Uso da Capecitabina para câncer de mama metastático

Transcrição

Uso da Capecitabina para câncer de mama metastático
Uso da Capecitabina para
câncer de mama metastático
Brasília – DF
Junho/2008
MINISTÉRIO DA SAÚDE
Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos
Departamento de Ciência e Tecnologia
Parecer Técnico-Científico:
Uso da Capecitabina para o câncer de mama
metastático
Brasília – DF
Junho/2008
2008 Ministério da Saúde.
É permitida a reprodução parcial ou total desta obra, desde que citada a fonte e que
não seja para venda ou qualquer fim comercial.
A responsabilidade pelos direitos autorais de textos e imagens desta obra é da área
técnica.
Este estudo foi financiado pelo Departamento de Ciência e Tecnologia (DECIT/MS) e
não expressa decisão formal do Ministério da Saúde para fins de incorporação no
Sistema Único de Saúde (SUS).
Informações:
MINISTÉRIO DA SAÚDE
Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos
Departamento de Ciência e Tecnologia
Esplanada dos Ministérios, Bloco G, Edifício Sede, 8° andar, sala 852
CEP: 70058-900, Brasília – DF
Tel.: (61) 3315-3633
E-mail: [email protected]
[email protected]
Home Page: http://www.saude.gov.br/rebrats
Elaboração:
Revisão Técnica:
Mário Henrique Osanai
(CGATS/DECIT/SCTIE/MS)
Luiz Henrique Picolo Furlan
(CGATS/DECIT/SCTIE/MS)
Fernanda de Oliveira Laranjeira
(CGATS/DECIT/SCTIE/MS)
Flávia Tavares Silva Elias
(CGATS/DECIT/SCTIE/MS)
Declaração de Potenciais Conflitos de Interesse
Nenhum dos autores recebe qualquer patrocínio da indústria ou participa de qualquer
entidade de especialidade ou de pacientes que possa ser incluído como conflito.
iii
RESUMO
O câncer de mama metastático é uma doença grave, com mau prognóstico e baixo
índice de sobrevida, além de ser causa importante de mortalidade e comprometer
significativamente a qualidade de vida dos doentes. A substância citotóxica 5fluoruracil (5-FU), de uso intravenoso, já faz parte do arsenal terapêutico de esquemas
consagrados no tratamento dessa doença. A capecitabina é um agente citotóxico
(carbamato de fluoropirimidina) precursor do 5-fluorouracil (5-FU). É administrada por
via oral e é convertida, através de várias etapas enzimáticas, para possibilitar a liberação
intratumoral de 5-FU. A enzima envolvida na conversão final para 5-FU, timidina
fosforilase, é encontrada em maiores níveis em alguns tumores do que no tecido normal,
em tese, reduzindo a exposição sistêmica ao 5-FU. Para avaliar a eficácia e a segurança
do uso da capecitabina no câncer de mama metastático, foi realizada busca por
evidências científicas nas bases PubMed/Medline, OVID, Science Direct, Biblioteca
Cochrane, Sociedades de Especialidades, jornais especializados em oncologia e
referências cruzadas dos artigos localizados. Para a avaliação da eficácia e segurança da
capecitabina no tratamento do câncer de mama metastático, foram localizados onze
estudos: uma revisão sistemática (Nível de evidência 1A), uma avaliação de tecnologia
baseada em uma revisão sistemática, um estudo fase III randomizado aberto (Nível de
evidência 2B), um estudo randomizado (Nível de evidência 3), quatro estudos fase II
não randomizados e não controlados (Nível de evidência 4) e três estudos de coortes
retrospectivas (Nível de evidência 4). Outros estudos relatando efeitos adversos e
toxicidades foram utilizados para complementar a análise de segurança. Até o momento,
as melhores evidências disponíveis são insuficientes para afirmar que a capecitabina
seja eficaz no tratamento do câncer de mama metastático, tanto em monoterapia, quanto
em uso combinado. As raras mortes relacionadas ao tratamento, sugerem que a droga
seja segura. No entanto, a prevalência de efeitos adversos graves e toxicidades graus 3 e
4 observadas nos estudos justificam aguardar o desenvolvimento de estudos com um
maior número de pacientes e mais tempo de seguimento para que se esclareça o perfil
de segurança da droga.
iv
SUMÁRIO
Contexto ..................................................................................................................... 6
Questão clínica ............................................................................................................... 7
Introdução e aspectos epidemiológicos .........................................................................8
Descrição do medicamento avaliado............................................................................. 9
Descrição das terapias em uso......................................................................................11
Estratégia de busca para síntese de evidências científicas.........................................13
Análise sobre a eficácia da capecitabina no câncer de mama metastático...............14
Recomendação sobre a eficácia................................................................................... 18
Análise sobre a segurança do uso da capecitabina no câncer metastático de......... 19
mama
Recomendação sobre a segurança do uso....................................................................23
Conclusões finais .......................................................................................................... 24
Referências bibliográficas ............................................................................................25
v
CONTEXTO
Este Parecer Técnico-Científico (PTC) foi elaborado pela Área de Avaliação de
Tecnologias em Saúde do DECIT/SCTIE/MS para avaliar as evidências científicas
disponíveis atualmente acerca da eficácia e segurança da tecnologia em questão,
visando ao bem comum e à eficiência do Sistema Único de Saúde (SUS).
Este PTC tem a finalidade de subsidiar a tomada de decisão do Ministério da
Saúde e dos demais gestores do SUS, e não expressa a decisão formal do Ministério da
Saúde para fins de incorporação.
6
QUESTÃO CLÍNICA:
População de interesse: Indivíduos portadores de câncer de mama metastático
Intervenção (tecnologia): Capecitabina
Comparação: Tratamentos já consagrados ou Placebo
Parâmetros: Eficácia e segurança
Desfechos (resultados em saúde): Respostas parciais ou completas, sobrevida
global, efeitos adversos, toxicidade.
