, os departamentos de história contemporânea das emissoras
de televisão tornaram-se uma insaciável máquina de reciclagem do material fílmico e
fotográfico nazista. Comentários, legendas e entretítulos, ou ainda avisos de precaução ao
anunciar o filme, cuidam para que, até hoje, se preserve o trabalho de identificação. É um
tratamento que indica cada foto, cada metro de filme do período nazista, a priori, como
"propaganda", e com isso, já, o priva da observação. Ao mesmo tempo, o processo continua
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subterraneamente, mas os conhecimentos que ele poderia produzir são encobertos pelas
rotinas de uso.
Ao escolher um método diferente, Bitomsky critica tais práticas de uso. Em
Deutschlandbilder a, parte da função de propaganda dos filmes culturais nazistas, sabendo,
porém, que, com isso, não se esgota seu caráter de indício. Embora trate do período de
domínio nazista, ele não questiona – dito de forma explícita – o que essas imagens têm a ver
com o nazismo, mas sim com a Alemanha.
Em Der VW-Komplex [O Complexo VW] monta um trecho curto de um discurso de Hitler de
1935, sem, no entanto, mostrar Hitler discursando, mas sim uma pausa do discurso, e
acrescenta o seguinte comentário: "agora vai prometer às massas criar o ‘carro do povo"‘.
Cada programa de história contemporânea da TV teria ansiado pelo "som original". Bitomsky
cria um procedimento contrário, nos privando do som supostamente tão comprobatório.
Assim, nós, os espectadores, temos a liberdade de desconfiar do seu material. Temos a
liberdade de confiar menos neste material fílmico do que os alemães de 1935 confiaram no
seu Führer. Bitomsky critica uma prática de filme documental e televisivo que organiza seus
sons e imagens de tal maneira que exige de seus espectadores uma confiança parecida a que
Hitler pediu aos alemães em 1935. Através da escolha do material, Bitomsky realiza o que
Godard pensava quando exigia "não fazer mais filmes políticos, mas fazer os filmes políticos".
Filmes documentários são menos documentos do seu tempo do que dos seus ideais: em
contextos de forte pressão política, isto os torna, de fato, filmes de propaganda. Os filmes
documentários dos nazistas chamavam-se "filmes culturais". Bitomsky toma o conceito ao pé
da letra, sem explorá-lo de maneira explicitamente "crítica". Ele demonstra que, sob as
condições do regime nazista, algumas idéias e características da cultura alemã encontraram a
si mesmo, e com isso, puderam ter a esperança de se verem realizadas. O Filme Cultural
ativava uma carga emocional de conceitos com conotação tradicionalmente positiva, e uma
valorização dramática de sentimentos estéticos geralmente vagos vinculados a eles: Limpeza
(Schönheit der Arbeit [Beleza do Trabalho]) Saúde (An Luft und Sonne [Ao ar livre e ao sol])
Liberdade (Urlaubsfreuden [Prazeres de férias]). Como toda época, a era nazista estilizava
seu potencial de violência para o lado estético. Conhecendo o que se sucedeu, o observador
crítico de hoje não tem dificuldades de decifrar a aparência estética como maquiagem de
brutalidade descomunal.
Muito rapidamente, recorre ao conceito de propaganda, para isolar a produção de imagens
nazista como caso fora do comum; se for preciso, está disposto a atestar-lhe uma
certa perfeição ou um refinamento demagógico. Em contrapartida, Bitomsky propõe ler os
filmes culturais primeiro como produtos de uma elite carente de beleza uma elite que
somente se diferenciava de seu povo por ter chegado ao poder.
Bitomsky diz: "Precisamos colocar esta produção de imagens diante dos nossos olhos". E ele
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não pensa isso em sentido moralizante, mas, antes de tudo, técnico: não se pode colocar um
trecho de filme diante dos olhos, deve-se pegar seus elementos isolados e, no momento
congelado, tentar agarrar as imagens in flagranti. Como desperta curiosidade, o autor pode
confiar na vontade descobridora de seus espectadores e reduzir seu comentário. Pode
limitar-se a palavras-chave que contêm estímulos, e que não fixem o observador, mas
possibilitem sua "reflexão: os filmes sobre os alemães, sobre a cultura de corpo alemã,
seriam um "plebiscito às avessas", quer dizer, o governo declararia a confiança ao povo. No
filme de férias, a saudade (alemã) se conciliaria com a xenofobia (alemã). Aos poucos se
entende que o Filme Cultural nazista tinha de lidar com uma série de contradições – aliás
como a televisão que, hoje em dia, tem de conciliar, permanentemente, as necessidades de
caos do público e sua ansiedade por harmonia.
Colocar as imagens diante dos olhos: existem diferentes técnicas para isso. Uma mão aparece
na imagem do lado esquerdo e entrega as fotos a um observador, o qual nós – os
espectadores – olhamos por sobre os ombros. Esta é uma solução convencional que,
conscientemente, duplica a distância (dos espectadores) em relação às imagens. Nós
permanecemos meros espectadores; esperamos um posicionamento do observador anônimo
que, no entanto, permanece calado. Ele é somente um instrumento que deve orientar o
nosso olhar. Ou, ainda: uma seqüência de fotos, alinhadas de maneira diagonal; elas estão
ligeiramente onduladas, como se acabassem de ter sido retiradas da solução fixadora; a
câmera move-se lentamente de cima sobre elas.
As consideramos como contínuo, como "fuga de imagens", e nos lembramos do trecho
mostrado anteriormente, do qual provêm. "Imagens desfiguram", diz Bitomsky, elas
confundem o contexto geral. No entanto, podemos descobrir imagens. Isto é mostrado no
sentido literal: uma mão retira uma foto, e debaixo jaz uma outra. O esporte encobre a
guerra, ‘Força pela alegria’ significa, "no fundo", a disposição para morrer.’ Propaganda?
Com certeza. "Uma imagem é a mascara da outra". Mas o esporte e a guerra, a alegria coletiva
e a disposição ao sacrifício são elementos da mesma cultura. Tal cultura não foi inventada
pelos nazistas; ela tem uma longa história.
O método de Bitomsky pode ser ampliado. Teríamos de retirar de baixo das imagens nazistas
outras imagens, que narram muitos antecedentes, histórias de vida e de percepção, dos quais
se compõe a pré-história do nazismo. Turistas alemães dos anos 30, como sabemos, olham
freqüentemente para fora das imagens, em uma distância qualquer. Orientam o olhar dos
que ficam em casa para mais longe: talvez para os territórios do Leste ou para as colônias
perdidas. Já a mídia do séc. XIX ensinou aos alemães este olhar orientado para o distante. E
quando a Primeira Guerra Mundial estava perdida, na Charneca de Brandenburgo foram
construídas paisagens exóticas para aqueles filmes de aventura e viagem, que reconciliaram a
saudade e o desejo de viajar do público alemão, humilhado pelo Tratado de Versailles, com
os planos de revanche dos nacionalistas de direita. Uma imagem é a máscara da outra, mas os
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mascaramentos são parte de uma história da percepção visual, que poucas vezes transcorre
em congruência com os períodos da historia política. Ela necessita mais tempo para se
desenvolver. Os cortes históricos impostos por revoluções ou guerras não valem para ela. Em
Der VW-Komplex, Bitomsky mostra fotos dos anos 50 com o presidente da empresa,
Nordhoff, no primeiro plano, diante de uma paisagem formada de filas de novos fuscas
meticulosamente ordenados, se perdendo no horizonte. Não conheço nenhuma foto dos
anos 30 ou 40 que não evidenciasse a dimensão nazista do milagre econômico em uma
iconografia tão impressionante.
Nessas imagens, os Volkswagen são arranjados em uma parada gigantesca: do mesmo modo
como as colunas do Serviço de Trabalho do Reich, ou muito antes, como os regimentos do
exército prussiano no Campo de Tempelhof. "Paradas trabalham como tautologias", diz
Bitomsky. Seus filmes aguçam nosso olhar para as analogias estruturais
que se revelam debaixo dos muitos mascaramentos. "As colunas e as paradas são a forma
teatral para o trabalho em série." Já na era pré-industrial funcionavam como teatro de revista
para as massas autoritariamente condicionadas. Com a expansão do grande maquinário
industrial na virada do século, surgiu uma "cultura motriz" (Fritz Gliese) na indústria da
diversão, e quando a linhas de montagem de Henry Ford se tinham imposto, Hollywood
respondeu com garotas perfiladas nos seus filmes de revista. Nos anos 30, a companhia
cinematográfica estatal Ufa integrou, nos seus espetáculos de entretenimento rigidamente
ritmados, o passo uniforme e militar da SA. Se as colunas uniformizadas foram a Revue do
trabalho em série, os filmes de Marika Roekk foram uma espécie de Revue da Revue.
Quando Bitomsky diz que assistir ao filme Rüstungsarbeiter [Operários da Indústria de
Armamento] seria trabalho de acorde, que este trabalho seria determinado pelos cortes, e o
ritmo destes cortes pela música, ele formula uma lei que já tinha conquistado seu valor no
clima e no gesto estético da ‘nova objetividade’. No mais tardar, a introdução do metrônomo
– sincronizando som e imagem – por ocasião da estréia do filme Berlin – Sinfonie der
Grossstadt [Berlim – Sinfonia da Metrópole], de Walter Ruttmann, subordinou a recepção
Cinematográfica a uma nova hierarquia. Em Der VW-Komplex, ouve-se um estranho
comentário, que soa como um hino tardio à tão ansiada simbiose entre indústria e arte. A
orquestra da Volkswagen ensaia num galpão que fica imediatamente ao lado da seção de
prensagem, e Bitomsky diz: "Percebe-se o compasso da produção, como ele estremece o
prédio todo e como se transforma em música." Isto também poderia ser lido num prospecto
de luxo de Nordhoff ou de seus sucessores.
A hierarquia entre indústria e estética, ritmo de produção e modo de percepção é uma
hierarquia de comando, na qual se integra facilmente, no filme cultural nazista, o martelar
continuo dos comentaristas. Os filmes trabalham como máquinas a vapor, sem deixar espaço
livre ao olhar errante. Isto favorece a tendência difundida de contá-los, como "propaganda",
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dentre as perdas da historia do cinema, para poder passar rapidamente à ordem do dia.
Porém, haveria detalhes e, também, qualidades a se descobrir. Eles também revelariam que
não se trata de uma estética nazista – mas de um modo forçado de meios estéticos que já
haviam sido elaborados nos anos 20,e que não desapareceram com o fim do regime nazista.
Rüstungsarbeiter, por exemplo, contém seqüências que lembram os filmes experimentais da
Escola de Hans Richter e Walter Ruttmann – uma corrente que surgiu nos estúdios
publicitários da Ufa e do vínculo entre a vanguarda e o filme industrial, promovido também
pelos interesses da indústria pesada pelo filme. Mensch, so’ n Blech [Homem como Lata] é
um filme esplendidamente montado a favor da reciclagem de metal leve, que com seu intuito
de "instrução divertida" e sua técnica de corte demonstra a continuidade espiritual do
departamento cultural da Ufa fundado em 1919,mas também dos jornais semanais e os
"filmes complementares" dos anos 50.A continuidade já não surpreende quando assistimos
um filme chamado So wird’ s gemacht [Assim se Faz] e produzido em 1944 – um filme
didático que ensina minuciosamente aos compatriotas, vítimas de ataques aéreos, como
reerguer provisoriamente o teto destruído. Mesmo antes do fim da guerra foi treinada a
reconstrução – da mesma forma que, em tempos de paz, se tinha ensinado a lidar com a
escuridão e a fugir para os bunker em caso de alarme aéreo. Só pouco tempo depois, alguns
"filmes de escombros" do inicio do pós-guerra reativaram o otimismo decretado deste e de
outros filmes nazistas dos últimos meses de guerra, sem ter de mudar essencialmente o
discurso de resistência.
A dramaturgia de Bitomsky torna possíveis tais descobertas, pois não prescreve ao espectador
o que ele deve ver, mas, quanto muito, faz propostas e cede espaço às viagens da fantasia, à
reflexão e às associações desordenadas. As imagens do período nazista não são tratadas de
modo como seriam imaginadas pelo consumidor médio, nem o autor tem pleno controle
sobre elas. Na alternância entre trechos de filme e fotos fixas, o material deve revelar os seus
indícios "como se fosse natural", mas este "natural" se baseia num procedimento estético
altamente calculado. O autor sabe que trabalha num universo de imagens que não surgiu
repentinamente em 1933, e que tampouco desapareceu em 1945.
"Não houve queda de imagens depois da guerra", constata Bitomsky ao final de
Deutschlandbilder. Deveriam ter vindo mesmo abaixo os fundamentos desta produção
imagética – uma tentativa que, como se sabe, foi empreendida na Alemanha Oriental, sem
que tenha alterado substancialmente a produção das imagens.
in Die Wirklichkeit der Bilder. Der Filmemacher Hartmut Bitomsky, Jutta Pirschtat (org), Essen,
filmwerkstatt, 1992, trad. Stephan Hollensteiner, Elcio Cornelsen
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Edgardo Cozarinsky
Journal d’un manipulateur
Edgardo Cozarinsky
J’entends dire: “Les films ne font plus rêver”. Entre les grands rituels du concert rock et les
cérémonies savantes de l’opéra, c’est loin des cinémas que les différents publics semblent
chercher maintenant leurs invitations au rêve. Les gens qui expriment ce regret évoquent
une Arcadie perdue : un cinéma naïf dans le propos, bien que très élaboré par ses moyens,
qui savait éveiller chez le spectateur, telle une étincelle, un travail fantasmatique, source de
plaisir.
Mais ce cinéma d’aujourd’hui, qui ne fait plus rêver, est trop souvent – du moins dans sa
production “à gros tirage” – à la fois plus primaire et plus tarabiscoté qu’à aucune autre
époque de on histoire. Agacé, abasourdi par le harcèlement audiovisuel, le public a de plus
en plus mal à voir et à entendre. Il en résulte, à l’autre extrême, que le travail d’attention
exigé aujourd’hui par un film des Straub, par exemple, est bien plus ardu que celui demandé
par le même film, il y a vingt-cinq ans: loin d’être entré dans les usages, le travail de ces
cinéastes est devenu moins accessible. Le même phénomène se produit pour l’Antonioni de
l’Eclipse, et pour nombre d’œuvres qui dans les années soixante pouvaient atteindre un
public non confidentiel.
Les spécialistes de la séduction du public imaginent faire rêver en offrant sur le “grand” écran
ce qui est censé manquer au “petit”. Mais le choix qui découle de ces appellations, “grand” et
“petit”, implique une emphase sans discernement: boursouflure d’effets visuels et sonores,
gâtant l’appétit qu’ils sont censés assouvir. Leur efficacité, brévissime, est inversement
proportionnelle à leur prolifération. Il en est de même pour les mille et une ressources de la
vidéo: à force d’être utilisées comme de simples artifices, elles ont pour effet, que ce soit
dans des shows musicaux ou des œuvres “de création”, toujours en retard sur les
“trouvailles” de la publicité, d’éveiller le zappeur en tout spectateur.
L’essai, vite abandonné, d’installer des écrans vidéo sur les quais du métro parisien a
démontré l’indifférence collective face à une morne avalanche de messages convenus et
d’images sophistiquées. Dans une société vouée aux dieux marchands, tout ce qui est gratuit
est immédiatement méprisé (c’est sans doute de ce côté qu’il faut chercher les raisons du
succès de la télévision payante); l’intrusion de ces images, censée alléger un moment sans
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éclat de la vie quotidienne, n’a été perçue en somme que comme un signe supplémentaire
d’inconfort lié aux transports en commun.
Ces images, par excellence celles qui ne peuvent pas faire rêver, entrées depuis longtemps à
la maison, participent du même contexte indifférencié que le téléphone – lui aussi, à une
autre époque, instrument prestigieux, héritier du pneumatique qui pourtant n’a disparu que
récemment – ou le réfrigérateur. Le cinéma, lui, a longtemps bénéficié du privilège de la
religion et du théâtre: celui d’avoir un lieu de culte exclusif dans lequel on se rend pour
participer au rite. Il semblerait qu’on n’accède au sacré que lorsqu’il faut sortir de chez soi,
quand le lieu de culte est bien séparé de celui de la vie pratique. Ce lieu, le cinéma l’a gardé,
mais son prestige est devenu moins reluisant que celui d’autres spectacles, tels le concert
rock ou l’opéra, qui, par nature, ne se répètent pas à l’infini, et deviennent donc des objets
de luxe.
Un fragment de pellicule imprimée, même si je connais la date et le lieu de tournage, les
circonstances de sa production, les noms des personnes intervenues d’un côté et de l’autre
de la caméra, sera toujours pour moi un objet venu “d’un autre monde”. Il peut n’avoir
aucun intérêt pour mon travail. Il peut être trop récent pour avoir un certain mystère, trop
lié au monde de la publicité ou du journalisme audiovisuel, avoir un sens univoque, une
surface trop lisse ne me permettant ni d’y instiller le doute, ni d’intervenir en le mettant en
rapport avec un autre regard, ni d’y déceler une histoire enfouie, ne fût-ce que lui faire
refléter un récit absent dont il serait le “négatif”.
Mais, parfois, s’il n’était pas purement utilitaire à l’origine, j’y soupçonnerais des possibilités
de fiction, la palpitation d’une fiction refoulée que je découvre, que je suis en train d’essayer
sur lui: comme le regard d’exploration qu’on adresse à une personne inconnue avant d’oser
l’aborder. Peut-être que l’effort, manifeste au moment de sa production, pour communiquer
un sens, pour offrir un certain spectacle, s’est estompé, effacé avec le temps. La surface
fissurée laisse alors paraître tout autre chose. J’y vois quelque chose que mon regard
apporte, que ce bout de pellicule imprimé me permet de projeter. Et cette chose-là me fait
rêver.
Ces images qui “arrivent d’ailleurs”, dès le début, j’ai ressenti le besoin de les inclure dans
mes films, de les “frotter” à d’autres images de source différente, à des sons nouveaux. Déjà,
dans mon premier essai de cinéma (Points de suspension, Argentine, 1971), il y avait une
citation du Nosferatu de Murnau. Dans la Guerre d’un seul homme (1981), les images
trouvées étaient le seul matériau à élaborer. Dans BoulevardS du crépuscule (1992), elles
jouent sous des aspects divers (vieilles actualités, extraits de films de fiction), mélangées à
mes propres images qui, elles aussi, revêtent des masques différents (journal de voyage,
entretiens plus ou moins mis en scène) de sorte que leur entrecroisement, parfois plan à
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plan, devient inextricable. Si je me penche sur mon travail passé, il me faudra aussi admettre
que dans mes films dits de fiction, j’ai souvent fabriqué les “images trouvées”: ainsi les
extraits de la Mort de Danton, tournés en noir et blanc pour les Apprentis-sorciers (1977),
me paraissent aujourd’hui aspirer l’existence objective des “objets trouvés” par rapport au
pastiche de film noir, tourné en couleur, sur lequel ils viennent se greffer.
Arrêt sur l’image d’une vieille actualité. Sur la table de montage, j’observe les visages
inconnus dans une foule, parfois filmés à leur insu. Rien ne peut me “faire rêver” plus que
leurs expressions, leurs gestes, excisés d’un contexte que j’ignorerai toujours, et qui bien sûr
n’a rien à voir avec celui que leur propose le montage du document conservé dans les
archives. Par rapport à ce contexte ignoré, je ne peux qu’inventer des hypothèses, lesquelles
glissent très vite vers la pure fiction. Je leur donne un avant, un après, un dedans : tout à
partir d’un regard fuyant, d’une coiffure particulièrement soignée, du journal à moitié déplié
qu’ils tiennent à la main.
Que faisaient-ils ce jour-là, près des puissants du moment? (De ceux-ci je connais le nom, le
destin de leur ambition. Je pourrais même savoir ce qu’ils ont voulu faire transparaître de
leur pensée, car ils ont laissé un journal ou des mémoires ... ). Pour mon regard, les
anonymes deviennent les “figurants” de l’Histoire, cette idole hégélienne, amnésique et
vénale, dont les stars me captivent peu. Tel soldat russe prisonnier des Allemands sur le front
de l’Est en 1942, sur lequel je fais un arrêt : gros plan fixe de quelques secondes arrêtant un
panoramique qui balayait le groupe où il se trouvait. Ce soldat m’avait intéressé parce qu’il
détournait les yeux de la caméra et les levait vers le ciel, moins dans une invocation muette à
l’au-delà que par simple lassitude. Il boudait cette caméra qui donnait une immortalité à son
image au moment où son existence était menacée, où elle pouvait être anéantie. Jamais je ne
saurais ce qui se passait dans sa tête.
Peut-être pas grand chose. Mais du seul fait qu’il ne pouvait empêcher qu’on le filme, et que
devant cette soumission il ait simplement dérobé son regard à la caméra, je ressens pour lui
un certain respect, plus chaleureux, en tout cas, que pour tel homme de lettres raffiné,
pouvant se permettre de coucher sur la page des pensées désabusées, afin qu’un lecteur
puisse saisir toute la distance qu’il mettait par rapport à une réalité qui le dégoûtait, mais
dont il se rendait en quelque sorte complice, ne fût-ce que par le simple fait de porter un
uniforme,
Les stars du cinéma ne m’ont jamais séduit non plus. A leur époque, je veux dire à l’époque
où il y en avait des vraies, c’étaient les “deuxièmes rôles”, les character actors, emplois
destinés à faire rire ou à faire peur, à attendrir ou à rassurer, qui m’attiraient davantage. Dans
les films de Lubitsch, par exemple, c’est moins l’admirable parti qu’il tire de modèles (dans le
sens bressonien) aussi prévisibles que Gary Cooper ou Marlene Dietrich que j’admire, que la
70
cohorte d’acteurs, souvent centro-européens, dont la réapparition de film en film
occasionnait non seulement d’heureuses retrouvailles mais créait aussi un signe de
reconnaissance, celle de ma familiarité avec eux, donc d’appartenance à une certaine idée de
famille : celle qu’on s’invente. Cette famille-là, je la retrouve aussi, je l’invente encore avec
ces figurants involontaires imprimés sur un bout de pellicule.
Je sais que le sens (sens original à déceler? sens imaginaire que j’instaure?) des gestes et
expressions de ces acteurs ne peut être qu’hypothétique. Je travaille à partir de données
objectives mais avec une marge d’inconnu, avec ce vide central qui me permet d’y couler
mon imaginaire. Il agira à l’intérieur d’une matière qui aurait semblé l’exclure. Dans cette
opération, je ne suis pas attiré par la possibilité d’effectuer un changement brutal de
contexte, tel celui dont bénéficie l’objet trouvé exposé dans un musée, permettant soit une
réflexion sur ce même déplacement, soit un regard frais sur sa forme, devenue invisible
parce que trop familière.
Ce qui m’attire, c’est un jeu peut-être plus proche de celui qui poussait Borges à inventer des
récits à partir de notes de bas de page dans un livre d’Histoire, à faire circuler, tel un courant
électrique, sa réflexion entre divers articles d’une encyclopédie ... Il y a dans ma démarche,
manipulation et tergiversation, mais ces mots perdent leur résonance délictive, car le sens
que je propose n’aspire pas à produire une vérité plus “vraie” qui en chasserait une autre.
De même que l’amoureux invente un personnage, l’être aimé, à partir du “modèle” que la
réalité lui fournit, mon travail a besoin de revêtir une forme, afin que mon plaisir ne soit pas
seulement une rêverie plus ou moins aimable et consolatrice. Errance, dérive, mots fétiches
d’une pensée récente, ne me promettent aucun plaisir. Je ne le trouve que dans le travail
d’assemblage, dans l’agencement de contradictions, dans la mise en conversation de
matériaux disparates.
in Art Press Spécial nº14, 1993
Edgardo Cozarinsky: o Flâneur
Dominique Païni
A obra de Cozarinsky convida-nos a flanar: podemos visitá-la por caminhos temáticos ou
figurativos e, como no seu livro Vudu Urbano I , ousar certas aproximações, numa espécie de
montagem, um processo de manipulação que em nada é estranho ao próprio Cozarinsky. As
personagens, reais ou ficcionais, sobre as quais Cozarinsky construiu os seus filmes mostram-
71
nos o seu fascínio pelos seres que travam um combate solitário. Isto está literalmente inscrito
no título de um dos seus filmes: La Guerre d’un Seul Homme. Em BoulevardS du
Crépuscule, há a solidão de Le Vigan; em Pour Mémoire, a luta do Klarsfeld contra os nazis e
contra o esquecimento; em Sarah, o orgulho combativo de Sarah Bernhardt contra o
establishment teatral; em Puntos Suspensivos, também se trata da guerra de um só homem e
em Les Apprentis-Sorciers, do isolamento de exilados argentinos. Nos filmes de Cozarinsky,
as personagens estão entrincheiradas na sua solidão, numa guerra, a sua guerra. A vida destas
personagens é feita de isolamento e de exílio.
A cidade: outro elemento constante e ainda mais visível nos filmes de Cozarinsky, e que lhes
dá uma incontestável unidade, para além de um conteúdo documental. Poderíamos dizer
que Cozarinsky filma uma obsessão urbana. Pois, para ele, uma cidade é o mundo inteiro. A
urbanidade não é um estado sócio-cultural, mas um verdadeiro imaginário, estruturado
como uma entrelaçada rede de ruas, de praças, de galerias, de quarteirões, de pontes, de
cruzamentos. O diário de Ernst Jünger, que fornece o comentário de La Guerre d’un Seul
Homme, é, por sinal, o diário de um flâneur urbano. Em Les Apprentis-Sorciers, temos o
ponto de vista de Cozarinsky sobre uma cidade que ama e admira, lado a lado com a sua
visão do destino dos exilados latino-americanos. Ao contar a vida de Sarah Bernhardt, ritma
os dados biográficos da actriz com imagens do seu cortejo fúnebre pelas ruas de Paris. Pois a
cidade de amor de Cozarinsky é, evidentemente, Paris, num verdadeiro paradigma
sentimental com Buenos Aires. […]
Na obra de Cozarinsky, a própria impossibilidade da ficção passa a ser a obra, como se ele
fizesse suas as palavras de Michel Leiris em De la Littérature Considérée Comme une
Tauromachie, citadas em Vudu Urbano: "Do ponto de vida estritamente estético, tratava-se,
para mim, de condensar, quase em estado bruto, uma série de factos e de imagens, que eu
me recusava a explorar, a permitir que a minha imaginação as trabalhasse; em suma, a
negação do romance".
Em Langage Tangage, Leiris diz ainda: "Prazer que ao escrever sinto em manipular a
linguagem para manipulá-la sem ter a pretensão de emitir a cada instante uma sentença
decisiva; mas, além desta satisfação, esperança de fazer emergir um dia algumas verdades e
compartilhá-las ... " […]
Cozarinsky é um manipulador de imagens pré-existentes e também um flâneur no sentido
de Baudelaire ou Benjamin; um flâneur que "colhe plantas" no asfalto. É facto que
Cozarinsky compartilha este sentimento e esta percepção da cidade com este grande
montador de citações e de textos esparsos que é o Walter Benjamin de Paris, Capital do
Século XIX. Passeios sem destino e leituras misturam-se, enredam-se uns aos outros:
Cozarinsky encontra citações de arquivos fílmicos, do mesmo modo que Baudelaire
72
encontrava rimas nas ruas de Paris. E em Vudu Urbano, os habituais títulos dos capítulos são
substituídos por citações (mais exactamente, os títulos dos capítulos são indicados entre
parêntesis e são precedidos por citações, em epígrafe) o que mostra a importância que
Cozarinsky atribui à citação. Ele fala através da palavra dos outros, conta a sua vida ao contar
a vida dos outros.
Seria lícito investigar as relações que instaura entre os dossiers que abre e a sua eventual
autobiografia. Quase todos os seus filmes são os diários íntimos de um manipulador e o
modo como utiliza os documentos dos arquivos cinematográficos e ao mesmo tempo uma
citação, uma prova num inquérito e uma confissão.
Em espanhol, o primeiro sentido de "citar" é "marcar um encontro". Citar seria por
conseguinte, uma prática urbana. Em BoulevardS du Crépuscule, a citação é o arquivo e cria
uma relação incerta entre o agora e o que foi. Para Benjamin, a citação é a imagem lida, ou
seja o agora do "conhecível". "Ela leva ao último grau o selo do momento crítico, do
momento de perigo que é o fundamento de qualquer leitura ". Benjamin também disse que
queria "levar a arte de citar sem aspas à sua mais alta perfeição" É deste mesmo inextricável
entrecruzamento que fala Cozarinsky, este manipulador que, ao fim e ao cabo, seria
excessivamente leitor, e um leitor excessivamente grande, para fazer, ele próprio, ficção.
in Edgardo Cozarinsky, catálogo Cinemateca Portuguesa, 1997, trad. Antonio Rodrigues com Rui Santana
Brito
Ambiguous evidence: Cozarinsky’s “Cinema Indirect”
Jonathan Rosenbaum
[…]
1.
“…Where all possibilities are plausible, perhaps none is true?
Around me, private history and public history cross each other without meeting…”
Edgardo Cozarinsky, BoulevardS du crépescule
Apart from a brief summary of Ernst Jünger’s life and career up to 1940 (when he was posted
as an army officer in Paris), the first section heading, “1. Andante con moto,” and the opening
73
credits, the first two verbal texts we encounter in One Man’s War – the two bread slices
sandwiching the three elements cited above – concern the “documentary” texts that
comprise the film’s two principal ingredients: weekly newsreels and personal notebooks,
both dating from the early Forties. The brief printed text about newsreels, written by
Cozarinsky, tells us that in a period before television, when cinema attendance was massive,
weekly newsreels were the only opportunity for a very large public to see moving images of
current events. And the opening spoken text by Ernst Jünger about his personal notebooks
and diaries, read offscreen by Niels Arestrup, tells us that he keeps them locked in a steel safe
in his hotel room -– a safe provided to him to house confidential files about disputes
between French army and Nazi officials. Objects such as these safes, he notes dryly, are only
symbols of personal status, and if this status should ever be questioned, such precautions
would become meaningless.
In the dialectical play between these two texts about texts – a dialectical play involving public
versus private (and hence advertised versus secret), the masses versus the individual,
onscreen versus offscreen, printed versus spoken, supposed “objectivity” versus supposed
“subjectivity,” and open spectacle versus fear of discovery – the “cinema indirect” of Edgardo
Cozarinsky has already begun to take shape. Whether taking the form of popular, everyday
spectacle or of private reverie, the two basic texts of One Man’s War are mechanisms for
normalizing and justifying the intolerable, and the means by which Cozarinsky chooses to
expose these mechanisms are those of indirection. “I am only interested in `cinema indirect,’
if it exists,” he remarked parenthetically to Thomas Elsaesser (the emphasis is mine) in an
interview about One Man’s War – an interview significantly carried out in both Berlin and
Paris.
Why “cinema indirect” and not “cinema direct”? Because, from one point of view, the films,
stories, and essays of Cozarinsky all tend to drift around the delicate and paradoxical issue of
how to deal with fiction and fantasy without lying, and “cinema direct,” a form of film
rhetoric and style that for many viewers automatically becomes a signifier of truth and the
“real,” falls too easily into the practice of lying. (Jean Rouch undoubtedly had this point in
mind when he employed “cinema direct,” a technique central to his ethnographic films –
many of which unabashedly incorporate elements of fiction –- in his only pure fiction film, Le
Gare du Nord , his contribution to the 1964 sketch film Paris vu par…) And as the
“Mythologies” of Roland Barthes (among related enterprises) remind us, “news” and
“documentary” can all too easily cloak their myths – their ideologies and other unstated
suppositions –- behind related signifiers of actuality.
From this point of view, the newsreel footage and the diary entries that rub shoulders in One
Man’s War are two forms of self-justifying fiction, and the motivation for juxtaposing them is
the desire to bear witness to the “real” sources and provocations they have in common. Like
the multiplication of two minus signs yielding a plus, this multiplication of two fictions yields
74
a common concealed space that each fiction strives to rationalize and domesticate. Cinema
indirect becomes the means for bringing this concealed space to light.
