Jornal Brasileiro de Medicina - Edição Novembro/Dezembro

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Jornal Brasileiro de Medicina - Edição Novembro/Dezembro
ISSN 0047-2077
Novembro/Dezembro 2013
Volume 101
Número 6
Hemocromatose
hereditária
Dificuldades no
diagnóstico diferencial
entre mesotelioma
pleural e adenocarcinoma
metastático
Síncope vasovagal em
criança com
Wolff-Parkinson-White
Apoptose no
endométrio humano
e endometriose
Evolução das técnicas de
transplante de fígado
Tratamento não cirúrgico
do traumatismo renal
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editorial
issn 0047-2077
Atualizações relevantes
Editor: José Maria de Sousa e Melo
In memoriam
Gerente Geral: Daila B. Melo
Gerência Executiva: Lícia M.a S. Andrade
Assistente: Thereza C. P. Jouan
N
a última edição de 2013, JBM traz à leitura
temas clínicos nem sempre presentes no dia
a dia do consultório, mas sobre os quais a
atualização se faz relevante.
Redação
Editor Científico: Dr. José Galvão-Alves
Redator-Chefe: Dr. Almir L. da Fonseca
Coordenação Editorial: Sheila Guedes
Revisores:Joel Vasconcellos
Sueli B. dos Santos
Tráfego: Jorge de Moura Bastos
De autoria do Dr. Olival Cirilo Lucena da Fonseca
Neto, o artigo Evolução das técnicas de transplante
de fígado — O papel da veia cava inferior analisa as
técnicas cirúrgicas consagradas. A importância da
morte celular via apoptose no endométrio normal e
em portadoras de endometriose é o objetivo do artigo
Apoptose no endométrio humano e endometriose, de
autoria do Prof. Marcos Mendonça e colegas.
Programação Visual
Edson de Oliveira Vilar
Editoração Eletrônica
Valter Batista dos Santos
Sonia R. Vianna e Silva
Publicidade
Executivo de Contas (RJ): Silvio F. Faria
Assistente: Raissa Negri Santiago
Executivo de Contas (SP): Anna Maria Caldeira
Assistente: Sirlei T. S. de Lima
Editora de Publicações Científicas Ltda.
No formato de relato de caso, mas com conteúdo
de atualização sobre o tema, Síncope vasovagal em
crianças com Wolff-Parkinson-White é apresentado
através da experiência da Dra. Maria Natividade Santos
Costa Lopes e colegas. Dificuldades no diagnóstico
diferencial entre mesotelioma pleural e adenocarcinoma
metastático para pleura patológica é outro artigo que
analisa, entre outros aspectos, o diagnóstico diferencial
entre as patologias.
Rio de Janeiro: Av. das Américas, 1.155 — Salas 1401
a 1404 — Barra da Tijuca — Tels.: 2492-1856 e 24932694 — Fax: 2492-1279 — CEP 22631-000 — Inscrição:
81.413.177 — CNPJ 33.897.679/0001-12 — E-mail:
[email protected] — Site: www.epuc.com.br
A edição se encerra com dois temas: Tratamento
não cirúrgico do traumatismo renal contuso e
Hemocromatose hereditária.
Jornal Brasileiro de Medicina é uma revista médico-científica bimestralmente enviada a mais de
25.000 médicos com clínica ativa em todo o território nacional. JBM NÃO ACEITA EM HIPÓTESE ALGUMA MATÉRIA PAGA EM SEU ESPAÇO EDITORIAL.
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Boa leitura a todos!
Dr. José Galvão-Alves
Número avulso: R$ 30,00
Registrado na Base de Dados Lilacs, organizada
pela Bireme (ex-Index Medicus Latino Americano)
Periodicidade: Bimestral
Impressão: Gráfica Trena
Distribuição: Door to Door e Diremadi
Representante no México: Intersistemas S.A. de
C.V. - México
JBM reserva-se todos os direitos, inclusive os de
tradução, em todos os países signatários da Convenção Pan-Americana e da Convenção Internacional sobre Direitos Autorais.
Os trabalhos publicados terão seus direitos autorais
resguardados pela EPUC que, em qualquer situação, agirá como detentora dos mesmos.
Publicações do Grupo:
JBM
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3
sumário
Conselho Científico
Presidente
3
Atualizações relevantes
Dr. José Galvão-Alves
editorial
José Galvão-Alves
Membros Honorários
7
11
17
21
Evolução das técnicas de transplante de
fígado – O papel da veia cava inferior
artigos
Dr. Olival Cirilo Lucena da Fonseca Neto
Membros Titulares
Apoptose no endométrio humano e
endometriose
Bahia
Zilton A. Andrade
Luis Guilherme Lyra
Drs. Marcos Mendonça, Liv Braga de Paula e Luciana Moro
Brasília
Columbano Junqueira Neto
Síncope vasovagal em criança com
Wolff-Parkinson-White
Espírito Santo
Carlos Sandoval
Drs. Maria Natividade Santos Costa Lopes, Cecílio Kassem Salamé
e Camila Costa Oliveira
Goiás
Celmo Celeno Porto
Minas Gerais
Julio Chebli
Dificuldades no diagnóstico diferencial entre
mesotelioma pleural e adenocarcinoma
metastático para pleura patológica
Paraná
Miguel Riella
Sergio Bizinelli
Drs. Beltrão Paiva Castello Branco, Fernando Antonio Carvalho, Francisco
de Assis Paiva e Igor Torres Castello Branco
27
4
Pernambuco
José Roberto de Almeida
Hemocromatose hereditária
Drs. Willian Cassuriaga Aymone, Vanessa Valiati, Maria da Graça de Faria
Santos Resem e William Peres
35
Tratamento não cirúrgico do traumatismo
renal contuso
16
Atualidades médicas
26
Panorama internacional
39
Noticiário
40
Índice geral
Amaury Coutinho (PE)
Affonso Berardinelli Tarantino (RJ)
Clementino Fraga Filho (RJ)
Mário Barreto Corrêa Lima (RJ)
Renato Dani (MG)
Drs. Olival Cirilo Lucena da Fonseca Neto e Rômulo Vasconcelos
seção
Rio de Janeiro
Aderbal Sabrá
Azor José de Lima
Evandro Tinoco
Fábio Cuiabano
Gilberto Perez Cardoso
Jorge Alberto Costa e Silva
José Manoel Jansen
Marta C. Galvão
Mauro Geller
Henrique Sergio Moraes Coelho
Glaciomar Machado
São Paulo
Capital
Adib Jatene
Flair José Carrilho
José Eduardo Souza
José Osmar Medina Pestana
Nestor Schor
Sender Miszputen
Botucatu
Oswaldo Melo da Rocha
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O papel da veia cava inferior
hepatologia
Evolução das técnicas de transplante de fígado
Olival Cirilo Lucena da Fonseca Neto
Cirurgião do Serviço de Cirurgia Geral e Transplante Hepático do Hospital Universitário
Oswaldo Cruz — UPE.
Resumo
Summary
O transplante de fígado (TxF) é provavelmente a maior agressão cirúrgica que
um paciente pode suportar. Desde a introdução do TxF convencional por Starzl,
o qual era baseado na ressecção conjunta
do fígado e da veia cava inferior, o procedimento sofreu vários refinamentos. Em
termos técnicos, o TxF é o mais complexo
entre todos os transplantes de órgãos. Uma
combinação dos avanços na técnica cirúrgica e cuidados intensivos vem permitindo
um aumento na sobrevida pós-TxF. Uma revisão dos aspectos técnicos do TxF é descrita no presente artigo.
Liver transplantation (LT) is probably the
biggest surgical aggression that a patient can
endure. Since introduction of the conventional LT by Starzl, which was based on the
resection of recipient inferior vena cava (IVC)
along the liver, the procedure has undergone
several refinements. In terms of technique LT
is the most complex of all types of transplantations. A combination of advances in critical
case and surgical technique has resulted in
a significant improvement in overall patient
survival after transplantation. Up to date
technical aspects of orthotopic liver transplantation are described in the present article.
Introdução (1, 2, 3)
Transplante ortotópico de
fígado (TOF) (4, 5, 6, 7, 8)
Desde o primeiro sucesso no transplante de fígado, por Starzl, em 1967, o procedimento tornou-se o tratamento de escolha
para pacientes com doença hepática terminal. Uma combinação de avanços na técnica
cirúrgica, seleção do receptor, cuidados pós-operatórios e na utilização de imunossupressores mais específicos vem proporcionando
maior e melhor sobrevida pós-transplante de
fígado (TxF). O primeiro desafio enfrentado
para tornar o TxF possível foi a parte técnica,
a cirurgia. Graças à aquisição progressiva e
contínua dos conhecimentos anátomo-cirúrgicos e suas repercussões fisiológicas em TxF
experimental, esse procedimento adquiriu o
status de maior cirurgia realizada no corpo
humano. Nesse cenário, a veia cava inferior
surge como uma estrutura que deverá ser
dominada, para permitir a evolução e a segurança na cirurgia do TxF.
É, por definição, quando um enxerto hepático total ou parcial é implantado no lugar do fígado nativo. Inicialmente foi realizado como cirurgia experimental por Welch e
Moore, em Boston, e por Starzl, em Chicago,
com objetivos diferentes: enquanto o grupo
de Boston preocupava-se com os aspectos
de imunossupressão, o grupo de Chicago
se interessava pela “nutrição” do enxerto
hepático. Nesse momento, os transplantes
realizados em cães ocorriam com o auxílio da
circulação extracorpórea. Esses pesquisadores utilizavam a técnica convencional, isto é,
o fígado doente é retirado completamente
com a veia cava inferior (VCI). Para realizar
essa técnica era necessário interromper o fluxo sanguíneo da VCI e da veia porta através
do pinçamento vascular. Com isso, todo o retorno venoso infradiafragmático (proveniente
Unitermos: Transplante
de fígado; técnica cirúrgica;
fígado; veia cava inferior.
Keywords: Liver
transplant; surgical
technique; liver;
inferior vena cava.
Fonte de financiamento: não há. Conflito de interesse: não declarado.
JBM
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NOVEMBRO/DEZEMBRO, 2013  VOL. 101  No 6
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Evolução das técnicas de transplante de fígado
O papel da veia cava inferior
Pontos-chave:
> Transplante ortotópico de
fígado é o enxerto hepático
total ou parcial implantado no
lugar do fígado nativo;
> Foi realizado
experimentalmente por Welch
e Moore, em Boston, e por
Starzl, em Chicago;
> Os pesquisadores utilizavam
a técnica convencional, isto é,
o fígado doente é retirado
completamente com a veia
cava inferior.
8
dos membros inferiores e da região esplâncnica) não retornava ao coração. Os cães não
suportavam e morriam em poucos minutos.
Foi necessário contornar esse problema hemodinâmico (baixo débito e choque) com a
utilização de circulação extracorpórea com
heparinização. A circulação extracorpórea
consistia em circuitos de tubos que inseridos
na veia femoral, veia porta e veia axilar permitiam o retorno venoso sistêmico e gastrointestinal para o coração. Muitos anos depois,
o próprio Starzl refere que essa necessidade
de desvio venovenoso para realizar TxF foi a
única lição errada aprendida com os animais,
transportada para o TOF em humanos.
Ainda no TxF experimental observou-se
que seria possível diminuir as complicações
do desvio venovenoso (DVV) realizando uma
anastomose portocava temporária, reduzindo assim a necessidade da colocação do
tubo venoso em área esplâncnica, sendo necessária apenas a drenagem da VCI.
Após descrições iniciais de hepatectomia
total em único estágio em cães, isto é, preservando a VCI na retirada do fígado nativo,
introduziu-se essa possibilidade técnica em
TxF experimental, com grande impacto positivo no equilíbrio hemometabólico. Associado com a anastomose portocava, o manejo
transoperatório dos animais submetidos ao
TxF tornou-se mais simples.
Com os conhecimentos provenientes do
laboratório, Starzl, aos 32 anos, realizou o primeiro TxF clínico, em 1963. A grande euforia
do início da cirurgia foi substituída pela tristeza
com o quadro hemorrágico desenvolvido durante a operação, levando o paciente a óbito. Mais duas tentativas foram realizadas pelo
mesmo grupo, em Denver. O sucesso também
não ocorreu dessa vez. Nessa série inicial foi
usada a técnica convencional (hepatectomia
total com a veia hepática inferior — retro-hepática), associada com o desvio venovenoso.
Ocorreram complicações tromboembólicas do
desvio venovenoso, que foram a causa do óbito nos pacientes. Decidiu-se suspender o DVV.
Quase 25 anos depois do primeiro TxF
em humanos, Starzl havia mudado de instituição. Passou a desenvolver seus trabalhos
em Pittsburg. Com uma nova equipe, seus
esforços estavam renovados para progredir
em todos os aspectos inerentes à questão.
Após realizar 170 TxFs em Denver e 63 em
Pittsburg, com a técnica convencional, sem
desvio venovenoso, um fato que ocorreu
JBM
nos últimos seis TxFs reacendeu a chama da
utilização do DVV. Os óbitos ocorridos nesses TxFs, na fase anepática, levaram Starzl
e sua equipe de volta aos laboratórios, em
busca de respostas. Em um ano, a equipe
de Pittsburg publicava suas experiências em
TxF convencional com DVV. Agora, o sistema de circulação extracorpórea era simples e
seguro. Era formado por uma bomba rolete
e tubos impregnados com heparina em suas
paredes. Não havia mais necessidade de heparinização sistêmica em um paciente que já
tinha alterações na coagulação. O sucesso
com o novo sistema de DVV propagou-se
por todo o mundo, e permitiu a criação de
novos centros de TxF.
Ainda assim, ocorriam várias complicações
inerentes ao sistema do DVV. Trombose e embolia pulmonar, embolia aérea, hipotermia,
lesões e infecção nos acessos vasculares, linfocele e aumento do custo do TxF eram fatores que diminuíam a grande contribuição
que o DVV havia dado para o progresso do
TxF. Vários trabalhos começaram a questionar
o real benefício do DVV na estabilização hemodinâmica durante a fase anepática (fase da
cirurgia do TxF em que o receptor fica sem
o fígado nativo e, com isso, todas as funções
dependentes do fígado não ocorrem, levando à coagulopatia, hipotermia, hipoglicemia e
acidose metabólica), colocando em dúvida a
sua utilização. As consequências seriam maior
sangramento operatório e, principalmente, insuficiência renal no pós-operatório imediato.
Com a crescente informação sobre resultados semelhantes quanto às complicações,
entre TxF convencional com e sem DVV, os
cirurgiões buscaram outra alternativa para
remediar a instabilidade hemodinâmica durante o pinçamento da VCI supra-hepática
e infra-hepática (suprarrenal). Surgiu então,
em 1989, a hepatectomia total com preservação da veia cava inferior retro-hepática, a
técnica piggyback. Esse procedimento já havia sido descrito há mais ou menos 30 anos,
em cirurgia experimental. Sua utilização nos
TxFs clínicos alcançou imediatamente quase
todos os serviços de TxF do mundo. Vários
trabalhos começaram a mostrar os seus benefícios em relação ao TxF convencional com
DVV. Alguns autores passaram a defender
seu uso rotineiro no TxF. Adotaram quase
uma moratória ao TxF convencional com
DVV. Já o convencional, sem DVV, era usado
como exceção. É importante lembrar que a
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NOVEMBRO/DEZEMBRO, 2013  VOL. 101  No 6
Evolução das técnicas de transplante de fígado
O papel da veia cava inferior
técnica piggyback foi utilizada inicialmente
por Calne, em 1968, no seu terceiro caso de
TxF clínico na Inglaterra. Comenta-se que a
técnica possui dois “pais”.
Com o advento da técnica piggyback, novas modalidades de TxF foram acrescentadas:
o TxF reduzido, o split liver, o dominó e o intervivos. O TxF reduzido foi criado para beneficiar as crianças na lista de espera. Um fígado
de doador falecido adulto é diminuído para
ser aproveitado pelos receptores pediátricos.
O TxF split liver, fígado bipartido, consiste em
repartir o fígado do doador falecido para dois
receptores, geralmente um adulto jovem e
uma criança. O TxF dominó é aquele em que
o receptor apresenta doença metabólica de
origem hepática, que produz complicações
após 20-30 anos. Assim, esses órgãos “doentes” são utilizados em pacientes com doença
hepática terminal com prognóstico reservado.
O paciente, portador da doença metabólica,
é ao mesmo tempo receptor e doador. O TxF
intervivos teve origem no Brasil. Rapidamente
ganhou adeptos em todo o mundo. Consiste
em retirar um segmento ou segmentos de um
doador aparentado sadio para transplante no
receptor com doença hepática terminal. Todas essas situações são regulamentadas pela
Central Nacional de Transplantes de Órgãos,
do Ministério da Saúde. Nos outros países
também existe lei regulamentando os diversos tipos de transplante (Figuras 1 e 2).
O TxF intervivos teve
origem no Brasil.
Rapidamente ganhou
adeptos em todo o
mundo. Consiste em
retirar um segmento
ou segmentos de um
doador aparentado
sadio para transplante
no receptor com doença
hepática terminal. Todas
essas situações são
regulamentadas pela
Central Nacional de
Transplantes de Órgãos,
do Ministério da Saúde.
Figura 1: Desenho esquemático da implantação do enxerto hepático pela técnica convencional.
Figura 2: Desenho esquemático da implantação do enxerto hepático pela técnica piggyback.
JBM
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NOVEMBRO/DEZEMBRO, 2013  VOL. 101  No 6
9
Evolução das técnicas de transplante de fígado
O papel da veia cava inferior
Transplante heterotópico
de fígado (THF) (9, 10)
para ressuscitação mais específicos e o uso
de vasoconstritores sistêmicos e esplâncnicos permitem o melhor equilíbrio hemometabólico nesses pacientes tão críticos.
O melhor entendimento da coagulação em
cirróticos, a utilização do tromboelastograma
(exame que mostra dinamicamente a função
das plaquetas e a formação do coágulo) e
a diminuição da hemotransfusão (principalmente plaquetas) concorrem para o aparecimento de um novo cenário clínico com melhores resultados, apesar da maior gravidade
dos pacientes com doença hepática.
Assim, novas pesquisas vêm demonstrando que, mais do que a técnica utilizada, o manejo intraoperatório teria maior
participação na gênese das complicações
pós-operatórias, principalmente a insuficiência renal. À luz dos novos conhecimentos, alguns trabalhos tentam demonstrar
a igualdade nos resultados entre o TxF
convencional com ou sem DVV e a técnica
piggyback.
Apesar de ter sido a primeira técnica
de TxF realizada em cirurgia experimental,
não se desenvolveu plenamente, devido
aos problemas técnicos inerentes à colocação de outro órgão (inteiro ou não) dentro
da cavidade abdominal, já repleta de vísceras. O problema de acomodação acarretou vários transtornos vasculares, que
levavam à disfunção do enxerto precoce
ou tardia, sendo necessário retirar o órgão
transplantado para permitir a vida. Atualmente não existe grande experiência clínica nessa técnica, mas alguns centros encontram justificativa para realizá-la quando
os receptores são jovens e/ou sofrem de
hepatite fulminante.
Considerações finais (11, 12, 13)
O domínio anátomo-cirúrgico da VCI permitiu o desenvolvimento das várias técnicas
utilizadas no TxF. Atualmente, os centros de
TxF lidam com pacientes mais graves na lista de espera para transplante, necessitando
realizar procedimentos cirúrgicos menos traumáticos, com o intuito de diminuir as complicações pós-operatórias. Os avanços no manejo dos pacientes cirróticos vêm permitindo
uma mudança nos conceitos fisiopatológicos
da hipertensão portal. A utilização de fluidos
Conclusão
A história do TxF pode ser contada a partir
do domínio da técnica cirúrgica. A abordagem
da VCI permitiu o desenvolvimento de várias
modalidades de TxF e assim, com o progresso de outras áreas da Medicina, proporcionou
o sucesso atual do transplante de fígado.
Referências
Endereço para
correspondência:
Olival Cirilo Lucena da Fonseca
Neto
Rua Jacobina, 45 — Apto. 1002
— Graças
52011-180
Recife-PE
[email protected]
10
18. STARZL, T.E. (ed.) — The recipient operation in man. Experience in hepatic transplantation. United States of America.
W.B. Saunders Company, 1969. p. 112-43.
19. CANNON, J.A. — Transplantation Bulletin, 3: 7, 1956.
10. STARZL, T.E. & FUNG, J.J. — Themes of liver transplantation. Hepatology, 51: 1869-84, 2010.
11. RAMSAY, M.A.E. & GARCIA-VALDECASAS, J.C. — Intraoperative renal protection: Anesthesia approaches. Liver Transpl., 15: S20-S21, 2009.
12. SCHWARZ, B.; POMAROLI, A. et al. — Liver transplantation without venovenous bypass: Morbidity and mortality in
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after vena cava clamping. J. Cardiothoracic Vasc. Anesth.,
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the dog, preserving the inferior vena cava. Am. J. Physiol.,
168: 156-8, 1952.
11. STARZL, T.E.; GROTH, C.G. et al. — Orthotopic homotransplantations of the human liver. Ann. Surg., 168: 392-415, 1968.
12. KAMATH, P.S. & KIM, R.W. — The model for end-stage liver
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13. STARZL, T.E. & BARKER, C. — The origin of clinical transplantation revisited. JAMA, 301: 2041-3, 2009.
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Surg. Gynecol. Obstet., 125: 319-27, 1967.
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16. CHAN, C.; PLATA-MUÑOZ, J.J. & FRANSSEN, B. — Técnicas
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17. KUSS, R. & BOURGET, P. — Una história ilustrada del trasplante de órganos. La gran aventura del siglo. 1. ed., Rucil-Malmaison, França, Sandoz, 1992.
JBM

