l`o sse rvator e romano - Paróquia Nossa Senhora da Conceição

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l`o sse rvator e romano - Paróquia Nossa Senhora da Conceição
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Preço € 1,00. Número atrasado € 2,00
L’OSSERVATORE ROMANO
EDIÇÃO SEMANAL
Unicuique suum
EM PORTUGUÊS
Non praevalebunt
Cidade do Vaticano
Ano XLVII, número 19 (2.413)
quinta-feira 12 de maio de 2016
Francisco recebeu o prémio Carlos Magno
Que te aconteceu, Europa?
Novo humanismo baseado na capacidade de integrar, dialogar, gerar
O que aconteceu com a «Europa
humanista, paladina dos direitos do
homem, da democracia e da liberdade», com o velho continente «terra
de poetas, filósofos, artistas, músicos
e letrados», com a Europa mãe de
povos e nações, mãe de grandes homens e mulheres que souberam defender e dar a vida pela dignidade
dos seus irmãos»? Esta tripla interrogação serviu de base ao longo discurso proferido pelo Papa ao receber
Sonho
de um filho
GIOVANNI MARIA VIAN
Durante a entrega do prémio
Carlos Magno ao Papa Francisco
foi respeitado o seu desejo de ir
além da dimensão comemorativa.
Com efeito, nas intervenções lidas
durante a cerimónia, em particular na do burgomestre de Aachen,
ressoaram palavras que reconheceram com franqueza a crise da
Europa. Mas, sobretudo, no discurso do Pontífice pareceu clara a
sua vontade de dedicar a «este
amado continente» o prémio recebido. Num momento em que a
confusão é evidente: «O que te
aconteceu, Europa», cadenciou
três vezes Bergoglio, recordando
brevemente o que o velho continente soube realizar nos séculos.
Obviamente, não é sem significado que este prémio simbólico
para a Europa, instituído poucos
anos depois da conclusão da segunda guerra mundial, tenha sido
atribuído pela primeira vez em
na manhã de 6 de maio o prémio
Carlos Magno que lhe foi oferecido
pela cidade alemã de Aachen. Na sala Régia do Palácio apostólico no
Vaticano, na presença dos máximos
dirigentes das instituições europeias
e de chefes de Estado e de governo,
o Pontífice auspiciou «um impulso
novo e corajoso para este amado
continente». Citando os pais fundadores Schuman, Adenauer e De
Gasperi, recordou que a Europa «no
século passado, após anos de conflitos trágicos, culminados na guerra
mais terrível que se recorde», «testemunhou à humanidade que um novo início era possível. Mas infelizmente, observou Francisco, nos últimos tempos, «parece que ela não
sente suas as paredes da casa comum distanciando-se por vezes, na
sua consolidação, do luminoso projeto arquitetado pelos Pais. Aquela
atmosfera de novidade, aquele desejo ardente de construir a unidade —
comentou com um fio de amargura
— parecem cada vez mais ofuscados;
nós, filhos daquele sonho, somos
tentados a ceder aos nossos egoísmos, tendo em vista apenas os próprios interesses e pensando em construir recintos particulares». Francisco
exortou de novo a «construir pontes
e derrubar muros», a «não se contentar com retoques cosméticos ou
compromissos tortuosos para corrigir
qualquer tratado, mas a lançar corajosamente bases novas» para poder
«enfrentar com coragem o complexo
quadro multipolar dos nossos dias,
aceitando com determinação o desafio de “atualizar” a ideia de Europa». Como? Francisco explicou-o
com a sua linguagem simples e direta, delineando aquilo que ele definiu
o «sonho» de «um novo humanismo, baseado em três capacidades»:
integrar, dialogar e gerar.
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CONTINUA NA PÁGINA 8
Na audiência os votos de que o Brasil reencontre a harmonia
Vigília de oração para enxugar as lágrimas
Lógica do abraço
Oceano de desolação
Na audiência geral de quarta-feira,
11 de maio, prosseguindo o ciclo de
reflexões sobre o tema do jubileu
relido à luz dos episódios evangélicos, o Pontífice falou sobre o trecho
de Lucas (15, 11-32), tirando a conclusão de que «todos aqueles que
têm fome de misericórdia e de perdão e pensam que não os merecem», seja qual for a situação de vida na qual se encontrem, não de-
vem esquecer que nunca deixarão
de ser filhos de Deus, filhos de um
Pai que ama. No final da audiência,
o Papa dirigiu um pensamento particular ao Brasil, «para que o país,
nestes momentos de dificuldade,
proceda pelas sendas da harmonia e
da paz, com a ajuda da oração e do
diálogo».
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Médicos com a África
Carta a Tawadros
A saúde negada
Inaudita violência
PÁGINA
11
II
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A
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«Quantas lágrimas são derramadas a cada instante no mundo;
uma diferente da outra; e juntas
formam como que um oceano de
desolação, que invoca piedade».
Disse o Papa Francisco durante a
vigília de oração para enxugar as
lágrimas, presidida na basílica
vaticana a 5 de maio, como iniciativa jubilar na solenidade da
Ascensão. Depois de ter ouvido
alguns testemunhos de dor e sofrimento, o Pontífice pronunciou
a homilia frisando que, até na
dor, «não estamos sozinhos».
Também Jesus sabe «o que significa chorar».
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L’OSSERVATORE ROMANO
página 2
quinta-feira 12 de maio de 2016, número 19
Gratidão e apreço do Pontífice à Guarda suíça pelo serviço prestado
Tempo de fraternidade
Apreço e gratidão pelo serviço prestado
com «disponibilidade» e espírito de
«fidelidade à Santa Sé» foram
manifestados pelo Papa Francisco à
Guarda suíça pontifícia durante a
audiência de 7 de maio na sala
Clementina, por ocasião do juramento
dos novos recrutas. Foram estas as
palavras do Santo Padre.
Senhor Comandante
Reverendo Capelão
prezados Guardas
caros familiares e amigos
da Guarda Suíça Pontifícia
No dia seguinte à vossa festa, sintome feliz por me encontrar e celebrar
convosco, inclusive para manifestar
o meu apreço e a minha gratidão
pelo vosso serviço, pela vossa disponibilidade e pela vossa fidelidade à
Santa Sé. Dirijo uma saudação particular aos Recrutas e aos respetivos
familiares, assim como aos Representantes das Autoridades suíças aqui
presentes. É bom ver jovens como
vós, que dedicam alguns anos da
própria vida à Igreja, nomeadamente
ao Sucessor de Pedro: trata-se de
uma oportunidade singular para
crescer na fé, para experimentar a
universalidade da Igreja e também
para viver uma experiência de fraternidade.
Crescer na fé. Sois chamados a viver o vosso trabalho como uma missão que o próprio Senhor vos confia; a aproveitar o tempo que transcorreis aqui em Roma, no coração
da cristandade, como oportunidade
para aprofundar a amizade com Jesus e para caminhar rumo à meta de
uma vida verdadeiramente cristã: a
santidade. Por isso, convido-vos a
alimentar o vosso espírito com a oração e com a escuta da palavra de
Deus; a participar com devoção na
Santa Missa; a cultivar uma devoção
filial à Virgem Maria; e deste modo
a cumprir a vossa missão peculiar,
trabalhando todos os dias «acriter et
fideliter», com coragem e fidelidade.
Experimentar a universalidade da
Igreja. Os túmulos dos Apóstolos e a
Sede do Bispo de Roma são uma
encruzilhada de peregrinos provenientes do mundo inteiro. Assim,
vós tendes a possibilidade de sentir
pessoalmente a maternidade da Igreja que recebe em si mesma, na própria unidade, a diversidade de tantos
povos. Podeis encontrar-vos com
pessoas de diferentes línguas, tradições e culturas, mas que se sentem
irmãos porque irmanados pela fé em
Jesus Cristo. Far-vos-á bem desco-
Missa celebrada pelo secretário de Estado aos novos recrutas
Vale a pena propor-se metas altas
Não uma profissão, mas uma missão, não um trabalho, mas uma vocação: na manhã de 6 de maio, dia
no qual se comemoram os 147 soldados helvéticos mortos em defesa
do Papa durante o saque de Roma
em 1527, o cardeal Pietro Parolin
celebrou a missa comemorativa no
altar da cátedra na basílica de São
Pedro, dirigindo-se em particular
aos 23 novos guardas suíços que na
parte da tarde prestarão juramento
solene. As boas-vindas aos recrutas
por parte do secretário de Estado
teve início com um encorajamento
a não «se contentarem com coisas
medíocres, efémeras» e a comprometerem-se «com o entusiasmo dos
jovens por coisas grandes, verdadeiras, pelo Senhor
que é fonte e fundamento de tudo».
A cerimónia teve um prólogo no dia 5 de maio com
o concerto da Glarner Jugend Blasorchester, formação
musical com artistas de 16 a 25 anos. A fazer as honras
da casa este ano foi o cantão suíço de Glarona. Depois, à noite a participação na vigília «Para enxugar as
lágrimas» presidida pelo Papa Francisco em São Pedro. A inserção deste momento de oração no programa
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das celebrações da guarda pontifícia confirma quanto o
cardeal Parolin recordou depois na missa: «Prestando
o vosso precioso serviço, não contam só as vossas capacidades e competências, embora importantes. O fundamento principal, a base, é a fé na presença e na ajuda
do Senhor». De facto, prosseguiu o secretário de Estado, «só com Cristo o serviço cresce e produz fruto, caso contrário seria um funcionamento mecânico sem vida, sem crescimento nem futuro».
GIOVANNI MARIA VIAN
diretor
Giuseppe Fiorentino
vice-diretor
Cidade do Vaticano
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Redação
via del Pellegrino, 00120 Cidade do Vaticano
telefone +390669899420
fax +390669883675
TIPO GRAFIA VATICANA EDITRICE
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don Sergio Pellini S.D.B.
diretor-geral
brir o seu testemunho cristão e oferecer, por vossa vez, um testemunho
evangélico sereno e jubiloso.
Viver uma experiência de fraternidade. Também isto é importante: estar
atentos uns aos outros, para vos ajudar no trabalho quotidiano e para
vos enriquecerdes reciprocamente,
recordando-vos sempre que «há
maior felicidade em dar do que em
receber!» (At 20, 35). Sabei valorizar
a vida comunitária, a partilha dos
momentos felizes mas inclusive dos
mais difíceis, prestando atenção a
quantos entre vós se encontram em
dificuldade e às vezes precisam de
um sorriso e de um gesto de encorajamento e de amizade. Assumindo
esta atitude, sereis favorecidos também na abordagem diligente e perseverante das pequenas e grandes tarefas do serviço diário, dando a todos testemunho de gentileza e espírito de hospitalidade, altruísmo e
humanidade.
Estimados Guardas, faço votos a
fim de que vivais intensamente os
vossos dias, firmes na fé e generosos
na caridade em relação às pessoas
com as quais vos encontrais. Vos
ajude a nossa Mãe Maria, que honramos de modo especial no mês de
maio, a experimentar cada vez mais
aquela profunda comunhão com
Deus, que para nós crentes tem início na terra e será completa no céu.
Com efeito, como recorda são Paulo,
somos chamados a ser «concidadãos
dos santos e membros da família de
Deus» (Ef 2, 19). Convido-vos, bem
como as vossas famílias, os vossos
amigos e quantos, por ocasião do juramento, vieram a Roma, à intercessão de Nossa Senhora e dos vossos
Padroeiros são Martinho e são Sebastião. Peço-vos instantemente que
oreis por mim e, de coração, concedo-vos a Bênção Apostólica.
Assinaturas: Itália - Vaticano: € 58.00; Europa: € 100.00 - U.S. $ 148.00; América Latina, África,
Ásia: € 110.00 - U.S. $ 160.00; América do Norte, Oceânia: 162.00 - U.S. $ 240.00.
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número 19, quinta-feira 12 de maio de 2016
L’OSSERVATORE ROMANO
página 3
Na vigília para enxugar as lágrimas o Papa explicou que as mais amargas são causadas pela maldade humana
Oceano de desolação
Jesus é o antídoto contra a indiferença pelo sofrimento dos irmãos
«Quantas lágrimas são derramadas
em cada instante no mundo; uma
diferente da outra; e, juntas, formam
como que um oceano de desolação, que
invoca piedade, compaixão e
consolação», observou o Papa
Francisco durante a vigília de oração
para enxugar as lágrimas, presidida
na basílica de São Pedro no final da
tarde de 5 de maio, como iniciativa
jubilar na solenidade da Ascensão. O
Pontífice pronunciou a homilia depois
da apresentação de alguns testemunhos
de dor e sofrimento.
Amados irmãos e irmãs!
Na sequência dos testemunhos que
escutamos e à luz da Palavra do Senhor que clarifica a nossa situação
de sofrimento, comecemos por invocar a presença do Espírito Santo, para que venha entre nós. Seja Ele
quem ilumina a nossa mente, quem
encontra as palavras certas e capazes
de proporcionar conforto; seja Ele
quem abre o nosso coração, para ter
a certeza da presença de Deus que
não nos abandona na provação. O
Senhor Jesus prometeu aos seus discípulos que nunca os deixaria sozinhos: em cada situação da vida, estaria junto deles com o envio do Espírito Consolador (cf. Jo 14, 26) que
havia de os ajudar, sustentar e confortar.
Nos momentos de tristeza, na tribulação da doença, na angústia da
perseguição e na desolação do luto,
cada um de nós procura uma palavra de consolação. Temos intensa
necessidade de alguém que esteja ao
nosso lado e sinta compaixão por
nós. Experimentamos o que significa
estar desorientados, confundidos, feridos profundamente como nunca tínhamos pensado que jamais nos
aconteceria. Incertos, olhamos em
redor para ver se encontramos alguém que possa realmente compreender a nossa dor. A mente enche-se
de interrogações, mas as respostas
não chegam. A razão, sozinha, não é
capaz de iluminar o nosso íntimo,
compreender a dor que sentimos e
dar a resposta que esperamos. Nestes momentos, temos mais necessidade das razões do coração, as únicas
capazes de nos fazerem entender o
mistério que envolve a nossa solidão.
Quanta tristeza nos acontece vislumbrar em tantos rostos que encontramos! Quantas lágrimas são derramadas em cada instante no mundo;
uma diferente da outra; e, juntas,
formam como que um oceano de desolação, que invoca piedade, compaixão e consolação. As mais amargas são as lágrimas causadas pela
maldade humana: as lágrimas de
quem viu arrancar-lhe violentamente
uma pessoa querida; lágrimas de
avós, de mães e pais, de crianças...
Há olhos que muitas vezes param fixos no pôr do sol e têm dificuldade
em ver a alvorada de um dia novo.
Precisamos de misericórdia, da consolação que vem do Senhor. Todos
nós precisamos dela; é a nossa pobreza, mas também a nossa grandeza: invocar a consolação de Deus,
que, com a sua ternura, vem enxu-
gar as lágrimas do nosso rosto (cf. Is
25, 8; Ap 7, 17; 21, 4).
Nesta nossa dor, não estamos sozinhos. Também Jesus sabe o que
significa chorar pela perda de uma
pessoa amada. Uma das páginas
mais comovedoras do Evangelho é
esta: quando Jesus vê Maria a chorar
pela morte do irmão Lázaro, também Ele não conseguiu conter as lágrimas. Emocionou-se profundamente e desatou a chorar (cf. Jo 11, 3335). Com esta descrição, o evangelista João quer mostrar como Jesus
participa na tristeza dos seus amigos
e solidariza com o seu desânimo. As
lágrimas de Jesus baralharam muitos
teólogos ao longo dos séculos, mas
sobretudo lavaram tantas almas, aliviaram tantas feridas! Também Jesus
experimentou, em si mesmo, o medo
do sofrimento e da morte, a deceção
e o desconforto pela traição de Judas e de Pedro, a dor pela morte do
amigo Lázaro. Jesus «não abandona
aqueles que ama» (Agostinho, In
evangelium Johannis 49, 5). Se Deus
chorou, também eu posso chorar,
ciente de que sou compreendido. O
pranto de Jesus é o antídoto contra
a indiferença face ao sofrimento dos
meus irmãos. Aquele pranto ensiname a assumir a dor dos outros, a
tornar-me participante das dificuldades e do sofrimento de quantos vivem nas situações mais dolorosas.
Comove-me para me fazer perceber
a tristeza e o desespero de quantos
viram até roubar-lhes o corpo dos
seus entes queridos, e já não têm sequer um lugar onde possam encontrar consolação. O pranto de Jesus
não pode ficar sem resposta por parte de quem acredita n’Ele. Como Ele
consola, assim somos chamados nós
a consolar.
No momento do pavor, da comoção e do pranto, surge no coração
de Cristo a oração ao Pai. A oração
é o verdadeiro remédio para o nosso
sofrimento. Na oração, também nós
podemos sentir a presença de Deus
ao nosso lado. A ternura do seu
olhar consola-nos, a força da sua palavra sustenta-nos, incutindo esperança. Junto do túmulo de Lázaro,
Jesus rezou dizendo: «Pai, dou-te
graças por me teres atendido. Eu
bem sei que sempre me atendes» (Jo
11, 41-42). Precisamos de ter esta certeza: o Pai escuta-nos e vem em nosso auxílio. O amor de Deus, derramado nos nossos corações, permitenos dizer que, quando se ama, nada
e ninguém poderá jamais separarnos das pessoas que amamos. Assim
no-lo recorda, com palavras de grande consolação, o apóstolo Paulo:
«Quem poderá separar-nos do amor
de Cristo? A tribulação, a angústia,
a perseguição, a fome, a nudez, o
perigo, a espada? (...) Mas em tudo
isso saímos mais do que vencedores,
graças Àquele que nos amou. Estou
convencido de que nem a morte
nem a vida, nem os anjos nem os
principados, nem o presente nem o
futuro, nem as potestades, nem a altura nem o abismo, nem qualquer
outra criatura poderá separar-nos do
amor de Deus que está em Cristo Jesus, Senhor nosso» (Rm 8, 35.37-39).
