Diversidad y diálogo en el mundo del trabajo: supuestos y reflexiones
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Diversidad y diálogo en el mundo del trabajo: supuestos y reflexiones
VIII Seminario Regional (Cono Sur) ALAIC “POLÍTICAS, ACTORES Y PRÁCTICAS DE LA COMUNICACIÓN: ENCRUCIJADAS DE LA INVESTIGACIÓN EN AMÉRICA LATINA” 27 y 28 de agosto 2015 | Córdoba, Argentina Diversidad y diálogo en el mundo del trabajo: supuestos y reflexiones Diversidade e diálogo no mundo do trabalho: suposições e reflexões Diversity and dialogue in the work environment: hypothesis and thoughts Mônica CARVALHO DE OLIVEIRA Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Brasil) [email protected] Resumo: A diversidade está claramente presente nas sociedades atuais e, por consequência, também se expressa no ambiente organizacional por meio de aspectos como gênero, orientação sexual, geração, crenças religiosas e diferenças físicas, por exemplo. O mundo do trabalho, espaço de interação entre os diferentes, torna-se, então, terreno para negociação de sentidos entre sujeitos com variadas histórias, expectativas e visões de mundo. Lidar com essas diferenças não é uma opção, mas um imperativo que desafia as organizações ao provocar questionamentos e desestabilizar relações, transgredir às tentativas de homogeneização da cultura organizacional e causar uma perturbação ao sistema constituído. As relações de trabalho estão em constante transformação a fim de se adaptar ao cenário de novas tecnologias e forte competitividade econômica. Entretanto, o surgimento de um processo de reconhecimento e valorização das diferenças, ou seja, de apoio à diversidade, depende de um contexto organizacional propício ao diálogo. A interação entre pessoas diferentes é um constante e profundo exercício de se colocar no lugar do outro e ao mesmo tempo de se questionar. Esse questionamento não só desestabiliza os sujeitos, mas, por consequência, as organizações, que nem sempre estão preparadas 1 VIII Seminario Regional (Cono Sur) ALAIC “POLÍTICAS, ACTORES Y PRÁCTICAS DE LA COMUNICACIÓN: ENCRUCIJADAS DE LA INVESTIGACIÓN EN AMÉRICA LATINA” 27 y 28 de agosto 2015 | Córdoba, Argentina para lidar com a heterogeneidade em seu dia a dia. Na tentativa de evitar esse confronto, muitas vezes tendem a adotar o caminho que lhes parece mais seguro: silenciar a discussão a fim de tornar as diferenças invisíveis. Sendo o mundo do trabalho um espaço de intensa disputa de sentidos e interesses, este artigo tem como proposta discutir os desafios da comunicação frente à diversidade do ambiente organizacional. Algumas reflexões servirão como ponto de partida para a execução deste trabalho, como: de que forma lidar com as tensões provocadas pela diversidade? Qual o papel da comunicação no reconhecimento das diferenças e promoção de um ambiente aberto ao diálogo e às trocas interculturais? Estamos preparados para lidar com a diversidade no ambiente organizacional? Palavras-chave: comunicação organizacional, diversidade, diálogo, mundo do trabalho. Abstract: Diversity is clearly present in current societies, therefore, is also expressed in the organizational environment throughout aspects as gender, sexual orientation, generation, religious beliefs and physical differences. The workspace, place of interaction between the different, becomes ground to negotiation of senses among individual with varied stories, expectations and views of the world. Dealing with differences is not an option, but an imperative that challenges organizations when causing questions and destabilizing relations transgressing the attempts of homogenization of the organizational culture. Work relations are in constant transformation in order to adapt to the new technologies scenery and strong economic competitiveness. However, the beginning of recognition process and appreciation of differences, in other words, the support of diversity, depends on an organizational context inclined to dialogue. Interaction among different people is a continuous and profound exercise of putting oneself in another’s place and at the same time questioning oneself. This questioning not only destabilizes individuals, as therefore, the organizations, which are not always prepared to deal with heterogeneity