A capecitabina é segura e eficaz no tratamento do câncer de mama metastático?
7
INTRODUÇÃO E ASPECTOS EPIDEMIOLÓGICOS:
Câncer de mama metastático
O número de casos novos de câncer de mama esperados para o Brasil em 2008 é
de 49.400, com um risco estimado de 51 casos a cada 100 mil mulheres1.
Na região Sudeste, o câncer de mama é o mais incidente entre as mulheres com
um risco estimado de 68 casos novos por 100 mil. Sem considerar os tumores de pele
não melanoma, este tipo de câncer também é o mais freqüente nas mulheres das regiões
Sul (67/100.000), Centro-Oeste (38/100.000) e Nordeste (28/100.000). Na região Norte
é o segundo tumor mais incidente (16/100.000)1.
No Brasil, o câncer de mama é o que mais mata entre as mulheres2.
Apesar de ser considerado um câncer de relativamente bom prognóstico, se
diagnosticado e tratado oportunamente, as taxas de mortalidade por câncer de mama
continuam elevadas no Brasil, muito provavelmente porque a doença ainda é
diagnosticada em estádios avançados. Na população mundial, a sobrevida média após
cinco anos é de 61%1.
O tratamento para o câncer de mama metastático visa o manejo dos sintomas e o
aumento de sobrevida com qualidade de vida. A ressecção cirúrgica pode ser
considerada em uma base paliativa, quando possível. A cura, geralmente, não é possível
com os regimes terapêuticos atuais e, apesar de a escolha do tratamento ser
frequentemente determinada pelo que o indivíduo recebeu anteriormente, muitas vezes é
apropriado selecionar a terapêutica com base no perfil de efeitos adversos3.
Pacientes com câncer metastático da mama constituem uma população
heterogênea; desta forma, os objetivos do tratamento variam desde a paliação dos
sintomas e minimização da toxicidade em mulheres idosas com doença indolente, até o
aumento da sobrevida em mulheres jovens, com bom estado geral, doença visceral
agressiva e superexpressão de Her-24.
A terapia sistêmica de primeira linha para o câncer de mama metastático, em
indivíduos com tumores negativos para receptor estrogênico, é a quimioterapia
(geralmente um regime contendo antraciclina, ou uma combinação de ciclofosfamida,
metotrexato e fluorouracil) e terapia de manipulação hormonal para os indivíduos com
receptor estrogênico positivo3.
8
A quimioterapia é também geralmente preferida para a doença agressiva,
particularmente quando há metástase para locais viscerais críticos, ou quando o
intervalo desde o tratamento prévio para doença em estágio inicial é curto3,4.
DESCRIÇÃO DO MEDICAMENTO AVALIADO:
Capecitabina
A capecitabina é um agente citotóxico, derivado do carbamato de
fluoropirimidina, tumor-ativado e tumor-seletivo, que foi planejado para administração
oral. A capecitabina é atóxica in vitro, porém, in vivo, a mesma é seqüencialmente
convertida para a fração citotóxica 5-fluorouracil (5-FU) que, por sua vez, é
metabolizada adicionalmente. A formação de 5-FU é catalizada preferencialmente no
tumor por um fator angiogênico associado ao tumor, denominado timidina fosforilase
(ThyPase), minimizando assim a exposição dos tecidos sadios do organismo ao 5-FU
sistêmico. A biotransformação enzimática seqüencial da capecitabina para 5-FU leva a
maiores concentrações dentro dos tecidos do tumor. A relação entre a concentração de
5-FU no tumor e no plasma foi de 21,4 (variação de 3,9 a 59,9), enquanto a relação
entre os tecidos saudáveis e o plasma foi de 8,9 (variação de 3,0 a 25,8)5,6.
Outras pesquisas demonstraram que diversos tumores humanos, como câncer de
mama, gástrico, colorretal, câncer de colo de útero e ovariano, apresentam nível
aumentado de timidina fosforilase (capaz de converter 5'-DFUR [5'-deoxi-5fluorouridina] em 5-FU) do que os tecidos normais correspondentes5,6.
Ambas as células normais e tumorais metabolizam o 5-FU para monofosfato de
5-fluoro-2-desoxiuridina (FdUMP) e trifosfato de 5-fluorouridina (FUTP). Estes
metabólitos causam dano à célula através de dois mecanismos diferentes. Inicialmente,
FdUMP e o cofator folato N5-10-metileno-tetrahidrofolato ligam-se à timidilato
sintetase (TS) para formar um complexo ternário covalente. Esta ligação inibe a
formação de timidilato a partir do uracil. O timidilato é o precursor necessário do
trifosfato de timidina, que por sua vez, é essencial para a síntese de DNA, de forma que
uma deficiência deste composto possa inibir a divisão celular. Em segundo lugar, as
enzimas nucleares de transcrição podem incorporar FUTP erroneamente, no lugar do
trifosfato de uridina (UTP) durante a síntese de RNA. Esse erro metabólico pode
interferir com o processamento do RNA e com a síntese protéica5,6.
9
Posologia: A dose recomendada para monoterapia de capecitabina é 1250mg/m2
administradas 2 vezes ao dia (pela manhã e à tarde; equivalente a 2500mg/m2 de dose
total diária) por 14 dias, seguidos de sete dias de descanso. Os comprimidos de
capecitabina devem ser ingeridos com água, 30 minutos após a refeição 5,6.
Em combinação com docetaxel, a dose recomendada de capecitabina é de
1250mg/m2 administradas 2 vezes ao dia (pela manhã e à tarde; equivalente a
2500mg/m2 de dose total diária) por 14 dias, seguidos de sete dias de descanso
associada ao docetaxel 75mg/m2 em infusão endovenosa durante 1 hora, a cada 3
semanas. A pré-medicação, de acordo com a bula de docetaxel, deve ser iniciada antes
da administração de docetaxel para os pacientes que o estiverem recebendo em
combinação com capecitabina5,6.