A força do amor transforma o sofrimento na certeza da vitória de Cristo, e da nossa vitória com Ele, e na
esperança de que um dia estaremos
juntos de novo e contemplaremos
para sempre o rosto da Santíssima
Trindade, fonte eterna de vida e de
amor.
Junto de cada cruz, está sempre a
Mãe de Jesus. Com o seu manto,
Ela enxuga as nossas lágrimas. Com
a sua mão, faz-nos levantar e acompanha-nos pelo caminho da esperança!
Três lâmpadas
Uma família marcada pelo drama de um filho suicida,
um refugiado político de origem paquistanesa,
jornalista católico, ameaçado de morte e obrigado a
abandonar o país e a refugiar-se na Itália com os seus
entes queridos, e dois gémeos, um dos quais se
converteu e depois transmitiu ao outro o estímulo para
mudar a vida. Foram os três testemunhos que
caracterizaram a vigília de oração para enxugar as
lágrimas, presidida pelo Papa Francisco, a 5 de maio,
na basílica de São Pedro. Um encontro importante no
calendário do ano santo da misericórdia, que se pode
definir como o coração do jubileu, pela mensagem de
solidariedade e de proximidade que transmitiu a
quantos estão feridos no seu íntimo. Como as histórias
narradas pelas três testemunhas, que representam a
ponta do iceberg do mundo do sofrimento, da dor, da
marginalização e de tudo o que pode provocar o
pranto num ser humano.
Narrações às vezes dramáticas, mas nas quais se insere
a descoberta ou a redescoberta de Cristo como uma
âncora de salvação. A consolar tantas pessoas aflitas, a
presença de Maria, simbolicamente representada pela
imagem e pelo relicário de Nossa Senhora das lágrimas
de Siracusa, exposto à veneração dos fiéis, colocado
num dos lados do altar da Confissão.
Significativamente depois de cada testemunho
depuseram uma lâmpada acesa aos pés da imagem da
Virgem. Para envolver os fiéis, depois da leitura do
evangelho de Mateus e da homilia do Papa, alguns
voluntários passaram pelas naves da basílica retirando
os bilhetinhos nos quais cada um escrevera as próprias
invocações que foram postas aos pés da imagem
mariana e idealmente unidas às intenções da oração
universal por todas as situações de sofrimento físico ou
espiritual. Em particular, rezou-se pelos cristãos
perseguidos, pelas pessoas em perigo de vida,
torturadas, escravizadas ou submetidas a experimentos
médicos, vítimas de guerra, de terrorismo e de
violência, pelas crianças abusadas ou pelos jovens que
não tiveram infância, por quantos sofrem no físico por
uma doença grave, pelas pessoas deficientes e pelas
suas famílias. Sem esquecer quantos foram acusados
injustamente, os inocentes, os presos, os que sofreram
injustiças, os abandonados, deprimidos e desesperados,
os angustiados e desanimados, os oprimidos por
diversas dependências. Não podia falatr a oração pelas
famílias que perderam filhos antes ou depois do
nascimento ou que choram um falecido, pelas pessoas
separadas das suas famílias e dos seus entes queridos,
por quem perdeu a casa, a pátria, o trabalho e a
família por várias causas.
Depois do canto do Pai-Nosso, o Papa Francisco
entregou a dez pessoas que passaram por experiências
marcadas pelo sofrimento, como símbolo de conforto e
esperança, a imagem do Agnus Dei, benzida por ele.
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quinta-feira 12 de maio de 2016, número 19
Por ocasião do dia mundial das comunicações sociais
Encontro fecundo
DARIO ED OARD O VIGANÒ
o ano santo extraordinário o
Papa Francisco traça com a
mensagem Comunicação e misericórdia: um encontro fecundo uma
rota imprescindível para o mundo
da comunicação. O sistema dos
mass media está chamado a não excluir ninguém, a não guetizar, mas
antes a sintonizar-se com os canais
justos para acolher e alargar os horizontes, para construir pontes e não
para erguer muros como defesa de
outras pessoas consideradas um problema e não um recurso. «Muitos
profissionais, formadores de opinião,
meios de comunicação e centros de
poder estão localizados [...] em
áreas urbanas isoladas, sem ter contacto direto com os seus problemas.
[…] Esta falta de contacto físico e
de encontro […] ajuda a cauterizar a
consciência e a ignorar parte da realidade», lê-se na Laudato si'.
Os frequentadores da mídia estão
convidados a usar palavras e ações
que ajudem a evitar o círculo vicioso
da condenação e da vingança, a quebrar as correntes que aprisionam indivíduos e nações. Com efeito, a palavra do cristão tem como objetivo a
comunhão e o cancelamento do tom
perentório da «excomunhão», convidando a pôr-se à escuta do grito de
ajuda que se eleva da humanidade.
A este propósito o Papa admoestanos: «ouvir nunca é fácil. Por vezes
é mais cómodo fingir-se surdo».
Com a eficácia das imagens, o Pontífice convida-nos a deter o processo
de aviltamento das palavras, o nominalismo típico da nossa cultura, porque as pessoas estão cansadas de palavras que não se encarnam nesta
história maravilhosa e atormentada.
Comprometamo-nos a restituir à
palavra — sobretudo à da pregação
— a sua força expressiva, o fogo que
a torna viva e dá calor e sabor humano ao anúncio do Evangelho.
Talvez precisemos de descobrir de
novo uma comunicação que estimule
a criatividade, favoreça a compreensão e enriqueça a convivência entre
pessoas e culturas diversas, convictos
de que não é a tecnologia que determina a autenticidade das mensagens,
mas o coração do homem.
Portanto, o compromisso de todos
deveria ser orientado para escolher
com esmero palavras e gestos a fim
de superar as divergências, medicar
as feridas e restabelecer relações no
sinal do perdão, tornando-nos embaixadores de concórdia. Tecer a trama de uma «diplomacia da misericórdia» significa, para o Papa, nunca
considerar nada perdido na relação,
não permanecer prisioneiro nas cavidades obscuras de antigas hostilidades. Equivale, ao contrário, a empreender o caminho da misericórdia, reconhecer as próprias responsabilidades, pedir perdão e mostrar compaixão também em relação a quem nos
fez mal.
Uma comunicação que continua a
discriminar entre «vencedores» e
«vencidos» debilita a dignidade das
pessoas e contribui para criar vagas
de marginalização, sobre as quais se
erige o orgulho soberbo do triunfo.
Ao contrário, que haja transparência
N
do desejo e da vontade de mitigar os
tormentos da vida, uma comunicação capaz de oferecer calor a quantos conheceram só o gelo do juízo
ou da rejeição. «A linguagem áspera
e bélica da divisão não fica bem nos
lábios do Pastor, não tem direito de
cidadania no seu coração e, mesmo
que pareça por um momento garantir uma hegemonia, unicamente o
fascínio duradouro da bondade e do
amor permanece deveras convincente», disse Francisco encontrando a
23 de setembro passado os bispos
norte-americanos.
Portanto, se a comunicação tem
uma relevância «política», ela não
pode ser subtraída ao papel de tecedora de comunhão e construtora de
cidadania. Nesta perspetiva, o reconhecimento da rede como lugar de
«comunicação plenamente humana»
por parte do Pontífice, abre-nos o
caminho rumo à «proximidade»,
também digital. Estamos convidados
a descobrir modalidades ainda inex-
ploradas para nos aproximarmos das
pessoas, inclinar-nos sobre os seus
sofrimentos. Com palavras de Francisco «num mundo dividido, fragmentado, polarizado, comunicar
com misericórdia significa contribuir
para uma proximidade boa, livre e
solidária entre os filhos de Deus e irmãos em humanidade», frequentadores cada vez mais assíduos dos
portais, que nos pedem uma presença alimentada por um suplemento
de alma e coração.
No dvd sobre o evangelho de Lucas distribuído aos participantes no jubileu dos jovens
Jesus em quinze línguas
Ver Jesus no seu ambiente da Galileia, observá-lo no
decorrer do dia a dia na casa de Nazaré. Vê-lo quando
ensina e chama os apóstolos para o seguir, enquanto
cura os enfermos e faz milagres. Sobretudo, reconhecêlo como Salvador, aquele que anuncia a misericórdia
do Pai. Esta é a oportunidade oferecida pelo dvd Jesus. The Gospel according to St. Luke («Jesus segundo o
Evangelho de Lucas») distribuído em 120.000 cópias
aos participantes no jubileu dos jovens celebrado no
domingo 24 de abril na praça de São Pedro.
O dvd, que contém realmente um filme sobre Jesus
inspirado na narração de Lucas, exigiu um grande es-
O segredo dum sucesso
Dirigido pelo britânico John Krish e pelo
australiano Peter Sykes, ambos provenientes do
cinema de género, Jesus (The Jesus Film), é um
filme de 1979 tirado do Evangelho de são Lucas.
Não obteve um sucesso particular no momento do
seu lançamento, mas nos anos seguintes alcançou
uma gradual, mas no total, grande difusão, a ponto
de ser dobrado em muitas línguas, mesmo não
estando isento de alguns limites evidentes; aliás,
graças precisamente a alguns destes limites. A
produção americana, apesar de ser bastante simples,
garante uma confecção sólida e profissional. O que
falta ao filme na verdade é uma autêntica
construção dramatúrgica. Mas provavelmente este é
o segredo do insuspeitável sucesso. Com efeito, a
palavra evangélica chega ao espectador sem
mediações nem superestruturas artísticas, de modo
que apoia a intenção declaradamente divulgadora e
didática da obra que, não por acaso, se abre com a
insólita frase: «Um documentário tirado do
evangelho de Lucas».
Características que, geralmente, são apreciadas pelo
amplo público do pequeno écran, contexto
decididamente apropriado para um filme como este
e, sobretudo, ideal para garantir a correta difusão.
Tudo isto não contradiz que as interpretações dos
atores são convincentes e sentidas, começando pela
do Messias oferecida pelo britânico Brian Deacon.
(emilio ranzato)
forço editorial se considerarmos que o vídeo está dobrado em 15 línguas: árabe, arménio, cantonês, cebuano, inglês, francês, alemão, indonésio, italiano, mandarim, polaco, português, espanhol, tagalog e ucraniano.
A iniciativa foi promovida pelas fundações Ramón Pané, com o seu presidente, o argentino Ricardo Grzona,
e Jesus film project, com Erick Schenkel, diretor executivo, coadjuvado por António Cabrera, e o site Internet
www.cristonautas.com em colaboração com o Pontifício
conselho para a promoção da nova evangelização.
Na introdução o cardeal Oscar Rodríguez Maradiaga dirige-se aos jovens, convidando-os a prestar atenção sobretudo ao episódio em que se vê Jesus, durante
a sua adolescência, «falar com os sacerdotes sobre
Deus enquanto todos estavam admirados com aquilo
que ele dizia (Lucas 2, 47). Sem dúvida, também a vossa vida tem coisas bonitas que podem surpreender o
mundo inteiro, inclusive Deus». O vídeo, explica na
apresentação o arcebispo Rino Fisichella, presidente do
dicastério para a nova evangelização, «visa levar a história de Jesus aos jovens sedentos de Deus. Através das
suas imagens encontrarão Cristo, o rosto misericordioso do Pai».
Para ir ao encontro das novas gerações, foi também
preparada uma app gratuita: Jesusfilmedia que permite
aceder ao vídeo e vê-lo nas 1.400 línguas em que até
agora foi traduzido, tornando este filme o mais traduzido (e provavelmente o mais visto) na história. O projeto de rodar um filme sobre o Evangelho de Lucas remonta ao final dos anos setenta. O objetivo era fazer
falar Jesus na língua do espetador, para o tornar familiar, alcançando assim um vastíssimo público. O filme
foi distribuído em milhares de paróquias, instituições
culturais e caritativas, e foi visto por um número incalculável de pessoas.
Nesta tarefa de difusão distinguiu-se a Fundação Ramón Pané, que há vinte anos está comprometida no
apoio à evangelização e à missão, através de congressos, laboratórios, retiros, conferências, cursos on line,
software e aplicações para pc, smarthphone e tablet.
A fundação Pané oferece um serviço gratuito todas
as semanas aos utentes da rede através de dois sites
(www.fundacionpane.com e www.cristonautas.com),
oferecendo material de estudo e de aprofundamento
para a reflexão e a oração pessoal para adultos, jovens
e crianças. (nicola gori)
L’OSSERVATORE ROMANO
número 19, quinta-feira 12 de maio de 2016
Desde que Jesus subiu ao céu, os
homens de todas as cidades, até «das
mais violentas», podem «elevar o
olhar com esperança», recordou o Papa
no Regina caeli recitado na praça de
São Pedro no domingo 8 de maio, dia
em que na Itália e noutros países se
celebrava a solenidade da Ascensão do
Senhor.
Queridos irmãos e irmãs, bom dia!
Hoje, na Itália e noutros países, celebra-se a Ascensão de Jesus ao céu,
ocorrida quarenta dias depois da
Páscoa. Contemplamos o mistério de
Jesus que deixa o nosso espaço terreno para entrar na plenitude da
glória de Deus, levando consigo a
nossa humanidade. Isto é, nós, a
nossa humanidade entra pela primeira vez no céu. O Evangelho de Lucas mostra-nos a reação dos discípulos diante do Senhor que «se separou deles e foi arrebatado ao céu»
(24, 51). Não sentiram dor nem perplexidade, mas «depois de o terem
adorado, voltaram para Jerusalém
com grande júbilo» (v. 52). É o regresso de quem já não teme a cidade
que rejeitou o Mestre, que presenciou a traição de Judas e a negação
de Pedro, viu a dispersão dos discí-
Regina caeli na Ascensão do Senhor
Sob o mesmo céu
Uma ave-maria pelas mães
pulos e a violência de um poder que
se sentia ameaçado.
A partir daquele dia para os
Apóstolos e para cada discípulo de
Cristo foi possível viver em Jerusalém e em todas as cidades do mundo, inclusive naquelas mais atribuladas pela injustiça e violência, porque
acima de cada cidade há o mesmo
céu e cada habitante pode erguer os
olhos com esperança. Jesus, Deus, é
homem verdadeiro, com o seu corpo
de homem no céu! E esta é a nossa
esperança, é ainda nossa, e sentimonos firmes nesta esperança se olharmos para o céu.
Neste céu reside o Deus que se revelou tão próximo que até assumiu
o rosto de um homem, Jesus de Nazaré. Ele permanece sempre o Deusconnosco — recordemos isto: Emanuel, Deus connosco — e não nos
deixa sós! Podemos olhar para o al-
to e reconhecer o nosso futuro. Na
Ascensão de Jesus, o Crucificado
Ressuscitado, há a promessa da nossa participação na plenitude de vida
junto de Deus.
Antes de se separar dos seus amigos, Jesus, referindo-se ao evento da
sua morte e ressurreição, disseralhes: «Disto sois testemunhas» (v.
48). Isto é os discípulos, os apóstolos são testemunhas da morte e da
ressurreição de Cristo, naquele dia,
também da Ascensão de Cristo.
Com efeito, depois de ter visto o seu
Senhor subir ao céu, os discípulos
voltaram à cidade como testemunhas
que com alegria anunciam a todos a
vida nova que vem do Crucificado
Ressuscitado, em cujo nome «se prega a penitência e a remissão dos pecados a todas as nações» (n. 47). Este é o testemunho — oferecido não
só com palavras mas também com a
Francisco convidou a servir os necessitados sem procurar o próprio prestígio
Ao encontro dos pobres de Roma
vida diária — o testemunho que todos os domingos deveria sair das
nossas igrejas para entrar durante a
semana nas casas, nos escritórios, na
escola, nos lugares de encontro e de
divertimento, nos hospitais, nas prisões, nas casas para idosos, nos locais cheios de imigrantes, nas periferias da cidade... Devemos oferecer
este testemunho todas as semanas:
Cristo está connosco; Jesus subiu ao
céu, está connosco; Cristo é vivo!
Jesus garantiu que neste anúncio e
testemunho seremos «revestidos de
poder que vem do alto» (v. 49), ou
seja, com a força do Espírito Santo.
Eis o segredo desta missão: a presença entre nós do Senhor ressuscitado,
que com o dom do Espírito continua a abrir a nossa mente e o nosso
coração, para anunciar o seu amor e
a sua misericórdia também nos âmbitos mais refratários das nossas cidades. O Espírito Santo é o verdadeiro artífice do multiforme testemunho que a Igreja e cada batizado
oferece no mundo. Portanto, nunca
podemos descuidar o recolhimento
na oração para louvar a Deus e invocar o dom do Espírito. Nesta semana, que nos leva à festa do Pentecostes, permaneçamos espiritualmente no Cenáculo, junto com a Virgem
Maria, para receber o Espírito Santo. Façamo-lo inclusive agora, em
comunhão com os fiéis reunidos no
santuário de Pompeia para a tradicional Súplica.
No final da oração mariana, depois de
ter falado do Dia mundial das
comunicações sociais, o Pontífice
saudou alguns grupos presentes.
«Ir ao encontro dos necessitados» levando-lhes «a visita
do Senhor», a exemplo de Maria: foi a tarefa indicada
pelo Papa aos sócios do círculo de São Pedro, recebidos em
audiência na manhã de 9 de maio, na sala Clementina.
Estimados sócios do Círculo de São Pedro!
Saúdo carinhosamente todos vós e agradeço ao vosso
Presidente-Geral, Duque Leopoldo Torlonia, as suas
amáveis palavras. Manifesto a cada um de vós o meu
apreço por aquilo que levais a cabo todos os dias ao
serviço das camadas mais frágeis da população da nossa cidade. A vossa Associação, inserida na realidade
eclesial da diocese de Roma, constitui a expressão de
uma Igreja «em saída»: uma Igreja que caminha para
procurar, visitar, encontrar, escutar, compartilhar e estar
ao lado das pessoas mais pobres. A cada um de vós é
pedido não simplesmente que vá ao encontro dos mais
necessitados, mas que o faça levando Jesus. Tratta-se
de ir como discípulos, como amigos do Senhor; tratase de compartilhar a sua palavra, a do Evangelho, de
repetir os seus gestos de perdão, de amor e de dom, de
não procurar o próprio prestígio, mas o bem do próximo.
