Nocturnal soundscape of Brasilia`s Pilot Plan: study case in North

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Nocturnal soundscape of Brasilia`s Pilot Plan: study case in North
Buenos Aires – 5 to 9 September 2016
st
Acoustics for the 21 Century…
PROCEEDINGS of the 22nd International Congress on Acoustics
Environmental Acoustics & Community Noise: FIA2016-11
Nocturnal soundscape of Brasilia's Pilot Plan: study
case in North Superblock 410 (SQN 410)
Ludmila Correia(a), Ricardo Trevisan(b), Sérgio Garavelli(c), Armando Maroja(d), Bruna
Croce(e), Jhennyfer Pires(f)
(a)
Universidade de Brasília, Brasil, [email protected]
(b)
Universidade de Brasília, Brasil, [email protected]
(c)
Centro Universitário de Brasília, Brasília, [email protected]
(d)
Universidade de Brasília, Brasil, [email protected]
(e)
Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brasil, [email protected]
(f)
Centro Universitário EuroAmericano, Brasil, [email protected]
Abstract
Heritage of Humanity, the Brasilia’s Pilot Plan has a distinctive sound ambience, atypical to a
big city. When the urban plan was designed by Lucio Costa, noise was not an evident principle,
but the adopted solutions incorporated premises that contribute with the urban acoustic comfort
- like the existence of local commercial buildings and green belt, which protects the residential
buildings. Scientific research carried out for UNESCO identified low percentage of people by
traffic noise. However, the nocturnal noise is actually a relevant nuisance factor to the
population, causing conflicts between community, bar owners and cultural producers. These
annoyances emerged mainly due to the growth of nocturnal activity in Local Commercial
Sectors in recent years, and due to their proximity with residential buildings of the Superblocks.
By evaluating the soundscape of North Superblock 410 (SQN 410), a place of intense nocturnal
activity, we sought to identify and analyze the different sounds that compose the soundscape of
that place. The study was conducted based on sound map by computer simulation and in situ
measurements, combined with residents’ interviews, having a night time frame. The results
were analyzed considering both the morphology of SQN 410 and subjective aspects highlighted
by residents in interviews. Therefore, we intended to contribute for a better understanding about
the acoustic aspects of Lucio Costa’s Plan, considering the present uses and the morphological
characteristics of the city. From this understanding, possible ways to mitigate conflicts between
leisure activities and residential use in this location are pointed out, as well as guidelines for
urban legislation.
Keywords: Nocturnal soundscape, Brasilia’s Pilot Plan, Nocturnal Noise
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Paisagem sonora do Plano Piloto de Brasília: estudo
de caso na Superquadra Norte 410 (SQN 410)
1 Introdução
A paisagem sonora de uma cidade reflete diretamente as vivências históricas, culturais e
políticas de cada época. Apesar de Brasília (Distrito Federal - DF, Brasil) ser uma cidade
relativamente nova, datada de 1960, muitas mudanças já podem ser observadas em sua
paisagem sonora, especialmente nos últimos anos.
Projetada para abrigar a nova capital do país, Brasília é um modelo único de cidade moderna
planejada. Seu plano urbanístico foi proposto por Lucio Costa [1], utilizando a forma de avião
para adequar o plano proposto à topografia, hidrologia e clima locais. Seu traçado é formado
por uma malha de quarteirões reticulados, orientados ao longo de dois principais eixos. No
sentido leste-oeste da cidade encontra-se o Eixo Monumental, ao longo do qual estão situados
os principais edifícios públicos e administrativos. Já no sentido norte-sul encontra-se o Eixo
Rodoviário-Residencial (Eixão), além dos eixos L e W e as avenidas L2 e W3, principais vias
que cortam a cidade e em torno das quais localizam-se as quadras residenciais. No
cruzamento entre os eixos norte-sul e leste-oeste estão situados os setores voltados ao
comércio e serviços.