in their routine. In attempt to avoid this confrontation, frequently adopt the path that seems more secure: Silencing discussions to make differences invisible. Being workspace an environment of intense dispute of senses and interests, this article has also as an objective discuss the challenges of communication facing the diversity of organizational environment. Some questions will be the starting point to the development 2 VIII Seminario Regional (Cono Sur) ALAIC “POLÍTICAS, ACTORES Y PRÁCTICAS DE LA COMUNICACIÓN: ENCRUCIJADAS DE LA INVESTIGACIÓN EN AMÉRICA LATINA” 27 y 28 de agosto 2015 | Córdoba, Argentina of this article as: How to deal with tension resulting from diversity? What is the role of the communication in the recognition of differences and promotion of an environment open to dialogue and to cultural interchange? Are we ready to deal with diversity in an organizational environment? Key Words: organizational communication, diversity, dialogue, workspace. 1. Introdução A diversidade está relacionada, essencialmente, ao respeito e ao reconhecimento da individualidade (Fleury, 2000); no contexto organizacional, pode abarcar a heterogeneidade de culturas, gerações, tempo de serviço, orientação sexual, modos de pensar e de agir, por exemplo. Assim, o ambiente de trabalho se constitui como um espaço de interação entre os diferentes. É neste ambiente que a cultura e a identidade de profissionais e organização entram em tensão. A diversidade passa a ser um desafio para as organizações na medida em que desafia a ordem posta. “Possivelmente por conta de um ideal de tecnicismo, as organizações adotam uma visão de homogeneidade no seu cotidiano: lidam com seus empregados como se suas diferenças pudessem desaparecer sob a formalidade das posições hierárquicas” (Saraiva & Irigaray, 2009, p.339). Lidar, de fato, com a diferença é disporse ao diálogo e ao desconhecido, ou seja, colocar em cheque crenças e práticas socioculturais legitimadas pela tradição e pela regulação da atividade de trabalho. A proposta deste artigo é refletir a respeito da relação entre comunicação, diversidade e mundo do trabalho. Para tal, é importante pontuar que “Toda organização guarda em seu interior comunidades variadas, microculturas se constituindo como um lugar de vida e não como um simples lugar de trabalho” (Enriquez, 1997, p.12). A interação e o diálogo, neste contexto, tornam-se fundamentais para que a subjetividade dos indivíduos possa 3 VIII Seminario Regional (Cono Sur) ALAIC “POLÍTICAS, ACTORES Y PRÁCTICAS DE LA COMUNICACIÓN: ENCRUCIJADAS DE LA INVESTIGACIÓN EN AMÉRICA LATINA” 27 y 28 de agosto 2015 | Córdoba, Argentina se manifestar e, assim, seja possibilitado um ambiente de troca e de crescimento. Toda interação, explica Chanlat (2015, p. 37), pressupõe um modo de comunicação, ou seja, “um conjunto de disposições verbais e não verbais que se encarregam de exprimir, traduzir, registrar, em uma palavra, de dizer o que uns querem comunicar aos outros durante uma relação”. As organizações constituem um espaço de encontro entre diferentes, em que sujeitos constroem sentidos com base em um universo partilhado para dar vida a um produto comum, que é o trabalho. As relações coletivas não se limitam às relações de produção, embora estas sejam determinantes para o conhecimento daquelas. Incluem também relações de poder e relações de saber, de maneira que as organizações põem em jogo uma teia complexa de relações (..). (Srour, 1998, p.75). Por meio das relações de trabalho temos a oportunidade de interagir e, portanto, estabelecer um confronto entre nossa visão da realidade e a visão de outros sujeitos. Para Morin (2010, p.182), “Uma sociedade é produzida pelas interações entre indivíduos e essas interações produzem um todo organizador que retroage sobre os indivíduos para coproduzi-los enquanto indivíduos humanos, o que eles não seriam se não dispusessem da instrução, da linguagem e da cultura”. Assim, ninguém sai ileso de uma interação: todos os interlocutores se modificam e são modificados ao assumirem noções tanto de produto quanto de produtor em suas relações. Além dessas reflexões, são apresentados caminhos possíveis para a comunicação organizacional a partir da promoção de práticas de discussão e conscientização sobre a diversidade. Afinal, a comunicação possibilita a compreensão e o reconhecimento do outro (Morin, 2005), contribuindo para a minimização dos preconceitos. 