Like the deliberately artificial and unstable spaces created between Paris and Buenos Aires in
much of Cozarinsky’s work, between fiction and nonfiction, between literature and cinema,
between “postcards” and quotations, between native tongue and exile tongue, and ultimately
between politics and art, this cinema indirect is quite literally founded on a theoretical
impossible space –- a realm of intervals, of in- betweenness, paradoxically defined by its own
conscious marginality and lack of definition. Its only certainty, one might say, is a complete
absence of certainty.
As Richard Porton has noted of One Man’s War: A currently fashionable tenet advocates the
view that history can only be evaluated within a textual framework, but this film moves
beyond that by-now moldy truism to demonstrate the instability and outright
mendaciousness of textual evidence. The newsreel sources are fascinating relics of societal
bad faith, and this gargantuan exercise in self-deception is mirrored in the diary entries of
Jünger that provide the film’s ectoplasmic voice-over narration. (As Thomas Elsaesser
remarks, the film is interesting precisely because we know less after watching it than we did
before.)
One reason why we know less is that even the satisfaction of being told a linear narrative is
disrupted. Although the film begins with Jünger’s early days in France and ends with the
Liberation of Paris, the achronological arrangement of many of the diary entries that figures
in between confounds any possible sense of progression or development in his thought. (In
some segments, the entries even proceed backwards: in one portion devoted to 1941, we
move from December to October to June to January.) And the nature of Cozarinsky’s mosaic
structure of both text and newsreel material, not to mention his juxtaposition of the two -–
counteracted in turn by his disjunctive uses of “Aryan” (Hans Pfitzner, Richard Strauss) and
“degenerate” (Arnold Schönberg, Franz Schreker) musical accompaniment, and his division
of the film into four chapters marked by musical indications –- compels us to regard the filmas-a-whole as an abstract composition at least as much as a collection of documents. Thanks
to these strategies, as the film advances, our awareness of what it leaves out and refuses to
say becomes every bit as important as what it includes; it is in all the unstable spaces between
Cozarinsky’s elements (newsreels, diary entries, music, punctuations of black leader) that his
darkest and “truest” meanings take shape. […]
3.
The second “homecoming” film, BoulevardS du crépescule, is a personal essay, though one
whose gaps and occasional ambiguities suggest at times some of the procedures of fiction.
The film’s subtitle – on Falconetti, Le Vigan and a few others … in Argentina – accurately
75
describes its subject. Yet the ellipsis of three periods, appearing on the screen in a separate
line between “a few others’ and “in Argentina,” almost subliminally introduces a sense of
indeterminacy at the same time that it evokes, appropriately, the title of Cozarinsky’s first
film, where the rudiments of this indeterminacy are already established.
The key historical event of BoulevardS, the “mirror-image” (or reverse-angle) of the event
concluding One Man’s War, is the celebration of the liberation of Paris on August 24, 1944,
in Buenos Aires’ Plaza Francia. The event is first evoked in the film by Adolfo Bioy Casares,
then by Gloria Acorta, then by Cozarinsky himself, who notes other events occurring on the
same day, including a performance by Falconetti in The Children’s Carnival at the Casa del
Teatro. But it isn’t until roughly halfway through the film, after the same celebration is
recalled by Andrée Tainsy, another actress who knew Falconetti in Buenos Aires, that
Cozarinsky incidentally reveals that he too was present at the same event: “Hanging onto the
hands of my parents, I did not understand people’s joy, nor their relief. I heard singing in a
tongue that I did not yet understand.” Just before he speaks these words offscreen, over the
offscreen voices of Tainsy and Acorta recalling the same event, we see Cozarinsky looking at
an array of photographs spread out on a table. When he arrives at his own memomy to
complement theirs, the camera moves forward to a boy in the crowd seen in one of the
photographs – a specific image to go with his recollection. But is this boy in the photograph
in fact Cozarinsky? We have no way of knowing, yet the fact that Cozarisnky immediately goes
on to say, “Nevertheless, the child I was would grow up in a country seduced by some quite
cheap illusions,” alerts us to the possibility that we have just been seduced by a cheap
illusion ourselves.
A little later on, after the film’s focus has shifted from Falconetti to Robert Le Vigan – another
French actor who spent his last years in Argentina, in his case escaping from the scorn and
other repercussions of having been a Nazi collaborator – Cozarisnky plays an even more
elaborate trick with his documentary materials. In the course of interviewing the writer
Nestor Tirri, a casual neighbor of Le Vigan in Tandil who is recalling his fleeting impression
of the man, the film suddenly cuts to footage of Le Vigan walking through the woods in the
same town, seen from behind. Then we see Cozarinsky himself in front of the house in
Tandil where Le Vigan lived for over fifteen years, interviewing two of his former neighbors
about their own recollections. In the midst of their replies, he cuts to footage of Le Vigan at
the same location, saying goodbye to his wife before taking a short stroll, and the voices of
Cozarisnky and the neighbors are allowed to run over part of this footage. Still later, the film
includes an actual interview with Le Vigan in Tandil and then shows Cozarinsky visiting the
gravesite of both Le Vigan and his wife.
From one point of view, this coexistence of “past” and “present” tenses in the same locations
is a standard documentary device. But to confess to a certain naïvité on my own part, my
initial assumption in viewing this film was that Cozarisnky had employed an actor to play Le
76
Vigan; it was only after I asked him about this that I discovered he had drawn on an earlier
television interview with Le Vigan that had never been shown.
Part of the significance of my error is simply the propensity of viewers to produce their own
images to correspond to events that are being recounted in films, regardless of whether the
films in question are documentary or fiction. Yet the passivity of the usual film-viewing
experience is such that if the film itself furnishes an image to “replace” the imagined one, the
viewer is likely to accept that replacement without protest, either symbolically or literally.
This is well illustrated by Cozarisnky’s interview with two former French students of Le
Vigan, both of them women, which is held in a former Tandil movie theater that is now a
discothèque. Cozarisnky informs us at the beginning of the interview that another former
student of Le Vigan, the writer Jorge DiPaola, “would be joining us,” and the point at which
he appears in the balcony, when one of the women below is describing to Cozarinsky Le
Vigan’s plans to build a chicken coop, there is a brief moment or two when DiPaola becomes
the figurative “stand-in,” or double, for Le Vigan himself.
Considering the degree to which Falconetti and Le Vigan are both presented to us as “lost”
figures, historically speaking – formerly famous actors whose last years can only be dealt with
in fragmentary glimpses and impressions, mainly through the accounts of people who knew
them only slightly – it is we, in any case, who have to furnish most of the images, and the
most that a documentary filmmaker can do in this process is to guide us in this activity. Yet as
my initial example demonstrates, Cozarinsky as a young child in Plaza Francia on August 24,
1944 is every bit as inaccessible today, even to Cozarinsky himself. Acknowledging such a
mystery is, properly speaking, the point at which his enterprise begins – the moment of
calculated reticence when “cinema indirect” takes shape.
in Film Comment, September-October 1995
La guerre d’un seul homme
Edgardo Cozarinsky
Point de départ
Un film à partir de citations.
77
Un film où les images des “Actualités Françaises” des années 40-44 seraient confrontées à
deux paroles très différentes: le commentaire de ces mêmes actualités … et le Journal
d’Ernst Jünger
Idée de forme
Un film où la citation dirait toujours plus, un “plus” qui serait aussi “autre chose”. Sa matière
brute serait une image et une parole, peut-être même plusieurs paroles, toutes trouvées.
Le travail sur cette matière, par contre, serait très varié.
L’image trouvée
Ce serait les “Actualités Françaises” des années de l’occupation, Images naïves par rapport au
discours du film, images mensongères et roublardes, par rapport au rôle social qu’elles
étaient cernées jouer à leur origine. Et comme toute image, même celles des films dits de
fiction, documentaires: rendues documentaires par le temps, qui modifie le regard posé sur
elles.
La parole trouvée
Les Journaux de Paris et les Notes du Caucase de Jünger: parole écrite, intime, qui serait
dite par une voix cultivée, à l’accent allemand très léger : premier niveau d’élaboration.
Occasionnellement, les commentaires des actualités : tour à tour optimiste, grave, ému,
patriotique, vulgaire. Les mots et la voix d’origine: trouvés, documentaires.
Le travail sur cette image, avec cette parole
C’est au niveau du montage, dans une acception large du mot, qu’on peut commencer à
entrevoir le film.
Pour commencer, une livraison hebdomadaire des “Actualités Françaises”, à l’état brut: le
brassage des menus événements de la semaine parisienne (ouverture d’une exposition
canine, Zarah Leander visite la Capitale, nouveaux chapeaux), des faits d’armes, toujours
ailleurs (en Afrique, à l’Est, dans l’Atlantique Nord), des images d’une politique
internationale nouvelle (visites diplomatiques des envoyés de l’Espagne “libéré” et du Régent
de Hongrie à Berlin, indépendance de la Croatie, réouverture des églises en Ukraine et dans
les pays baltes).
78
Cette ouverture, ce serait quelques minutes où la bande-images et la bande-son seraient
“occupées” par les actualités de l’époque, telles que le public d’une salle de quartier aurait
pu les voir sur l’écran.
Pour continuer, du noir dans l’image, et d’une ambiance sonore indistincte, surgiraient
quelques images de ces mêmes actualités, isolées, peut-être même arrêtées, et une voix – qui
dorénavant sera, dans le film, la voix de Jünger – lira une note de son Journal. (Celle, peutêtre, où il parle des actualités, projetées avec les lumières de la salle allumées, qu’il voit dans
un cinéma voisin de la Place des Ternes.)
À partir de ce moment, le film irait à la rencontre du personnage et de sa guerre à lui. Aucun
parti pris d’”illustration” du texte dit par les images tirées des actualités : plutôt une série de
rencontres et de digressions entre la parole et l’image: un travail très libre qui pourrait
s’arrêter sur une image pour en dégager le gros plan d’un geste ou d’un regard, ou bien
pourrait établir la chronique d’une campagne en fouillant dans les rubriques qui se suivent,
d’une semaine à l’autre, dans les actualités (telle cette “guerre à l’Est” où Jünger devra faire
une incursion entre ses deux séjours à Paris, et dont témoignent ses Notes du Caucase).
Le dessein, toujours, sera celui de trouver une respiration entre parole et image ; entre cette
même image et le noir qui devrait occasionnellement la scander, entre son mouvement et ses
arrêts ; entre la parole, le silence et la musique, et entre les paroles: celle toute réflexive de
l’officier-poète, et celle, banale, du commentaire des actualités, qui de temps à autre
interromprait l’écrivain, comme le rappel d’une autre “parole publique” de l’époque.
La musique
De très brèves bouffées de musique: “juive, dégénérée” – Schoenberg – et “aryenne, pure” –
Pfitzner -, qui pourraient dépasser et images et paroles, mettre en conflit les éléments du
contexte culturel. On peut songer, par exemple, à la rencontre dans le film des dernières
notes hâtives de Jünger (après avoir acheté quelques vieux livres, fait les dernières visites,
oublié dans un tiroir des Iettres irremplaçables), de leur date (le 10 août 1944) et de la voix
d’Elisabeth Schwarzkopf qui s’impose à celle de Jünger pour l’effacer, en chantant l’une des
Quatre Dernières Chansons de Strauss, sur les images exultantes dès la Libération de Paris.
(Rappelons que Jünger publie ses notes d’après 45 comme “journaux d’occupation” .... ) .
Le personnage
Dégoûté par le récit des atrocités sur le front de l’Est, touché par les valeurs culturelles de
cette France qu’il visite encore une fois, Jünger paraît dans son Journal comme une figure
exceptionnelle et en même temps représentative de l’artiste ou l’intellectuel allemand qui,
pendant le troisième Reich, choisit “l’Exil intérieur”. Cet officier de l’armée allemande parle
79
dans son Journal en écrivain que l’analyse des sentiments et l’étude des mœurs intéressent.
Il consigne avec minutie les derniers mots des résistants exécutés, les rafles, les déportations,
les dénonciations. Il fait des réflexions d’ordre moral, voire philosophique, sur I’histoire, les
valeurs en jeu, les individus courageux ou indécis qu’il rencontre. Spectateur privilégié?
Pudeur extrême? Hypocrite flâneur? Ressent-il que le seul fait de survivre, en de telles
périodes de l’histoire, équivaut déjà à une “collaboration” avec les forces du Mal? En tout cas,
il n’ignore rien et il porte un regard impitoyable sur ses compatriotes, sur la société
parisienne de l’époque, sur la vie quotidienne… Après un déjeuner avec Paul Morand chez
Maxim’s, il se promène rue Royale et voit, avec malaise, “les premières étoiles jaunes à Paris”,
sur la poitrine de trois jeunes filles qui se promènent bras dessus-bras dessous… Aussi
troublant par ce qu’il consigne que par ce qu’il fait, Ernst Jünger nous rappelle
qu’aujourd’hui aussi peut-être nous ne vivons pas cette histoire qui nous ronge (l’Iran, le
Cambodge, I’Amérique Latine sont nos “ailleurs”, maintenant), que nous nous contentons
d’y réfléchir, de notre refuge cultivé d’européens. Et il n’y a pas de refuge plus trompeur que
la culture.
in Cinematographe n.º 54, Janvier 1980
Entretien avec Edgardo Cozarinsky
Pascal Bonitzer
Ton film se présente comme un montage de documents sur l’occupation. En fait, on
s’aperçoit vite qu’il y a des partis pris très différents et même inverses de ceux qui sont
habituels dans ce genre cinématographique.
Je n’ai senti à aucun moment que j’étais en train de faire un documentaire, même si je
prenais comme point de départ des documents dans le sens le plus large (non seulement des
images mais aussi des enregistrements de musique et des textes, que ce soit le commentaire
des actualités ou le journal parisien de Jünger). Dans la plupart des films qu’on appelle
documentaires, on trouve un pré-supposé qui m’est profondément étranger, même
antipathique : qu’on saisit la vérité par le document, ou que si l’on braque la caméra devant
quelqu’un et on le fait parler, l’image et le son ne peuvent pas mentir. Moi, j’ai toujours eu le
sentiment inverse. Ce n’est pas dans le documentaire ou dans l’idéologie du cinéma-vérité
que j’ai trouvé une vérité. Je l’ai trouvée dans la fiction, dans la convention, dans ce qui me
parle de l’imaginaire: Goldiggers 1933 m’en dit plus long sur le New Deal de Roosevelt que
80
les documentaires de l’époque. Pour en revenir à La Guerre d’un seul homme, je voulais
mettre en conversation certains éléments visuels et sonores. Plutôt que d’illustrer une vérité
définie à l’avance, je voulais étudier le jeu des mensonges (parce que je savais qu’il y aurait
des mensonges !), reproduire à échelle réduite les contradictions et aveuglements d’une
époque sans jamais emprunter la vois de l’Histoire ; plutôt, retrouver la difficulté de voir clair
dans laquelle on vit à n’importe quelle période. Dans cette optique, c’est l’aspect fortement
codé des actualités qui m’attirait : elles trahissent de par la censure même, tout ce qui était
refoulé. En même temps, en composant ce modèle à échelle réduite avec quarante ans de
recul, on connaît l’issue historique des situations qu’on examine. C’est comme ça qu’est né
le sentiment d’être en train de faire un film sur le présent, en retrouvant des lignes de force,
derrière l’image qui est restée de cette période-là, les problèmes, les problèmes et les
hantises du présent, surtout cette obstination presque biologique à survivre à tout prix à
n’importe quelle défaite.
Ce qui est frappant d’abord, c’est l’absence de commentaire, ou alors le fait que chaque
élément du film, images d’archives, éléments musicaux, voix, textes, fonctionnent comme
les commentaires les uns des autres. C’est-à-dire que le document est en même temps le
commentaire et le commentaire est le document. Il n’y a pas de point de vue surplombant
qui ferait les comptes. C’est ça qui a dicté la forme musicale du film, sa mise en
mouvements musicaux ?
Ce n’était pas un a priori, ça s’est imposé au fur et à mesure qu’on avançait dans le montage.
Je me suis aperçu qu’il prenait forme très nettement en quatre sections et que ces chapitres
étaient moins narratifs que musicaux. C’est ce qui nous a sauvé à un moment où le montage
semblait déraper vers un film de 5 heures ! L’organisation en quatre mouvements nous a
permis d’avoir un principe formel par rapport auquel réduire, resserrer, mettre en rapport
les éléments.
Ces quatre mouvements correspondent aussi aux quatre périodes de la vie de Jünger en
tant qu’occupant. Dans un premier temps, quand il est plutôt en position de voyeur. Dans
un deuxième temps, quand il voit les premières étoiles jaunes, il commence à se sentir
regardé lui-même, gêné d’être en uniforme… On a deux points de vue fondamentaux qui
s’expriment : celui de cet Allemand atypique, et celui de la collaboration qui est aussi le
point de vue du gratin (la mode, etc.) …
Pas exclusivement. Il y a aussi: soupes populaires, chômage, travailleurs qui cherchent des
salaires plus élevés en Allemagne, beaucoup d’indices d’une situation sociale difficile. C’est
précisément ce mélange qui m’a intéressé. Ne pas dire a priori, avec les réflexes
sentimentaux traditionnels de gauche, que c’est le côté chômage, etc., qui est plus vrai que
81
l’autre. Ce sont les rapports, le croisement de ces lignes différentes qui m’ont intéressé.
D’ailleurs, c’est frappant de retrouver dans ces actualités faites sous contrôle allemand
certains aspects de la vie parisienne où notre regard ne peut que lire autre chose, comme ces
chapeaux en fibrane, “triomphe de la collaboration entre les chimistes de l’IG Farben et les
couturiers parisiens” …
La musique aussi impose un regard inattendu sur ce qu’on connaît. Je crois que c’est la
première fois qu’on montre des images des liesses de la Libération sur une musique
totalement mélancolique.
La quatrième des Quatre Dernières Chansons de Strauss a été composée la première, en
1948. Même si Strauss n’a pas été, comme on le dit souvent à tort un musicien officiel du
Troisième Reich (il connut bien des ennuis car son ancien librettiste, Stefan Zweig, était juif),
cette musique d’après-guerre me semble exprimer quelque chose de l’éclipse d’une culture,
d’une tradition pas seulement viennoise. Avec les paroles d’un poème d’Eichendorff qui
s’appelle précisément “Dans le rouge du couchant”, il m’a semblé qu’elle exprimait quelque
chose d’une défaite non seulement militaire ou politique mais la défaite d’une conception du
monde, d’un idéal culturel compromis par sa complicité avec des idéaux politiques et
militaires. Ce qui est frappant dans le cas de Jünger c’est qu’il est conscient de tout ce qui se
passe et que cette conscience ne questionne pas son appartenance à ce qu’il ressent comme
une chevalerie, sorte de cinquième colonne à l’intérieur de l’armée. Ne croyant ni à la
démocratie ni au communisme, comme beaucoup y croyaient à l’époque, il se sent soumis à
un code d’honneur que la plupart de ses compagnons d’armes ignorent. C’est tout. En
parlant de ses retrouvailles heureuses avec Paris, au début, il dit avec une innocence très
troublante : “Peut-être ferais-je bien de profiter de cette occasion pour prendre pied ici, elle
me fut offerte sans que j’y fusse pour rien” : comme s’il n’était pas un officier d’une armée
d’occupation. Peut-être qu’à seulement vingt ans de la fin de la Grande Guerre, une certaine
mystique des armes n’était pas encore ternie, que ce sont les guerres coloniales récentes qui
ont fait la vraie cassure …
Le titre du film de ce point de vue-là est ironique : La Guerre d’un seul homme.
Pour moi le titre dit : voilà la guerre telle qu’un homme l’a vécue. Etant écrivain, cet homme
a laissé son témoignage. Mais si on pouvait avoir les témoignages d’autres gens, des
inconnus, on aurait d’autres guerres. C’est un peu dans cet esprit que je fais basculer le film
de la subjectivité la plus outrée, celle de Jünger, aux masses de travailleurs, légionnaires,
prisonniers, tous sans voix. Même les collaborateurs qui prennent la parole (Alphonse de
Chateaubriand ou Mayol de Luppé) sont là pour rendre sensible la meute dont ils émergent
un instant.
82
Il y a aussi les arrêts sur l’image.
Six ou sept fois au cours du film, j’ai arrêté l’image sur des visages dont l’expression me
captivait. Je me disais : voilà des gens qui passaient par là, ils ont été peut-être indifférents,
complices, victimes, en tout cas des témoins sans nom que je ne connaîtrai jamais.
Souvent ce sont de gens qui photographient.
Au début et à la fin. Au début, c’est un officier allemand sur les Champs-Elysées pendant le
défilé de 1940, qui regarde ailleurs (vers quoi ?) et prend une photo de cette autre chose qui
a attiré son attention.
Dans un premier temps j’ai cru que tu arrêtais l’image parce que c’était Jünger.
Même si un document sur Jünger avait existé je ne l’aurais pas inclus pour qu’il reste une
présence purement sonore, une voix qui chuchote à l’oreille du spectateur. A ce premier
plan du film, dont tu parles, répond à la fin un gendarme qui prend une photo ; par le
montage, j’ai fait que la photo qu’il prend soit celle de deux petits enfants assis au bord de la
rue, et par un jeu d’arrêts successifs, on a relié ces enfants au tout dernier plan, celui d’une
femme blonde qui a elle aussi un appareil-photo à la main … Tu sais, pendant le montage,
on s’est rendu compte avec la monteuse que souvent on s’arrêtait pour regarder l’expression
d’un personnage dont on ignorait tout. Je me suis dit que cette curiosité, ce plaisir, je devais
le partager. On a commencé à faire des marques ; au bout du montage, on en avait presque
cinquante ! On a fait un choix et je dirais, même si ça sonne un peu littéraire, que ce qui
m’attirait dans ces visages était le fait que jamais je ne pourrais pénétrer dans leur tête ni
savoir ce qu’ils pensaient à ce moment-là, et qu’en même temps je voulais arracher cette
expression fugitive à l’oubli, à l’anéantissement. Tout a commencé par deux visages qui
m’ont frappé par leur beauté : celui de la jeune fille qui demande une cigarette au milieu de
la soupe populaire à Montmartre, dans le premier mouvement, et dans le troisième ce
prisonnier russe qui, quand on le filme, lève les yeux vers le ciel. D’abord j’ai cru qu’il en
avait marre, puis j’ai pensé que tout simplement il regardait s’il allait pleuvoir, maintenant je
le regarde pour le regarder, sans essayer de percer son mystère.
Dans ces moments du film, il y a quelque chose dont Barthes parle dans “La chambre
claire”, ce qu’il appelle le punctum.
Ces arrêts sont devenus pour moi quelque chose de presque érotique. Je voulais que ces
personnages imaginés à partir des visages rencontrés au hasard restent encore un peu avec
83
moi, d’une manière amoureuse pour ces deux-là ; dans d’autres cas pour des raisons
intellectuelles, comme dans le cas des photographes.
Je crois que c’est à propos de la photo d’un condamné à mort que Barthes dit qu’il a ce
sentiment de tragique plus ou moins infusé d’érotisme, et c’est un sentiment qu’on a
constamment dans ton film. La mort frappait partout et on sent que la plupart des acteurs
du film sont condamnés à mort et sont morts
J’ai eu le même sentiment au cours du montage, que c’était en tout cas un film sur les
vaincus.
D’où le titre qui signifie aussi la guerre de tous en tant qu’individus …
En tant qu’ils sont seuls, et qu’ils seront vaincus même si leur cause triomphe, car même si
ce sont eux qui gagnent la guerre jamais ils n’auront le pouvoir. Ces prisonniers russes, ces
officiers allemands, n’étaient peut-être pas plus vaincus que cette foule joyeuse qui célèbre la
Libération à la fin : c’est pourquoi je n’ai voulu montrer aucune personnalité officielle, je n’ai
gardé du défilé que quelques soldats américains parce qu’ils me semblaient naïfs dans leur
attitude et parce que j’aimais les plans de femmes qui montent sur des chars armés. La fête y
paraît dans toute sa fragilité.
Tu as choisi de ne prendre aucune figure représentative. Et Jünger est absent de l’image.
Ce qui m’intéresse en lui c’est le regard en biais, l’individu qu’on peut trouver inacceptable
mais qui dérange toujours par la vérité qui passe dans son observation : un peu comme dans
la vie quotidienne, quand des propos qui nous semblent justes sont tenus par des gens qui
nous dégoûtent, ou qu’on ne peut pas être d’accord avec ceux qu’on estime.
Dans Jünger ce qui t’a intéressé, c’est le monologue intérieur d’un écrivain.
Ce qui me frappe le plus c’est la précision avec laquelle il décrit et analyse tout en n’ayant
aucune illusion sur la possibilité de changer les évènements. C’est quelque chose de très dur,
pour nous qui sommes devenus adultes dans le mirage flatteur qu’il n’y a pas de
compréhension intellectuelle des faits qui ne dérive dans une praxis devant à son tour
modifier la réalité matérielle, et donc le cours de l’Histoire … Pourtant l’Histoire elle-même
s’est chargée de nous détromper, montrant jusqu’à quel point on peut comprendre sans
pouvoir modifier, ou modifier pour aboutir à des résultats insupportables.
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Ce regard est troublant parce qu’on se dit, si ce détachement était possible alors, pourquoi
ne serait-il possible maintenant ?
Si je revendique quelque chose pour le film, qui prend pour matériel une époque éloignée
de quarante ans, c’est d’être fait avec un regard qui correspond à l’après-Cambodge. Il existe
une sensibilité de l’après-guerre du Vietnam, la nôtre, nous qui avons assisté insouciants à
l’installation, grâce aux efforts conjugués de Kissinger et de la Chine, du régime des Kmers
rouges, régime de marxistes éclairés, éduqués à Paris, qui a débouché sur le génocide le plus
rapide et systématique du siècle. On a eu droit à ce moment-là à une mise en scène des
stratégies du pouvoir qui va au-delà de ce qu’on aurait pu penser possible au niveau de toute
Realpolotik et de la manipulation des idéologies. Et on l’a vécu protégés, car la guerre se
passe toujours ailleurs pour les intellectuels, même quand ça se passe chez eux.
L’un des sujets principaux du film c’est le rôle de l’écrivain dans l’Histoire. Ce n’est pas
quelqu’un qui semble avoir hurlé avec les loups, Jünger ; c’est au contraire quelqu’un qui a
essayé de garder la tête froide.
Ce code chevaleresque n’est pas plus absurde que d’autres fictions par lesquelles les
intellectuels se sont trouvé un rôle dans l’Histoire. Malraux en Chine dans les années 30,
Débray en Bolivie dans les années 60, ils n’ont cherché qu’à revêtir le mythe de Rimbaud.
Après tout, qu’est-ce que le tiers-mondisme sinon le dernier avatar de l’impérialisme : on
exporte des armes, ou la technologie, ou le rôle de sauvage noble qui doit réaliser la
révolution, le plus loin possible de l’Europe. Tu te souviens d’Eluard ? Dans “Poésie
ininterrompue”, vers 1950, je crois, il écrivait “Aujourd’hui je voudrais être en URSS ou nulle
part ailleurs”. Quelle coquetterie ! Il pouvait s’y rendre en visiteur, avec passeport, cet objet
de luxe dans le monde communiste … Quand il acceptait l’exécution à Prague de son
copain, le poète surréaliste Zavis Kalandra, sa complicité me choque autant que celle de
Jünger. Ayant subi “ne pas désespérer Billancourt”, je ne m’attendais pas à lui trouver une
réplique chez un officier de l’armée du Reich. Et pourtant le reflet y est, sauf qu’à l’époque,
on payait des prix plus élevés pour adhérer aux états-bourreaux : pense au suicide de Drieu
… Qui oserait espérer une délicatesse semblable de la part des rédacteurs de Tel Quel, qui
prônaient la révolution culturelle dans le sixième arrondissement ? Ils sont là encore, se
cherchant toujours des avant-gardes, cette métaphore où déjà Baudelaire décelait l’origine
militaire …
D’une certaine façon, le film continue la problématique des Apprentis-sorciers sur les
rapports de victimisation des intellectuels par rapport au fascisme ou à toute répression
politique.
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C’est possible. Dans La Guerre d’un seul homme je pars du document pour aller dans le sens
de la fiction ; dans Les Apprentis-sorciers tout comme dans Points de suspension la fiction
était interrompue par des développements qui devraient apporter une réflexion sur elle, la
fiction glissait tout le temps vers l’essai. Dans tous les cas, il y a contamination. C’est vari que
l’idée de pureté, esthétique autant que raciale, m’a toujours été antipathique.
L’indécidabilité du document est une notion à laquelle tu tiens depuis ton premier film
argentin…
Il y a une dizaine d’années, je tenais le document en horreur. C’était l’époque des
spéculateurs culturels du tiers-mondisme, qui vendaient leurs produits à une critique
européenne ébranlée par 68. En Argentine, ils faisaient en même temps de la propagande
pour le retour de Peron et de la publicité pour Walter Thompson ou McCann-Erikson, avec
les mêmes boursouflures rhétoriques et les mêmes capitaux. Plus tard, en réalisant mes
propres films, ça m’a intéressé de contaminer la fiction par le document, pour leur faire
rendre par l’affrontement un plus qui serait aussi autre chose …
L’absence de commentaire de ta part n’exclut pas un regard, un choix très orienté.
Etant argentin, juif, né en 1939, j’ai vécu la deuxième guerre mondiale d’une façon plutôt
inconsciente … Je me souviens pourtant de la libération de Paris, telle que je l’ai vécue à
Buenos Aires. Mon père est rentré à la maison plus tôt que prévu, en disant “c’est la fin du
nazisme, on peut respirer, maintenant c’est une question de mois, de semaines” ; on m’a
emmené sur une place où il y avait un monument dédié à la France républicaine, il y avait
des gens qui chantaient dans une langue que je ne connaissais pas et des bouquets bleublanc-rouge. Ils avaient tous l’air très heureux. Sur le chemin de retour, mon père chuchota à
ma mère, assise à côté de lui dans la voiture “Si les nazis avaient gagné la guerre, je me serais
suicidé après t’avoir tuée, toi et l’enfant”. Comme toujours, quand on entend ses parents
parler à voix basse pour qu’on ne les entende pas, j’ai saisi là quelque chose d’important.
La question de la position du peuple français que l’on trouve posée dans la plupart des
films sur cette période ne l’est pas dans ton film, peut-être parce que ton point de vue est
celui d’un exilé.
Ou celui d’un survivant, ne fut-ce que parce qu’un jour j’ai décidé de survivre … Dans la
France occupée j’ai reconnu pas mal de choses de l’Argentine, tel qu e je l’ai connue sous de
différents régimes militaires.
86
Ça contribue à ce que ton film soit vu comme un film sur aujourd’hui.
Cette sensibilité dont on a parlé, celle de “l’après Cambodge”, je la sens partout dans la vie
mais je la reconnais rarement dans le cinéma qui se fait aujourd’hui. Dans La troisième
génération de Fassbinder, oui. Dans Le Faussaire de Schlöndorff, non, même si le parallèle
entre le Liban divisé et l’Allemagne partagée touche à quelque chose d’essentiel : le fait que
de nos jours toutes les guerres sont des guerres civiles ; mais je ne peux plus marcher quand
on trouve les Palestiniens plus sympathiques que les Chrétiens “parce qu’ils sont plus
pauvres”. C’est comme lorsque L’Ombre rouge découvre les méfaits du stalinisme, six ans
après les confections italiennes écrites pour Giean Maria Volonte …
Pour finir. Quelques précisions sur l’élaboration. Comment as-tu choisi le matériel ?
