Anatomia do lenho de Uncaria guianensise U. tomentosa

Transcrição

Anatomia do lenho de Uncaria guianensise U. tomentosa
Anatomia do lenho de Uncaria guianensis e U. tomentosa
(Rubiaceae) do Estado do Acre, Brasil
Percy A. ZEVALLOS POLLITO1, Mario TOMAZELLO2
RESUMO
As plantas de Uncaria guianensis e U. tomentosa são lianas trepadeiras, arbustos trepadores ou rasteiros ascendentes que ocorrem em
amplas áreas da Amazônia brasileira e países da América Central e do Sul. Possuem excepcional importância medicinal, com sua casca,
lenho e folhas utilizadas pelos povos amazônicos e pela indústria farmacêutica. Face a necessidade da identificação das plantas em
condições de campo e de laboratório, o presente trabalho descreveu a estrutura anatômica do lenho de Uncaria guianensis e U.
tomentosa, ocorrentes no Estado do Acre, Brasil. Os resultados mostraram que o lenho das espécies é característico da família
Rubiaceae, a exceção dos vasos arredondados, grandes e solitários, parenquima axial difuso e largura dos raios que são próprios das
lianas.
PALAVRAS-CHAVE
Anatomia do lenho, liana, Rubiaceae, Uncaria guianensis, Uncaria tomentosa.
Wood anatomy of Uncaria guianensis e U. tomentosa (Rubiaceae) from
the State of Acre, Brazil
ABSTRACT
Uncaria guianensis and U. tomentosa are climbing lianas, bush lianas occuring in large areas of Brazilian Amazon and Central and
South America countries. The species presented exceptional medicinal importance, with its bark, wood and leaves used by Amazon native
people and pharmaceutical industries. Considering the importance of the species identification in field and laboratory conditions, the
present work described the anatomical structure of Uncaria guianensis and U. tomentosa, which occurs in State of Acre, Brazil. The results
showed that the wood of the species was characteristic of the Rubiaceae family, except the rounded vessel, greater and solitary, parenchyma
axial diffuse and width of the rays, proper of lianas.
KEY WORDS
wood anatomy, liana, Rubiaceae, Uncaria guianensis, Uncaria tomentosa.
Faculdade de Ciências Florestais/Universidade Nacional Agrária La Molina, C.P. 456. Lima/Peru ([email protected]);
1
Departamento de Ciências Florestais-ESALQ/Universidade de São Paulo, C.P. 09. 13418-900. Piracicaba, SP/Brasil ([email protected])
2
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ANATOMIA DO LENHO DE Uncaria guianensis E U. tomentosa
(RUBIACEAE) DO ESTADO DO ACRE, BRASIL
INTRODUÇÃO
O gênero Uncaria é representado por cerca de 60 espécies de
lianas distribuídas principalmente na África e Ásia (Obregón,
1995; Steyermark, 1974) sendo que, Uncaria guianensis e U.
tomentosa (Ridsdale, 1978; Zavala & Zevallos, 1996), ocorrem
em amplas áreas da Amazônia brasileira e demais países da América
Central (Guatemala, Belize, Honduras, El Salvador, Nicarágua,
Costa Rica, Panamá) e do Sul (Colômbia, Venezuela, Guiana,
Equador, Peru e Bolívia), indicadas como seu centro de origem
(Villachica et al., 1998; Zevallos et al., 2000) (Fig. 1). As plantas
de Uncaria são, em geral, lianas, arbustos- trepadeiras ou rasteiras
ascendentes, com um par de espinhos, originados de pedúnculos
abortivos, utilizados para galgar a copa das árvores (Ridsdale,
1978; Reinhard, 1999; Zevallos et al., 2000), denominadas de
“unha de gato” por Steyermark (1974). Possuem folhas simples
e opostas, lâmina ovada, elíptica, consistência cartácea ou papirácea
e um par de estípulas interpeciolares, livres na base, deltóide,
obovada, com tomentos na superfície da folha em Uncaria
tomentosa e grabra em U. guianensis (Zavala & Zevallos, 1996).