2. Diversidade e comunicação no contexto organizacional 4 VIII Seminario Regional (Cono Sur) ALAIC “POLÍTICAS, ACTORES Y PRÁCTICAS DE LA COMUNICACIÓN: ENCRUCIJADAS DE LA INVESTIGACIÓN EN AMÉRICA LATINA” 27 y 28 de agosto 2015 | Córdoba, Argentina As últimas décadas representam um avanço para a definição de políticas públicas que visam a eliminar a discriminação no ambiente de trabalho, de forma a garantir aos trabalhadores um tratamento mais humano, justo e igualitário. Em 1995 o Brasil foi questionado por não ter criado medidas que atendessem ao compromisso assumido em 1965 com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), por ocasião da Convenção 111, que tratava do combate à discriminação e a promoção da igualdade de oportunidade e tratamento no trabalho. Dessa forma, foi constituído pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), no ano de 1996, um Grupo de Trabalho para a Eliminação da Discriminação no Emprego e na Ocupação, o que estimulou a realização de diversos estudos sobre a discriminação no trabalho no país, além da criação de índices de verificação do acesso e qualidade de participação no mercado de pessoas com deficiência, negros e mulheres. A partir daí, foram criadas medidas pelo MTE a fim de coordenar ações e propor estratégias de combate à discriminação e promoção da igualdade de oportunidades e de tratamento. Para garantir a contratação de Pessoas com Deficiência (PcDs) no mercado de trabalho existe a lei nº 8.213/91, artigo 93, que determina que as empresas com mais de 100 empregados devem ter de 2% a 5% do seu quadro funcional composto por deficientes ou reabilitados. Entretanto, mais do que contratar é preciso incluir. Apesar da política das cotas, diversas pesquisas1 mostram não apenas a dificuldade de inserção de PcDs no mercado de trabalho, mas também as dificuldades encontradas por eles para encontrar uma colocação, a necessidade de adequação dos postos de trabalho e a falta de preparo das organizações para incluir estes profissionais. A inclusão passa por um ambiente aberto ao diálogo e por iniciativas que sejam acessíveis a todos os empregados. “Além do desconhecimento sobre as reais capacidades e limitações do ‘deficiente’, a desinformação gera também o desconhecimento de suas possibilidades, necessidades, expectativas e sentimentos, o 1 Levantamento foi feito por Brunstein e Serrano (2008). 5 VIII Seminario Regional (Cono Sur) ALAIC “POLÍTICAS, ACTORES Y PRÁCTICAS DE LA COMUNICACIÓN: ENCRUCIJADAS DE LA INVESTIGACIÓN EN AMÉRICA LATINA” 27 y 28 de agosto 2015 | Córdoba, Argentina que contribui para conservar os preconceitos sobre esta população” (Brunstein & Serrano, 2008, p.5). Quanto à discriminação de gênero, também há dados concretos: em 2014, o IBGE2 divulgou resultados de pesquisa realizada em 2010, que apontava o crescimento no número de mulheres que comandam domicílios (dentre as mulheres sem cônjuge e com filhos, elas são as responsáveis por 87% das famílias). Entretanto, por mais que estejam melhor capacitadas, as mulheres ainda ganham cerca de 68% do rendimento dos homens. De acordo com levantamento feito pelo jornal O Estado de S. Paulo 3, em março de 2015, nenhuma das 64 empresas de capital aberto que compõem o índice de ações da Bolsa Brasileira, o Ibovespa, tinha mulheres no posto de presidente. Quanto aos conselhos de administração, apenas metade das empresas têm presença feminina. Este cenário é uma amostra do quanto as organizações acabam por constituir um locus de reprodução dos gêneros; reproduzem a dominação masculina e têm, por consequência, uma cultura masculina (Prestes Motta, 2000, p.9). Para Bourdieu (2014, p.24), a ordem social “tende a ratificar a dominação masculina sobre a qual se alicerça: é a divisão sexual do trabalho, distribuição bastante estrita das atividades atribuídas a cada um dos dois sexos, de seu local, seu momento, seus instrumentos [...]”