Preço: O preço por comprimido de 500mg é R$19,10 e o preço por comprimido
de 150mg é R$5,99 (preço máximo de venda ao consumidor)7. Esses valores são
estimados para o Distrito Federal, com base em consulta à página eletrônica do
Consulta Remédios7 (Caixa com 120 comprimidos de 500mg: R$2.292,07 e caixa com
60 comprimidos de 150 mg: R$359,55).
A cotação de preço no Banco de Preços do Ministério da Saúde8 para o
comprimido de 500mg varia entre R$10,11 e R$13,47, conforme tabela a seguir:
Instituições
Data
Secretaria de Saude de Estado do
Rio Grande do Sul / RS - BRA
Secretaria de Saúde de Estado de
Minas Gerais / MG - BRA
HSE- Hosp.Servidores do Estado /
RJ - BRA
Hospital Municipal Dr Mario
Gatti - HMMG / SP - BRA
Per. Quantidade Preço Unit.
% Comp
Nome
Comercial
19/12/2007
6
360
10,1100 48.042,86
Xeloda
05/09/2007
12
1.680
10,1500 48.233,33
Xeloda®
04/10/2007
10
1.000
13,3400 63.423,81
Capecitabina
12/05/2008
12
3.600
13,4700 64.042,86
Roche
Registro ANVISA9 : número 101000549 . Princípio ativo: Capecitabina. Nome
Comercial: Xeloda®. Empresa: Produtos Roche Químicos e Farmacêuticos S.A.
(Processo 25000.002251/98-73 ; Vencimento 12/2008).
Apresentações:
150mg
com
60
comprimidos
revestidos:
Registro:
10100.0549/001-7, Local de Fabricação: Hoffmann - La Roche Inc., Nutley EUA –
Estados Unidos; 500mg com 120 comprimidos revestidos: Registro: 10100.0549/002-5;
10
150mg com 10 comprimidos revestidos: Registro: 10100.0549/003-3; 500mg com 10
comprimidos revestidos: Registro: 10100.0549/004-1.
Indicações constantes na bula5,6: Xeloda® (capecitabina) em combinação com
docetaxel está indicado para o tratamento de pacientes com câncer de mama localmente
avançado ou metastático, após falha da quimioterapia citotóxica. Esta quimioterapia
prévia deve ter incluído uma antraciclina.
Xeloda® (capecitabina) está indicado como monoterapia, para o tratamento de
pacientes com câncer de mama metastático ou localmente avançado após o insucesso de
um taxane e de um regime de quimioterapia contendo antraciclina ou para aqueles em
que a terapia adicional com antraciclina não está indicada.
Xeloda® (capecitabina) também está indicado como tratamento de primeira
linha para pacientes com carcinoma colorretal metastático.
DESCRIÇÃO DAS TERAPIAS EM USO:
A escolha do tratamento de primeira linha para o câncer de mama metastático, se
hormonioterapia ou quimioterapia, é fundamentada em diversos fatores clínicos. A
escolha de uma droga ou regime específico é baseada em quais drogas já foram
administradas como tratamento adjuvante, junto com a probabilidade de benefícios
balanceada contra os efeitos adversos e perfil de tolerabilidade de determinada droga.
Existem evidências que sugerem que a poliquimioterapia diminui a mortalidade
comparada com agentes únicos, mas não parece haver evidências de que um regime
particular seja mais efetivo que outro. Os regimes de quimioterapia de primeira linha
disponíveis para o câncer de mama metastático incluem o CMF (ciclofosfamida,
metotrexato e 5-fluorouracil) e regimes contendo antraciclinas. Um intervalo curto livre
de doença (menor que um ano) entre a cirurgia para câncer em estádio inicial e o
desenvolvimento de metástases sugere que a doença recorrente seja resistente à droga
utilizada no tratamento adjuvante.
Quase todas as pacientes que recebem quimioterapia de primeira linha para sua
progressão metastática irão recair ou progredir e necessitar de tratamentos subsequentes.
Para estas pacientes necessitando de terapias de segunda linha, a duração da resposta e a
sobrevida são menores do que na quimioterapia inicial. Os objetivos do tratamento são a
manutenção de uma boa qualidade de vida e o aumento da sobrevida. Os taxanos
11
(paclitaxel e docetaxel) apresentam uso crescente, tanto sozinhos quanto em
combinação com outros agentes, em primeira e segunda linha de tratamento 3.
12
ESTRATÉGIA DE BUSCA PARA SÍNTESE DE EVIDÊNCIAS CIENTÍFICAS:
Para a localização de evidências científicas sobre o uso da capecitabina no
câncer de mama metastático, foi realizada busca na base PubMed, utilizando como
estratégia de busca as expressões: "capecitabine "[Substance Name] AND "Breast
Neoplasms"[Mesh], e obtendo 301 resultados. A leitura dos títulos e dos abstracts,
quando disponíveis, resultou na seleção de 27 artigos aplicáveis ao tema do parecer
técnico-cientifico. Para obtenção dos textos completos, foram realizadas buscas nas
bases OVID, ScienceDirect, em arquivos de revistas de oncologia, como Journal of
Clinical Oncology e Annals of Oncology.
Foram pesquisadas, ainda, as páginas eletrônicas das agências de avaliação de
tecnologias, como INAHTA (International Network of Agencies for Health Technology
Assessment), CRD (Centre for Reviews and Dissemination) e NICE (National Institute
for Health and Clinical Excellence).
Além das referências obtidas nas buscas, foram avaliadas as referências cruzadas
localizadas nos artigos selecionados. A busca no Google também foi utilizada como
auxiliar para a obtenção de textos completos.