En suivant mon instinct, en gardant tout ce qui me frappait. J’ai vu plusieurs heures de
documents par jour, cinq jours par semaine pendant deux mois aux archives de l’INA. Je
reconnais bien les Journaux de Jünger mais, ayant refusé le principe de l’illustration, je n’ai
pas voulu en faire un canevas ; je n’avais fait qu’une maquette du film, celle que l’INA avait
feuilleté, une quarantaine de pages. C’est sur cette maquette-là d’ailleurs que des gens aussi
différents que Eckart Stein à Mayence, et le producteurs Jean-Marc Henchoz et Alain Dahan
ont décidé de me soutenir, et ont tenu pendant les années de négociations avec l’Institut,
jusqu’à ce que Manette Bertin trouve un biais pour réussir la coproduction. Aux archives, les
titres des sujets ne voulaient rien dire, donc j’ai tenu à tout voir. J’ai fait tirer plus de matériel
qu’il ne fallait : une vingtaine d’heures. Le premier montage faisait autour de 2 heures 20’ ;
finalement on est arrivé à 1 heure 45’.
Et pour la composition de la bande-son ?
Je savais que je voulais les voix criardes, arrogantes ou sentimentales des actualités, en
alternance avec la voix de Niels Arestrup lisant Jünger : j’aime le débit de Niels, à qui j’avais
demandé de jouer Danton dans les extraits de “La mort de Danton” de Büchner insérés dans
Les Apprentis-sorciers. Sa voix a été enregistrée très près du micro, avec beaucoup de
“présence” ; ces petits bruits et respirations qu’en général on enlève de la bande son. C’est
une voix intime, “de chambre”, qui parle à l’oreille du spectateur. Avec lui on a enregistré
quelques trois heures de texte dont sont restées à peu près quarante minutes. Quant à la
musique, je savais dès le début que je voulais la chanson de Strauss pour la fin. Et aussi que
je voulais Pfitzner, mais là le choix a été plus difficile : c’est sa musique qu’on entend
pendant les trois premiers mouvements du film ; ce n’est que dans le quatrième
qu’interviennent les “non aryëns” : Schönberg avec un fragment de sa “Musique
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d’accompagnement pour une scène de film” et Schreker avec son lied “L’obscurité descend
pesante comme le plomb”.
Il y a un film auquel il serait intéressant de confronter le tien, celui des Staub sur cette
même musique de Schönberg, Einleitung … etc.
Je n’ai jamais pu le voir.
Justement il est fait sur un principe parfaitement inverse du tien. On a la confrontation des
textes, à l’époque du fascisme, des lettres entre Kandinsky et Schönberg. Kandinsky aurait
fait montre de sentiments antisémites et Schönberg lui répond. C’est une chose à laquelle tu
t’es refusé, parce que finalement ton point de vue n’est pas, au sens classique, dialectique.
Penses-tu qu’un cinéma qui se veut résolument faux, arbitraire, artificiel, a plus de chances
d’atteindre la réalité aujourd’hui qu’un cinéma qui se voudrait plus près du réel ?
Je me dirais que oui, et en même temps je me demande si ce n’est pas encore une trace de
l’impact du cinéma des années 60 … Les films auxquels je tiens le plus ce sont des films
“classiques” : Griffith, Lubitsch, Lang. Mais j’ai toujours porté sur eux un regard imprégné de
cette volontaire suspension de l’incrédulité (willing suspension of disbelief) dont parle
Coleridge. Le spectateur des films classiques ne croyait jamais à la vérité de ce qu’il voyait, il
acceptait une convention, dans un jeu beaucoup plus nuancé que ce qu’on voudrait nous
faire croire lorsqu’on revendique aujourd’hui un retour à la “transparence”. C’est là
l’évangile même de la roublardise. Le spectateur du cinéma classique était très conscient des
différentes conventions et degrés de fiction dans lesquels il choisissait de se laisser entraîner.
Il suffit de penser à la comédie musicale, où la convention est étalée sur la table. Est-ce que
tu penses que ce film que tu as fait, La Guerre d’un seul homme, qui est une œuvre unique
dans son genre, ne saurait se prolonger dans ton travail ?
En marge de ce film, avant et après, j’ai fait quatre courts courts-métrages, des miniatures, à
partir d’objets cinématographiques trouvés : L’album des cartes-postales volées. Trois
d’entre eux sont comme satellites détachés de La Guerre… : Les cartes-postales d’un
cinéphile pendant l’Occupation, Deux cartes-postales de la Manche 1940 et Trois cartespostales du Troisième Reich. L’autre s’appelle Trois cartes-postales de Saigon 1975 et c’est
une sorte de post-scriptum imaginaire à la guerre du Vietnam. Dans toutes les quatre, des
textes de fiction (des messages écrits sur les cartes-postales) font éclater le document brut,
lui font livrer autre chose. Donc, en ce moment, je n’ai aucune envie d’insister … Mais deux
projets sont très carrément des films de fiction, et romanesques et romantiques ! Pourtant un
jour je voudrais revenir à une forme non identique mais proche de celle de La Guerre …
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pour aborder un sujet qui me passionne ; le retour de Bernanos en France, le lendemain de
la Libération, invité par De Gaulle. Rentrant de son exil au Brésil, Bernanos devient un cassepieds insupportable pour De Gaulle, dénonce l’épuration, tout cela d’un point de vue
irréprochable ; c’est en même temps une situation de comédie et un rappel gênant, car les
pamphlets écrits par Bernanos à cette époque là sonnent plus juste aujourd’hui que la
plupart des choses qu’on écrit sur le destin de l’Europe depuis qu’on a ressuscité la guerre
froide.
Que ce soit Bernanos ou Jünger, le défroqué de Points de suspension ou les militants
rêveurs des Apprentis-sorciers, ce qui t’intéresse finalement c’est toujours la position d’un
homme en porte-à-faux …
Peut-être, m’étant senti moi-même trop souvent en porte-à-faux dans mon expérience de
l’Histoire …
in Cahiers du Cinéma n.º 333, Mars 1982
Discourse and History. One man’s war: An Interview with Edgardo
Cozarinsky
Thomas Elsaesser
You made One man’s war in France at a time when there had already been an extensive
public discussion about the French and their collective memory of the Second World War
and German occupation, The sorrow and the pity, Lacombe Lucien and The last metro
among others had very much fixed the critical debate around the question of collaboration
and resistance. Your film deliberately displaces these terms, and one could imagine an
equally important debate around the use you make of documentary material – in your
case, newsreels of the period – and the choice of a German writer, Ernst Jünger, as intimate
witness. Does the question of Jünger’s complicity, his attitude to the historical events he
observed, engage you more than "the truth" about the French?
Whether the majority of the French collaborated or resisted is a question of statistics and a
neuralgic point in the national conscience. What mattered to me was the question of Jünger
the writer, and the quality of his look at history. He approaches current history with a precise
surgical hand, almost as if the events he is describing are part of natural history. He works
89
hard at having a perspective. He puts himself at a distance from what he is experiencing as if
he were a visitor from another planet. […]
Once again, a writer’s attempt to make literature a reference point outside politics and
history?
It represents what I believe to be the capacity of most intellectuals – to be cool, to look at
things from a distance. Being aware of it, and often having a bad conscience about it, they
have shown themselves, in the last half century, overzealous to "commit" themselves, to take
a stand, to do anything that might cancel that distance. To the point of wanting to be the
stars of History, not its chroniclers. And that distance, when repressed, only comes back the
more strongly, in the midst of political engagement. For instance, hundreds of European
writers signed the protest for Regis Debray when he was imprisoned in Bolivia, and he knew
they were signing for him, not for the hundreds of other people imprisoned in the same jail.
The case of Jünger is extreme – a Reich officer in occupied Paris allowed himself to write
from the point of view of an intellectual analyzing extraordinary moral, social, and historical
upheavals in contemporary society as if he was not a part of it.
Are you saying that the exceptional circumstances of Jünger finding himself in Paris, and
the disavowal of this exceptionality in his journals, manifest a general predicament of the
intellectual in the face of politics?
I feel it to be exemplary because it is so extreme. It casts light on our own experience, and I
personally feel it as an Argentinean. When I lived in Argentina under successive but similar
military regimes, there was always this understanding in intellectual circles that everybody
was against the Regime. At the same time being almost a question of manners, this agreement
represented an extraordinary level of passive collaboration – it meant that you did nothing
about the situation. And yet, literature seems to thrive under such circumstances...
If Jünger’s look as a writer was that of an alien from another planet, of someone who
perceived events and upheavals as part almost of natural history, does this hard, mineral
quality of his commentary not stand in a very deliberate, not to say cruel opposition to the
sometimes frivolous, frothy material you have chosen from the newsreels, at least in the
first "movement" of the film?
When I first started on the project I had an "experimental" attitude to the work. I had the
newsreels on the one hand and the Jünger journals on the other and I wanted to see what
happened when they came together. Most of my preoccupations were formal (if I had no
interest in form I would be doing TV reportage or magazine articles instead of films). I did
90
not know exactly what the end result would be but I knew it would reveal something, I
trusted my instinct in choosing as well as in editing: I watched the material in the archives in
November and December 1980, I began editing in May 1981 for twelve weeks. After a
moment of despair when I thought it would be a five-hour film, I felt the material asked to be
grouped in four different units, the four movements of the film. I became very involved in
the material during this time and I connected the emotional agitation I felt with my distrust
of documentary and the ideology of cinéma vérité or direct cinema (I am only interested in
"cinéma indirect," if it exists). The material was very much connected with my personal
background in Argentina as well as my approach to the cinema.
One might say that the intellectual Right during this century has been preoccupied with the
"disappearance of history," whereas the Left, sensing that history was very much in the
making, has been obsessed with causes and effects, with instrumentality. Is your film
concerned with what has happened to our concept of history during the last fifty years?
I began to feel that the film was as much about today as about the past. And not simply
because of the fact that I was watching the material for so many hours a day that it became a
part of reality – I didn’t see daylight at all! The first association I made was with the attitude
of French intellectuals on the left, that "turncoat" quality of French intellectual life which is a
kind of farce accepted by everybody. Nobody feels they have to justify it, changing sides and
changing factions just out of a feeling that they have to move with the times. Paris fashion,
which is an industry, is a model for all kinds of cultural activities, people wear certain ideas
which change as fashions change. Look at the shifts of position of magazines like Tel Quel,
the whole itinerary from promoting the Cultural Revolution, to supporting Soviet dissidents
is not based on political analysis or gruesome discoveries but derived from a deeply
ingrained intellectual frivolity. […]
You must have thought a lot about the "voice" of the camera, as it were, because there is
already heterogeneity, an area of friction between the voice-over commentary of the
newsreel and the point of view from which the material is shot, without even considering
Jünger’s voice or that of Pfitzner’s or Strauss’s music.
One of the reasons for my deep distrust of documentary vérité is that I’m never sure what it
is a document of. The newsreels were basically very truthful about what they captured; only,
they were truthful about things other than what they thought they were saying. Time, in a
sense, is the great flashlight because now you see through the lie and everything seems
obvious and apparent. There are moments when I repeat the same images but in a very
different context, an example is the arrival of Heydrich in Paris. Once it is there with the
original newsreel commentary, presented as the arrival of a German personality in Paris, on a
91
par with the arrival of Winifred Wagner or Franz Lehar. He is greeted in much the same way
that the others are greeted and he meets French personalities, like Darquier de Pellepoix
(who surfaced later in Spain), and Bousquet, the personalities of the collaboration. Then I
took some shots from the sequence containing the Heydrich arrival, intercut them with black
leader and put on them Jünger’s comments about the fauna to be seen at the German
Institute, individuals "he wouldn’t touch with a barge pole." Repeating the same shots with a
different editing and soundtrack shows them to be both continuous and discontinuous,
constructed.
Only once or twice do you show the face of a name which Jünger mentions. Voice and
image in general do not come together, or rather, a literary image and a photographic
image of the same referent persist side by side, each with its own connotations and
provoking subtle delays in the passage from perception to idea.
I knew since I first thought about the film that the soundtrack and the image should be
distinct, meeting occasionally at certain points but in general diverging, even where the
sound track carries the commentary of the original newsreel. I wanted to have the image and
soundtrack in counterpoint, each commenting on the other. What I was most afraid of, on
aesthetic grounds, was that the film would be systematic in the wrong sense, in that it would
become obvious to the viewer from the start how it worked, the rest following on the same
principle. I was very much afraid that the film would have a method which people could
pinpoint. Even if the counter-pointing of image and soundtrack could be considered a
method, it works in different ways. I was very careful when organizing the film into four
movements that you could never predict at the beginning of a section how it was going to
develop.
A lot of photographic images have been appropriated by our period as the Image of Paris in
the thirties and Paris under the Occupation. A certain "Paris" has been constructed a new,
history has been rewritten through these images. Were you conscious of not giving too many
iconographic references or points of recognition to your audiences?
The only such point of reference occurs very near the beginning. After the parade on the
Champs Elysées there is a series of shots of German street signs which follow a kind of
itinerary from the Place de la Concorde to the Opéra. I kept them as a travelogue of Paris in
1940. Instead of having the traditional kind of travelogue: "here we see these charming
natives" etc., instead of a voice-over stressing the difference of the "invader" from the French
population, you have one of those invaders telling how happy he is to be back in Paris. He
says that perhaps he should take this opportunity to settle down in Paris, since it has been
offered to him freely. He is speaking as a writer who had been a frequent visitor to the city,
92
who has friends there, favorite places, and doesn’t seem to see much difference in the fact
that now he is in the German army wearing a German uniform. […]
One man’s war is a film by an exile about an invader, both looking at Paris from an inner
distance. The newsreel material you have put together is light and ephemeral, and perhaps
because of Jünger’s relentlessly self-centered commentary, shot through with ironies at every
point. His was an analytical mind which nonetheless doesn’t necessarily believe that there
is "truth," which is why the question of perspective and the look – in its widest sense – is so
crucial. You emphasize this in your film, for instance, by several shots of people filming,
notably in the beginning, where we see a German officer – not Jünger, of course, but in
some sense his double, a Jünger alter ego – taking pictures with a camera. Does this not
suggest that despite the polyphonic organization of many voices and multiple perspectives,
the film privileges the individual voice, even if this is obviously not the voice of truth?
The individual voice, of course. Jünger’s – not necessarily. His journals were available and
the fact that his predicament (a writer and army officer, an accomplice of henchmen caring
for the victims) is exceptional made him richer, more upsetting and revealing as a
counterpoint. But the voices I would have liked to listen to are not those of such "stars,"
however engrossing their account, but those of the nameless "extras." I have frozen the
image on their faces (literally, faces in the crowd) to let us fantasize what roles they could
have played, what their "one-man’s-war" may have been like... […]
I see the frozen images in the film as "details," such as you may find illustrating an art book.
They try to stop the flow (the editing is quite fast throughout) and call attention to a gesture,
to an incident, but never as explanation, rather as unexpected windows opening on
something unknown. Most times I worked with them according to the music, and the music
was the great organising principle of the film, not only its choices but also whether it was left
under, or over, the Jünger voice or the newsreels voices, whether it runs freely for minutes
or is broken into tiny units. The music suggested also that a shot be frozen at the end (the
smiling girl asking a German for a cigarette) or at the beginning (the boy looking at the
camera is like a still photograph suddenly brought to life – he leaves with his pushcart a
bombed-out quartier); in another case, a freeze frame in the middle of a pan shot (the closeup of a Russian prisoner looking at the sky) was placed as to coincide with a certain musical
phrase.
I said to myself from the beginning that I wanted to rescue the faces of these people and
preserve them. Why? To keep them for myself, perhaps. I allowed myself to engage in some
kind of necrophilia by making them the object of my desire.
93
Do you think this is an obsession which has always been ill the cinema?
For me its best expression is to be found in "The Oval Portrait" the Poe story. In a sense that
is most extraordinary thing ever to be written about the cinema.
I did indeed feel this desire to possess – the frozen images. I started to fantasize about these
people and to wonder what their lives might be like. I knew this was pointless but I couldn’t
prevent myself, it was a kind of sorcery. I think it, too, reflects this Lang quality, cinema as a
"daimonic" art. It is something, which as I said, I relate very much to Poe. I saw a film not
long ago, a medium-length film made in France by the Vietnamese filmmaker Lam-Le,
entitled La rencontre des nuages et du dragon. It is a story about a man who embellishes the
photographs of dead people so that they may enter eternal life looking their very best. For
the occupation forces in Vietnam, the French in the 1950S and the Americans in the 1960s,
this practice is tantamount to falsification of documents and identity papers. He goes to jail.
The film tells the story of his revenge on the people who sent him to jail, using his magic
brush. It’s an extraordinary film, considering it was made in France on a very tight budget –
it was all shot in Paris, and the banlieue becomes Saigon in the 1960s. Everything is
believable in the sense that von Sternberg’s China and Spain (on the other end of the
production scale) are believable. The story is at once about an individual’s revenge and the
revenge of a repressed culture on the occupying forces. But it is also a story about the
cinema, the power of the image; the embellishing power, not just of an actor’s face but the
fact that the cinema creates out of that image an immortality. As in Poe, the cinema in general
changes the people who work on it and the image does destroy the owner in the end.
This even affects documentary.
Yes. As far as documentary is concerned, I always feel that fiction films are the best
documentaries of any period for they allow the imaginary to speak, which in the bad sense of
documentary is forbidden.
But, of course, in documentaries themselves, what really speaks is the imaginary.
The stock footage of any period is meant to be a recording of reality but it is completely open
to the imagination. For me there is a kind of displacement of roles, the fiction film becomes a
document and the would-be document opens itself to the imaginary.
Both the war years and the pre-war period have undergone an extraordinary revival in all
forms. Maybe because we also live in a world of public spectacle using roles, images, signs,
self-display, and in many ways the 1930’s and 1940’s were a self displaying, narcissistic
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period on a massive scale but more naively so; perhaps the spectacle of those years holds an
attraction because even aesthetically it anticipates our own, more guilty or more
provocative narcissism.
I decided to make this film on negative and not just on video, as the I.N.A. (Institut National
de l’ Audiovisuel) people wanted ... On the one hand I desired to see the images as they were
once seen on a film screen in 35 mm black and white, but also because those were pre-TV
days and audiences were less used to seeing images of daily life and current affairs, and so
the public image worked much stronger than today. People are now saturated with images,
and however uncritical, they are familiar with their operation, whereas in the 1930’s and
1940’s I think people would still say: "It’s true, I’ve seen it on the screen." Everybody is
aware now that images can be manipulated. Then images had a much stronger capacity to
impress people’s imagination. Also there was the fact that people had to leave home to go to
the cinema, whereas TV is in the house, the space of daily life. I think this made looking at
images akin to a religious experience – you went to the cinema like you went to church and
communicated with another world. I think this experience has been lost from watching films
on TV. People only go on special occasions or for particular films, whether it is the
intellectual cinema-goer or the Star Wars spectator, it’s no longer a weekly event, a ritual.
I would say that the religious dimension is much stronger today. When a large audience goes
to the cinema, it is always the end of the world they have come to watch. But perhaps there
is, after all, a secret complicity between this desire and a writer’s perspective, such as
Jünger’s. Borges recently quoted Mallarmé: "everything exists to take shape in a book," and
added: "an writer knows that whatever he does, lie docs for his writing.”
I cannot think of the relationship between, to put it at its bluntest, Art and Life, if not as a
vampiric one. The "committed" films about the Third World exploit the misery that gives
them a reason for being and in the end reassure their enlightened audiences in rich
countries; when I want to allow people to really see the face of a prisoner about to die, my
film feeds on his victimization. And I know that being aware of this is not enough. Jünger was
aware of it all and didn’t raise his little finger… So what? Stop caring? Stop writing and
making films? Again – I don’t know the answer, and those offered to me look banal or
obsolete. And I know I can’t stop caring, or writing, or making films. Or just putting
questions.
in Framework n.º 21, Summer 1983
95
BoulevardS du crépuscule – Journal de mixage
Edgardo Cozarinsky
“Par des maillons mi-familiaux mi-historiques, j’accroche donc ma mince aventure à la chaîne
générale des époques et me situe – rappelé à quelque modestie – dans le déroulement d’un
ensemble.”
Michel Leiris, “Il était une fois ...” Biffures.
Bry-sur-Marne, le 14 avril 1992.
Déjà je commence à oublier ce qu’il y avait avant la coupe par laquelle j’ai choisi de
commencer un plan (plutôt: de le garder au montage; mais maintenant, pour toujours, c’est
là qu’il commence), ce qui suivait après la coupe par laquelle j’ai choisi de le quitter. Sur le
grand écran, la copie de travail défile, floue en marche arrière, et quand le point revient, c’est
à l’équilibre des bandes-son que je fais attention, sans que je puisse préciser à quel moment
s’est évanouie la tentation, présente jusqu’à la fin du montage, de prolonger encore tel
regard, de commencer au milieu d’un geste tel plan qui pourtant avait connu d’autres essais,
quatre images en plus, huit en moins, avant d’arriver à sa longueur présente ...
L’illusion du définitif s’installe, pour l’image. C’est le son maintenant qui me propose
d’autres tentations de changement: faire disparaître une musique quelques secondes plus
loin derrière une voix, amener une ambiance cut et non graduellement, comme prévu.
Comme si j’éprouvais le besoin de sentir que le matériau n’est pas encore figé, qu’il répond à
mon toucher... (Qu’on ne s’est pas quittés? Qu’il ne me regarde pas d’en face, déjà
inabordable, comme ce sera au moment de la copie zéro?)
J’entends ma propre voix sur la bande-son et certaines phrases, que j’avais enregistrées
comme de simples liaisons, me semblent maintenant dire beaucoup plus que je ne leur avais
confié : “J’étais parti sur les traces de Falconetti et de Le Vigan ...” “Toute vie est faite de
l’entrecroisement d’autres vies”. Elles me gênent un peu, tant elles révèlent la méthode,
purement intuitive, avec laquelle j’ai travaillé.
Oui, c’est vrai, je savais depuis toujours que Falconetti était morte à Buenos Aires, mais c’est
vrai aussi que je devais découvrir son nom parmi les programmes des théâtres, sur les pages
jaunies, miteuses de ce journal argentin du 24 août 1944 criant de ses gros titres la joie
devant la libération de Paris. Et je savais aussi que Le Vigan, après avoir purgé ses émissions
sur Radio-Paris dans les prisons de l’épuration, après avoir été remis en liberté
conditionnelle et avoir traversé sans papiers les Pyrénées (comme tant de Juifs en 1940 !),
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était finalement arrivé en cette Argentine du premier péronisme, havre des personae non
gratae de l’après guerre.
Je savais, oui, mais je n’ai saisi, d’un coup, ce que le film devait être que le jour où, parlant
du projet à Claude Guisard, il m’a tout simplement fait remarquer que si je m’intéressais à la
“fuite à l’autre bout du monde” de mes deux personnages, c’était peut-être parce que j’avais
fait le trajet inverse, et que si le film devait être fait, ce ne serait qu’à condition que je parle
d’eux à la première personne, en m’inscrivant carrément dans le récit.
J’ai senti, ce jour-là, que quelque chose se libérait en moi. J’ai retrouvé dans la foulée cette
“fête de la Libération” à Plaza Francia où, agrippé à la main des parents dont je ne
comprenais pas la joie, le soulagement, je devais entendre chanter dans une langue que je ne
connaissais pas encore, avant d’apprendre que, “si le choses s’étaient passées autrement ",
c’est du côté des victimes que je me serais trouvé.
Peu à peu sont revenus aussi les croquemitaines d’une enfance protégée. Au-delà de la
souriante Mme Perón, auteur apocryphe de La Razón de mi vida (qui devait bénéficier d’un
come-back posthume, assuré autant par le goût du kitsch que par le simple opportunisme),
des silhouettes plus exotiques me sont revenues. Ce “savant fou” de docteur Richter, par
exemple, importé pour installer une base atomique dans une île des lacs du Sud. Ou la
séduisante Diana Toldy, dont je devais apprendre (par le journal clandestin du parti
socialiste, que mon père achetait sous le manteau) qu’elle avait été Zita S., la plus populaire
ingénue du cinéma hongrois avant 1944, accusée par certains d’avoir joué, hors l’écran, le
rôle d’indicatrice de la Gestapo. Ces années de mon enfance, où l’on parlait des sous-marins
émergeant la nuit sur les côtes de l’Atlantique Sud, avaient été bercées par une ignorance
tenace: le matin du 12 mai 1960, déjà jeune homme, je devais lire dans les journaux
qu’Adolph Eichmann venait d’être kidnappé tout près de chez moi. Qui parmi nous avait su
qu’il était là?
Tout cela semblait me mener bien loin de Falconetti et de Le Vigan. Mais, après tout,
qu’avaient-ils été pour moi sinon des bribes d’une adolescence cinéphile? Le coup d’envoi de
mon film avait été le choc d’apprendre qu’ils avaient été là, tout près de moi, bien vivants et
ignorés de moi pendant que j’apprenais à les reconnaître sur l’écran... Le cône de lumière
projetée rendait aux images fugitives une réalité transcendante (bien que jamais je n’aurais
osé l’appeler ainsi... ).
Dans cette basse vie “réelle”, qu’aucun écran ne rachetait, je ne pouvais que les ignorer. Les
objets de ma boulimie cinéphilique avaient été, d’une part, un visage énorme à la souffrance
démesurée, paré de tous les prestiges que le nom de Dreyer et les projections de minuit au
ciné-club pouvaient lui conférer; de l’autre, un personnage fuyant, crispé ou visqueux,
toujours plus captivant que les rôles sur lesquels il ne faisait que s’appuyer. Le regard rivé au
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loin n’avait que faire des simples supports humains, éclipsés, déchirés, de leurs personae
cinématographiques...
Peut-être parce qu’il cherchait aussi à s’aveugler sur une autre “basse réalité”, celle du vaste
pays où il était né? Et si aujourd’hui je cherche les traces de leur déchéance, n’est-ce pas
parce que mon regard cherche aussi à fouiller dans mon passé personnel tout ce que je
m’étais refusé à considérer auparavant?
Donc, ce n’était pas seulement ma “mince aventure” qui s’éclairait au passage de mon
enquête, mais un brassage de lieux et personnages appartenant à d’autres histoires, tout un
monde disparu bien que, parfois, trompeusement visible, dont les monuments abandonnés
pourraient être ces cinémas de quartier devenus salles de jeux-vidéo, supermarchés ou halles
de brocante, Pompéi et Herculanum de mon amour pour un cinéma qui n’existe plus.
Le 15 avril 1992.
Encore une phrase dans la bande-son qui se met à résonner : “Aujourd’hui, les seuls films
qui me font rêver sont les films à faire ...” Pourtant, je revois, toujours, Angel et Madame de...
et My Darling Clementine. Ne serait-ce pas l’horreur de l’audiovisuel et ses innombrables
métastases interdisant le rêve que je cherche à exorciser?
Je me rappelle avoir quitté une réunion de préparation pour un projet lorsqu’un employé
d’une chaîne censée le coproduire avait parlé d’ ”émission”. Et je suis certain qu’il ne s’agit
pas, de ma part, de velléités passéistes; plutôt, d’une idée du cinéma à laquelle on essaie de
rester fidèle, qui s’imposerait quel que soit le cadre de diffusion d’un film. Pour la
perception la plus superficielle, il s’agissait il y a encore peu de temps d’éclairages et de
mouvements de caméra: aux lumières égalisantes, policières, du feuilleton télé, aux
travellings rastaquouères, censés rendre évidents les production values, on opposait les
contre-jours que la télévision interdisait, ou les mouvements de caméra purement lyriques.
Mais les voilà, déjà incorporés dans la production télévisuelle “haut-de-gamme”, ne fût-ce
qu’en signes extérieurs de richesse.
Ce serait, plutôt, une question de dramaturgie et de narrativité, de temps et des temps, un
jeu entre transparence et opacité, entre ce qui se communique et ce qui se dérobe à
l’information, qui instaure un espace de réflexion, un temps du regard: les mêmes que
l’audiovisuel essaie frénétiquement de combler, fentes à colmater, dangereux interstices
permettant au cinéma – à l’instar d’une autre notion, théologique celle-ci – de souffler où il
veut.
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Le 16 avril 1992.
Peu de fois, je me suis laissé aller à tourner ce que j’avais envie de voir sur l’écran comme
dans BoulevardS du crépuscule, même sans être sûr de pouvoir le garder au montage,
parfois sans aucune idée précise de la place, si place il y aurait, pouvant lui revenir.
Tout comme au début du montage, je regarde avec un émoi de voyeur culturel, qui me fait
quand même un peu honte, ce couple faisant l’amour dans les derniers plans du film: si
basané, si typique des provinciaux essayant de se frayer un chemin dans cette orgueilleuse
Buenos Aires dont, moi, on m’avait fait cadeau, ces Argentins que la plus petite et plus
mesquine bourgeoisie citadine appelait des cabecitas negras, de petites têtes noires ... Ils
font l’amour sur une pelouse dégarnie, abîmée par le trafic incessant qui l’encercle, en bas
de l’affreux obélisque en ciment au plein centre de la ville, au milieu des néons qui
commencent à s’allumer et resteront jusqu’à l’aube à veiller sur leurs ébats toujours
renouvelés.
Du balcon de ma chambre d’hôtel, je les avais vus, le premier soir. Eux ou d’autres. Ma
réaction immédiate fut d’un optimisme aussi modeste que sincère: oui, quelque chose avait
changé; malgré la corruption et la misère, il n’y a pas de général au pouvoir faisant
poursuivre dans la rue les garçons aux cheveux longs tandis que sa femme fait interdire un
opéra... (Souvenirs archéologiques: ils datent de 1966, de mon premier séjour prolongé en
Europe, des années avant ma décision de quitter l’Argentine.) M’attendrissant devant cet
“outrage aux mœurs”, la banalité de ma satisfaction m’apparaissait évidente, et pourtant je
tenais à préserver sa fragile vérité.
Deux mois plus tard, à la fin du dernier jour de tournage, je les ai revus. Le lent soleil de
décembre – l’été de l’hémisphère Sud – frappait encore les étages supérieurs des tours face
au fleuve, mais ils étaient déjà là, attendant dans leurs caresses la nuit qui approchait. Ça a
été très vite ; j’ai glissé: “On les filme” à l’oreille de Javier Miquélez, chef opérateur; on est
monté dans ma chambre et du balcon on a filmé quelques minutes de leur tendresse. Plus
tard le même soir, après dîner, l’équipe me raccompagnait à l’hôtel quand Ignacio Musich,
assistant opérateur, les a découverts: “Ils sont toujours là ...” On les a encore filmés, d’un
autre parterre au milieu de la large avenue. Eux ou d’autres à leur place ...
Combien j’ai hésité à leur chercher une place dans le film et maintenant je ne peux penser à
une fin qui ne soit pas sur eux! Plutôt: sur mon regard posé sur eux, ou sur le souvenir
archéologique qu’ils éveillent. Je raconte un peu tout ça à Martine Bouquin et à Jean-Claude
Brisson pour mieux expliquer pourquoi je veux que ma dernière phrase sur la bande-son
(“J’étais parti à la recherche de Falconetti et de Le Vigan ...”) soit presque inaudible, noyée
dans la musique.
On l’essaie, à différents niveaux de parole et de musique. Tous mes doutes reviennent: une
structure basée sur la digression, sur des rencontres fortuites qui pourtant renvoient toutes
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au même mouvement d’origine, sera-t-elle perceptible? Peut-être que cette fin pourra la
rendre plus évidente...
Le 17 avril 1992.
Tout à coup le sentiment me gagne, d’avoir tourné des plans “objectifs”, où malgré la
subjectivité de mon regard sur les gens et les lieux, une certaine neutralité domine: comme
s’il s’agissait d’objets trouvés. Par contre, les plans d’actualités, et même (surtout?) les
citations de vieux mélos argentins me semblent atteints, dans ce contexte, d’une forte
subjectivité: celle de mon regard sur eux. Le brassage de matériaux d’origines très
différentes, encore plus que le passage constant du noir et blanc à la couleur, m’entraînent
dans un mouvement où je me découvre, finalement, spectateur de cette “mise-enconversation” (de filmages divers, de paroles à autrui et à moi) que j’ai moi-même agencée.