Tendes diante de vós o exemplo de Nossa Senhora,
a quem rezamos com uma devoção particular durante
este mês de maio. Como Ela, também vós não vos canseis de «partir», de ir à pressa, para encontrar as pessoas e para lhes levar a visita de Deus (cf. Lc 1, 39).
Ela é portadora da visita de Deus, porque vive em profunda comunhão com Ele. «Bem-Aventurada é Aquela
que acreditou!» (Lc 1, 45), diz-lhe Isabel. Maria é o
ícone da fé. Só na fé podemos levar Jesus e não nós
mesmos. Neste Ano Santo da Misericórdia, enquanto
nos esforçamos por percorrer o caminho das obras de
misericórdia, somos chamados a renovar-nos na fé. Para levar a visita do Senhor a quantos sofrem no corpo
e no espírito, devemos cultivar a fé, aquela fé que nas-
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ce da escuta da Palavra de Deus e aspira por uma profunda comunhão com Jesus.
Encorajo-vos a dar continuidade ao vosso testemunho do Evangelho da caridade, a ser cada vez mais sinal e instrumento da ternura de Deus para cada pessoa, de maneira especial para as mais frágeis e descartadas.
Agradeço-vos também o Óbolo de São Pedro, que
angariais em todas as igrejas como sinal da vossa participação na solicitude do Bispo de Roma pelas formas
de pobreza desta cidade. A vossa benemérita atividade
caritativa seja corroborada pela oração, para encontrar
no Coração de Cristo o amor que haveis de oferecer
aos irmãos.
Confio todos vós, os vossos familiares e o vosso
compromisso apostólico à proteção da Virgem Santa, a
Salus populi Romani, e à intercessão de são Pedro e de
são Paulo. Peço-vos que apoieis o meu ministério sobretudo com a oração, enquanto vos abençoo de todo
o coração.
Hoje comemora-se o 50º Dia mundial das Comunicações Sociais, desejada pelo Concílio Vaticano II. Com
efeito, os padres conciliares, refletindo sobre a Igreja do mundo contemporâneo, compreenderam a importância crucial das comunicações, que
«podem lançar pontes entre as pessoas, as famílias, os grupos sociais,
os povos. Tanto no ambiente físico
como no digital» (cf. Mensagem de
2016). Dirijo a todos os agentes da
comunicação uma saudação cordial e
faço votos para que o nosso modo
de comunicar na Igreja tenha sempre um claro estilo evangélico, que
una a verdade e a misericórdia.
Saúdo os participantes na Marcha
pela Vida, os amigos da Obra do
Padre Folci e do Pré-seminário São
Pio X, os Escoteiros da Europa de
Roma Oeste e Roma Sul, e os numerosos crismandos da Diocese de
Génova. Sois rumorosos, genoveses!
Hoje celebra-se em muitos países
o dia das mães: recordemos com
gratidão e carinho todas as mães —
as que estão aqui na praça, as nossas
mães que estão entre nós e as que já
foram para o céu — confiando-as a
Maria, a mãe de Jesus. E juntos, por
todas as mães, rezemos a Ave-Maria.
Desejo a todos um bom domingo.
Por favor, não vos esqueçais de rezar
por mim. Bom almoço e até à vista!
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L’OSSERVATORE ROMANO
quinta-feira 12 de maio de 2016, número 19
Uma vista da colina das cruzes
em Šiauliai
Face às mais de quatrocentas mil
cruzes da colina de Šiauliai, lugar de
peregrinação para todos os lituanos
e coração da nação inteira, o cardeal
Pietro Parolin, secretário de Estado,
pronunciou as primeiras palavras
públicas da sua visita oficial às Repúblicas da Lituânia, Estónia e Letónia, que tem lugar de 7 a 13 de maio.
Durante a missa celebrada no convento de Kryžių Kalnas, o purpurado recordou a «memorável visita»
de João Paulo II em 1993 e, reconsiderando que o Papa Wojtyła definiu
o santuário um «lugar de esperança,
amor e sacrifício», falou da «importância da oração» e da «responsabilidade de partilhar a fé».
O Secretário chegou durante a
manhã a Vilnius — onde no dia anterior foi inaugurado o Congresso nacional da misericórdia, um dos eventos centrais do ano jubilar dos católicos na Lituânia — e deslocou-se antes de mais ao palácio do Governo
para um encontro com o primeiro
ministro Algirdas Butkevičius. Após
cerca de meia hora de colóquio, o
cardeal regressou ao aeroporto da
capital, indo em seguida a Šiauliai,
onde saudou os funcionários da
Otan em missão de polícia aérea nos
Estados bálticos e celebrou a missa
no convento da colina das Cruzes.
O que «tem a ver a misericórdia
com a promoção da paz?». E o ano
jubilar, inaugurado significativamente em Bangui no dia 29 de novembro passado, o que tem «para dizer
ao mundo da política e da diplomacia?». Convidado em Vilnius a falar
da diplomacia da Santa Sé ao serviço da paz, o cardeal Pietro Parolin
chamou a atenção da política e da
diplomacia internacionais para que
não sejam míopes nem sacrifiquem à
consecução de meros resultados
transitórios a construção de um
mundo verdadeiramente pacificado.
Na conferência que teve lugar na
igreja dos Santos João Batista e João
Apóstolo, na manhã de 9 de maio —
segundo dia da sua visita à Lituânia
— o secretário de Estado realçou que
os processos de reconciliação entre
povos e nações exigem «tempo e esforço paciente». Por isso, «em vez
de trabalhar a curto prazo, para alcançar resultados imediatos, a política e a diplomacia empreendam processos de construção da pessoa e da
cultura, visando a verdadeira realização humana»: não é de uma diplomacia da conveniência que o mundo
de hoje precisa, mas de uma «diplomacia de misericórdia», capaz de enfrentar «a resignação, o interesse
pessoal, a apatia e a indiferença», e
cultivar «a cultura da solidariedade,
da misericórdia e da compaixão».
Por isso, acrescentou o purpurado, o jubileu pode dar resultados
concretos não só para a vida das
pessoas «mas também na vida social
e política». Com efeito, a lógica da
misericórdia deveria «modelar as relações internacionais» e levar a «um
esforço comum para superar e mostrar preocupação pelos membros
mais vulneráveis da sociedade, como
os prisioneiros, os migrantes, os desempregados e os enfermos». No
sulco da mensagem do Papa para o
dia mundial da paz de 2016, o secre-
Visita oficial do cardeal Pietro Parolin aos Estados bálticos
É preciso construir pontes
tário de Estado renovou um apelo
aos responsáveis das nações: «Abster-se de levar os povos a conflitos e
guerras, perdoar ou gerir de modo
sustentável a dívida internacional
dos países pobres, evitando a imposição de condições inaceitáveis ditadas por pressões ideológicas». Uma
evocação significativa também à luz
dos seus gestos na mesma manhã,
ou seja, a visita ao memorial das vítimas do ataque do Exército vermelho a 13 de janeiro de 1991, e depois
ao museu dedicado à história da resistência lituana e das violências do
regime soviético. «A misericórdia —
disse Parolin concluindo — tem muito a oferecer à diplomacia internacional na busca da paz», favorecendo a construção de uma mentalidade
capaz de evitar «juízos fáceis» e
«construir pontes».
O tema da misericórdia serviu de
fio condutor na visita do secretário
de Estado à Lituânia. Depois de ter
visitado a capela de Nossa Senhora
da Porta da Aurora, a 8 de maio o
purpurado participou na procissão
que, da sede do Parlamento, chegou
à catedral de Vilnius. Ali celebrou a
missa conclusiva do congresso nacional da misericórdia, inaugurado
poucos dias antes. Na solenidade da
Ascensão do Senhor, o cardeal Parolin recordou que para fazer nosso o
mandato de Jesus aos apóstolos, somos chamados a «proclamar a misericórdia de Deus» e a testemunhá-la.
Uma ação de graças a Deus «pelo
fiel testemunho de sacerdotes, religiosos e leigos» da Estónia «diante
das perseguições, deportações e obstáculos de todos os tipos» impostos
«durante os anos de ocupação e de
ditadura»: com esta intenção o cardeal Parolin celebrou a 10 de maio a
missa na catedral de Tallinn.
Proveniente da Lituânia, o secretário de Estado chegou à capital da
Estónia na noite de 9 de maio,
acompanhado pelo núncio apostólico Pedro López Quintana. No dia
seguinte, depois de ter deposto uma
coroa no monumento aos mortos na
guerra de independência, almoçou
com o primeiro-ministro Taavi Rõivas. Em seguida, visitou o palácio
do Parlamento («Riigikogu»), onde
foi recebido pelo presidente da assembleia Eiki Nestor, encontrandose com a ministra dos Negócios Estrangeiros Marina Kaljurand e com
o presidente da República Hendrik
Ilves. Após as reuniões protocolares,
seguiram-se os momentos de culto: a
oração ecuménica com os líderes das
várias confissões cristãs presentes em
Tallinn e a missa concelebrada pelo
bispo Philippe Jourdan, administrador apostólico da Estónia, na catedral católica intitulada aos santos
Pedro e Paulo. E inspirando-se precisamente nas palavras de Paulo aos
anciãos de Éfeso — propostas pelo
trecho litúrgico dos Atos dos Apóstolos (20, 17-27) — o cardeal Parolin
relacionou «o testemunho de fidelidade aos sofrimentos» sobre os
quais fala o apóstolo das nações, aos
oferecidos pela comunidade cristã da
Estónia durante os anos obscuros do
segundo conflito mundial e da guerra fria. Padecimentos que só terminaram há vinte e cinco anos quando,
em 1991, o país recuperou a independência. «No mesmo ano — recordou
o purpurado — foram também restabelecidas as relações diplomáticas
entre a Santa Sé e a Estónia, interrompidas em 1940». João Paulo II
visitou a nação em 1993.
Não obstante tudo, também na situação atual não faltam problemas:
«Hoje a vossa terra é livre. Todavia,
a chamada à fidelidade e ao testemunho corajoso não é menos relevante. Por causa da secularização difundida, da independência religiosa
e, às vezes, da hostilidade mal dissimulada em relação aos credos religiosos, que atingem muitas regiões
da Europa, é ainda mais urgente a
necessidade da nova evangelização».
Um convite dirigido em particular
à comunidade católica que na Estónia é minoria. «Por conseguinte, é
importante — frisou — que cada
membro faça a sua parte na difusão
do Evangelho» na sociedade. E a este propósito agradeceu «aos sacerdotes, consagrados, consagradas e fiéis
leigos o compromisso na Igreja local
e o que fazem para promover a missão da Igreja universal, da qual beneficia toda a sociedade».
Por fim, o cardeal Parolin realçou
que a obra de evangelização tem
também uma conotação ecuménica.
«Isto é particularmente verdadeiro
neste país — explicou — que tem
uma forte tradição ortodoxa e luterana. Sei que existe um alto nível de
contacto e colaboração entre os fiéis
das várias denominações e animovos a continuar a rezar juntos, a promover o diálogo e a cooperar em várias iniciativas para difundir a fé e
promover o bem comum, no espírito
do Evangelho». De resto, concluiu,
«a divisão dos cristãos é contrária à
vontade de Cristo. No nosso compromisso as suas palavras devem inspirar os nossos pensamentos e ações
para irmos em frente até quando parece que não progredimos».
O futuro da Europa e a atual crise
de valores do continente, o fenómeno migratório com todas as suas repercussões sobre a sociedade e a situação da Ucrânia, onde o cardeal
Pietro Parolin irá no próximo mês
para levar a solidariedade do Papa a
quantos sofrem: são «as três questões de particular interesse para a
Santa Sé neste momento histórico»,
sobre as quais o secretário de Estado
falou na Universidade estónia de
Tartu.
Convidado pelo ateneu no âmbito
da sua viagem aos países bálticos, o
purpurado pronunciou no dia 11 de
maio uma conferência sobre o tema:
«A Santa Sé e as relações internacionais». Depois de uma visão geral do
tema, o relator entrou no ponto central da atualidade e refletiu sobretudo acerca da questão europeia, tratada pelo Papa Francisco em várias
ocasiões, em particular em Estrasburgo no dia 25 de novembro de
2014, quando «frisou que a busca da
unidade e da paz através da promoção dos direitos humanos, da democracia e do estado de direito, requer
uma referência constante ao rico património» do velho continente. Para
ilustrar este ponto, prosseguiu Parolin, o Pontífice usou uma imagem
sugestiva do poeta italiano Clemente
Rebora: um choupo, cujos ramos
que alcançam o céu, são sacudidos
pelo vento, enquanto o tronco permanece plantado em profundidade,
através das raízes. Precisamente como a Europa que na sua história alcançou grandes alturas, apostando
em novos e ambiciosos objetivos,
impelida por uma sede insaciável de
conhecimento. Mas o desenvolvimento do pensamento e da cultura e
as descobertas científicas devem-se à
solidez do tronco e à profundidade
das raízes que nutrem a planta. Mas
se as raízes se perdem, o tronco
murcha lentamente. Eis o paradoxo
que para progredir rumo ao futuro
precisamos do passado, não podemos fugir do presente e dos seus desafios. Em particular, observou o secretário de Estado, a Europa precisa
de superar o individualismo, que leva ao empobrecimento humano e à
aridez cultural, por causa dos quais,
como diz o Papa, «possuímos um
excesso de coisas inúteis, mas já não
temos a capacidade de construir autênticas relações humanas vividas na
verdade e no respeito recíproco».
número 19, quinta-feira 12 de maio de 2016
L’OSSERVATORE ROMANO
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Por uma unidade sem muros
As razões da atribuição do prémio Carlos Magno nas palavras do burgomestre de Aquisgrano
A Europa precisa hoje como nunca
«de vozes admoestadoras» como a
do Papa e precisamente «pelo vigor
e clareza com que se ocupa desta tarefa» o burgomestre de Aquisgrano,
Marcel Philipp, entregou a Francisco o prémio internacional Carlos
Magno 2016 durante o encontro na
sala régia. Uma cerimónia, reconheceu, que este ano assume «um valor
extraordinário».
«Nos decénios passados — observou imediatamente — o prémio foi
várias vezes plataforma para impulsos destinados a favorecer a unificação da Europa», um verdadeiro «encorajamento em momentos de crise
da política europeia». Hoje «a situação parece ser particularmente difícil
e o termo Europa agora é pronunciado só quase em concomitância
com a palavra crise». Há questões
urgentes: «A que ponto estamos
com o reforçamento da unidade na
diversidade? Ou estamos porventura
a mover-nos há tempos na direção
oposta? Nas frentes da migração, da
segurança e dos valores a Europa
vai-se quebrantando com os egoísmos nacionais?», questionou o burgomestre sem esconder uma «preocupação profunda».
«Estabelecer paz e coesão na Europa: eis a tarefa do século pelo qual
muitos se comprometeram com merecimentos depois dos horrores da
segunda guerra mundial» afirmou. E
«o sucesso do processo de unificação é notável: setenta anos de democracia e paz tornaram-nos fortes».
Precisamente «para enfrentar os desafios comuns nasceram estruturas
comuns», mesmo se «hoje nos sentimos impotentes», e «cooperação
económica e instituição de estruturas
comuns continuam sem dúvida a revestir um papel decisivo». Acrescentam-se, prosseguiu Philipp, «as
questões atinentes a uma linha comum e às ajudas nas áreas de crise
do mundo, assim como no campo
da migração: desenvolver soluções
sobre estas frentes pressupõe contudo a existência de uma base que hoje em parte falta». Esta base «consiste na consciencialização partilhada
dos valores europeus e dos ensinamentos que nos vêm da história de
um continente que por séculos precipitou nas guerras». E «os valores
que se trata de reconhecer e fortalecer são essencialmente valores cristãos».
Segundo o burgomestre «a erosão
do fundamento cultural e moral da
Europa é alarmante. Deveríamos ternos apercebido disto há tempos: slogans de extrema direita e expressões
de renacionalização ganham terreno
no coração da sociedade, a abordagem diferente em relação aos meios
de comunicação leva em muitos casos a ignorar a realidade». Além disso «o modelo de consumo da rica
Europa é vergonhoso, em certos caCONTINUA NA PÁGINA 10
Intervenções durante a cerimónia
É «o compromisso extraordinário»
de Francisco «a favor da paz, da
compreensão e da misericórdia
numa sociedade europeia de
valores» a razão da atribuição do
prémio internacional Carlos Magno.
A confirmação é dada pelo atestado
oficial que, durante o encontro, foi
lido por Jürgen Linden, presidente
da comissão diretiva da associação
que o conferiu. O Papa, explicou,
«é uma voz da consciência que nos
solicita a pôr o homem sempre no
centro das nossas ações» e, com a
sua altíssima autoridade moral dános «a coragem e a confiança para
fazer novamente da Europa aquele
sonho que ousámos fazer por mais
de sessenta anos». Com efeito,
acrescentou Linden, Francisco
«recorda-nos, como admoestador e
mediador, que na Europa temos a
tarefa e o dever, na esteira dos ideais
dos pais fundadores, de dar
realização concreta aos princípios de
paz e liberdade, direito e
democracia, solidariedade e
salvaguarda da criação».