O tombamento de Brasília favoreceu a preservação das características morfológicas da cidade,
em especial a organização espacial dos prédios e vias. Já quanto à distribuição dos usos e
atividades, a cidade sofreu diversas alterações. Os edifícios comerciais localizados nas
entrequadras, por exemplo, eram inicialmente contínuos (como acontece na Asa Sul), voltados
para as residências e destinados a atender às demandas cotidianas da população residente
nas quadras próximas [2]. Na Asa Norte, edificada posteriormente [3], foram construídos blocos
quadrados com galeria coberta, isolados uns dos outros, com lojas voltadas para todas as
laterais. Entretanto, dada a maior visibilidade a partir da via de acesso à entrequadra, as lojas
hoje estão prioritariamente abertas para tal, e atendem não apenas à população local,
oferecendo comércio diferenciado, atividades de lazer, alimentação e outros.
O Plano Piloto de Brasília apresenta uma ambiência sonora atípica para uma grande cidade.
Apesar da poluição sonora não ser, à época do projeto de Lucio Costa, uma preocupação
primária, as soluções adotadas incorporam premissas acústicas [4] que favorecem a proteção
em relação ao ruído de tráfego: cinturão verde e relativa distância entre as vias principais e as
residências; edifícios comerciais locais que separam os blocos residenciais do tráfego na via de
acesso às superquadras; hierarquização das vias e traçado orgânico para as ruas internas às
superquadras.
A qualidade acústica da cidade se confirmou em uma pesquisa realizada para a UNESCO [5],
na qual o Plano Piloto revelou baixos percentuais de pessoas incomodadas com o ruído de
tráfego, mundialmente apontado como principal poluidor sonoro. Já o ruído noturno
(proveniente de bares, restaurantes, casas noturnas e demais estabelecimentos que funcionam
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à noite) é atualmente fator de crescente incômodo a uma parcela da população residente nas
superquadras do Plano Piloto, verificado em conflitos recentes entre comunidade, donos de
bares e produtores culturais. Tais embates decorrem, entre outros fatores, do crescimento das
atividades de lazer nos Setores Comerciais Locais, especialmente nos últimos cinco anos, e da
grande proximidade entre estes e alguns blocos residenciais das superquadras residenciais.
O desenho do Plano Piloto é caracterizado por áreas predominantemente abertas, nas quais o
som se dissipa mais facilmente, com configuração semelhante à do campo livre [6]. A
atenuação provocada pela absorção das superfícies e pela dispersão a partir das aberturas
entre os edifícios facilita a perda de energia sonora. A descontinuidade na malha, devido à
distribuição espaçada dos edifícios e os térreos dos edifícios residenciais em pilotis, favorece a
propagação do ruído, fazendo da distância o principal elemento redutor da intensidade sonora.
Há, assim, um significativo impacto das atividades geradoras de ruído sobre atividades
sensíveis, quando localizadas muito próximas.
Embora o ruído de tráfego seja o mais citado em estudos e reclamações relativos à poluição
sonora nas cidades, não são apenas os ruídos intensos que afetam o estado de saúde das
pessoas. A Organização Mundial de Saúde (OMS) [7] defende que o ruído noturno, mesmo
em níveis não tão elevados, está amplamente relacionado com distúrbios de sono e insônia,
levando ao uso de medicamentos, problemas de saúde auto relatados, hipertensão, infarto do
miocárdio, depressão, entre outros. A OMS determina 35 decibels como o limiar para que se
tenha condições ótimas de sono, recomendando-se valores abaixo de 40 dB no interior do local
de descanso. Quando o ruído interno está em torno de 50 dB, o descanso é comprometido e
apenas por breves intervalos chegamos ao sono profundo; já acima de 55 dB, os níveis
sonoros são considerados críticos para a saúde da população, com efeitos adversos
frequentemente observados, incluindo o aumento nos riscos de doença cardiovascular.