. A interação entre pessoas com diferentes formações, gerações, culturas, gêneros ou credos é um constante e profundo exercício de se colocar no lugar do outro e ao mesmo tempo se questionar. Morin (2005) observa que a possibilidade de compreensão permite reconhecer o outro e senti-lo, eventualmente, como outro si mesmo: 2 Disponível em: http://saladeimprensa.ibge.gov.br/noticias?view=noticia&id=1&busca=1&idnoticia=2747. Acesso em: 10 de julho de 2015. 3 Disponível em: <http://economia.estadao.com.br/noticias/geral,empresas-do-ibovespa-nao-temmulheres-no-comando,1642646>. Acesso em: 10 de julho de 2015. 6 VIII Seminario Regional (Cono Sur) ALAIC “POLÍTICAS, ACTORES Y PRÁCTICAS DE LA COMUNICACIÓN: ENCRUCIJADAS DE LA INVESTIGACIÓN EN AMÉRICA LATINA” 27 y 28 de agosto 2015 | Córdoba, Argentina A relação com o outro inscreve-se virtualmente na relação consigo mesmo; o tema arcaico do duplo, tão profundamente enraizado em nossa psique, mostra que cada um carrega um alterego (eu mesmo-outro), ao mesmo tempo diferente e idêntico ao eu. (...) Por carregarmos essa dualidade, na qual “eu é um outro”, podemos, na simpatia, na amizade, no amor, introduzir e integrar o outro em nosso Eu. (Morin, 2005, p.78) O mundo do trabalho, identificado por Figaro (2008, p.92) como “um microcosmo da sociedade”, é formado por diferentes discursos, vozes e perfis, regidos pelas lógicas da atividade de trabalho, ou seja, é “um lugar de encontro e do confronto dos diferentes e das diferenças, demandando atenção especial para as relações de comunicação” (Figaro, 2014, p.110). Por meio da comunicação torna-se possível conhecer melhor o outro, para que seja possível compreendê-lo, como propõe Morin (2005). A comunicação organizacional, compreendida por Baldissera (2008, p.169) como “o processo de construção e disputa de sentidos no âmbito das relações organizacionais”, não está baseada apenas no discurso da organização; ela envolve também os sujeitos que a compõe por meio de suas interpretações e falas: “toda vez que alguém/algo/alguma coisa tornar a organização presente em uma relação haverá produção e disputa de sentidos, e isso não se restringe aos processos autorizados”. (Baldissera, 2010b, p.208). Dessa forma, Baldissera (2009) propõe três dimensões da comunicação organizacional: organização comunicada, organização comunicante e organização falada. Os processos formais da fala autorizada constituem a organização comunicada, que “dá visibilidade [à organização] objetivando retornos de imagemconceito, legitimidade, capital simbólico (e reconhecimento, vendas, lucros, votos, etc)”, podendo adquirir caráter disciplinador e, ainda, orientação ao auto-elogio. Essa dimensão se estabelece a partir do discurso da organização, ou seja, o que ela deseja transmitir. Ultrapassados os limites da fala autorizada encontramos a organização comunicante, ou seja, quando o processo comunicacional se atualiza a partir do estabelecimento da relação entre um sujeito (pessoa, público) e a organização. Neste caso são incluídos os processos comunicacionais informais, inclusive aqueles que surgem sem que a 7 VIII Seminario Regional (Cono Sur) ALAIC “POLÍTICAS, ACTORES Y PRÁCTICAS DE LA COMUNICACIÓN: ENCRUCIJADAS DE LA INVESTIGACIÓN EN AMÉRICA LATINA” 27 y 28 de agosto 2015 | Córdoba, Argentina organização tenha conhecimento. Essa dimensão revela a ocorrência de relações que escapam do controle e que podem perturbar a ordem estabelecida. Contudo, a subjetividade adquire um espaço ainda maior no dia a dia das relações de trabalho na terceira dimensão descrita por Baldissera (2009, p. 119), a organização falada. São “processos de comunicação informal indiretos; aqueles que se realizam fora do âmbito organizacional e que dizem respeito à organização”, como conversas em um jogo de futebol ou no almoço de domingo. Sobre essa dimensão a organização não possui nenhum tipo de controle e interferência direta, já que as manifestações extrapolam o ambiente organizacional e partem para o convívio em família ou com amigos, por exemplo. A definição de políticas de diversidade é uma das principais categorias do discurso organizacional moderno (Siqueira & Andrade, 2012); contudo, é urgente que as organizações proponham alternativas de transformação das relações de trabalho, a fim de minimizar a precarização do trabalho e “buscar formas não violentas de organização e relacionamento, mesmo que tais violências sejam, em certa medida, violências