Para o presidente do Parlamento
europeu, Martin Schulz «a Europa
está a atravessar um período
atormentado», a braços com «uma
prova decisiva para a sua unidade»
sobre questões decisivas como «paz,
solidariedade, respeito recíproco». O
Papa «argentino, filho de imigrantes
italianos, olha de fora para a Europa
de maneira genuína» e «remete-nos
para o espírito humanista europeu»,
afirmou Schulz. «Na Europa
fizemos nosso o compromisso a
favor da dignidade humana
Voz
da consciência
abandonando conscientemente o
totalitarismo» que marcou o século
XX . Precisamente daquela «página
escura» os europeus foram capazes
de criar «um contraprojeto
extraordinário: a democracia, o
Estado de direito, a liberdade de
opinião e a cooperação entre povos
além das fronteiras». A ponto que
«a integração europeia se funda na
consciência de que, quando no
passado nos combatemos, houve
trágicas consequências para todos, e
quando permanecemos unidos todos
beneficiaram». Contudo, prosseguiu
o presidente do Parlamento europeu,
«hoje arriscamos dissipar esta
herança, porque as forças centrífugas
das crises tendem a dividir-nos e
não a unir-nos mais estreitamente».
Pelo meio estão «os egoísmos
nacionais, a renacionalização e o
particularismo nacional» que «se
vão expandindo». Entretanto «no
respeitante aos refugiados, a Europa
encontra-se diante a um desafio
epocal: desde a segunda guerra
mundial não se viam tantas pessoas
em fuga de todo o mundo». E se «o
medo é compreensível, em política é
mau conselheiro» e certamente não
favorece a busca de soluções. Além
disso, acrescentou Schulz,
«esquecendo a história, vinte e cinco
anos depois da derrocada da cortina
de ferro há quem pretende construir
na Europa novos muros, pondo em
perigo uma das maiores conquistas
europeias que é a liberdade de
circulação». Além do mais, «as
pessoas que fogem certamente não
param diante de muros ou arame
farpado». «A Europa — concluiu o
presidente Schulz — está a atravessar
uma crise de solidariedade e os
valores comuns sobre os quais se
funda estão a vacilar». Mas o
ensinamento do Papa Francisco «dános motivos de esperança»,
reconheceu o presidente do
Parlamento europeu, juntamente
com as tantíssimas pessoas que
voluntariamente oferecem
acolhimento aos refugiados, «em
Lesbos e em Lampedusa ou em
Mónaco», encarnando «os valores
europeus de justiça, solidariedade e
respeito da dignidade» e mostrando
«aos refugiados e ao mundo o rosto
de uma Europa humana».
Um convite, precisamente como
resposta aos apelos do Papa, a estar
«à altura das próprias
responsabilidades» face às grandes
questões, sem nunca «se fechar na
própria concha» foi feito também
pelo presidente da Comissão
europeia Jean-Claude Junker. De
facto o continente deve continuar a
ser «a união das forças: pela
humanidade, por uma paz que
começa no dia a dia», assim,
«acolhendo doze refugiados», disse,
o Papa «anima-nos com renovada
coragem» e aos atentados terroristas
«contrapôs um gesto de fraternidade
lavando os pés a migrantes de
confissões diversas». Francisco,
acrescentou, recorda-nos também
que «a construção europeia tem a
vocação de ser uma obra de
pacificação além dos seus confins,
porque as desventuras do mundo
dizem respeito também a nós: não
nos devemos sujeitar à história mas
ser seus artífices». Um papel forte
para um futuro melhor, segundo
Junker, deve ser desempenhado
pelos «jovens que não conheceram a
guerra e que dizem não à
intolerância e sim ao nosso modo de
viver juntos, unindo as suas
energias».
Por fim, tomou a palavra o
presidente do Conselho europeu
Donald Tusk, que relançou a
imagem do «hospital de campo»
sugerida pelo Pontífice para
apresentar a Igreja. Mencionando a
visita que o Papa fará à Polónia em
julho, para a Jornada mundial da
juventude, Tusk recordou que «ser
europeu não é uma declaração
geográfica ou política, mas
sobretudo axiologia e metafísica»
porque, num certo sentido, «a
Europa é um artigo de fé». Com
efeito, concluiu, «na Europa o
espírito do amor e da liberdade está
presente» e sê-lo-á ainda se
prevalecerem «compaixão e
altruísmo» juntamente com os
«princípios cristãos dos direitos
humanos, da liberdade civil e do
respeito por cada ser humano».
L’OSSERVATORE ROMANO
número 19, quinta-feira 12 de maio de 2016
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Um dos desenhos entregues ao Papa
pelas crianças durante a visita
ao campo de refugiados de Lesbos
O Papa Francisco recebeu o prémio Carlos Magno e relançou o sonho de um novo humanismo para o velho continente
Que te aconteceu, Europa?
vasta do que as fronteiras atuais da
União e chamada a tornar-se modelo
de novas sínteses e de diálogo. Com
efeito, o que caracteriza o rosto da Europa não é contrapor-se aos outros,
mas trazer impressos os traços de várias
culturas e a beleza de vencer os confinamentos. Sem esta capacidade de integração, as palavras pronunciadas outrora por Konrad Adenauer ressoarão hoje
como profecia de futuro: «O futuro do
Ocidente não está ameaçado tanto pela
tensão política, como sobretudo pelo
perigo da massificação, da uniformidade do pensamento e do sentimento; em
resumo, por todo o sistema de vida,
pela fuga da responsabilidade, tendo
como única preocupação o próprio
eu».6
A atual situação deve ser enfrentada sem egoísmos nem vedações porque ser migrante não é um delito
«Que te aconteceu, Europa humanista, paladina dos
direitos do homem, da democracia e da liberdade? Que te
aconteceu, Europa, terra de poetas, filósofos, artistas,
músicos, letrados? Que te aconteceu, Europa, mãe de
povos e nações, mãe de grandes homens e mulheres que
souberam defender e dar a vida pela dignidade dos seus
irmãos?»: são estas as interrogações às quais o Papa
Francisco deu uma resposta concreta no discurso
pronunciado, ao receber o prémio Carlos Magno 2016,
durante a cerimónia realizada na manhã de sexta-feira,
6 de maio, na Sala Régia do Palácio apostólico.
Ilustres Hóspedes!
Dou-vos as minhas cordiais boas-vindas
e agradeço a vossa presença. Sinto-me
particularmente agradecido aos senhores Marcel Philipp, Jürgen Linden,
Martin Schulz, Jean-Claude Juncker e
Donald Tusk pelas suas amáveis palavras. Desejo reiterar a minha intenção
de dedicar à Europa este prestigioso
Prémio com que sou honrado: com
efeito não estamos a comemorar qual-
Juntamente com os representantes da União europeia — o
presidente do Parlamento europeu Martin Schulz, o
presidente do Conselho europeu Donald Tusk e o
presidente da Comissão europeia Jean-Claude Junker —
participaram o rei Filipe VI de Espanha, o grão-duque
Henri de Luxemburgo e o presidente lituano Dalia
Grybauskaité. Estavam presentes ainda a chanceler
alemã Angela Merkel e o presidente do Conselho dos
ministros italiano Matteo Renzi. Em lugares reservados
estavam também os cardeais Sodano, decano do Colégio
cardinalício, Parolin, secretário de Estado, com os
quer gesto, mas queremos aproveitar o
ensejo para, juntos, almejarmos um novo e corajoso impulso a este amado
Continente.
A criatividade, o engenho, a capacidade de se levantar e sair dos seus limites pertencem à alma da Europa. No
século passado, ela deu testemunho à
humanidade de que era possível um
novo começo: depois de anos de trágicos confrontos, culminados na guerra
purpurados alemães Müller, Marx, Karper e
Brandmüller; os arcebispos Becciu e Gallagher,
respetivamente substituto da Secretaria de Estado e
secretário para as Relações com os Estados; bispos que
vieram da Alemanha, entre os quais o de Aquisgrano,
Heinrich Mussingoff; e os monsenhores Borgia, Camilleri
e Bettencourt, respetivamente assessor, subsecretário para
as relações com os Estados e chefe do Protocolo da
Secretaria de Estado. À saída da Sala Régia o Papa
saudou também o coro da catedral de Aquisgrano que
animaram a cerimónia com os seus cânticos.
mais terrível de que se tem memória,
surgiu — com a graça de Deus — uma
novidade sem precedentes na história.
As cinzas dos escombros não puderam
extinguir a esperança e a busca do outro que ardiam no coração dos Pais
fundadores do projeto europeu. Estes
lançaram os alicerces dum baluarte de
paz, dum edifício construído por Estados que se uniram, não por imposição,
mas por livre escolha do bem comum,
renunciando para sempre a guerrear-se.
Finalmente, depois de tantas divisões, a
Europa reencontrou-se a si mesma e começou a edificar a sua casa.
Esta «família de povos»,1 que entretanto se foi louvavelmente ampliando,
nos últimos tempos parece sentir como
menos suas as paredes da casa comum
distanciando-se por vezes, na sua consolidação, do luminoso projeto arquitetado pelos Pais. Aquela atmosfera de
novidade e aquele desejo ardente de
construir a unidade aparecem sempre
mais amortecidos; nós, filhos daquele
sonho, somos tentados a ceder aos nossos egoísmos, tendo em vista apenas os
próprios interesses e pensando em
construir recintos particulares. Estou
convencido, porém, de que a resignação e o cansaço não pertencem à alma
da Europa e que as próprias «dificuldades podem revelar-se, fortemente, promotoras de unidade».2
Sonho de um filho
CONTINUAÇÃO DA PÁGINA 1
1989 a uma personalidade religiosa.
Com efeito naquele ano, antecipando
um pouco a queda do muro de Berlim, foi condecorado Roger Schutz,
fundador e prior da comunidade de
Taizé que por mais de trinta anos tinha tecido fios ecuménicos de reconciliação e de paz, superando silenciosamente até a cortina de ferro.
E em 2004, de forma extraordinária,
o prémio foi oferecido ao Papa Wojtyła, quase no final do longuíssimo
pontificado. Com uma homenagem
implícita à ação levada a cabo durante
décadas também pelos seus predecessores a favor do processo de integração europeia. Dinâmica histórica sancionada no ano seguinte pela sucessão
na sede romana de um Papa alemão,
quase a selar a reconciliação entre Polónia e Alemanha, antecipada pelos
respetivos episcopados na época do
Concílio. Hoje o discurso do Pontífice
é uma continuação daqueles proferidos em Estrasburgo em 2014. Com citações explícitas dos três «pais fundadores» do processo de unificação do
continente que, sobre os destroços deixados pelo conflito mundial, «ousaram procurar soluções multilaterais para problemas que pouco a pouco se
tornavam comuns»: Robert Schuman,
Alcide De Gasperi, Konrad Adenauer.
Tendo passado setenta anos daquele
«novo início» depois do assustador
conflito mundial, enquanto na Síria,
no Médio Oriente e na África continuam a recrudescer guerras e miséria
que estão a causar uma onda migratória sem precedentes, e enquanto se elevam inúteis muros e clamores de intolerância, o Papa diz que é preciso
«atualizar» a ideia do continente, para
que seja capaz de integrar, dialogar,
gerar. Assim, à imagem de «uma Europa cansada e envelhecida», que assustada quer entrincheirar-se, Bergoglio opõe a necessidade de que o continente volte a ser uma «mãe geradora
de processos», novos e positivos.
Com efeito, a identidade europeia
foi sempre dinâmica e ao longo do
tempo soube assumir «os traços de várias culturas», recordou o primeiro Papa americano. De origens italianas,
Bergoglio falou «como um filho que
reencontra na mãe Europa as suas raízes de vida e de fé». Filho que hoje
sonha um «novo humanismo europeu», para o renascimento de um continente que não deve abandonar as
suas raízes e a sua história. E para este
processo «pode e deve contribuir a
Igreja»: ou seja, mulheres e homens
testemunhas do Evangelho que ofereçam a sua «água pura» às «raízes da
Europa».
No Parlamento Europeu, tomei a liberdade de falar de Europa avó. Dizia
aos eurodeputados que crescia, de diferentes partes, a impressão geral duma
Europa cansada e envelhecida, não fértil e sem vitalidade, onde os grandes
ideais que a inspiraram parecem ter
perdido o seu fascínio; uma Europa decadente que parece ter perdido a sua
capacidade geradora e criativa; uma
Europa tentada mais a querer garantir e
dominar espaços do que a gerar processos de inclusão e transformação; uma
Europa que se vai «entrincheirando»,
em vez de privilegiar ações que promovam novos dinamismos na sociedade;
dinamismos capazes de envolver e mobilizar todos os atores sociais (grupos e
indivíduos) na busca de novas soluções
para os problemas atuais, que frutifiquem em acontecimentos históricos importantes; uma Europa que, longe de
proteger espaços, se torne mãe geradora de processos (cf. Exort. ap. Evangelii
gaudium, 223).
Que te sucedeu, Europa humanista,
paladina dos direitos humanos, da democracia e da liberdade? Que te sucedeu, Europa terra de poetas, filósofos,
artistas, músicos, escritores? Que te sucedeu, Europa mãe de povos e nações,
mãe de grandes homens e mulheres
que souberam defender e dar a vida
pela dignidade dos seus irmãos?
O escritor Elie Wiesel, sobrevivente
dos campos nazistas de extermínio, dizia que hoje é de importância capital
realizar uma «transfusão de memória».
É preciso «fazer memória», distanciarse um pouco do presente para ouvir a
voz dos nossos antepassados. A memória permitir-nos-á não só de evitar cometer os mesmos erros do passado (cf.
Exort. ap. Evangelii gaudium, 108), mas
dar-nos-á acesso também às conquistas
que ajudaram os nossos povos a ultrapassar com êxito as encruzilhadas históricas que iam encontrando. A transfusão de memória liberta-nos da tendência atual, muitas vezes mais fascinante,
de forjar à pressa, sobre areias movediças, resultados imediatos que poderiam
produzir «ganhos políticos fáceis, rápidos e efémeros, mas que não constroem
a plenitude humana» (ibid., 224).
Para isso, será útil evocar os Pais
fundadores da Europa. Eles souberam
procurar estradas alternativas, inovadoras num contexto marcado pelas feridas
de guerra. Tiveram a audácia não só de
sonhar a ideia de Europa, mas ousaram
transformar radicalmente os modelos
que provocavam apenas violência e des-
Capacidade de diálogo
truição. Ousaram procurar soluções
multilaterais para os problemas que
pouco a pouco se iam tornando comuns.
No ato que muitos reconhecem como
o nascimento da primitiva comunidade
europeia, disse Robert Schuman: «A
Europa não se fará duma só vez, nem
através duma construção de conjunto;
far-se-á através de realizações concretas
que criem, antes de tudo, uma solidariedade de facto».3 Precisamente agora,
neste nosso mundo dilacerado e ferido,
é preciso voltar àquela solidariedade de
facto, à mesma generosidade concreta que
se seguiu à segunda guerra mundial,
porque «a paz mundial — continuava
Schuman — não poderá ser salvaguardada sem esforços criativos à altura dos
perigos que a ameaçam».4 Os projetos
dos Pais fundadores, arautos da paz e
profetas do futuro, não estão superados: inspiram-nos hoje, mais do que
nunca, a construir pontes e a derrubar
muros. Parecem expressar um premente
convite a não contentar-se com retoques cosméticos ou compromissos tortuosos para se corrigir qualquer Tratado, mas a estabelecer corajosamente ba-
ses novas, com raízes fortes; como afirmava Alcide De Gasperi, é preciso que
nós «todos, igualmente animados pela
preocupação do bem comum das nossas pátrias europeias, da nossa Pátria
Europa», recomecemos, sem medo, um
«trabalho construtivo que requer todos
os nossos esforços de paciente e longa
cooperação».5
Esta transfusão de memória permite
inspirar-nos no passado para enfrentar
corajosamente o complexo quadro multipolar dos nossos dias, aceitando com
determinação o desafio de «atualizar» a
ideia de Europa; uma Europa capaz de
dar à luz um novo humanismo baseado
sobre três capacidades: a capacidade de
integrar, a capacidade de dialogar e a
capacidade de gerar.
Capacidade de integrar
Na sua estupenda obra A ideia de
Europa, Erich Przywara desafia-nos a
pensar a cidade como um lugar de convivência entre vários órgãos e níveis.
Estava ciente da tendência reducionista
que está presente em cada tentativa de
pensar e sonhar o tecido social. A bele-
Alcide De Gasperi, Konrad Adenauer e Robert Schuman (1951)
za, encontrada em muitas das nossas cidades, deve-se ao facto de serem capazes de conservar ao longo do tempo as
diferenças de épocas, nações, estilos,
perspetivas. Basta olhar o inestimável
património cultural de Roma, para se
confirmar uma vez mais que a riqueza
e o valor dum povo se radicam precisamente no facto de saber articular todos
estes níveis numa sadia convivência. Os
reducionismos e todas as tentativas uniformizadoras, longe de gerar valor, condenam os nossos povos a uma pobreza
cruel: a da exclusão. E a exclusão, longe de trazer grandeza, riqueza e beleza,
provoca vilania, penúria e brutalidade.
Longe de proporcionar nobreza ao espírito, fá-lo cair na mesquinhez.
As raízes dos nossos povos, as raízes
da Europa foram-se consolidando no
decurso da sua história, aprendendo a
integrar em sínteses sempre novas as
culturas mais diversas e sem aparente
ligação entre elas. A identidade europeia é, e sempre foi, uma identidade dinâmica e multicultural.
A atividade política sabe que tem entre mãos este trabalho fundamental e
inadiável. Sabemos que «o todo é mais
do que a parte, sendo também mais do
que a simples soma delas», pelo que
será preciso esforçar-se por «alargar
sempre o olhar para reconhecer um
bem maior que trará benefícios a todos
nós» (Exort. ap. Evangelii gaudium,
235). Somos convidados a promover
uma integração que encontra na solidariedade a forma de fazer as coisas, a
forma de construir a história; uma solidariedade que nunca se pode confundir
com a esmola, mas há de ser entendida
como geração de oportunidades para
que todos os habitantes das nossas cidades — e de muitas outras cidades —
possam desenvolver a sua vida com
dignidade. O tempo tem-nos ensinado
que não é suficiente a mera inserção
geográfica das pessoas; o desafio é uma
vigorosa integração cultural.
