Diversidad y diálogo en el mundo del trabajo: supuestos y reflexiones

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Diversidad y diálogo en el mundo del trabajo: supuestos y reflexiones
VIII Seminario Regional (Cono Sur) ALAIC
“POLÍTICAS, ACTORES Y PRÁCTICAS DE LA COMUNICACIÓN:
ENCRUCIJADAS DE LA INVESTIGACIÓN EN AMÉRICA LATINA”
27 y 28 de agosto 2015 | Córdoba, Argentina
Diversidad y diálogo en el
mundo del trabajo: supuestos y reflexiones
Diversidade e diálogo no
mundo do trabalho: suposições e reflexões
Diversity and dialogue in the
work environment: hypothesis and thoughts
Mônica CARVALHO DE OLIVEIRA
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Brasil)
[email protected]
Resumo:
A diversidade está claramente presente nas sociedades atuais e, por consequência,
também se expressa no ambiente organizacional por meio de aspectos como gênero,
orientação sexual, geração, crenças religiosas e diferenças físicas, por exemplo. O
mundo do trabalho, espaço de interação entre os diferentes, torna-se, então, terreno para
negociação de sentidos entre sujeitos com variadas histórias, expectativas e visões de
mundo. Lidar com essas diferenças não é uma opção, mas um imperativo que desafia as
organizações ao provocar questionamentos e desestabilizar relações, transgredir às
tentativas de homogeneização da cultura organizacional e causar uma perturbação ao
sistema constituído.
As relações de trabalho estão em constante transformação a fim de se adaptar ao cenário
de novas tecnologias e forte competitividade econômica. Entretanto, o surgimento de um
processo de reconhecimento e valorização das diferenças, ou seja, de apoio à
diversidade, depende de um contexto organizacional propício ao diálogo. A interação
entre pessoas diferentes é um constante e profundo exercício de se colocar no lugar do
outro e ao mesmo tempo de se questionar. Esse questionamento não só desestabiliza os
sujeitos, mas, por consequência, as organizações, que nem sempre estão preparadas
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para lidar com a heterogeneidade em seu dia a dia. Na tentativa de evitar esse confronto,
muitas vezes tendem a adotar o caminho que lhes parece mais seguro: silenciar a
discussão a fim de tornar as diferenças invisíveis.
Sendo o mundo do trabalho um espaço de intensa disputa de sentidos e interesses, este
artigo tem como proposta discutir os desafios da comunicação frente à diversidade do
ambiente organizacional. Algumas reflexões servirão como ponto de partida para a
execução deste trabalho, como: de que forma lidar com as tensões provocadas pela
diversidade? Qual o papel da comunicação no reconhecimento das diferenças e
promoção de um ambiente aberto ao diálogo e às trocas interculturais? Estamos
preparados para lidar com a diversidade no ambiente organizacional?
Palavras-chave: comunicação organizacional, diversidade, diálogo, mundo do trabalho.
Abstract:
Diversity is clearly present in current societies, therefore, is also expressed in the
organizational environment throughout aspects as gender, sexual orientation, generation,
religious beliefs and physical differences. The workspace, place of interaction between
the different, becomes ground to negotiation of senses among individual with varied
stories, expectations and views of the world. Dealing with differences is not an option, but
an imperative that challenges organizations when causing questions and destabilizing
relations transgressing the attempts of homogenization of the organizational culture.
Work relations are in constant transformation in order to adapt to the new technologies
scenery and strong economic competitiveness. However, the beginning of recognition
process and appreciation of differences, in other words, the support of diversity, depends
on an organizational context inclined to dialogue. Interaction among different people is a
continuous and profound exercise of putting oneself in another’s place and at the same
time questioning oneself. This questioning not only destabilizes individuals, as therefore,
the organizations, which are not always prepared to deal with heterogeneity in their
routine. In attempt to avoid this confrontation, frequently adopt the path that seems more
secure: Silencing discussions to make differences invisible.
Being workspace an environment of intense dispute of senses and interests, this article
has also as an objective discuss the challenges of communication facing the diversity of
organizational environment. Some questions will be the starting point to the development
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of this article as: How to deal with tension resulting from diversity? What is the role of the
communication in the recognition of differences and promotion of an environment open to
dialogue and to cultural interchange? Are we ready to deal with diversity in an
organizational environment?
Key Words: organizational communication, diversity, dialogue, workspace.