NOVEMBRO/DEZEMBRO, 2013  VOL. 101  No 6
ginecologia
Apoptose no endométrio
humano e endometriose
Marcos Mendonça
Professor adjunto do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina da
Universidade Federal de Minas Gerais.
Liv Braga de Paula
Mestranda em Saúde da Mulher no Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de
Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais.
Luciana Moro
Médica veterinária. Professora adjunta do Departamento de Patologia Geral do Instituto de
Ciências Biológicas da Universidade Federal de Minas Gerais.
Resumo
Summary
A apoptose tem papel fundamental na
manutenção da homeostase tissular e na eliminação de células geneticamente alteradas
ou que albergam vírus. No ciclo menstrual,
a apoptose atua contribuindo para a homeostase celular do endométrio, eliminando as
células da camada funcional endometrial durante as fases secretora e menstrual do ciclo.
A família do oncogene Bcl-2 tem sido extensamente estudada no tecido endometrial e
endometriótico. O endométrio eutópico de
mulheres com a endometriose apresenta diferenças fundamentais ao ser comparado com o
endométrio de pacientes sem endometriose.
Essas diferenças podem ser responsáveis pela
sobrevida das células endometriais advindas
do fluxo menstrual retrógrado na cavidade
peritoneal e no desenvolvimento da endometriose. Este artigo consiste numa revisão
da literatura sobre a importância da morte
celular via apoptose no endométrio normal
e no endométrio de mulheres portadoras de
endometriose.
Apoptosis is very important in the homeostasis of tissues. Its function consists in the
elimination of the excessive or disfunctional
cells. In menstrual cycle, the role of apoptosis
is the homeostasis of endometrium, eliminating all cells of the functional layer during
secretory phase and menstruation. The oncogene Bcl-2 family has been studied in endometrium and endometriosis. Ectopic endometrium from women with endometriosis has
differences from endometrium of patients
without the disease. These differences can
be responsible for the survival of endometrial
cells regurgitated in peritoneal cavity and development of endometriosis. The apoptosis
is being studied in the pathogenesis of endometriosis. This paper consists in a review
of apoptosis, its role in the endometrium of
patients with and without endometriosis.
Introdução
Embora a primeira descrição de endometriose tenha sido feita no início do século passado,
por Sampson em 1927, e de sua prevalência ser
elevada, pouco se conhece sobre a etiologia e
fisiopatologia desta doença (1).
Com relação à etiopatogenia, várias teorias
têm sido propostas, tais como: o desenvolvimento do tecido endometrial através de metaplasia ou a partir de remanescentes müllerianos
Endometriose é o termo que define a presença de tecido glandular ou estroma endometrial funcionante fora do útero. É uma afecção
comum que ocorre em 5% a 15% das mulheres
durante o período reprodutivo (1). As manifestações clínicas mais frequentes dessa alteração
incluem: dor abdominal, dismenorreia, dispareunia e infertilidade (4).
JBM
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NOVEMBRO/DEZEMBRO, 2013
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VOL. 101  No 6
Unitermos: Apoptose;
ciclo menstrual;
endometriose.
Keywords: Apoptosis;
menstrual cycle;
endometriosis.
11
Apoptose no endométrio humano e endometriose
e o crescimento endometrial após implante de
células do endométrio presentes no fluxo menstrual retrógrado.
Vinatier, em 2001, sugeriu que além da
presença das células endometriais ectópicas,
outros fatores devem estar associados para o
desenvolvimento da endometriose. Uma das alterações evidenciadas no endométrio ectópico
e eutópico de pacientes com endometriose é a
alteração na regulação da apoptose celular.
O objetivo deste artigo é abordar a importância da morte celular via apoptose no endométrio e sua implicação na etiopatogenia da
endometriose.
ria dos casos, essas vias convergem para a
ativação de proteases de cisteína (caspases),
conduzindo à proteólise de substratos celulares vitais.
As proteínas da família Bcl-2 funcionam
como controle-chave da maquinaria efetora
de morte celular. Os membros pré-apoptóticos da família Bcl-2 possuem a habilidade de
formar canais iônicos nas membranas citoplasmáticas de mitocôndrias, no envelope nuclear
e no retículo endoplasmático. Assim, ruptura
na membrana mitocondrial resultaria em liberação de fatores indutores da apoptose (8).
Grande parte do avanço no entendimento dos eventos intracelulares reguladores da
apoptose foi proporcionada pela identificação de alguns genes, como os da família Bcl-2
(do inglês: B-cell lymphoma 2 gene) (12).
O Bcl-2 localiza-se no cromossomo 18 e
consiste em um proto-oncogene inibidor da
apoptose — é a molécula melhor caracterizada do mecanismo de apoptose e considerada um repressor da morte celular (1, 11).
Atualmente já foram descritos pelo menos
10 genes pertencentes à família Bcl-2. Com
base na sua função podemos dividi-los em
dois grupos: os inibidores da apoptose Bcl-2,
Bcl-x longo, Bcl-w e Mcl-1, e os indutores
da apoptose como Bax, Bcl-x curto, Bak e
Bad (5). Os membros da família Bcl-2 interagem através de associação homodimérica
e heterodimérica; ou seja, a suscetibilidade
de uma célula a um estímulo apoptótico é
determinada pela proporção de membros
pró-apoptóticos e antiapoptóticos presentes nas células naquele momento (5).
À microscopia de luz, as células apoptóticas apresentam-se isoladas, têm forma
irregular, tipicamente circundadas por um
halo claro (anoiquia). Tais células apresentam cromatina condensada e basofílica com citoplasma retraído e acidófilo. O
núcleo apresenta-se retraído, fortemente
basófilo, com cromatina condensada, algumas vezes compactada na carioteca sob a
forma de crescente. Os corpos apoptóticos
são principalmente visíveis quando contêm
fragmentos do núcleo (ver Figura) (10, 13).
Várias alterações moleculares podem ser
observadas quando a célula entra em apoptose e muitas delas têm sido utilizadas para
detectar esse tipo de morte celular. Entre
essas, ressalta-se a clivagem do DNA genô-
Apoptose
Pontos-chave:
> A morte celular programada
(apoptose) é um tipo de
morte celular responsável pelo
desenvolvimento e homeostase
de vários tecidos, incluindo o
endométrio;
> É um processo rápido (que
se completa em torno de três
horas) e assincrônico;
> Envolve células isoladas,
sendo regulada intrínseca e
extrinsecamente.
12
A morte celular programada (apoptose)
é um tipo de morte celular responsável pelo
desenvolvimento e homeostase de vários tecidos, incluindo o endométrio (12). Sua importância baseia-se na sua participação no
desenvolvimento embrionário e na organogênese, na renovação de células epiteliais,
na involução cíclica dos órgãos reprodutivos,
na hipotrofia induzida pela remoção de fatores de crescimento ou de hormônios, na
involução de alguns órgãos (p. ex.: timo) e
ainda na regressão de tumores (13).
A apoptose é um processo rápido (que
se completa em torno de três horas) e assincrônico. Desse modo, se cerca de 2%-3% das
células de um tecido estiverem morrendo via
apoptose em um determinado momento, haverá regressão substancial do mesmo. Assim
sendo, é um tipo de morte celular desejável
programada e seletiva, que envolve células
isoladas, sendo regulada intrínseca e extrinsecamente (13).
A morte celular programada pode ser dividida em pelo menos três fases: ativação (através
de sinais de indução da apoptose), regulação e
execução. Durante o processo ocorrem e alterações bioquímicas e estruturais celulares (1).
Com relação à indução, uma variedade
de estímulos, tais como privação de fatores
de crescimento, uso de glicocorticoides, danos no DNA, exposição à radiação ionizante,
tratamentos utilizando drogas quimioterápicas e/ou estresse, pode ativar a apoptose (1).
O mecanismo do processo de apoptose
pode ocorrer envolvendo múltiplas vias independentes, nas quais podem atuar intermediários de sinalização distintos. Na maioJBM