Assim a comunidade dos povos europeus poderá vencer a tentação de refugiar-se em paradigmas unilaterais e
aventurar-se em «colonizações ideológicas»; em vez disso redescobrirá a amplitude da alma europeia, nascida do
encontro de civilizações e povos, mais
Se há uma palavra que devemos repetir, sem nunca nos cansarmos, é esta:
diálogo. Somos convidados a promover
uma cultura do diálogo, procurando
por todos os meios abrir instâncias para o tornar possível e permitir-nos reconstruir o tecido social. A cultura do
diálogo implica uma autêntica aprendizagem, uma ascese que nos ajude a reconhecer o outro como um interlocutor
válido, que nos permita ver o forasteiro, o migrante, a pessoa que pertence a
outra cultura como sujeito a ser ouvido, considerado e apreciado. Hoje é urgente envolvermos todos os atores sociais na promoção duma «cultura que
privilegie o diálogo como forma de encontro», fomentando «a busca de consenso e de acordos mas sem a separar
da preocupação por uma sociedade justa, capaz de memória e sem exclusões»
(Exort. ap. Evangelii gaudium, 239). A
paz será duradoura na medida em que
armarmos os nossos filhos com as armas do diálogo, lhes ensinarmos a boa
batalha do encontro e da negociação.
Desta forma, poderemos deixar-lhes em
herança uma cultura que saiba delinear
estratégias não de morte mas de vida,
não de exclusão mas de integração.
Esta cultura do diálogo, que deveria
constar em todos os currículos escolares
como eixo transversal das disciplinas,
ajudará a incutir nas gerações jovens
uma forma de resolver os conflitos diferente daquela a que os temos habituado. Hoje é urgente poder realizar alianças já não apenas militares ou económicas, mas culturais, educacionais, filosóficas, religiosas; alianças que ponham
em evidência que frequentemente, por
trás de muitos conflitos, está em jogo o
poder de grupos económicos; alianças,
capazes de defender o povo de ser manipulado para fins impróprios. Armemos o nosso povo com a cultura do
diálogo e do encontro.
Capacidade de gerar
O diálogo, com tudo o que implica,
lembra-nos que ninguém se pode limitar a ser espetador, nem mero observador. Todos, desde o menor ao maior,
são parte ativa na construção duma sociedade integrada e reconciliada. Esta
cultura é possível, se todos participarmos na sua elaboração e construção. A
situação atual não admite meros obserCONTINUA NA PÁGINA 10
página 10
L’OSSERVATORE ROMANO
quinta-feira 12 de maio de 2016, número 19
Que te aconteceu, Europa?
CONTINUAÇÃO DA PÁGINA 8
vadores de lutas alheias; pelo contrário, é um forte apelo à responsabilidade pessoal e social.
Neste sentido, têm um papel preponderante os nossos jovens. Estes
não são apenas o futuro dos nossos
povos, mas o presente; são aqueles
que já hoje estão a forjar, com os
seus sonhos, com a sua vida, o espírito europeu. Não podemos pensar
no amanhã, sem lhes proporcionar
uma participação real como operadores de mudança e transformação.
Não podemos imaginar a Europa
sem os tornar participantes e protagonistas deste sonho.
Refletindo recentemente sobre este aspeto, interrogava-me: Como podemos fazer os nossos jovens participantes desta construção, quando os
privamos de emprego, de trabalhos
dignos que lhes permitam desenvolver-se com as suas mãos, a sua inteligência e as suas energias? Como
pretendemos reconhecer-lhes o valor
de protagonistas, quando não param
de crescer as taxas de desemprego e
subemprego de milhões de jovens
europeus? Como evitar a perda dos
nossos jovens, que acabam por sair
para outros lugares à procura de
ideais e sentido de pertença, porque
aqui, na sua terra, não lhes sabemos
oferecer oportunidades nem valores?
«A justa distribuição dos frutos da
terra e do trabalho humano não é
mera filantropia. É um dever moral».7 Se quisermos imaginar diferentes as nossas sociedades, precisamos
de criar postos de trabalho digno e
bem remunerado, especialmente para os nossos jovens.
Isto requer a busca de novos modelos económicos, mais inclusivos e
equitativos, orientados não para o
serviço de poucos, mas para benefício do povo e da sociedade. Isto pede-nos a passagem duma economia
líquida para uma economia social.
Penso, por exemplo, na economia
social de mercado, encorajada pelos
meus Predecessores.8 Passar duma
economia que tenha em vista o rendimento e o lucro com base na especulação e empréstimo com juros, para uma economia social que invista
nas pessoas criando postos de trabalho e qualificação.
Devemos passar duma economia
líquida, que tende a favorecer a corrupção como meio para obter lucro,
para uma economia social que garanta o acesso à terra, à casa, por
meio do trabalho como âmbito onde
as pessoas e as comunidades possam
fazer valer as suas «muitas dimensões da vida: a criatividade, a projetação do futuro, o desenvolvimento
das capacidades, a exercitação dos
valores, a comunicação com os outros, uma atitude de adoração. Por
isso, a realidade social do mundo
atual exige que, acima dos limitados
interesses das empresas e duma discutível racionalidade económica, “se
continue a perseguir como prioritário
o objetivo do acesso ao trabalho para
todos”9» (Enc. Laudato si’, 127).
Se quisermos apontar para um futuro que seja digno, se quisermos
um futuro de paz para as nossas sociedades, só o poderemos alcançar
apostando na verdadeira inclusão:
«a inclusão que dá o trabalho digno,
livre, criativo, participativo e solidário».10 Esta passagem (duma economia líquida para uma economia social) não só criará novas perspetivas
e concretas oportunidades de integração e inclusão, mas dar-nos-á novamente a capacidade de sonhar
aquele humanismo, cujo berço e fonte
é a Europa.
Para o renascimento duma Europa
cansada mas ainda rica de energias e
potencialidades, pode e deve contribuir a Igreja. A sua tarefa coincide
com a sua missão: o anúncio do
Evangelho, que hoje, mais do que
nunca, se traduz sobretudo em sair
ao encontro das feridas do homem,
levando a presença forte e simples
de Jesus, a sua misericórdia consoladora e encorajadora. Deus quer habitar entre os homens, mas só o pode fazer através de homens e mulhe-
Por uma unidade sem muros
CONTINUAÇÃO DA PÁGINA 7
sos destruidor». E «de repente,
eis que a globalização bate à nossa porta: tem um rosto, e é diferente de quanto esperávamos apenas há alguns meses; olha para
nós com um olhar que fala de
medo, êxodo, pobreza, fome,
doenças, guerra e morte. É o rosto de um ser humano. São os rostos de muitos seres humanos».
Mas «desviar o olhar para outras partes já não é possível», disse Philipp, e «a Europa deve enfrentar a sua responsabilidade
global: isto não significa ser capaz de resolver todos os problemas do mundo ou ser responsável
pelo seu surgimento». Mas significa «viver o princípio de humanidade: este já por si é uma tarefa
tão importante que conseguiremos levá-la por diante unicamente unindo as forças». O velho
continente «demonstrou várias
vezes que as crises se superam» e
«o plano de controle desta crise
consiste na estabilidade dos valores». Precisamente «neste difícil
caminho que a Europa está chamada a percorrer, o Papa representa uma grande riqueza». Com
efeito, Francisco «olha para a Europa com os olhos do hemisfério
sul e tem uma visão do nosso
continente muito clara, que não
está coberta pelo véu do bem-estar». E o ano santo da misericórdia é um elemento unificador para todos, também no contexto do
diálogo inter-religioso.
Em seguida, Philipp frisou que
se «o poder económico torna
possível as conquistas sociais,
contudo comporta também um
perigo de decadência, de declínio
moral e cultural». Um sintoma
«deste declínio é constituído pela
diminuição da confiança do povo
em relação à política e às instituições estatais, incapazes de garantir justiça suficiente».
«Um segundo sinal negativo —
prosseguiu — consiste na tendência ao fechamento por parte quer
das nações individualmente quer
da Europa. Contudo, muros e vedações não são capazes de resolver problema algum de maneira
permanente. Servem só para combater sintomas resultantes de um
insuficiente apoio de estruturas
sociais e económicas fora da Europa. Os detentores da riqueza
têm responsabilidades. A riqueza
da Europa implica o dever de
agir de maneira mais clarividente
e solidária de quanto não fizera
no passado».
Trata-se de uma «responsabilidade que não deve ser confiada a
estruturas
anónimas»
porque
«concerne às pessoas no seu ser e
nas suas posições e ações diárias». E a «atribuição do prémio
Carlos Magno representa uma
chamada à ordem e, como tal,
pretende convidar a adotar um
rumo de tipo espiritual e tematizar as orientações da ação política
europeia», cientes de que este
sentido de responsabilidade comum na Europa se tornou frágil.
res que, como os grandes evangelizadores do Continente, sejam tocados
por Ele e vivam o Evangelho sem
outras ambições. Só uma Igreja rica
de testemunhas poderá de novo dar
a água pura do Evangelho às raízes
da Europa. A propósito, o caminho
dos cristãos rumo à plena unidade é
um grande sinal dos tempos, ditado
pela exigência de responder urgentemente ao apelo do Senhor «para
que todos sejam um só» (Jo 17, 21).
Com a mente e o coração, com esperança e sem vãs nostalgias, como
um filho que reencontra na mãe Europa as suas raízes de vida e de fé,
sonho um novo humanismo europeu,
«um caminho constante de humanização», ao qual servem «memória,
coragem e utopia sadia e humana».11
Sonho uma Europa jovem, capaz de
ainda ser mãe: uma mãe que tenha
vida, porque respeita a vida e dá esperanças de vida. Sonho uma Europa que cuida da criança, que socorre
como um irmão o pobre e quem
chega à procura de acolhimento porque já não tem nada e pede abrigo.
Sonho uma Europa que escuta e valoriza as pessoas doentes e idosas,
para que não sejam reduzidas a objetos de descarte porque improdutivas. Sonho uma Europa, onde ser
migrante não seja delito, mas apelo
a um maior compromisso com a dignidade de todos os seres humanos.
Sonho uma Europa onde os jovens
respirem o ar puro da honestidade,
amem a beleza da cultura e duma
vida simples, não poluída pelas solicitações sem fim do consumismo;
onde casar e ter filhos sejam uma
responsabilidade e uma alegria grande, não um problema criado pela
falta de trabalho suficientemente estável. Sonho uma Europa das famílias, com políticas realmente eficazes, centradas mais nos rostos do
que nos números, mais no nascimento dos filhos do que no aumento
dos bens. Sonho uma Europa que
promova e tutele os direitos de cada
um, sem esquecer os deveres para
com todos. Sonho uma Europa da
qual não se possa dizer que o seu
compromisso em prol dos direitos
humanos constituiu a sua última
utopia. Obrigado
1 Discurso ao Parlamento Europeu
(Estrasburgo, 25 de novembro de
2014).
2 Ibidem.
3 Declaração de 9 de maio de 1950
(Salon de l’Horologe, Quai d’O rsay,
Paris).
4 Ibidem.
5 Discurso à Conferência Parlamentar
Europeia (Paris, 21 de abril de 1954).
6 Discurso à Assembleia dos Artesãos
Alemães (Dusseldórfia, 27 de abril de
1952).
7 Discurso aos Movimentos Populares
(Bolívia — Santa Cruz da Serra, 9 de
julho de 2015).
8 Cf. João Paulo II, Discurso ao Embaixador da República Federal Alemã,
8 de novembro de 1990.
9 Bento XVI, Carta enc. Caritas in veritate (29 de junho de 2009), 32.
10 Discurso aos Movimentos Populares
(Bolívia — Santa Cruz da Serra, 9 de
julho de 2015)
11 Discurso ao Conselho da Europa
(Estrasburgo, 25 de novembro de
2014).
número 19, quinta-feira 12 de maio de 2016
L’OSSERVATORE ROMANO
página 11
O Pontífice denunciou a exclusão dos pobres da África dos cuidados básicos
Saúde negada
Aceder às curas e aos remédios deve ser um direito universal e não um privilégio
Em várias regiões do mundo, e
sobretudo na África, a saúde «é
efetivamente negada», denunciou o
Papa Francisco recebendo em audiência
os membros da organização Médicos
com a África — Colégio universitário
de aspirantes e médicos missionários
(Cuamm). Em seguida, publicamos o
discurso proferido pelo Pontífice
durante o encontro, que teve lugar
na manhã de 7 de maio
na sala Paulo VI.
Estimados irmãos, estou feliz por
vos dar as boas-vindas a cada um de
vós, «Médicos com a África —
Cuamm», que trabalhais pela salvaguarda da saúde das populações
africanas; e ainda mais feliz depois
de ter ouvido as palavras que me
aproximaram em grande medida daqueles lugares distantes, pois o testemunho destes médicos levou o meu
coração até lá, onde vós ides simplesmente para encontrar Jesus. E isto fez-me muito bem. Obrigado! A
vossa organização, expressão da missionariedade da diocese de Pádua,
ao longo dos anos envolveu numerosas pessoas que, como voluntários,
se comprometeram na realização de
projetos a longo prazo, numa ótica
de desenvolvimento. Agradeço-vos
aquilo que estais a levar a cabo a favor do direito humano fundamental
da saúde para todos. Com efeito, a
saúde não é um bem de consumo,
mas um direito universal e portanto
o acesso aos serviços médicos não
pode ser um privilégio.
A saúde, principalmente a básica,
é efetivamente negada — negada! —
em várias partes do mundo e em
muitas regiões da África. Ela não
constitui um direito para todos mas,
ao contrário, ainda é um privilégio
para poucos, para aqueles que têm
possibilidades. A acessibilidade aos
serviços médicos, aos cuidados e aos
remédios ainda permanece uma miragem. Os mais pobres não conseguem pagar e são excluídos dos serviços hospitalares, até dos mais essenciais e primários. Por isso é importante a vossa atividade generosa
em benefício de uma rede minuciosa
de serviços, capaz de dar respostas
às necessidades das populações.
Escolhestes os países mais pobres
da África, os subsarianos, e as áreas
mais esquecidas, «a última milha»
dos sistemas de saúde. Trata-se das
periferias geográficas para onde o
Senhor vos envia, a fim de serdes
bons samaritanos, indo ao encontro
do pobre Lázaro e atravessando a
«porta» que leva do primeiro ao terceiro mundo. Esta é a vossa «porta
santa»! Trabalhais a favor das camadas mais vulneráveis da população:
as mães, para lhes garantir um parto
seguro e digno; e as crianças, de modo especial os recém-nascidos. Na
África muitas mães morrem durante
o parto e demasiadas crianças não
superam o primeiro mês de vida,
por causa da subalimentação e das
grandes epidemias. Encorajo-vos a
permanecer no meio desta humanidade ferida e sofredora: é Jesus. A
vossa obra de misericórdia é o cuidado pelo doente, segundo o lema
evangélico «Curai os enfermos» (Mt
10, 8). Que possais ser expressão da
Igreja mãe, que se debruça sobre os
mais frágeis e cuida deles.
Para favorecer processos de desenvolvimento autênticos e duradouros
são necessários prazos longos, na lógica do semear com confiança e esperar os frutos com paciência. Tudo
isto é demonstrado também pela
história da vossa Organização, que
há mais de sessenta e cinco anos se
encontra comprometida ao lado dos
mais pobres no Uganda, Tanzânia,
Moçambique, Etiópia, Angola, Sudão do Sul e Serra Leoa. A África
tem necessidade de um acompanhamento paciente e continuativo, tenaz
e competente. As intervenções precisam de programas de trabalho sérios, exigem pesquisa e inovação, e
impõem o dever de transparência em
relação aos doadores e à opinião pública.
Sois médicos «com» a África e
não «pela» África, e isto é deveras
importante. Sois chamados a envolver as populações africanas no processo de crescimento, caminhando
juntos, compartilhando dramas e
alegrias, dores e entusiasmos. Os povos são os primeiros artífices do próprio progresso, os seus primeiros responsáveis! Bem sei que enfrentais os
desafios de todos os dias de modo
gratuito, ajudando de maneira abnegada, sem proselitismos nem ocupações de espaços. Aliás, colaborando
Mas a terra é redonda?
«As nossas vidas, as nossas famílias, a África e o seu
povo, a nossa paixão e o compromisso pelos mais
pobres»: são estes — disse o diretor de Médicos com a
África Cuamm, o padre Dante Carraro, saudando o
Papa — «os tesouros mais preciosos» de quantos há
mais de 65 anos desempenham a sua missão em sete
países da África subsariana, expressão de uma «Igreja
de trabalho que se encarna na história e na vida do
mundo». E como testemunho desta fé vivida
concretamente no meio do sofrimento, padre Dante leu
a Francisco as comovedoras cartas provenientes de dois
médicos do Sudão do Sul. Na primeira, Massimo La
Raja descreve ao Papa a «periferia extrema» de uma
«terra que é redonda só nos mapas-múndi» e onde nos
hospitais se respira «odor de terra», odor de «sangue
coagulado», odor de «desinfetante, provando que
tentamos fazer alguma coisa», e «odor de lágrimas e
sorrisos». Uma realidade dura, difícil, na qual —
escreveu Arianna Bortolani, diretora clínica do hospital
de Yrol — são tantas as ofensas à dignidade humana
que é «difícil reconhecer o rosto e a presença de
Cristo».
Quantas vezes, acrescentou a médica na carta, «tenho
vontade de gritar as “minhas” razões: isto é, que são
possíveis e boas outras modalidades de relação que
não sejam a violência, a vingança, a prepotência, o
egoísmo». Por sorte, continuou, às vezes «um sorriso,
uma pessoa mais disponível, uma atenção dedicada,
repõe o olhar na justa direção, permitindo ver também
a beleza que muitas vezes está simplesmente diante
dos olhos».
São só dois exemplos, explicou o diretor de Médicos
com a África Cuamm, que indicam a medida da
participação dos agentes da organização, nascida em
1950 em Pádua «para fazer com que todos tenham
acesso aos cuidados médicos, pelo menos aos
essenciais».