Pourtant, de temps à autre, c’est mon double qui apparaît là, sur l’écran, en train de
dialoguer avec d’autres ombres. Je le regarde, inscrit dans le cadrage: entre nous, il y a eu la
caméra et un bout de pellicule imprimé et développé, défilant maintenant devant mes yeux.
Aussi, déjà quelques mois. Il ne sait pas que je suis en train de le regarder. Moi, je sais que je
ne serai, que je ne suis pas déjà, le seul à le regarder. Après tout, si je me suis filmé, n’était-ce
pas un peu pour sortir sur l’arène, pour donner la face? “De la littérature considérée comme
une tauromachie” (Leiris).
in Trafic n.º4, Automne 1992
En busca del país perdido
Pablo Klappenbach
“‘Leer’ un país significa, ante todo, percibirlo según el cuerpo y la memoria, según la
memoria del cuerpo […] Por eso la infancia es el camino real por el que accedemos al
conocimiento más exacto de un país. En el fondo, no hay más país que el de la infancia.”
Roland Barthes, “Incidentes”
La figura del extranjero acapara la mirada de Cozarinsky en cada una de sus películas. Es la
visión de ese “otro”, observador silencioso de lo que ocurre, donde toda noción de
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pertenencia se desintegra. Porque el inmigrante infringe toda ley de identidad, aun cuando
sostenga su propia tradición o se rinda ante la nueva cultura: su posición no dejará nunca de
ser limítrofe, transcultural. La memoria opera sobre él, a veces de un modo tortuoso, a veces
como engaño que configura el sentido de la existencia. Lo que en ese “otro” que interpela al
nativo se gesta es la concreción de un vacío que todos intuimos. La nostalgia tanguera por el
regreso a esa tierra perdida basa su condición de existencia en la imposibilidad de retornar a
ese tiempo pasado, ahora mítico. Sólo al convertirlo en un pasado que se hace presente es
que puede recuperar, otra vez, su sentido. Esa articulación del tiempo es la que da lugar a
BulevareS del crepúsculo.
Cada película de Cozarinsky sólo puede ser pensada en relación con un contexto
conformado por el resto de su producción fílmica. Imágenes de sus películas se cruzan como
si saltaran de un film a otro, construyendo un tejido de relaciones, tal vez infinitas, con
seguridad múltiples. Se produce un diálogo entre sus realizaciones, retumban las voces de
un relato sobre otro y surge así el mundo de las reminiscencias, no sólo del pasado, sino
también del presente que la red de sus películas configura.
BulevareS del crepúsculo se erige como interrogante. Una voz over relata el regreso a un
país, la Argentina, que choca con lo que la voz pretende como regreso al “país de la infancia”.
Nos encontramos, por este camino, con una búsqueda de sentido que logre articular aquello
que el cuerpo recuerda con ese territorio “desconocido”. Se teje un recorrido, entonces, que
se esfuerza por hallar lo imposible: lugares que cambian de nombre y lo recuperan,
velocidades modificadas, ritmos distintos, cines que no existen o ya no funcionan. ¿Qué
buscar en un lugar cuyo nombre es idéntico al que se pretende, pero cuyo funcionamiento
difiere? ¿Dónde alcanzar un anclaje que lo devuelva al origen, ese país desaparecido? La
investigación, esa búsqueda de un conocimiento que obliga siempre al movimiento (de pista
en pista, de texto en texto), resulta el modelo perfecto que esta película encuentra y donde
Cozarinsky se pregunta, en última instancia, por si mismo.
La realización cinematográfica se erige, desde esta perspectiva, como un dispositivo donde
confluyen y confrontan distintas partes que hacen a un sujeto, como si fuera atravesado por
distintos ejes. Partes de la historia –mundial y nacional-, del relato social de esa historia, de
la psiquis del narrador, de la historia del cine, de la arquitectura, etcétera, componen ese
dispositivo materializado en el celuloide; así como en una estructura macroscópica existe un
“cine cozarinsky” – aquí como adjetivo – que se define como “red” o “tejido”, en el nivel de
la estructura miscroscópica de un solo film, la polifonía discursiva se hace presente.
BulevareS del crepúsculo nos llevará a través de una investigación de dos personajes, los
cuales llegan a este país a causa de la Segunda Guerra Mundial. Uno de esos personajes es la
Falconetti, eternizada en su interpretación de la Juana de Arco de Dreyer; el otro es Robert
Le Vigan, actor secundario de los años ‘30. El narrador, mientras intentaba recordar como
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fue la recepción en Buenos Aires de la liberación de París, se sorprende al encontrar que la
actriz había venido a vivir aquí, cansada del olvido en que la había sumido el cine sonoro. Le
Vigan, al mismo tiempo, llega a estas tierras luego de ser acusado de colaboracionista. Tanto
uno como otro devuelven una parte de la historia del cine a partir del relato minúsculo
(relatos, por otra parte, predilectos del director quien nos recuerda con este gesto aquellos
datos encontrados por Walter Benjamin sobre el París del siglo XIX), pero también sirven
como representaciones de la doble actitud con que se vivió la guerra en este país: unos a
favor del triunfo “ario”, otros, del lado de los aliados.
Como el mismo Cozarinsky afirma, “ninguna investigación es inocente”. No hay azar, por lo
tanto, en la búsqueda de información sobre estos personajes que llegaron a estos “pagos”
casi sin hacer ruido. Al abrir una interrogación sobre los dos actores que inmigraron se abre
también la pregunta por ese yo que narra, pero ¿desde dónde? BulevaresS del crepúsulo no
ofrece respuestas unívocas a la nueva situación de esa voz over, alter ego de Cozarinsky
(incluso se lo ve, en algunos momentos, realizando entrevistas). Por el contrario, todo hecho
se asume como indicio que define una relación activa entre presente y pasado. En
consecuencia, la pregunta por la propia voz – representación del cuerpo – y el lugar desde
el que se enuncia funciona como principio disparador para profundizar sobre dos mundos
hoy escindidos: el mundo público y el privado. La imagen de Cozarinsky niño mezclado en la
multitud que festejaba la liberación parisina (una suerte de Zelig porteño) impone al
presente el gesto de ese país de la infancia desde el cual, siguiendo el incidente barthesiano,
todo es leído. Atravesada la proyección ya no es tan importante aquella noción de origen,
sino más bien el modo en que ese pasado produce presente y, por lo tanto, sentido.
Imposible de entender en su totalidad, la pregunta por ese yo que nombra resulta prolífica a
la hora de producir cine, pero sobre todo, en el momento de reflexionar sobre el sujeto y su
relación con el tiempo y el espacio en los que se inscribe.
www.otrocampo.com
Work in progress
Sergio Wolf
Las pequeñas historias que crecen en los márgenes de la Gran Historia fueron menos el tema
que el tono que sobrevoló las películas – y los cuentos, y los ensayos, y las novelas- de
Edgardo Cozarinsky. Pero aún así, siempre había una dimensión novelesca, un flujo de vidas
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y destinos y pasiones y convicciones cruzados e interferidos. Su Work in progress de 2010 es,
en ese sentido, tanto una continuidad como la apertura de un nuevo rumbo, ya que la
microscopía de estas historias – filmadas, encontradas, citadas, amorosas, dolorosas,
secretas- no tienen ni la más remota pretención de iluminar ninguna totalidad. Son parte de
una búsqueda – esa hermana siamesa del azar- que va en zigzag y encuentra y abandona,
echa una luz tenue y se esfuma, dejándonos siempre con la gratificante sensación de que tras
esos bellos y conmovedores textos, tras esas poderosas y desconocidas imágenes hay más,
mucho más. En estos tiempos donde el cine se define por el exceso, este Work in progress…
produce un efecto extraordinario: su sobriedad es tan discreta y confesional que nos
recuerda que el cine no es el rumor del mundo, sino que está hecho de – o mejor que es –
el murmullo de los seres humanos.
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Yervant Gianikian,
Angela Ricci Lucchi
Elogio da política: conversa com Yervant Gianikian e Angela Ricci
Lucchi
Sérgio Toffetti
O “catálogo” é um dos eixos em torno do qual gira a vossa poética de autores. Comecemos
portanto por definir os elementos de um “catálogo” ideal das experiências pessoais que vos
levaram a utilizar o cinema como meio de expressão.
Angela Ricci Lucchi Começámos ambos como artistas visuais. Eu estudei com Kokoschka
em Salzburgo e, em 1972, fiz uma exposição em Ferrara, apresentada por Renato Barilli. Já
nessa altura estava muito interessada na utilização dos media e comecei uma espécie de
“inquérito”, mais tarde publicado pela editora Pari & Dispari, que consistia em colocar uma
pergunta essencial a uma série de pessoas: o que é a rosa para si? Pergunta que coloquei
também, entre outros, a Zavattini que me enviou uma carta muito bonita. E coloquei-a
também a Yervant que eu acabava de conhecer. Ele já tinha realizado alguns filmes em 8 mm
e exposições na galeria Cavallino de Veneza. Juntos realizamos um filme sobre os pilastrini,
pequenos altares de Nossa Senhora espalhados pelos campos da Romagna. Tudo começou
aí.
Yervant Gianikian Eu fazia trabalhos com materiais reciclados, com objectos que tinham
sempre a ver com a memória, normalmente eram brinquedos, fotografias; trabalhava a
madeira e mais materiais pobres. Filmava os objectos e com eles fazia grandes catálogos, fazia
umas “caixas” já estruturadas como “sequências” cinematográficas. Quando nos conhecemos,
achámos que já não nos interessava muito fazer trabalhos, esculturas ou quadros com os
objectos, mas sim realizar filmes sobre objectos. Por outras palavras, considerávamos a
câmara um meio para aprofundar a nossa pesquisa. De qualquer maneira, a ideia do
“catalogo” estava muito ligada à arte conceptual, mas também às vanguardas do princípio do
século, ao dadaísmo e ao surrealismo. Mais tarde pensámos na ideia do aroma como “banda”
exterior ao filme.
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“É preciso olhar não só com os olhos”, como dizia Dziga Vertov.
ARL Com certeza, mas a ideia surgiu também do nosso interesse pelo Iluminismo, pela
“estátua” de Condillac e o Traité des Sensations. O olfacto é o mais pobre dos sentidos, e nós
começámos a trabalhar sobre cheiros e perfumes como catalisadores da memória,
associando-os à redescoberta dos objectos antigos com que eram compostos os nossos filmes
e que já continham uma memória própria, portanto o olfacto na qualidade de sentido que
acciona a memória: o perfume que te leva a recuar no tempo.
YG Havia também o facto de os filmes serem mudos, e em vez de pôr uma banda sonora,
resolvemos pôr uma banda olfactiva. Quando os apresentávamos, eram verdadeiras
performances, com as pessoas que paravam não só para ver, mas também para cheirar. Era
uma experiência de envolvimento total do espectador, muito ligada à cultura daqueles anos.
Enfim, o perfume, tal como a música, por um lado servia para realçar os momentos
emotivos, enquanto, por outro, funcionava à maneira de Proust como uma espécie de
madalena a despertar lembranças.
YG Às vezes calhavam-nos encontros extraordinários. Por exemplo, em São Francisco
aproximou-se de nós um austríaco que tinha ido lá em criança e que, graças aos objectos –
objectos da tradição austro-húngara – e aos cheiros na sala, tivera uma sensação muito forte
do seu passado.
ARL Os nossos filmes mudos e cheirosos provocaram sempre reacções extremas: havia quem
saísse de repente e quem ficasse extasiado. Uma vez, um médico disse-nos que
embriagávamos os espectadores com as essências alcoólicas dos nossos perfumes.
Cesare Lombroso – Sull’Odore del Garofano, um filme perfumado que coloca a questão de
catalogar objectos bastante diferentes dos outros, marca uma fractura no vosso trabalho.
YG Chegamos a Lombroso através das teorias de um lombrosiano, Strassman, que afirmava
que as mulheres são menos sensíveis aos cheiros do que os homens. Fomos então a Turim
ver o Museu Lombroso. De facto, havia alguma afinidade entre os objectos expostos e os
brinquedos utilizados para os nossos filmes perfumados. Principalmente os objectos feitos à
mão pelos criminosos, pelos loucos; objectos pobres, de papel. E também havia alguma
afinidade no sistema de catalogação dos objectos.
ARL Nós queríamos contrapor os nossos catálogos de brinquedos e o catálogo dos horrores
lombrosianos. Apercebemo-nos, porém, de que Lombroso já tinha feito o catálogo: objectos,
bocados de corpo humano; havia imagens muito bonitas, fotografias das vítimas assassinadas
com todos os instrumentos utilizados.
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YG Eram muito interessantes as descrições do modus operandi: as imagens quase pareciam
exemplos da arte conceptual que esta va a chegar naquela altura: havia o machado, a
fotografia do morto, a corda para a fuga, a lanterna. A descrição perfeita de uma performance
criminosa. O que nos ligava a Lombroso era o coleccionismo. Porque ele, na realidade, era
um verdadeiro coleccionista de objectos do crime, uma pessoa que mandava vir peças de
todo o mundo. O sistema era análogo ao dos coleccionistas de postais, só que Lombroso, em
vez de trocar postais do Egipto, mandava vir fotografias de prostitutas japonesas, corpos de
pessoas assassinadas do Extremo-Oriente, etc ... E ainda havia as plantas, plantas criminosas,
insectos que matam outros insectos, todo o mundo catalogado conforme uma obsessiva
visão criminológica. Ao ponto deste excesso de coleccionismo, cujo ultimo estádio é o de
coleccionar e deixar aos vindouros o seu próprio corpo, nos parecer a verdadeira aberração.
ARL À entrada do museu, dava-te as boas vindas o esqueleto de Cesare Lombroso que, de
facto, nos era apresentado ao entrarmos. Mas o que deixava uma impressão mesmo perversa
era a fotografia do grupo familiar do Dr. Lombroso: no jardim de família, com as mulheres
em crinolina, o protótipo do conformismo burguês.
Portanto Cesare Lombroso marca o abandono da idade dos jogos. dos contos de fadas.
ARL Sim, Lombroso leva-nos um pouco fora de um determinado mundo a que tínhamos
dedicado também Wladimir Propp – Profumo di Lupo. Não quero dizer com isso que se
tratou de uma escolha consciente, uma pessoa segue simplesmente um percurso, encontra
algo, provoca às vezes, de alguma forma, algo para poder encontrar. No que diz respeito aos
filmes de arquivo, por exemplo, foram verdadeiramente uma descoberta de Yervant que
ficou pasmado.
YG Karagoez veio a ser, de facto, outro catálogo, o de um arquivo de filmes em 9,5 mm, mais
uma vez com uma importante vertente de violência. Sobre a violência contra a mulher, sobre
uma determinada ideia do erotismo, sobre a utilização do corpo da mulher. De facto, todos
os nossos filmes seguintes são filmes sobre o uso da violência: quando aparece o homem nas
primeiras imagens de Dal Polo All’Equatore, pega logo numa espingarda e mata.
Essence d’Absynthe fazia parte do mesmo fundo de filmes em 9,5 mm, era um filme porno e
cómico com quatro personagens, dois homens e duas mulheres; nós utilizámos apenas os
dois corpos femininos. Na verdade, durante as suas performances sexuais, estas duas
mulheres mostram-se muito ingénuas e pudicas: olham muitas vezes para a câmara e há uma
cena final em que uma mulher puxa para cima um collant, como quem quer tapar-se ...
enfim, há quem diga que era um filme muito moralista e muito trágico.
Do catálogo de objectos ao catálogo de perfumes, até ao catálogo de fotogramas... Quais
são os vossos pontos de referência no cinema?
106
YG As vanguardas do princípio do século, a começar pelos surrealistas, Léger e, acima de
tudo, Dalí e Buñuel. Além disso, passar aos fotogramas, ao material de arquivo, é algo
bastante directo, pois o nosso trabalho teve sempre a ver com o encontrar coisas, o
coleccionismo, as suas manias terríveis, o desencadear de fortes energias psíquicas, porque
quando encontras coisas ficas perturbado com isso. Só que, ao fim e ao cabo, já não nos
interessava o objecto concreto, mas sim o fotograma como objecto que detém em si a
memória. Karagoez permite-nos perceber que, para nós, eram mais importantes o
documentário e o documento do que a ficção.
Mas mais do que pelo seu valor de “documento”, o fotograma parece interessar-vos como
superfície a atravessar. Os materiais encontrados tornam-se “vossos” graças a um trabalho
profundo dentro do fotograma, escolhendo e às vezes escapam à exibição normal, aquilo
que está em pano de fundo, os pormenores que ao primeiro autor não pareciam os mais
importantes.
YG O fotograma é entendido como o objecto partir do qual começa todo o trabalho de
montagem. Basicamente, trata-se de voltar a fotografar a imagem. É como olhar
demoradamente uma fotografia, imobilizá-la o tempo necessário, isolar alguns pormenores
no interior, aproximar-se mais. Normalmente nunca filmamos o fotograma inteiro, ficamos lá
dentro, mais próximos. Em Essence d’Absynthe, por exemplo, estávamos muito interessados
nos riscos da película, na grelha de arranhões; era como se tivessem visto o filme milhares de
vezes, como se houvesse um véu, com a imagem a aparecer por trás. Conforme o filme, o
grande trabalho é o de juntá-lo. Karagoez é um filme quase montado na câmara, há poucos
cortes e poucas colagens; andávamos muito presos com os significados da imagem, e as
temáticas eram imensas. Pelo contrario, com Dal Polo All’Equatore procurámos fazer uma
montagem por blocos, temáticas, grupos de significados. A montagem de Dal Polo
All’Equatore foi muito complexa, as filmagens demoraram três anos, tínhamos uma
quantidade enorme de material e não conseguíamos encontrar o caminho certo, depois
fechámo-nos num quarto, sem as imagens, e agrupamos as temáticas. Normalmente
começamos a montagem pelo início ou pelo fim do filme: em Dal Polo All’Equatore é a
imagem do comboio a conduz todo o filme. Com materiais tão violentos não se podia jogar à
maneira surrealista, estilo Buñuel, ou de forma literária.
ARL A montagem é o momento de maior sofrimento, até porque é um momento de
confronto directo entre mim e Yervant, que é quem filma as imagens. Antes disso, também
há trabalho em comum, naturalmente, na fase de planeamento e pesquisa. Depois, enquanto
ele filma, eu leio ... Para Dal Polo All’Equatore, por exemplo, li de tudo: horrores do género
Mario Appelius e coisas extraordinárias como L’Afrique Fantôme. Voltamos a encontrar-nos
para a montagem, tal como no momento em que se decide sobre os cortes, a coloração, etc
... Não temos ideias muito diferentes, mas, de qualquer maneira, cada um tem o seu ponto
de vista.
107
YG Eu costumo andar muito às voltas enquanto Angela vai logo directa ao assunto. Mas o
problema é que os caminhos na película são infinitos, especialmente quando se começa a
descer em profundidade para dentro do fotograma. É um trabalho muito demorado, não
podes montar mais de dois ou três minutos por dia.
ARL Eu tenho mais coragem quando se trata de cortar, enquanto para Yervant cortar é algo
muito doloroso, era capaz de continuar até ao infinito. Há, porém, todo um trabalho
anterior: escolhe-se a maior parte das cenas com antecedência. Podemos decidir não pôr
determinadas coisas, porque não podemos fazer filmes de quatro horas, mas muita coisa fica
montada já no pape!.
Uma parte do vosso trabalho, a redescoberta dos arquivos, entrelaça-se com essa “nova
filologia” cinematográfica que levou, nos últimos anos, à descoberta e ao restauro de obras
do cinema mudo que se pensava tivessem desaparecido para sempre.
ARL Nos utilizamos os arquivos para criar filmes completamente novos, diferentes do
significado original, tornamo-los filmes nossos. Entrámos no mundo da filologia pura
apresentando os nossos filmes no Festival de Pordenone, na presença dos arquivistas das
cinematecas da FIAF. Houve algum burburinho, mas depois perceberam.
YG O período mais difícil foi o princípio da década de 80, porque as pessoas não percebiam
como é que num filme pudessem caber muitos filmes; o único jogo que os espectadores
faziam era o de reconhecer as citações, e isto parecia-nos muito restritivo. Todavia, de um
certo ponto de vista, por trás dos nossos filmes está também um cuidadoso trabalho
filológico. Nós analisamos em pormenor e catalogamos todos os filmes que nos interessam,
contando até os fotogramas que compõem uma sequência. Fazemos descrições quase
completas, sabemos exactamente como começam e como acabam todas as sequências. De
qualquer maneira, a pesquisa filológica não passa de uma base para o trabalho.
ARL No ano em que apresentámos Dal Polo All’Equatore, no Festival de Roterdão, exibiram,
com o acompanhamento de uma grande orquestra, Casanova de Volkoff com Mosjukin, que
é para nós um dos grandes actores. Mas eu achei mais bonito o nosso, porque o outro, à
velocidade normal, parecia-me algo “estoirado”. Nós, pelo contrário, enfatizamos muito os
movimentos dos olhos, o virar da cabeça ...
YG Sim, às vezes ficas interessado por um olhar ... Mas isto era no tempo de Karagoez.
Agora, depois de Dal Polo All’Equatore, a ficção já não nos interessa.
Dal Polo All’Equatore marca, depois de Cesare Lombroso, mais uma viragem para a
realidade?
YG Por um lado, em Dal Polo All’Equatore, há uma reflexão sobre a força, o poder, mas há
também a constatação de que o documentário, já na altura, era muito mais avançado do que
108
a ficção. A descoberta do Arquivo Comerio foi um momento muito importante. Tínhamos
trabalhado imenso sobre o 9,5 mm, escrevendo centenas de páginas. Há filmes cujos
fotogramas conhecemos um a um, e todos os intertítulos, por isso estávamos preparados
para reconhecer o que podia conter um arquivo inteiro pelos sinais emergentes, até mesmo
pelo primeiro fotograma. Vi talvez um metro do Arquivo Comerio e percebi logo que era
aquilo que eu procurava. Não era material desconhecido, mas ninguém o quis, porque não
se tratava de ficção. Além disso, quando começámos a ver o 35 mm, percebemos que ele é o
pai do 9,5; é o formato que deu origem a todos os formatos reduzidos, o 9,5, o 16, o 8 mm.
É como possuir a origem de tudo: a cor, o grão, o inflamável. O 35 mm é o pai e os filhos
têm sempre qualquer coisa a menos. Por exemplo, o 9,5 perde algo, as margens encolhem,
há sempre um corte, há sempre algo que desaparece; o mesmo acontece com o 16. E além
do mais, contém a história, o movimento que não consta dos livros, contém todas as coisas
que tínhamos lido. Havia também o facto de reencontrarmos os negativos, por exemplo os
negativos presentes no campo de batalha, que estiveram lá e que são as únicas testemunhas
da guerra.
“Os filhos têm sempre qualquer coisa a menos que o pai”. Mas o teu pai representa para ti
a ligação com a tua terra de origem, a Arménia. que surge como o ponta de encontro entre
a memória histórica e a tua memória pessoal.
YG O meu pai é um grande artista, um grande narrador que conta a sua fuga duma aldeia da
Turquia Oriental e o massacre da sua família. A diferença entre nos é precisamente essa, ele
viveu na primeira pessoa, enquanto nós vivemos através das imagens, quase que par
transferência de experiências. A nossa é uma memória de segundo nível. Mas é verdade que
um filme pode ser escavado. Deste ponta de vista, Uomini, Anni, Vita é como uma espécie
de catarse, um filme doloroso.
ARL A procura de material foi muito complicada, procurámos nos arquivos do Imperial War
Museum de Londres; encontrámos mais coisas na Rússia, pouca coisa na Arménia, porque
nos laboratórios faltava água e luz par causa do terramoto. Yervant estivera na Arménia,
filmou lá muitas imagens que não chegámos a montar.
YG Em 1987, recebi um convite oficial da indústria cinematográfica da Arménia soviética para
visitar o meu país. Já tinha tentado várias vezes e consegui graças à intervenção do realizador
Ovanessian. Desejava imenso ir lá, mas quando chegou a momento, faltava-me a coragem.
Acabámos par ir, com Angela e Walter Chiari, que lera partes do livro do meu pai e quisera
acompanhar-me. Era um período em que aconteciam tantas coisas: o terramoto, a revolução,
o muro de Berlim. Nós conseguimos acabar o filme antes da queda do muro. Ainda bem,
assim o filme fica fora da história. De facto, percebi logo que era impossível inserir todas as
cenas filmadas na Arménia.
109
O último elemento do catálogo, por enquanto, é a vossa pesquisa sobre os “Arquivos
italianos”.
YG Ainda queremos trabalhar sobre o fascismo. Queremos continuar para depois acabar.
Gostaríamos mos de preencher estes anos italianos que vão da primeira guerra mundial ao
pós-guerra e depois mudar. E fechar também a experiência de trabalho com os arquivos. O
facto é que precisas também de filmar imagens tuas.
De que cineastas é que se sentem hoje mais próximos?
ARL Mas o nosso problema é que estamos muito isolados, principalmente em Itália.
Viram, por exemplo, Reminiscenses, a viagem à Lituânia de Jonas Mekas?
YG Sim, com efeito estamos muito ligados a Mekas, e não só pelo percurso das vanguardas –
palavra que, aliás, me parece muito ultrapassada – mas também porque ele é lituano e eu
sou arménio.
in Yervant Gianikian & Angela Ricci Lucchi, Catálogo Cinemateca Portuguesa, 2001, trad. Marcelo Sacco
Des instants choisis de l’espèce humaine
Raymond Bellour
Comment dire l’effet que ces films communiquent – non leur halètement perceptif singulier,
tenant à l’art de leur reconstruction, mais grâce à cet art qui se donne une qualité propre
d’hallucination comme règle de sentiment et de pensée, l’effet d’humanité qu’ils impriment,
jusqu’à l’égarement ?
Depuis que la peinture en a abandonné l’idée, le cinéma a eu parmi bien des fonctions celle
de rapporter les corps à la masse physique et sociale dont chacun est issu. À l’époque qui
connaît seul le plan d’ensemble, il suffit qu’un corps en se détachant avance plus que
d’autres vers la caméra pour qu’il paraisse entrer soudain dans une vie seconde, précipitant
une intimité inconnue vers la foule immobile dont chaque spectateur se croit la part unique.
Magie Lumière, magie Griffith. Passage aussi, de l’un à l’autre, d’une sélection qui n’est plus
de semi-hasard, mais de contrôle et de découpage. Effets de plan, qui sont autant d’effets de
connaissance et de reconnaissance. Ils varient en chacun de nous, sait-on jamais dans quelle
110
proportion, selon ce ces corps s’approchent de leurs visages semblent de fiction ou se disent
documentaires affin de laisser croire qu’ils ont vraiment été, là-bas et maintenant.
Les films de Yervant Gianikian et Angela Ricci Lucchi mettent en abyme toute estimation
relative à la réalité réelle des corps qu’ils découvrent, puisque ceux-ci sont aussi bien
contemporains de leur image autrefois enregistrée puis retrouvée dans telle archive, que
contemporains de cette image par laquelle aujourd’hui ils se réincarnent, plus ou moins
remodelés, recadrés, reformés, refigurés. Ainsi, grâce à des modalités d’intervention qu’il
laisse à deviner, ce cinéma de la durée, du ralentissement, de la saccade, de l’intervalle et du
tremblement continu, se révèle d’autant plus comme un cinéma du plan, de l’effort, des
nuances, des hasards, des effets prodigieux du plan. Au gré de la transmutation rythmique
qui réverbère les images des mondes que ces films font défiler, reconfigurant toute image du
monde en un arrière.monde plus réel qu’aucun autre, des évènements de plan
continuellement se produisent, entre plans et internes au plan, ayant trait en grand nombre
à l’aura d’humanité distinctive émanant des corps, gestes attitudes, mimiques, regards
singulièrement, qui les envahissent et les peuplent.
Par exemple ce visage d’enfant qui surgit par la droite au bas du cadre dans Dal Polo
all’Equatore. On est entré suivant les rails du train dans l’ordre quotidien d’une bourgade
d’un Moyen-Orient quelconque. Un plan rapproché découvre bientôt quelques dignitaires
barbus, souriant comme des archétypes – on reconnaît chacun, celui qui se frotte un instant
le nez. Puis d’autres, en masse, qu’on distingue mal l’un de l’autre, s’avançant
solennellement entre les rails du train. Puis d’autres encore, dans un plan un peu moins
large, qu’on individualise à demi. Un nouveau plan découvre enfin, dans un décor de rue,
deux femmes, une au premier plan à droite, une au fond à gauche, s’éloignant de dos tandis
que deux autres, formant avec deux militaires un groupe un peu confus, arrivent droit vers
nous. Ballet humain obéissant à une sorte de hasard réglé, par un emmêlement de lignes et
de chevauchements de corps, qu’accuse le détail des vêtements (vives rayures noires et
blanches de la jupe qui s’éloigne en zigzaguant), comme dans une vue Lumière devenue
attentive, doublement (l’opérateur d’époque, Luca Comerio/le travail des Gianikian). C’est
au moment où les femmes animées de mouvements opposés se croisent qu’apparaît l’enfant.
Comme projeté par le hors-champ, tout près, l’air goguenard, une casquette vissée sur la
tête, le visage penché, il semble glisser dans le cadre au centre duquel il s’installe, l’œil fixe,
attentif à la caméra ; puis il repart d’un mouvement inverse, demeurant à demi au bord de
l’image avant de disparaître. Le temps qu’il s’est accordé à nous regarder et que la mise en
scène a déployé aura suffi pour que les deux femmes se soient rapprochées, aussitôt
recadrées en un plan bref dont elles sortent vite, entourées dès lors par bien d’autres corps
saisis comme elles dans une généralité indécise.
Ajoutons à ce semblant de description que la teinte change ici selon le motif, ou le thème
socio-figuratif, passant au travers de ces quelques plans du brun au cramoisi au bistre et,
111
comme dans un nuancier, par des tons intermédiaires de bruns aussi reconnaissables que
difficiles à nommer.
La variété qui s’offre ainsi tient à la détermination proportionnelle d’apparences de l’humain,
relative à la taille accordée à chaque corps dans l’espace du cadre, comme à ses modalités de
mouvement et de surgissement. Il est clair que ce visage d’enfant saisit par une brutalité
d’insertion, une adresse expresse au spectateur, comme a pu autrement le faire chez Griffith
la fameuse avancée jusqu’à l’extrême gros plan du truand dans The Musketeers of Pig Alley.
Mais ces effets de corps possèdent ici une sorte d’obscénité, obscure, entêtante. Il y a une
obscénité de principe attachée à l’acteur de cinéma travaillant à s’offrir son vrai corps à la
fiction, niant la distance interne à son paradoxe de comédien, se livrant à la caméra qui
décide son apparence littérale et mensongère. Il existe également une obscénité du corps
documentaire se prêtant dans son illusion de vérité, attestant de lui-même, comme branché
sur sa réelle identité dont il prend le spectateur à témoin. L’obscénité propre des corps
ressaisis par les films de Gianikian-Ricci Lucchi est autre, moins entre le documentaire et la
fiction qu’en arrière des deux, installée dans une région où chaque créature, vacillant entre
l’individuation prégnante et un destin de masse, semble, à proportion de cette variation, en
posture de devenir l’acteur unique de son identité virtuelle.