NOVEMBRO/DEZEMBRO, 2013

VOL. 101  No 6
Apoptose no endométrio humano e endometriose
As evidências sugerem
que a apoptose auxilia
na manutenção da
homeostase celular
durante o ciclo menstrual,
eliminando as células
da camada funcional do
endométrio nas fases
secretoras tardia e
menstrual.
Figura: Apoptose no endométrio. Corte de endométrio corado em hematoxilina-eosina, mostrando a
presença de células em apoptose em microscopia óptica com aumento de 40x. Notam-se, nas setas
brancas, os núcleos retraídos com cromatina condensada e as células com aspecto irregular, isoladas e de
halo claro pericelular (seta preta).
mico em fragmentos múltiplos de 180-200
pares de bases, que é um quadro típico de
apoptose em vários sistemas celulares. Na
apoptose, como consequência da atividade
de endonucleases, o DNA sofre fragmentação internucleossômica, sem nenhuma especificidade de sequência, porém mais intensa
na cromatina em configuração aberta. Essa
fragmentação característica do genoma é
facilmente visualizada laboratorialmente pela
eletroforese de DNA em gel de agarose, produzindo o clássico padrão em escada.
Todavia, esse método não provê informação sobre a localização histológica das
células em apoptose. Esse problema pode
ser solucionado marcando-se, in situ, as extremidades 3’-OH do DNA fragmentado.
Para tanto, utiliza-se a enzima transferase de
deoxinucleotídeo terminal (Tdt), que incorpora nucleotídeos marcados às extremidades
livres do genoma. Esse método é denominado técnica de TUNEL — marcação in situ da
fragmentação do genoma com transferase
de deoxinucleotídeo terminal (13).
Apoptose no endométrio normal
Hopwood & Levinson (14) realizaram o primeiro estudo sobre a apoptose no endoméJBM

NOVEMBRO/DEZEMBRO, 2013

trio humano e identificaram alterações morfológicas características de apoptose no endométrio que variam de acordo com a fase do
ciclo menstrual. Concluíram que há uma considerável perda de tecido epitelial glandular
com formação de corpos apoptóticos na fase
secretora tardia, pré-menstrual e menstrual, e
em menor extensão, na fase proliferativa.
As evidências sugerem que a apoptose
auxilia na manutenção da homeostase celular durante o ciclo menstrual, eliminando as
células da camada funcional do endométrio
nas fases secretoras tardia e menstrual. (1).
McLaren et al. (4), ao investigar a relação
entre Bcl-X/Bax no endométrio, observaram
que estes são encontrados predominantemente nas células epiteliais glandulares e
que a expressão de Bcl-2 é mais intensa na
fase proliferativa do ciclo menstrual (9).
A apoptose foi detectada no epitélio glandular nas fases secretora e menstrual, entretanto, muito pouco deste fenômeno pode ser
observado nas fases proliferativa ou secretora
inicial. Considerando-se a natureza cíclica da
apoptose no endométrio, parece razoável
supor que o estrogênio e a progesterona
possam regular os fatores apoptóticos no endométrio. Alguns autores sugerem que os es-
VOL. 101  No 6
13
Apoptose no endométrio humano e endometriose
teroides ovarianos podem alterar a apoptose
através da regulação da expressão dos oncogenes Bcl-2 e Bax.
Bax no endométrio eutópico de 14 pacientes
com endometriose e de 16 pacientes sem a
doença. As amostras de endométrio foram
coletadas através de curetagem com cureta
de Novak e as células apoptóticas detectadas com o uso da técnica do TUNEL. A análise da expressão do Bcl-2 e Bax foi obtida
através da realização da imuno-histoquímica.
Observou-se que a apoptose no endométrio
eutópico foi menos frequente nas pacientes
com endometriose quando comparado ao
grupo-controle — independente da fase do
ciclo menstrual. Foi evidenciado aumento na
expressão da proteína Bcl-2 na fase proliferativa do ciclo menstrual de mulheres com
endometriose e houve aumento na expressão do Bax na fase secretora de ambos os
grupos. Concluiu-se que as mulheres com
endometriose apresentam menor número de
células apoptóticas no tecido tópico e que
a sobrevida anormal destas células pode
resultar no seu crescimento em localizações
ectópicas.
Dmowski, em 2001, demonstrou que o
índice apoptótico no epitélio glandular do
endométrio foi significativamente menor nas
pacientes com endometriose quando comparadas ao grupo-controle.
Jones et al. (11) selecionaram 30 pacientes com diagnóstico de endometriose e 30
sem a doença e avaliaram a expressão do
Bcl-2 e a apoptose no endométrio tópico
de ambos os grupos. As células apoptóticas foram detectadas utilizando a técnica do
TUNEL e a expressão do Bcl-2 foi demonstrada com utilização de imuno-histoquímica.
Foi evidenciado que as células apoptóticas
eram raras no tecido endometrial do grupo-controle e não foi identificada diferença entre esse grupo e o grupo de pacientes com
endometriose. A expressão do Bcl-2 encontrava-se significativamente (p < 0,05) aumentada na fase secretora tardia do endométrio
de pacientes com endometriose.
Apoptose e endometriose
Pontos-chave:
> O endométrio eutópico
e ectópico das pacientes
portadoras de endometriose
apresenta diferenças
fundamentais em relação ao
endométrio das mulheres sem
a doença;
> Dentre estas podemos
observar as anomalias
estruturais, componentes
imunes, moléculas de
aderencia;
> Também enzimas
proteolíticas e seus inibidores,
produção de citocinas,
expressão genética e produção
proteica.
14
O endométrio eutópico e ectópico das pacientes portadoras de endometriose apresenta
diferenças fundamentais em relação ao endométrio das mulheres sem a doença. Dentre estas podemos observar as anomalias estruturais,
componentes imunes, moléculas de aderência,
enzimas proteolíticas e seus inibidores, produção de citocinas, expressão genética e produção proteica (2).
Essas alterações podem contribuir na
sobrevivência das células advindas do fluxo
menstrual retrógrado na cavidade abdominal
e no desenvolvimento da endometriose. Um
dos mecanismos que tem recebido grande
atenção atualmente é a apoptose no endométrio eutópico e ectópico das pacientes portadoras de endometriose.
McLaren et al. (4) analisaram o endométrio de 10 pacientes portadoras de endometriose e 10 pacientes sem endometriose para
investigação da expressão do Bcl-2 e Bax. A
obtenção da amostra do endométrio foi realizada através da dilatação do colo uterino com
vela de Hegar no 8 e posterior curetagem. Foi
observada maior expressão do Bcl-2 e Bax
nas pacientes com endometriose.
Gebel et al. (3) realizaram um estudo avaliando a apoptose em endométrio tópico de
20 mulheres, sendo 10 delas portadoras de
endometriose e 10 do grupo controle. Foram
incluídas pacientes submetidas à videolaparoscopia que apresentavam implantes endometriais exofíticos, das quais os fragmentos
de endométrio foram obtidos utilizando-se
cureta de Novak. A análise da apoptose foi
realizada através da detecção de morte celular baseado em ELISA. Como resultado,
demonstrou-se que a apoptose foi menos
frequente nas pacientes portadoras de endometriose do que nas pacientes sem a doença.
Essa relação se manteve mesmo após a estratificação da fase do ciclo menstrual. Com
base nos resultados, os autores descreveram
que há uma diminuição da suscetibilidade do
endométrio à apoptose que pode contribuir
para a etiopatogenia da doença.
Meresman et al. (2) avaliaram e compararam a apoptose e a expressão do Bcl-2 e
JBM
Considerações finais
A diminuição da ocorrência da apoptose
pode resultar em sobrevivência anormal das
células endometriais, sendo um dos fatores
associados à patogênese da endometriose.

NOVEMBRO/DEZEMBRO, 2013

VOL. 101  No 6
Apoptose no endométrio humano e endometriose
Referências
1. Harada, T.; Kaponis, A. et al. — Apoptosis in human endometrium and endometriosis. Hum. Reprod. Update, 10:
29-38, 2004.
2. Meresman, F.G.; Vighi, S. et al. — Apoptosis and expression of Bcl-2 and Bax in eutopic endometrium from women
with endometriosis. Fertil. Steril., 74: 760-6, 2000.
3. Gebel, M.H.; Braun, D.P. et al. — Spontaneous apoptosis
of endometrial tissues impaired in women with endometriosis. Fertil. Steril., 69: 1042-7, 1998.
4. McLaren, J.; Prentice, A. et al. — Immunolocalization of
the apoptosis regulating proteins Bcl-2 and Bax in human
endometrium and isolated peritoneal fluid macrophages in
endometriosis. Hum. Reprod., 12: 146-52, 1997.
5. Tao, X.J.; Sayegh, R.A. et al. — Elevated expression of the
proapoptotic Bcl-2 family member, Bak, in the human endometrium coincident with apoptosis during the secretory
phase of the cycle. Fertil. Steril., 70: 338-43, 1998.
6. Orazi, V.D.; Cosson, M. & Dufour, P. — Theories of
endometriosis. Eur. J. Obstet. Gynecol. Reprod. Biol., 96:
21-34, 2001.
7. Timms, K.L. — Endometrial anomalies in women with endometriosis. Ann. N.Y. Acad. Sci., 943: 131-47, 2001.
8. O’Reilly, L.A. & Strasser, A. — Apoptosis and autoimmune disease. Inflamm. Res., 48: 5-21, 1999.
9. Gompel, A.; Sabourin, J.C. et al. — Bcl-2 expression in
normal endometrium during the menstrual cycle. Am. J. Pathol., 6: 1195-202, 1994.
10. Silva, M.B. — Ultra-estrutura do endométrio de rata após
castração: Autofagocitose e apoptose. Tese de Mestrado.
Belo Horizonte, Faculdade de Medicina, UFMG, 1998.
Obs.: As oito referências restantes que compõem este artigo se
encontram na Redação, à disposição dos interessados.
Endereço para
correspondência:
Marcos Mendonça
Rua Gustavo Pena, 44 —
4o andar — Bairro Horto
31015-060
Belo Horizonte-MG
mendoç[email protected]
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JBM

NOVEMBRO/DEZEMBRO, 2013
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VOL. 101  No 6
15
atualidades médicas
Novas diretrizes para redução
global do risco cardiovascular
Circulation
As doenças cardiovasculares (DCVs)
constituem a principal causa de morbidade
e mortalidade em todo o mundo. Em 12
de novembro de 2013, a American Heart
Association (AHA) e o American College of
Cardiology (ACC) publicaram, no periódico
Circulation, novas diretrizes visando à redução do risco de DCVs, com foco em quatro aspectos principais: estimativa de risco
cardiovascular, modificações de hábitos de
vida, manejo da obesidade e manejo da dislipidemia, conforme resumido a seguir.
Diretrizes da ACC/AHA para
estimativa de risco cardiovascular
A correlação entre fatores de risco específicos e a probabilidade de desenvolvimento de DCVs é um conceito bem estabelecido, de modo que a identificação e correção
desses fatores é etapa fundamental na prevenção das DCVs. No artigo “2013 ACC/
AHA Guideline on the Assessment of Cardiovascular Risk”, Goff D.C. e colaboradores
descrevem uma nova fórmula para predizer
o risco, em 10 anos, de desenvolvimento
de um primeiro evento aterosclerótico cardiovascular (infarto agudo do miocárdio não
fatal, doença arterial coronária, acidente
vascular encefálico fatal ou não). A equação
inclui fatores como idade, sexo, etnia, nível
plasmático de colesterol (total e LDL), valor
da pressão arterial sistólica, tabagismo e perfil glicêmico, tendo sido elaborada especialmente para uso em indivíduos entre 40 e 79
anos de idade, brancos e negros não hispânicos. Características como histórico familiar
de DCV, pressão arterial diastólica, doença
renal crônica moderada ou grave e índice
de massa corpórea (IMC) são descritas pelos
autores como marcadores de risco adicional,
mas que não auxiliaram significativamente
na discriminação do risco em 10 anos.
16
Profa. Dra. Andréa F. Mendes
Diretrizes do ACC/AHA para redução
do risco de DCV com base em
modificações nos hábitos de vida
Hábitos de vida saudáveis constituem
etapa fundamental na prevenção das DCVs,
sendo esse aspecto também abordado nas
novas diretrizes (“2013 ACC/AHA Guideline
on Lifestyle Management to Reduce Cardiovascular Risk”). Redigidas por Eckel R.H.
e colaboradores, têm como foco os efeitos
da dieta e da atividade física na redução
da pressão arterial e dos níveis plasmáticos
de LDL-colesterol (LDL-col), consolidando e
harmonizando recomendações já difundidas
em diversas publicações prévias. Entre os
principais pontos destacados está a recomendação de uma dieta rica em frutas, vegetais e fibras, além de derivados do leite
com baixo teor de gordura. Como fontes de
proteína para uma dieta saudável destacam-se peixe, legumes e frango; como fontes
de gordura estão óleos vegetais e nozes.
Adicionalmente, com o intuito de reduzir o
LDL-col, apenas 5%-6% das calorias de uma
dieta ideal devem ser provenientes de gordura saturada, com ênfase na importância
de se minimizar a percentagem de gordura
trans. Os autores lembram ainda das sólidas
evidências de que a redução da ingesta de
sódio em aproximadamente 1g/dia diminui
o risco de eventos cardiovasculares em cerca de 30%. Assim, visando reduzir a pressão
arterial, o consumo dietético diário de sódio
não deve exceder 2,4g, se possível ficando
abaixo de 1,5g.
Diretrizes do ACC/AHA para manejo
da obesidade
A obesidade é, sem dúvida, um problema de saúde mundial: estima-se que mais
da metade da população adulta apresente
sobrepeso (IMC superior a 25kg/m2) ou obesidade (IMC superior a 30kg/m2). Diversos
estudos comprovam que a obesidade eleva
a morbidade e a mortalidade por diversas
JBM

