de leite no brasil - Sociedade Nacional de Agricultura

Transcrição

de leite no brasil - Sociedade Nacional de Agricultura
Modelo ideal para produção
de leite no Brasil
Por: Rosangela
Zoccal, Pesquisadora da
Embrapa Gado de Leite
Geraldo Alvim Dusi, Polo de
Excelência de Leite e Derivados
L
evantamento do IBGE indicou que no
Brasil existem, aproximadamente, 5,2
milhões de estabelecimentos rurais e em
25% deles ocorreu produção de leite, ou seja,
1.350.809 unidades produtivas.
A predominância foi de pequenos produtores,
com 1,2 milhão de estabelecimentos com volume
diário menor que 100 litros (Tabela 1), que somavam 91,5% do total e produziam 47% do leite. Os
estabelecimentos com produção entre 100 e 200
litros/dia representavam 5,4% do total e 19% do
leite nacional. Propriedades com volume de 201
a 500 litros/dia representavam 2,4% dos produto-
34_Animal Business-Brasil
res e 18% do leite brasileiro. As propriedades com
mais de 500 litros por dia não chegavam a 1% e o
volume de leite foi de aproximadamente 16% da
produção total.
Informação importante sobre os estabelecimentos produtores de leite diz respeito à comercialização da produção, que ocorreu em 930 mil
unidades (69%), na forma de leite cru ou beneficiado. Este fato significa que em aproximadamente 420 mil unidades (31%) o leite produzido
foi consumido ou transformado em derivados na
propriedade para o consumo das famílias e/ou
destinado para alimentação dos bezerros.
Tabela 1. Número de estabelecimentos rurais e produção de leite por estrato de
produção diária.
Estrato de produção (litros leite/dia)
Menos de 100
De 100 a 200
De 201 a 500
De 201 a 1000
Mais de 1000
TOTAL
Produtores*
Número
1.236.130
73.559
32.785
6.109
2.226
1.350.809
%
91,5
5,4
2,4
0,5
0,2
100,0
Produção**
Volume
15.085.220
6.098.280
5.773.319
2.567.698
2.567.698
32.096.214
%
47
19
18
8
8
100,0
Dados do IBGE/Pesquisa da Pecuária Municipal 2011
Observação: Os dados do Censo Agropecuário se referem a 2006, porém não ocorreram no País fatos relevantes que possam ter
provocado mudanças no setor as quais invalidem uma análise sobre os sistemas de produção em uso atualmente.
Os dados apresentados reforçam que a maioria dos produtores de leite no Brasil possui volume diário inferior a 100 litros, com características
de propriedades de subsistência e sem uso de
tecnologias. Por outro lado, um número reduzido de estabelecimentos refletem sistemas competitivos, que buscam ganho de escala e usam
tecnologias avançadas.
Segundo o levantamento realizado pelo site
Milkpoint sobre os cem maiores produtores de
leite no Brasil, em 2011, o volume diário de produção variou de 5.900 litros a 52 mil litros de leite.
O sistema de maior ocorrência entre eles foi o de
confinamento total dos animais, com média de
produção diária de 27,5 kg/vaca ordenhada, seguido pelo semiconfinamento com 20,4 kg/vaca/
dia e, em terceiro lugar, os sistemas baseados
em pastagens com 16,8 kg/vaca/dia. A principal
raça utilizada é a Holandesa, porém em muitas
fazendas se utilizam mais de uma raça leiteira.
Modelo de produção de leite
para o Brasil
Estudos realizados pela Embrapa Gado de
Leite, diagnósticos estaduais da cadeia produtiva e informações disponibilizadas pelo IBGE,
subsidiam uma classificação dos sistemas de
produção existentes no Brasil, em quatro tipos,
sob a ótica da intensificação, com as seguintes
características de produção de leite:
Produção de subsistência: São os estabelecimentos mais comuns, com rebanhos menores
que 30 vacas; produtividade abaixo de 5 litros/
animal/dia; produção diária por propriedade menor que 100 litros. Tem o pasto como base da
alimentação do rebanho. As pastagens normalmente possuem baixa capacidade de suporte e
não fazem uso da suplementação de forragem,
apenas o sal comum é fornecido no cocho.
