A armadilha do estúdio

Transcrição

A armadilha do estúdio
D E S TA Q U E
M AT T H E W H E R B E R T • S A M P L E A N D O R U Í D O S D E U M P O R C O
“Eu realmente penso nisso como um grande problema...” O estúdio
onde One Pig e outras produções recentes de Matthew Herbert
foram mixadas é baseado em uma mesa modular Rupert Neve
Designs 5088.
que ele persegue impiedosamente: todo
aspecto de coletar suas gravações fonte é
determinado pelas ideias conceituais e políticas
por trás daquele projeto específico. One Pig
leva o seu comprometimento ao extremo
lógico, limitando totalmente o seu mundo
sonoro a uma única narrativa.
“Eu já escrevo assim há muito tempo.
Para mim, aconteceu uma revolução na
música nos últimos 20 ou 30 anos, que é que,
com a invenção do sampler, não existe mais
nenhuma distinção entre som e música. Este
limite ficou completamente indefinido. Com o
sampler, rapidamente o mundo inteiro é o seu
teclado. Ele está constantemente mudando
e constantemente gerando novos ruídos em
novas combinações, em constante evolução.
Poder rapidamente capturar coisas do ar e
transformá-las em música é uma enorme ideia.
Para mim, ficou muito importante ser claro
sobre qual deve ser o resultado final: não pegar
coisas de maneira simplesmente aleatória ou
porque soa legal. Sem querer soar abstrato
demais, você precisa se entregar ao material.
Você precisa aprender a ouvir melhor.
“Por exemplo, eu fiz um álbum chamado
Plat du Jour, que foi feito com comidas, e eu
fui até uma granja que chocava 25 mil galinhas
exatamente ao mesmo tempo. Eu achei que 25
mil galinhas chocando exatamente ao mesmo
tempo poderia ser o melhor som de todos os
tempos, um incrível momento estilo Jurassic
Park. Mas você chega lá e existem enormes
ventiladores industriais mantendo os 37ºC,
produzindo este enorme barulho, ‘nvoooom’,
e todos os ovos estão em trilhos plásticos,
armazenados como se você estivesse em uma
caixa-forte. Consequentemente, o pintinho
que faz ‘piu piu piu’ - você multiplica isso
por 25 mil e fica ‘piiiiiiiiiiu’, apenas um único
timbre. Então o som que eu achava que seria o
som mais incrível de todos os tempos acabou
A armadilha do estúdio
O estúdio em Kent onde One Pig foi mixado estava
para ser demolido e mudado para um novo local
um dia depois da visita da SOS. “Eu mudo de
estúdio a cada três anos,” diz Matthew Herbert.
“Só para não ficar acomodado. A cada dois ou
três anos, eu compro uma nova mesa de mixagem,
troco todos os equipamentos, troco os meus
monitores, troco de estúdio. Como um camaleão
que muda de pele depois de alguns anos, eu tento
recomeçar. É uma luta constante para evitar me
repetir. Tanto que hoje em dia compor música se
tornou um hábito.”
Herbert fica nitidamente desconfortável com
a tensão entre seus ideais políticos e artísticos e as
tendências audiofônicas que o levaram a encher
a sua sala com processadores de sinais analógicos
caríssimos. “Eu estou em uma posição bastante
privilegiada: posso ouvir e trabalhar com coisas
como o aparelho DW Fearn, que é caríssimo,
custa quatro mil por um equalizador mono. Mas
o problema é que, depois que você o ouve, é muito
difícil retroceder. Eu simplesmente acho que é
uma verdadeira armadilha e estou cheio disso. Eu
acho que é uma grande responsabilidade, porque
eu progrido, e laptops e plug-ins podem fazer
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muita coisa e ir muito longe, mas simplesmente
não soam como este aparelho. É ruim, porque
você sempre foca no elo mais fraco da cadeia
e, antes que possa perceber, você comprou três
Prism Orpheuses. Um bom exemplo é aquele
DI valvulado da Fearn, que provavelmente é
um dos DIs mais caros já fabricados, mas ele
simplesmente soa diferente de tudo mais.”
O atual destaque do estúdio é o novo mixer
modular 5088 da Rupert Neve Designs. “É uma
mesa incrível, com ótimo custo-benefício, ela tem
um headroom absurdo. Eu adoro as coisas da Neve,
como o equalizador que chega a 25k – eles gostam
muito de frequências que você não consegue ouvir
e do efeito que isso tem no som. Para mim, ter uma
mesa modular e poder construir o que você quiser
obviamente é um grande progresso. Como eu não faço
muita gravação aqui, não me interessei em ter 16 prés
de microfone, então eu tenho alguns equalizadores e
provavelmente comprarei o compressor.”
Embora o novo estúdio de Herbert inclua
um patchbay, ele sempre preferiu fluxos de sinal
fixos, por causa das vantagens sonoras que eles
proporcionam. “Tudo isso está conectado. O
meu pai trabalhou na BBC e parte do mantra
Novembro 2011 / w w w . s o u n d o n s o u n d . c o m . b r
que eu herdei dele foi ter o fluxo de sinal mais
curto possível, com a menor quantidade de
componentes. O patchbay era como outra coisa na
cadeia, então eu resisti até agora, porque eu acho
que soa melhor sem ele – mas agora eu quero esta
flexibilidade.
“A maneira que ele é configurado, por exemplo,
são com as saídas 1/2 da placa de som indo para os
equalizadores Portico, depois para o compressor
Gyraf, pelo efeito da mesa e em seguida para a mesa.
Isso tem certo som e os canais 5/6, por exemplo,
passam por equalizadores API e pelo compressor
valvulado Anthony DiMario, então isso tem um
som diferente. Então, dependendo do tipo de som
desejado, eu o direciono por canais diferentes. Para
uma cadeia vocal, eu simplesmente conecto no
Retro 176 e em um equalizador Fearn, e o ignoro
se eu não gostar do timbre. Eu tive um 1176 preto
por um tempo, que é um ótimo compressor de voz
e bastante usado, mas enjoei do timbre dele – ele
adiciona um pouco de vivacidade e eu enjoei dela
estando em toda gravação, e ele não tinha nenhum
bypass. É por isso que eu digo que é ruim, porque,
depois que você percebe que tem um timbre, é
impossível não ouvi-lo!”