causas, incluindo DCVs. Assim, Jensen M.D.
e colaboradores revisaram aspectos importantes no diagnóstico e tratamento dessa
condição, especialmente em indivíduos com
outros fatores de risco de DCV e em diabéticos (“2013 AHA/ACC/TOS Guideline for the
Management of Overweight and Obesity in
Adults”). Os autores concluem que não há
dieta ideal; entretanto, recomendam que
indivíduos com sobrepeso ou obesidade
sejam orientados a aderir a programa de
reeducação alimentar com redução da ingesta calórica. A dieta deve ser prescrita por
especialista em nutrição e indivualizada, respeitando preferências e o estado global de
saúde de cada paciente; deve fazer parte de
um programa global de modificações de hábitos de vida e ser mantida inicialmente por
pelo menos seis meses.
Diretrizes do ACC/AHA para manejo
da dislipidemia
As novas diretrizes do ACC/AHA abordam
ainda o manejo das dislipidemias, trazendo
novas recomendações com base em estudos
randomizados e controlados que utilizam doses fixas de estatinas em populações de pacientes que apresentam risco elevado de DCV
aterosclerótica (“2013 ACC/AHA Guideline on
the Treatment of Blood Cholesterol to Reduce
Atherosclerotic Cardiovascular Risk in Adults”).
Assim, quando comparadas às diretrizes prévias, destaca-se que as atuais não mais utilizam
níveis-alvo de LDL-col para guiar a terapia
farmacológica. Stone N.J. e colaboradores
identificaram quatro subgrupos de pacientes
nos quais os benefícios da utilização de estatina são claramente superiores aos seus riscos,
a saber: 1. pacientes com DCV aterosclerótica
evidente do ponto de vista clínico; 2. pacientes
com LDL-col ≥ 190mg/dl; 3. diabéticos com
LDL-col ≥ 70mg/dl; 4. risco de DCV em 10 anos
estimado como superior a 7,5% (conforme fórmula citada anteriormente), em indivíduos com
LDL-col ≥ 70mg/dl. Para esses subgrupos, os
autores recomendam terapia farmacológica
de alta intensidade (atorvastatina 40-80mg/dia
ou rosuvastatina 20-40mg/dia), visando reduzir
em pelo menos 50% os valores plasmáticos
de LDL-col. Naqueles com idade superior a
75 anos, em diabéticos com risco em 10 anos
inferior a 7,5% e naqueles que não tolerarem
essa forma de tratamento, deve-se optar pela
terapia dita de intensidade moderada (atorvastatina 10-20mg/dia, rosuvastatina 5-10mg/
dia, sinvastatina 20-40mg/dia ou pravastatina
40-80mg/dia), visando reduzir o LDL-col em
30%-50%. Cabe lembrar que todos os pacientes que usam estatina devem ser monitorados
quanto ao risco de lesão hepática e muscular,
além de diabetes de início recente.
NOVEMBRO/DEZEMBRO, 2013  VOL. 101  No 6
cardiologia
Síncope vasovagal em criança
com Wolff-Parkinson-White
Maria Natividade Santos Costa Lopes
Médica cardiologista do Prontocor/Hospital Anchieta — Taguatinga e Fundação Hemocentro de
Brasília, DF.
Cecílio Kassem Salamé
Médico cardiologista do Prontocor/Hospital Anchieta e Hospital Regional de Taguatinga, DF.
Camila Costa Oliveira
Residente de Clínica Médica do Hospital Regional do Paranoá, DF.
Resumo
Summary
Relatamos o caso de uma criança de nove
anos de idade, com quadro de síncope há dois
anos e eletrocardiograma revelando síndrome
de Wolff-Parkinson-White (WPW). História familiar de irmã com síndrome vasovagal. A paciente foi submetida a estudo eletrofisiológico
(EEF), para estratificação de risco e ablação da
via anômala. Após a ablação, permaneceu com
os mesmos sintomas que a fizeram procurar
atendimento médico na primeira consulta, sendo então solicitado teste de inclinação (tilt test),
que foi positivo para síndrome vasovagal do
tipo mista. Conclui-se, portanto, que a causa
dos desmaios foi a síndrome vasovagal, sendo
as alterações eletrocardiográficas compatíveis
com Wolff-Parkinson-White apenas um achado
casual. Dois anos após a primeira consulta ela
apresenta aumento dos intervalos entre os episódios de síncope.
We report a case of a child nine years
old, presented with syncope about two years, with electrocardiogram Wolff-Parkinson-White (WPW) and family history of a sister
with vasovagal syndrome. The patient underwent electrophysiological study (EPS) for
risk stratification and ablation of the anomalous pathway. After ablation remained with
the same symptoms that caused her to seek
medical attention at the first consultation,
and then asked the tilt test, which was positive for mixed type of vasovagal syndrome.
Therefore concluded to be the syncope’s
cause, the vasovagal syndrome and electrocardiographic changes compatible with
Wolff-Parkinson-White, being just an incidental finding. Two years after the first consultation, she finds with increase interval between
episodes of syncope.
Introdução
As síncopes cardíacas podem manifestar-se em decorrência de disfunção miocárdica,
obstrução anatômica ou funcional ao fluxo
sanguíneo ou de distúrbio do ritmo cardíaco,
com consequente comprometimento da perfusão cerebral (3).
A presença de síndrome de Wolff-Parkinson-White (WPW) tem sido relatada em 0,1 a
3,0/1.000 em uma população aparentemente saudável. A incidência de síncope
na síndrome de WPW tem sido relatada
como de 19% a 36% nas populações dos
estudos (5, 6).
Em pacientes com síndrome de WPW a
síncope é marcador de mau prognóstico.
A ocorrência de fibrilação atrial com alta
resposta ventricular deve ser considerada
Síncope é a perda transitória da consciência e do tônus postural secundária à perfusão cerebral inadequada, com recuperação
espontânea (1). Afeta em torno de 3% da população geral e 15% a 50% dos adolescentes
têm ao menos um episódio (1).
Os mecanismos desencadeantes são múltiplos, podendo variar de mais benignos,
como as neuromediadas, até os de mortalidade (18% a 33%), aqueles associados às
cardiopatias estruturais ou arritmias cardíacas (2). A causa mais comum de síncope é
dita vasovagal, neurocardiogênica ou neuromediada, diagnosticada em 35% a 38% da
população geral, tendo sido detalhada por
Gowers em 1901 (1).
JBM

NOVEMBRO/DEZEMBRO, 2013  VOL. 101  No 6
Unitermos: Síncope;
criança; síndrome
vasovagal;
Wolff-Parkinson-White.
Keywords: Syncope;
child; vasovagal syndrome;
Wolff-Parkinson-White.
17
Síncope vasovagal em criança com Wolff-Parkinson-White
como a mais provável causa responsável
pelos episódios sincopais. No entanto, mecanismos fisiopatológicos autonômicos também podem estar envolvidos na gênese da
síncope destes pacientes, neste caso com
prognóstico favorável (3), como ocorreu
com a paciente em questão.
de onda delta (Figura 2). O ecocardiograma
apresentava FE de 72%, câmaras cardíacas,
valvas, aorta e pericárdio normais.
Foi encaminhada ao serviço de arritmia
de um hospital terciário, para estratificação
de risco da WPW, sendo submetida a estudo eletrofisiológico (EEF), que foi compatível
com via acessória lateral esquerda benigna
de condução somente anterógrada. Realizada ablação da via anômala com sucesso e
sem complicações, ficando o ECG de base
normal (Figura 3).
Após seis meses da ablação retornou ao
ambulatório de Cardiologia, para controle,
quando referiu os mesmos sintomas da primeira consulta, sendo então solicitado teste
de inclinação, ou tilt test, que foi positivo
para síndrome vasovagal do tipo mista, inicialmente vasodepressora e cardioinibitória
tardiamente, com pré-síncope. Houve reprodução dos sintomas em relação ao episódio
espontâneo (Figura 4).
Recebeu alta com prescrição de atenolol,
orientação para modificações do comportamento — como ingestão de líquidos e sal e
eliminação de agentes ou comportamentos
que possam causar hipotensão ou desidratação — e instruções para identificação dos
sintomas precedentes aos desmaios, com o
objetivo de interrompê-los.
Relato do caso
Pontos-chave:
> Síncope é a perda transitória
da consciência e do tônus
postural secundária à perfusão
cerebral inadequada;
> Afeta em torno de 3% da
população geral;
> 15% a 50% dos adolescentes
têm ao menos um episódio.
18
Paciente com nove anos de idade, do
sexo feminino, estudante, natural e procedente do Distrito Federal, procurou o
Serviço de Cardiologia de um hospital de
Taguatinga, acompanhada da mãe, com
queixa de desmaios, iniciados há aproximadamente dois anos. Os episódios eram
precedidos de náuseas e tontura, e nos
últimos meses vinham ocorrendo até três
vezes por mês. Os desmaios, de curta duração, ocorriam sem perda de consciência. Não havia contrações tônico-clônicas,
sialorreia ou relaxamento de esfíncteres.
Aconteciam com mais frequência diante
de ansiedade. A paciente não tinha antecedentes patológicos e negava uso de
medicação. Fazia Educação Física no colégio duas vezes por semana e negava desmaios durante as aulas. Informou que uma
irmã mais velha apresentava diagnóstico
de síncope vasovagal. O exame físico foi
normal.
Realizou-se eletrocardiograma, que revelou intervalo PR
curto (0,08seg), com retardo no
início dos complexos QRS, devido à presença de onda delta,
compatível com Wolff-Parkinson-White (Figura 1).
O Holter de 24 horas mostrou ritmo sinusal com FV média
de 100bpm, intervalo PR curto,
complexos QRS alargados, presença de ondas delta, extrassístole supraventricular isolada
(uma), pareada (uma) e taquicardias paroxísticas supraventriculares (quatro), com três e quatro
batimentos, com FC variando
de 100 a 128bpm, ausência de
eventos ventriculares, alterações
da repolarização ventricular secundárias ao complexo QRS
resultante de um complexo de
fusão (ativação ventricular nor- Figura 1: ECG à admissão — intervalo PR curto e empastamento
mal e anormal) com presença no início do complexo QRS devido à presença da onda delta.
JBM

NOVEMBRO/DEZEMBRO, 2013  VOL. 101  No 6
Síncope vasovagal em criança com Wolff-Parkinson-White
Figura 2: Holter de 24 horas mostrando taquicardias paroxísticas
supraventriculares (TPSVs) (atriais) não sustentadas, intervalo PR
curto e complexo QRS alargado com onda delta.
Figura 3: ECG após ablação da via anômala. Intervalo PR
normal e complexo QRS estreito, sem onda delta.
Discussão
A síncope em jovens geralmente é um evento benigno, mas deve ser feita uma
avaliação cuidadosa, visando
afastar causas com potencial
risco de vida (1).
Episódios isolados de síncope em indivíduos sem cardiopatia não requerem investigação diagnóstica, a menos
que se apresentem sem pródromos, após exercícios, em
atletas (ou outras profissões
de risco) ou estejam relacionados a traumas físicos
decorrentes de quedas. Em
pacientes não cardiopatas,
apesar do prognóstico bastante favorável, a recorrência
frequente de síncope implica
Figura 4: Tilt test, ou teste de inclinação, com gráfico mostrando
em maior morbidade e comqueda da PA seguida da FC tardiamente.
prometimento significativo
da qualidade de vida. Por
isso recomenda-se investigação diagnóstica
Retornou 14 meses após a última consulnão invasiva ampla e detalhada (3).
ta, relatando episódios de desmaios, com
ligeiro espaçamento entre eles. EncontravaNa síncope vasovagal ou reflexa o meca-se sem medicação, já que não a havia tonismo fisiopatológico tem como via final colerado.
mum o aumento da estimulação vagal sobre
JBM

NOVEMBRO/DEZEMBRO, 2013  VOL. 101  No 6
19
Síncope vasovagal em criança com Wolff-Parkinson-White
Endereço para
correspondência:
Maria Natividade Santos Costa
Lopes
SHIN QI 02 — Conj. 04 —
Cs. 16 — Lago Norte
75510-040
Brasília-DF
[email protected]
20
o coração e a inibição do influxo simpático
para o leito vascular. Vários sítios processam
os estímulos deflagradores no organismo.
Em algumas situações, como dor intensa,
emoções fortes e flebotomia, a resposta
vasovagal ocorre por estimulação de mecanismos hipotalâmicos. Em outras situações,
o estímulo deflagrador parte de estruturas
sensoriais localizadas no trato gastrointestinal, geniturinário, pulmões ou mesmo de
alterações químicas resultantes de isquemia
miocárdica (3, 4).
Nas síncopes arrítmicas, episódios de
bradicardia e de taquicardia podem provocar redução súbita do débito cardíaco, mas
a síncope, entretanto, depende de outros
fatores associados, como grau de disfunção
ventricular e resposta vascular periférica à
redução do débito cardíaco. Sabe-se que
os pacientes com disfunção ventricular grave são mais sensíveis às flutuações da FC
do que aqueles com função ventricular mais
preservada (3).
A síncope é manifestação clínica comum
em pacientes com taquicardia paroxística
supraventricular, quando em postura ortostática, pela ocorrência de fenômenos vasomotores reflexos e não propriamente pela magnitude da FC (3).
No caso em questão, na avaliação clínica inicial foram encontrados, de positivo,
ECG com WPW e história familiar de irmã
portadora de síndrome vasovagal. A alteração eletrocardiográfica foi relevante para
se pensar em causa cardíaca. O Holter de
24 horas apresentava taquicardia paroxística supraventricular não sustentada, porém
sabemos que o sistema de monitorização
com Holter de 24 horas tem demonstrado
correlação de distúrbio do ritmo, com sintomas a esclarecer em menos de 5% dos
casos de síncope. Não é considerado um
método de eleição para diagnóstico de
síncope inexplicada, e sim o loop event
recorder, com duração de 30 dias, que
possibilita esclarecer etiologias em aproximadamente 25% dos casos (4). Como o
Serviço de Cardiologia deste hospital não
dispunha de tal exame, foi utilizado o método de investigação com o Holter de 24
horas. Portanto, a investigação foi direcionada para a patologia mais grave, sendo
então solicitado EEF para estratificação de
risco e ablação de via anômala. Somente
depois, na evolução sem melhora dos sintomas, voltou a se pensar na síncope vasovagal, causa mais frequente de desmaios
entre os jovens, com solicitação do tilt test
e confirmação da mesma, com reprodução
dos sintomas das crises espontâneas.
Podemos concluir que apesar de a taquiarritmia ser comum, podendo causar
sintomas de tontura e síncope, é importante
pensarmos em síndrome vasovagal para explicarmos uma síncope em paciente jovem,
com ECG de síndrome de Wolff-Parkinson-White, já que o achado eletrocardiográfico
pode ser uma coincidência, e o tratamento
deve ser direcionado sempre para a correção da causa mais provável.
Referências
14. LOPES, M.N.; SALAMÉ, C.K. et al. — Síncope neurocardiogênica maligna em uma mulher. Brasília Med., 44(2): 146-51,
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15. NUNES, R.R.; CAVALCANTE, S.L. et al. — Avaliação pré-operatória: Conduta em paciente com síndrome de WPW.
Relato de caso. Rev. Bras. Anestesiol. 49(2): 115-7, 1999.
16. GANDHI, N.M. & BENNETT, D.H. — Malignant vasovagal syndrome in two patients with Wolff-Parkinson-White.
Syndrome Regional Cardiothoracic Centre, Wythenshawe [internet]. Acessado em 26/08/2010. Disponível em:
www.ncbi.nlm.nih.gov. Journal List Heart, 90(4): Apr
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11. SILVA, L.B.M.S. — Síncope em adolescentes. Rev. Soc. Card.
Rio Grande do Sul [internet] ano XIII no 01, 2004. Acessado
em 31/08/2010. Disponível em: sociedades.cardiol.br/sbc-rs/revista/2004/01/artigo11.pdf-similares.
12. HABIB, R.G.; MOREIRA, D.A.R. et al. — Síncope [internet].
Acessado em 31/08/2010. Disponível em: http://artigos.
netsaber.com.br/resumo_artigo_1852/artigo_sobre_sincope.
13. HACHUL, D. — Diagnóstico diferencial e abordagem clínica da síncope. [internet]. Acessado em 31/08/2010. Disponível em: http://www.cibersaude.com.br/revista.asp?id_
materia=906&fase=imprime.
JBM