1. Introdução
A diversidade está relacionada, essencialmente, ao respeito e ao reconhecimento da
individualidade
(Fleury,
2000);
no
contexto
organizacional,
pode
abarcar
a
heterogeneidade de culturas, gerações, tempo de serviço, orientação sexual, modos de
pensar e de agir, por exemplo. Assim, o ambiente de trabalho se constitui como um
espaço de interação entre os diferentes. É neste ambiente que a cultura e a identidade
de profissionais e organização entram em tensão.
A diversidade passa a ser um desafio para as organizações na medida em que desafia a
ordem posta. “Possivelmente por conta de um ideal de tecnicismo, as organizações
adotam uma visão de homogeneidade no seu cotidiano: lidam com seus empregados
como se suas diferenças pudessem desaparecer sob a formalidade das posições
hierárquicas” (Saraiva & Irigaray, 2009, p.339). Lidar, de fato, com a diferença é disporse ao diálogo e ao desconhecido, ou seja, colocar em cheque crenças e práticas
socioculturais legitimadas pela tradição e pela regulação da atividade de trabalho.
A proposta deste artigo é refletir a respeito da relação entre comunicação, diversidade e
mundo do trabalho. Para tal, é importante pontuar que “Toda organização guarda em seu
interior comunidades variadas, microculturas se constituindo como um lugar de vida e
não como um simples lugar de trabalho” (Enriquez, 1997, p.12). A interação e o diálogo,
neste contexto, tornam-se fundamentais para que a subjetividade dos indivíduos possa
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se manifestar e, assim, seja possibilitado um ambiente de troca e de crescimento. Toda
interação, explica Chanlat (2015, p. 37), pressupõe um modo de comunicação, ou seja,
“um conjunto de disposições verbais e não verbais que se encarregam de exprimir,
traduzir, registrar, em uma palavra, de dizer o que uns querem comunicar aos outros
durante uma relação”.
As organizações constituem um espaço de encontro entre diferentes, em que sujeitos
constroem sentidos com base em um universo partilhado para dar vida a um produto
comum, que é o trabalho.
As relações coletivas não se limitam às relações de produção, embora estas sejam
determinantes para o conhecimento daquelas. Incluem também relações de poder e
relações de saber, de maneira que as organizações põem em jogo uma teia complexa de
relações (..). (Srour, 1998, p.75).
Por meio das relações de trabalho temos a oportunidade de interagir e, portanto,
estabelecer um confronto entre nossa visão da realidade e a visão de outros sujeitos.
Para Morin (2010, p.182), “Uma sociedade é produzida pelas interações entre indivíduos
e essas interações produzem um todo organizador que retroage sobre os indivíduos para
coproduzi-los enquanto indivíduos humanos, o que eles não seriam se não dispusessem
da instrução, da linguagem e da cultura”. Assim, ninguém sai ileso de uma interação:
todos os interlocutores se modificam e são modificados ao assumirem noções tanto de
produto quanto de produtor em suas relações.
Além dessas reflexões, são apresentados caminhos possíveis para a comunicação
organizacional a partir da promoção de práticas de discussão e conscientização sobre a
diversidade. Afinal, a comunicação possibilita a compreensão e o reconhecimento do
outro (Morin, 2005), contribuindo para a minimização dos preconceitos.
2. Diversidade e comunicação no contexto organizacional
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As últimas décadas representam um avanço para a definição de políticas
públicas que visam a eliminar a discriminação no ambiente de trabalho, de forma a
garantir aos trabalhadores um tratamento mais humano, justo e igualitário. Em 1995 o
Brasil foi questionado por não ter criado medidas que atendessem ao compromisso
assumido em 1965 com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), por ocasião da
Convenção 111, que tratava do combate à discriminação e a promoção da igualdade de
oportunidade e tratamento no trabalho. Dessa forma, foi constituído pelo Ministério do
Trabalho e Emprego (MTE), no ano de 1996, um Grupo de Trabalho para a Eliminação
da Discriminação no Emprego e na Ocupação, o que estimulou a realização de diversos
estudos sobre a discriminação no trabalho no país, além da criação de índices de
verificação do acesso e qualidade de participação no mercado de pessoas com
deficiência, negros e mulheres. A partir daí, foram criadas medidas pelo MTE a fim de
coordenar ações e propor estratégias de combate à discriminação e promoção da
igualdade de oportunidades e de tratamento.