Cela tient évidemment aux procédures de refilmage et d’apparition, aux choix étagés de
figuration, mais surtout à la relative indéfinition dont chaque être est l’objet, dans ces films
sans commentaire, qu’ouvrent ou ponctuent de rares cartons. Le partage est clair autant qu’il
est simple dans Dal Polo all’Equatore, entre les victimes et les tueurs, les colonisés et les
colonisateurs, les militaires et les civils, les hommes et les femmes, etc. Mais au-delà ? Rien ne
dit la nature, l’appartenance, le lieu, la fonction, le moment. Si bien qu’en deçà de puissants
clivages primordiaux qui confèrent à ces films une brutalité salutaire, condition de leur
sauvagerie éthique, une incertitude plus ou moins grande est de règle quant à l’identité de
ce qu’on voit, et ainsi relative au savoir comme à l’intuition du spectateur, en regard de la
norme implicite du geste documentaire. C’est la façon dont est touchée comme jamais
l’irréfragable identité impersonnelle de l’humain. Elle s’offre par des signes sans voix, qui
s’étendent à l’animal (comme l’illustre Animali Criminali), selon une variation infinie et par
là indéfinie, à travers et au-delà d’un typage constant : entre silhouette et geste, corps et
visage, file ou troupe ou meute ou masse. Monte ainsi par bouffées, continuellement, la
vieille question de Michaux: “L’humain, qu’est-ce que c’est ?”, avec sa réponse indécise :
“L’humain, en somme, c’est leur groupe.”
Sans doute cette identification de la réalité figurée est-elle changeante, selon les films,
comme au gré de mouvements de l’œuvre. A l’absence de presque tout carton dans Dal Polo
all’Equatore répond, neuf ans plus tard, dans Prigionieri della guerra une suite de
spécifications qui découpent le film en autant de séquences ou de moments, correspondant
à des situations locales et supposant des identités nationales (“1914. Galicie. Front oriental.
112
Victoire tzariste. Départ des prisonniers austro-hongrois en Sibérie”). Il y a ainsi sept cartons
dans ce film de trente-cinq minutes. Su tutte le vette à pace, le film qui à bien des égards en
est peu après la reprise et la dilatation au cœur le plus tourmenté de la guerre, se trouve
intertitré selon un principe identique. Mais de telles mentions sont trop élémentaires pour
affaiblir la tension primordiale entre la réalité des corps de masse et celle de l’individuation
énigmatique dont chaque corps peut devenir à tout moment l’objet. Aussi les auteurs en ontils formulé alors le principe, en quelques lignes d’un carton devenu incontournable, proche
des cursifs commentaires écrits dont ils ont de tout temps accompagné leurs films :
“Recherche de l’individu, de l’ ’homme soldat’, parmi des archives qui représentent les
masses anonymes. Dans les détails, dans les traits particuliers : l’expression, la
microphysionomie, le comportement individuel. Repris au ‘corps blessé’ du support nitrate.”
Et toujours se développe ainsi, par-delà tout savoir et toute référence, signe sûr d’un siècle
effrayant qu’aura seul su saisir et ressaisir le cinéma, cet aller et retour entre puissances de la
masse et saisissements de l’être individuel, avec tous les états intermédiaires concevables.
Deux choses frappent dans Prigionieri della guerra, À travers des images arrachées à
diverses propagandes, russes et austro-hongroises. On devient indifférent aux identités
nationales rappelées discrètement, comme pour rassurer sur la véracité de ce conflit
embrouillé dont nous sommes nés. Dans des images trop polies pour être honnêtes, on ne
voit plus que des essences aussi coupantes qu’incertaines, des êtres-prisonniers, acharnés à
survivre en chacun de leurs gestes. Le dernier carton ouvre la voie d’une telle indécisionconfusion (“L’attaque, la retraite, la défaite”). On ne sait lesquelles, et de qui : seulement des
êtres-soldats qui s’affrontent, dans les tirs et les bombes, masses obscures, prisonniers qui
défilent, champs de morts, corps précipités dans des fosses, tous signes entre les signes. On
entre aussi, par effraction, à revers de cette pression anonyme, dans un entre-monde de
fictions éclatées, instantanées. Ainsi ces plans où une, puis deux, puis deux petites filles
encore viennent glisser des lettres dans la boîte : dans une image apaisée, elles entrent,
accomplissent leur geste et repartent. Ce sont, a dit un moment plus tôt le carton, des
orphelines de guerre, recueillies à Oberhollabrunn, en Autriche. Un plan d’ensemble et de
foule sur l’entrée du camp, sitôt après, achevant la séquence, livre à nouveau l’information.
Mais le temps de cette avancée trois fois reprise des petites filles dans le cadre, mimant de
leurs corps cahotants et gracieux un ballet de pures distances, on a presque tout oublié, au
profit de la grâce de l’événement.
in Trafic n.º 38, Eté 2001
113
Do documentário feito à mão. Notas conjugais sobre o cinema de
Yervant Gianikian e Angela Ricci-Lucchi
Danièle Hibon, Dominique Païni
Ocorre com “os Gianikian” como com “os Straub”: quando nos interessamos pelos seus
trabalhos é enquanto casal que temos vontade de os estudar, programar, comentar.
Num texto de Yervant Gianikian e Angela Ricci Lucchi publicado em 1995 na revista Trafic,
intitulado “Notre caméra analytique”, fomos surpreendidos pela tentativa dos dois cineastas
definirem o seu método.
“A construção de uma câmara analítica permite-nos aproximar, entrar em profundidade no
fotograma. Intervir na velocidade do filme, no detalhe, na cor. Fixar e reproduzir em formas
pouco habituais o material de arquivo. Graças a ela, realizamos as nossas catalogações,
arquivamos, dentro da massa de imagens encontradas e que possuímos, aquelas que nos
provocam fortes tensões [...]. Pois nada podia ser visto na mesa de montagem, devido ao
estreitamento da película, que vimos praticamente parada, à mão, fotograma por fotograma
[...]. Vemos alguns fotogramas de um fragmento de filme. Vemo-los fixos, à mão, à contraluz
sobre o vidro fosco, à luz da mesa.”
Este texto teve a virtude no seu tempo de conjugar, para nós, interesses que até então não
nos tinham parecido conectados nem conectáveis: o ensaio cinematográfico “defendido e
ilustrado” desde há uma dezena de anos na Galerie Nationale du Jeu de Paume e as
condições da plasticidade cinematográfica. No fundo, encontrávamos neste texto argumentos
para nos questionarmos de novo sobre a artisticidade do cinema e elementos metodológicos
emprestados a dois cineastas contemporâneos para conturbar o medieval mas recorrente
antagonismo entre as artes mecânicas e as artes liberais, antagonismo aliás relançado
aquando da invenção do cinema.
O ensaio cinematográfico poderia ser definido como uma permeabilidade ao real e uma
visão inquieta do mundo, uma viagem aos meandros muitas vezes dolorosos da memória e
uma escrita no presente, a combinação de materiais objectivos “já existentes” (o arquivo de
arquivos segundo os Gianikian) e a reivindicação subjectiva da montagem.
Ao reler o texto dos Gianikian e ao rever os seus filmes, encontrámos uma frase do poeta
Francis Ponge (em My creative method) que descreve na nossa opinião de forma bastante
ideal o trabalho dos cineastas, tendo que se substituir, obviamente, a palavra “literário” pela
palavra “cinematográfico”: “Criar objectos literários que tenham mais possibilidade não digo
de viver, mas de se opor (objectar-se, dispor-se objectivamente) com firmeza ao espírito das
gerações, que lhes interessam sempre (como lhes interessarão sempre os próprios objectos
exteriores), ficam à sua disposição, à disposição do seu desejo e gosto pela concreto, da
114
evidência (muda) oponível, ou do representativo (ou presentativo)”. Não saberíamos
encontrar melhores palavras que estas de Ponge para justificar as “fatias douradas”
cinematográficas dos Gianikian e o seu alcance ideológico. Encontramos, de facto, nestes
cineastas uma atenção semelhante em relação aos objectos, propriamente ditos par um lado
e de um ponto de vista linguístico por outro lado. Os seus filmes-catálogos dos anos 70 são
exercícios próximos de “lançamentos em orbita” escriturais de objectos banais e quotidianos
dos quais Ponge elogia as formas, as possibilidades de anamorfose figural e o poder
semântico infinito. Estes objectos descritos “em todos os seus estados” mantêm uma certa
afinidade, uma relação conceptual com os objectos que ocupam a proximidade do olhar e da
vida dos dois cineastas que apreciam os perfumes e os brinquedos e cujo Catalogo nº3 –
Odore di Tiglio Intorno alla Casa [Aroma de Tília à Volta da Casa] revela o projecto de
transformar a intimidade em obra de arte, de apresentar-representar o que existe “mesmo ali
à nossa volta”. Forma de continuar de um modo mais poético o debate dos anos 70
semiologicamente militantes, entre denotação e conotação, ver e olhar, realismo e verdade
(o titulo do recente Inventario Balcânico indica que esta interrogação está ainda hoje viva
para eles). Por outras palavras, estamos a sugerir que é assim que os Gianikian inscrevem na
sua obra a relação incerta e subtil entre documentário e ensaio cinematográfico, levando-nos
a desafiar quem quer que seja para determinar qual é, para os cineastas, o “campo certo”.
Pois a que está em jogo e a verdade do seu trabalho encontram-se sem dúvida noutro lado,
precisamente nesta leve alusão, apenas assinalada no seu texto: visionam os arquivos que
encontram “à mão”. O seu cinema seria então feito à mão!?
Alguns cineastas, ou artistas temporariamente cineastas, tentaram ultrapassar, pela menos
metaforicamente, a impossibilidade da marca manual no “fazer cinematográfico”, uma
impossibilidade ontológica de certo modo. Assim, para rematar o filme Anémic Cinema,
Marcel Duchamp assina-o de uma forma singular. Faz figurar o seu pseudónimo de ficção,
Rose Sélavy, e deixa uma impressão digital no genérico final. Duchamp comenta deste modo
a sua única experiência cinematográfica: “Além disso, este cinema era divertido.
Trabalhávamos milímetro por milímetro, porque não havia máquinas muito aperfeiçoadas.
Havia um pequeno cilindro, com os milímetros marcados, que rodávamos imagem por
imagem. Fizemos isto durante duas semanas. Os aparelhos não eram capazes de passar a
cena a qualquer velocidade, baralhava-se tudo, e como rodavam bastante depressa, verificavase um efeito de óptica curioso. Fomos então obrigados a abandonar a mecânica e a fazer
tudo nós próprios. Um retorno à mão, por assim dizer.”
Robert Bresson confere igualmente à mão um papel de relevo: “Que no teu filme sintamos a
alma e o coração, mas que seja feito como um trabalho manual.” Nas suas Notes sur le
Cinématographe, Bresson compara a câmara aos apetrechos manuais da pintura, do desenho
e da escrita (o Cinematógrafo) e sem dúvida é preciso ver que ao atribuir o nome de modelo
aos actores não se trata de uma indiferença em relação ao seu trabalho, mas antes de uma
115
preocupação de assinalar um projecto escultural, de modelar o corpo do actor. Como afirma
Bresson, dirigir um actor consistiria pois, mais precisamente, em remover a matéria
supérflua.
No fundo, Duchamp e Bresson opõem-se à ontologia cinematográfica segundo princípios
herdados da filosofia clássica da arte. Recorde-se L’Eloge de la main de Henri Focillon: “O
que distingue o sonho da realidade é que o homem que sonha não pode engendrar uma
arte: a suas mãos estão adormecidas. A arte faz-se com as mãos. São o instrumento da
criação, mas são em primeiro lugar o órgão do conhecimento. [...] [A mão] está na origem de
toda a criação. Adão foi moldado com barro, como uma estátua. Na iconografia romana,
Deus não sopra sobre o globo do mundo para o lançar para o éter. Coloca-o no lugar
segurando-o com a mão. E é uma formidável mão que Rodin, para representar a obra dos
seis dias, faz irromper de um bloco onde repousam as forças do caos.” E, finalmente, diante
de fotografias de patriarcas judeus, Focillon evoca uma representação de Rembrandt.
Mas retracta-se rapidamente: “Que mal-estar se apodera de nós diante destas imagens tão
perfeitas! É Rembrandt destituído de Rembrandt. Uma percepção pura, despojada de
substância e densidade, ou antes uma deslumbrante recordação óptica, fixada nesta memória
cristalina que retém tudo, a câmara escura. A matéria, a mão, o próprio homem estão
ausentes".
Os Gianikian pensariam deste modo diante das mesmas fotografias?
Criar confundir-se-ia pois com modelar, esculpir, manipular a matéria. Ora, as artes
mecânicas que são a fotografia e o cinema excluem esta acção directa da mão sobre a matéria
do real. Reproduzir não é produzir. Contudo, não é indiferente que modelar e fingir, dito de
outro modo a escultura e a ficção, tenham uma origem etimológica comum: fingere. Poderia
isto contribuir para melhor compreender o tormento que atravessou o cinema moderno
desde o pós-guerra? Tormento que aflora de outra forma em Transparenze onde as mãos de
Yervant decapitam, dilaceram a carne da película que encarna o fotograma, verdadeira pasta
modelável, viscosa. (Recorde-se que segundo Jean Epstein a viscosidade era o que melhor
definia a plasticidade da imagem cinematográfica projectada ao ralenti).
Rosselini, Pasolini, Antonioni, Buñuel, Bergman, Bresson enfrentaram, ao longo das suas
respectivas obras, estas questões: o cinema é uma arte? O cineasta é um artista? Que
aconteceu às mãos, qual o seu papel e a sua marca, nesta arte do século xx? Esta arte cujo
tempo é o material e cuja matéria, a película, não é a matéria de expressão. Por outras
palavras, onde reside a plasticidade cinematográfica que atestaria o acto manual, o toque do
artista-cineasta no seio deste dispositivo que regista mecanicamente, do qual a colagem da
montagem apaga igualmente a marca? Não entendo a plasticidade segundo a sua redução
pictórica (a realidade reproduzida pictoricamente, com “efeitos de pintura”), mas como a do
116
material cinematográfico, e do que está na sua base: o movimento, a duração, a velocidade
das imagens.
Coloquemos esta hipótese: a plasticidade cinematográfica reside nas variações de andamento
imprimidas aos objectos representados na imagem fílmica. Agir sobre a velocidade das
imagens, sobre o ritmo do movimento dos seres e das coisas reproduzidas pelo filme
reconduziria assim a uma actividade de modelagem do tempo.
O verdadeiro material dos filmes dos Gianikian não é a realidade como é o caso do
documentário tradicional. O material que modelam, que manipulam, que “vêem à mão”, é
uma realidade registada com a sua temporalidade própria que se oferece à tangibilidade do
visionamento, fotograma por fotograma, e da montagem. Porque os Gianikian já não
encontram nenhum projector à medida de visionar os filmes que descobrem, vêem-nos e
apresentam/representam-nos à mão, graças à sua câmara analítica que aumenta a imagem,
pormenoriza o seu conteúdo e estende a sua duração.
Aumentar, pormenorizar, estender constituem gestos de extracção ideológica de partes da
imagem, metamorfoseando os arquivos iniciais manipulados em incontestáveis discursos
ideológicos dos nossos dias. Além disso, estes mesmos gestos extraem, aprisionam nos
movimentos humanos colectivos (Prigioneri della Guerra, Su tutte le vette è pace) olhares
que sem o saberem, varias décadas mais tarde, individualizam testemunhas tornadas
anónimas, olhares reflectidos no dos Gianikian.
É assim que os filmes dos Gianikian seriam ensaios por excelência. se nos consentíssemos a
fantasia teórica de os definir como documentários feitos à mão.
in Yervant Gianikian & Angela Ricci Lucchi, Catálogo Cinemateca Portuguesa, 2001, trad. Joana Campos
Notre caméra analytique
Yervant Gianikian, Angela Ricci Lucchi
Archives
Nous voyageons en cataloguant, nous cataloguons en voyageant à travers le cinéma que nous
allons re-filmer.
Les sources d’origine sont ce qui a été récupéré des archives documentaires, parmi lesquelles
la collection privée de Luca Comerio (1876-1940), pionnier du cinéma de documentation.
117
La construction d’une “caméra analytique” nous permet de nous approcher, de descendre en
profondeur dans le photogramme. D’intervenir sur la vitesse de défilement, sur le détail, sur
la couleur. De fixer et de reproduire dans des formes inhabituelles le matériel d’archive.
Grâce à elles nous réalisons nos “mises en catalogues”, nous archivons, parmi la masse
d’images trouvées et que nous avons, celles qui provoquent en nous de fortes tensions.
Emploi de l’ancien pour le nouveau, pour faire émerger des actualités les sens cachés, pour
renverser les sens premiers. Mémoires de fin de millénaire sur les comportements, les
idéologies.
Mise en catalogue rangement des images par comparaison
Du Pôle à l’Equateur, les 347 000 photogrammes photographiés un à un autour du “thème
légendaire du voyage”. Le documentaire archaïque comme bazar d’exotisme, comme
exposition d0images de marchandises même humaines. (Rapine culturelle permanente et
violation systématique de cultures par d’autres). Caractérisation dans l’archive d’éléments
constants qui apparaissent dans les espaces géographiques différents : le panorama / les
animaux / les objets / la danse / les rituels / le portrait / la foule / la procession / le vêtement.
En ce qui concerne le vêtement, les seuls à être “en costumes” sont les conquistadors, les
chasseurs, les prêtres, les soldats. Mussolini. Déflagration des violences par la mise en
catalogues des matériaux. […]
Aspect d’un laboratoire.
A Milan, au printemps 1982, nous trouvons donc les travaux du dernier laboratoire de Luca
Comerio. Le lieu est le sous-sol d’un petit établissement de banlieue, près des autoroutes. Le
laboratoire cinématographique a un air du XIXe siècle. La caméra Prevost avec laquelle
Comerio filma, au début comme seul opérateur, la Première Guerre mondiale, est appuyée à
la verticale sur un banc-titre en bois. La tireuse au contact, elle aussi en bois, ressemble à une
petite armoire, avec deux rideaux en tissu noir dans la partie inférieure pour cacher les deux
corbeilles qui recueillent la pellicule. Dans la machine, la pellicule n’est entraînée que par
une seule roue dentée à huit pointes. Les films sont regardés sur une petite table en bois
avec des plateaux en bakélite. Le laboratoire va être démoli. Le propriétaire, seul ouvrier, a
déjà démonté et cassé à coups de marteau la tireuse Lumière, par désespoir, parce que sans
avenir. Les divers morceaux, rouillés, désarticulés, emplissent des seaux dehors dans la cour,
sous la pluie, où sont alignés aussi les châssis en bois pour développer. A l’intérieur, d’autres
objets, des appareils cinématographiques sur des socles, sont recouverts de lourdes bâches
noires et maintenus par de grosses cordes. Les films documentaires inflammables sont
conservés dans une cave. Ils sont destinés à êtres brûlés. Nous regardons quelques
photogrammes d’un fragment de film. Nous les regardons “fixes” à la main, en contre-jour
118
sur le verre dépoli, à la lumière de la table. Une embarcation à voile virée en peinte en bleu
et rose marin.
Noue ne voulons rien voir d’autre à moins de tout voir.
Nous n’aurions pas pu réaliser Du Pôle à l’Equateur si nous n’avions pu posséder
physiquement et mentalement tout ce matériau. Matériau que nous allions rassembler
pendant des années pour constituer nos “archives des archives” en relation étroite avec notre
travail sur le film comme forme d’art. Pour une transposition des archives en formes non
traditionnelles. Une recherche personnelle sur un matériau donné, sur ce qu’il cache, dans
les détails de ses photogrammes en 18x24 mm, et dans les vitesses originales de
déroulement. Pour une nouvelle relecture de la mémoire collective fixée dans le matériau
documentaire. Luca Comerio meurt amnésique en 1940. L’amnésie chimique, la moisissure,
la désintégration physique de l’émulsion, tel est l’état dans lequel se trouvent ses archives,
qui rassemblent ce qui a été tourné par lui et par d’autres opérateurs primitifs. Un filmpanorama du monde qui précédait la Première Guerre mondiale. Du Pôle à l’Equateur
(1986) est la forme nouvelle, la resignification du matériau filmique de ces archives
primitives, concernant le voyage d’exploration, de conquête, de main basse culturelle,
d’imposition religieuse et militaire, d’aventure exotique et coloniale.
La “caméra analytique”
Pour le film, on a construit une “caméra analytique” comprenant deux éléments. Dans le
premier défile verticalement l’original 35 mm. Il peut contenir la perforation Lumière et les
pellicules avec les divers états de rétrécissement et de détérioration du support et de
l’émulsion jusqu’à la perte de l’interligne du photogramme et de son total effacement. Le
déroulement se fait manuellement avec une manivelle à cause de l’état des perforations, du
risque permanent d’incendie du matériau inflammable. La griffe se compose de deux dents
mobiles au lieu de quatre. Les lampes employées sont des lampes photographiques à
température variable au moyen d’un rhéostat. Cette première partie de la caméra est le
résultat d’une tireuse à contact. Le second élément est une caméra aérienne sur un axe dont
le premier élément absorbe l’image par transparence. C’est une caméra avec des
caractéristiques microscopiques, plus photographiques que cinématographiques, qui
rappelle plus les expériences de Muybridge et de Marey que celles des Lumières. La caméra,
équipée de mécanismes pour le déroulement latéral, longitudinal et angulaire dans toutes
les directions, peut respecter intégralement le photogramme, sa structure originelle et sa
vitesse d’apparition au sens philologique. Ou bien elle pénètre en profondeur le
photogramme pour observer les détails, dans les zones marginales de l’image, dans les
parties incontrôlées du cadre. La caméra est capable de respecter la couleur du virage
119
original ou de la coloration à la main du photogramme, mais peut aussi, de façon autonome,
peindre de vastes zones du film.
La vitesse du déroulement est fonction de la vitesse originelle, qui diffère à chaque morceau
du film selon ce qu’on veut souligner. En général la valeur du ralenti est de 3-4 par
photogramme. La valeur augmente dans les parties fugitives, lorsqu’il n’y a qu’un seul
photogramme et dans les fragments. La caméra travaille à l’intérieur de la séquence et
quelquefois la décompose en plusieurs séquences. Elle confronte les formes du matériau
primitif pour mettre en lumière les détails. Avec les techniques expérimentées pour la
première fois pat Mikhail Kaufmann en 1928, elle voyage dans l’espace et dans le temps du
film. Le fil est divisé en dix sections. Le montage se fait par blocs et par thèmes. Dans chacun
d’eux, les éléments constitutifs reviennent sous des formes et des aspects différents,
récurrents.
1. Topographie à la frontière de l’empire austro-hongrois
Le Tyrol vu du train dans les années qui précèdent la Première Guerre mondiale. La
longueur originelle du morceau de film était de 5 044 pieds (97 m) et a été multipliée trois
fois. Les perforations de la pellicule – comme les rails sur lesquels roule le train – qui
manquaient sur tout un côté ont été refaites une par une. La moisissure, le brouillard
chimique du territoire filmique ferroviaire sont la concrétisation visuelle du mot amnésie.
La caméra sur le train fait défiler le paysage, c’est la nouvelle ponctuation filmique qui
contient les autres ponctuations, dans le tunnel on invente le fondu qui ouvre et ferme. Le
tunnel, la galerie, est l’architecture primaire où les soldats passeront, comme dans une
tanière, de longues années.
2. “Le Sphynx blanc”
Alignement de matériaux antarctiques de provenance diverse à partir de ceux qui ont été
filmés par le duc des Abruzzes, 1899 : rupture de glaciers, chemins d’eau, panoramas
dynamiques, première apparition dans un fil de l’homme en chasse polaire. Le cache ovale
ou rond, comme la section du canon du fusil, contient les animaux visés : l’ourse blessée,
son petit pris au lasso, la proie sanglante qu’on hisse à bord encore vivante.
3. Topographie d’une frontière
Un opérateur à la frontière “russo-persane” avant 1910. La caméra topographique sur le train
pénètre la ville de Tiflis, distingue l’architecture chrétienne de la musulmane. On compte
plus de militaires que de civils dans les recensements de rues. Dans les portraits en groupe
120
même les femmes sont armées. Les éléments reproposés dans une forme nouvelle sont le
panorama, les géométries des parades, les portraits, le mouvement de la danse, le visage de
la foule caucasienne décrit plus tard par Joseph Roth.
4. “Le Sphynx noir” des missionnaires
Chasse religieuse. Les quatre fonctions représentées par les missionnaires sont : la recherche
de la proie, le baptême, l’encadrement religieux, l’encadrement militaire. A l’école, le geste
em miroir de la main gauche de la sœur missionnaire provoque le mouvement de la main
droite des enfants noirs pour faire le signe de la croix. Les missionnaires viennent à la suite
du baron Franchetti. Ouganda 1910. Luca Comerio est l’opérateur de cette section, il
accompagne le baron, futur agent secret de Mussolini en Afrique. Le chasseur blanc (détails
de son allure et de son habillement colonial) est pris au milieu d’une foule de corps noirs
nus, la caméra explore en particulier les corps féminins. Le drapeau italien est retiré du
fleuve par une colonne d’hommes noirs nus. L’intertitre qui accompagnait cette séquence :
“Partout, l’Italie a fait flotter son glorieux drapeau.”
5. Combats. Contrastes d’opérateurs en Inde
Vers 1911. La couleur peinte au pochoir ajoute une note d’irréalité et d’abstraction. Filmcarte postale à expédier en Occident. Degrés divers d’interférence de la caméra coloniale sur
la vie des indigènes, comme instrument d’observation et de surveillance de la “couleur
locale”. L’attention porte sur le rituel du nettoyage et de l’épouillement réciproques.
Présence continue de l’épopée militaire, à Bombay, George V est couronné. Des défilés
d’hommes armés, à pied, sortent de la forêt.
6. Carte postale “mystique” d’Indochine
Le contraste est évident avec les formes de la parade militaire, de la chasse ou de l’imposition
religieuse : les bonzes marchent, légers dans leurs vêtements de soie, portant à la main
gauche les objets de leur culte. Détails précieux de la cérémonie de prise d’habit d’un bonze.
Les rituels sont la procession, le caractère magique de la musique du tambour ; la
distribution du riz aux jeunes bonzes ; l’apprentissage des textes sacrés. Images du début du
siècle, précédant les spoliations physiques et culturelles en Indochine.
7. Cartes postales exotiques de “France d’Outre-mer”
Tanger 1910, date incertaine. Catalogue filmique à la manière du “Journal” de Delacroix.
Delacroix en 1832 notait que les canons sur la citadelle étaient déjà rouillés. La caméra
121
analytique fixe les objets de l’exotisme : une tente qui flotte au vent, des burnous, des
regards, des chevaux et des cavaliers en bordure du désert, des comportements dans le
ghetto. Elle montre des boiteux, des nains, des chanteurs aveugles. Des porteurs et des
policiers armés de bâtons de déplacent sur fonds lointains de bateaux de guerre. Citation de
Flaubert : “Peu de stupeur devant la nature – paysage – ciel – désert. Stupeur énorme devant
la ville – des hommes. Horizons rêvés – plantes – sable – soleil plus que rues – maisons –
vêtements – visages.”
8. Gondar, Afrique-Orientale, 1910
Les références littéraires sont le Leiris de L’Afrique fantôme, Griaule. Au texte de Rimbaud
“Lettres d’Abyssinie” : “Satané pays” où “il blanchit un cheveu par minute”, s’oppose le texte
filmique dans se éléments : panorama des ruines coloniales portugaises, des châteaux de
Gondar, aspect de crèche en carton avec des palmes. Défilent en parade, sur fond, des ânes,
des chameaux, des zèbres, des autruches et des guerriers. La “fantasia africaine” est la
fantasia de la guerre. Le coup de feu de l’homme blanc donne départ de la bataille et
disperse hommes et animaux. La moisissure dissout cette procession fantôme ouverte par le
chef du village à cheval qui arbore sur sa chevelure aune aigrette blanche. Mussolini porte
une plume blanche semblable sur son front, à son entrée à Tripoli en son année
“napoléonienne” de la “prédestination africaine”, 1926. (On voit cette séquence dans la
section de la guerre.)
9. “Le Sphynx noir” du baron Franchetti
Ouganda 1920. Grosse chasse du Lawrence italien. Nous les trouverons tois dans un musée à
Reggio Emilia, les animaux tués par le baron. Empaillés, ils retrouvent les positions qu’ils
avaient dans le film, vivants ou morts. Dans le musée, le chien du baron est sur le dos du
rhinocéros, Luca Comerio consacre un plan américain à lui-même en train de viser dans la
savane et on le voit encore avec un enfant lion capturé. Parallélisme entre le “Sphynx noir” et
le”Sphynx blanc” : les mères sont tuées et les petits capturés. Géométrie des cortèges, des
défilés, des processions de chasse, qui précèdent les formes identiques des colonnes de
guerre.
10. La Première Guerre mondiale vue par Luca Comerio
Filmage pris dans les négatifs d’origine, dans les positifs de projection virés. Les soldats
tombent sur le Monte Calvario, en trois photogrammes, en six photogrammes dans l’eau de
l’Isonzo. Sur le Monte Calvario, la prise de vues est interrompue par la mort de l’opérateur.
La moisissure, dégradation chimique de l’émulsion de la pellicule, dessine des formes
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tourmentées sur les masses armée, efface les hommes et laisse intactes les rochers. Dans un
vallon, un troupeau de moutons compose l’inscription VIVE LE ROI. […]
in Trafic n.º 13, Hiver 1995
… au devenir-incendie de la mémoire
Sylvain George
[…] Les films des cinéastes Angela Ricci-Lucchi et Yervant Gianikian comptent, avec ceux
d’Antonello Bianca et Aldo Tambellini, parmi les plus significatifs du cinéma expérimental et
politique italien et mondial.
Leur projet cinématographique s’inscrit dans une relecture allégorique/critique de très
grande ampleur des présupposés philosophiques et politiques qui fondent notre modernité
depuis le 16ème siècle, et interroge dans le même temps la question de la théorie de la
connaissance en reprenant en charge la question des arts de la mémoire.
Leur œuvre prend principalement appui sur le remploi de films d’archive ou found footage
ou films-trouvés, à l’instar des “objets-trouvés” des surréalistes. Si cette pratique est
fréquente dans le cinéma dit “expérimental”, elle est “rarement accompagnée d’une théorie,
les artistes qui s’y livrent semblant plutôt se fier en général à leur intuition ou se suffire de
leur principe de base” (Jacques Aumont). Les Gianikian réalisent des mises en jeu
dialectiques, un programme singulier que fonde l’usage d’une “caméra analytique” : “Parce
que nous pensons que tous les maux du siècle sont contenus dans chaque boite de pellicule,
comme des vipères prêtes à mordre à nouveau. Nous cherchons le monstre tapi dans
chacune de ces images des années 10 et 20, ce sont des images prémonitoires qui annoncent
les catastrophes à venir, comme Orwell les avait annoncées dans ses livres” (Ricci-Lucchi et
Gianikian).
D’une clinique descriptive (les principes invariables des films des Gianikian)
Trois grandes étapes caractérisent ce schéma plastique établi sur la base d’un rapport
dialogique avec les “origines” du cinéma, ou virtualités non actualisées de celui-ci, les
promesses inaccomplies…
Première étape : rassembler les films d’archives : Il s’agit principalement d’archives en 16 et
35 mm qui proviennent du fond de Luca Comerio (1876-1940), un opérateur fasciste italien,
123
pionnier oublié du cinéma de “documentation”, et dont les films, réalisés entre la première
et la seconde guerre mondiale, “reflètent tous une vision proto-fasciste d’après la première
guerre mondiale. Des héros italiens partent à la conquête du vaste monde...”. Et par ailleurs
d’archives qui proviennent de fonds nationaux ou locaux américains, français, italiens,
russes, arméniens (propagande militaire, archives d’origine scientifique, archives de
voyageurs…).
Le deuxième geste de cette première étape consiste après les avoir rassemblés, à restaurer et
à restituer l’intégrité physique première des matériaux (reconsolider les collures,
reconstruire les perforations manquantes).