No Brasil, apesar de haverem diretrizes federais, o controle da poluição sonora é
regulamentado por leis municipais e distritais. A Lei Distrital 4.092/08, popularmente
denominada “Lei do Silêncio”, é voltada ao combate à poluição sonora e estabelece “limites
máximos de intensidade da emissão de sons e ruídos resultantes de atividades urbanas e
rurais do Distrito Federal”, ancorada na Norma ABNT NBR 10.151 [8]. Visando garantir a
efervescente vida cultural e noturna brasiliense, e acreditando que a legislação atual dificulta
suas atividades, alguns grupos têm se organizado na tentativa de alterar a lei 4.092, mas
apesar dos diversos projetos de lei apresentados desde 2009, não há até o momento um
consenso em sua alteração. Dentre os principais motivos de divergência estão os novos limites
propostos, que ultrapassam significativamente os níveis da lei atual e vão de encontro à
legislação federal. Em nível federal, a Lei 6.938/1981, relativa à Política Nacional do Meio
Ambiente, dá ao CONAMA a competência para estabelecer “normas e padrões compatíveis
com o meio ambiente ecologicamente equilibrado e essencial à qualidade de vida”. Como a
Resolução 001/90 do CONAMA determina que sejam adotados os níveis estabelecidos na
ABNT NBR 10.151, suas determinações passam a ter força de lei.
A resolução de conflitos entre comerciantes e moradores, entretanto, ultrapassa o mero
estabelecimento de níveis mais ou menos elevados – até porque em outras cidades brasileiras
com vida noturna consolidada, como em São Paulo, são adotados os mesmos limites da atual
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lei do DF. A discussão deve ser pautada na garantia dos diversos direitos constitucionais como
apresenta, por um lado [9], o artigo 5 da Constituição: “é livre a expressão da atividade
intelectual, artística, científica e de comunicação”, e o artigo 225: “todos têm direito ao meio
ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia
qualidade de vida”.
Para que o debate seja mais amplo e aprofundado, a avaliação das mudanças na paisagem
sonora deve considerar não apenas quantificação de ruídos, mas também as preferências
subjetivas e relações históricas e socioculturais. Kang et al. [10], por exemplo, consideram que
as pessoas em geral preferem sons naturais e culturais em detrimento a sons artificiais, além
de sugerir que a herança cultural e experiência ambiental a longo prazo façam com que
pessoas acostumadas a ambientes sonoros semelhantes tenham preferências similares,
normalmente associadas às características da paisagem sonora a que estão acostumadas.
O estudo da paisagem sonora noturna de uma superquadra do Plano Piloto de Brasília com
intensa atividade noturna permitiu-nos uma melhor compreensão das mudanças no ambiente
sonoro da cidade. A partir do trabalho realizado, apontamos possíveis caminhos para amenizar
os conflitos entre atividade de lazer noturno e uso residencial, considerando tanto as mudanças
na ocupação de Brasília quanto suas características morfológicas únicas.
2 Metodologia
O trabalho foi realizado com base em pesquisa bibliográfica e documental e avaliação da
paisagem sonora, utilizando-se medições in loco, mapeamento sonoro por simulação
computacional e a entrevistas com moradores e proprietários de bares.
2.1
Caracterização do estudo de caso e recorte temporal
O local selecionado como estudo de caso foi a Superquadra Norte 410, incluindo a entrequadra
comercial, conforme apresentado na Figura 1. A Superquadra abriga prioritariamente atividade
residencial, mas também conta com igreja, escola, praças e parques infantis. O comércio local
apresenta uso misto, com loja e sobreloja ocupando os dois primeiros níveis dos blocos e
unidades residenciais no terceiro nível.