Enfim uma proposta: dar vida a um dia para o acesso
às curas de todos, a fim de que «todos, especialmente
os mais pobres possam ser tratados e assistidos com
dignidade». Como recordação da sua missão na África,
os participantes ofereceram ao Pontífice uma estátua
de ébano, proveniente da Tanzânia, que representa
uma mulher grávida.
com as Igrejas e os governos locais,
na lógica da participação e da partilha de compromissos e responsabilidades recíprocas. Exorto-vos a perseverar na vossa abordagem peculiar
das realidades locais, contribuindo
para o seu crescimento e deixandoas quando já se tornam capazes de
prosseguir sozinhas, numa perspetiva de desenvolvimento e de sustentabilidade. É a lógica da semente,
que desaparece e morre para dar frutos duradouros.
No vosso inestimável serviço aos
pobres da África, tendes como modelos o vosso fundador, doutor
Francesco Canova, e o diretor histórico, padre Luigi Mazzucato. O
doutor Canova amadureceu na FUCI
a ideia de ir pelo mundo em socorro
dos últimos, projetando um «colégio
para futuros médicos missionários» e
delineando a figura do médico missionário leigo. Por sua vez, o sacerdote Mazzucato foi diretor do
Cuamm durante 53 anos, tendo falecido no dia 26 de novembro passado
com 88 anos de idade. Foi o verdadeiro inspirador das opções de fundo, em primeiro lugar a pobreza.
Assim deixou escrito no seu testamento espiritual: «Nasci pobre e
sempre procurei viver com o mínimo
indispensável. Nada do que possuo
é meu e nada tenho para deixar. O
pouco vestuário de que disponho seja distribuído pelos pobres».
No sulco destas grandiosas testemunhas de uma missionariedade de
proximidade evangelicamente fecunda, vós continuais com coragem a
vossa obra, dando expressão de uma
Igreja que não é uma «super clínica
para vips», mas antes de tudo um
«hospital de campo». Uma Igreja
com um coração generoso, próxima
dos numerosos feridos e humilhados
da história, ao serviço dos mais pobres. Asseguro-vos a minha proximidade e oração. Abençoo todos vós,
os vossos familiares e o vosso compromisso em prol do hoje e do amanhã do Continente africano. E peçovos, por favor, que rezeis também
por mim, para que o Senhor me torne cada vez mais pobre. Obrigado!
L’OSSERVATORE ROMANO
página 12
quinta-feira 12 de maio de 2016, número 19
Missas matutinas em Santa Marta
Sexta-feira
6 de maio
Com alegria e esperança
O cristão não anestesia o sofrimento,
nem sequer o maior que faz vacilar a
fé, e não vive a alegria e a esperança
como se fosse sempre carnaval. Mas
encontra o sentido da sua existência
no perfil da mulher que dá à luz:
sente tanta felicidade quando nasce
a criança que se esquece do seu sofrimento. «Na liturgia da Ascensão
do Senhor, observou Francisco, a
Igreja explode numa atitude que
não é habitual, e no início a primeira oração é um grito: “Exulte, Senhor, a tua Igreja!”». Sim, prosseguiu, «exulte com a esperança de viver e alcançar o Senhor: “Exulte de
alegria a tua Igreja”». E na oração
da coleta, «hoje rezámos: “Senhor,
eleva os nossos corações para Jesus!”». Uma invocação que expressa
«precisamente a alegria que invade
toda a Igreja, alegria e esperança:
ambas caminham juntas». Com efeito, «uma alegria sem esperança é
um simples divertimento, uma alegria passageira». E «uma esperança
sem alegria não é esperança, não vai
além de um otimismo sadio».
Eis por que «alegria e esperança
caminham juntas — explicou Francisco — e ambas fazem esta explosão
que a Igreja na sua liturgia quase,
permito-me dizer a palavra, grita
sem pudor: “Exulte a tua Igreja!”,
exulte de alegria, sem formalidades». Porque «quando há grande
alegria, não há formalidade: é alegria». Portanto, explicou o Papa,
«Exulte de alegria a tua Igreja, viva
na esperança de a alcançar» e «eleva, Senhor, os nossos corações para
Jesus que está sentado na glória do
Pai».
«Com três pinceladas — afirmou o
Pontífice — a Igreja diz qual deve
ser a atitude cristã: alegria e esperança juntas». E assim «a alegria
fortalece a esperança e a esperança
floresce na alegria». E «ambas, com
esta atitude que a Igreja lhes deseja
atribuir, estas duas virtudes cristãs
indicam um sair de nós mesmos: o
jubiloso não se fecha em si mesmo;
a esperança leva-te lá, é a âncora
que está precisamente na praia do
céu e te conduz para fora». Por isso
podemos «sair de nós mesmos com
a alegria e a esperança». Uma reflexão que faz referência ao trecho
evangélico de João (16, 20-23) proposto pela liturgia.
«O Senhor diz-nos que há problemas — prosseguiu o Papa — e na vida esta alegria e esperança não são
um carnaval: são outra coisa, também, ter que enfrentar dificuldades».
Francisco repropôs «a imagem que o
Senhor usa hoje no Evangelho: a
mulher quando chega o momento
do parto». Sim, explicou, «a mulher,
quando dá à luz, sente dor porque
chegou a sua hora; mas depois de
dar à luz a criança, esquece o sofrimento».
E é precisamente «o que fazem a
alegria e a esperança juntas, na nossa vida, quando estamos nas tribulações, quando temos problemas,
quando sofremos». Não se trata certamente de «uma anestesia: o sofrimento é sofrimento, mas se for vivido com alegria e esperança abre a
porta para a alegria de um futuro
novo».
«Esta imagem do Senhor deve
ajudar-nos muito nas dificuldades»,
acrescentou o Papa, até as «más que
nos fazem duvidar da nossa fé».
Mas «com a alegria e com a esperança vamos em frente, porque depois desta tempestade chega um homem novo, como a mulher quando
dá à luz». E Jesus diz que esta alegria e esperança são duradouras, que
não passam». «Assim também vós,
agora, estais no sofrimento», são as
palavras de Jesus aos discípulos
transmitidas pelo Evangelho. Mas
tranquiliza-os imediatamente: «Vervos-ei de novo e o vosso coração alegrar-se-á e ninguém vos poderá privar da vossa alegria».
São palavras que devem ser frisadas, acrescentou o Pontífice: «A alegria humana pode ser tirada de
qualquer coisa, de qualquer dificuldade. Mas esta alegria que o Senhor
nos dá, que nos faz exultar, que nos
faz elevar na esperança de o encontrar, esta alegria ninguém no-la pode
tirar, é duradoura. Até nos momentos mais obscuros».
«Alegria, esperança é o grito da
Igreja, feliz depois da Ascensão do
Senhor». Francisco recordou que
«Lucas nos diz nos Atos que, a um
certo ponto, quando o Senhor se vai
embora e deixam de o ver, os discípulos ficam a olhar para o céu, um
pouco entristecidos». E «são os anjos que os despertam, convidando-os
a ir. E depois, no Evangelho de Lucas, lê-se: “Voltaram felizes, cheios
de alegria”. Precisamente aquela alegria de saber que a nossa humanidade entrou no céu: pela primeira
vez!».
Francisco concluiu a sua meditação com os votos de «que o Senhor
nos conceda a graça de uma alegria
grande que seja a expressão da esperança; e uma esperança forte que se
torne alegria na nossa vida». E com
a oração que «o Senhor conserve esta alegria e esperança, assim ninguém poderá privar-nos delas».
Segunda-feira
9 de maio
Perfeito desconhecido
Um perfeito desconhecido ou até
«um prisioneiro de luxo»: eis o que
é o Espírito Santo para muitos cristãos que ignoram que é ele quem
«move a Igreja», levando-nos a Jesus e tornando-nos «reais» e «não
virtuais». O encorajamento a refletir
sobre o papel central que o Espírito
Santo desempenha na vida dos crentes, precisamente na semana que
precede o Pentecostes, esteve no
centro da homilia de Francisco.
No início da celebração o Papa,
indicando a imagem de santa Luísa
de Marillac posta ao lado do altar,
recordou a comemoração da memória litúrgica. Com efeito, é a primeira vez que se celebra nesta data: des-
de a canonização, realizada em 1934,
até hoje foi celebrada a 15 de março.
Além disso, celebra-se também o
aniversário da cerimónia de beatificação da santa, que teve lugar a 9 de
maio de 1920. Um dia particularmente importante, explicou o Pontífice, porque Luísa de Marillac foi a
fundadora das Filhas da Caridade
de São Vicente de Paulo, «as religiosas que trabalham e gerem» a Casa
de Santa Marta. Desta forma, acrescentou Francisco, «ofereço esta missa pelas religiosas da casa».
Para a sua reflexão na homilia, o
Papa inspirou-se no trecho dos Atos
dos Apóstolos (19, 1-8). Paulo encontra-se em Éfeso com alguns discípulos que acreditavam em Jesus e
pergunta-lhes: «Recebestes o Espírito Santo quando abraçastes a fé?».
E eles, depois de se terem entreolhado surpreendidos, responderam-lhe:
«Não, nem sequer ouvimos dizer
que há um Espírito Santo!». Portanto, observou o Papa, «acreditavam
em Jesus, eram bons discípulos, mas
nem sequer tinham ouvido que existia o Espírito Santo».
Paulo retoma imediatamente o
diálogo perguntando-lhes que batismo tinham recebido. E os discípulos: «O de João». Então, Paulo explica-lhes que «aquele era um batismo de penitência, de preparação».
Ouvindo Paulo, os discípulos de
Éfeso «foram batizados em nome do
Senhor Jesus». Lê-se nos Atos: «E
quando Paulo lhes impôs as mãos, o
Espírito Santo desceu sobre eles, e
falavam em todas as línguas e profetizavam». Portanto, explicou o Papa, «é um caminho: a via da conversão, mas faltavam o batismo e a imposição das mãos, para que viesse o
Espírito Santo».
«Também hoje acontece o mesmo», afirmou o Pontífice. «A maioria dos cristãos» sabe pouco ou nada sobre o Espírito Santo, a ponto
que se pode fazer própria a resposta
dos discípulos de Éfeso a Paulo:
«Não, nem sequer ouvimos dizer
que há um Espírito Santo!». E se
perguntássemos a tantas pessoas
boas: «quem é o Espírito Santo para
ti?» e «o que faz e onde está o Espírito Santo?», a única resposta será:
«é a terceira pessoa da Trindade».
Exatamente como aprendemos no
catecismo. Certamente, «sabem que
o Pai criou o mundo, porque a criação é atribuída ao Pai». E sabem
também que «o Filho é Jesus, que
nos redimiu e nos deu a vida». Portanto, «respondem assim» mas depois em relação ao Espírito Santo
sabem que é «a terceira pessoa da
Trindade». Mas se lhes perguntas:
«o que faz ele?», respondem-te que
«está ali!». «Os nossos cristãos são
assim».
«O Espírito Santo — explicou
Francisco — é quem move a Igreja; é
quem trabalha na Igreja, nos nossos
corações; quem faz de cada cristão
uma pessoa diversa das outras, mas
de todos faz unidade». Por conseguinte, prosseguiu, o Espírito Santo
«é quem leva em frente, abre as portas de par em par e envia a dar testemunho de Jesus».
No início da missa, recordou o
Pontífice, na antífona de entrada foi
dito: «Recebereis o Espírito Santo e
sereis minhas testemunhas em todo
o mundo». Eis que «o Espírito Santo é quem estimula a louvar a Deus,
a rezar: “Ora em nós”». O Espírito
Santo «está dentro de nós e ensinanos a olhar para o Pai e a dizer-lhe:
“Pai”». E assim «liberta-nos desta
condição de órfãos na qual o espírito do mundo nos quer manter». Por
todas estas razões, explicou, o Espírito Santo «é tão importante: é o
protagonista da Igreja viva: é ele
quem trabalha na Igreja».
Neste ponto, o Pontífice advertiu
sobre um perigo: «Quando não estamos à altura desta missão do Espírito Santo e não o recebemos desta
forma», acabamos por «reduzir a fé
a uma moral, a uma ética». E pensamos que cumprir todos os mandamentos é suficiente, «e nada mais».
Assim, dizemo-nos: «posso fazer isto, não posso fazer aquilo; até aqui
sim, até lá não!», caindo na «casuística» e numa «moral fria». Contudo,
recordou o Papa, «a vida cristã não
é uma ética: é um encontro com Jesus Cristo». E «quem me leva ao encontro com Jesus Cristo» é precisamente o Espírito Santo.
Deste modo, «nós, na nossa vida,
temos no nosso coração o Espírito
Santo como um “prisioneiro de luxo”: não deixamos que nos impulsione, não deixamos que nos mova».
E no entanto «ele faz tudo, sabe tudo, sabe recordar-nos o que disse Jesus, sabe explicar-nos os temas de
Jesus». Só há uma coisa que «o Espírito Santo não sabe fazer: cristãos
de salão. Isto ele não sabe fazer!
Não sabe fazer “cristãos virtuais”,
não virtuosos». Pelo contrário, «faz
cristãos reais: enfrenta a vida real tal
como ela é, com a profecia do ler os
sinais dos tempos, e leva-nos em
frente desta maneira». Por isso «é o
grande “prisioneiro do nosso coração” e dizemos que é a terceira pessoa da Trindade e ponto final».
«Esta semana — sugeriu Francisco
— far-nos-á bem refletir sobre o que
faz o Espírito Santo na nossa vida».
Para ajudar este exame de consciência o Pontífice propôs algumas questões diretas: «Ensinou-me a estrada
da liberdade? Aprendi-a por ele?
Mas que liberdade? Qual liberdade?
O Espírito Santo, que reside em
mim, impele-me a sair: tenho medo?
Como é a minha coragem, a que me
dá o Espírito Santo, para sair de
mim mesmo, para testemunhar Jesus? Como vai a minha paciência
nas provações? Pois também a paciência é dada pelo Espírito Santo».
Precisamente «nesta semana de
preparação para a solenidade de
Pentecostes», o Papa convidou os
cristãos a perguntar se deveras acreditam no Espírito Santo ou se para
eles é só «uma palavra». E «procuremos — exortou — falar com ele e
dizer: “Sei que estás no meu coração, que estás no coração da Igreja,
que levas em frente a Igreja, que
promoves a unidade entre todos nós,
mas somos todos diversos, na diversidade de todos nós”». O convite é
«dizer-lhe todas estas coisas e pedir
a graça de aprender, mas na minha
vida, o que faz ele de concreto». É
«a graça da docilidade a ele, ser dócil ao Espírito Santo: esta semana
façamos isto, pensemos no Espírito e
falemos com ele».
número 19, quinta-feira 12 de maio de 2016
L’OSSERVATORE ROMANO
página 13
O Papa voltou a denunciar as perseguições contra os cristãos e as minorias religiosas
Vítimas de uma violência inaudita
Novo apelo de Francisco a favor dos cristãos e das minorias religiosas vítimas de
perseguições no Egito e no Médio Oriente. Numa carta enviada a Tawadros II,
Papa de Alexandria e Patriarca da Sé de São Marcos, por ocasião do dia da
amizade copto-católica — que se celebra no terceiro aniversário do encontro
fraterno realizado no Vaticano em 2013, quarenta anos depois do encontro de
Paulo VI com Shenouda III — o Pontífice recordou as «grandes dificuldades» e
as «situações trágicas» que os crentes estão a viver em muitos países. E pediu à
comunidade internacional que «responda de maneira sábia a esta violência
inaudita».
A Sua Santidade Tawadros II
Papa de Alexandria e Patriarca
da Sé de São Marcos
Recordando com prazer o terceiro
aniversário do nosso encontro fraterno em Roma a 10 de maio de 2013,
apresento-lhe, Santidade, os meus
cordiais auspícios de paz e saúde, e
expresso a minha alegria pelos vínculos espirituais cada vez mais profundos que unem a Sé de Pedro e a
Sé de Marcos.
É com gratidão no Senhor nosso
Deus que recordo os passos que demos juntos pelo caminho da reconciliação e da amizade. Depois de séculos de silêncio, de desentendimentos
e até de hostilidades, católicos e
coptas estão a encontrar-se cada vez
com mais frequência, dialogando e
cooperando para proclamar o Evangelho e servir a humanidade. Neste
renovado espírito de amizade, o Senhor ajuda-nos a ver que o vínculo
que nos une nasce da mesma chamada e missão que recebemos do Pai
no dia do nosso batismo. Com efeito, é através do batismo que nos tornamos membros do único Corpo de
Cristo que é a Igreja (cf. 1 Cor 12,
13), o povo de Deus, que proclama o
seu louvor (cf. 1 Pd 2, 9). Que o Espírito Santo, motivo e portador de
todos os dons, nos una cada vez
mais no vínculo de amor cristão e
nos guie na nossa peregrinação comum, na verdade e na caridade, rumo à plena comunhão.
Desejo expressar-lhe também,
Santidade, o meu profundo apreço
pela generosa hospitalidade oferecida durante o décimo terceiro encontro da Comissão Mista Internacional
para o Diálogo Teológico entre a
Igreja Católica e as Igrejas Ortodoxas Orientais, que se realizou no
Cairo a convite do Patriarcado da Sé
de São Marcos. Estou-lhe grato por
ter recebido os membros da Comissão Mista no mosteiro de São
Bishoy em Wadi Natrum, na certeza
de que partilhamos a fervorosa esperança de que este importante diálogo possa continuar para progredir e
dar frutos abundantes.
Mesmo estando ainda a caminho
rumo àquele dia no qual nos reuniremos como um só na mesma mesa
eucarística, podemos já agora tornar
visível a comunhão que nos une.
Coptas e católicos podem testemunhar juntos valores importantes como a sacralidade de cada vida humana, a santidade do matrimónio e
da vida familiar, o respeito pela criação que nos foi confiada por Deus.