A casca, lenho e folhas dessas plantas têm sido usadas pelos povos
amazônicos (ex.: os Ashaninkas do Peru) para o tratamento de
inúmeras enfermidades (gastrite, úlcera, diarréia, artrite, câncer,
etc.) e como abortivo (Zevallos et al., 2000), corroborando os
resultados das pesquisas realizadas pela indústria farmacêutica
(Keplinger et al., 1999). Dentre os usos medicinais atuais das
plantas de Uncaria mencionam-se suas propriedades como
estimulantes do sistema imunológico e contra o câncer, além da
aplicação contra a AIDS (Lock de Ugaz, 1994; Urrunaga, 1994;
Keplinger et al., 1999) e ação anticonceptiva (TCA, 1995) e
afrodisíaca (IPSS, 1997). A seiva da unha de gato, pelas suas
propriedades energéticas e nutritivas, é utilizada pelos povos das
florestas (Cabieses, 1997). A indústria de medicamentos naturais
Figura 1 - Distribução geográfica das espécies do gênero Uncaria na América
Latina.
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fabrica remédios para doenças cardiovasculares (Wang, 1989;
Huang, 1999) renais, ginecológicas, gastrointestinais, hepáticas,
reumatológicas e reprodutivas (Keplinger, 1999), imune
estimulante, antimicrobianos e antivirais (Aquino et al., 1989)
além de aumentar a resistência dos tecidos (Desmarchelier et al.,
1997). Apesar da extensa bibliografia médica, as informações
sobre a anatomia das duas espécies de Uncaria concentram-se na
sua casca (Silva et al., 1998; Lindorf, 2001). Em relação a madeira
existem apenas descrições gerais do lenho na Amazônia peruana
(Chavesta & Gonzáles, 1996; Zevallos et al., 2002).
Pelo exposto, o presente trabalho visa caracterizar a estrutura
anatômica do lenho das plantas de Uncaria guianensis e U.
tomentosa como subsídio para a identificação das espécies em
campo e em laboratório, para estudos taxonômicos, medicinais e
ecológicos, dentre outros.
MATERIAL E MÉTODOS
Localização das coletas: o material botânico de Uncaria
guianensis (Aubl.) J.F. Gmel e U. tomentosa (Willd. Ex Roem. &
Schult.) DC. foi coletado nos trabalhos de campo realizados em
18 municípios do Estado do Acre, a saber: Acrelândia, Assis
Brasil, Brasiléia, Bujari, Capixaba, Cruzeiro do Sul,
Epitaceolândia, Feijó, Mâncio Lima, Manoel Urbano, Plácido
de Castro, Porto Walter, Rio Branco, Rodrigues Alves, Senador
Guiomard, Sena Madureira, Tarauacá e Xapuri (Fig. 2).
Amostragem e preparo do material: Para Uncaria guianensis
foram coletadas amostras do lenho de oito plantas com 10
repetições cada e para Uncaria tomentosa de quatro plantas com
10 repetições. As amostras foram cortadas na região basal do
caule das plantas, incluindo a coleta de material botânico. Em
laboratório as amostras do lenho foram preparadas para os estudos
macro e microscópicos, inicialmente, pelo cortes histológicos dos
corpos de prova (1.5x1.5x1.5 cm) orientados nos planos
transversal, longitudinal radial e tangencial (Johansen, 1940;
Sass, 1951).