Fonte: (Google Earth, 2016)
Figura 1: Localização da área de estudo – SQN 410, no Plano Piloto de Brasília-DF
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A quadra foi selecionada por apresentar recorrentes conflitos entre os moradores e os
comerciantes e consumidores dos bares, além de um padrão de ocupação que intensifica o
incômodo aos moradores. As lojas ocupadas pelos bares – foram contabilizados oito
estabelecimentos de funcionamento noturno – estão em sua maioria situadas nos trechos de
cada bloco mais próximos à superquadra residencial. Como a área interna das lojas dos
comércios locais da Asa Norte é reduzida (cerca de 50 m 2), a ocupação ocorre principalmente
na área externa às lojas, não só por mesas mas grande quantidade de pessoas em pé (Figura
2), dificultando a adoção de soluções de isolamento acústico. Além disso, a grande
proximidade entre os prédios comerciais e a fachada dos edifícios residenciais mais próximos –
cerca de 15 metros – destoa da forma de implantação proposta para as demais superquadras,
que em geral apresentam maior área verde entre o comércio e os edifícios residenciais.
Fonte: Arquivo Pessoal, 2016
Figura 2: Trecho entre bloco comercial e o edifício residencial mais próximo na SQN 410,
de dia e à noite.
Os usuários dos bares da quadra são principalmente jovens, moradores das proximidades ou
estudantes da Universidade de Brasília – situada a pouco mais de 1 km do local. Por isso, a
atividade nos bares é mais significativa de terças a sexta-feira, a partir das 18h, sendo
intensificada entre 22h e 2h. Como o foco avaliação é a paisagem sonora noturna, foi realizado
um recorte para o período das 22h às 7h, conforme definido na normatização brasileira [8].
2.2
Mapeamento sonoro
Com intuito de caracterizar gráfica e quantitativamente a paisagem sonora noturna da SQN
410, foi realizado um mapeamento utilizando o Software CadnaA. Os mapas sonoros ou
acústicos são instrumentos de avaliação e análise de ruído ambiental, realizados atualmente
com auxílio de programas de computador [11]. Sua elaboração foi baseada no levantamento
das fontes, medições in loco para calibração do modelo, levantamento de dados topográficos e
da morfologia dos edifícios.
Produzimos, assim, uma previsão do cenário atual, no qual foi possível identificar as áreas
mais afetadas ou protegidas acusticamente. Os resultados foram analisados considerando-se
tanto a morfologia da superquadra – dimensões e distribuição dos edifícios, o traçado viário e a
localização das diferentes atividades realizadas no local – quanto aspectos subjetivos
apontados nas entrevistas.
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As fontes foram quantificadas a partir de medições in loco - com uso de sonômetro1 (medidor
de pressão sonora) e dados de estudos precedentes realizados pelo grupo 2 - caracterizadas a
partir de observação em campo e entrevistas com os moradores e proprietários dos bares.
Foram selecionadas as fontes do período noturno: vias ao redor e internas, comércios móveis
na entrada da quadra, áreas de mesas dos bares, fontes pontuais nas proximidades dos
edifícios residenciais nos quais há constante permanência de pessoas, estacionamentos,
praças e estacionamentos, além da fachada da escola (com atividades do período noturno).
Utilizou-se como referência o LAeq (nível de pressão sonora equivalente, ponderado em A), o
Lmax (nível de pressão sonora máximo) e o L min (nível de pressão sonora mínimo). Fontes
naturais (animais, ventos) não foram consideradas por não apresentarem um padrão definido
de emissão sonora.
2.3
Medições in loco
A análise dos impactos das fontes sonoras considerou os receptores mais sensíveis, com
destaque para os edifícios residenciais mais próximos ao comércio. Para tanto, além das
medições externas, foram realizadas medições no quarto de uma residência no Bloco O da
quadra residencial, próximo ao qual há maior concentração de pessoas nos bares. Para
caracterizar as variações na paisagem sonora ao longo do dia, foram realizadas medições em
24 horas, em duas quintas-feiras (final de maio e início de junho de 2016), dia de maior
atividade nos bares. Foi realizada uma medição no interior do quarto, com a janela fechada, e
outra no exterior, a 2 metros da fachada.