NOVEMBRO/DEZEMBRO, 2013  VOL. 101  No 6
pneumologia
Dificuldades no diagnóstico diferencial entre
mesotelioma pleural e adenocarcinoma
metastático para pleura patológica
Beltrão Paiva Castello Branco
Médico pneumologista do Complexo Hospitalar Clementino Fraga — João Pessoa, PB.
Fernando Antonio Carvalho
Médico cirurgião torácico do Hospital Napoleão Laureano — João Pessoa, PB.
Francisco de Assis Paiva
Médico infectologista do Complexo Hospitalar Clementino Fraga — João Pessoa, PB.
Igor Torres Castello Branco
Técnico em Radiologia do Complexo Hospitalar Clementino Fraga — João Pessoa, PB.
Resumo
Summary
As dificuldades diagnósticas entre mesotelioma pleural e adenocarcinoma metastático
na pleura exigem estudo amplo. Os autores
ilustram um caso clínico cujo diagnóstico só
foi estabelecido após realização de toracotomia, com retirada de material para análise
imuno-histoquímica. A diferenciação diagnóstica é de fundamental importância, uma vez
que envolvem conduta terapêutica e prognóstico distintos. O estudo adequado deve
utilizar material obtido através de toracoscopia ou toracotomia e empregar coloração
imuno-histoquímica, estudos com anticorpos
monoclonais, microscopia eletrônica e pesquisa de marcadores tumorais.
The diagnosis difficulties distinguishing
mesothelioma from pleural metastatic adenocarcinoma request wide study. The authors illustrate a clinical case whose diagnosis was only established after thoracotomy
removing material for immune-histochemical analysis. The diagnosis differentiating is
very important, because involves distinct
treatment and prognosis. The appropriate
study should use material obtained through
thoracoscopy or thoracotomy and submitted to immune-histochemical coloration,
studies with monoclonal antibodies, electronic microscopy and research of tumor
makers.
Introdução
mão é o mais frequente, seguido do carcinoma de mama; os carcinomas de ovário e
estômago também podem estar relacionados, e menos frequentemente o carcinoma
de endométrio ou do colo uterino, carcinoma de cólon, tumor de pâncreas e tumor de
bexiga. O tumor primário não é encontrado
em aproximadamente 6% dos pacientes com
derrame pleural neoplásico metastático. O
adenocarcinoma é considerado atualmente o tipo histológico de câncer pulmonar
mais comum, mais frequente em mulheres
e menos relacionado ao tabagismo, tendo
localização periférica em 75% dos casos. No
momento do diagnóstico, em torno de 15%
dos pacientes apresentam derrame pleural,
aumentando para 50% durante a evolução
da doença.
A dificuldade de se diferenciar o mesotelioma de pleura do adenocarcinoma metastático para pleura é histórica. Antes de 1931
não existia o termo mesotelioma. Nesse período, Klempere e Rabim propuseram essa
denominação para algumas das neoplasias
pleurais.
Em 1942, Stout e Murray documentaram
a origem dos mesoteliomas relacionados às
células mesoteliais da pleura. Mccaughey,
em 1958, foi quem primeiro classificou os
mesoteliomas da pleura. Sua correlação com
o asbesto foi feita finalmente por Wagner, em
1960.
O adenocarcinoma metastático pleural
pode-se originar de diferentes sítios primários. Dentre eles, o adenocarcinoma de pul-
JBM

NOVEMBRO/DEZEMBRO, 2013  VOL. 101  No 6
Unitermos: Mesotelioma;
adenocarcinoma metastático
pleural; diagnóstico;
imuno-histoquímica.
Keywords: Mesothelioma;
pleural metastatic
adenocarcinoma; diagnosis;
immunohistochemical.
21
Dificuldades no diagnóstico diferencial entre mesotelioma pleural
e adenocarcinoma metastático para pleura patológica
Pontos-chave:
> O quadro clínico do
mesotelioma é o mesmo
do derrame pleural;
> Inclui dor torácica
ventilatório-dependente,
dispneia, tosse seca;
> Posteriormente, perda de
peso ou sinais de invasão
de estruturas vizinhas, como
diafragma, traqueia, esôfago,
veia cava superior e nervo
laríngeo recorrente.
22
Segundo fontes do U.S. National Cancer
Institute Statistic Branch, a incidência dos
mesoteliomas em 1973 era de 0,5 caso/100
mil habitantes, saltando atualmente para 1,9
caso/100 mil habitantes; isto se deve à expansão explosiva da indústria e ao uso crescente de asbesto nas décadas de 60 e 70.
Altman, em 1981, refere que o mesotelioma
acomete mais os homens (na proporção de
3:1) com idades entre 50 e 70 anos. Os alvos
de maior risco são os trabalhadores expostos
ao asbesto, como os da construção de navios, refrigeradores de ar e aquecedores. Relata também o que ele chama de exposição
paraocupacional — pessoas que moram na
mesma casa ou vizinhança dos trabalhadores
expostos ao asbesto. Outros possíveis fatores associados ao desenvolvimento do mesotelioma são: infecção viral (simian vírus-40),
radioterapia, pleurodese com determinados
talcos e inalação de outras fibras orgânicas
(p. ex.: erionita).
O quadro clínico do mesotelioma é o
mesmo do derrame pleural: dor torácica ventilatório-dependente, dispneia, tosse seca;
posteriormente, perda de peso ou sinais de
invasão de estruturas vizinhas, como diafragma, traqueia, esôfago, veia cava superior e
nervo laríngeo recorrente.
No adenocarcinoma metastático pleural o
quadro clínico também consiste de derrame
pleural, além de manifestações específicas
do seu sítio primário tumoral.
Com relação aos exames, no mesotelioma pleural a radiografia de tórax lembra a de
um derrame pleural septado. A tomografia
computadorizada de tórax é um exame de
excelente sensibilidade (88%) e de moderada especificidade (69%). Como achados
mais frequentes são descritos: espessamento
pleural irregular, às vezes nodular; espessamento da cissura interlobar; decréscimo do
volume do hemitórax acometido; fixação
precoce do mediastino; nódulos ou massas
pleurais. A ressonância magnética é muito
útil no estadiamento, no que se refere à invasão de mediastino, parede torácica ou diafragma. Um exame considerado excelente na
diferenciação de lesões benignas e malignas,
principalmente quando negativo, é o PET-SCAM. Sua sensibilidade pode alcançar 91%
e a especificidade, 100%.
Por conta da dificuldade diagnóstica, uma
série de exames laboratoriais vem sendo utilizada para esse fim. Embora o diagnóstico de
JBM
malignidade possa ser obtido por esfregaço
citológico ou biopsia por agulha da pleura,
esses procedimentos, em geral, não podem
distinguir entre adenocarcinoma metastático
e mesotelioma, sendo necessários processos
mais invasivos para fornecer maior amostra
de tecido. A toracoscopia é o procedimento
de escolha, porque a exibição diagnóstica é
semelhante à da toracotomia aberta, mas o
processo é menos invasivo.
Relato do caso
Identificação
G.P.S., 65 anos de idade, sexo masculino,
casado, brasileiro, pedreiro. Natural de João
Pessoa (PB) e morador de Santa Rita há 30
anos. Paciente melanodérmico, tabagista, e
tossígono crônico.
Relato
O paciente, tabagista, consumidor de 25
maços/ano, com diagnóstico de doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC), apresentou, quatro meses antes, dor do tipo “fisgada” em região mamária direita, acompanhada do aparecimento de massa tumoral local.
Admitido em setembro de 2002, para investigação diagnóstica. Ao exame físico encontrava-se lúcido, orientado no tempo e no espaço, em bom estado geral, taquipneico (FR:
26ipm), normotenso (PA: 130 x 80mmHg),
com frequência cardíaca de 90bpm, afebril
(Tax: 36ºC), hipocorado 2+/4+; ausência de
adenomegalias periféricas e de baqueteamento digital; tórax com massa palpável e de
consistência pétrea, aderida aos planos profundos, sem sinais flogísticos, medindo aproximadamente 6cm no seu maior diâmetro,
localizada na região mamária direita; aparelho respiratório: expansibilidade, mobilidade
e frêmito toracovocal diminuídos na base do
pulmão direito, maciez à percussão e murmúrio vesicular diminuído na região mamária
direita. Restante do exame sem alteração.
Na investigação do caso clínico foram
realizados:
1. Telerradiografia do tórax: Presença de lesão
lítica de 4o e 5o arcos costais anteriores, hiperinsuflação pulmonar, imagem de hipotransparência homogênea de bordos bem
definidos, justapleural, medindo aproximadamente 6cm no seu maior diâmetro, localizada predominantemente no terço médio
do hemitórax direito (Figuras 1a e 1b).

NOVEMBRO/DEZEMBRO, 2013  VOL. 101  No 6
Dificuldades no diagnóstico diferencial entre mesotelioma pleural
e adenocarcinoma metastático para pleura patológica
5. Tomografia computadorizada do tórax: Tumor de parede costal à direita invadindo
o 5o arco costal (destruindo-o); pleura e
pulmão adjacentes de aproximadamente
6,5cm de diâmetro (Figuras 2a, 2b e 2c).
Figura 2a: Tomografia do tórax, visão
panorâmica: tumor de aproximadamente 6,5cm
de diâmetro, no terço médio do hemitórax
direito.
Figura 2b: Tomografia do tórax, janela de
mediastino: tumor invadindo o 5o arco costal,
pleura e pulmão adjacentes.
Figuras 1a e 1b: Radiografias do tórax em PA
e perfil, respectivamente: hipotransparência
justapleural localizada no terço médio do
hemitórax direito.
2.Hemograma: Anemia hipocrômica e microcítica. Hematócrito: 32%; hemoglobina: 10,5g/dl; ferro sérico: 50mg/dl; capacidade de combinação de transferrina:
172mg/dl; leucograma e coagulograma
normais.
3. Eletrocardiograma: Ritmo sinusal, SÂQRS
entre 0º e 30º e ausência de bloqueios ou
arritmias.
4. Provas de função respiratória: A espirometria revelou obstrução pura de grau acentuado (VEF1/CVF: 46% do teórico previsto)
com prova broncodilatadora negativa, e
gasometria arterial em ar ambiente com
hipoxemia moderada (PaO2: 63mmHg).
JBM

Figura 2c: Tomografia do tórax, janela para
pulmão: tumor invadindo o 5o arco costal, pleura
e pulmão adjacentes.
6. Aspirado de massa tumoral: Neoplasia maligna sugerindo mesotelioma, não sendo
possível afastar adenocarcinoma ou sarcoma. A citologia não lembra plasmocitoma.
NOVEMBRO/DEZEMBRO, 2013  VOL. 101  No 6
23
Dificuldades no diagnóstico diferencial entre mesotelioma pleural
e adenocarcinoma metastático para pleura patológica
Embora o estudo citológico não possa
assegurar a distinção entre os dois tipos patológicos, alguns aspectos são sugestivos:
agregação papilar, multinuclear, com atipia
e aposição célula a célula no mesotelioma;
estruturas acinoides e vacuolização em balão
no adenocarcinoma.
O corante ácido periódico de Schiff é o
método histoquímico mais confiável. Através
dele, a presença de vacúolo fortemente positivo estabelece eficazmente o diagnóstico
de adenocarcinoma, embora nem todos os
adenocarcinomas assumam essa coloração.
Normalmente, o adenocarcinoma brônquico não exige estudo imuno-histoquímico, exceto nos casos em que é necessário
diferenciá-lo do adenocarcinoma metastático e do mesotelioma pleural. Os adenocarcinomas geralmente apresentam citoqueratinas de alto e baixo peso molecular, porém
de baixo valor para diferenciação de mesotelioma; são positivos também para EMA
(antígeno de membrana epitelial), CEA (antígeno carcinoembrionário) e B72.3. Aproximadamente um quarto dos adenocarcinomas brônquicos apresenta vimentina, e
dois terços são positivos para componente
secretório. A análise imuno-histoquímica
do fluido pleural inclui os marcadores tumorais CEA, Leu-M1 e CYFRA 21-1. Se o
CEA e o Leu-M1 forem positivos, indicam
adenocarcinoma; caso contrário, sugerem
mesotelioma. Altos níveis de CYFRA 21-1
com baixos níveis de CEA sugerem mesotelioma.
A pesquisa de marcadores tumorais no
sangue periférico ajuda a elucidar o diagnóstico. A presença de CEA sérico elevado é
sugestiva de adenocarcinoma; já a existência
de CA-125 sugere adenocarcinoma seroso
do ovário; e a presença de CA 15-3 é indicativa de adenocarcinoma intraductal da mama.
A microscopia eletrônica é também eficaz para diferenciar os mesoteliomas e
adenocarcinomas metastáticos. Os mesoteliomas apresentam características quase
diagnósticas: ausência de radículas centrais
nas microvilosidades, de corpúsculos glicocaliceais e grânulos secretórios, presença de
desmossomos intracelulares, de complexos
juncionais abundantes, de lumes intracitoplasmáticos e de numerosas microvilosidades características. O aspecto das microvilosidades é fator importante para diferenciar
os tipos histológicos em questão. No meso-
7.Broncofibroscopia: Sem lesão intracanalicular visível. Lavado broncoalveolar negativo para tuberculose, actinomicose, fungos e células malignas.
8.Biopsia de massa tumoral: Mesotelioma
bifásico.
9. Antígeno carcinoembriônico sérico (CEA):
32ng (normal: 0-25ng).
Pontos-chave:
> O adenocarcinoma
brônquico não exige estudo
imuno-histoquímico;
> Exceto nos casos em que
é necessário diferenciá-lo do
adenocarcinoma metastático e
do mesotelioma pleural;
> Os adenocarcinomas
geralmente apresentam
citoqueratinas de alto e baixo
peso molecular, porém de
baixo valor para diferenciação
de mesotelioma.
24
Após a biopsia houve drenagem de material serossanguinolento em grande quantidade, com sinais inflamatórios exuberantes. Fez
uso de antibioticoterapia (cefalotina durante
14 dias), evoluindo com melhora dos sinais
inflamatórios, porém com persistência da drenagem espontânea. Foi colhida amostra desse
material para estudo, que evidenciou a presença de raras células neoplásicas malignas.
Em virtude dos resultados encontrados,
optou-se por toracotomia diagnóstica e terapêutica (com finalidade higiênica).
Descrição da intervenção cirúrgica: presença de tumoração de parede torácica com
invasão do músculo peitoral menor e de parte
do músculo peitoral maior; aderência do tumor ao pulmão (lobo médio), porém o mesmo se encontrava contido pela pleura; aderência em ápice; presença de nódulo em lobo
inferior, de aproximadamente 1,5cm de diâmetro. Foram realizadas toracotomia anterior
(reconstrução com tela de Marlex) e exérese
do nódulo do lobo inferior direito. Evoluiu no
pós-operatório com pneumotórax hipertensivo e parada cardiorrespiratória, não responsiva às manobras clássicas de reanimação.
O estudo histopatológico das peças cirúrgicas (nódulos de pulmão, tumor de parede
torácica, costelas, músculos, tecido celular
subcutâneo e pele) revelou adenocarcinoma
moderadamente diferenciado. Foi realizado
estudo imuno-histoquímico com CEA, que
foi positivo.
Discussão
Este relato de caso corrobora a literatura a
respeito da eventual dificuldade diagnóstica
entre mesotelioma e adenocarcinoma metastático pleural.
A confirmação diagnóstica deve empregar
coloração imuno-histoquímica, estudos com
anticorpos monoclonais, microscopia eletrônica e a pesquisa de marcadores tumorais.
No estudo do fluido pleural a concentração elevada de hialuronato sugere fortemente mesotelioma.
JBM