Produção semiextensiva: Possuem rebanhos entre 30 e 70 vacas, com produtividade
animal de 5 a 8 kg por vaca/dia e produção total entre 100 e 500 kg por dia. O sistema de alimentação é misto, isto é, uso da pastagem com
suplementação de forragem e concentrada no
inverno ou estação seca e em muitos casos a
suplementação concentrada é fornecida durante
o ano todo. O pasto possui capacidade mediana
de suporte.
Produção especializada: Estabelecimentos
usualmente com rebanhos de 70 a 200 vacas,
com produtividade média entre 8 e 15 kg/vaca/
dia e produção total variando entre 500 e 2.000
kg por dia. O sistema de alimentação e manejo
é especializado, geralmente com pastagem adubada, utilização de cana-de-açúcar e silagem
como suplementação volumosa e concentrada
durante o ano todo.
Produção intensiva: São os estabelecimentos grandes, rebanho produtivo com mais de
200 cabeças, sendo, geralmente, a produtividade superior a 15 kg/vaca/dia e o volume diário
superior a 2.000 kg por unidade produtiva. A alimentação do rebanho é balanceada e fornecida
integralmente no cocho durante o ano todo.
A classificação dos sistemas de produção
existentes no País reflete a grande heterogeneidade existente, e eleger um modelo ideal seria
utópico. A exemplo do que ocorre nos principais
países produtores de leite, o Brasil deve adotar
Animal Business-Brasil_35
modelos físicos de produção de leite que busquem competitividade e eficiência dos fatores de
produção.
Na Figura 2, se observa que a Nova Zelândia,
que é o país com maior volume de leite no mercado internacional e que exporta cerca de 90%
do leite produzido, a média é de aproximadamente 1.600 litros por propriedade por dia. Nos
Estados Unidos, que é o maior produtor mundial
de leite de vaca, o volume médio por unidade
produtiva é de 1.300 litros/dia.
O Uruguai, que é um dos grandes exportadores de leite para o Brasil, apresenta média de
300 litros/dia, índice semelhante aos que apresentam França e Alemanha, que também são
países importantes na produção de leite. O Brasil ainda não atingiu a marca de 50 litros por produtor por dia.
Ainda, na Figura 2, se observa que os países importantes no cenário mundial apresentam
crescimento da quantidade de leite produzida
diariamente nos sistemas de produção, no período de 2000 a 2010. Este deve ser o caminho
do Brasil na busca do desenvolvimento da atividade leiteira. Os Estados Unidos aumentaram
em 91%, passando de 681 litros/dia para 1.303
litros/dia, e a Inglaterra, de 453 litros/dia para
863 litros/dia, o que representou um crescimento de 91% durante a década.
Figura 2. Produção média de leite por
unidade produtiva em alguns países,
2000/2010.
Fonte: IFCN, 2012
1596
2000 2010
1303
863
36_Animal Business-Brasil
14
2
Índia
Brasil
Uruguai
França
Alemanha
Inglaterra
Estados Unidos
Nova Zelândia
26
China
331 312 302
Organização do setor leiteiro
Os produtores de leite, em grande número,
estão organizados em cooperativas, porém o
sistema cooperativista brasileiro vem perdendo
credibilidade ao longo dos anos, por vários motivos, desde a falta de gestão adequada e transparente até o despreparo dos membros participantes e de dirigentes, causando vários casos
de falências nos últimos anos.
Apesar dos “tropeços” das cooperativas,
muitas delas representam a única opção do produtor de leite para comercialização do produto,
que é altamente perecível. Algumas cooperativas deixaram de processar o leite captado e se
transformaram em postos de resfriamento, vendendo o produto no mercado spot.
Com a implementação da IN 51, que foi substituída pela IN 62, esperava-se que o leite produzido
em pequenas quantidades fosse desaparecer em
função da qualidade e da coleta a granel, porém
esse fato não ocorreu e os pequenos produtores
se mantiveram e ainda hoje há leite transportado
da fazenda até a plataforma de recepção, em latões, e, em alguns casos, conduzidos por animais
ou outros meios não adequados.
A dificuldade para que ocorra uma profícua
organização dos produtores em cooperativas
está relacionada ao baixo nível educacional e
à falta de conhecimento dos cooperados quanto
às suas obrigações e responsabilidades.