Seconde étape : classer : L’opération consiste à examiner attentivement les photogrammes, à
l’aide de la table de montage ou bien, comme cela fut le cas pour le film qui nous occupe –
la pellicule ayant rétréci – à l’aide d’une loupe. La structure et les chapitres du film de
Comerio sont alors repérés et examinés de même que le contenu de chaque séquence, et ce
jusqu’au détail le plus infime, le plus ténu, le plus fragile. Le projet du film Du pôle à
l’Equateur apparaît alors : une vision proto-fasciste qui vise à montrer la grandeur de la
nation italienne à la fin des années 20.
Puis vient le second geste de l’étape qui consiste à établir un nouveau découpage du film à
partir des chapitres étudiés et ce, afin de donner une forme nouvelle en deux chapitres.
Troisième étape : Re-filmer : Les deux chapitres nouvellement définis vont être ensuite
“analysés”, et vont donner lieux à une nouvelle “suite” composée de dix nouvelles
séquences. Ces séquences seront ensuite montées par “blocs et par thèmes”. Dans chacun
d’eux, “les éléments constitutifs reviennent sous des formes et des aspects différents,
récurrents.”
Pour ce faire, Angela Ricci-Lucchi et Yervant Gianikian vont se doter d’un nouvel outil, une
“caméra analytique” qui va leur permettre de re-filmer le négatif original et préciser encore
plus leur méthode. Suivant ce que les cinéastes souhaitent souligner dans telle ou telle
séquence, la vitesse du déroulement de la pellicule peut varier, fluctuer : des ralentis,
rarement des accélérations… La caméra “travaille”, “analyse” et explore les séquences, en
retient une, la décompose, met en lumière certains détails que renforce la mise en valeur des
couleurs des photogrammes ou leur recoloration par le rajout de couleurs primaires
essentiellement, de complémentaires quelques fois : rouge, bleu, jaune, ocre...
Dix nouvelles séquences seront ainsi obtenues par le biais de la caméra analytique-critique,
qui délivrent les sujets filmés de la gangue idéologique qui les emprisonnait, et les restituent
à leur pleine intégrité. Rendre justice.
124
Pour exemple, la séquence10 : La première Guerre Mondiale vue par Luca Comerio . Sur les
flancs du Mont Calvario, la prise de vue est interrompue par la mort de l’opérateur. Des
soldats tombent sous le feu des balles et… fondent : “La dégradation chimique de la
pellicule dessine des formes tourmentées sur les masses armées…” Dans un vallon, un
troupeau de moutons compose l’inscription “vive le Roi”.
La technique compositionnelle que nous avons très rapidement esquissée répond à un
“usage analytique” du matériau-trouvé. Refilmer et pénétrer dans la substance des films
permet de travailler, re-travailler, et de transformer le mouvement même des images. Cela
participe de l’élaboration d’une écriture plastique, éminemment physique, extrêmement
fluide, et qui revêt une dimension critique : il s’agit en effet de “déconstruire les images de
propagande et démontrer, dans le même temps, la puissance du documentaire durant la
Première Guerre mondiale”. Il s’agit de “chercher les individus, “les hommes-soldats, dans
les archives cinématographiques qui ne montrent que des masses anonymes”.
Cette technique compositionnelle donne ainsi lieu, aboutit à un “voyage”, une “archive
d’archives”. Ou bien encore à un catalogue de gestes, entre expérience et expérimentations
ainsi que nous le verrons, et qui fait écho, de façon plus ou moins proche ou lointaine, à des
gestes tout aussi singuliers et révolutionnaires. Comme premiers exemples : L’Atlas
Mnémosyne d’Aby Warburg, le Paysan de Paris d’Aragon, le Livres des passages de Walter
Benjamin, le très beau et méconnu projet de Rossellini La lotta de l’Uomo per la sua sa
opravvivenza et plus précisément la douzième partie consacrée aux évènements de mai
1968 partout dans le monde , Evolution of a Filipino Family de Lav Diaz, et dans une
moindre mesure la revue Documents de Georges Batailles et les Histoire(s) du cinéma de
Jean-Luc Godard…
Le principe du catalogue avait déjà été utilisé par les Gianikian dans la première phase de
leur œuvre lorsqu’ils travaillaient sur les films parfumés. Mais, il en va sans doute
différemment si le cinéma cesse “d’être l’instrument de saisie et de visibilité de divers
catalogues pour devenir catalogue lui-même” (Raymond Bellour). Rappelons que les
catalogues – que chérissait Diderot, et dont l’Encyclopédie est une variante – mettent en
œuvre un art combinatoire (selon le rêve de Leibniz, mais aussi de Giordano Bruno,
Raymond Lulle… ou encore Louis-Auguste Blanqui, Raymond Roussel…), et permettent
d’établir des combinaisons, des comparaisons, des interconnections dialectiques entre des
éléments que tout peut séparer, éloigner à priori, entre des “objets” qui peuvent se situer à
des intervalles différents. Le catalogue permet de consigner des éléments de savoir, et de
faire interagir ces différents éléments les uns avec les autres. Il rapproche ou éloigne. Il
favorise tout en rendant visible des opérations de montage. Il démontre que le savoir et la
connaissance sont des constructions de sens qui résultent, essentiellement, surtout, du jeu
des extrêmes et des polarités.
125
Tel qu’envisagé par les Gianikian, le sens philosophique du found footage serait ainsi à
trouver dans une recombinatoire à visée démythologisante, qui effectuerait une stase critique
à l’endroit des régimes “transparents”, fascismes passés, présents et à venir, à l’industrie
culturelle, aux rêves “hollywoodiens” de Caligari et Mabuse.
Les concepts traditionnels de l’esthétique (création, génie, valeur d’éternité, mystère, etc.),
utilisables d’emblée pour les buts du fascisme, ne doivent-ils pas être impérativement évincés
du champ de la pensée ? A l’ “esthétisation du politique” (Walter Benjamin) ne faut-il
substituer la “politisation de l’art” ? Ce renversement dialectique n’exige-t-il pas un autre
usage de la technique en même temps qu’une critique de l’apparence ?
Serait-ce à dire qu’Angela Ricci-Lucchi et Yervant Gianikian, en reprenant à la base la
“machine de guerre” des Lumières, poseraient à nouveau la question de la connaissance,
d’une méthode cinématographique pour accéder à la connaissance, ou plus précisément de
la “nécessité” d’une nouvelle théorie de la connaissance cinématographique fondée sur la
mémoire et le montage ? Le cinéma comme lieu de montage de gestes, c’est-à-dire d’images,
de blocs de temps et de mouvements, hétérogènes, anachroniques, et qui engagerait une
conception et une écriture de l’histoire non téléologique et linéaire ? L’optimisme du
rationalisme des Lumières, de la révolution bourgeoise ou l’espoir marxiste de la Révolution
qui déboucheraient sur la fin de l’histoire ne doivent-ils pas être irrémédiablement congédiés
au profit d’une nouvelle conception de l’origine et du temps historique, de l’écriture de soi,
d’une écriture de l’histoire adialectique dans lequel l’Autrefois se télescope avec
l’Aujourd’hui et ce, afin d’honorer, pour reprendre la formule de Stendhal, une “promesse
de bonheur” ?
Le cinéma comme art combinatoire : un espace d’image comme lieu de la multiplication des
mondes et de leur exposition ? […]
Le cinéma des Gianikian réalise le “véritable état d’exception” que Benjamin appelait de ses
vœux. Il est une réponse aux nombreuses zones d’exception que réalisent les sociétés figées,
mythiques, prises dans les rets de l’origine, de l’archaïque, du progrès… ce que nous
appellerons l’immanentisme chronologiques du fascisme et d’autres sociétés transparentes,
sociales-démocrates, libérales.
Le cinéma d’exception saisit l’histoire à rebrousse-poil au lien de se laisser porter par elle ou
de nager dans son sens. Il met en jeu une écriture de l’histoire, dans l’histoire, à
contretemps, qui ouvre le réel – en le retournant, tel un gant – le critique, le mortifie,
l’allégorise pour mieux en saisir teneur de vérité. Il pratique une césure, messianique, du
“mouvement” dialectique des phénomènes et des choses (en termes hégéliens). Contre
l’éternel retour du même et son cortège de catastrophes, il interrompt le cours du monde
selon une dialectique à l’arrêt qui donne à lire un véritable mouvement : la restitution
126
intégrale du passé, l’abolition de la société de classe, de la domination de l’Homme sur
l’Homme, de l’Homme sur la Nature.
En effet, les “politiques incendiaires” se trouvent ruinées et subverties par de fragiles bouts
de pellicules en décomposition, défigurés et ravagés par l’oubli. Re-filmées, ralenties,
surimpressionnées, colorées, répétées, arrêtées, montées, remontées de façon disjonctives,
“parataxiques”, les images d’archives (images inflammables, de nitrate, récupérées pendant la
guerre pour en faire des bombes), “analysées” , cataloguées, pensées dans toute leur
matérialité, trivialité, par les Gianikian, brisent les continuités et font exploser l’Humanisme
classique qui voit en l’Homme le dépositaire des attributs de Dieu. Et parmi-ceux-ci le plus
précieux : le pouvoir de créer et de faire qu’un monde existe. A l’humanisme classique se
substitue l’humanisme réel (Walter Benjamin) ou a-humanisme, à l’humanité, l’inhumanité,
à l’homme logo-centré, l’homme ex-centré, au concept de création, celui de destruction. Au “
choix du grand” dessine la figure du sujet-petit, une “souveraineté de l’exil”, un “caractère
destructeur”, un roi de carnaval à l’écoute de la plainte de la Nature, jusque là silencieuse et
muette. Un sujet-traducteur (Walter Benjamin). […]
in “Le peuple qui vient : gestus du cinéma prophétique (la communauté des amis étrangers)”, Histo.art n.º
2 (Travaux de l’école doctorale histoire de l’art), 2010
On From the Pole to the Equator: interview with Yervant Gianikian &
Angela Ricci Lucchi
Scott MacDonald
Few filmmakers exemplify the idea of a "critical cinema" more clearly than the Milanese
collaborators Yervant Gianikian and Angela Ricci Lucchi, who see their mission as retrieving
and examining the cinematic artefacts of the ltalian past and critiquing them from the other
end of the century these artefacts helped to introduce. That this process has generally
involved slowing down the filmed material they work with, first, so they can study it frame by
frame, and then, so that viewers can see it, not frame by frame, but slowly enough to profit
from the painstaking examination Gianikian and Ricci Lucchi have conducted, has a specific
(and local) reference: Futurism, an artistic movement that was centred in Milan and
characterized by a fascination with motion and especially speed. The fact that Futurism was
to become one of the pillars of Italian fascism makes a critique of it crucial, especially since,
as Gianikian and Ricci Lucchi are well aware, fascist ideology is hardly a thing of the past.
127
Indeed, their explorations of the cine-artefacts they collect are often inspired by current
events reminiscent, to them, of the particular histories that produced Mussolini, Hitler, and
the Turkish genocide of the Armenians (in 1915), as a result of which Gianikian lives in Italy
as a second-generation Armenian immigrant. As filmmakers, Gianikian and Ricci Lucchi have
always been fascinated with the past and with memory. […]
For From the Pole to the Equator, Gianikian and Ricci Lucchi built a special "analytic"
camera. With this device Gianikian and Ricci Lucchi recorded 347,600 frames from Luca
Comerio’s original From the Pole to the Equator (the completion date i unclear; Gianikian
and Ricci Lucchi estimate the late 1920S) and From various other films in Comerio’s
collection. The result transforms the original material – In general, artefacts of imperialism:
missionaries "educating" natives, big-game hunters in Africa, British military parades in lndia
– so the viewers not only see the original imagery and its original intent (to testify to the
superiority of white, European civilization) but see through the imagery to the human beings
looking back at these cameras from within their own complex cultures.
When people ask you what kind of films you make, or what your mission as filmmakers is,
how do you describe your work? Of course, you are collectors of early film imagery (and
other artefacts), and you explore this imagery. Are you cine-archaeologists?
Gianikian: Somebody might define us that way, but I don’t like the term...
Ricci Lucchi: Something is missing.
G: We are interested in an ethical sense of vision. A project is usually born from our reading
film images.
You mean from exploring the material you’ve collected?
G: Yes, in very controlled ways. It’s something like vivisection. We write down what happens
in each frame, how many frames are in each shot and sequence. We are very precise.
Do you both do this exploration?
G: I begin, but she is always following the work, so she knows everything about it. She takes
part and contributes many important things. She often does other kinds of research as well.
Really, we work together, but in different ways.
R L: It depends on the topic, and whether I am interested. My first job is to know, very
deeply, the historical time period of the material we want to explore – all the things in the
world that might affect this topic.
128
G: For the sections on Africa in From the Pole to the Equator, we read all the books on the
subject, all the French writers, as well as the Italians, and not only scholarship, but explorers’
diaries.
Karagoez-Catalogo 9.5 was your first long archival film. It developed out of the collection
you found in 1977. Are you always collecting material? And do particular films develop out
of particular collections?
G: It’s not as conscious as that, though it is true that Karagoez was born from a collection of
fiction films, and From the Pole, from a collection of documentaries. But in Pole we made a
choice not to mix fiction with documentary. The Comerio collection included both.
We are always looking for new material, because we’re always looking for new meaning, and
new ways of reading imagery.
You used "vivisection" to describe your exploration of film imagery. Is your interest in
exploring the image in such detail partly a desire to see how a fascistic way of seeing has
developed in cinema in general? One could argue that popular cinema and television in
general tend to be reactionary – not only in what is shown, but in the way in which viewers
are asked to use their eyes. In order to watch your films, one must learn to look in a
completely different way. Most popular films and TV shows simply ask you to consume
images. By slowing down the process of consumption, you force us to think about that
process.
R L: It’s not just that you can think about our movies; you must come inside each frame. We
force you to think about the operations we have performed on the original material.
In what year did you acquire the Comerio archives?
R L: After a tour in the United States in the winter of 1981, we found From the Pole to the
Equator in an old lab in Milano.
G: At the time, I was looking for materials about travel, about exoticism and war. I was
thinking about the film on Gustav Mahler [Das Lied von der Erde: Gustav Mahler], from the
Adorno text [T. W. Adorno, Mahler (Frankfurt am Main: Suhrkamp Verlag, 1960)]. We had
known there was an old film lab in Milano. We went there, met the man in charge of the lab,
and in time we became friends. During that time, we were almost the only visitors to that lab.
We paid nearly all the money we had to get the Comerio materials. At the beginning, the man
was very mysterious about Comerio, but soon we discovered he didn’t know very much and
didn’t understand the cultural importance of the material. In 1982, he gave us some tapes –
129
recordings of conversations with the cameramen of World War I – made for radio many years
ago: the tapes included Paolo Granata, Luca Comerio’s first cameraman during World War I
(granata in Italian means "cannonball"!).
R L: We continued to collect materials from the lab until 1985, when it closed. The owner of
the lab (he and his wife were the only workers) was the nephew of Granata.
During fascism Granata was the most important cameraman of the fascist Institute Luce in
northern Italy. Over the years, the nephew had taken over Comerio’s place: the space, the
films. The nephew was also a cameraman. His first shot was the hanging of the body of
Mussolini in a square in Milano in 1945. The nephew remembered the last visits of Comerio
to the lab.
How much Comerio material was at the lab?
G: The lab had many underground spaces. At the beginning it was impossible to understand
how much material was there.
There was a kind of stratification of film materials, we realized later. There were early
materials filmed or collected by Luca Comerio. There were fascist films shot by Paolo Granata
(in which there are traces of Comerio) during the twenties, thirties and forties. And there was
religious material filmed by the nephew in the fifties and sixties. The film materials were
records of three different times: the time of the King, the time of fascism, and the more
recent time of the Vatican.
The Comerio collection was very large: there were thousands of meters of material –
documentaries from the beginning of cinema, travel films, ethnography, scientific materials,
and World War I material. Except for a few rolls, there was almost no trace of the fiction films
listed in Comerio’s filmography. That material had disappeared, or had been collected by
cinematheques. There was no interest here in the documentaries. From the Pole was in two
cans, six hundred meters each, in a wardrobe in the room where the nephew filmed titles
with the old camera Comerio used during World War I. The nephew had offered From the
Pole to the cinematheque in Milano for a reasonable amount of money, but they wanted it
only as a gift!
Had you known about Comerio for a long time before acquiring his films?
G: It is difficult to explain the sensation I had when I saw the two reels of From the Pole for
the first time. The color of the tinted materials! I saw only a few meters, but it was enough. I
didn’t know the film was by Comerio. I didn’t know who Comerio was. We discovered that
every intertitle was signed by Comerio in superimposition: "Comm-Luca Comerio, Milano
130
Cinematografia." Later we found a book, very superficial – but the filmography was useful. By
juxtaposing the filmography and the images, it was possible to recover Comerio’s life and
travels.
In 1985, the man at the lab gave us the Comerio materials about fascism, thousands of
meters of film, and also a group of stills, some signed by Comerio, of Comerio during the
fascist demonstrations. By the thirties, Comerio himself was very ill and in a state of amnesia.
Is the original, Comerio version of From the Pole to the Equator still in existence?
G: It’s in our home. Before the erosion wipes out the image, we hope to find a way to make a
35mm copy that’s absolutely faithful to the original.
Tell me about his film.
G: The film is tinted positives. We think a complete negative never existed. It was an ignored
film, not even mentioned in Comerio’s filmography.
The original film is divided into four sections or chapters: the first begins with the intertitle,
"La vita animale per perpetuarsi deve lottare E VINCERE!" ["To survive, animal life has to
fight AND WIN!"].
The intertitles, almost ten minutes of the total length, were written by Gabriele
d’Annunzio, the "soldier-poet."
When was Comerio’s From the Pole to the Equator made?
G: We don’t know the exact date. At the end of the twenties, we think, at a time when his
career was almost finished. The "Cameraman of the King," the pioneer of Italian cinema, feels
himself overcome by the new technology of sound. He writes letters to Mussolini, trying to
find a job in the new Institute Luce, the institute for Italian fascist documentary. He may have
edited From the Pole in the hope that it would secure him a job.
R L: Comerio is not an avant-garde filmmaker like Dziga Vertov. He was a capable
moviemaker, but not experimental at all. He became a proto-fascist because he wanted to
make movies, and the only way to make movies was to come inside the Regime. He wanted
work. There’s a letter written by Comerio to Mussolini, asking to work for him at Institute
Luce: he writes not as a political supporter, but as a family man looking for work.
How similar to what we see in your film was the original From the Pole?
131
G: There are differences in both content and technique. The Comerio film is, as I said, twelve
hundred meters, 57 minutes. Our film is longer: 101 minutes (96 minutes on television).
The Comerio film is divided into four chapters. In our film there are ten sections. Of the
original four chapters, we used part of the second (the South Pole material) and almost all of
the third (Uganda, 1910) for two chapters in our film: the chapter about the missionaries and
the chapter about the big-game hunt. The other seven sections of our From the Pole come
from Comerio’s personal archives.
The slow motion of our version is the opposite of the extremely fast movement of the
original. Our slow motion changes: it is not constant for every sequence. Sometimes it
changes inside a sequence. Slow motion becomes emphasis, the rhythm of memory.
All the materials from the archives, including those from the original From the Pole, are first
generation prints. The definition was good enough (though in many parts the emulsion had
been attacked by the mold) and the 24mm x 18mm aspect ratio of the silent frame made it
possible for us to see hidden details, without losing too much definition. Sometimes we
recomposed shots, as we did with several portraits of army generals and the eyes of a blind
man in Tangier. Except for the animals in the first chapter, close-ups don’t exist in the
original From the Pole, or in the other material from the collection. Usually we step inside
the individual frame, to get closer to it and to isolate details.
What about the colour?
G: Sometimes we used particular filters to reinforce the original colours or sometimes to
change them completely. The train material in the beginning had lost its original colours,
except for some traces near the perforations. In the original From the Pole, the intertitles are
blue and the writing is white. The name, "Comerio," is superimposed in dark blue. The
original first chapter ("The Eternal Fight," the animals’ struggles, which we didn’t use) is
tinted different colours, except for a cock fight, which is hand painted. The original "White
Sphinx" chapter, about the South Pole, is blue and sepia for some animals and dark red for
one or two sequences in the interior of the ship. The third chapter of the original film is
generally sepia (we used various colours). In the fourth chapter of the original, which we
didn’t use, the colours change from sequence to sequence. In the original film, there is no
use of negative; all the imagery is positive; in some cases, as you know, we print from the
original negative stock that was in Comerio’s cameras. We use negative symbolically.
Decay is more or less evident on ail the surfaces of both the original From the Pole and the
rest of the Comerio collection. Instead of trying to eliminate all the mold, we decided to use
it as an analogue. In some sequences of the war, the decay on the film cancels out the men
but not the rocks (and in some cases, the color of the mold was red). At the end of the East
132
Africa material, we used the mold as a fade out to white-at the end of the parade of the
inhabitants of the village.
How does your editing differ from Comerio’s?
G: Each chapter of Comerio’s film started with a d’Annunzio title, and each sequence or
group of related sequences was preceded by an intertitle, which was illustrated by what
followed. The intertitles are key in the first From the Pole to the Equator; they reflect the
ideology of d’Annunzio and [Filippo Tommaso] Marinetti (not the young avant-garde,
futurist artist Marinetti, but the older Marinetti, who went into the hierarchy of fascist
power).
Our From the Pole is arranged according to "themes" in which elements reappear in different
forms and aspects. In preparing the project, we discovered – in the original From the Pole
and in the other materials – recurring motifs. There are parades and processions (military,
religious, hunting); dance (rituals, dances of death); war landscapes (trenches, for example);
crowds and other groups; and particular types of people: the priest, the warrior, the
"savage," the hunter, the mystic, the traveller, the conqueror. These became the motifs in our
film and they are arranged in parallels and contrasts. Elements in each of our chapters are
references to elements in the next chapter. The parade of the English cavalry at the
coronation of George V in one chapter parallels the mystical religious parade-the procession
of the bones-in the next chapter. A contrast is evident between the African kids conditioned
by a culture not theirs and the Indian kids smiling.
We reread, rewrote, re-edited the original Comerio film, overturning the original meaning
and ideology. Our film was centred on the metaphor of amnesia: the amnesia of Comerio’s
last years, the general "amnesia" about primitive cinema, and the desire of early audiences
for exotic spectacles, which reflected their dreams of conquest and cultural pillage (their
"amnesia" about early cultures). When we analyzed the frames of Comerio’s film, we were
irritated and disturbed by Comerio’s sanctification of imperialism, colonialism and war. We
wanted to make a film on the violence of colonialism as it plays itself out in different
situations and spheres.
In the original From the Pole, the animals killing other animals in the first chapter is a
"necessity of life." By applying this morality to people, it was possible (for Comerio) to justify
the violence of the man who kills not only for necessity but for the pleasure of affirming his
own power and will. We removed the last chapter of the original film, "Victory of Man": its
images and intertitle are hymns to strength, courage, sport, war, nationalism, maternity, and
religion – the last two, the Catholic blessing of the first elements. Our ending sequence, the
man-rabbit-dog sequence, is the "key" to our film: it reveals violence for play, violence with
133
no possible justification. We are not sure the shot of the man, dog, and rabbit is by Comerio.
We do know that the man in the shot is [Giacomo] Puccini; the place, Torre del Lago.
Were you able to distinguish between what Comerio shot and what he collected?
G: Yes, though in our film we used both. A very large part of the archive is about World War
I. It was shot by Comerio, the only one to have the army’s permission to film the war. He lost
the permission during the second part of the war; there were too many deaths in his films
and the battles he recorded were often lost. The first part of the war could be seen as a game
– for example, the hundreds of soldiers trying to push the enormous cannon to the top of
the mountain – but later, this was not possible. At the end of the war Comerio did film the
celebration of victory in Trento near the Dolomites.
In the archive, the war materials were in small reels of ten, twenty, or thirty meters or
sometimes in separate sequences of less than one meter. All the positives are tinted, and
some of the negatives. There is only one reel of positive, four hundred meters, edited, with
intertitles (from this reel we took the war scenes with the mold damage).
We started our film by re-shooting and re-editing the war material. In our From the Pole, we
included a shot of Mussolini on his horse entering Tripoli in 1927 (it is after the cavalry in
the matte with the monument of the King on his horse). The shot is not by Comerio but by
Institute Luce. We wanted to show what would be the future of the Italians.
In his filmography, we discovered that Comerio started to film in 1898. There is a short
Comerio film about the funeral of King Umberto who was killed by an anarchist (Bresci) in
Monza in 1900. The catalogue of the films of the Lumière brothers lists a film with this title.
Monza is very near to Milano and it is possible that Comerio worked for Lumière in those
years. All the Comerio films on Lumière stock are about Milano. At the turn of the century,
there was only one filmmaker in Milan other than Comerio: Vittorio Calcina.
The original train material was about ninety-eight meters, exactly 5,044 frames. We excluded
a section filmed, not from the train, but near the railway. There’s no indication that that
material is by Comerio, but perhaps it could be his From Geeschenen la Andermatt [1909].
We do not think Comerio traveled in the Caucasus. For our Caucasus chapter, we used two
different source materials. The sequences of the train were made in Tiflis, probably in 1904,
during the re-conquest of the town and of Georgia by the czarist army (we used only one
sequence of the Russian cavalry with armor). For the second section, we used a separate film,
of the czarist officers in white uniforms and the native men and women dancing. The place
seems to be in central Russian Asia.
A very large part of the Comerio collection was about India. The material includes many
different originals: some Gaumont (the English cavalry material), some Pathécolor (the hand
134
painted materials), and some on the Italian stock, Ferrania (the travels of the cameraman
with the Cook agency). Granata’s nephew told us that in the last years of his career Comerio
went to India. But it was impossible for us to be sure the Indian material was by Comerio.
[…]
Are you always working on several projects?
G/R L: No. We are slow workers and like to work on one project at a time. From the Pole
took four years. People, Years, Life [Uomini, Anni, Vita, 1990] two years, and we wanted
more time for that. People, Years, Life was begun before the Berlin Wall came down, and was
first projected on the Wall the night after the start of the Gulf War.
Suppose someone were to say, "Your work is not really film art, because it simply represents material that was already there." How would you respond?
R C: We use ready-mades. We transform the old into the new.
G: By changing the speed, the colours, the meaning, we make the film new. By "old" and
"new," we don’t just mean the physical material of the film. It’s a question of meanings also:
the old means in a new way.
ln our new film, Italian Archives (No. 1) [Archivi Italiani (n. 1): Il fiore della razza (The
Flower of the Race), 1991], we consider the relationship between sport and war, as it was
during fascism, but also as it is today. We started this new film when the Gulf War was just
over. The relationship between Then and Now is always central to our films.
in A Critical Cinema: interviews with independent filmmakers, Berkeley, University of California Press,
1998
135
Susana de Sousa Dias
O fascismo nunca existiu: entrevista com Susana de Sousa Dias
(e Ansgar Schäfer)
Chris Wahl
O teu último filme chama-se 48. Este número representa o período de 48 anos da ditadura
fascista portuguesa de 1926 a 1974. Daqui a 12 anos, 48 anos depois da Revolução dos
cravos, qual será a imagem da ditadura na memória geral dos Portugueses?
SSD: Acho que será uma imagem difusa porque nós temos vindo a assistir, nestes últimos 36
anos, a um processo não só de esquecimento como também de branqueamento. Há um
texto muito interessante do Eduardo Lourenço que se chama O Fascismo Nunca Existiu e
que foi publicado em 1976, portanto dois anos logo após o fim da ditadura. Este texto fala
do problema da memória e do facto de já nessa altura se estar a recalcar o período de 48
anos. Eu li o texto há alguns anos e fiquei estupefacta por o Eduardo Lourenço ter detectado
tão cedo os sintomas do que de facto viria a acontecer. Daqui a 12 anos suponho que vai
haver ainda mais releituras com o objectivo de reabilitar a imagem do ditador, de dar uma
imagem ligeira do que foi a ditadura.
E tu tentas opor-te a este processo?
SSD: Sim, claro. Nos meus filmes, trabalho com fragmentos daquilo que permaneceu –
imagens de arquivo, testemunhos orais. Pretendo iniciar um trabalho em que incluo também
objectos de outra ordem – mas nunca na perspectiva de trazer à luz uma verdade única, de
descobrir como foi o passado e trazê-lo para o presente. Trabalho com ‘coisas vivas’: uma
imagem tem um tempo cristalizado nela, mas está sujeita aos múltiplos tempos que a
atravessam e que a vão transfigurando. Uma das minhas grandes referências é Georges DidiHuberman que diz que a ideia de um facto do passado como facto objectivo é uma ilusão
teórica. Um facto do passado é sempre um facto de memória. É a partir do presente que o
passado é analisado, mas também temos que compreender como o passado vem até nós. Eu
não procuro a verdade daquilo que se passou num momento preciso, mas quero abarcar
também todo esse movimento que vem do passado até nós e que está na memória das
pessoas que hoje falam desses acontecimentos mas também nas próprias imagens.
136
Além do teu interesse na memória, qual é a tua motivação pessoal para fazer filmes sobre
a ditadura portuguesa? Tens alguém na família que tem sofrido com a ditadura?
SSD: Tenho uma pessoa na família, o general Sousa Dias [1865-1934], que fez a primeira
revolta contra a ditadura [1930, Ilha da Madeira]. De facto, foi preso no Tarrafal antes de o
Tarrafal ser um campo de concentração e morreu no exílio [Mindelo]. Mas isto é um passado
longínquo, não é uma memória que esteja presente. O que me leva a fazer estes filmes são
essencialmente três momentos: nos anos 80 estudei na Escola Superior de Teatro e Cinema e
depois, porque fiquei insatisfeita com o curso, fiz Artes Plásticas na Faculdade de Belas Artes.
Acabado este curso, recebi, já nos anos 90, uma encomenda de um produtor para fazer um
episódio para uma série de televisão sobre a história do cinema português, neste caso, sobre
os anos 1933 a 1945. Durante este trabalho comecei a conhecer a cinematografia do meu
país porque na Escola de Cinema falávamos sobretudo no cinema português a partir dos
anos 60. É fascinante quando uma pessoa começa a descobrir a história do cinema através
dos arquivos – neste caso, o ANIM [Arquivo Nacional das Imagens em Movimento] – e por
meio de um percurso mais liberto de constrangimentos académicos. O contacto com o
arquivo e com as imagens produzidas pela ditadura, para além dos filmes de ficção, foi um
momento para mim crucial, ou seja, marcou o início do meu interesse pelo Estado Novo.
Depois, em 2000, fiz o filme Processo-Crime 141/53 – Enfermeiras no Estado Novo. As
enfermeiras não podiam casar no tempo da ditadura e algumas foram mesmo presas. Foi o
momento em que entrei no arquivo da PIDE/DGS [Arquivo Nacional da Torre do Tombo],
onde vi os álbuns de reconhecimento de presos políticos. São grandes álbuns que só têm
imagens de cadastro. Rostos. Nada mais. Depois descobri toda uma série de imagens no
arquivo do exército onde fui na mesma altura. No fundo, estes são os três momentos que
mais me marcaram: a descoberta da cinematografia portuguesa do tempo da ditadura, as
imagens do exército do período da guerra colonial e os rostos dos presos políticos da PIDE.
Então, estes rostos, estas fotografias estão na base dos teus três filmes sobre a ditadura
portuguesa?
SSD: Não, no Processo-Crime utilizei-as da forma mais banal que uma pessoa pode utilizar
uma imagem de arquivo. A própria Natureza Morta é quase uma reacção contra ProcessoCrime, contra o documentário narrativo no sentido tradicional do termo: conta-se uma
história, os historiadores vão contextualizando, as imagens vão aparecendo. No fundo, no
Processo-Crime, acabei por utilizar as imagens dos prisioneiros – sim – mas não foram elas
que estiveram na base do filme, somente ilustram algumas situações: alguém fala, foi preso, e
eu ponho a imagem da pessoa que foi presa; ou foram presas muitas mulheres e eu ponho
uma série de imagens de prisioneiras políticas. Ainda por cima, tive problemas de
produção... Portanto, quando acabei de fazer esse filme, decidi que nunca mais iria dizer:
137
não gosto deste filme porque o produtor não me deu os meios para eu fazer o que queria.