2.4
Entrevistas
As entrevistas foram realizadas com moradores e proprietários dos bares, a partir de conversas
informais e entrevistas. A forma de participação – via email, oralmente, entrevista gravada –
variou conforme a disposição do respondente, mantendo-se o mesmo escopo geral de
perguntas. Junto aos moradores foram levantadas informações sobre suas preferências em
relação à quadra, sua percepção da paisagem sonora da quadra de maneira geral, e mais
especificamente no período noturno. Também foi questionado se há algum incômodo em
relação ao ruído, e se foi realizada alguma adequação na residência para reduzir eventuais
incômodos. Em relação aos proprietários de bares, foram levantadas as principais dificuldades
encontradas para manter o bar funcionando e os possíveis entraves devido à proximidade das
residências. Também questionamos sobre as modificações já realizadas ou previstas, visando
reduzir o incômodo aos moradores.
Finalmente, foi levantada a opinião tanto dos moradores quanto dos proprietários sobre as
possíveis atitudes – dos moradores, donos, funcionários e usuários dos bares, órgãos do
1
Sonômetro SOLO da 01dB, dotado de filtro de frequência de 1/3, a análise realizada com o software
dBTraid da 01dB. O equipamento foi calibrado antes e após a realização das medidas.
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Parte da equipe deste trabalho é integrante do grupo Acústica e Poluição Ambiental, do Centro
Universitário de Brasília – UNICEUB.
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governo, entre outros – que poderiam contribuir para harmonizar a relação entre os bares e as
residências.
3 RESULTADOS
A Figura 4 apresenta duas imagens que confirmam a hipótese de que a SQN 410 possui uma
paisagem sonora diferenciada, relativamente silenciosa.
Os maiores níveis de exposição ao ruído de tráfego foram encontrados nas proximidades das
vias, não atingindo significativamente as unidades residenciais devido à distância entre vias e
residências. As vias locais de acesso (vias de acesso à EQN 410/411 e à SQN 410)
apresentam variação ao longo do dia, proporcionalmente mais significativo à noite, quando o
movimento de veículos nas demais vias é reduzido e o fluxo no acesso aos bares é maior
(Figura 3).
Fonte: Software CadnaA, 2016.
Figura 3: Mapa acústico para os períodos diurno (7h às 22h) e noturno (22h às 7h)
Comparando-se a paisagem sonora nos períodos diurno e noturno, há um significativo
contraste em determinadas áreas, devido à grande quantidade de bares localizados na
entrequadra comercial, em sua maioria voltados para as unidades residenciais e com ocupação
da área pública. Outro importante contraste foi observado especificamente no período noturno,
entre as unidades residenciais mais próximas ao comércio e o interior da quadra (Figura 4).
Fonte: Software CadnaA, 2016.
Figura 4: Visão geral da paisagem sonora da quadra
A partir da avaliação das edificações, foi analisado o nível sonoro atingido em cada ponto das
fachadas das residências. Nas áreas próximas às comerciais (Visada 1, Figura 5), foram
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identificados níveis acima de 60 dB na fachada dos edifícios residenciais e acima de 65 dB nas
residências sobre o comércio local, valores bem acima do estabelecido pela legislação local. Já
no interior da quadra (Visada 2, Figura 5) raramente são encontrados níveis acima de 55 dB,
prevendo-se no interior das residências o nível sonoro recomendado pela OMS.
Essa diferenciação ao longo da quadra se justifica pela existência de edifícios residenciais
bastante próximos dos blocos comerciais e unidades residenciais acima destes, os quais são
afetados mais significativamente. Já no interior da quadra, devido ao espaçamento entre os
edifícios e a ausência de fontes sonoras significativas no período noturno, os demais prédios
estão mais protegidos das fontes de ruído.