Face a tantos desafios contemporâneos, coptas e católicos estão chamados a dar uma resposta comum fundada no Evangelho. Enquanto continuamos a nossa peregrinação terrena, se aprendermos a carregar os fardos uns dos outros e a intercambiar
o rico património das nossas respetivas tradições, veremos com maior
clareza que aquilo que nos une é
mais do que quanto nos divide.
Santidade, todos os dias os meus
pensamentos e orações se dirigem às
comunidades cristãs no Egito e no
Médio Oriente, muitas das quais vivem grandes dificuldades e situações
trágicas. Estou bem ciente da vossa
séria preocupação pela situação no
Médio Oriente, sobretudo no Iraque
e na Síria, onde os nossos irmãos e
irmãs cristãos e outras comunidades
religiosas devem fazer face a provas
diárias. Que Deus nosso Pai conceda
paz e conforto a quantos sofrem e
inspire a comunidade internacional a
responder de maneira sábia e justa a
esta violência inaudita.
Nesta ocasião, que justamente já é
conhecida como dia da amizade
copto-católica, troco de bom grado
com Vossa Santidade um abraço fraterno de paz em Cristo, Senhor Ressuscitado.
Vaticano, 10 de maio de 2016
FRANCISCO
Missas matutinas em Santa Marta
Terça-feira
10 de maio
Juventude consumida
«Consumir a vida por causas nobres»: eis uma oportunidade oferecida aos jovens de hoje, que imersos
numa «cultura do consumismo» e
«do narcisismo» com frequência vivem insatisfeitos e pouco felizes.
Francisco pôs no centro da própria
reflexão o testemunho dos missionários — «a glória da nossa Igreja» —
propondo-a como modelo para os
jovens.
A homilia do Papa foi inspirada
pela primeira leitura do dia tirada
dos Atos dos Apóstolos (20, 17-27),
na qual se lê o que — disse o Papa —
«poderíamos chamar “a despedida
de um apóstolo”». É a passagem na
qual «Paulo faz vir a Mileto os presbíteros de Éfeso e diz-lhes que não
os verá mais porque deve partir, o
Espírito o impele a ir a Jerusalém».
Analisando este texto, vê-se que,
antes de tudo, o apóstolo faz um
«exame de consciência: “sabeis como me comportei convosco todo este tempo”». É um exame minucioso
no qual Paulo «faz uma narração do
modo como se comportou» e, num
primeiro momento, parece até «que
se vangloria um pouco». Na realidade «não é assim», a ponto que ele
mesmo acrescenta: «Simplesmente
foi o Espírito que me levou a isto».
E continua: «Constrangido pelo Espírito, vou a Jerusalém. O Espírito
enviou-me aqui para anunciar Jesus
e agora envia-me a Jerusalém». Depois do exame de consciência emerge outro elemento: a «docilidade»
ao Espírito Santo. É uma despedida
na qual Paulo exprime quer «uma
nostalgia ao constatar o que o Senhor fez com ele», quer «um sentimento de gratidão ao Senhor».
Este trecho da Escritura, observou
Francisco, faz vir à mente «o bonito
excerto literário do espanhol Pemán» no qual se lê «a descrição da
despedida da vida de são Francisco
Xavier no litoral da China. Também
ele faz um exame de consciência: sozinho, diante de Deus».
É significativa também a continuação da narração, porque se pode
questionar: «O que espera Paulo?».
De facto o apóstolo escreve que «vai
a Jerusalém “sem saber o que lá
acontecerá”». Como um missionário
que parte «sem saber o que o espe-
ra». Tem a certeza de uma única
coisa: «Só sei que o Espírito Santo,
de cidade em cidade, me assegura
que me esperam cadeias e perseguições». E, comentou o Pontífice,
também «o missionário sabe que a
vida não será fácil mas prossegue».
Por fim Paulo acrescenta «outra
verdade, que faz chorar os presbíteros de Éfeso: “Sei agora que não tornareis a ver a minha face, todos
vós”». Depois, «dá alguns conselhos. Acompanham-no até à embarcação e na praia lançam-se ao pescoço de Paulo, chorando... Ele despede-se assim» da comunidade de Éfeso, na cidade de Mileto.
«O fim do apóstolo é o fim dos
missionários» comentou o Papa.
«Penso — explicou — que este trecho» evoca «a vida dos nossos missionários: muitos jovens, moças e
moços, que deixaram a pátria, a família e foram para longe, para outros continentes, anunciar Jesus Cristo».
Também eles «eram “constrangidos” pelo Espírito Santo», era a sua
«vocação». E hoje, quando naqueles
lugares «visitamos os cemitérios» e
«vemos as suas lápides», damo-nos
conta de que «tantos morreram jovens, com menos de quarenta anos»,
frequentemente porque não estavam
preparados para suportar as doenças
locais. Entendemos que estes jovens
«deram a vida», «consumiram a vida». Significativa a reflexão de Francisco: «Penso que eles, naquele último momento, distantes da pátria, da
família, dos amigos, disseram: “Valia
a pena fazer o que fiz!”».
Em recordação destes jovens, «heróis da evangelização dos nossos
tempos», considerando que a Europa povoou outros continentes de
missionários que partiam sem voltar
— e que provavelmente, no seu «último momento», o da «despedida»,
disseram como Xavier: «Deixei tudo, mas valia a pena!» — o Papa
afirmou: «Acho que é justo dar graças ao Senhor pelo seu testemunho». Alguns morreram «anónimos», outros como «mártires, isto é,
oferecendo a vida pelo Evangelho»:
são, afirmou Francisco, «a nossa glória estes missionários! A glória da
nossa Igreja!».
Face a tais exemplos, o Pontífice
dirigiu um pensamento «aos moços
e moças de hoje», com frequência
em dificuldade na «cultura do consumismo, do narcisismo». E disseCONTINUA NA PÁGINA 14
L’OSSERVATORE ROMANO
página 14
quinta-feira 12 de maio de 2016, número 19
Declaração final do colóquio entre o Pontifício Conselho para o diálogo inter-religioso e o Royal Institute for Inter-Faith Studies
Solidariedade
com as vítimas de violências e guerras
Concluiu-se com a assinatura de uma
declaração final o encontro entre o
Pontifício conselho para o diálogo interreligioso e o Royal Institute for InterFaith Studies, que teve lugar em Roma
nos dias 3-4 de maio. A seguir, o texto
da mencionada declaração.
O Pontifício conselho para o diálogo inter-religioso (Cidade do Vaticano), e o Royal Institute for InterFaith Studies (Amã, Jordânia), realizaram o seu quarto diálogo em Roma nos dias 3 e 4 de maio de 2016.
O tema escolhido foi o seguinte:
«Valores compartilhados na vida social e política: perspetivas cristãs e
muçulmanas».
Este tema foi analisado a partir de
três subtítulos: «Cidadãos e crentes:
perspetivas cristãs e muçulmanas»,
apresentado respetivamente pelo
professor Mohan Doss, S.V.D. (Índia)
e pelo professor Ahmed Abaddi
(Marrocos); «Os nossos valores
compartilhados e as respetivas particularidades», apresentado pelo professor Wajih Kanso (Líbano) e pelo
professor Salim Daccache, S.J. (Líbano); e «Ir ao encontro dos necessita-
Juventude
consumida
CONTINUAÇÃO DA PÁGINA 13
lhes: «Olhai para o horizonte!
Olhai para os nossos missionários!». Por isso, acrescentou, é
preciso «rezar ao Espírito Santo
para que os constranja a ir para
longe, a “queimar” a vida». Usou
precisamente esta expressão forte,
explicando: «É uma palavra um
pouco dura, mas a vida vale a pena vivê-la; mas para a viver bem»
é necessário «“consumi-la” no serviço, no anúncio; e ir em frente.
E esta é a alegria do anúncio do
Evangelho».
Concluindo a homilia, o Papa
exortou todos a dar graças ao Senhor «por Paulo, pela sua capacidade de ir a um lugar e de o deixar quando o Espírito Santo o
chama para outro», mas também
«por tantos missionários da Igreja» que, no passado assim como
ainda hoje, tiveram a coragem de
partir. O Pontífice convidou também a rezar a fim de que o Espírito entre «no coração dos nossos
jovens», onde «há um pouco de
insatisfação» e «constranja-os a ir
além, a consumir a vida por causas nobres». Provavelmente, disse,
disto permanecerá só «uma lápide, com o nome, a data de nascimento, a data da morte; e passados alguns anos ninguém se lembrará deles», mas eles «despedirse-ão do mundo em serviço. E esta é uma coisa boa!». Eis a invocação final: «Que o Espírito Santo, que vem agora, semeie no coração dos jovens esta vontade de
partir e anunciar Jesus Cristo,
“consumindo” a própria vida».
Encontro do Papa com os participantes no colóquio inter-religioso (4 de maio de 2016)
dos e dos vulneráveis: uma solicitude comum para cristãos e muçulmanos», apresentado por monsenhor
Giovanni Pietro Dal Toso (Vaticano)
e pelo doutor Hani El-Banna (Reino
Unido).
O cardeal Jean-Louis Tauran, presidente do Pontifício conselho para
o diálogo inter-religioso, chefiou a
delegação católica, enquanto o príncipe El Hassan bin Talal, presidente
do conselho do Royal Institute for
Inter-Faith Studies, guiou a delegação muçulmana.
Outros membros da delegação católica: D. Miguel Ayuso, M.C.C.J, secretário do Pontifício conselho;
monsenhor Khaled Akasheh, chefe
do departamento para o islão do
Pontifício conselho; D. Jean-Paul
Vesco, O.P., bispo de Oran (Argélia);
a senhora Anne Leahy, embaixadora
emérita do Canadá junto da Santa
Sé; o doutor Anan Al-Kass Yousif
(Iraque); a senhora Ruth Susan
Wangeci Maina (Quénia); o engenheiro Riad Sargi (Síria); e o senhor
Michael Utama Purnama (Indonésia).
Outros membros da delegação
muçulmana: o doutor Fareed Yaqoob Yusuf Mubarak AlMuftah (Bahrain); o doutor Amer El Hafi (Jordânia); o doutor Oussama Mohamed
Nabil (Egito); o doutor Hassan
Nadhem (Iraq); o doutor Majeda
Omar, diretor do Royal Institute
(Jordânia); e o doutor Nayla Tabbara (Líbano).
Os participantes demonstraram
grande apreço pelas intervenções,
enfrentando os debates com espírito
de abertura, num clima de profunda
cordialidade.
As duas delegações foram recebidas pelo Papa Francisco a 4 de maio
e comoveram-se com as suas palavras: «O diálogo é sair de nós mesmos com a palavra e ouvir a palavra
do outro. Duas palavras encontramse, dois pensamentos encontram-se.
É a primeira etapa de um caminho.
Depois desta reunião da palavra, os
corações encontram-se e encetam um
diálogo de amizade, que acaba com
o aperto de mão. Palavra, coração,
mãos. É simples! Até uma criança o
sabe fazer...».
No final da sua reunião, os participantes apresentaram a seguinte
proposta:
Compartilhamos credos e valores
morais. As realidades que temos em
comum são muito mais numerosas
do que as nossas particularidades, e
constituem uma base sólida para vivermos juntos de modo pacífico e
frutuoso, inclusive com pessoas de
boa vontade que não professam uma
religião específica.
Cremos no papel humanizador e
civilizador das nossas religiões,
quando os seguidores aderem aos
seus princípios de adorar a Deus e
de amar e cuidar do próximo.
Acreditamos que Deus conferiu
dignidade e direitos inalienáveis a
cada pessoa. São seus dons, que devem ser reconhecidos, garantidos e
protegidos pela lei.
Asseguramos a nossa solidariedade aos nossos irmãos e às nossas irmãs em humanidade que se encontram em necessidade, prescindindo
da sua pertença étnica, religiosa ou
cultural.
A nossa ajuda aos pobres e aos
necessitados deve ser oferecida por
compaixão e por amor à benevolência de Deus. Nunca deve ser usada
para promover o proselitismo.
Consideramos que os jovens não
representam apenas o futuro da humanidade. São também uma parte
importante do seu presente. Têm o
direito a uma educação adequada,
que os prepare para ser bons cidadãos, no respeito pela diversidade.
O nosso mundo, a nossa «casa comum», atravessa muitas crises complicadas e tem necessidade do compromisso constante dos seus habitantes para o transformar num lugar
adequado onde poder viver juntos
pacificamente, compartilhando os recursos do universo, tendo presentes
as gerações vindouras.
Manifestamos a nossa proximidade e solidariedade a todos aqueles
que sofrem, de modo particular devido à violência e aos conflitos armados. O respeito pelo direito internacional, o diálogo, a justiça, a misericórdia e a compaixão são valores e
instrumentos adequados para alcançar a paz e a harmonia.
O Pontifício conselho para o diálogo inter-religioso e o Royal Institute for Inter-Faith Studies, gratos a
Deus Todo-Poderoso por esta colaboração frutuosa, decidiram continuá-la, encontrando-se no prazo de
um ano, em vista de se preparar para o seu quinto diálogo.
Mensagem aos budistas na festa do Vesakh
Para uma educação ecológica
«Budistas e cristãos: promovamos
juntos uma educação ecológica»: foi o
título da mensagem que o Pontifício
conselho para o diálogo inter-religioso
enviou aos budistas pela festa do Vesakh, durante a qual se comemoram
os principais eventos da vida de Buda. A festa do Vesakh/Hanamatsuri
de 2016, nos vários países de cultura
budista, é celebrada em datas diversas, segundo as diferentes tradições.
Este ano é comemorada nalguns países a 14 de maio e noutros nos dias
20 e 21 de maio.
Queridos amigos budistas!
Em nome do Pontifício Conselho
para o Diálogo Inter-Religioso desejamos mais uma vez apresentar as
nossas felicitações mais cordiais
por ocasião do Vesakh, enquanto
comemorais três eventos significativos da vida de Gautama Buda: o
nascimento, a iluminação e a morte. Desejamos-vos paz, tranquilidade e alegria nos vossos corações,
nas vossas famílias e nos vossos
países.
Este ano escrevemos, inspirandonos na Carta Encíclica de Sua Santidade o Papa Francisco Laudato
si’, sobre o cuidado da casa comum,
na qual ele observa que: «Se “os
desertos exteriores se multiplicam
no mundo, porque os desertos interiores se tornaram tão amplos” a
crise ecológica é um apelo a uma
profunda conversão interior» (n.
217). E afirma: «A educação será
ineficaz e os seus esforços estéreis,
se não se preocupar também por
difundir um novo modelo relativo
ao ser humano, à vida, à sociedade
e à relação com a natureza» (n.
215). «A doação de si mesmo num
compromisso ecológico só é possível a partir do cultivo de virtudes
sólidas» (n. 211). Em resposta, o
Papa Francisco propõe: «São vários os âmbitos educativos: a escola, a família, os meios de comuniCONTINUA NA PÁGINA 15
L’OSSERVATORE ROMANO
número 19, quinta-feira 12 de maio de 2016
INFORMAÇÕES
Audiências
O Papa Francisco recebeu em audiências particulares:
A 6 de maio
Suas Ex.cias os Senhores Martin
Schulz, Presidente do Parlamento
Europeu; Donald Tusk, Presidente
do Conselho Europeu; e Jean Claude Juncker, Presidente da Comissão
Europeia; e a Senhora Angela Merkel, Chanceler da República Federal
da Alemanha.
A 7 de maio
Sua Ex.cia o Senhor Johann Schneider-Ammann, Presidente da Confederação Helvética, com o Séquito.
O Senhor Cardeal Marc Ouellet,
Prefeito da Congregação para os
Bispos.
A 9 de maio
O Senhor Cardeal George Pell, Prefeito da Secretaria para a Economia;
D. Gabriele Giordano Caccia, Núncio Apostólico no Líbano; D. Silvano Maria Tomasi, Núncio Apostólico; e o Senhor Cardeal Angelo Amato, S.D.B., Prefeito da Congregação
para as Causas dos Santos.
Renúncias
O Santo Padre aceitou a renúncia:
No dia 7 de maio
De D. John Kudrick, ao governo
pastoral da Eparquia de Parma dos
Rutenos (EUA), em conformidade
com o cânone 210 § 1 do Código
dos Cânones das Igrejas Orientais.
De D. Gerald Nicholas Dino, ao governo pastoral da Eparquia de Holy
Mary of Protection de Phoenix dos
Rutenos (EUA), em conformidade
com o cânone 210 § 1 do Código
dos Cânones das Igrejas Orientais.
De D. Sarhad Yawsip Jammo, ao
governo pastoral da Eparquia de
Saint Peter the Apostle of San Diego dos Caldeus (EUA), em conformidade com o cânone 210 § 1 do Código dos Cânones das Igrejas Orientais.
De D. Dominique Nguyên Chu Trinh, ao governo pastoral da Diocese
de Xuân Lôc (Vietname), em conformidade com o cânone 401 § 1 do
Código de Direito Canónico.
De D. Antoni Długosz, ao cargo de
Auxiliar da Arquidiocese de Częstochowa (Polónia), em conformidade
com os cânones 411 e 401 § 1 do Código de Direito Canónico.
De D. John Hine, ao cargo de Auxiliar da Arquidiocese de Southwark
(Grã-Bretanha), em conformidade
com os cânones 411 e 401 § 1 do Código de Direito Canónico.
Nomeações
O Sumo Pontífice nomeou:
A 5 de maio
Bispo de Parramatta (Austrália), D.
Vincent
Long
Van
Nguyen,
O.F.M.Conv., até esta data Auxiliar de
Melbourne.
A 7 de maio
Enviado Especial à celebração do
25º aniversário de ereção da Arquidiocese de Minsk-Mohilev (BieloRússia), que terá lugar em Budslau
a 1 e 2 de julho, o Senhor Cardeal
Christoph Schönborn, O.P., Arcebispo de Viena (Áustria).