NOVEMBRO/DEZEMBRO, 2013  VOL. 101  No 6
Dificuldades no diagnóstico diferencial entre mesotelioma pleural
e adenocarcinoma metastático para pleura patológica
telioma essas são numerosas, finas e longas,
enquanto no adenocarcinoma são menos
frequentes, curtas e grossas.
Apesar de todo o avanço na imuno-histoquímica e na microscopia eletrônica, cerca
de 5% a 10% dos casos de mesotelioma só
são esclarecidos em autópsia. Esta permite
amostra de tecido pulmonar suficiente e distante das margens do tumor para evidenciar
exposição ao asbesto, visando demonstrar
tipos e extensão das fibras.
Essa diferenciação diagnóstica é de fundamental importância para se definir a conduta terapêutica e estabelecer o prognóstico. O adenocarcinoma metastático é sinal de
estágio avançado da doença, sendo o tratamento, portanto, paliativo. No entanto, apresenta melhor sobrevida, quando comparado
ao mesotelioma.
O mesotelioma parece ter no tratamento cirúrgico a tentativa de cura, através de
ressecções amplas. Estudos têm sido realiza-
dos com a associação de quimioterapia ou
radioterapia, porém a sobrevida média no
mesotelioma é entre seis e 18 meses, e não é
influenciada pelas intervenções terapêuticas.
Referências
7. STERMAN, D.H.; KAISER, L. & ALBELDA, S.M. — Advances
in the treatment of malignant pleural mesothelioma. Chest,
116: 504-20, 1999.
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and staging of malignant mesothelioma. Up To Date, 2003.
9. STERMAN, D.H.; LITZKY, L.A. et al. — Epidemiology and
pathology of malignant mesothelioma. Up To Date, 2003.
10. PINHEIRO, B.V. & OLIVEIRA J.R., J.C.A.A. — Doenças da
pleura.
11. COLBY, T.V.; KOSS, M.N. & TRAVIS, W.D. — Tumors of the
lower respiratory tract. In: Atlas of tumor pathology. 3. ed.,
Armed Registry of Pathology, 1995.
12. BATTIFORA, H. & MACCAUGHEY, W.T. — Tumors of the
serosal membranes. In: Atlas of tumor pathology. 3. ed.,
Washington D.C., Armed Forces Institute of Pathology,
1995.
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Revinter, 2001.
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Janeiro, Guanabara-Koogan, 2002.
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— Doenças da pleura. 3. ed., Rio de Janeiro, Revinter, 2001.
p. 158-71.
4. HIERHOLZER, J.; LUO, L. & BITTNER, R.C. — MRI and CT
in the differential diagnosis of pleural disease. Chest, 3(118):
604-9, 2000.
5. BOYLAN, A.M. — Mesothelioma: New concepts in diagnosis
and management. Curr. Opin. Pulm. Med., 2(6): 157-63, 2000.
6. GARCIA-PACHON, E. & PAGANUZZI, M. — Tumor markers
for diagnosing malignant pleural effusion. Chest, 1(121):
302-3, 2002.
JBM

Conclusão
O trabalho relata um típico caso de dificuldade diagnóstica, no qual o aspirado da massa
tumoral sugeriu mesotelioma pleural, porém o
estudo histopatológico e imuno-histoquímico
revelou adenocarcinoma em pulmão e pleura.
De acordo com Light (3), a pesquisa citológica
não pode assegurar a distinção entre os dois
tipos patológicos, e a confirmação diagnóstica deve empregar imuno-histoquímica, estudos com anticorpos monoclonais, microscopia
eletrônica e pesquisa de marcadores tumorais
em adequada amostra de tecido, obtida por
toracotomia aberta ou toracoscopia. Apesar
do emprego de tais técnicas, 5% a 10% dos
casos de mesotelioma são esclarecidos apenas em autópsia.
NOVEMBRO/DEZEMBRO, 2013  VOL. 101  No 6
Endereço para
correspondência:
Beltrão Paiva Castello
Branco
Av. Maranhão, 200/Apto. 103
58030-260
João Pessoa-PB
25
panorama internacional
Estenose de carótida
NEJM
Paciente do sexo feminino, 53 anos de idade, tabagista e hipertensa, busca atendimento
médico referindo hemiparestesia à direita, de
curta duração. Informa ainda, seis meses antes,
quadro súbito de afasia e hemiparesia à direita,
que regrediu espontaneamente em menos de
48 horas. Foi submetida à avaliação cardiológica, sem evidência de anormalidades. Realizou
angiografia por tomografia computadorizada
(TC), que demonstrou estenose de 70% da
artéria carótida interna esquerda, distalmente à sua bifurcação; à ressonância magnética
(RM) havia área de infarto frontotemporal à esquerda, sem hemorragia ou edema cerebral.
Com base na descrição desse caso clínico,
Grotta J. (Carotid Stenosis. N. Engl. J. Med.
2013;369:1143-50) discute aspectos relacionados ao manejo apropriado da estenose de
carótida (EC), condição responsável por cerca
de 10%-20% dos casos de acidente vascular
encefálico (AVE) isquêmico. A placa aterosclerótica localizada na artéria carótida é o principal fator envolvido na patogênese da doença, seja através de embolia distal para ramos
de artérias cerebrais ou retinianas, seja por
reduzir significativamente o lúmen vascular,
levando ao comprometimento da perfusão
encefálica. O autor lembra ainda que cerca de
70%-90% dos pacientes com redução significativa do lúmen arterial apresentam sopro carotídeo ao exame físico (apesar de ser um sinal
inespecífico da EC) e que o grau de estenose
constitui-se no principal fator prognóstico que
determina o risco de AVE.
A realização de anamnese detalhada revela
que cerca de 50% dos pacientes que sofrem
AVE relacionado à EC têm sintomas prévios
compatíveis com ataque isquêmico transitório
(AIT). Assim, todo paciente que tenha sofrido
AIT deve ser submetido a testes não invasivos que permitam diagnosticar a EC — a
exemplo de ultrassonografia de carótidas
26
Profa. Dra. Andréa F. Mendes
com Doppler colorido, associada à angiografia por TC ou RM —, visando minimizar o risco
de AVE. Tais testes costumam ser suficientes
para orientar a conduta terapêutica; em alguns
casos a angiografia cerebral por cateter pode
ser necessária para fornecer informações adicionais sobre a anatomia vascular. Em relação
ao tratamento da EC, o autor destaca que é
fundamental corrigir possíveis fatores de risco
de aterosclerose, em especial hipertensão arterial, dislipidemia e tabagismo. A angioplastia da carótida é uma alternativa terapêutica
à endarterectomia, devendo ser considerada
principalmente em pacientes com alto risco
cirúrgico. Finalmente, cabe lembrar do papel
da prescrição de antiagregante plaquetário (aspirina, clopidogrel), considerando a prevenção
secundária do AVE em longo prazo e a redução
da mortalidade em pacientes submetidos à endarterectomia ou colocação de stent.
Obesidade
Ann. Intern. Med.
A obesidade é um problema de saúde
mundial, amplamente estudado e debatido
nos dias atuais. Frequentemente associa-se
a um perfil característico de alterações metabólicas — diabetes, dislipidemia e hipertensão arterial —, que colocam o indivíduo
sob maior risco de eventos cardiovasculares
e de óbito. Entretanto, na prática clínica, frequentemente são encontrados pacientes que,
apesar de obesos, não apresentam qualquer
outra alteração clínica ou laboratorial que revele comprometimento do perfil metabólico.
Uma meta-análise recente, incluindo mais de
60 mil adultos, buscou responder à seguinte
pergunta: a obesidade pode ser considerada
condição benigna, quando em indivíduos metabolicamente saudáveis? A resposta a essa
pergunta parece ser “não”, conforme os resultados do estudo, publicado no periódico
Annals of Internal Medicine (Are Metabolically
Healthy Overweight and Obesity Benign ConJBM

ditions? A Systematic Review and Meta-analysis. Ann. Intern. Med. 2013;159(11):758-769).
Kramer C.K. e colaboradores consideraram
como metabolicamente saudáveis aqueles
pacientes que não preencheram critérios
compatíveis com a síndrome metabólica, essa
última caracterizada pela presença de pelo
menos três dos seguintes, conforme o ATP III:
aumento da circunferência abdominal, hipertrigliceridemia, hipertensão arterial, LDL-colesterol baixo, hiperglicemia. Em quatro dos
oito estudos avaliados, nos quais o período
de acompanhamento foi superior a 10 anos,
verificou-se que, no grupo de indivíduos com
alterações do perfil metabólico, tanto os pacientes com índice de massa corpórea (IMC)
normal quanto aqueles com sobrepeso ou
obesidade apresentaram risco aumentado.
Icterícia neonatal
NEJM
A icterícia neonatal (hiperbilirrubinemia
indireta) é uma condição clínica que acomete
cerca de 85% dos recém-natos (RNs), sendo
as formas graves mais frequentemente observadas em países subdesenvolvidos e em desenvolvimento. Tal fato deve-se principalmente ao diagnóstico tardio ou inadequado, seja
da própria elevação plasmática da bilirrubina
indireta (BI), seja das condições clínicas que
favorecem a hiperbilirrubinemia grave —
sepse neonatal, isoimunização Rh, deficiência de glicose-6-fosfato desidrogenase, por
exemplo. Apesar de tratar-se de condição
frequentemente benigna e transitória, em
uma pequena proporção de RNs a icterícia
neonatal cursa com risco direto de lesão
cerebral grave, com encefalopatia que pode
progredir para o kernicterus. Nesses casos há
impregnação de BI em áreas específicas do
sistema nervoso central (SNC), possibilitando o
surgimento de distúrbios motores extrapiramidais (distonia, coreia, atetose), perda auditiva
e paresia oculomotora. Cabe lembrar que prematuridade e baixo peso ao nascer são importantes fatores preditores de pior prognóstico.
Estudos têm avaliado a eficácia de agentes
farmacológicos que podem se tornar futuras
opções terapêuticas, atuando por mecanismos
diversos: redução da produção de bilirrubina
(inibidores da heme oxigenase), aumento do
clearance de bilirrubina (como os fenobarbitúricos, que aumentam o processo de conjugação) ou neuroproteção, com mecanismo de
ação direcionado a reduzir os efeitos adversos
da BI no SNC (minociclina).
NOVEMBRO/DEZEMBRO, 2013  VOL. 101  No 3
hematologia
Hemocromatose hereditária
Willian Cassuriaga Aymone
Vanessa Valiati
Acadêmicos do curso de Medicina da Universidade Católica de Pelotas (UCPEL).
Maria da Graça de Faria Santos Resem
Professora titular das disciplinas de Bioquímica Médica e Bioquímica I das escolas de Saúde e
Farmácia da UCPEL.
William Peres
Doutor em Ciências Biológicas pela Universidade de León, Espanha. Professor adjunto das
disciplinas de Bioquímica Médica e Bioquímica II das escolas de Ciências Ambientais, Farmácia e
de Saúde da UCPEL.
Resumo
Summary
Introdução
expressão da doença são modificadas por
fatores ambientais, incluindo perda ou doação de sangue, uso de álcool, dieta e contração de infecções, como hepatite viral (5).
A hemocromatose tipo 1 consiste na mutação do gene HFE no braço curto do cromossomo 6, perto do lócus HLA (27). Este
gene codifica uma molécula semelhante ao
HLA classe I que regula a absorção intestinal de ferro da dieta (13). Desde a descoberta do gene HFE, duas mutações nesse
gene foram descritas, e são responsáveis
pela maioria dos casos de HH: a C282Y e
a H63D (19, 24). No estado homozigótico
de HH, ambos os alelos do cromossomo 6
possuem a mutação C282Y; já no estado
heterozigótico, um cromossomo possui a
mutação C282Y e outro, a mutação H63D.
De acordo a maioria dos estudos, os indivíduos homozigotos (C282Y/C282Y) representam 90% dos pacientes com hemocro-
A hemocromatose é um distúrbio autossômico recessivo ou dominante que ocorre
devido ao aumento inapropriado da absorção de ferro pela mucosa gastrointestinal,
resultando no armazenamento excessivo
desse elemento no fígado, pâncreas, coração, articulações e gônadas. Afeta a população caucasiana, com prevalência de até
um em 200 descendentes da população
nórdica ou celta. O diagnóstico se faz por
critérios clínicos, bioquímicos (ferritina, saturação da transferrina, etc.), genéticos e
por imagem (ressonância magnética, tomografia e ultrassom).
A hemocromatose hereditária (HH) é um
distúrbio autossômico, geralmente recessivo e bastante comum (14, 30). Transmitida
de pais para filhos, ocorre devido ao aumento inapropriado da absorção de ferro
pela mucosa gastrointestinal, resultando
em um armazenamento excessivo desse
elemento, com posterior dano estrutural
e funcional, no fígado, pâncreas, coração,
nas articulações, nas gônadas e em outros
órgãos (11, 22). Afeta a população caucasiana, com prevalência que alcança até um
em 200 descendentes da população nórdica e celta (24). A hemocromatose é mais
comum em homens do que em mulheres
(5 a 7:1). Nas mulheres a apresentação clínica é ligeiramente mais precoce, devido
à perda fisiológica de ferro (menstruação,
gravidez), que retarda a acumulação deste
elemento (13). A acumulação de ferro e a
JBM