sutis” (ibidem, p.100). Práticas organizacionais formais – como equiparação da oferta de benefícios para casais heterossexuais e homossexuais, condições de trabalho asseguradas para PcDs e regras claras para salários e promoção de cargos, por exemplo – são fundamentais para que os profissionais se sintam seguros para assumir sua identidade no ambiente de trabalho (Siqueira & Andrade, 2012). Com isso, tendem a fortalecer sua autoestima e, assim, passam a buscar o respeito dos colegas nas relações que estabelecem. Essa busca precisa envolver todos os empregados, não apenas o profissional estigmatizado, por meio de sensibilização: “é preciso haver discussões sobre alteridade como um todo, sobre a necessidade em se respeitar o outro, o diferente; isso pode ser catalisado por meio do esforço ao coletivo de trabalho e à ampliação de um espaço público da palavra” (Siqueira & Andrade, 2012, p.102). Além disso, outras possibilidades são a promoção de palestras com especialistas, a criação de fóruns de 8 VIII Seminario Regional (Cono Sur) ALAIC “POLÍTICAS, ACTORES Y PRÁCTICAS DE LA COMUNICACIÓN: ENCRUCIJADAS DE LA INVESTIGACIÓN EN AMÉRICA LATINA” 27 y 28 de agosto 2015 | Córdoba, Argentina discussão, de dinâmicas de reflexão, além de abordagem diferenciada sobre diversidade nos canais internos de comunicação. Para PcDs, por exemplo, algumas empresas já dispõem de formatos adaptados em seus veículos de comunicação, como revistas com edição em áudio. Também são oferecidos cursos de libras gratuitamente a quem se interessar, o que facilita a comunicação com pessoas com deficiência auditiva. A comunicação entre organização e empregados precisa estar envolvida na gestão da diversidade a fim de evitar a reafirmação de posições discriminatórias por meio de campanhas ou peças de comunicação. Presentear as mulheres da empresa com kit maquiagem e as mamães com esmalte pode ser uma alternativa barata, entretanto, não rompe com a lógica da dominação masculina que ainda se faz presente no cotidiano das organizações (Prestes Motta, 2000). “As representações imaginárias que uma organização cultiva identificam quem é quem, demarcam praxes nem sempre explícitas, impõem precedências e formalidades compulsórias, regulam expectativas e pautas de comportamentos, exigem cautela e aprendizagem por parte de todos os membros” (Srour, 1998, p.128). Os novos desafios da comunicação exigem das organizações novas formas de relacionamento com seus públicos em uma era de exclusividade, pluralismo, inovação, fragmentação e simbolismos (Almeida, 2008). 3. Mundo do trabalho: território de convivência entre diferentes Em busca de legitimidade frente ao mercado e a seus públicos, as organizações que investem em políticas de diversidade esperam projetar uma imagem socialmente responsável (Saraiva & Irigaray, 2009) e, por isso, o conceito tem sido utilizado por organizações de diversos segmentos de mercado, tanto em discursos institucionais quanto na publicidade. Neste ano, no Brasil, o Dia dos Namorados, comemorado em 12 de junho, foi estopim para uma forte discussão sobre diversidade. Uma grande marca de perfumes e cosméticos utilizou em sua campanha casais heterossexuais e homossexuais, resultando, inclusive, em boicote à empresa por parte 9 VIII Seminario Regional (Cono Sur) ALAIC “POLÍTICAS, ACTORES Y PRÁCTICAS DE LA COMUNICACIÓN: ENCRUCIJADAS DE LA INVESTIGACIÓN EN AMÉRICA LATINA” 27 y 28 de agosto 2015 | Córdoba, Argentina de grupos mais conservadores, como se pode assistir no You Tube, no canal oficial do Pastor Silas Malafaia4, ou também no site Reclame Aqui5, em que, em meio a reclamações sobre produtos ou serviços relacionados à marca, surgiram reclamações a respeito da campanha. A repercussão foi tamanha que, além de repercutir nas redes sociais, o assunto ganhou destaque em sites de notícias como BBC Brasil6, El País7 e portal de Economia do IG8, o que motivou a empresa a disseminar, via redes sociais, uma pesquisa de opinião a fim de avaliar como a campanha estava sendo interpretada e qual a intenção de compra dos consumidores no auge da discussão. Ultrapassando a questão do preconceito, ou mesmo da aceitação do público, é possível traçar uma segunda discussão, em paralelo, ao nos aproximarmos do contexto organizacional: o