Para garantir a contratação de Pessoas com Deficiência (PcDs) no mercado
de trabalho existe a lei nº 8.213/91, artigo 93, que determina que as empresas com mais
de 100 empregados devem ter de 2% a 5% do seu quadro funcional composto por
deficientes ou reabilitados. Entretanto, mais do que contratar é preciso incluir. Apesar da
política das cotas, diversas pesquisas1 mostram não apenas a dificuldade de inserção de
PcDs no mercado de trabalho, mas também as dificuldades encontradas por eles para
encontrar uma colocação, a necessidade de adequação dos postos de trabalho e a falta
de preparo das organizações para incluir estes profissionais.
A inclusão passa por um ambiente aberto ao diálogo e por iniciativas que
sejam acessíveis a todos os empregados. “Além do desconhecimento sobre as reais
capacidades
e
limitações
do
‘deficiente’,
a
desinformação
gera
também
o
desconhecimento de suas possibilidades, necessidades, expectativas e sentimentos, o
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Levantamento foi feito por Brunstein e Serrano (2008).
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que contribui para conservar os preconceitos sobre esta população” (Brunstein &
Serrano, 2008, p.5).
Quanto à discriminação de gênero, também há dados concretos: em 2014, o
IBGE2 divulgou resultados de pesquisa realizada em 2010, que apontava o crescimento
no número de mulheres que comandam domicílios (dentre as mulheres sem cônjuge e
com filhos, elas são as responsáveis por 87% das famílias). Entretanto, por mais que
estejam melhor capacitadas, as mulheres ainda ganham cerca de 68% do rendimento
dos homens. De acordo com levantamento feito pelo jornal O Estado de S. Paulo 3, em
março de 2015, nenhuma das 64 empresas de capital aberto que compõem o índice de
ações da Bolsa Brasileira, o Ibovespa, tinha mulheres no posto de presidente. Quanto
aos conselhos de administração, apenas metade das empresas têm presença feminina.
Este cenário é uma amostra do quanto as organizações acabam por constituir
um locus de reprodução dos gêneros; reproduzem a dominação masculina e têm, por
consequência, uma cultura masculina (Prestes Motta, 2000, p.9). Para Bourdieu (2014,
p.24), a ordem social “tende a ratificar a dominação masculina sobre a qual se alicerça:
é a divisão sexual do trabalho, distribuição bastante estrita das atividades atribuídas a
cada um dos dois sexos, de seu local, seu momento, seus instrumentos [...]”.
A interação entre pessoas com diferentes formações, gerações, culturas,
gêneros ou credos é um constante e profundo exercício de se colocar no lugar do outro
e ao mesmo tempo se questionar. Morin (2005) observa que a possibilidade de
compreensão permite reconhecer o outro e senti-lo, eventualmente, como outro si
mesmo:
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Disponível em: http://saladeimprensa.ibge.gov.br/noticias?view=noticia&id=1&busca=1&idnoticia=2747.
Acesso em: 10 de julho de 2015.
3 Disponível em: <http://economia.estadao.com.br/noticias/geral,empresas-do-ibovespa-nao-temmulheres-no-comando,1642646>. Acesso em: 10 de julho de 2015.
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A relação com o outro inscreve-se virtualmente na relação consigo mesmo; o
tema arcaico do duplo, tão profundamente enraizado em nossa psique, mostra
que cada um carrega um alterego (eu mesmo-outro), ao mesmo tempo diferente
e idêntico ao eu. (...) Por carregarmos essa dualidade, na qual “eu é um outro”,
podemos, na simpatia, na amizade, no amor, introduzir e integrar o outro em
nosso Eu. (Morin, 2005, p.78)
O mundo do trabalho, identificado por Figaro (2008, p.92) como “um
microcosmo da sociedade”, é formado por diferentes discursos, vozes e perfis, regidos
pelas lógicas da atividade de trabalho, ou seja, é “um lugar de encontro e do confronto
dos diferentes e das diferenças, demandando atenção especial para as relações de
comunicação” (Figaro, 2014, p.110). Por meio da comunicação torna-se possível
conhecer melhor o outro, para que seja possível compreendê-lo, como propõe Morin
(2005).
A comunicação organizacional, compreendida por Baldissera (2008, p.169)
como “o processo de construção e disputa de sentidos no âmbito das relações
organizacionais”, não está baseada apenas no discurso da organização; ela envolve
também os sujeitos que a compõe por meio de suas interpretações e falas: “toda vez que
alguém/algo/alguma coisa tornar a organização presente em uma relação haverá
produção e disputa de sentidos, e isso não se restringe aos processos autorizados”.