Para a avaliação da eficácia e segurança da capecitabina no tratamento do câncer
de mama metastático, foi selecionada uma revisão sistemática3 (Nível de evidência 1A),
uma avaliação de tecnologia baseada em uma revisão sistemática10, um estudo fase III,
randomizado, “open-label”11 (Nível de evidência 2B), um estudo fase II randomizado,
não comparativo 12 (Nível de evidência 3), quatro estudos fase II não randomizados, não
controlados13-16 (Nível de evidência 4) e três estudos de coortes retrospectivas17-19
(Nível de evidência 4). Duas revisões descritivas não sistemáticas20,21 foram localizadas
e utilizadas como texto de apoio e complemento. Outras três publicações (duas cartas ao
editor22,23 e um estudo fase I24) relatando efeitos adversos e toxicidades foram utilizadas
para complementar a análise de segurança.
13
ANÁLISE SOBRE A EFICÁCIA DA CAPECITABINA NO CÂNCER DE MAMA
METASTÁTICO:
Em relação à eficácia da capecitabina no tratamento do câncer de mama
metastático, as melhores evidências disponíveis ainda são estudos de baixa qualidade,
em sua maior parte estudos de fase II12-16 e séries de casos não controlados17-19 e com
resultados de impacto terapêutico questionável. Uma revisão sistemática realizada em
2004 não localizou estudos de boa qualidade que demonstrassem a efetividade da
capecitabina3. Até junho de 2008, não foram localizados novos estudos prospectivos
randomizados controlados que demonstrassem a efetividade da capecitabina no
tratamento do câncer de mama metastático, tanto em monoterapia quanto em uso
combinado.
A revisão sistemática de Jones e colaboradores (2004) encontrou apenas um
estudo e concluiu que faltavam evidências para avaliar a efetividade da monoterapia.
Quanto à terapia combinada com o docetaxel, descreveu, baseada em evidência de baixa
qualidade, uma maior efetividade do que o docetaxel isolado e maiores eventos de
toxicidade, como a síndrome mão-pé, náusea, diarréia e estomatite3. No mesmo ano, o
Instituto de Efectividad Clinica y Sanitaria, de Buenos Aires-Argentina, não encontrou
outros estudos e emitiu um boletim com as mesmas evidências10.
Foram selecionados nove estudos clínicos para o presente parecer. O primeiro,
conduzido por Blum e colaboradores13 (1999), foi um estudo fase II, multicêntrico, com
162 pacientes, em que foi instituída monoterapia com capecitabina. Houve resposta
completa em 2,2% dos indivíduos e resposta parcial em 17,7%. A sobrevida global
média foi de 12,8 meses. Em relação ao impacto do tratamento na intensidade da dor,
em 15% dos casos, o efeito foi positivo. Em 29%, no entanto, este efeito foi negativo. O
fato de o estudo não ser controlado, sequer com placebo, faz com que estes resultados
tenham baixo impacto como evidência científica e pouco acrescentam ao propósito do
parecer, no que se refere à eficácia. Outro estudo de fase II, também conduzido por
Blum e colaboradores14 (2001), apresentou respostas tumorais entre 27% e 20% e
sobrevida média de 12,2 meses. As mesmas considerações metodológicas são aplicáveis
a este estudo.
Em 2002, estudo fase III de O’Shaughnessy e colegas11 comparou o uso de
docetaxel isolado ou associado à capecitabina. Os resultados mostraram um discreto
aumento da sobrevida global média, porém não significativo (14,5 meses com a
14
associação capecitabina-docetaxel (IC 95%=12,3-16,3 meses) versus 11,5 meses para o
uso do docetaxel em monoterapia (IC 95%= 9,8-12,7 meses)).
Outro estudo fase II, de Reichardt e colegas15 (2003), utilizou a capecitabina em
monoterapia, com resposta completa em 1% e resposta parcial em 14%. A sobrevida
global média foi de 10,1 meses. Fumoleau e colegas16 (2004) publicaram outro estudo
fase II com capecitabina em monoterapia, com resposta completa em 4% e resposta
parcial em 24%. A sobrevida global média foi de 15,2 meses. Hennessy e colegas17
(2005) publicaram estudo onde testaram doses de capecitabina em monoterapia em três
grupos: A= 2500mg/m2/dia ± 5% (dose entre 2385–2560); B = 2250mg/m2/dia ± 5%
(dose entre 2130–2350) e C < 2000mg/m2/dia ± 5% (dose entre 1000–2100), com
índices crescentes de resposta com a diminuição da dose (18%, 20% e 24%,
respectivamente). Concluíram que um estudo randomizado, multicêntrico, fase III para
estabelecer a segurança e a eficácia de diferentes doses de capecitabina era necessário
urgentemente.
Ainda em 2005, El-Helw e colegas18 publicaram outro estudo retrospectivo, não
controlado, com 57 pacientes que haviam utilizado capecitabina 1g/m2 duas vezes ao
dia por 14 dias repetido a cada 3 semanas. Houve resposta completa em 1,7% e resposta
parcial em 26%. A sobrevida global média foi de apenas 9 meses. Yap e colegas19
(2007) publicaram outra série retrospectiva, de 63 pacientes com resposta completa em
2% e resposta parcial em 29%. A sobrevida global média foi de 12,5 meses.
O estudo mais recente, publicado em 2008 por Pajk e colegas12, é um estudo fase
II randomizado entre capecitabina 1250mg/m2 duas vezes ao dia ou vinorelbina
30mg/m2 ev. dias 1 e 8, ambos por 3 semanas. A resposta (redução do tumor) com a
capecitabina foi de 8.7% (IC95: 1,1–29,0) e com a vinorelbina foi de 12.5% (IC95: 2,7–
32,4). A sobrevida global média (com seguimento médio 17 meses) foi de 9,3 meses no
grupo da capecitabina e de 11,0 meses no grupo da vinorelbina.
Conforme a descrição dos estudos, pode-se constatar a carência de estudos que
forneçam evidências científicas de bom nível para a avaliação da eficácia e efetividade
da capecitabina no tratamento do câncer metastático de mama. Algumas revisões
descritivas não sistemáticas recentes, publicadas em 2007 e 2008, também destacam a
necessidade de mais estudos neste sentido20,21. Os resultados de todos os estudos
descritos acima se encontram resumidos nas Tabelas 1 e 2.