Bispo da Diocese de Xuân Lôc
(Vietname), D. Joseph Đinh Đú’c
Đao, até esta data Coadjutor da
mesma Sede.
Bispo da Eparquia de Holy Mary of
Protection de Phoenix dos Rutenos
(EUA), D. John Stephen Pažak,
C.SS.R., até agora Bispo da Eparquia
de Saints Cyril and Methodius of
Toronto dos Eslovacos de rito bizantino (Canadá).
Bispo de San José del Guaviare
(Colômbia), o Rev.do Pe. Nelson Jair
Cardona Ramírez, do clero da Diocese de La Dorada — Guaduas, até
esta data Pároco da Paróquia «Santísima Trinidad» em Puerto Salgar e
Delegado diocesano para os ministros ordenados.
D. Nelson Jair Cardona Ramírez
nasceu no dia 18 de janeiro de 1969,
em Norcasia (Colômbia). Foi ordenado
Sacerdote a 12 de dezembro de 1992.
Administrador Apostólico sede vacante da Eparquia de Parma dos Rutenos (EUA), D. William Charles
Skurla, atualmente Arcebispo Metropolitano de Pittsburgh dos Bizantinos (EUA).
Administrador Apostólico sede vacante da Eparquia de Saints Cyril
and Methodius of Toronto dos Eslovacos de rito bizantino (Canadá), D.
John Stephen Pažak, C.SS.R., atualmente Bispo da Eparquia de Holy
Mary of Protection de Phoenix dos
Rutenos (EUA).
Administrador Apostólico sede vacante da Eparquia de Saint Peter the
Apostle of San Diego dos Caldeus
(EUA), D. Shlemon Warduni, atualmente Auxiliar de Baghdad dos Caldeus (Iraque).
Auxiliar de Koszalin-Kołobrzeg (Polónia), o Rev.mo Mons. Krzysztof
Stefan Włodarczyk, até esta data Diretor do Departamento Pastoral Diocesano, simultaneamente eleito Bispo Titular de Surista.
D. Krzysztof Stefan Włodarczyk
nasceu no dia 25 de fevereiro de 1961,
em Sławno (Polónia). Recebeu a Ordenação sacerdotal a 21 de junho de
1987.
A 11 de maio
cação, a catequese, e outros» (n.
213).
Caros amigos budistas, também
vós manifestais preocupação pela
degradação ambiental, como atestam os documentos The Time to
Act is Now: A Buddhist Declaration on Climate Change e Buddhist
Climate Change Statement to World
Leaders. Ambos evidenciam a reflexão comum e partilhada de
que no centro da crise ecológica
com efeito é uma crise do eu, expressa pela avidez, pela ansiedade, pela arrogância e pela ignorância do ser humano. Por conseguinte, os nossos estilos de vida e
as nossas expectativas devem mudar para derrotar o deterioramento do que nos circunda. «Cultivando um olhar interior e a compaixão, seremos capazes de agir
por amor, não por medo, para
proteger
o
nosso
planeta»
(Buddhist Climate Change Statement to World Leaders). Além disso, «quando a Terra adoece, também nós adoecemos pois somos
parte dela» (The time to Act is
Now).
Dado que a crise das mudanças
climáticas se deve também à atividade humana, nós, cristãos e budistas, devemos trabalhar juntos
para tratar o tema de uma espiritualidade ecológica. O agrava-
gia na Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, em Belo Horizonte. Recebeu a Ordenação sacerdotal a
14 de agosto de 1999 e foi incardinado
na Diocese de Divinópolis, onde desempenhou os seguintes cargos: Vigário Paroquial e Pároco em diversas paróquias, Reitor do Seminário de Teologia,
Coordenador diocesano da Pastoral vocacional e da Pastoral familiar; e Reitor do Seminário Propedêutico, em Pará de Minas.
Prelados falecidos
Adormeceram no Senhor:
No dia 30 de abril
D. Alphonsus Flavian D’Souza, S.I.,
Bispo de Raiganj (Índia).
O saudoso Prelado nasceu no dia 4
de julho de 1939, em Mangalore (Índia). Recebeu a Ordenação sacerdotal
a 13 de julho de 1971. Foi ordenado
Bispo em 17 de maio de 1987.
No dia 2 de maio
D. Myles McKeon, Bispo Emérito
de Bunbury (Austrália).
Auxiliar da Arquidiocese de Goiânia
(Brasil), o Rev.do Pe. Moacir Silva
Arantes, do clero da Diocese de Divinópolis, até esta data Administrador Paroquial da Paróquia de Nossa
Senhora da Piedade, em Pará de Minas, simultaneamente eleito Bispo
Titular de Tituli in Numidia.
O venerando Prelado nasceu em
Westport (Irlanda), a 3 de abril de
1919. Foi ordenado Sacerdote no dia
22 de junho de 1947. Recebeu a Ordenação episcopal em 12 de setembro de
1962.
D. Moacir Silva Arantes nasceu no
dia 3 de junho de 1969 em Itapecirica,
no Estado de Minas Gerais. Completou os estudos de Filosofia e de Teolo-
D. Tadeusz Gocłowski, Arcebispo
Emérito de Gdańsk (Polónia).
Mensagem aos budistas
na festa do Vesakh
CONTINUAÇÃO DA PÁGINA 14
página 15
mento dos problemas ambientais
globais aumentou a urgência da
cooperação inter-religiosa. A educação para a responsabilidade pelo meio ambiente e pela criação
de uma «cidadania ecológica» requer uma ética ecológica virtuosa
que respeite e cuide da natureza.
É uma necessidade impelente que
os seguidores de todas as religiões
atravessem os próprios confins e
se unam para construir uma ordem social responsavelmente ecológica baseada em valores partilhados. Nos países onde budistas
e cristãos vivem e trabalham uns
ao lado dos outros, podemos promover a saúde e a sustentabilidade do planeta através de programas educativos comuns dirigidos
a desenvolver a consciência ecológica com iniciativas conjuntas.
Queridos amigos budistas, podemos colaborar juntos para libertar a humanidade dos sofrimentos causados pelas mudanças
climáticas, e contribuir para o
cuidado da nossa casa comum.
Neste espírito, mais uma vez fazemos votos por uma pacífica e jubilosa festa do Vesakh.
Cardeal JEAN-LOUIS TAURAN
Presidente
D. MIGUEL ÁNGEL AYUSO
GUIXOT, MCCJ
Secretário
No dia 3 de maio
O ilustre Prelado nasceu a 16 de setembro de 1931 em Piski (Polónia).
Recebeu a Ordenação sacerdotal no dia
26 de junho de 1956. Foi ordenado
Bispo em 17 de abril de 1983.
No dia 5 de maio
D. Benito Cocchi, Arcebispo Emérito de Modena-Nonantola (Itália).
O saudoso Prelado nasceu em Minerbio (Itália), a 5 de novembro de
1934. Foi ordenado Sacerdote no dia
14 de março de 1959. Recebeu a Ordenação episcopal em 6 de janeiro de
1975.
D. Gabriel Thohey Mahn-Gaby, Arcebispo Emérito de Yangon (Myanmar).
O venerando Prelado nasceu no dia
19 de setembro de 1927, em Kanazogon
(Myanmar). Recebeu a Ordenação sacerdotal a 21 de dezembro de 1951. Foi
ordenado Bispo em 2 de fevereiro de
1965.
No dia 7 de maio
D. Gonzalo López Marañón, ex-Vigário Apostólico de San Miguel de
Sucumbíos (Equador).
O saudoso Prelado nasceu em Medina del Pomar (Espanha), a 3 de outubro de 1933. Foi ordenado Sacerdote
no dia 6 de abril de 1957. Recebeu a
Ordenação episcopal em 8 de dezembro
de 1984.
Início de Missão
de Núncio Apostólico
D. Paolo Rocco Gualtieri, Arcebispo
Titular de Sagona, na República das
Seychelles (8 de março).
L’OSSERVATORE ROMANO
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quinta-feira 12 de maio de 2016, número 19
Na audiência geral o Papa Francisco comentou a parábola do pai misericordioso
Lógica do abraço
E desejou ao Brasil que encontre a harmonia e a paz através do diálogo
A parábola do pai misericordioso levou
o Papa a pensar «nas mães e nos pais
em apreensão quando veem os filhos
afastar-se enveredando por caminhos
perigosos» e «em quantos estão na
prisão e têm a impressão de que a sua
vida acabou». Disse ele mesmo na
audiência geral de quarta-feira 11 de
maio, na praça de São Pedro.
Bom dia, amados irmãos e irmãs!
Hoje esta audiência realiza-se em
dois lugares: dado que havia previsão de chuva, os doentes estão na
sala Paulo VI, em contacto connosco
através de uma grande tela; dois lugares mas uma só audiência. Saudemos os doentes que se encontram na
sala Paulo VI! Hoje queremos meditar sobre a parábola do Pai misericordioso. Ela fala de um pai e dos
seus dois filhos, e leva-nos a conhecer a misericórdia infinita de Deus.
Comecemos pelo fim, ou seja, pela alegria do coração do Pai, que
diz: «Façamos uma festa. Este meu
filho estava morto e reviveu; estava
perdido e foi encontrado» (vv. 2324). Com estas palavras o pai interrompeu o filho mais jovem no momento em que confessa a sua culpa:
«Já não sou digno de ser chamado
teu filho...» (v. 19). Mas esta expressão é insuportável para o coração do
pai, que ao contrário se apressa a
devolver ao filho os sinais da sua
dignidade: a roupa bonita, o anel, o
calçado. Jesus não descreve um pai
ofendido e ressentido, um pai que
por exemplo diz ao filho: «Vais pagar»: não, o pai abraça-o, espera por
ele com amor. Ao contrário, a única
coisa que o pai quer é que o filho
esteja diante dele, são e salvo, é o
que o torna feliz, e por isso faz festa. A receção do filho que volta é
descrita de modo comovedor: «Ainda estava longe, quando o seu pai o
viu e, movido de compaixão, correu
ao seu encontro, lançou-se ao seu
pescoço e beijou-o» (v. 20). Quanta
ternura; viu-o de longe: o que significa isto? Que o pai subia continuamente ao terraço para perscrutar a
estrada a ver se o filho voltava;
aquele filho que tinha feito de tudo,
mas o pai esperava-o. Como é bonita a ternura do Pai! A misericórdia
do pai é transbordante, incondicional e manifesta-se ainda antes que o
filho fale. Sem dúvida, o filho sabe
que errou e reconhece-o: «Pequei...
Trata-me como a um dos teus servos» (v. 19). Mas estas palavras dissolvem-se diante do perdão do pai.
O abraço e o beijo do seu pai levam-no a entender que foi sempre
consideriado filho, não obstante tudo. Este ensinamento de Jesus é importante: a nossa condição de filhos
de Deus é fruto do amor do coração
do Pai; não depende dos nossos méritos, nem dos nossos gestos, e portanto ninguém no-la pode tirar, nem
sequer o diabo! Ninguém nos pode
privar desta dignidade.
Esta palavra de Jesus anima-nos a
nunca desesperar. Penso nas mães e
nos pais em apreensão quando veem
os filhos afastar-se seguindo por caminhos perigosos. Penso nos páro-
cos e catequistas que às vezes se interrogam se o seu trabalho foi em
vão. Mas penso também em quantos
estão na prisão e têm a impressão de
que a sua vida acabou; naqueles que
fizeram escolhas erradas e não conseguem olhar para o futuro; em todos os que têm fome de misericórdia
e perdão, e julgam que não o merecem... Em qualquer situação da vida,
não devo esquecer que nunca deixarei de ser filho de Deus, filho de um
Pai que me ama e espera a minha
volta. Até na pior situação da vida,
Deus espera-me, Deus quer abraçarme, Deus aguarda-me.
Na parábola há outro filho, o
mais velho; também ele tem necessidade de descobrir a misericórdia do
pai. Ele permaneceu sempre em casa, mas é muito diverso do pai! As
suas palavras carecem de ternura:
«Há muitos anos que te sirvo, sem
jamais transgredir ordem alguma... E
agora que voltou este teu filho» (vv.
29-30). Vemos o desprezo: nunca diz
«pai», nunca diz «irmão», só pensa
em si mesmo, gaba-se de ter permanecido sempre ao lado do pai e de o
ter servido; e no entanto nunca viveu esta proximidade com alegria. E
agora acusa o pai porque nunca lhe
deu um cabrito para fazer festa. Coitado do pai! Um filho foi embora e
o outro nunca permaneceu realmen-
Ao chefe dos Bektashi
No sinal
da fraternidade
Foi um encontro no sinal da
fraternidade e do diálogo, que
teve lugar antes da audiência
geral de 11 de maio, no estúdio
da sala Paulo VI, onde Francisco recebeu Sua Graça (Haxhi)
Baba Edmond Brahimaj, chefe
mundial da comunidade dos
Bektashi, uma confraria muçulmana de derivação sufi, fundada no século XVIII na Turquia
e que se propagou sobretudo
na Albânia. O líder bektashi,
acompanhado pelo cardeal
Jean-Louis Tauran, presidente
do Pontifício conselho para o
diálogo inter-religioso, já se tinha encontrado com o Papa
em setembro de 2014, por ocasião da viagem pontifícia a Tirana.
te próximo dele! O sofrimento do
pai é como o do Deus, o de Jesus
quando nos afastamos ou porque vamos embora ou porque estamos perto mas sem o estar deveras.
Também o filho mais velho precisa de misericórdia. Inclusive os justos, aqueles que se julgam justos,
têm necessidade de misericórdia. Este filho representa cada um de nós,
quando nos perguntamos se vale a
pena labutar tanto, se depois nada
recebemos em troca. Jesus recordanos que não permanecemos na casa
do Pai para receber uma recompensa, mas porque temos a dignidade
de filhos corresponsáveis. Não se
trata de «negociar» com Deus, mas
de seguir Jesus que se entregou incondicionalmente na cruz.
«Filho, tu estás sempre comigo, e
tudo o que é meu é teu. Convinha,
porém, fazer festa...» (vv. 31-32). Assim diz o Pai ao filho mais velho. A
sua lógica é a da misericórdia! O filho mais jovem pensava que merecia
um castigo por causa dos seus pecados, e o filho mais velho esperava
uma recompensa pelos seus serviços.
Os dois irmãos não falam entre si,
vivem histórias diferentes, mas ambos raciocinam segundo uma lógica
alheia a Jesus: se fizeres o bem, receberás uma recompensa, se fizerem o
mal serás punido; esta não é a lógica
de Jesus, não! Esta lógica é invertida
pelas palavras do pai: «Convinha,
porém, fazer festa, pois este teu irmão estava morto e reviveu; estava
perdido e foi encontrado» (v. 31). O
pai recuperou o filho perdido e agora pode inclusive restituí-lo ao seu
irmão! Sem o filho mais jovem, também o filho mais velho deixa de ser
um «irmão». A maior alegria para o
pai é ver que os seus filhos se reconheçam irmãos.
Os filhos podem decidir se querrem unir-se à alegria do pai ou rejeitá-la. Devem interrogar-se sobre os
próprios desejos e sobre a sua visão
da vida. A parábola termina deixando o final suspenso: não sabemos o
que o filho mais velho decidiu fazer.
E isto é um estímulo para nós. Este
Evangelho ensina-nos que todos temos necessidade de entrar na casa
do Pai e participar da sua alegria, na
festa da misericórdia e da fraternidade. Irmãos e irmãs, abramos o nosso
coração para sermos «misericordiosos como o Pai»!
O Brasil «nestes momentos de
dificuldade, siga por estradas de
harmonia e de paz, com a ajuda da
oração e do diálogo». Foram os votos
do Papa no final da audiência.
Saúdo cordialmente todos os peregrinos de língua portuguesa, de modo particular aos fiéis brasileiros de
Araxá.
Ao saudar vocês, queridos peregrinos brasileiros, o meu pensamento
vai à sua amada Nação. Nestes dias
em que nos preparamos para a festa
de Pentecostes, peço ao Senhor que
derrame abundantemente os dons
do seu Espírito, para que o País,
nestes momentos de dificuldade, si-
Charlie Mackesy, «O filho pródigo»
ga por estradas de harmonia e de
paz, com a ajuda da oração e do
diálogo. Possa a proximidade de
Nossa Senhora Aparecida, que como
uma boa Mãe nunca abandona os
seus filhos, ser defesa e guia no caminho.
Dirijo um pensamento especial
aos jovens, aos doentes e aos recémcasados. No próximo domingo celebraremos o Pentecostes. Caros jovens, desejo que cada um de vós reconheça, entre as múltiplas vozes do
mundo, a do Espírito Santo, que
continua a falar ao coração de quem
sabe pôr-se à escuta. Amados doentes, confiai-vos ao Espírito que não
vos fará faltar a luz consoladora da
sua presença. E a vós, prezados recém-casados, desejo que sejais no
mundo transparência do amor de
Deus com a fidelidade do vosso
amor e a união da vossa fé.
Olimpíadas no Rio
Na audiência estava presente,
entre outros, uma delegação de
atletas paraolímpicos que se
preparam para os próximos
Jogos. No Rio de Janeiro, pela
primeira vez, a sede geral de uma
seleção olímpica será numa
paróquia. A iniciativa foi tomada
por Luca Pancalli, presidente da
comissão paraolímpica italiana,
com o cardeal Tempesta,
arcebispo do Rio, e com a
colaboração do cardeal Ravasi,
presidente do Pontifício conselho
para a cultura. «Não hotéis nem
círculos desportivos — explica
Pancalli — mas a paróquia da
Imaculada Conceição, porque
queremos compartilhar com a
comunidade os valores de
integração e inclusão social que
representam a verdadeira essência
do nosso movimento». Em vista
dos Jogos, os atletas
paraolímpicos italianos
comprometer-se-ão na construção
de uma estrutura desportiva para
portadores de deficiência na
paróquia de São Geraldo, «uma
das favelas mais pobres»,
explicou o padre Leandro Lenin,
responsável pela pastoral
desportiva da arquidiocese.

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