(Baldissera, 2010b, p.208). Dessa forma, Baldissera (2009) propõe três dimensões da
comunicação organizacional: organização comunicada, organização comunicante e
organização falada. Os processos formais da fala autorizada constituem a organização
comunicada, que “dá visibilidade [à organização] objetivando retornos de imagemconceito, legitimidade, capital simbólico (e reconhecimento, vendas, lucros, votos, etc)”,
podendo adquirir caráter disciplinador e, ainda, orientação ao auto-elogio. Essa dimensão
se estabelece a partir do discurso da organização, ou seja, o que ela deseja transmitir.
Ultrapassados os limites da fala autorizada encontramos a organização comunicante, ou
seja, quando o processo comunicacional se atualiza a partir do estabelecimento da
relação entre um sujeito (pessoa, público) e a organização. Neste caso são incluídos os
processos comunicacionais informais, inclusive aqueles que surgem sem que a
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organização tenha conhecimento. Essa dimensão revela a ocorrência de relações que
escapam do controle e que podem perturbar a ordem estabelecida. Contudo, a
subjetividade adquire um espaço ainda maior no dia a dia das relações de trabalho na
terceira dimensão descrita por Baldissera (2009, p. 119), a organização falada. São
“processos de comunicação informal indiretos; aqueles que se realizam fora do âmbito
organizacional e que dizem respeito à organização”, como conversas em um jogo de
futebol ou no almoço de domingo. Sobre essa dimensão a organização não possui
nenhum tipo de controle e interferência direta, já que as manifestações extrapolam o
ambiente organizacional e partem para o convívio em família ou com amigos, por
exemplo.
A definição de políticas de diversidade é uma das principais categorias do
discurso organizacional moderno (Siqueira & Andrade, 2012); contudo, é urgente que as
organizações proponham alternativas de transformação das relações de trabalho, a fim
de minimizar a precarização do trabalho e “buscar formas não violentas de organização
e relacionamento, mesmo que tais violências sejam, em certa medida, violências sutis”
(ibidem, p.100).
Práticas organizacionais formais – como equiparação da oferta de benefícios
para casais heterossexuais e homossexuais, condições de trabalho asseguradas para
PcDs e regras claras para salários e promoção de cargos, por exemplo – são
fundamentais para que os profissionais se sintam seguros para assumir sua identidade
no ambiente de trabalho (Siqueira & Andrade, 2012). Com isso, tendem a fortalecer sua
autoestima e, assim, passam a buscar o respeito dos colegas nas relações que
estabelecem. Essa busca precisa envolver todos os empregados, não apenas o
profissional estigmatizado, por meio de sensibilização: “é preciso haver discussões sobre
alteridade como um todo, sobre a necessidade em se respeitar o outro, o diferente; isso
pode ser catalisado por meio do esforço ao coletivo de trabalho e à ampliação de um
espaço público da palavra” (Siqueira & Andrade, 2012, p.102). Além disso, outras
possibilidades são a promoção de palestras com especialistas, a criação de fóruns de
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discussão, de dinâmicas de reflexão, além de abordagem diferenciada sobre diversidade
nos canais internos de comunicação. Para PcDs, por exemplo, algumas empresas já
dispõem de formatos adaptados em seus veículos de comunicação, como revistas com
edição em áudio. Também são oferecidos cursos de libras gratuitamente a quem se
interessar, o que facilita a comunicação com pessoas com deficiência auditiva.
A comunicação entre organização e empregados precisa estar envolvida na
gestão da diversidade a fim de evitar a reafirmação de posições discriminatórias por meio
de campanhas ou peças de comunicação. Presentear as mulheres da empresa com kit
maquiagem e as mamães com esmalte pode ser uma alternativa barata, entretanto, não
rompe com a lógica da dominação masculina que ainda se faz presente no cotidiano das
organizações (Prestes Motta, 2000). “As representações imaginárias que uma
organização cultiva identificam quem é quem, demarcam praxes nem sempre explícitas,
impõem precedências e formalidades compulsórias, regulam expectativas e pautas de
comportamentos, exigem cautela e aprendizagem por parte de todos os membros”
(Srour, 1998, p.128). Os novos desafios da comunicação exigem das organizações novas
formas de relacionamento com seus públicos em uma era de exclusividade, pluralismo,
inovação, fragmentação e simbolismos (Almeida, 2008).