Figura 2 - Localização dos pontos de amostragem no Estado do Acre
ZEVALLOS-POLLITO & TOMAZELLO
ANATOMIA DO LENHO DE Uncaria guianensis E U. tomentosa
(RUBIACEAE) DO ESTADO DO ACRE, BRASIL
Tabela 1 - Diferênças na estrutura anatômica do lenho das plantas de
Uncaria guianensis e U. tomentosa
Tabela 1 - continuação
Parênquima radial (raios)
CARACTERISTICAS
U. guianensis
U. tomentosa
Cor
Vermelho-amarelado
Avermelhado
Unisseriado
66
63
Bege-avermelhado
Vermelho-amarelado
Multiserriado
34(2-3)
37(2-5)
Rosa-amarelado
Laranja-amarelado
Largura (%)
As exsicatas, coletadas do lenho foram: Uncaria guianensis:
Zevallos (2914; 2922; 2925; 2933; 2942; 2959; 2964; 2976)
e de U. tomentosa: Zevallos (2931; 2936; 2958; 2973), e
encontram-se depositadas nos herbários do Parque Zoobotânico
da Universidade Federal do Acre (HPZ) e as duplicatas no
herbário da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da
Universidade de São Paulo (ESA). A identificação do material
botânico foi realizada de acordo com a metodologia de Radford
et al. (1974).
Análise da estrutura macroscópica do lenho: para a observação
da superfície do lenho, os corpos de prova foram inicialmente
cortados com navalha em micrótomo de deslize e, em seguida,
polidos pela abrasão em pedra de afiação de granulação fina
umedecida em água e em tecido macio para propiciar o contraste
dos elementos anatômicos. A densidade básica foi obtida pela
massa seca do lenho (em estufa) pelo volume verde (saturado
em água até peso constante). A estrutura anatômica macroscópica
do lenho das duas espécies de Uncaria, observada sob microscópio
estereoscópico, foi descrita atendendo as normas da COPANT
(1974) e Coradin & Muniz (1992).
Análise da estrutura microscópica do lenho: a estrutura
microscópica do lenho foi analisada através de lâminas histológicas
permanentes (Johansen, 1940; Sass, 1951) e células dissociadas
pelo processo de maceração (Franklin, 1937; Berlyn, 1976).
Corpos de prova do lenho das plantas das duas espécies de
Uncaria foram (i) imersos em água para a saturação completa e,
em seguida, em água a ebulição para amolecimento prévio; (ii)
fixados em micrótomo de deslize foram obtidas seções histológicas
finas (espessura 12-14 µm) dos 3 planos, (iii) as seções foram
clarificadas (água sanitária), lavadas (água destilada) e desidratadas
(álcool 30 a 50%), coradas (safranina e astra-blue, 30 a 70%),
desidratadas (série alcóolica, 50 a 100%; acetato e álcool, 1:1;
acetato de N-butila), selecionadas e montadas em lâmina de vidro
com bálsamo do Canadá. Para o processo de maceração,
segmentos do lenho foram transferidos para tubos de ensaio com
água destilada e, em seguida, com solução macerante (ácido acético
glacial e água oxigenada 120 vol, levados a estufa (60º C, 48h)
que, depois de escoada, foram lavados com água. Para o estudo
da morfologia e a avaliação das dimensões, as células dissociadas
do lenho foram coradas com safranina e montadas em lâminas
semi-permanentes com glicerina, sob microscópio acoplado a
câmera de vídeo e sistema de análise de imagens. A descrição da
estrutura anatômica microscópica do lenho das duas espécies de
Uncaria foi conduzida de acordo com as normas da COPANT
(1974) e da IAWA (1989).
