Durante mais de um século, as guerras entre as potências

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Durante mais de um século, as guerras entre as potências
Durante mais de um século, as guerras entre as potências dominaram o cenário europeu como forma de afirmação dos Estados modernos. Pela força das armas, o Estado assegurava o domínio de seu território e de suas colônias, consolidava o controle de rotas comerciais, garantia sua influência em lutas dinásticas e disputava com
outros Estados a hegemonia na Europa. Com tantos interesses em jogo, o continente europeu havia se transformado num verdadeiro barril de pólvora. E as explosões não tardariam. Entre 1618 e 1763, a Europa foi sacudida
por um infindável número de conflitos, como a Guerra dos Trinta Anos (1618-1648), a Guerra de Sucessão da
Espanha (1702-1714) e a Guerra dos Sete Anos (1756-1763), só para citar alguns.
Seriam décadas de enfrentamentos, dos quais a Inglaterra emergiria como a grande potência europeia, pronta
para conquistar a hegemonia mundial. Até que isso ocorresse, porém, a Inglaterra passou no plano interno por
dois processos de transformação: a Revolução Puritana (1640) e a Revolução Gloriosa (1688-1689).
1. A GUERRA DOS TRINTA ANOS
Espanha, França, Inglaterra, Holanda. No início do século XVII, esses quatro países disputavam entre si a hegemonia da Europa ocidental. Suas forças militares se equivaliam. A Inglaterra e a Holanda eram fortes no mar. A
França detinha o maior exército. A Espanha, senhora também de Portugal pela União Ibérica, dominava o maior
império colonial. Na parte oriental da Europa, o poderoso Império Turco já controlava a Grécia e toda a península
Balcânica e ameaçava o Sacro Império Romano-Germânico. O equilíbrio era precário e instável entre todas essas
potências.
O primeiro conflito a eclodir foi a Guerra dos Trinta Anos, que começou em 1618 provocada por problemas religiosos e políticos. Por essa época, a dinastia dos Habsburgo procurava impor o absolutismo e a religião católica a
seus súditos do Sacro Império Romano-Germânico, formado por cerca de trezentos pequenos principados autônomos. Revoltados com a imposição, os príncipes protestantes, organizados na Liga Evangélica, entraram em
choque com as forças do governo, sofrendo fragorosa derrota em 1620.
Nesse momento, Inglaterra, Holanda e França, preocupadas com o fortalecimento dos Habsburgo, intervieram
no conflito, apoiando o rei da Dinamarca, que disputava territórios com o Sacro Império. Em 1629, as forças do
Sacro Império derrotaram as da Dinamarca. Em seguida, a Suécia entrou no conflito contando com o apoio da
França, mas foi igualmente vencida em 1632.
Com a derrota dos suecos, a França aliou-se à Holanda, declarou guerra à Espanha e invadiu o Sacro Império. Em
1648, o exército francês sitiou Viena, capital da Áustria e sede dos Habsburgo. A paz foi selada pelo Tratado de
Westfália, que concedeu à França os territórios da Alsácia e da Lorena, antes pertencentes ao Sacro Império. O
acordo obrigou ainda a Espanha a reconhecer a independência da Holanda.
2. A QUEDA DA MONARQUIA INGLESA
Em 1603, a morte da rainha Elizabeth I deixou vago o trono da Inglaterra. Na ausência de herdeiros diretos, já que
a rainha não tinha filhos, a coroa foi entregue a seu primo, Jaime Stuart, rei da Escócia.
Tão logo assumiu o trono, Jaime I, como se tornaria conhecido, entrou em rota de colisão com amplos setores da
sociedade inglesa. Para começar, quis restaurar o absolutismo, invocando a teoria da origem divina dos reis e
perseguindo os puritanos. Ao mesmo tempo, tentou estabelecer novos impostos. Foi o bastante para que sua
política provocasse sérias divergências com o Parlamento.
A morte do rei, em 1625, só fez piorar a situação. Seguindo na mesma trilha, o filho e sucessor de Jaime, Carlos I,
tentou impor o anglicanismo aos calvinistas escoceses, dissolveu o Parlamento e restaurou antigos impostos.
Todas essas medidas, como era de esperar, criaram um clima de guerra entre o rei e o Parlamento.
A Revolução Puritana
Durante os reinados de Henrique VIII e de Elizabeth I, no século XVI, a economia inglesa passara por um período
de grande desenvolvimento comercial. Por essa época, surgiram grandes empresas monopolistas, como a Companhia das índias Orientais.