3. Mundo do trabalho: território de convivência entre diferentes
Em busca de legitimidade frente ao mercado e a seus públicos, as
organizações que investem em políticas de diversidade esperam projetar uma imagem
socialmente responsável (Saraiva & Irigaray, 2009) e, por isso, o conceito tem sido
utilizado por organizações de diversos segmentos de mercado, tanto em discursos
institucionais quanto na publicidade. Neste ano, no Brasil, o Dia dos Namorados,
comemorado em 12 de junho, foi estopim para uma forte discussão sobre diversidade.
Uma grande marca de perfumes e cosméticos utilizou em sua campanha casais
heterossexuais e homossexuais, resultando, inclusive, em boicote à empresa por parte
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de grupos mais conservadores, como se pode assistir no You Tube, no canal oficial do
Pastor Silas Malafaia4, ou também no site Reclame Aqui5, em que, em meio a
reclamações sobre produtos ou serviços relacionados à marca, surgiram reclamações a
respeito da campanha. A repercussão foi tamanha que, além de repercutir nas redes
sociais, o assunto ganhou destaque em sites de notícias como BBC Brasil6, El País7 e
portal de Economia do IG8, o que motivou a empresa a disseminar, via redes sociais, uma
pesquisa de opinião a fim de avaliar como a campanha estava sendo interpretada e qual
a intenção de compra dos consumidores no auge da discussão.
Ultrapassando a questão do preconceito, ou mesmo da aceitação do público,
é possível traçar uma segunda discussão, em paralelo, ao nos aproximarmos do contexto
organizacional: o discurso de diversidade, presente na publicidade das marcas, se reflete
nas práticas das organizações? Afinal, não basta que a publicidade defenda uma
bandeira se esta já não estiver fixada internamente. Os discursos organizacionais são
particularmente ambíguos com relação à diversidade, pois “difundem uma nova visão de
organização, tratando de aspectos díspares e, ao mesmo tempo, complementares, na
tessitura de uma visão de cidadão (mais do que de empregado), e da comunidade (mais
do que da empresa), em busca de legitimidade” (Saraiva & Irigaray, 2009, p.339).
Entretanto, ainda conforme os autores, “embora seja estimulado o envolvimento afetivo
dos empregados, nas práticas de gestão predomina a impessoalidade”. As organizações
Vídeo do Pastor Silas Malafaia, líder da Igreja Assembleia de Deus – Vitória em Cristo, em que pede
aos espectadores que digam não à marca. Disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=Rn8ET9Nos9g>. Acesso em: 20 de julho de 2015.
5 Exemplo de manifestação contrária à propaganda publicitária feita por meio do site Reclame Aqui, que
reúne reclamações de consumidores e disponibiliza espaço para que as empresas possam respondê-las.
Disponível em: <http://www.reclameaqui.com.br/13420264/o-boticario/o-boticario-e-gay>. Acesso em: 20
de julho de 2015.
6 Disponível em:
<http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/06/150604_salasocial_oboticario_opinioes_evangelicos_rs>
Acesso em: 20 de julho de 2015.
7 Disponível em:< http://brasil.elpais.com/brasil/2015/06/03/politica/1433365595_609632.html>. Acesso
em: 20 de julho de 2015.
8 Disponível em: <http://economia.ig.com.br/empresas/2015-06-02/em-video-malafaia-propoe-boicote-aoboticario-va-vender-perfume-pra-gay.html>. Acesso em 20 de julho de 2015.
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que não mostrarem coerência entre fala e atitude podem ter sua legitimidade ameaçada
quando os próprios empregados não reconhecem as políticas de diversidade por
perceberem, em seu dia a dia, a falta de oportunidades de ascensão e de reconhecimento
na organização (Saraiva & Irigaray, 2009).
Apesar da discriminação que ainda persiste nos processos seletivos, quanto à
raça, gênero, credos, orientação sexual, deficiências, a organização se constitui como
um espaço de encontro entre diferentes, no qual os sujeitos interagem e constroem
sentidos com base em um universo comum e partilhado. Por meio da atividade de
trabalho, diferentes sujeitos se encontram para trocar experiências e criar um produto
comum, a partir da ação em coletividade. “A ideia de organização compreende, também,
e fundamentalmente, sujeitos em relação, laborando por objetivos específicos, definidos,
claros” (Baldissera, 2010a, p.62). Dessa forma, as organizações deixam de ser local de
trabalho para se tornar o mundo do trabalho; deixam de ser um local delimitado por
barreiras físicas para tornarem-se uma teia de relações e aprendizados que servem de
experiência para os indivíduos e para compreensão de outras formas de ver sua própria
realidade.