As associações de produtores estão surgindo
com o propósito inicial de se obterem melhores
condições de comercialização do leite e de compra de insumos utilizados na atividade. No entanto, o sucesso de algumas associações resultou em
outras iniciativas, tais como a contratação de assistência técnica, centros de cria e recria de animais
e comercialização em conjunto. Ainda é reduzido
o número de produtores que participam de associações ou de cooperativas e esse é um bom caminho para que o produtor e o setor se fortaleçam.
Empresas nacionais e multinacionais
O setor tem se caracterizado pela fusão ou
compra de pequenas empresas brasileiras por
grandes empresas. Em 2011, 40% do leite produzido no País, 13,1 bilhões de litros, foram
adquiridos pelas dez maiores empresas com
atuação no Brasil. As principais são: DPA/Nestlé,
BR Foods, LBR – Lácteos Brasil, Itambé, Italac,
Laticínios Bela Vista, Embaré, Danone, Jussara
e Centroleite.
A oferta de leite tem se expandido ao longo
dos anos para atender ao crescimento do parque industrial e também por especialização da
atividade. Entre 2001 e 2011, a produção nacional cresceu 56%, ou seja, dos 20 bilhões passamos a produzir 32 bilhões de litros.
Além do crescimento da produção, o Brasil
tem se caracterizado como importador de produtos lácteos. No período de 2004 a 2009, houve uma mudança na balança comercial em que
as exportações superaram as importações, mas
a partir desse período voltamos a ser grandes
compradores de produtos, principalmente da Argentina e do Uruguai.
O crescimento da produção e as constantes
importações de produtos mostram que a demanda brasileira por leite e derivados ainda está em
crescimento. Esse fato significa que vale a pena
investir no setor, não só pensando em abastecimento de mercado, mas também por outros
benefícios que o leite traz para a sociedade brasileira, como geração de emprego e distribuição
de renda.
Perspectivas e desafios para a
próxima década
Para garantir o desenvolvimento e a especialização da pecuária leiteira nacional, alguns desafios devem ser enfrentados visando à competitividade e à sustentabilidade do setor:
Produtividade: Para que a produtividade por
animal e por área se aproxime de índices observados em países expressivos na produção de
leite, será necessária a adoção de tecnologias,
que já estão disponíveis, em relação à qualidade
genética dos animais e às práticas de manejo e
de alimentação em uso nos sistemas de produção mais eficientes.
Nas pequenas e médias propriedades, o uso
das pastagens para alimentação do rebanho é
de fundamental importância para a redução do
custo de produção. Em regiões de clima tropical,
como é o caso da maior parte do território brasileiro, a suplementação volumosa no período de
seca ainda é um grande entrave para que a alimentação do rebanho seja adequada em quantidade e qualidade durante o ano todo.
A maioria dos produtores
de leite no Brasil tem
produção média diária
inferior a 100 quilos
Qualidade do leite: A qualidade do produto
deve ser uma preocupação constante do produtor para que o leite atenda às exigências do
mercado doméstico e do internacional, ficando
dentro dos parâmetros determinados pela IN 62.
Gestão da atividade: Para permanecer no
leite, acompanhar a evolução e enfrentar a concorrência, o produtor deve priorizar a gestão do
negócio, monitorando os indicadores zootécnicos e econômicos mais relevantes, tais como
produtividade por área e por animal, rendimento
da mão de obra, custo de produção e renda da
atividade.
O sistema de produção mais adequado é
uma tarefa que cabe ao produtor definir, porque
a capacidade de investimento e gerenciamento
depende de cada um.
Capacitação: Para que os sistemas de produção se tornem eficientes é necessária a incorporação de tecnologias e estas inovações
exigem uma formação educacional básica por
parte dos produtores. Nesse sentido esbarramos em um grande desafio para o setor, que é o
nível educacional do produtor.
Considerando dados do IBGE, observa-se
que o grau de instrução dos dirigentes de estabelecimentos rurais que se dedicam à pecuária
é de que a maioria, 57%, tem pouca instrução,
ou seja, não concluíram o ensino fundamental,
porque não tiveram alfabetização formal, mas
sabem ler e escrever, ou foram alfabetizados
depois de adulto. Essa situação se agrava com
dirigentes que se declararam analfabetos, que
somam 22% do total.
Uma grande missão do setor para a próxima
década é conseguir fazer chegar ao produtor,
por meio das instituições de assistência técnica
e das empresas de lacticínios, as melhores práticas de produção e as tecnologias adequadas ao
seu sistema de produção.
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