15
Tabela 1. Estudos clínicos sobre a efetividade da capecitabina no câncer de mama
metastático
Estudo
Tipo
Desfechos
Blum JL et
al.199913
Estudo multicêntrico fase
II não controlado.
N=162
Capecitabina monoterapia
2,510 mg/m2/d por 2
semanas seguida por
repouso 1 semana e
repetidos
3
ciclos
semanais.
Blum JL et al.
200114
Estudo multicêntrico fase Resposta
II não controlado.
Sobrevida média
N=74
Resultados
Resposta
completa
(desaparecimento 2,2 %
tumor)*
Resposta parcial (redução nas dimensões 17,7%
tumor)*
Resposta clínica: Intensidade da dor
positiva =15%
estável= 56%
negativa=29%
Sobrevida global média (seguimento 12.8 meses
médio não informado)
Entre 27 e 20%
12.2 meses
Capecitabina monoterapia
1255 mg/m(2) duas vezes
ao dia (2 semanas de
tratamento seguida por 1
semana de repouso)
O’Shaughnessy J Estudo
fase
III, Sobrevida média
et al. 200211
randomizado, open label. Docetaxel+ capecitabina
Ciclos de 3 semanas
capecitabina 1,250 mg/m2 Docetaxel
duas vezes ao dia (1 a 14)
mais docetaxel 75 mg/m2
no dia 1 (n= 255) ou
docetaxel 100 mg/m2 no
dia 1 (n=256)
14.5 meses (95CI
12.3-16.3)
11.5 meses (95CI, 9.812.7)
Reichardt P. et al. Estudo multicêntrico fase
200315
II não controlado.
N=136
Capecitabina monoterapia
ciclos
de
3semanas
capecitabina 1250 mg/m2
duas vezes ao dia (2
semanas de tratamento
seguida por 1 semana de
repouso)
Resposta
completa
(desaparecimento 1%
tumor)
Resposta parcial (redução do tumor)
14%
Fumoleau P. et al. Estudo multicêntrico fase
200416
II não controlado.
N=126
Capecitabina monoterapia
1250 mg/m2 duas vezes
ao dia (1–14), seguida por
7 dias de repouso
Resposta
completa
(desaparecimento 4%
tumor)
Resposta parcial (redução do tumor)
24%
Sobrevida global média
médio não informado)
Sobrevida global média
médio – não informado)
Hennessy BT et
al. 200517
Estudo não controlado, Resposta***
coorte,
retrospectivo.
n=112
capecitabina: A= 2500 ±
5% (dose entre 2385–
2560) n=51
mg/m2/dia; B = 2250 ±
5% (dose entre 2130–
2350) n=17 mg/m2/dia; C
<_ 2000 ±5% (dose entre
1000–2100)
mg/m2/dia. n=45
El-Helw L et al.
200518
Estudo não controlado, Resposta
coorte,
retrospectivo. tumor)
(seguimento 10.1 meses
(seguimento 15.2 meses
Grupo A (2.500mg/m2/dia) 18%
Grupo B (2.250mg/m2/dia) 20%
Grupo C (2.000mg/m2/dia) 24%
completa
(desaparecimento 1,7%
16
Yap YS et al.
200719
Capecitabina 1 g/m2 duas
vezes ao dia por 14 dias
repetido a
cada 3
semanas. n=57
Resposta parcial (redução nas dimensões 26%
tumor)
Sobrevida global média (seguimento 9 meses
médio não informado)
Estudo não controlado,
coorte,
retrospectivo.
N=63.
Capecitabina 1000 mg/m2
duas vezes ao dia em 2 de
3 semanas
Resposta
completa
(desaparecimento 2%
tumor)**
Resposta parcial (redução nas dimensões 29%
tumor)**
Sobrevida global média
médio não informado)
(seguimento 12.5 meses
Pajk B et al. 2008 Estudo randomizado não Resposta (redução do tumor)
12
comparativo. Fase II. N=
capecitabina
47
vinorelbina
Capecitabina 1250 mg/m2 Sobrevida global média (seguimento
duas vezes ao dia (1–14) médio 17 meses)
ou vinorelbina 30 mg/m2
capecitabina
ev. dias 1 e 8, ambos por
vinorelbina
3 semanas
8.7%; (95CI 1.1–29.0)
12.5% (95CI 2.7–32.4)
9.3 meses
11.0 meses
Tabela 2. Revisões sobre a eficácia da capecitabina no câncer de mama metastático
Estudo
Tipo de estudo
Resultados
Jones L et al. . Revisão sistemática
20043
Capecitabina monoterapia Nenhuma conclusão pode ser emitida relacionada ao benefício
terapêutico da monoterapia com capecitabina. São necessários
estudos clínicos randomizados. A capecitabina parece ser custoefetiva comparada com a vinorelbina, mas sérias dúvidas persistem;
a baixa qualidade dos estudos pode invalidar esta conclusão.
Capecitabina combinada Baseada em evidência limitada, a terapia combinada foi mais efetiva
que com docetaxel isolado e parece ser custo-efetiva, mas foi
associada com maiores incidências de síndrome mão-pé, náusea,
diarréia e estomatite.
IECS 200410
Avaliação de Tecnologia Utilizou a revisão sistemática de Jones L. Et al., como principal
em saúde
referência. Não encontrou nenhuma nova publicação relevante.
Tripathy D .