discurso de diversidade, presente na publicidade das marcas, se reflete nas práticas das organizações? Afinal, não basta que a publicidade defenda uma bandeira se esta já não estiver fixada internamente. Os discursos organizacionais são particularmente ambíguos com relação à diversidade, pois “difundem uma nova visão de organização, tratando de aspectos díspares e, ao mesmo tempo, complementares, na tessitura de uma visão de cidadão (mais do que de empregado), e da comunidade (mais do que da empresa), em busca de legitimidade” (Saraiva & Irigaray, 2009, p.339). Entretanto, ainda conforme os autores, “embora seja estimulado o envolvimento afetivo dos empregados, nas práticas de gestão predomina a impessoalidade”. As organizações Vídeo do Pastor Silas Malafaia, líder da Igreja Assembleia de Deus – Vitória em Cristo, em que pede aos espectadores que digam não à marca. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=Rn8ET9Nos9g>. Acesso em: 20 de julho de 2015. 5 Exemplo de manifestação contrária à propaganda publicitária feita por meio do site Reclame Aqui, que reúne reclamações de consumidores e disponibiliza espaço para que as empresas possam respondê-las. Disponível em: <http://www.reclameaqui.com.br/13420264/o-boticario/o-boticario-e-gay>. Acesso em: 20 de julho de 2015. 6 Disponível em: <http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/06/150604_salasocial_oboticario_opinioes_evangelicos_rs> Acesso em: 20 de julho de 2015. 7 Disponível em:< http://brasil.elpais.com/brasil/2015/06/03/politica/1433365595_609632.html>. Acesso em: 20 de julho de 2015. 8 Disponível em: <http://economia.ig.com.br/empresas/2015-06-02/em-video-malafaia-propoe-boicote-aoboticario-va-vender-perfume-pra-gay.html>. Acesso em 20 de julho de 2015. 4 10 VIII Seminario Regional (Cono Sur) ALAIC “POLÍTICAS, ACTORES Y PRÁCTICAS DE LA COMUNICACIÓN: ENCRUCIJADAS DE LA INVESTIGACIÓN EN AMÉRICA LATINA” 27 y 28 de agosto 2015 | Córdoba, Argentina que não mostrarem coerência entre fala e atitude podem ter sua legitimidade ameaçada quando os próprios empregados não reconhecem as políticas de diversidade por perceberem, em seu dia a dia, a falta de oportunidades de ascensão e de reconhecimento na organização (Saraiva & Irigaray, 2009). Apesar da discriminação que ainda persiste nos processos seletivos, quanto à raça, gênero, credos, orientação sexual, deficiências, a organização se constitui como um espaço de encontro entre diferentes, no qual os sujeitos interagem e constroem sentidos com base em um universo comum e partilhado. Por meio da atividade de trabalho, diferentes sujeitos se encontram para trocar experiências e criar um produto comum, a partir da ação em coletividade. “A ideia de organização compreende, também, e fundamentalmente, sujeitos em relação, laborando por objetivos específicos, definidos, claros” (Baldissera, 2010a, p.62). Dessa forma, as organizações deixam de ser local de trabalho para se tornar o mundo do trabalho; deixam de ser um local delimitado por barreiras físicas para tornarem-se uma teia de relações e aprendizados que servem de experiência para os indivíduos e para compreensão de outras formas de ver sua própria realidade. 4. Sujeitos e organizações plurais A identidade de cada sujeito é formada e re-significada continuamente em suas representações sociais, processo que se dá também por meio das interações que estabelece em seu ambiente de trabalho. A comunicação como processo de interação e construção de sentidos, com base em um universo comum e partilhado, pressupõe compreender que os sentidos desse universo são provenientes da condição intrínseca da atividade humana. 