Rosa-avermelhado
Densidade básica
Média/baixa
Baixa
Resistência ao corte
Moderadamente dura
Macia
Solitários
64
96
Múltiplos
36(2-3)
4[2-(3)]
Freqüência (no/ mm2)
3-13
3-8
120
Vasos
Agrupamento dos vasos (%)
Diâmetro tangencial (μm)
Mínimo
107
Médio
309
334
Máximo
453
613
Desvio padrão
91.48
110.62
Mínimo
293
240
Médio
599
509
Máximo
826
867
Desvio padrão
125.61
107.48
Comprimento (μm)
Diâmetro das pontoações intervasculares
Mínimo
4
5
Médio
6
6
Máximo
7
8
Desvio padrão
0.36
0.91
Diâmetro das pontoações radio-vasculares
Mínimo
4
4
Médio
6
6
Máximo
7
7
Desvio padrão
0.75
0.98
Diâmetro das pontoações parênquimo-vasculares
Mínimo
4
5
Médio
6
6
Máximo
7
8
Desvio padrão
0.36
0.91
Diâmetro das pontuações das fibras
Mínimo
4
4
Médio
6
6
Máximo
8
8
Desvio padrão
0.77
0.58
Mínimo
1110
509
Médio
Máximo
1483
1910
980
1760
Desvio padrão
101
110
Fibras
Comprimento (μm)
Largura (μm)
19-44
Espessura da parede (μm) 9-28
171
19-47
16-25
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ZEVALLOS-POLLITO & TOMAZELLO
ANATOMIA DO LENHO DE Uncaria guianensis E U. tomentosa
(RUBIACEAE) DO ESTADO DO ACRE, BRASIL
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A
As observações sobre as características organolépticas do lenho,
os nomes vulgares aplicados em sua extensa área de ocorrência e
a descrição da estrutura anatômica do lenho das duas espécies de
Uncaria são apresentados.
Uncaria guianensis
B
C
D
Figura 3 - Uncaria guianensis – (a) Seção transversal (10 X), (b) transversal,
(c) longitudinal tangencial, (d) longitudinal radial (50X). Escala:
a: 1mm; a, b, c, d: 250μm.
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Nomes vulgares: Brasil: Acre: anzol-de-lontra, cipó, cipóanzol-de-lontra, espara-aí, esperái, unha-de-gato; Amapá:
jupindá, mão-de-gato; Amazonas: espera-aí, unha-de-gato;
Maranhão: maracuçumé, paruá-cipó; Mato Grosso: jupindá,
unha-de-onça; Pará: cuerussu, jupídá-do-vermelho, pau-d’arco,
unha-de-gato; Rondônia: unha-de-lontra. Bolívia: cacatao,
misijuni, unha-de-gato. Peru: ancajsillo, ancauacu, auri huasca,
garabata, garabata casha, garabato, garabato colorado,
garabatocasha, huarinhuasca, jijyúwamyuúho, kug kuukjagki,
tambo huasca, toroñ, uña de gato, uña de gavilán, unganangui,
yamayakat. Suriname: sipaliwini. Venezuela: uña de gavilán.
Caracterização anatômica do lenho: Cerne indistinto do
alburno, de cor vermelho-amarelado, bege-avermelhado ou rosaavermelhado, brilho moderado, odor imperceptível, densidade
básica média/baixa, resistência ao corte moderadamente dura,
grã direita, textura média/grossa. Camadas de crescimento
indistintas ou pouco distintas. Vasos visíveis a olho nu; difusos;
solitários (64%) e múltiplos (36%) de 2-3 células, freqüência 313/mm²; diâmetro tangencial107-453 µm, média 309 µm e
forma arredondada; comprimento 293-826 µm, média 599 µm;
apêndices curtos, menor a 1/3 do comprimento do vaso e em
ambas extremidades; placas de perfuração simples; depósitos de
cristais distintos; pontoações intervasculares areoladas, alternas,
arredondadas, abundantes, ornamentação ausente, diâmetro
tangencial 4-7 µm, média 6 µm; pontoações raio-vasculares,
areoladas, alternas, arredondadas, abundantes, diâmetro
tangencial 4-7 µm, média de 6 µm; pontoações parênquimovasculares semelhantes às intervasculares. Fibras não septadas,
com pontoações distintamente areoladas maior de 3 µm; curtas a
longas, comprimento 1110-1910 µm, média 1483 µm; largura
média 19-44 µm; espessura da parede delgada com lume de 928 µm; pontoações alternas, arredondadas, abundantes nas seções
radial e tangencial, com diâmetro tangencial 4-8 µm, média 6
µm. Parênquima axial invisível a olho nu e indistinto sob lente
(10x); apotraqueal difuso em agregados formando linhas; células
do tipo seriado. Parênquima radial (raios) invisível sob lente (10x),
unisseriados (66 %) e multisseriados (34 %), com mais de 2-3
células em largura; altura 3-12 mm, média 7.52 mm; freqüência
6-20/mm, média 13,5/mm; heterocelulares, com 8-9 fileiras
(32%) de células eretas no extremo superior, no centro 10-13
fileiras (44%) de células procumbentes e 5-8 fileiras (24%) de
células eretas no extremo inferior; com 7-30 linhas de células;
largura variando de 27-107 µm (Fig. 3, Tab. 1).