Hemochromatosis is a disorder autosomal recessive or dominant that occurs inappropriate due to the increased absorption
of iron by the gastrointestinal mucosa resulting in excessive storage of this element in
the liver, pancreas, heart, joints and gonads. It affects the caucasian population with
a prevalence reaching up to 1 in 200 people descendants of the population nordic
or celtic. The diagnosis is made by clinical
criteria, biochemical (ferritin, transferrin saturation of and so on), genetic and by image (magnetic resonance, tomography and
ultrasound).
NOVEMBRO/DEZEMBRO, 2013  VOL. 101  No 6
Unitermos:
Hemocromatose;
sobrecarga de ferro.
Keywords:
Hemochromatosis; iron
overload.
27
Hemocromatose hereditária
matose, enquanto que os heterozigotos
(C282Y/H63D) representam em torno de
3% a 5% dos casos (19, 24).
Esta revisão teve como objetivo apresentar a epidemiologia, fatores de risco, manifestações clínicas, diagnóstico e tratamento
da hemocromatose. Quanto à metodologia,
o trabalho baseou-se na revisão da literatura
sobre hemocromatose hereditária nas bases de dados da Pubmed, Highwire Press e
Scielo. Fontes adicionais de dados incluem
os sites do Centers for Disease Control and
Prevention (CDC) e Online Mendelian Inheritance in Man (OMIM).
De acordo com o CDC (6), se um indivíduo
apresenta hemocromatose, a probabilidade
de seu irmão ou irmã ter duas mutações no
gene HFE é de um em quatro (25%), e a probabilidade de os filhos desse indivíduo portador de hemocromatose apresentarem essa
mutação é de um em 20 (5%).
pela formação de radicais hidroxila tóxicos
(9). A sobrecarga desse elemento leva à
disfunção dos linfócitos NK (natural killer), à
diminuição da citotoxicidade dos neutrófilos e muda a proporção de linfócitos T CD4
(helper) e T CD8 (linfócitos killer) (9).
Deve-se pensar na importância de algumas proteínas responsáveis pela homeostasia
(19) do ferro no organismo humano e suas
respectivas funções imunológicas: a transferrina (transportador de ferro), presente nos monócitos/macrófagos e linfócitos T, necessária
para a diferenciação precoce das células T; o
receptor 1 da transferrina (captação celular de
ferro), que promove a captação de ferro por
ativação dos linfócitos necessários para a síntese de DNA e divisão celular dos linfócitos T;
a ferritina (armazenamento de ferro), sintetizada por macrófagos e linfócitos T. Acredita-se
que os linfócitos poderiam facilmente mobilizar o compartimento de armazenamento de ferro no organismo, protegendo-o da
toxicidade produzida pelo excesso de ferro
(19). Recentemente foi descoberto o gene da
hepcidina — um regulador responsável pela
absorção e pela liberação de ferro e pelos
macrófagos (8, 23, 26). A hepcidina é sintetizada no fígado quando se necessita de ferro
devido a mudanças que ocorrem no corpo,
como na anemia, na hipoxia e na inflamação,
quando é então secretada na circulação (23).
Importância do ferro e seu papel na
doença
Pontos-chave:
> De acordo com
o CDC, se um indivíduo
apresenta hemocromatose,
a probabilidade de seu irmão
ou irmã ter duas mutações no
gene HFE é de um em quatro;
28
Normalmente, a quantidade de ferro no
organismo é estável, oscilando de 4g a 5g.
Nos pacientes sintomáticos a regulação de
absorção intestinal de ferro está perdida, levando à acumulação líquida de ferro de 0,5g
a 1g por ano (13, 22). Essa doença geralmente se manifesta após os 40 anos de idade
quando houve um acúmulo de ferro igual ou
superior a 20g. O ferro em excesso é tóxico
para os tecidos do hospedeiro (pois produz
o radical hidroxila [•OH], que causa danos às
membranas celulares, às proteínas e ao DNA)
pelas seguintes razões (13, 22):
> E a probabilidade de
os filhos desse indivíduo
portador de hemocromatose
apresentarem essa mutação
é de um em 20 (5%);
1. Peroxidação lipídica por meio de reação
de radicais livres catalisados pelo ferro.
2. Estimulação de formação de colágeno,
promovendo, desta maneira, fibrose progressiva dos órgãos parenquimatosos,
como fígado, pâncreas e coração.
3. Interação de espécies de oxigênio reativo
e do próprio ferro com o DNA, levando à
lesão letal ou a predisposição ao carcinoma hepatocelular.
> Nos pacientes sintomáticos
a regulação de absorção
intestinal de ferro está
perdida, levando à
acumulação líquida de ferro
de 0,5g a 1g por ano.
O ferro é essencial para a eritropoese,
sendo um componente ativo de muitas enzimas relevantes para o crescimento e a função
de outras células dinâmicas, tais como as do
sistema imunológico (9). Está envolvido no
percurso imune de neutrófilos e macrófagos,
JBM
Classificação
A base de dados OMIM (17) lista quatro
tipos de HH causados por uma sequência
de variações envolvendo diferentes genes
(8, 17). A Tabela 1 mostra essa divisão e os
achados mais importantes.
A hemocromatose dos tipos 1, 2 e 3
envolve uma deficiência sistemática de
hepcidina (4), cujo gene é fundamental na
homeostasia do ferro, e a sua disrupção resulta em hemocromatose (19). O padrão de
herança da hemocromatose dos tipos 1, 2
e 3 é autossômico recessivo, enquanto que
o do tipo 4 é autossômico dominante (20).
Fatores de risco e manifestações
clínicas
Os principais fatores de risco, de acordo
com o CDC (6), são:
1. Pessoas que herdam a mutação do gene
HFE de ambos os pais apresentam maior
risco de desenvolvimento da doença.

NOVEMBRO/DEZEMBRO, 2013  VOL. 101  No 6
Hemocromatose hereditária
TABELA 1: Principais tipos de hemocromatose e achados mais importantes
Tipo e lócus cromossômico
envolvido
Observações
Achados importantes
Hemocromatose tipo 1
(6p21.3-6p22.1)
Representa mais de 90% dos casos de
hemocromatose, está associada ao
gene HFE e afeta apenas a população
caucasiana, principalmente masculina
Clínicos: Os sintomas começam após a 4a década. Fadiga
crônica, dores nas articulações, impotência, infertilidade,
diabetes, pigmentação da pele, cirrose hepática e
arritmias
Bioquímicos: Aumento do ferro sérico, da saturação da
transferrina (ST) e da ferritina sérica
Morfológicos: Sobrecarga de ferro (Fe) nos hepatócitos
Hemocromatose tipo 2
“juvenil”
(19q13) e (1q21)
Ambos os sexos são igualmente afetados
a. Resulta de mutação no gene hepcidina
(tipo 2A)¹
b. Resulta de mutação no gene
hemojuvelina (tipo 2B)²
¹ Gene HAMP
² Gene HJV
Clínicos: Os sintomas começam após a primeira década.
Dor abdominal, hipogonadismo, arritmias cardíacas,
insuficiência cardíaca intratável e diminuição da tolerância
à glicose
Bioquímicos: Aumento do ferro sérico, da ST e ferritina.
Morfológicos: Sobrecarga de ferro no fígado, coração,
glândulas endócrinas e músculo esquelético
Hemocromatose tipo 3
(7q22)
Mutação do receptor 2 da transferrina
no gene (TFR2); clinicamente imita a
hemocromatose tipo 1
Clínicos, bioquímicos e morfológicos: Semelhantes à
hemocromatose tipo 1
Hemocromatose tipo 4
(2q32)
A doença da ferroportina resulta de
mutação do gene da ferroportina
(SLC40A1), e subdivide-se em:
Subtipo “A”: Caracterizado por baixa
saturação da transferrina e deposição de
ferro nos macrófagos
Subtipo “B”: Mimetiza a hemocromatose
tipo 1 com alta saturação da transferrina e
deposição de ferro nos hepatócitos
Clínicos: Os sintomas são comparáveis aos da
hemocromatose tipo 1 e apresentam anemia precoce.
Bioquímicos: Aumento significativo da ferritina sérica, com
ligeiro aumento da ST
Morfológicos: Sobrecarga de ferro predominantemente
nas células reticuloendoteliais
Obs.: A hemocromatose dos tipos 2, 3 e 4 não está relacionada ao gene HFE.
Fonte: Adaptação a partir de Brissot (4), Robson (20) e Swinkels (23).
Embora tanto os homens como as mulheres possam herdar esse gene defeituoso,
a probabilidade de ser diagnosticada HH
nos homens é maior do que nas mulheres.
2. Fator étnico: pessoas brancas descendentes do norte europeu (p. ex.: famílias da
Inglaterra, Irlanda, Escócia, Dinamarca,
França e Escandinávia) apresentam maior
probabilidade de mutação do gene HFE.
3. História familiar: pessoas com parentes
próximos (avós, mãe, pai, irmão, sobrinha, sobrinho) com hemocromatose têm
maior probabilidade de apresentar mutação no gene HFE.
O início da doença é insidioso, e seus sintomas são muito inespecíficos. Entre eles se
destacam: fadiga, letargia, astenia, perda de
peso, encurtamento da respiração, artralgias,
perda da libido ou impotência sexual entre os
homens e amenorreia entre as mulheres (24).
A doença pode finalmente levar à hiperpigmentação da pele, artrite, diabetes
mellitus, dor abdominal crônica, fadiga graJBM

ve, hipotireoidismo, cardiomiopatia, cirrose
hepática, carcinoma hepatocelular ou a risco
aumentado de certas infecções bacterianas,
principalmente por Yersinia enterocolitica,
Vibrio vulnificus, Listeria monocytogenes e
Pasteurella pseudotuberculosis. Acredita-se
que isso ocorra por disfunção dos linfócitos
NK e dos macrófagos (11, 14).
O fígado é um dos primeiros órgãos
afetados (11). Aproximadamente 95% dos
pacientes sintomáticos apresentam hepatomegalia, que precede o desenvolvimento de
sintomas ou alterações dos testes de função
hepática, como, por exemplo, a AST e a ALT
(22). A atividade dessas aminotransferases
tem sido anormal em 65%-75% dos estudos
clínicos de pacientes com hemocromatose
(1). A hepatomegalia pode evoluir para esteatose hepática, fibrose, cirrose e carcinoma
hepatocelular.
A dor abdominal é o sintoma mais frequente (entre 10% e 50%) (22) em pacientes
cirróticos com HH (11). Geralmente possui
caráter crônico e localiza-se na região epi-
NOVEMBRO/DEZEMBRO, 2013  VOL. 101  No 6
O início da doença
é insidioso, e seus
sintomas são muito
inespecíficos. Entre eles
se destacam: fadiga,
letargia, astenia, perda
de peso, encurtamento
da respiração, artralgias,
perda da libido ou
impotência sexual entre
os homens e amenorreia
entre as mulheres.
29
Hemocromatose hereditária
Pontos-chave:
> O diabetes mellitus é
um dos maiores distúrbios
endócrinos associados à HH;
> Desenvolve-se em 30% a
60% dos portadores dessa
doença e piora bastante o
prognóstico;
> Acredita-se que a
sobrecarga de ferro (Fe) no
fígado leve à resistência à
insulina e ao acúmulo de Fe
nas células beta pancreáticas,
resultando em danos celulares
e diminuição da secreção de
insulina.
30
gástrica ou no hipocôndrio direito. Sua ocorrência pode ser devido à hepatomegalia e à
distensão da cápsula hepática (22).
A cirrose hepática é um dos principais fatores etiológicos para o surgimento do carcinoma hepatocelular (CH) (27), sendo que a incidência anual desse tipo de carcinoma em doentes com cirrose hepática é de 3%-5% (2). O
câncer hepático é uma complicação frequente
nos pacientes com HH, nos quais o carcinoma
hepatocelular primário (200 vezes) é mais comum, desenvolvendo-se mais frequentemente
em fígado cirrótico (7, 11). O alcoolismo crônico e o fumo são fatores de risco muito importantes para o desenvolvimento de CH (7, 11).
No entanto, existem alguns casos de carcinoma hepatocelular em pacientes com HH sem
cirrose e observa-se aumento na frequência de
colangiocarcinoma (7, 11).
O aumento de melanina e de ferro na pele
leva à hiperpigmentação em 27%-85% dos
doentes. Ocorre na maioria dos pacientes
sintomáticos e geralmente está ausente nos
estágios mais precoces da doença (11, 22).
Em geral, a pigmentação é difusa e generalizada, porém pode ser mais pronunciada na
face, pescoço, dorso da mão, nos antebraços,
pernas, região genital e nas cicatrizes (11, 22).
Também podem ocorrer perda de cabelo,
atrofia da pele e distrofia das unhas (11, 22).
O diabetes mellitus é um dos maiores distúrbios endócrinos associados à HH. Desenvolve-se em 30% a 60% dos portadores dessa
doença e piora bastante o prognóstico (11,
14). Acredita-se que a sobrecarga de ferro
(Fe) no fígado leve à resistência à insulina e
ao acúmulo de Fe nas células beta pancreáticas, resultando em danos celulares e diminuição da secreção de insulina (10). No estágio
“pré-cirrótico”, aproximadamente 20% dos
pacientes demonstram hiperglicemia, e sua
prevalência aumenta para mais de 70% na
presença de cirrose (10).
Depois do diabetes mellitus, o hipogonadismo hipogonadotrópico (deficiência de
gonadotropina por deposição de ferro na
glândula pituitária ou em nível hipotalâmico)
é a endocrinopatia mais frequente associada com HH, apresentando prevalência que
varia entre 10% e 100% dos casos (11, 16).
Em estudo realizado por McDermott & Walsh
(16), com 141 homens com hipogonadismo,
níveis anormalmente baixos de testosterona
com LH e FSH baixos foram observados em
6,4% dos pacientes, 89% apresentavam cirroJBM
se associada e 33% tinham diabetes; das 38
mulheres analisadas, 5,2% possuíam níveis
inapropriados de FSH e LH. Perda da libido
e atrofia testicular são comuns em pacientes sintomáticos, com impotência associada
em mais de 35% dos homens e amenorreia
em 15% das mulheres (16).
As anormalidades cardíacas mais clássicas são a insuficiência cardíaca global (2% a
35% dos casos) e as arritmias cardíacas (7%
a 36% dos casos) (11, 14). Anormalidades do
ECG (mudanças no segmento ST-T) estão
presentes em mais de 35% dos pacientes
sintomáticos (11, 14). As arritmias incluem
extrassístoles ventriculares, taquicardias supraventriculares e ventriculares, fibrilação
ventricular e podem ocorrer vários graus de
bloqueio (14, 22).
As artropatias são encontradas em 20%
a 70% dos pacientes sintomáticos (14). A
característica da artropatia hemocromatótica é o envolvimento do segundo e terceiro
ossos metacarpais, que frequentemente
estão rígidos, dolorosos e associados a
pequenos cistos com osteófitos em forma
de gancho, que se desenvolvem na cabeça dos ossos metacarpais (15). Um achado
frequente é a deposição de pirofosfato de
cálcio com condrocalcinose (14, 15, 22),
acometendo 36% a 72% dos casos. Essa
deposição afeta principalmente os punhos,
os joelhos, os quadris, a sínfise púbica (15)
e as articulações intervertebrais. Embora
o envolvimento seja simétrico, pode ser
apenas unilateral (22). A condrocalcinose
ocorre principalmente nos meniscos e na
cartilagem articular, e é radiologicamente semelhante à osteoartrite degenerativa
(14). As artropatias não estão associadas à
extensão ou à duração da sobrecarga de
ferro e podem surgir ou se agravar mesmo
após a remoção do excesso dos estoques
férricos (22). São degenerativas, em vez de
inflamatórias (a taxa de sedimentação eritrocitária é tipicamente normal), e podem
levar a uma extensa destruição da articulação, sendo que um terço dos pacientes
cujos quadris são afetados requerem substituição da articulação (15).
Diagnóstico
Deve-se estar atento à “regra dos três
As” tanto para homens quanto para mulheres, em qualquer idade na vida adulta,
quando os mesmos apresentarem astenia