4. Sujeitos e organizações plurais
A identidade de cada sujeito é formada e re-significada continuamente em
suas representações sociais, processo que se dá também por meio das interações que
estabelece em seu ambiente de trabalho.
A comunicação como processo de interação e construção de sentidos, com base
em um universo comum e partilhado, pressupõe compreender que os sentidos
desse universo são provenientes da condição intrínseca da atividade humana.
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Essa é a objetividade das relações intersubjetivas necessárias à comunicação e
ao trabalho. (Figaro, 2014, p.104)
A identidade do sujeito no trabalho é um componente importante para o
processo motivacional, contribuindo, também, para a construção de uma autoestima
positiva, para maior criatividade e melhor socialização (Machado, 2003). Já a identidade
organizacional é parte da identidade individual de seus membros; nesta construção
também se fazem presentes “os objetivos, a missão, as práticas e os valores presentes
na organização” e, por isso, ela adquire um caráter compartilhado (Machado, 2003, p.61).
Portanto, é possível dizer que não há organização plural se esta pluralidade não estiver
nos integrantes que formam a organização.
Reconhecer a pluralidade cultural implica em reconhecer também uma
pluralidade identitária: “à medida que os sistemas de significação e representação cultural
se multiplicam, somos confrontados por uma multiplicidade desconcertante e cambiante
de identidades possíveis, com cada uma das quais poderíamos nos identificar – ao
menos temporariamente” (Hall, 2014, p.12). Assim, a identificação dos sujeitos não se dá
mais exclusivamente em termos de classe, nem por uma identidade mestra e única, como
argumenta Hall (2014), mas por um “jogo de identidades” que se deslocam,
“atravessadas por diferentes divisões e antagonismos sociais que produzem uma
variedade de diferentes ‘posições de sujeito’”:
Uma vez que a identidade muda de acordo com a forma como o sujeito é
interpretado ou representado, a identificação não é automática, mas pode ser
ganhada ou perdida. Ela tornou-se politizada. Esse processo é, às vezes, descrito
como constituindo uma mudança de uma política de identidade (de classe) para
uma política de diferença. (Hall, 2014, p.16)
Baldissera (2007, p. 233) argumenta que, melhor que falar em identidades,
seria falar em identificações: “Isso dá conta do fato de os sujeitos, em diferentes
momentos, identificarem-se com coisas/processos/fatos diferentes, algumas vezes
contrários e até contraditórios”. Ao reconhecer essas diferentes e fluidas identidades, a
organização assume a função de mediar seus significados por meio da compreensão da
diferença e, assim, alcança o aprofundamento da alteridade.
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5. Reflexões finais
Na contemporaneidade, o ambiente organizacional caracteriza-se por
“mudanças que determinam novos cenários e bases para as relações sociais. Coexistem
mundos distintos, complexos, ambíguos e fluídos, os quais resultam em rupturas, novas
leituras e linguagens” (Almeida, 2013, p.53). Para Maria Ester de Freitas (2013) vivemos
em uma era que exige comunicação, resolução de conflitos, além da criação de novas
formas de trabalhar e de se relacionar, cenário que interfere diretamente no mundo do
trabalho, conforme destaca: “A diversidade nas sociedades atuais é cada vez mais
expressa no mundo organizacional, que tem como grande tarefa extrair dela o seu
melhor, sem perder a consistência interna” (2013, p.151).
A definição de políticas públicas contrárias à discriminação no mercado de
trabalho não é garantia de tolerância e inclusão – nem por parte dos sujeitos, nem por
parte das organizações. É preciso que se discuta a diversidade, retirando de certos
assuntos o rótulo do tabu. A partir interação entre sujeitos diferentes torna-se possível a
compreensão da subjetividade do outro, permitindo, assim, a criação de um ambiente
plural e de respeito à manifestação de diferentes identidades.
Ao interagirem, os sujeitos transformam a cultura organizacional e também são
transformados por ela. Por meio de tensões e disputas perturbam a teia de significados
que constitui a organização e, ao mesmo tempo, exige que se reorganize; essas
interações representam uma das condições de existência da própria organização, já que
a mantém longe da estagnação (Baldissera, 2014). A diversidade presente no ambiente
organizacional serve de oxigenação para que o sistema continue funcionando e possa se
adaptar de forma cada vez mais rápida frente aos desafios que surgem.
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