ZEVALLOS-POLLITO & TOMAZELLO
ANATOMIA DO LENHO DE Uncaria guianensis E U. tomentosa
(RUBIACEAE) DO ESTADO DO ACRE, BRASIL
Uncaria tomentosa
A
B
C
D
Figura 4 - Uncaria tomentosa – (a) Seção transversal (10 X), (b) transversal,
(c) longitudinal tangencial, (d) longitudinal radial (50X). Escala:
a: 1mm; b, c, d: 250μm.
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Nomes vulgares: Brasil: Acre: espera-aí, unha-de-gato;
Amapá: jupinda, jupindá; Amazonas: espera-aí, unha-de-gato.
Bolívia: bereoquida. Peru: garabato amarillo, jipotatsa, misho
mentis, paotati mösha, samento, toroñ, tsachk, uña de gato,
unganangui.
Caracterização anatômica do lenho: Cerne indistinto do
alburno, de cor avermelhado, vermelho-amarelado, laranjaamarelado, a rosa-avermelhado, brilho moderado, odor
imperceptível, densidade básica baixa, resistência ao corte macia,
grã direita, textura média/grossa. Camadas de crescimento
indistintas ou pouco distintas. Vasos visíveis a olho nu; difusos;
solitários (96%) e múltiplos (4%) de 2-3 células, freqüência 38/mm²; diâmetro tangencial 120-163 µm, média 334 µm, forma
arredondada; comprimento 240-867 µm, média 509 µm;
apêndice curto, menor a 1/3 do comprimento do vaso e em
ambas extremidades; placas de perfuração simples; depósitos de
cristais distintos; pontoações intervasculares areoladas, alternas,
arredondadas, abundantes, ornamentação ausente, diâmetro
tangencial 5-8 µm, média 6 µm; pontoações raio-vasculares
aeroladas, alternas, arredondadas, abundantes, diâmetro
tangencial 4-7 µm, média de 6 µm; pontoações parênquimovasculares semelhantes às intervasculares. Fibras não septadas,
com pontoações distintamente areoladas maior de 3 µm; curtas a
longas, comprimento 509-1760 µm, média 980 µm; largura
média 19-47 µm; espessura da parede delgada a espessa, com
lume de 16-25 µm; pontoações alternas, arredondadas, muito
abundantes nas seções radial e tangencial, com diâmetro tangencial
4-8 µm, média 6 µm. Parênquima axial invisível a olho nu e
indistinto sob lente (10x); apotraqueal difuso em agregados
formando linhas; células do tipo seriado. Parênquima radial (raios)
invisível sob lente (10x), unisseriado (63%) e multisseriado
(37%), com mais de 2-5 células em largura; altura 3-12 mm,
média 6,69 mm; freqüência 3-16/mm, média 9/mm;
heterocelulares, com 4-6 fileiras (20%) de células eretas na
extremidade superior, no centro 10-11 fileiras (45 %) de células
procumbentes e 8-9 fileiras (35%) de células eretas na
extremidade inferior; com 7-42 linhas de células; largura variando
de 20-107 µm (Fig. 4, Tab.1).