Decidi fundar a minha própria produtora e ter o controlo total sobre os meus filmes. Isso foi
para mim um facto muito importante. O outro foi que fiquei muito insatisfeita com a própria
forma como tinha usado a imagem de arquivo no filme. E o Natureza Morta, portanto, é uma
coisa radicalmente diferente. No fundo, considero-o o meu primeiro filme.
Como descreves o passo que deste entre Processo-Crime e Natureza Morta, onde já aparecem
quase todas as fotografias que usaste para 48, mas ainda com outras imagens da ditadura
(por exemplo: Salazar, desfiles militares, tumultos nas ruas de Lisboa, a guerra nas
colónias, a Revolução dos cravos)?
SSD: A ideia da Natureza Morta era mostrar a vida da ditadura e, em certa medida, o seu
reverso. Ou seja, mostrar o outro lado da ditadura através de imagens de arquivo, com a
dificuldade dessas imagens, na sua maioria, terem sido produzidas pela própria ditadura.
AS: A oposição não tem imagens por definição.
SSD: O regime quer divulgar uma certa mensagem com aquela imagem, mas, por vezes,
dentro da imagem encontra-se outra coisa, qualquer coisa que desmente essa própria
mensagem. E eu, na Natureza Morta, fui à procura desses sintomas dentro das imagens.
Encontrei, por exemplo, uma sequência com soldados a rodear um grupo de meninos
africanos que estão a dançar. Os soldados sorriem, marcam o ritmo em harmonia com as
crianças. Ouvimos a música, uma música muito empolgante, ouvimos a locução que diz que
os soldados estão a fazer um excelente trabalho nas colónias. Se tirarmos a música, se
tirarmos a narração e observarmos apenas a imagem, começamos a ver o rosto das crianças,
começamos a ver uma coisa completamente diferente. Todo o princípio da Natureza Morta
foi esse: tentar perceber o que podia estar dentro das imagens. Muitas vezes, as informações
interessantes estão no segundo plano e para se conseguir ver o que está lá atrás, tem de se
tornar a imagem mais lenta e decompô-la através de reenquadramentos. O filme tem 72
minutos, mas a duração original das imagens de arquivo que utilizei é de doze minutos
apenas.
O que representa o macaco que escolheste como imagem inicial: O povo adestrado?
SSD: Um dos princípios do filme é não reduzir a imagem a uma leitura apenas. Mas eu posso
dar-te a minha motivação pessoal para pôr este macaco. Para já, acho que é uma imagem
poderosíssima, muito rica, que pode ter um leque imenso de leituras. Mas a minha razão
pessoal é que eu tive dois tios que estiveram na guerra colonial e um deles trouxe um
macaquinho igual àquele. E se tu falares com Portugueses que eram crianças nessa altura,
encontras imensas memórias de macaquinhos. Toda a gente conhece alguém com uma
138
história de macaquinhos. É o momento do filme em que a minha memória pessoal se toca
com a memória colectiva. Essa é a minha razão privada.
Qual é a ligação entre os dois filmes, Natureza Morta e 48? Quiseste contar mais sobre as
pessoas nas fotos?
SSD: Quando fiz o Processo-Crime, vi as imagens de cadastro dos presos políticos e pedi
autorização para as filmar. A autorização foi imediata e filmei as imagens que quis. Mas
quando comecei a preparar a Natureza Morta, em 2003, e pedi autorização para filmar as
fotografias, uma coisa muito simples julgava eu, a resposta foi negativa; é que entretanto a
direcção do arquivo tinha mudado. Entrámos em pânico. Tentámos falar outra vez com os
responsáveis do arquivo, e disseram ok, sim senhora, pode ter autorização desde que consiga
a assinatura de cada um dos prisioneiros ou, no caso de terem morrido, tem de ir à procura
dos herdeiros e tem de apresentar a certidão de óbito... O problema é que naqueles grandes
álbuns havia imagens, mas não havia nomes porque os nomes estavam no verso, na parte de
trás da fotografia, mas não nos deixavam virá-las. E, por outro lado, havia os documentos
escritos, cheios de texto mas sem imagens.
AS: Como não era possível saber os nomes das pessoas nas fotografias, tivemos de mudar
completamente de perspectiva. Dissemos assim: vamos à procura de pessoas que tenham
sido presas e vamos pedir-lhes as autorizações para depois usar as fotografias dessas pessoas.
E assim conseguimos, através de amigos, também de amigos de amigos, de historiadores, do
Partido Comunista, etc.
E aí começa a história do 48?
SSD: Pois. Uma coisa é obter a assinatura, outra é começar a perceber, a falar com as
pessoas. E falei com muita gente... Posso dizer que neste processo houve três imagens que
me deram a ideia para fazer o 48: a imagem da mulher do sorriso, a Maria Antónia – fiquei
estupefacta quando a vi. Não é uma imagem que se possa pôr num filme sem a
contextualizar. Portanto, não podia aparecer na Natureza Morta que é um filme sem
palavras. E a história por trás daquela imagem é uma história extremamente interessante, do
orgulho familiar de uma jovem estudante que é presa e que tem uma expressão como se
tivesse sido colocada no quadro de honra; outra imagem foi a da Conceição Matos que está
vestida com o pulôver que, no fundo, foi o pulôver que limpou o chão no momento da
tortura. Todo o rosto dela já reflecte o tempo que passou na prisão; e por fim a imagem do
Manuel Pedro. Quando falei com ele para lhe pedir a autorização, contou-me que a fotografia
em que tem cabelo era posterior àquela em que está careca. A careca, no fundo, era um
disfarce. Com estas três fotografias comecei a perceber que havia aí um filme a ser contado.
139
Parece que Natureza Morta é um filme baseado na imagem de arquivo, da qual tentas
arrancar uma verdade ou um significado pelo uso do ralenti e do reenquadramento, e que
48 é baseado no som, nas vozes dos presos sobreviventes que enchem as fotos de vida.
Falam como se fossem os fantasmas da história portuguesa. Foi uma decisão consciente?
SSD: A ideia do filme era mesmo partir só de fotografias porque a intenção é pôr o
espectador a olhar para aquela fotografia, ser obrigado a confrontar-se com o preso politico.
No começo da Natureza Morta surge a imagem do macaco, o genérico e logo a seguir
surgem os presos políticos que nos olham directamente, ou seja, há uma espécie de
confrontação directa com o espectador. Eu aqui [48] queria, além disso, pôr o espectador a
ver as imagens de cadastro com um segundo olhar. E porque não pus as imagens das
pessoas? Por uma razão muito simples: se mostrasse a pessoa a falar no presente sobre uma
coisa que aconteceu no passado e depois mostrasse a imagem do passado, teria
automaticamente uma clivagem temporal. E toda a ideia do filme é trabalhar o tempo de
outra forma. A memória é passado, mas ela vive-se e constrói-se no presente. A fotografia foi
captada num tempo passado, mas é também um objecto do presente que incorpora todo o
‘futuro anterior’ de que fala Barthes.
Eu diria que num filme a banda sonora é responsável pela empatia do espectador com
aquilo que se passa na tela. É por isso que o som mais abstracto do que concreto em
Natureza Morta abre uma distância entre as imagens e o espectador, enquanto 48 é um
filme bastante emocional. Tiveste a impressão de que era preciso personalizar e concretizar
o terror da ditadura?
SSD: Natureza Morta, no fundo, foi construído segundo a noção de exposição, no sentido
mais lato: como acção de colocar as obras para serem apreciadas, mas também de exposição
à luz, de revelação, de apresentação temática. A ideia central foi, em vez de construir uma
narrativa linear de causa e efeito, pensar o filme como se fosse uma exposição em salas. E a
música do meu irmão – que tem uma duração original de oito minutos – serviria como
criadora de espaços, de locais: a sala do Estado Novo, a sala das colónias, a sala da guerra. 48,
claro, é diferente porque tem as vozes e tem a experiência pessoal. Mas também tenho o som
como construtor de espaços; aparentemente, o 48 é só imagem e voz, mas não é. Tem um
trabalho imenso sobre o som. E se não fosse esse som, o filme não era um filme, era um
álbum. Todo o som está trabalhado de forma a que se ouça a presença corporal das pessoas
que falam; aqueles sons a que ninguém liga nenhuma e que são completamente secundários,
aqui são fundamentais. Eu não mostro a imagem da pessoa hoje, mas estou a dá-la de outra
forma, pelo som e pela sua presença física. Para além disso, cada prisioneiro tem a sua célula,
140
tem o seu ambiente sonoro. Portanto, no fundo, o que eu fiz no 48 foi definir o espaço
cinematográfico através do som.
Nestas células ouvimos uma grande variedade de sons: o trânsito na rua, uma sirene de
polícia, o tiquetaque de um relógio, uma serra eléctrica. De onde vêm estes sons? Onde
falaste com as pessoas?
SSD: Na altura, quando comecei o filme, pensei que teria que entrevistar as pessoas no
estúdio para ter a voz limpa. Mas não é a condição ideal, levar uma pessoa para um estúdio.
E começámos a fazer tudo no próprio arquivo da Torre do Tombo, onde se encontram as
fotografias. Mas era muito barulhento, sobretudo por causa dos aviões e, para além disso,
percebemos que perturbávamos o curso dos trabalhos do próprio arquivo. Fizemos aí duas
entrevistas, mudámos e perguntámos às pessoas onde queriam ser entrevistadas: algumas
escolheram a própria casa, outras deixaram ao nosso critério, mas tivemos sempre muito
cuidado com o som. Uma das pessoas que entrevistámos em Moçambique tinha um relógio
de pulso de metal que abanava de vez em quando. Primeiro pensei: vou tirar o relógio. Mas
depois: não. Porque com o andamento do filme fui percebendo que o som caracteriza a
pessoa e, sobretudo, como já tinha começado a montar, apercebi-me que os ruídos eram
absolutamente essenciais. A partir daí comecei a tomar outra atenção aos sons. Uma das
características da Sofia, a terceira personagem, é o relógio de parede que ela tem na sala que
faz tiquetaque, tiquetaque, tiquetaque e ouve-se muito. Ela morava no rés-do-chão, portanto
ouvem-se também alguns carros, poucos, mas quando entra um, tem uma grande
preponderância. Todo o som foi trabalhado nesse sentido: cada espaço foi caracterizado
pelos próprios sons que o habitam.
Em La Jetée [1962, Chris Marker] há um curto momento famoso em que dos fotogramas
isolados nasce um movimento (a mulher na cama que abre os olhos). Em 48 introduziste
também espécies de movimento: fusão para o negro, zoom...
SSD: Susana: Sim, claro, há também muito trabalho a nível visual. A imagem foi um grande
problema porque eu tinha pensado em utilizar a imagem fixa. A questão é que tu vês uma
imagem fixa alguns segundos, já recebeste a informação e então descolas, já não olhas, ou
melhor, já não vês. Toda a dificuldade do filme foi essa: Como colocar o espectador a olhar
sempre para a imagem, a vê-la, sem se descolar dela? A Rosa, por exemplo, fala cerca de oito
minutos, tem três imagens só, ou seja, três planos. Mas as imagens nunca estão fixas.
AS: Trata-se de micro-movimentos.
SSD: São movimentos manuais. Não fiz um scan, as fotografias foram mesmo filmadas, e eu
estipulei uma série de movimentos mínimos. Depois, na mesa de montagem, trabalhei com
141
ralentis. Portanto apliquei os mesmos princípios da Natureza Morte: ralenti,
reenquadramento e fusão a negro.
Vocês mexeram as fotografias durante a filmagem e depois alongaram estes movimentos
com o ralenti?
SSD: Não, são movimentos de câmara.
AS: Tens de ver o filme em DVD no modo acelerado, e vais ver os movimentos.
SSD: No fundo trata-se de operações tão antigas quanto o próprio cinema. Houve uma
pessoa que viu o filme antes de estar pronto e disse: “Ai, estes morphings estão tão
esquisitos!” Mas não são morphings, porque o morphing altera a natureza da imagem. São
simples encadeados.
No fim do filme, quando falam as pessoas africanas, vemos uma imagem escura que
parece ser fotografada num campo de concentração, e, de repente, a escuridão é iluminada
por uma luz. O que é isto?
SSD: No início, a questão africana não entrava no filme, mas depois cheguei à conclusão que
tinha de entrevistar prisioneiros africanos, porque a tortura a que eles eram submetidos era
muito específica. Mas confrontei-me com um problema: é que não existiam fotografias. E
decidi incorporar a ausência da imagem, incorporar a própria questão dos arquivos no filme.
No exército havia uma imagem que tinha visto na altura da Natureza Morta e que me ficou
sempre na memória. Foi uma imagem de vigilância feita pela tropas portuguesas durante a
guerra colonial. Estão a fazer um varrimento do terreno, onde supostamente se esconde o
inimigo, com um foco luminoso. E depois há um contra-campo que filmou esse foco a fazer
o varrimento. Não são imagens que fui buscar, de uma paisagem que achei muito
interessante, mas vêm do contexto. Isto para mim é fundamental nos filmes: não há imagens
gratuitas.
Então não é uma fotografia.
SSD: Pois, é o único momento em que aparece uma imagem animada, que eu torno muito
lenta.
AS: A duração original é de poucos segundos apenas.
SSD: Há outra coisa: O primeiro prisioneiro começa a falar sobre o negro. Mas no fundo este
negro não é sempre um verdadeiro negro, é também a imagem de uma noite, é o momento
antes do foco aparecer. Esse negro começa por invadir todo o ecrã mas depois há momentos
142
em que o desenquadro, vê-se a linha branca do ecrã, a janela de projecção. Quando a
paisagem aparece, é uma paisagem que se inscreve numa superfície, não é uma paisagem
onde ‘se entra’.
Um dos dois presos africanos conta que a PIDE o forçou a inventar que teria sido treinado
na URSS como especialista de sabotagem. Mas não chegamos a saber o que os presos da
PIDE tinham feito na realidade. Só em alguns casos se entende que eram membros
clandestinos do Partido Comunista. O que sabemos hoje sobre a PIDE e os presos da PIDE?
SSD: Há muito poucos livros sobre a PIDE. Em 2007 foi publicada a tese de doutoramento
da Irene Pimentel que é basicamente o primeiro grande trabalho sobre o assunto, para além
do da Dalila Mateus que se centra na acção desta polícia nas ex-colónias. Relativamente aos
presos: no filme fiz mesmo um corte. Concentrei-me mesmo dentro da prisão. O que se
passa antes, não faz parte deste filme, vai fazer parte de outros. O que se passa depois,
também fará parte de outros. Fiz deliberadamente esse corte. Interessava-me trabalhar a
relação com os agentes da PIDE, sobretudo dentro da prisão. As acções que a PIDE cometeu
sobre o corpo e a mente dos prisioneiros, o que é viver dentro de um sistema repressivo. O
filme não identifica as pessoas, só as identifica no final, porque não queria fazer um filme
sobre cada uma das pessoas especificamente. Procuro, através delas, transmitir uma realidade
muito mais abrangente e que ultrapassa as experiências de cada uma especificamente. Se eu
fosse entrar na história pessoal de cada uma delas – porque é que foi presa, quais foram os
motivos – ia sair do enquadramento do filme.
Há famílias inteiras que foram detidas e torturadas. Num caso, falas com um casal que
durante muito tempo foi brutalmente separado. Pessoalmente, fiquei surpreendido com a
quantidade de mulheres entre os presos políticos no teu filme. É representativo?
SSD: As mulheres tiveram um grande papel na resistência à ditadura. Muitas vezes ficavam a
proteger as casas clandestinas. Há uma mulher no filme que viveu 17 anos na
clandestinidade. Se não fossem as mulheres a ter este trabalho de cuidar da casa, de defender
a casa, parte da resistência, da luta clandestina, não teria podido existir. Mas em termos de
protagonismo político, este acaba por ser nulo. São figuras invisíveis.
AS: Viver na clandestinidade quer dizer estar num estado de vigilância 24 horas sobre 24
horas. Mas esse é um papel desrespeitado. Não se fala dele.
Parece-me que havia um sistema de tortura especialmente criado para combater mulheres,
baseando-se mais na humilhação do que na violência física e mais na destruição de
relações do que na destruição do corpo. É verdade?
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SSD: Sim, havia uma tortura específica para as mulheres. E utilizavam muito a chantagem
com os filhos. O grau de violência física dependia da classe. As camponesas e operárias eram
tratadas de forma muito mais violenta.
Achas que o Estado Novo teve medo do poder das mulheres?
SSD: O Estado Novo, por um lado, privilegiou a família, a mulher no lar, mas isso era só para
uma certa classe e, no fundo, tratava-se de propaganda. As operárias, as camponesas estavam
todas a trabalhar nas fábricas e no campo. É muito contraditório. A questão das enfermeiras,
por exemplo; é uma lei única, no panorama das ditaduras, a proibição das enfermeiras
poderem casar. É uma especificidade contra as mulheres.
Para um preso político, as duas únicas possibilidades de resistência na cadeia,
aprendemos no filme, são calar-se e controlar a expressão quando se tira uma foto. Não foi
uma libertação retroactiva para eles poderem falar contigo sem que os rostos deles
interessassem?
SSD: Mas todos foram filmados.
Ah, foram filmados, só que não usaste as imagens. Mas foi a primeira vez que falaram
sobre as suas experiências?
SSD: Tenho várias situações. Tenho a situação de pessoas que já falaram muito, tenho a
situação de pessoas que falaram pela primeira vez e tenho a situação de pessoas que falaram
já, mas que contaram coisas que nunca tinham contado. Quando converso com uma pessoa,
converso sobre a vida toda. Portanto, as entrevistas são longas. No 48 só aproveitei uma
pequena parte. Filmei especificamente para o 48, mas há uma pessoa que fui buscar a um
outro filme que estou neste momento a montar. E há várias pessoas que estão no 48 que vão
aparecer noutros filmes que vou fazer.
Então, quais são os próximos filmes que vais fazer?
SSD: Falei com a Georgette, que é a primeira personagem do 48, em 2000 durante a
preparação de Processo-Crime. E ela contou-me qualquer coisa muito especial sobre o
mundo feminino da época em que era jovem, o mundo das mães e das avós. Um mundo a
que não temos qualquer acesso a não ser através da memória destas pessoas. Desaparece,
não há documentos, nada. Desde que comecei a estabelecer uma relação com ela quero fazer
um filme sobre o seu núcleo familiar, três irmãs que foram presas simultaneamente. É um
dos meus próximos projectos. Outro chama-se Luz Obscura, é um filme sobre os filhos dos
144
clandestinos que estou a montar agora. No 48, a seguir à Georgette aparece o Dias Lourenço
que esteve 18 anos na prisão; é aquele que diz que nunca daria o prazer à PIDE de o ver com
o rosto de torturado. Fiz essa entrevista pensando em dois filmes: em 48 e em Luz Obscura.
Este último parte também de uma fotografia de cadastro que aparece na Natureza Morta. É a
única fotografia de cadastro que existe no Arquivo da PIDE, de uma mãe com um filho, tinha
dois anos e meio na altura. A mãe suicidou-se. Fui à procura do filho. O filme parte da
história dele.
E qual é o próximo passo que vais fazer neste filme?
SSD: É trabalhar sobre o rosto da pessoa hoje. Um dos grandes problemas deste filme é a
questão da entrevista. Porque eu acho que em certas condições a voz apaga a expressão,
apaga o rosto, e o rosto apaga a voz, a palavra. Há sempre um duplo efeito de apagamento
na situação de entrevista. Estou a trabalhar sobre essa disjunção mas ainda não tenho
soluções. E também trabalho sobre as fotografias de cadastro, mas só de pessoas que já
morreram, ou seja, de pessoas que não podem falar. O que resta da memória delas hoje? O
sistema pode aparecer semelhante, mas é radicalmente diferente de 48.
A mulher no 48, que até hoje tem vergonha de ter sorrido quando a PIDE tirou uma foto
dela, também diz que a verdade do Portugal em que ela vivia revelou-se exclusivamente
em gestos mínimos. Parece-me emblemático para os teus filmes: a verdade sobre Portugal
revela-se em gestos mínimos.
SSD: Sim, sim. Tentei várias versões desta ideia de gesto mínimo ao extremo. Já na questão
do material em Natureza Morta sucedeu o mesmo; vi centenas de horas de imagens no
arquivo, comecei a montar sobre vinte horas dessas imagens, a primeira versão do filme
incorporou 45 minutos de imagens de arquivo e depois de um ano consegui chegar a doze
minutos. Este princípio foi também válido para as dezenas de horas de entrevista que tinha
para 48. Na estrutura final do filme, cada prisioneiro só entra uma vez num determinado
sítio. Mas não é cronológico, obviamente. Por acaso, o último prisioneiro foi um dos últimos
a ser preso, já nos anos setenta, e a primeira foi presa nos anos quarenta. Natureza Morta
tem uma macroestrutura cronológica – ascensão do Estado Novo, guerra colonial, 25 de
Abril –, mas por dentro faço uso do anacronismo. Dentro da mesma sequência, tenho planos
de épocas completamente diferentes. Foi mesmo um princípio deliberado com que trabalhei,
um dos princípios fundadores do filme, aliás, e em 48, no fundo, acaba por ser o mesmo.
Há duas mulheres que aparecem duas vezes.
145
SSD: Sim, mas só falam uma vez. Nos outros momentos aparecem porque alguém fala delas.
Uma delas, a Alice, conta o quase-suicídio da mãe. Não tinha contado essa história a
ninguém. O que me impressionou imenso foi que ela conta qualquer coisa sem
efectivamente contar, sem dizer as palavras. Estamos a apanhar a informação duma outra
forma, através de ‘gestos’ para-linguísticos mínimos.
Alguns dos interrogados dizem literalmente que depois de serem postos em liberdade
encontraram exactamente a mesma situação na sociedade fora dos muros:
insensibilidade, hipocrisia, receio... Quer dizer que contar a vida dos prisioneiros políticos
e o comportamento da polícia na cadeia é um modo de descrever a atmosfera geral no país
sob a ditadura?
SSD: Sim, é. Quando falei com as pessoas, as histórias mais fortes que começaram a aparecer
foram sobre a tortura. Decidi que esse seria um dos temas centrais. Outro tema mais fundo,
que é dado também através da experiência dentro do próprio espaço prisional, é o do
sistema repressivo; trata-se de mostrar como é que um sistema repressivo domina não só os
prisioneiros mas toda a sociedade. Na Natureza Morta, a figura central é Salazar. Está sempre
no vértice. Em 48, Salazar é referido só uma vez. O que está agora em questão é todo um
sistema repressivo cuja parte mais visível – no filme – é a policia política. Depois, na
construção da narrativa, trabalhei com conceitos directores: o poder, a identidade, a
máscara, entre outros. Um outro aspecto sobressaiu no conjunto dos testemunhos, o do
reconhecimento: de si, do outro mas também dos outros em relação à própria pessoa. Uma
imagem fotográfica levanta sempre a questão da indexicalidade. Normalmente, a imagem está
pela pessoa, a fotografia de cadastro, sobretudo, contém na sua base a ideia da máxima
semelhança anatómica. Mas o que se passa com estas fotografias é que muitas vezes os
prisioneiros não se reconhecem nelas. Ou não reconhecem as pessoas que lhes são
próximas. Para além disso, encontrei muitas outras situações de não reconhecimento, como
o caso do próprio prisioneiro torturado que não se reconhece no espelho. E depois há os
disfarces que se põem, as máscaras reais, mas também as metafóricas, que se referem a toda a
sociedade. Estes foram aspectos estruturantes do filme.
Natureza Morta foi uma co-produção luso-francesa, mas 48 foi feito sem apoio francês.
Podes explicar as circunstâncias da produção dos teus filmes? Qual é o papel da família,
visto que o teu marido faz a produção e o teu irmão o som?
SSD: Quando faço essas entrevistas, muitas vezes estou a tocar em assuntos muito delicados.
Se houver uma coisa que as pessoas digam e que depois não querem que utilize, não utilizo.
No Processo-Crime tive uma situação destas. O problema é que o material depois não ficava
comigo, ficava com a produtora, e já não tinha controle. Em termos éticos, isto para mim era
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muito desconfortável. A nossa produtora Kintop, que fundámos depois do Processo-Crime,
também é outra forma de nós garantirmos que o material fica connosco e está protegido.
AS: É também por isto que as pessoas têm tanta confiança na Susana.
SSD: Para 48, desde o início que decidimos pedir apoio ao ICA [Instituto do Cinema e do
Audiovisual] mas a mais ninguém. Natureza Morta foi uma co-produção franco-portuguesa.
Conseguimos logo um produtor francês que é o Xavier Carniaux. Através do Carniaux,
conseguimos o apoio da ARTE e depois o apoio do CNC [Centre National de la
Cinématographie], todos franceses. Pensamos então – ingenuamente – que era fácil
conseguir o resto em Portugal com este dinheiro garantido. Mas não conseguimos nada. O
ICA, na altura, não nos deu apoio, a RTP também não, o Instituto Camões também não, os
arquivos também não, ninguém nos deu apoio. Foi mesmo horrível.
SSD:: Tudo só foi possível por causa da estrutura familiar de que falaste. Não recebemos
nada, trabalhámos em casa.
SSD: O meu irmão estava a fazer o doutoramento na Universidade de Paris VIII, e fez lá, no
estúdio de som, a música para Natureza Morta. Tudo sem qualquer dinheiro português.
Quando o filme já estava pronto, a Fundação Gulbenkian deu-nos um apoio para a
promoção do filme cá. O que vale é que o nosso sustento económico não vem dos filmes. Eu
dou aulas na Faculdade de Belas-Artes, o meu sustento vem daí. Tenho também um trabalho
de investigação, estou fazer um doutoramento que incorpora a prática dos filmes.
AS: Eu sou bolseiro e faço um doutoramento sobre documentário histórico e, assim, posso
usar parte do meu tempo para produzir filmes documentários. Ligamos a teoria com a
prática.
Como foi a colaboração com a ARTE?
SSD: Natureza Morta foi muito discutido na ARTE. Eles no princípio reagiram à ideia do
filme não ter palavras, reagiram mesmo aos princípios formais intrínsecos do filme. Foi muito
duro.
Mas isto não prejudicou o filme.
AS: Não. Acho que há poucos documentários portugueses que foram convidados para tantos
festivais internacionais como a Natureza Morta. Circulou em cinco continentes. E ainda
continua a circular, as últimas exibições foram na Turquia e no Brasil, há um mês atrás.
SSD: Na verdade, as discussões com a ARTE beneficiaram o filme. A questão da Natureza
Morta é interessante porque o que aconteceu foi que o filme ficou pronto e a ARTE exibiu-o
logo. Portanto, a partir daí foi recusado numa série de festivais. Foi recusado cá também, no
147
DocLisboa, no Indie, foi recusado em todas as fases, da produção até à distribuição. Ficou
alguns meses mais ou menos parado.
AS: Quando o produtor francês ouviu que a ARTE ia mostrar o filme disse: “O filme está
morto. A Natureza Morta morreu. Acabou.”
SSD: Depois foi mostrado num festival no Canadá e no Doc’s Kingdom, em Serpa. Acabou
por ser programado para o DocLisboa desse ano. Ganhou o prémio de distribuição, foi para
a Finlândia, quer dizer: de repente o filme começou a viajar. E ainda não parou.
48 foi então feito exclusivamente com dinheiro do ICA?
AS: Sim. E com o apoio do ICA vem automaticamente o da RTP. Mas falamos de pouco
dinheiro relativamente às horas de trabalho. Foram dez meses de montagem, e isto é só a
montagem. Com 48, logo desde o princípio foi claro que era impossível vender esta ideia a
alguém: imagens fixas, seis minutos de negro etc.
SSD: Decidimos logo que íamos fazer tudo entre nós, tal e qual como queríamos. Não quis
fazer concessões.
Tens a impressão que o país está pronto para os teus filmes ou é preciso fazer um desvio
através de festivais internacionais e prémios franceses?
SSD:A questão de 48 é muito estranha.
AS: Em França o filme foi mesmo muito bem recebido. Já foi mostrado seis vezes, cá em
Portugal apenas duas vezes em oito meses. Passou no DocLisboa, mas ninguém falou do
filme, a não ser o Amir Labaki, que escreveu a primeira crítica no Brasil.
SSD: Foi mostrado três vezes em São Paulo e duas vezes no Rio, no festival “É tudo verdade”.
As discussões com o público foram interessantíssimas. Houve entrevistas, críticas, o público
escreveu-me e-mails, portanto não tem rigorosamente nada a ver com o que se passa cá.
AS: Fomos entrevistados pela própria RTP, que co-financiou o filme, quando ganhámos o
Grand Prix no Cinéma du Réel em Paris. Só que essa entrevista não foi mostrada logo, mas
um mês depois, no 25 de Abril, num magazine sobre a comunidade portuguesa em França.
Um mês depois! Foi o primeiro filme português que ganhou esse prémio.
SSD: Fico surpreendida porque é um filme que lança um tema que merecia ser discutido.
Não querer discutir talvez seja uma característica nossa que vem dos 48 anos de ditadura.
148
O que faz falta
Regina Guimarães
Falando curto e grosso: 48 é um filme que fazia falta. Fazia falta num país onde, como
indignada e amargamente uma das resistentes entrevistadas por Susana de Sousa Dias
sublinha, os agentes da PIDE-DGS tiveram direito à protecção zelosa de um aparelho de
justiça apostado em branquear o cadastro dos criminosos, nem que isso implicasse denegrir
as pessoas das vítimas vivas e injuriar a memória dos mártires mortos.
Pois claro, 48 fazia falta num país em que os contornos de um passado recente, marcado pela
prática quotidiana da violência e pela insidiosa instilação do medo, tendem a esbater-se, a
ponto de ter sido possível um concurso – para o qual grandes meios mediáticos foram
mobilizados – atribuir ao criminoso-mor o estatuto de “melhor português de sempre”.
Contudo, a falta que este 48 surgido por “entre as brumas da memória” nos fazia ecoa tanto
mais poderosamente quanto, de facto, é “falta” que sentimos, uma vez volvida hora e meia de
confrontação com fragmentos de testemunhos, com farrapos de vozes testemunhando, com
o cilício dos muitos silêncios, com o difícil reconhecimento dos rostos congelados pelos
próprios “protagonistas”, de várias e perversas maneiras desapossados das suas caras, corpos
e crenças.
Foi talvez preciso hiper-esteticizar o cortejo de imagens para diferir do contexto de
desumanidade em que aquelas fotografias foram tiradas, obviamente contra a vontade dos
retratados, mas ainda assim convocando todas as fileiras da vontade de resistir, como a dada
altura confidencia um dos entrevistados. Foi talvez necessário extrair do caos emocional,
mental e moral das memórias de cada um a quintessência das palavras que se reportam ao
capítulo da humilhação e da ofensa: tortura física, maus tratos psicológicos, manipulação
afectiva, aniquilamento moral, etc. Foi porventura útil enfatizar a heroicidade de uma galeria
de cidadãos que preferiram suportar, até ao limiar da alucinação e da loucura, até às portas
que separam da morte e a fazem desejar, os piores horrores e terrores em vez de ceder às
ameaças e aos actos dos torcionários. Foi decerto uma opção estilística plenamente
consciente das suas consequências entrecortar os pedaços de depoimento com silêncios
densos de ruído e gritantes de vazio, fazer entrar as vozes em solene derrapagem ou na
rasura da incerteza, a fim de que o fora de campo se tornasse mais avassaladoramente
habitado de pressentimentos. Porém, tudo isso – tudo isso acrescido do que se imagina ser a
penosa abertura das comportas perante os pequeninos clichés de má memória – apenas
contribui para que a tal falta se torne sensorialmente espessa e eticamente dolorosa.