Fonte: (Software CadnaA, 2016)
Figura 5: Detalhe Visadas 1 e 2, vistas a partir da entrequadra comercial e do acesso à
Superquadra (residencial), respectivamente
As medições realizadas em uma residência do Bloco O, em frente ao comércio (Visada 1,
Figura 5), demonstraram que o período mais ruidoso é de 22h às 02h. A Figura 7 apresenta os
resultados das medições no interior do quarto, com a janela fechada, e externamente à
fachada. Apesar de em 24 horas o LAeq no interior do quarto ter sido de 48 dB, das 22h às 02h
chegou a 54,7 dB, atingindo o Lmax de 67,8 dB. Na medição externa, a variação em 24 horas
manteve o mesmo padrão da medição no interior, mas o LAeq foi de 65,8 dB em 24 horas e 71,3
dB de 22h às 02h, com Lmax de 84,7 dB.
Fonte: Tela do software de análise das medidas - dBBATI-01dB, 2016
Figura 6: Espectro de Leq ponderado em A, no interior do quarto e a 2 metros da fachada
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Verificamos assim uma elevação significativa nos níveis sonoros no período noturno, atingindo
valores críticos tanto se levarmos em conta as recomendações da OMS [5] – 40 dB – quanto a
NBR 10.151 [8] – 45 a 55 dB para áreas estritamente residenciais e mistas com vocação
recreacional, respectivamente. Essa condição é reforçada quando observamos no relato dos
moradores a constante dificuldade de sono, havendo um grande número de moradores dos
blocos residenciais mais próximos ao comércio que só dormem com medicação.
As entrevistas demonstraram uma grande satisfação dos moradores com a paisagem sonora
da quadra durante o dia – com pássaros cantando, vozes das crianças na escola, e outros
sons considerados agradáveis – e bastante incômodo durante a noite. A maior reclamação é
em relação à conversação de grande número de pessoas – apenas um bar tem música ao vivo.
O incômodo apontado não foi só em relação ao ruído, mas também a problemas de segurança
pública (assaltos, brigas, pessoas urinando ou fazendo sexo em locais públicos),
especialmente depois que os bares fecham e as pessoas se deslocam para baixo dos blocos.
Dentre as medidas adotadas para minimizar o incômodo com o ruído, além do uso de
medicação para dormir, tivemos relatos de moradores que inutilizaram o quarto voltado para a
comercial, outros que passaram a dormir com o mascaramento gerado por equipamento de
climatização. Já entre os donos de bares, as principais mudanças foram a alteração na área de
ocupação das mesas, evitando-se a fachada voltada para a residencial, mudanças no horário
de funcionamento ou de música, e orientação aos clientes sobre o excesso de ruído.
Quanto às possíveis atitudes para amenizar os conflitos entre os bares e as residências,
apesar das opiniões diversas, houve consenso sobre a necessidade de se conscientizar os
usuários dos bares e de maior segurança pública. A grande maioria dos proprietários considera
legítima a reclamação dos moradores, especialmente os mais próximos às entrequadras
comerciais, assumindo sua parcela de responsabilidade na solução do problema. Apontam,
entretanto, falhas nos métodos de medição e fiscalização por parte dos órgãos ambiental e de
fiscalização do DF, os quais agiriam de forma seletiva e pouco transparente. Outro ponto
levantado foi a falta de definições mais claras sobre a ocupação da área pública, pela qual os
proprietários relatam que pagam uma taxa mas não tem oficialmente direito de uso. Isso
dificulta a adoção de medidas para isolamento e atenuação do ruído, já que a instalação de
barreiras móveis e outras soluções acústicas demanda um investimento que pode se perder,
caso não deixem de ter direito ao uso da área pública.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O trabalho realizado permitiu-nos avançar na definição de um método voltado para a avaliação
do ruído noturno, considerando-se as características morfológicas específicas de Brasília e as
fontes de ruído provenientes de atividade de lazer. Os contextos cultural e ambiental de cada
localidade impactam diretamente na paisagem sonora, sendo necessária a criação de uma
metodologia própria para a avaliação sonora aplicável em cada caso.