As duas espécies de Uncaria apresentaram lenho
avermelhado, com variações do amarelado ao rosado ou bege ao
alaranjado, característica da família Rubiaceae (Détienne &
Jacquet, 1983) e distintas das de Pentagonia e Chomelia, de cor
clara, do branco ao bege claro (Freitas et al., 1992). O odor
indistinto, grã direita, textura médio-grossa, brilho moderado e
densidade básica baixa a média, resistência ao corte de mole a
moderadamente dura (U. guianensis) corroboram a descrição
apresentada por Zevallos et al. (2002) e Chavesta & Gonzáles
(1996). As características anatômicas do lenho das duas espécies
de Uncaria são coincidentes com as descritas para outras espécies
da família (Jansen et al., 2002; Record & Hess, 1949; Freitas et
ZEVALLOS-POLLITO & TOMAZELLO
ANATOMIA DO LENHO DE Uncaria guianensis E U. tomentosa
(RUBIACEAE) DO ESTADO DO ACRE, BRASIL
al., 1992; Detienne & Jacquet, 1983; Metcalf & Chalk, 1972;
Mainieri & Chimelo, 1989), exceto para os vasos de maior
diâmetro, o parênquima axial difuso e os raios largos e altos,
próprios das lianas (Carlquist , 1991). Pontoações intervasculares
guarnecidas e fibras septadas, comuns na família não foram
observadas. A semelhança do lenho das duas espécies é perceptível,
sendo os vasos difusos, com diâmetro uniforme e largos (>309
µm), arredondados, predominância de solitários, pouco
numerosos (6-10/mm²), curtos a muito longos (301-1000 µm)
e com pontoações arredondadas. O parênquima axial é
apotraqueal difuso em agregados, unilateral distinto ou quase
distinto sob lente e o radial unisseriado, coincidente com Silva et
al., (1998), e com Zevallos et al., (2002) somente em U. guianensis
(indicou multisseriados para U. tomentosa), heterocelulares,
número de células (7-42), largos (101-200 µm), medianos a
moderadamente altos (2-20 mm), poucos a muito numerosos (3
a >29/mm). As fibras mostram pontoações areoladas, maiores de
3 µm, médias a medianamente longas (0,9-2,2/mm), estreitas a
largas (<24 a > 40 µm) e com paredes muito delgada a espessa.
As diferenças das espécies, encontram-se na largura dos raios, na
proporção de vasos solitários e na freqüência dos mesmos;
podendo ser resultado do hábito de crescimento e habitat das
plantas: U. guianensis, de hábito lianescente com tendência a
arbustiva, em florestas secundárias e U. tomentosa, de hábito
lianescente, em florestas primárias (Zevallos et al. 2000), relação
que destaca nas lianas (Carlquist, 1985).
A descrição da estrutura anatômica do lenho das duas espécies
de lianas, segundo Gentry (1993), tem importante aplicação na
sua identificação taxonômica, constituindo valiosa informação
complementar aos elementos reprodutivos, geralmente
empregados nos trabalhos de campo e nos herbários.
BIBLIOGRAFIA CITADA
CONCLUSÕES
Freitas, A.J.; Vasconcellos, F.J.; Silva, B.N.; Loureiro, A.A. 1992.
Madeiras da Amazônia que apresentam raios largos. Acta
Amazonica, 22(1):91-161.
A estrutura anatômica macro e microscópica do lenho das
plantas de Uncaria tomentosa e de U. guianensis mostraram
características peculiares à Família Rubiaceae, à exceção dos
elementos vasculares solitários, arredondados, largos e freqüentes,
parênquima axial difuso e largura dos raios, que correspondem a
plantas de hábito lianescente. Os parâmetros anatômicos do lenho
das duas espécies, de forma complementar à morfologia dos órgãos
vegetativos e reprodutivos, permitem a identificação das plantas
em condições de campo e de laboratório.
AGRADECIMENTOS
A Maria A. R. Bermúdez pelo preparo das lâminas histológicas
do lenho; aos Profs. Evandro Ferreira, Marcos Silveira e Silvia
Brilhante da Universidade Federal do Acre pelo acesso ao
Laboratório do HPZ; ao Pesq. Geraldo J. Zenid, do IPT/São
Paulo pelo apoio nas descrições anatômicas do lenho; a OEA pela
bolsa-de-estudos para o desenvolvimento da Tese de Doutorado,
do 1o autor do artigo.
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