200720
Revisão descritiva
sistemática
Miles D. 200821
Revisão descritiva
sistemática
não Apesar de os agentes biologicamente dirigidos mostrarem atividade
promissora contra o câncer de mama, as respostas tipicamente são
vistas somente em uma fração dos pacientes, com atividade muito
Capecitabina
em limitada no contexto do pré-tratamento. Dadas as limitações dos
combinação com novos modelos pré-clínicos, uma estratégia integrada de estudos
agentes
laboratoriais, clínicos e correlativos constituem a melhor promessa
para a próxima geração de regimes combinados desenhados para
indivíduos baseados nas características do tumor e do paciente.
não A capecitabina associada ao docetaxel mostrou melhores índices de
resposta, tempo para a progressão e sobrevida global em relação ao
docetaxel isolado. No entanto, deve ser dada atenção à redução da
dose e ao fato de que, talvez devido à pior tolerabilidade nas doses
registradas, poucos médicos no Reino Unido e na Europa utilizam
esta combinação. A capecitabina pode ser uma escolha válida como
agente único em pacientes com doença indolente, pacientes idosos
ou pacientes que não desejam sofrer com a perda de cabelos e os
efeitos adversos de outras quimioterapias.
17
RECOMENDAÇÃO SOBRE A EFICÁCIA:
A recomendação é de que ainda são necessários estudos randomizados
prospectivos e controlados, para avaliar a potencial eficácia da capecitabina,
particularmente como quarta linha terapêutica, após o uso de CMF (ciclofosfamida,
metotrexato e 5-fluorouracil) e regimes contendo antraciclinas ou taxanos (paclitaxel
and docetaxel). Não foram localizados estudos comparados, sequer com placebo ou
melhor cuidado clínico de suporte, para verificação da eficácia do tratamento com
capecitabina no câncer metastático de mama.
O aumento de efetividade sugerido com o esquema terapêutico de docetaxel
associado à capecitabina também carece, ainda, de estudos de melhor qualidade que
demonstrem este benefício.
18
ANÁLISE SOBRE A SEGURANÇA DO USO DA CAPECITABINA NO
CÂNCER METASTÁTICO DE MAMA:
Foram analisados 12 estudos nos quais houve registro de efeitos adversos ou
toxicidade durante o uso de capecitabina no tratamento do câncer metastático de mama,
sendo um estudo fase I24, cinco estudos fase II12-16, um estudo fase III11, três estudos de
coorte17-19 e duas cartas ao editor22,23. Os principais efeitos adversos relatados foram
síndrome mão-pé (eritrodisestesia palmar–plantar), diarréia, náuseas e vômitos, astenia,
fadiga, neutropenia e estomatite. Houve relato de neutropenia febril em alguns
estudos11,19. Algumas mortes potencialmente relacionadas ao tratamento foram
apresentadas11,17.
O estudo fase II de Blum13 (1999) relatou, com o uso de capecitabina em
monoterapia em 162 pacientes, eventos adversos como síndrome mão-pé, diarréia,
náusea, vômitos e fadiga. Diarréia (14%) e síndrome mão-pé (10%) foram os únicos
efeitos adversos relacionados ao tratamento que ocorreram com intensidade Graus 3 ou
4 em mais que 10% dos pacientes. Nenhuma morte foi relatada como relacionada ao
tratamento em estudo.
No outro estudo fase II de Blum14 (2001), foram 74 pacientes em uso de
capecitabina, com a ocorrência de síndrome mão-pé (62%), diarréia (58%), náusea
(55%), vômitos (37%), e estomatite (34%). Três pacientes apresentaram efeitos
adversos Grau 4. Eventos adversos relacionados ao tratamento Grau 3 relatados em 10%
ou mais dos pacientes foram: síndrome mão-pé (22%), diarréia (16%), e estomatite
(12%). Não há referência a mortes relacionadas ao tratamento.
Estudo fase III de O’Shaughnessy e colegas11 (2002) avaliou o uso de
capecitabina associado ao docetaxel versus docetaxel em monoterapia em 256
pacientes. Neste estudo, efeitos adversos gastrointestinais e síndrome mão-pé foram
mais comuns com o tratamento combinado, enquanto mialgia, artralgia e neutropenia
febril/sepse foram mais comuns com agente simples docetaxel. Mais eventos Grau 3
ocorreram no tratamento combinado (71% vs 49%, respectivamente), enquanto eventos
Grau 4 foram discretamente mais comuns com docetaxel (31% monoterapia vs 25%
combinação). Mortes prováveis, possíveis ou remotamente relacionadas ao tratamento
em estudo ocorreram em três pacientes no braço do tratamento combinado (1.2%) e em
um paciente no braço do agente único (0.4%).
19
Reichardt e colegas15 apresentaram estudo multicêntrico fase II não controlado
com 136 pacientes em uso de monoterapia com capecitabina. Relatam que os eventos
adversos relacionados ao tratamento Graus 3/4 foram síndrome mão-pé (13%), diarréia
(8%), vômitos (4%) e náusea. Não houve mortes relacionadas ao tratamento.
Fumoleau e colegas16, em estudo multicêntrico fase II não controlado, com 126
pacientes em uso de capecitabina, encontraram que os mais comuns (>20% dos
pacientes) efeitos adversos relacionados ao tratamento foram síndrome mão-pé (71%),
náusea (48%), diarréia (48%), astenia (35%), vômitos (27%), neutropenia (26%), e
estomatite (25%). A maioria dos eventos adversos relacionados ao tratamento foi leve a
moderado em intensidade e os únicos eventos Graus 3 e 4 ocorrendo em mais de 5%
dos pacientes foram síndrome mão-pé (21%, Grau 3 apenas), diarréia (10%) e
neutropenia (14%). Não houve mortes relacionadas ao tratamento.