11 VIII Seminario Regional (Cono Sur) ALAIC “POLÍTICAS, ACTORES Y PRÁCTICAS DE LA COMUNICACIÓN: ENCRUCIJADAS DE LA INVESTIGACIÓN EN AMÉRICA LATINA” 27 y 28 de agosto 2015 | Córdoba, Argentina Essa é a objetividade das relações intersubjetivas necessárias à comunicação e ao trabalho. (Figaro, 2014, p.104) A identidade do sujeito no trabalho é um componente importante para o processo motivacional, contribuindo, também, para a construção de uma autoestima positiva, para maior criatividade e melhor socialização (Machado, 2003). Já a identidade organizacional é parte da identidade individual de seus membros; nesta construção também se fazem presentes “os objetivos, a missão, as práticas e os valores presentes na organização” e, por isso, ela adquire um caráter compartilhado (Machado, 2003, p.61). Portanto, é possível dizer que não há organização plural se esta pluralidade não estiver nos integrantes que formam a organização. Reconhecer a pluralidade cultural implica em reconhecer também uma pluralidade identitária: “à medida que os sistemas de significação e representação cultural se multiplicam, somos confrontados por uma multiplicidade desconcertante e cambiante de identidades possíveis, com cada uma das quais poderíamos nos identificar – ao menos temporariamente” (Hall, 2014, p.12). Assim, a identificação dos sujeitos não se dá mais exclusivamente em termos de classe, nem por uma identidade mestra e única, como argumenta Hall (2014), mas por um “jogo de identidades” que se deslocam, “atravessadas por diferentes divisões e antagonismos sociais que produzem uma variedade de diferentes ‘posições de sujeito’”: Uma vez que a identidade muda de acordo com a forma como o sujeito é interpretado ou representado, a identificação não é automática, mas pode ser ganhada ou perdida. Ela tornou-se politizada. Esse processo é, às vezes, descrito como constituindo uma mudança de uma política de identidade (de classe) para uma política de diferença. (Hall, 2014, p.16) Baldissera (2007, p. 233) argumenta que, melhor que falar em identidades, seria falar em identificações: “Isso dá conta do fato de os sujeitos, em diferentes momentos, identificarem-se com coisas/processos/fatos diferentes, algumas vezes contrários e até contraditórios”. Ao reconhecer essas diferentes e fluidas identidades, a organização assume a função de mediar seus significados por meio da compreensão da diferença e, assim, alcança o aprofundamento da alteridade. 12 VIII Seminario Regional (Cono Sur) ALAIC “POLÍTICAS, ACTORES Y PRÁCTICAS DE LA COMUNICACIÓN: ENCRUCIJADAS DE LA INVESTIGACIÓN EN AMÉRICA LATINA” 27 y 28 de agosto 2015 | Córdoba, Argentina 5. Reflexões finais Na contemporaneidade, o ambiente organizacional caracteriza-se por “mudanças que determinam novos cenários e bases para as relações sociais. Coexistem mundos distintos, complexos, ambíguos e fluídos, os quais resultam em rupturas, novas leituras e linguagens” (Almeida, 2013, p.53). Para Maria Ester de Freitas (2013) vivemos em uma era que exige comunicação, resolução de conflitos, além da criação de novas formas de trabalhar e de se relacionar, cenário que interfere diretamente no mundo do trabalho, conforme destaca: “A diversidade nas sociedades atuais é cada vez mais expressa no mundo organizacional, que tem como grande tarefa extrair dela o seu melhor, sem perder a consistência interna” (2013, p.151). A definição de políticas públicas contrárias à discriminação no mercado de trabalho não é garantia de tolerância e inclusão – nem por parte dos sujeitos, nem por parte das organizações. É preciso que se discuta a diversidade, retirando de certos assuntos o rótulo do tabu. A partir interação entre sujeitos diferentes torna-se possível a compreensão da subjetividade do outro, permitindo, assim, a criação de um ambiente plural e de respeito à manifestação de diferentes identidades. Ao interagirem, os sujeitos transformam a cultura organizacional e também são transformados por ela. Por meio de tensões e disputas perturbam a teia de significados que constitui a organização e, ao mesmo tempo, exige que se reorganize; essas interações representam uma das condições de existência da própria organização, já que a mantém longe da estagnação (Baldissera, 2014). A diversidade presente no ambiente organizacional serve de oxigenação para que o sistema continue funcionando e possa se adaptar de forma cada vez mais rápida frente aos desafios que surgem. 13 VIII Seminario Regional (Cono Sur) ALAIC “POLÍTICAS, ACTORES Y PRÁCTICAS DE LA COMUNICACIÓN: ENCRUCIJADAS DE LA INVESTIGACIÓN EN AMÉRICA LATINA” 27 y 28 de agosto 2015 | Córdoba, Argentina Bibliografia Almeida, A. L. C. (2008). A construção de sentido sobre “quem somos” e “como somos vistos”. In: Marchiori, M. Faces da Cultura e da Comunicação Organizacional. São Paulo: Difusão. Baldissera, R. (2007). 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