Essas companhias, entretanto, impediam a livre concorrência e barravam o acesso das pequenas e médias companhias de comércio ao mercado. Como consequência, a burguesia inglesa acabou se dividindo em relação à
política econômica do governo. Enquanto os grandes comerciantes apoiavam o monopólio, os pequenos e os
médios empresários lutavam contra a exclusividade de mercado, reivindicando a liberdade de comércio.
Com o surgimento da dinastia Stuart, os problemas se agravaram. Tanto Jaime I quanto seu filho, Carlos I, praticaram uma política mercantilista estrita, favorecendo a grande burguesia e a nobreza em detrimento dos pequenos e médios empresários. Esses setores tinham representantes em um dos órgãos do Parlamento, a Câmara dos
Comuns; o outro órgão era a Câmara dos Lordes, na qual a nobreza tinha assento.
Desde a Magna Carta de 1215, ficara estabelecido que o rei não podia criar novos impostos sem a aprovação do
Parlamento. A burguesia, agora muito mais forte do que no século XIII, não estava disposta a abrir mão dessa
conquista. A política absolutista dos Stuart exigia grandes recursos financeiros para o rei, o que só seria possível
com o aumento dos impostos e o consequente aumento da arrecadação.
Para agravar a situação, em 1628 Carlos I resolveu dissolver o Parlamento. As tensões chegaram ao limite.
Em 1640, os calvinistas escoceses invadiram o território inglês, rebelando-se contra Carlos I, que tentava impor a
eles a religião anglicana. O rei foi obrigado a convocar o Parlamento, que não se reunia havia 12 anos.
O Parlamento se tornou então a grande "caixa de ressonância" do ódio acumulado da burguesia puritana contra
os Stuart. Em 1642 teve início a guerra civil. De um lado, as forças do rei, de outro, as do Parlamento, lideradas
por Oliver Cromwell.
Os aliados do rei, chamados cavaleiros, eram em sua maioria membros da antiga nobreza católica ou anglicana.
No exército do Parlamento estavam os cabeças redondas (assim chamados porque usavam o cabelo curto), grupo formado pela pequena e média nobreza, pela burguesia e por boa parte da população ligada aos ofícios urbanos — em geral, calvinistas. No curso da luta, surgiram no exército de Cromwell setores mais radicais, como os
niveladores, que lutavam pelo sufrágio universal.
Em 1648, o rei foi definitivamente derrotado. Preso pelos cabeças redondas, enfrentou um julgamento sumário e
foi decapitado em 1649. A Inglaterra passou então a ser governada pelo Parlamento, sob a liderança de Cromwell.
A ditadura de Cromwell
Formalmente, a monarquia tinha sido extinta. Na prática, porém, os ingleses viveriam sob a ditadura exercida
por Oliver Cromwell que, em 1653, seria declarado Lorde Protetor da Inglaterra, cargo vitalício e hereditário.
O governo de Cromwell caracterizou-se por adotar uma agressiva política de fortalecimento do comércio internacional da Inglaterra. Em 1651, o Parlamento aprovou o Ato de Navegação, pelo qual somente barcos ingleses
ou dos países de origem das mercadorias podiam transportá-las até os portos da Inglaterra. A medida acabou
provocando uma guerra com a Holanda (1652-1654). Vitoriosa, a Inglaterra saiu do conflito como a grande potência naval da Europa. Internamente, Cromwell esmagou a facção dissidente dos niveladores, enforcando seus
líderes, e estabeleceu a supremacia política da burguesia. Desprezando as reivindicações das camadas populares,
Cromwell argumentava que a pobreza era uma punição divina para os pecados dos menos afortunados.
Oliver Cromwell morreu em 1658 e foi sucedido pelo filho, Richard, que ficou menos de um ano no poder. Sem
habilidade para manter o apoio político dos grandes proprietários, Richard seria destituído do cargo pelo Parlamento. Em 1660, o trono passou às mãos de Carlos II, filho de Carlos I, o rei decapitado. Com o retorno dos Stuart
ao poder, teve início a Restauração, que se estenderia pelos reinados de Carlos II (1660-1685) e de Jaime 11(16851688).
A Revolução Gloriosa
Carlos II e, principalmente, seu sucessor Jaime II insistiram em adotar políticas semelhantes às de seus antecessores Stuart. Centralizaram o poder, governaram de forma autoritária e favoreceram abertamente católicos e
anglicanos em detrimento dos calvinistas. Além disso, feriram o brio e os interesses comerciais dos ingleses ao
aproximar-se da França, que havia se tornado a maior concorrente do país no comércio internacional.