Em 2005, Hennessy e colegas publicaram estudo não randomizado 17, de coorte
retrospectiva de 112 pacientes, analisando o uso da capecitabina em doses de
2500mg/m2/dia (Grupo A); 2250mg/m2/dia (Grupo B) e menor ou igual a
2000mg/m2/dia (Grupo C). A toxicidade em Graus 3 e 4 nas doses nos Grupos A, B e
C, respectivamente, incluíram eritrodisestesia palmar-plantar = síndrome mão-pé (33%,
63%, 20%), diarréia (13%, 12%, 3%), estomatite (8%, 0%, 3%), e náuseas e vômitos
(4%, 6%, 5%). 40% de todos os pacientes necessitaram reduções de dose da
capecitabina; menos pacientes tratados com 2000mg/m2/dia necessitaram redução de
dose (28%). 5% dos pacientes necessitaram descontinuação da capecitabina pela
toxicidade. Somente uma morte, por pneumonia, foi possivelmente atribuível à
toxicidade da capecitabina.
El-Helw e colegas publicaram, também em 2005, estudo não controlado18, de
uma coorte retrospectiva de 57 pacientes em uso de capecitabina em monoterapia.
Nenhum paciente apresentou eventos adversos Grau 4. Mielossupressão e alopécia
foram raras e não houve relato de mortes relacionadas ao tratamento.
Em 2007, Yap e colegas publicaram estudo não controlado19, de outra coorte
retrospectiva de 63 pacientes que receberam capecitabina em monoterapia. As
toxicidades Graus 3 ou 4 foram: síndrome mão-pé (14%), fadiga (5%), diarréia (6%),
neutropenia (5%), neutropenia febril (2%). Não houve mortes relacionadas ao
tratamento.
Em 2008, Pajk e colegas publicaram estudo fase II randomizado não
comparativo 12, com 47 pacientes utilizando capecitabina ou vinorelbina. A toxicidade
20
foi diferente para cada agente, com mais diarréia e síndrome mão-pé no braço da
capecitabina e mais toxicidade hematológica, neurotoxicidade, náusea e vômitos, dor
abdominal e reação no sítio de injeção (flebite) no braço da vinorelbina. A toxicidade
Graus 3 e 4 incluindo infecção, toxicidade hematológica com neutropenia febril e fadiga
foi observada principalmente no braço da vinorelbina. Outras toxicidades foram
similares em ambos os braços. Sete pacientes descontinuaram o tratamento em estudo
devido à toxicidade excessiva (capecitabina um paciente, vinorelbina seis pacientes) e
três devido a outras razões. Não houve mortes relacionadas ao tratamento.
Com o aumento crescente da utilização da capecitabina, surgem os relatos de
eventos adversos ainda não documentados em ensaios clínicos, como o de Cowman e
colaboradores, em carta ao editor do Annals of Oncology, publicada em 18 de junho de
2008, onde relatam dois casos de perfuração de cólon associada ao uso de capecitabina
em tratamento por câncer de mama22. Em 20 de junho de 2008, foi publicada carta de
Mukesh e Murray, ao editor do Clinical Oncology, em que relatam caso de uma
paciente de 56 anos, com quadro de toxicidade cerebelar decorrência do uso de
capecitabina por câncer de mama metastático23.
O estudo fase I, analisando o uso associado da capecitabina e vinorelbina,
publicado por Favier e colegas, em 2008, foi interrompido precocemente em
decorrência da alta toxicidade observada24. Segundo os autores, a combinação de
vinorelbina intravenosa (dias 1 e 15) mais capecitabina oral (dias 1–14) apresenta
níveis de toxicidade que não são consistentes com seu uso como tratamento de
primeira linha no câncer metastático de mama. As toxicidades relatadas motivaram a
interrupção prematura do estudo pelos investigadores sem testar doses mais baixas.
Toxicidade dose-limitante: neutropenia > 7 dias 7,7%, colestase grau 3 7,7%, colestase
> 7 dias 7,7%, citólise > 7 dias 7,7%.
Os resultados dos estudos comentados acima, com relação à segurança da
capecitabina para câncer de mama metastático, encontram-se apresentados nas Tabelas
3 e 4.
Tabela 3. Segurança em estudos clínicos com capecitabina para câncer de mama
metastático
Estudo
Tipo
Resultados
Blum JL et al.
199913
Estudo multicêntrico fase
II não controlado.
N=162
Síndrome mão-pé, diarréia, náusea, vômitos e fadiga.
Diarréia (14%) e síndrome mão-pé (10%) foram os únicos efeitos
adversos relacionados ao tratamento que ocorreram com intensidade
21
Capecitabina
Graus 3 ou 4 em mais que 10% dos pacientes. Nenhuma morte foi
relatada como relacionada ao tratamento em estudo.
Estudo multicêntrico fase
II não controlado.
N=74
Capecitabina
Síndrome mão-pé (62%), diarréia (58%), náusea (55%), vômitos
(37%), e estomatite (34%).
Três pacientes apresentaram efeitos adversos Grau 4.
Eventos adversos relacionados ao tratamento Grau 3 relatados em
10% ou mais dos pacientes foram: síndrome mão-pé (22%), diarréia
(16%), e estomatite (12%). Não há referência a mortes relacionadas
ao tratamento.
O’Shaughnessy J Estudo fase III,
et al. 200211
randomizado, open
label.N=256
Capecitabina + docetaxel
vs. docetaxel
Efeitos adversos gastrointestinais e síndrome mão-pé foram mais
comuns com o tratamento combinado, enquanto mialgia, artralgia e
neutropenia febril/sepse foram mais comuns com agente simples
docetaxel. Mais eventos Grau 3 ocorreram no tratamento combinado
(71% vs 49%, respectivamente), enquanto eventos Grau 4 foram
discretamente mais comuns com docetaxel (31% monoterapia vs
25% com a combinação). Mortes prováveis, possíveis ou
remotamente relacionadas ao tratamento em estudo ocorreram em
três pacientes no braço do tratamento combinado (1.2%) e em um
paciente no braço do agente único (0.4%).
Reichardt P. et al. Estudo multicêntrico fase
200315
II não controlado.
N=136
Capecitabina
Eventos adversos relacionados ao tratamento Graus 3/4 foram
síndrome mão-pé (13%), diarréia (8%), vômitos (4%) e náusea. Não
houve mortes relacionadas ao tratamento.