Acreditamos que a busca por um ambiente sonoro equilibrado pressupõe não o silêncio
absoluto, mas sim uma paisagem sonora que, ao mesmo tempo, reflita a vivência do homem
no espaço urbano, e lhe permita usufruir do direito ao sossego. Se, por um lado, a efervescente
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vida noturna de Brasília traz à cidade maior urbanidade, seus impactos devem ser
adequadamente analisados, evitando a exposição dos moradores locais a níveis sonoros
críticos, que representem danos efetivos à saúde da população. Nosso estudo verificou que
nos edifícios residenciais mais próximos ao comércio local os níveis encontrados ultrapassam
significativamente os limites estabelecidos pela legislação, especialmente no período noturno.
Dentre os principais caminhos vislumbrados para a solução dos conflitos entre reclamantes e
causadores de ruído está a ampla discussão e esclarecimento da população em geral, com
programas de conscientização e controle do ruído, com maior foco nos bairros em que a
atividade comercial noturna e o uso residencial coexistem de maneira mais próxima. Ações
educativas dos próprios donos de bares junto aos usuários demonstraram-se bastante
eficazes, mas devem partir de uma ação conjunta, envolvendo todos os proprietários e também
o poder público. Do ponto de vista legal, mostrou-se necessária a revisão da legislação de
controle da poluição sonora, especialmente no que diz respeito à forma de medição, tornando
os procedimentos mais padronizados e transparentes.
A partir de um conjunto de ações integradas, consideramos possível encontrar caminhos para
uma convivência mais pacífica entre os diferentes grupos e parcelas da população. Assim, ao
invés de proibir determinadas atividades, restringir ou engessar o uso e ocupação,
caminharemos para garantir tanto o direito sossego quanto ao amplo usufruto da cidade.
Referências
[1] Costa, L. Relatório do Plano Piloto de Brasília. GDF, Brasília, 1991.
[2] Ferreira, Marcílio Mendes e Gorovitz, Matheus. A invenção da Superquadra: o conceito da Unidade
de Vizinhança em Brasília, IPHAN / Superintendência do IPHAN no Distrito Federal, Brasília, 2009.
[3] Leitão, F. ; Ficher, Sylvia . Do risco à cidade: as plantas urbanísticas de Brasília, 1957-64. Anais do
8º Seminário de História da Cidade e do Urbanismo, UFF, Niterói (Brasil), 2004. v. 1. p. 1-18.
[4] Bistafa, S. R. Acústica Aplicada ao Controle do Ruído. Editora Blucher, São Paulo (Brasil), 2. edição,
2011.
[5] Garavelli, S. L. ; Maroja, A. M. ; Costa, C.A ; Carvalho Júnior, E. B. O Projeto de Lucio Costa para
Brasília DF e a Contaminação Acústica. Anais do 6º. Congresso Luso-Brasileiro para o Planejamento
Urbano, Regional Integrado e Sustentável, Lisboa , Portugal, 2014, pp. 1597-1608.
[6] NIEMEYER, M. L. Conforto acústico e térmico, em situação de verão, em ambiente urbano: uma
proposta metodológica, Dissertação − Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, UFRJ, Rio de Janeiro
(Brasil), 2007.
[7] WHO – World Health Organization. Night Noise Guidelines for Europe. Who Europe, Copenhagen,
2009.
[8] ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR 10.151: Avaliação do ruído em áreas
habitadas visando o conforto da comunidade, ABNT, Rio de Janeiro (Brasil), 2000.
[9] Brasil. Constituição da República Federativa do Brasil, Senado Federal, Brasília (Brasil), 1988.
[10] Kang, Jian; Yang, Wei; Zhang, Mei. Sound Environmental and Acoustic Comfort in Urban Spaces.
Nikolopoulou, Marialena. Design Open Spaces in the Urban Environment: A Bioclimatic Approach,
CRES/RUROS, Greece, 2004.
[11] Licintra, Gaetano. Noise mapping in the EU: models and procedures. CRC Press, Boca Raton, 2013.
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