Diante disso, em 1688 o Parlamento decidiu depor o rei. Para o trono inglês, foi escolhido o príncipe holandês
Guilherme de Orange. Casado com uma filha de Jaime II, Guilherme foi coroado em novembro de 1689 como
Guilherme II.
Os acontecimentos de 1688 e 1689 constituíram a Revolução Gloriosa, assim chamada porque se deu sem derramamento de sangue. Ao assumir o trono, o novo rei se comprometeu a respeitar e cumprir o Bill of Rights
(Declaração de Direitos), votado pelo Parlamento. O documento reafirmava e ampliava a lista de direitos da população inglesa que o soberano não podia violar
3. A SUPREMACIA INGLESA
A França, governada pela dinastia Bourbon, saiu da Guerra dos Trinta Anos como a nação hegemônica da Europa. O desfecho do conflito e a nova posição do país no continente estimularam as pretensões do monarca francês, Luís XIV, de exercer o papel de árbitro entre as demais nações. Essa pretensão acabou envolvendo a França
em outros conflitos. O primeiro deles consistiu em mais uma disputa entre os Bourbon e os Habsburgo. A origem
dessa guerra foi a sucessão do trono espanhol.
Em 1700, morreu Carlos II da Espanha. Antes de morrer, como não tinha herdeiros diretos, o rei legou por testamento a Espanha e todos os seus domínios a um neto de Luís XIV, Filipe, duque de Anjou. A coroação de Filipe
como rei da Espanha com o título de Filipe V foi reconhecida por todos os soberanos europeus — exceto pelo
imperador do Sacro Império. Entretanto, a situação mudou completamente quando Luís XIV concedeu ao neto
direitos à Coroa francesa.
A possibilidade de que Espanha e França viessem a se unir sob a mesma Coroa assustou os demais países europeus. Essa mudança de atitude permitiu que o imperador Habsburgo, do Sacro Império, atraísse a Inglaterra e a
Holanda para uma aliança contra os Bourbon. Em 1702, os três Estados deram início às hostilidades contra a
França e a Espanha, desencadeando a Guerra de Sucessão da Espanha.
A guerra prolongou-se por vários anos, levando ambos os lados ao esgotamento. A paz foi negociada a partir de
1713 pelos tratados de Utrecht e de Ramstadt. Segundo os acordos, Filipe de Anjou foi confirmado no trono da
Espanha, com a condição de que esse país e a França jamais se unissem; a Inglaterra obteve Gibraltar e Minorca
da Espanha e recebeu da França os territórios da Terra Nova e da Nova Escócia, localizados na América do Norte.
A Inglaterra foi, sem dúvida, a principal beneficiária do conflito, que marcou também o período de declínio da
Espanha. Além dos territórios, os ingleses conquistaram o monopólio do tráfico de escravos para as colônias
espanholas da América e o direito de enviar, anualmente, para essa região, um navio com mercadorias, o chamado navio de permissão. Esse direito abriria uma brecha por meio da qual a Inglaterra realizaria lucrativo contrabando nos domínios espanhóis.
A supremacia inglesa na Europa e no mundo seria confirmada pela Guerra dos Sete Anos (1756-1763). Nesse conflito, os ingleses aliaram-se à Prússia, região do Sacro Império Romano-Germânico que havia se tornado reino em
1701. Mais uma vez, o inimigo era a França, aliada agora à Áustria, à Rússia e à Espanha.
O conflito estendeu-se para o Oriente e para a América do Norte, constituindo um primeiro ensaio de guerra
mundial. Terminou com a vitória da Inglaterra que, pelo Tratado de Paris (1763), arrebatou da França e da Espanha os territórios do Canadá e da Flórida e anexou a Índia a seu império em crescimento.
Essas conquistas coincidiram com o começo da Revolução Industrial, processo que teve início na Inglaterra na
segunda metade do século XVIII. Com as conquistas, os ingleses passaram a ter fácil acesso a fontes de matériasprimas, como o algodão indiano, do qual a nascente indústria têxtil do país tanto dependia. Além disso, estavam
assegurados à Inglaterra os mercados de consumo para os tecidos de algodão (e outros artigos), produzidos a
baixo custo pela indústria têxtil e lançados em quantidade cada vez maior no comércio internacional.

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