Fumoleau P et al. Estudo multicêntrico fase
200416
II não controlado.
N=126
Capecitabina
Os mais comuns (>20% dos pacientes) efeitos adversos relacionados
ao tratamento foram síndrome mão-pé (71%), náusea (48%),
diarréia (48%), astenia (35%), vômitos (27%), neutropenia (26%), e
estomatite (25%). A maioria dos eventos adversos relacionados ao
tratamento foram leves a moderados em intensidade e os únicos
eventos Graus 3 e 4 ocorrendo em mais de 5% dos pacientes foram
síndrome mão-pé (21%, Grau 3 apenas), diarréia (10%) e
neutropenia (14%). Não houve mortes relacionadas ao tratamento.
Hennessy BT et
al. 200517
Estudo não randomizado,
coorte retrospectiva.
n=112
Capecitabina em doses de
A= 2500 mg/m2/dia; B =
2250 mg/m2/dia; C ≤
2000 mg/m2/dia.
Toxicidade Graus 3 e 4 nas doses nos níveis A, B e C,
respectivamente, incluíram síndrome mão-pé (33%, 63%, 20%),
diarréia (13%, 12%, 3%), estomatite (8%, 0%, 3%), e náuseas e
vômitos (4%, 6%, 5%). 40% de todos os pacientes necessitaram
reduções de dose da capecitabina; menos pacientes tratados com
2000mg/m2/dia necessitaram redução de dose (28%). 5% dos
pacientes necessitaram descontinuação da capecitabina pela
toxicidade. Somente uma morte, por pneumonia, foi possivelmente
atribuível à toxicidade da capecitabina.
El-Helw L et al.
200518
Estudo não controlado,
coorte, retrospectivo.
Capecitabina n=57
Nenhum paciente apresentou eventos adversos Grau 4.
Mielossupressão e alopécia foram raras e não houve relato de
mortes relacionadas ao tratamento.
Yap YS et al.
200719
Estudo não controlado,
coorte, retrospectivo.
N=63.
Capecitabina
Toxicidades Graus 3 ou 4 foram: síndrome mão-pé (14%), fadiga
(5%), diarréia (6%), neutropenia (5%), neutropenia febril (2%).Não
houve mortes relacionadas ao tratamento.
Blum JL et al
200114
Pajk B et al. 2008 Estudo randomizado não
12
comparativo. Fase II. N=
47
Capecitabina vs.
vinorelbina
A toxicidade foi diferente para cada agente, com mais diarréia e
síndrome mão-pé no braço da capecitabina e mais toxicidade
hematológica, neurotoxicidade, náusea e vômitos, dor abdominal e
reação no sítio de injeção (flebite) no braço da vinorelbina. A
toxicidade Graus 3 e 4 incluindo infecção, toxicidade hematológica
com neutropenia febril e fadiga foi observada principalmente no
braço da vinorelbina. Outras toxicidades foram similares em ambos
os braços. Sete pacientes descontinuaram o tratamento em estudo
devido a toxicidade excessiva (capecitabina um paciente,
vinorelbina seis pacientes) e três devido a outras razões. Não houve
mortes relacionadas ao tratamento.
22
Tabela 4. Outros relatos de eventos adversos com o uso de capecitabina no câncer
de mama metastático
Estudo
Tipo
Desfechos
Cowman S et
al. 200822
Carta ao editor
Relato de dois casos de perfuração de cólon associada ao uso
de capecitabina em tratamento por câncer de mama.
Favier L et al.
200824
Estudo fase I (não
controlado, não
randomizado)
Capecitabina +
vinorelbina. n=10
A combinação de vinorelbina intravenosa (dias 1 e 15) mais
capecitabina oral (dias 1–14) apresenta níveis de toxicidade
que não são consistentes com seu uso como tratamento de
primeira linha no câncer metastático de mama. As
toxicidades relatadas motivaram a interrupção prematura do
estudo pelos investigadores sem testar doses mais baixas.
Toxicidade dose-limitante: neutropenia > 7 dias 7,7%,
colestase grau 3 7,7%, colestase > 7 dias 7,7%, citólise > 7
dias 7,7%,
Mukesh M et al.
200823
Carta ao editor
Relato de toxicidade cerebelar em paciente recebendo
capecitabina por câncer de mama metastático.
RECOMENDAÇÃO SOBRE A SEGURANÇA DO USO:
Os diversos estudos analisados são concordantes em relação aos efeitos adversos
mais comuns da capecitabina no tratamento do câncer metastático de mama. No
entanto, faltam estudos de bom nível de evidência científica que demonstrem a
segurança do uso da capecitabina com maior seguimento e com populações maiores. Os
relatos de óbitos potencialmente relacionados ao uso da capecitabina foram observados
em estudos com populações maiores. Além disso, já surgem relatos de outros tipos de
complicações, alguns bastante graves e não descritos nos estudos clínicos já publicados.
Por esta razão, as evidências disponíveis podem ser consideradas insuficientes para
fundamentar um parecer sobre a segurança do uso da capecitabina em câncer
metastático de mama. Devem ser desenvolvidos estudos controlados, randomizados e
com amostras maiores e mais tempo de seguimento, para a verificação da segurança do
uso da capecitabina no câncer metastático da mama.
23
CONCLUSÕES FINAIS:
As evidências disponíveis são insuficientes para afirmar que a capecitabina
seja eficaz e segura no tratamento do câncer metastático de mama.
Faltam estudos de melhor qualidade metodológica que avaliem a utilização da
capecitabina em comparação com os regimes de tratamento atualmente disponíveis e
utilizados nesta indicação.
O perfil de segurança ainda em análise, associado à gravidade de alguns dos
eventos adversos já relatados e a característica de uso domiciliar da capecitabina torna
urgente a realização de estudos de maior qualidade (bem como os resultados dos
estudos já em andamento) para avaliar as reais segurança e efetividade desta droga nas
indicações analisadas.
24
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