Porque – e a ordem das razões aponta para o pau de dois bicos deste exercício no fio da
navalha – as pessoas cujo testemunho foi sabiamente retalhado, reduzido ao paroxismo de
149
um dizer que não pode ser ousado por comparação à tortura da lembrança e à lembrança da
tortura, todas essas pessoas que afirmam terem resistido possuíam motivos de grande
envergadura para o fazerem. E se, desafiando os limites do humano, resistiram lá dentro é
porque cá fora, desafiando as condições de possibilidade impostas pelo regime, também se
atreveram, activamente, a resistir. Da expressão desses motivos que mantiveram vivos os
recursos de resistência de um punhado de vítimas da opressão salazarista e pidesca, o
espectador não pode deixar de sentir falta. Em última análise, o silenciamento dos motivos
que é parte constitutiva do dispositivo de 48 pode soar como uma, mais uma, operação de
censura, infligida a pretexto de valores estéticos que mais alto se alevantaram.
Frente à dilaceração das palavras que 48 encena e encerra, por entre negros e negros,
qualquer espectador se sente abalado, combalido, comovido, imensamente desconfortável
com a perspectiva de que os gestos e actos relatados aconteceram mesmo, num passado não
longínquo, aos donos daquelas vozes. O carácter insuportável e intolerável do que ali se
conta configura uma verdade transpessoal. Absoluta, digamos. No entanto, a fraquíssima
sinalização do contexto historico-político e a ausência quase total de referência aos motivos
que moviam os resistentes coloca o espectador na estranhíssima situação de pactuar com um
dispositivo que prefere não correr o risco da dispersão dos afectos e da deflagração das
ideias. Mais do que abrir o leque daqueles sofrimentos que ninguém suporta em vão, Susana
de Sousa Dias fecha-os na caixa de ressonância das confissões. E quem se “vê” na situação de
“ver” o que apenas se ouve, algures por detrás fotografias que são fruto de roubo de imagem
e violação de pessoa, só pode sentir-se duplamente excluído de um entendimento mínimo
das dores e pavores em questão: porque não pode, evidentemente, ter deles vivência, e
porque as pessoas que os viveram não têm a ocasião de exprimir ali quais os modos de
resistência mental que lhes permitiram, contra tudo o que é expectável, manter a sua
dignidade, através da árdua prática do silêncio atirado à cara do carrasco. Ora, esse
entendimento mínimo deveria ser-nos pão para a boca.
Em tempos de ditadura, era eu uma catraia, havia lá por casa um poster – os posters eram
coisa bastante em voga nas famílias anti-regime e faziam as vezes de cartazes contra a
repressão dentro do espaço privado, já que na rua não podia ser... – com um poema do
Livro Sexto da Sophia de Mello Breyner. Os três últimos versos desse texto causavam-me
grande inquietação, embora na altura eu não conseguisse compreender porquê.
PRANTO PELO DIA DE HOJE
Nunca choraremos bastante quando vemos
O gesto criador ser impedido
Nunca choraremos bastante quando vemos
Que quem ousa lutar é destruído
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Por troças por insídias por venenos
E por outras maneiras que sabemos
Tão sábias tão subtis e tão peritas
Que nem podem sequer ser bem descritas
Se fizesse algum sentido resumir a primeira impressão que colhi do primeiro visionamento
de 48, ela giraria em volta de palavras para falar de uma inquietação, essa inquietação, a
inquietação de saber que as maneiras sábias, subtis e peritas da opressão – na verdade,
grosseiras, brutais e perversas – não podem, ao contrário do que parece pensar Susana de
Sousa Dias, ser bem descritas.
Posto isto, e para que não se depreenda de todos os meus senãos uma rejeição liminar e
injusta da presente obra de Susana de Sousa Dias, é-me imperativo acrescentar duas notas
finais altamente positivas. A primeira tem a ver com o lugar concedido às vozes femininas em
48, um lugar preponderante que não somente lança alguma luz sobre a forma como os
carrascos defensores da (sagrada) família utilizavam os laços de afecto familiar no âmbito da
sua actividade criminosa, como também contribui para esclarecer que a resistência
antifascista não encaixa no molde da virilidade, não coincide com o boneco da
masculinidade, barba rija e companhia. A segunda prende-se com a preciosa inclusão de
depoimentos que nos revelam a que ponto a actividade da PIDE-DGS nas chamadas
“províncias ultramarinas” era redobradamente violenta e assassina, sendo que pouco tem
sido dado a conhecer acerca desta faceta da intervenção da polícia política do salazarismomarcelismo. Embora eu não capte o propósito das imagens concretas utilizadas para
colmatar a ausência de fotografias nesse trecho do filme, há que reconhecer a força inaudita
dos antepenúltimo e penúltimo depoimentos. Uma força, também no sentido estrito, que
recentra pertinentemente a questão dos interesses subjacentes a um regime apodrecido cujo
derrube contudo tardou.
O “desfecho” de 48 é uma oportuna chamada de atenção para uma potencial prossecução
dos trabalhos de memória relativos à história negra da PIDE-DGS, tão imprescindível e
urgente quanto os que directamente podem testemunhar o farão à custa da dolorosa
convocação de lembranças impossíveis de apagar nas suas cabeças. Sob o ângulo de uma
retórica assente no pathos, esta é uma escolha de abrupta quebra de um contínuo crescendo.
Todavia, Susana de Sousa Dias faz aí, creio eu, uma opção ajuizada. 48 é o filme que fazia
falta porque fazia falta a falta que o fissura.
10 de Junho de 2010
151
Détournement de délits de faciès
Arnaud Hée, Camille Pollas
À en juger par le titre de son film précédent, Natureza Morta – Visages d’une dictature, le
dispositif élaboré pour 48 peut être considéré dans la continuité d’une volonté, celle de
donner une forme cinématographique à un épisode historique traumatique. Le Grand Prix
est visuellement composé de photographies anthropométriques de la police politique
portugaise (PIDE : Polícia Internacional e de Defesa do Estado), fer de lance de la dictature
de Salazar durant 48 ans, d’où le titre. La première couche du film est donc ce dialogue du
spectateur avec ces clichés policiers. Le premier émerge doucement d’un long fondu au noir,
de profil ; une figure spectrale venue du passé, l’effet est tout à fait saisissant. Sur ces photos
d’un temps révolu se greffent des voix du présent, des voix vieillies, traînantes et hésitantes,
parfois étouffées d’émotion. Les locuteurs peuvent aussi être pris d’un très vif emballement
de la mémoire pour dire l’ordinaire de la répression d’un régime en guerre contre tout ce
qui pouvait ressembler à un ennemi objectif. Ces paroles disent le pouvoir du bourreau sur
des corps humiliés, à disposition, les passages à tabac, la torture physique et mentale, des
méthodes atrocement universelles : privation de sommeil, électrocution, chantage, brutalités
extrêmes…
À partir de cette sécheresse initiale, Susana de Sousa Dias parvient à élaborer une œuvre
méditative d’une richesse cinématographique assez stupéfiante. Cela passe par le montage de
ces clichés policiers. Leur mise en rapport introduit une étrange idée, pourtant persistante,
celle d’unclichés policiers. Leur mise en rapport introduit une étrange idée, pourtant
persistante, celle d’un film d’animation en stop motion à un rythme extrêmement ralenti.
Chaque photographie est en effet reliée à la suivante par un fondu, au noir, ou enchaîné
lorsqu’il s’agit d’une même personne, par exemple en passant du profil au faciès. Sur ce
point, il se produit des moments troublants, desquels emergent des sensations
contradictoires, à la fois mortifères et remplies de vie. C’est notamment l’exemple d’une
personne pour laquelle deux arrestations sont intervenues à quinze ans d’écart. Le montage
révèle le travail de l’écoulement du temps tout en faisant quitter l’aspect mortifère de la fixité
à cet être également animé par sa parole du présent : les sévices n’ont pas eu raison d’une
force de vie insoupçonnable. Sur le même principe, une autre série montre la transformation
physique d’un même homme aux différents stades de son traitement policier, le visage de
plus en plus marqué et éprouvé, mais avec au présent un verbe un peu crâne en forme de
victoire sur la répression.
Il s’élabore ainsi une grande variété d’associations et de sens à partir de cette articulation
entre images fixes et paroles. Cela peut côtoyer l’impossibilité de se souvenir : “c’est moi,
mais je ne me souviens pas” dit l’un, “ce n’est pas elle” rétorque la voix d’un fils évoquant le
152
cliché d’une mère que l’on imagine décédée. 48 est en lutte contre l’absence de paroles, de
mémoires, d’images ; le métrage s’organise en une entreprise chirurgicale, des points de
suture administrés avec un matériau préalable extrêmement pauvre. Dans un geste étonnant,
autant par sa radicalité que son efficacité, Susana De Sousa Dias prend acte de la destruction
ou de la perte de certains fichiers, y substituant un écran noir constellé de quelques percés
lumineuses, laissant paraître un mystérieux paysage composé d’un arbre, d’un chemin, d’une
clôture. Le vide laissé par la disparition est total, mais l’absence n’échappe pas à une
représentation.
Les clichés et la parole forment un double portrait, celui d’une courageuse jeunesse rebelle ;
ceci culmine lorsqu’une inculpée se paie le luxe d’opposer un sourire éclatant, évidemment
provocant, à l’appareil photographique policier. “J’étais contente d’être emprisonnée”
confie-t-elle, bouclant ainsi un cycle familial d’opposition à la dictature puisque l’on
comprend que d’autres membres de sa famille ont subi les foudres de la PIDE ; elle s’est ainsi
rendue digne de sa lignée. Se superpose au présent une vieillesse vive, qui s’est relevée, non
sans douleur et traumatisme, de même qu’un pays qui a réussi “sa” révolution. Souvent
associé au registre comique, le détournement d’image est ici détonnant. En se réappropriant
ces clichés de la répression, la cinéaste tente et réussit une formidable entreprise de
subversion, qui consiste en cette revanche de voix un temps condamnées au silence. Le
rythme et le forme appellent à la méditation, ils permettent à l’esprit de déambuler à travers
différents strates d’espaces et de temps de la souffrance et de l’humiliation : des sous-sols de
stades d’Amérique latine par exemple, mais aussi les systèmes concentrationnaires, ou
encore des caves humides où furent entassés et abattus des résistants aux quatre coins du
monde. 48 est un formidable pavé dans la mare de l’oubli, faisant de la mémoire non un
devoir, mais un droit.
(Ré)composition. Cinéma du réel : bilan de la 32e édition, 6 avril 2010
Susana de Sousa Dias: 48
Tue Steen Müller
An academic film team would normally make me, a documentary addict, shiver with fear for
the outcome of 48, in this case no, for that simple reason that I had seen the team’s previous
film that perfectly combined the background of aesthetics, philosophy, history and music
with a creative intention.
153
And with a sense for image and sound, and the putting the two together. To convey with Still
Life. Faces of a Dictatorship (2005) the traumatic past of Portugal under Salazar. The film is
77 minutes long without any narration, built on archive from the 48 years between 1926 and
till 1974, when the carnation revolution happened. The archive includes news, war footage
from the colonies, propaganda films and photos of political prisoners. The musical score for
this film, by António de Sousa Dias, is exceptional, first you wonder why but then you see
what it does to the images, making a reflective distance and opens for a new both intellectual
and emotional interpretation.
The same is the case in 48 where the sound design is made to make space around the voices
of the political prisoners. But not only what they say come to the ear, also sounds of them
being in a room to be interviewed and other sounds, as far as I could hear(!) that are made to
match with the image and create the tense atmosphere.
Image after image, the prison ID´s, en face, profile left, profile right, faces of people looking
at you, and looking at the photographer, who in many cases took part in the infamous
torture conduct, described by the human beings behind the faces. They express anger and
dignity, how could they be like that? It is terrible to watch what they say, in your head you
make your own images. And then suddenly come voices that go for some absurd anecdotes
from the prison life. Relief and a little smile. There is a work with details in very refined ways:
A tiny light change in the photo is suddenly made, a fine almost imperceptible camera
movement, the face comes closer or moves away.
One woman has suffered a lot because she smiles on her photo. How stupid of me to laugh!
In the film context, the smile becomes one of defiance. In many cases there are more than
one photo of the same person imprisoned more than once. They normally remember the
photographic session. They remember the atrocities. They visualize them. In a way the film
builds one long monologue changing visually at the end with some shots from Moçambique,
a barbed wire fence, a tree, a camp – the prisoners talking did not have the photos any
longer.
Let me end with the words of Allan Berg, translated and edited from Danish: “The portraits
of the Secret Police appear calm and clarified for a long time on the screen. The ugly
operation has lent the beauty, dignity and authenticity of the models… the images are
carefully worked on so their aura become visible. The naked sound of the voices from the
conversations are treated like was it delicate music. So it becomes delicate music. It is about
the political crime of the Portuguese dictatorship… it is so horrifying and wild, and it is
conveyed with such a beautiful and calm clarification”.
www.cinereel.org / http://www.kintop.net/
154
155
Os Filhos de Lumière
Os Filhos de Lumière – Cinema, cem anos de Juventude 2009/2010
Teresa Garcia, Pierre-Marie Goulet
Porquê mexer a câmara? Uma questão que mais de 500 crianças e adolescentes se colocaram
este ano, realizando pequenos filmes em França, em Espanha, em Portugal, em Itália e na
Grã- Bretanha.
Cinema, cem anos de juventude, é um projecto experimental de educação ao cinema,
coordenado pela Cinemateca francesa que reúne cineastas, professores, salas de cinema,
associações e cinematecas dos cinco países participantes.
Os cursos que põe em prática nas escolas (ensino básico e secundário) permitem aos alunos
uma importante experiência de cinema com a realização de pequenos filmes, a partir de uma
questão diferente em cada ano e segundo regras do jogo comuns a todos os participantes.
Depois da cor (em 2008-2009) a questão sobre os movimentos de câmara foi o fio condutor
da reflexão e experimentação em 2009-2010.
A associação Os Filhos de Lumière coordena este programa em Portugal, em parceria com a
Cinemateca Portuguesa, desde o ano lectivo 2006/2007. Este ano participaram 4 turmas em
três escolas (duas na Escola Secundária de Serpa, uma na Escola Secundária Passos Manuel
em Lisboa e uma na Escola de Ensino Básico José Afonso em Alhos Vedros/Moita).
A 10 e 11 de Junho realizou-se a apresentação dos filmes finais de todos os grupos
participantes na Cinemateca Francesa em Paris. Acompanhados pelos professores e cineastas
que os orientaram, oito jovens de Serpa, Lisboa e Alhos Vedros estiveram presentes nestes
encontros – representando os 4 grupos que os realizaram – para apresentarem e partilharem
os seus filmes com os participantes dos cinco países envolvidos.
Nesta sessão serão projectados Julho de Darejan Omirbaev, um dos filmes que serviu de base
para analisar os movimentos de câmara, e 7 pequenos filmes realizados no âmbito do
programa em 2010.
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Julho – 22’ Darejan Omirbaev 1988 (Cazaquistão)
Vision (2’26’’) London Nautical School, Londres (Grã Bretanha) Year 8
Breakers (9’04”) I.S. Arte Calcagnadoro, Rieti (Italia) classe IV (niv 2º)
Os acordes da mudança (10’09”) Escola Secundária de Serpa (Portugal) 7º ano
O pavão (10’05”) Escola Básica José Afonso, Moita (Portugal) 8º ano
O amor em jogo (7’41”) Institut Castell d’Estela, Amer (Espanha) 4º ES0
Signes (5’27”) Collége Claude Debussy, Aulney-Sous-Bois Académie de Creteil (França)4-3
Ainda amo as rosas! – 7’47” Escola Secundária de Serpa (Portugal) Clube de Cinema
Aprender a olhar e olhar uma segunda vez: o documentário como
exercício
Inês Sapeta Dias
Em certo momento da nossa pesquisa, que segue o rasto do ensino do documentário por
entre escolas e pedagogias de diferentes raízes, embatemos numa experiência que, apesar de
não tratar directamente o documentário, parece lançar luz sobre o que de mais fundamental
existe na abordagem documental, no encontro do cinema com o mundo. O laboratório
“Cinema: cem anos de juventude”, levado a cabo, em Portugal, pela Associação Filhos de
Lumière, feito de experiências e exercícios que tentam sensibilizar as crianças (que em
Portugal vão dos 11 aos 18 anos) para a imagem cinematográfica, parece dizer-nos que o
documental talvez não seja mais do que olhar para as coisas que vemos todos os dias, e olhar
para elas outra vez, descobrindo aí o cinema. Preparando as crianças para o encontro
cinematográfico com esse mundo onde vivem, e provocando nelas uma outra maneira de ver
as mesmas coisas, e dizendo que essa preparação se faz deixando espaço e fôlego para o que
de novo se encontra, este laboratório ensina que o cinema se faz na abertura ao encontro e à
surpresa, e que o documentário está por todo o lado, nesse encontro.
“Cinema: cem anos de juventude” é isso mesmo, um laboratório. Vivido não só do lado de
quem faz os exercícios, e é guiado, as crianças; mas vivido também do lado de quem o
organiza. A experiência começou há 15 anos, pelas mãos de Nathalie Bourgeois, responsável
pelo Serviço Pedagógico da Cinemateca Francesa, e de Alain Bergala, coordenador
pedagógico do projecto. E em 2005 chegou a Portugal, com a Filhos de Lumière, que já
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desenvolvia uma série de acções pedagógicas dentro de um projecto chamado “Primeiro
Olhar”, onde era proposto às crianças que construíssem filmes de um minuto, o minuto
Lumière, feito de um só sítio, numa única tomada de vistas. Se a vontade de estimular os
olhos dos mais novos para a imagem cinematográfica era já qualquer coisa de muito forte e
concertado nessas primeiras acções, essa vontade parece ter-se tornado mais partilhada,
discutida, ampla e profunda com a participação da Filhos de Lumière no programa “Cinema:
cem anos de juventude”. Por várias razões. Por um lado, este programa mostra-se mais
claramente intricado na escola, faz parte do seu currículo (consiste numa disciplina incluída
na área de projecto ou de enriquecimento curricular do ensino secundário), o que resulta
numa possibilidade de acompanhamento das mesmas crianças durante um ano inteiro, e às
vezes por vários anos consecutivos. Em Portugal, o projecto é, então, encetado na Escolas do
Ensino Básico José Afonso em Alhos Vedros, Moita (8º ano), Escola Secundária de Serpa
(turmas de 7º ano, e um grupo no Clube de Cinema) e Escola Secundária Passos Manuel, em
Lisboa (uma turma de 9º ano). Por outro lado, o projecto é levado a cabo por vários países
europeus e isto resulta numa troca muito maior de experiências e maneiras de ver e viver o
cinema (inerente a cada uma das cinematografias dos países participantes), tornando o
projecto mais partilhado e amplo. Fazem parte do projecto, actualmente, escolas, que vão do
ensino básico ao secundário, em França, Espanha, Itália e, mais recentemente Inglaterra (e
há a vontade de abrir o projecto a mais países, inclusive de fora da Europa).
Há então um carácter muito forte de abertura, neste projecto. Vivido na troca entre crianças
de vários países, mas também na estrutura do seu trabalho individual, tal como é guiado
pelos adultos. É essa abertura que lhe confere o tal cariz de “laboratório”, e que faz com que
Alain Bergala defina o projecto como tendo uma “forte vertente experimental e de
vanguarda”: experimental porque nunca está nada decidido à partida (não há um programa
que se deve seguir), o que faz com que as crianças experimentem, mas os adultos que as
guiam também; e de vanguarda porque pretende abrir caminho e tocar outras experiências,
ser uma espécie de pedra atirada à água capaz de provocar um movimento autónomo,
desligado do centro, mas informado e provocado por ele.
Na prática como se desenvolve o projecto, e como se tornam visíveis estas suas vertentes?
Pierre-Marie Goulet e Teresa Garcia, cineastas responsáveis pela Filhos de Lumiére, explicamnos como tudo se processa.
Primeiro, todos os anos há um tema específico que permite organizar o material pedagógico,
e orientar os olhos das crianças confrontados muitas vezes pela primeira vez com o cinema –
são exemplos de temas desenvolvidos, desde que o projecto foi trazido para Portugal, “a
figura e o fundo”, “ponto de vista”, “cor”, e, agora em 2009/2010, “movimentos de câmara”.
Esse tema é trabalhado pelos adultos – professores das escolas participantes e cineastas que
encabeçam o programa – num primeiro encontro na Cinemateca Francesa onde Alain
Bergala lança pistas sempre discutidas por todos os intervenientes. É nesse primeiro
158
encontro que se decide o rumo a seguir durante o ano, e que material pedagógico servirá de
base ao trabalho. Esse material está sempre fundado na escolha de fragmentos de filmes e
filmes inteiros, e durante a acção pedagógica, já com as crianças, é destes fragmentos* e do
seu visionamento que saltam as questões teóricas – não há problema que não salte de um
filme ou pedaço de filme visto por todos, adultos e crianças. Nesta fase os cineastas voltam a
fazer perguntas e a pesquisar sobre questões fundamentais, e a relembrar problemas iniciais,
obrigando-se a voltar ao princípio (exigência depois continuada durante os encontros com as
crianças, que obrigam a isso, com as suas perguntas). Pelo seu lado, os professores são eles
próprios confrontados com um cinema que desconheciam, retirando dele o seu lado
utilitário (“como pode este filme servir as minhas aulas?”), e olhando-o como objecto de
estudo em si, passando por um processo de descoberta e encontro. A descoberta, o
“laboratório”, a experiência começa, então, desde logo aqui, no trabalho prévio levado a
cabo pelos adultos.
Depois deste primeiro encontro na Cinemateca Francesa, segue-se a troca de materiais
pedagógicos entre as entidades intervenientes, começa-se a trabalhar com as crianças, fazemse os primeiros exercícios orientados para o trabalho do tema. Em Março, a meio do
processo, volta-se à Cinemateca Francesa onde se apresentam os resultados dos exercícios, e
se discutem as dificuldades sentidas, os pontos onde será preciso ter mais cuidado, mais
atenção, os objectivos alcançados, e os que não foram, e lança-se o percurso para a segunda
fase do trabalho, a construção dos filmes finais. Em todas as fases do trabalho encetado pelos
adultos discutem-se opções e corrigem-se rumos. O último encontro acontece no fim do ano
lectivo, já com as crianças e novamente em Paris. Apresentam-se os filmes, as crianças
defendem-nos, respondem a perguntas, falam de escolhas. E numa conversa sem crianças, os
adultos discutem e decidem qual o tema do ano que se segue.
Num ano, numa destas conversas, apareceu como hipótese o “documentário” ser tratado
como tema. Tal como o movimento de câmara, a cor, o ponto de vista são elementos que
estão em todo o trabalho do cinema, para estes pedagogos, também o documentário é um
destes elementos, está em tudo. E, de facto, se olharmos mais atentamente para a forma
como o projecto é vivido pelas crianças, percebemos o que é que isto quer dizer.
Para as crianças, a primeira fase é aquela em que, muitas vezes pela primeira vez, vêem
cinema. Filmes inteiros, vistos em sala, escolhidos exactamente para proporcionar esse
primeiro encontro, e para fazer perceber que o cinema não é só um actor e uma história,
mas sim que vive de elementos mais fundos que funcionam para a criação de um sentido, e
que têm tanta importância na criação de uma emoção quanto a tal história e actor. É também
neste primeiro momento que se revisitam, inevitavelmente, os temas tratados em anos
anteriores (e temas futuros), trazidos ao de cima por um visionamento concreto, sob a forma
de problema. Depois começa-se a trabalhar o tema do ano, através do visionamento de
fragmentos de filmes, do trabalho de um profissional de cinema ligado mais directamente à
159
área tratada, e através dos materiais pedagógicos compilados pelos vários países. Chega
depois o momento dos exercícios. E o exercício é ir olhar. Com o tema na cabeça, é proposto
às crianças que o procurem nos sítios que conhecem e onde vivem. A primeira reacção é
muitas vezes “não há nada para filmar”. E o trabalho dos cineastas é, neste ponto, a
insistência, propondo às crianças que fiquem e olhem em volta. E o que as crianças
descobrem nessa permanência é que há interesse nas coisas que os rodeiam. Descobrem a
sua própria cidade, aprendem a ver de outra maneira aquilo que conhecem, sendo aqui que
mais fortemente se enraíza o cariz documental do projecto. E do outro lado os cineastas
descobrem um rigor inesperado no trabalho das crianças, qualquer coisa também muito
ligada à vivência documental de um espaço. Contam por exemplo, como num exercício em
que era proposto filmar sob o tema “eu e o mundo; eu e o meu mundo”, houve uma criança
em Serpa que viajou com a sua equipa 15km para filmar uma parede branca: era daquela
parede que ele via o mundo; tinha que ser aquela e não outra.
Mesmo se no final chegam à construção de uma ficção, a aplicação de uma história a um sítio
(em vez de filmarem a história que encontraram nesse sítio, tal como a encontraram), há no
olhar em volta uma raiz que é comum, na ficção e no documentário. “O processo é o
mesmo”. E é esse processo que Pierre-Marie Goulet e Teresa Garcia sublinham sempre
quando falam do trabalho com as crianças, falando do documentário aí também. Mesmo as
histórias finais resultam de coisas observadas durante a fase dos exercícios, a fase das
descobertas, e de alguma forma são provocadas por esses sítios. A ficção é inevitável, pela
forma como imaginação está em explosão, nas crianças. Mas o mundo descoberto está
sempre muito profundamente intricado nessa imaginação aplicada aqui ao cinema.
Num outro nível, a própria construção do filme final acompanha este processo de
descoberta. Há sempre uma estrutura que é proposta às crianças, sendo trabalhada pelos
adultos nos vários encontros que têm ao longo do ano. Essa estrutura, contudo, é sempre
semelhante de ano para ano: trata-se sempre de um personagem que vagueia por um sítio,
por uma história, e a certa altura acontece qualquer coisa que altera a forma desse sítio, e
altera a maneira como a personagem o vive. Ora, esta estrutura acaba por ser uma
documentação do processo vivido pelas crianças ao longo da experiência que aqui têm com
o cinema. Também elas são personagens que vagueiam na sua cidade e que, depois de
descobrirem o cinema, olham a mesma cidade de outra maneira, vendo nela novas cores,
novos movimentos, renovados pontos de vista, etc. E para levar esta descoberta até ao fim, o
Pierre-Marie e a Teresa fazem questão de não ter a figura do argumentista (ao contrário, por
exemplo, de Espanha): o argumento é, aqui, um ponto de partida para a rodagem, e nem
sequer está muito estruturado, serve para pensar e serve como grelha de descoberta. Ele é
feito essencialmente na rodagem. O que acontece na prática, depois, é que as crianças ficam
muito mais disponíveis para o que acontece. E de take para take, como de ano para ano,
cada exercício, cada correcção de ângulo da câmara, cada espera pelo momento do corte
160
(espera que se vai tornando mais e mais larga**) demonstra como as crianças olham cada vez
com mais atenção. O que é o olhar documental se não isso mesmo?
Para trazer ao de cima esta abertura, esta disponibilidade para a descoberta, os próprios
cineastas chegam sem certezas. Não impõem nada. E experimentam mesmo aquilo que à
partida acham que não vai funcionar (e às vezes funciona mesmo). E é disto que a Filhos de
Lumière, e o projecto “Cinema: cem anos de juventude” tratam. De dar a ver, e não de
ensinar a ver. E é aí que reside a diferença, fina mas fulcral, entre educação e ensino, entre o
trabalho da Filhos de Lumière e as escolas visitadas ao longo destes artigos. Educar ao
cinema é educar o olhar, levar ao encontro com o cinema, com a imagem, e levar esse
encontro para as coisas que de repente provocam os olhos de quem assim desperta para o
cinema, ao contrário do ensino que está do lado da profissão, de dar instrumentos para que
se vá fazer filmes. (A pergunta que me fica, insistente, na cabeça é se será possível ensinar
sem passar por este processo de dar a ver, de educar os olhos…).
* E sobre a importância do fragmento fílmico para o ensino do cinema, vale a pena ver a compilação de
testemunhos de alunos de António Reis, nomeadamente o que diz João Pedro Rodrigues. Também nas
aulas do professor Reis, o fragmento era usado para fazer saltar questões, transformando a visão de um
filme, e permitindo vê-lo a partir de um novo ponto de vista (actualizado por uma necessidade
pedagógica). Esta transformação da visão perante um fragmento de filme e a sua importância para a
pedagogia do cinema é igualmente descrita por Pierre-Marie Goulet e Teresa Garcia.
** Espera que faz com que Pierre-Marie Goulet e Teresa Garcia se surpreendam sempre com o tempo de
cada plano filmado pelas crianças. Se o consumo de objectos audiovisuais, como o teledisco, cheio de
imagens rápidas e frenéticas, fazia prever que os planos construídos pelas crianças fossem assim também, o
encontro com o cinema é de tal modo profundo, que altera de facto a maneira como as crianças vêem o
seu mundo e as imagens que nele encontram. “São mesmo portuguesas” dizem, com piada, querem
sempre planos mais longos, porque esperam para devolver aquele momento preciso em que “qualquer
coisa” acontece, para elas.
in Catálogo Panorama – Mostra do Documentário Português, 2010
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Índice
Doc’s Kingdom 2010
A imagem-arquivo | José Manuel Costa 1
Filmar, arquivar | Nuno Lisboa 2
Sinopses 7
Hartmut Bitomsky
Restoring the quality of Realness to the Cinema: an interview
with Harmut Bitomsky | Theo Bromin
The documentary world | Hartmut Bitomsky
O vestido preto das coisas | Hartmut Bitomsky
A morte e o cinema | Hartmut Bitomsky
Cinéma, vidéo et histoire | Hartmut Bitomsky
Passage le long de la ligne d’ombre. Farocki et les autres:
approche d’un style Filmkritik | Olaf Möller
Que cherche-t-on? (Au regard de l’histoire, le cinéma en question) | Jean-Pierre Rehm
Deutschlandbilder: um processo imaginário de indícios | Klaus Kreimeier
Edgardo Cozarinsky
Journal d’un manipulateur | Edgardo Cozarinsky
Edgardo Cozarinsky: o Flâneur | Dominique Païni
Ambiguous evidence: Cozarinsky’s “Cinema Indirect” | Jonathan Rosenbaum
La guerre d’un seul homme | Edgardo Cozarinsky
Entretien avec Edgardo Cozarinsky | Pascal Bonitzer
Discourse and History. One man’s war:
An Interview with Edgardo Cozarinsky | Thomas Elsaesser
BoulevardS du crépuscule - Journal de mixage | Edgardo Cozarinsky
En busca del país perdido | Pablo Klappenbach
Work in progress | Sergio Wolf
17
21
30
37
45
54
58
61
67
70
72
76
79
88
95
99
101
162
Yervant Gianikian, Angela Ricci Lucchi
Elogio da política: conversa com Yervant Gianikian
e Angela Ricci Lucchi | Sérgio Toffetti
Des instants choisis de l’espèce humaine | Raymond Bellour
Do documentário feito à mão. Notas conjugais sobre o cinema de
Yervant Gianikian e Angela Ricci-Lucchi | Danièle Hibon, Dominique Païni
Notre caméra analytique | Yervant Gianikian, Angela Ricci Lucchi
… au devenir-incendie de la mémoire | Sylvain George
On From the Pole to the Equator: interview with Yervant Gianikian
& Angela Ricci Lucchi | Scott MacDonald
Susana de Sousa Dias
O fascismo nunca existiu: entrevista com Susana de Sousa Dias
(e Ansgar Schäfer) | Chris Wahl
O que faz falta | Regina Guimarães
Détournement de délits de faciès | Arnaud Hée, Camille Pollas
Susana de Sousa Dias: 48 | Tue Steen Müller
103
109
113
116
122
126
135
148
151
152
Os Filhos de Lumière
Os Filhos de Lumière - Cinema, cem anos
de Juventude 2009/2010 |Teresa Garcia, Pierre-Marie Goulet 155
Aprender a olhar e olhar uma segunda vez:
o documentário como exercício |Inês Sapeta Dias 156

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