NOVEMBRO/DEZEMBRO, 2013  VOL. 101  No 6
Hemocromatose hereditária
TABELA 2: População-alvo para o screening da hemocromatose
Pacientes sintomáticos
Pacientes assintomáticos
• Manifestações inexplicáveis de doença hepática ou uma causa
conhecida de doença hepática com alteração dos exames
indiretos de ferro (ST e ferritina sérica)
• Diabetes mellitus tipo 2 com hepatomegalia, elevação das
enzimas hepáticas, doença cardíaca atípica ou disfunção sexual
precoce
• Artropatia atípica precoce, cardiopatia e disfunção sexual
masculina
• Parentes de primeiro grau de pacientes com HH
• Alteração dos exames indiretos de ferro descoberta em exames
de rotina
• Elevações inexplicáveis de enzimas hepáticas ou hepatomegalia
assintomática ou aumento da atenuação do fígado em
tomografia computadorizada
Fonte: Adaptação a partir de Tavill, 2001.
crônica imotivada e/ou artralgia e/ou aminotransferases (ALT ou AST) aumentadas sem
motivo aparente, geralmente acima de três
vezes o limite superior de normalidade. Estes
fatores são significativos, e nos levam a suspeitar de HH (22). De acordo com Tavill (24),
o diagnóstico da HH é baseado no aumento
das concentrações hepáticas de ferro > 1,9,
associadas ao aumento dos níveis séricos de
ferritina e da ST, e ambos avaliam alterações
no metabolismo do ferro. A Tabela 2 mostra a
população-alvo para o screening da hemocromatose. De fato, a ST é o primeiro parâmetro
alterado e o mais barato e fácil de mensurar;
é utilizado usualmente no screening dos pacientes com HH (8), além de ser o teste mais
sensível para avaliação de acúmulo de ferro
no corpo (8). Na literatura, o ponto de corte
mais aceito para diagnóstico de HH é de 45%
ou superior (8). Quando o valor da ST exceder
em 50% para mulheres e 60% para homens,
ele apresenta sensibilidade de 92%, especificidade de 93% e valor preditivo positivo de
86% para o diagnóstico de HH (24). As concentrações de ferritina sérica que refletem a
sobrecarga de ferro em níveis > 200mg/l em
mulheres e > 300mg/l em homens são consideradas patológicas. Além disso, a ferritina
tem um valor preditivo no que diz respeito
à possível existência de danos hepáticos;
na verdade, quando o valor for superior a
1.000mg/l, a presença de fibrose hepática é
considerada extremamente provável (8).
De acordo com Pietrangelo (18), o padrão-ouro para o diagnóstico de HH tem sido a
quantificação de ferro hepático e a observação
histológica da distribuição de ferro. Isto implica em biopsia hepática, com aumento dos
riscos de morbimortalidade. Com o aparecimento da bioquímica e dos testes genéticos,
pode-se evitar a biopsia na grande maioria dos
casos. A mortalidade da biopsia hepática vaJBM

ria de 0,01% a 0,1%, e o risco de hemorragia
é de 0,3% (12). No entanto, quando os valores
de ferritina sérica forem superiores a 1.000ng/
ml e/ou na presença de aumento das transaminases ou hepatomegalia, o exame histológico
é necessário para avaliar a extensão dos danos
e das doenças hepáticas (18). Souza et al. (22)
afirmam que a biopsia hepática é um método
clássico que confirma o diagnóstico de HH nos
indivíduos cujos testes bioquímicos e achados
clínicos apontem para sobrecarga de ferro. Esse
tipo de biopsia é essencial para: 1. confirmar
a sobrecarga férrica; 2. identificar o padrão
característico de distribuição periportal e hepatocítica dos depósitos de ferro; 3. promover
avaliação semiquantitativa do excesso de ferro;
4. identificar a presença de fibrose ou cirrose;
e 5. detectar lesões pré-malignas potenciais,
como, por exemplo, focos livres de depósitos
de ferro.
Além disso, a doença também pode ser
definida genotipicamente pela ocorrência familiar de sobrecarga de ferro, principalmente naqueles indivíduos homozigotos para o
gene C282Y ou heterozigotos para o gene
C282Y/H63D no caso da hemocromatose
tipo 1, que é a mais prevalente (4, 24). O teste de DNA para HH em populações de alto
risco tem validade e utilidade clínica (25).
A ressonância magnética pode ser utilizada para detectar o aumento de ferro nos
tecidos, particularmente no fígado (18).
Apesar deste método não ser invasivo e auxiliar na detecção de fibrose hepática (21),
apresenta baixa sensibilidade (18, 22) para
o diagnóstico quando as concentrações desse metal não forem muito elevadas (22). A
propriedade paramagnética da hemossiderina e da ferritina permite que se utilize um
dispositivo supercondutor com interferência
quântica (SQUID) para medir a suscetibilidade magnética do fígado, e correlaciona com
NOVEMBRO/DEZEMBRO, 2013  VOL. 101  No 6
A ressonância magnética
pode ser utilizada para
detectar o aumento
de ferro nos tecidos,
particularmente no
fígado. Apesar deste
método não ser invasivo
e auxiliar na detecção
de fibrose hepática,
apresenta baixa
sensibilidade para o
diagnóstico quando as
concentrações desse
metal não forem muito
elevadas.
31
Hemocromatose hereditária
a concentração hepática de ferro (18). A estimativa da concentração hepática de ferro
pode também ser feita pela tomografia computadorizada (22).
Nos pacientes com cirrose e carcinoma
hepatocelular concomitante indica-se também screening semestral com ultrassom e
AFP (α-fetoproteína) (14).
O reconhecimento e o diagnóstico precoces objetivam minimizar a progressão e as
complicações da hemocromatose. As maiores
causas de morte por essa doença são cirrose
descompensada, carcinoma hepatocelular,
diabetes mellitus e miocardiopatia (24).
tipo 4 não toleram um regime semanal de
flebotomia e se tornam rapidamente anêmicos, apesar da elevação persistente dos
níveis de ferritina. Nesses casos, indica-se
um regime menos agressivo e a utilização
de eritropoetina, que pode melhorar a tolerância hematológica à terapia (8). O Quadro explica melhor esse tipo de terapia e
os principais cuidados a serem tomados em
relação à flebotomia.
Quando a flebotomia não é viável
(como, por exemplo, nos casos de anemia,
disfunção cardíaca avançada ou cirrose
hepática), a deferoxamina — um agente
quelante de ferro — pode ser utilizada com
sucesso (8). No entanto, devido à sua má
absorção gastrointestinal e meia-vida curta,
ela deve ser administrada por via subcutânea (20-40mg/kg/dia) por infusão contínua
(8-10h), ou duas vezes ao dia pela mesma
via, por meio de injeção em bolo, tornando-se mais tolerada pelos pacientes (8).
Além disso, existem complicações potenciais com o uso crônico da deferoxamina,
tais como infecções por Yersinia sp., lesões
retinianas e de nervo acústico (22).
Deve ser encorajada uma dieta rica em
proteínas, vitamina B12 e folato, pois acelera
a eritropoese que é intensificada com a sangria terapêutica (12).
Existem dois quelantes orais: a deferiprona, que não foi aprovada com abordagem terapêutica, pois apresenta um efeito
colateral significativo (a agranulocitose),
evidenciando risco muito maior quando
comparada com a flebotomia. O deferasirox, que foi recentemente aprovado, não
apresenta tantos efeitos colaterais em longo prazo, e pode ser uma terapia substitutiva da flebotomia em alguns casos (4).
Tratamento
Pontos-chave:
> Uma dieta balanceada é
usualmente suficiente para os
pacientes com HH;
> Eles devem evitar
principalmente os suplementos
com vitamina C;
> Porque aumentam a
absorção intestinal de ferro
e potencializam
a atividade de agentes
pró-oxidantes e radicais livres.
32
Uma dieta balanceada é usualmente suficiente para os pacientes com HH, os quais
devem evitar principalmente os suplementos
com vitamina C (4, 22, 24), porque aumentam
a absorção intestinal de ferro (22) e potencializam a atividade de agentes pró-oxidantes e radicais livres (24), podendo ser responsáveis por
casos letais e raros de insuficiência cardíaca (4).
Evitar alimentos com alto teor de ferro, como
carne vermelha e bife de fígado (22); certos
frutos do mar, como ostras cruas, as quais podem causar infecções fatais geradas por sua
contaminação com Vibrio vulnificus (14, 22);
também evitar bebidas que contenham álcool,
porque podem acelerar danos hepáticos (22).
A flebotomia, ou “sangria” terapêutica, é
o tratamento mais seguro, eficaz e econômico
para a HH (8, 29, 30). Deve-se enfatizar aos
pacientes que a terapia deve começar antes
que se desenvolvam danos irreversíveis aos
órgãos (8), principalmente antes de apresentar diabetes e/ou cirrose, o que significa uma
redução significativa da morbimortalidade
(24, 28). Os pacientes com hemocromatose
QUADRO: Flebotomia e cuidados a serem tomados
• A flebotomia periódica deve remover em torno de 500ml de sangue, contendo de 200 a 250mg de
ferro; semanalmente ou quinzenalmente, dependendo da tolerância de cada paciente (menor em
idosos), com duração de alguns meses até dois a três anos, conforme a precocidade do diagnóstico
e do tratamento, até que os estoques em excesso de ferro sejam esgotados
• Verificar o valor do hematócrito (Ht) antes de cada flebotomia, sendo que o Ht não deve cair mais
que 20% do nível anterior
• Verificar o nível da ferritina sérica a cada 10 ou 12 flebotomias
• Parar a flebotomia quando a ferritina sérica cair abaixo de 50ng/ml
• A hemoglobina deverá ser dosada antes de cada sangria, situando-se em torno de 11g/dl, sem
tendência a se elevar de imediato com a suspensão do tratamento
• Continuar a flebotomia em intervalos, para manter os níveis de ferritina entre 25 e 50ng/ml
Fonte: Adaptação a partir de Tavill (24) e Souza et al. (22).
JBM

NOVEMBRO/DEZEMBRO, 2013  VOL. 101  No 6
Hemocromatose hereditária
O transplante hepático ortotópico (OLT)
é o tratamento de preferência em muitos
pacientes com estágio terminal de doença
hepática, embora para a HH seja uma indicação incomum (3). No entanto, a taxa de
sobrevivência nesse tipo de paciente é menor, quando comparada à de outras doenças que requeiram o OLT (24). A maioria das
mortes ocorre no período peroperatório,
por complicações cardíacas ou relacionadas
a infecções (24).
Conforme Limdi & Cramptom (14), o
principal motivo que leva à morte nos estados de sobrecarga de ferro, como no
caso da HH, são as arritmias cardíacas e
miocardiopatias. Assim, é necessário preocupar-se com o tratamento de algumas das
consequências dessa doença, como, por
exemplo, o diabetes, que requer insulina e
um tratamento apropriado para as complicações macro e microvasculares; a artrite,
que deve ser tratada com uma simples analgesia; e o hipogonadismo hipogonadotrópico, que, por sua vez, necessita de reposição hormonal.
Referências
em http://www.cdc.gov/ncbddd/hemochromatosis. Acessado em 06/12/2007.
17. DEUGNIER, Y. & TURLIN, B. — Pathology of hepatic iron
overload. World J. Gastroenterol., 13(35): 4755-60, 2007.
18. FRANCHINI, M. — Hereditary iron overload: Update on pathophysiology, diagnosis, and treatment. Am. J. Hematol.,
81: 202-9, 2006.
19. GASCHE, C.; LOMER, M.C.E. et al. — Iron, anaemia, and inflammatory bowel diseases. Gut, 53: 1190-7, 2004.
10. HAHN, J.U.; STEINER, M. et al. — Evaluation of a diagnostic algorithm for hereditary hemochromatosis in 3,500
patients with diabetes. Diabetes Care, 29(2): 464-6,
2006.
11. BHAVNANI, M.; LLOYD, D. et al. — Screening for genetic
haemochromatosis in blood samples with raised alanine
aminotransferase. Gut, 46: 707-10, 2000.
12. BOIGE, V.; CASTÉR, L. et al. — Lack of association between
HFE gene mutations and hepatocellular carcinoma in patients with cirrhosis. Gut, 52: 1178-81, 2003.
13. BRANDHAGEN, D.J. — Liver transplantation for hereditary
hemochromatosis. Liver Transplantation, 7: 663-72, 2001.
14. BRISSOT, P. & BELS, F. — Current approaches to the management of hemochromatosis. Hematology, p. 36-41, 2006.
15. CALONGE, N.; PETITTI, D.B. et al. — Screening for hemochromatosis: Recommendation statement. Ann. Intern.
Med., 145: 204-8, 2006.
16.CENTERS FOR DISEASE CONTROL AND PREVENTION
(CDC) — Iron overload and hemochromatosis. Disponível
Conclusão
A HH é um distúrbio genético cujo diagnóstico se faz por critérios clínicos, bioquímicos, genéticos e por imagem. O reconhecimento e o diagnóstico precoces são
importantes, pois minimizam a progressão e
as complicações futuras dessa doença. A flebotomia, a deferoxamina, a deferiprona e o
deferasirox são as opções terapêuticas atualmente existentes.
Obs.: As 20 referências que compõem este artigo se encontram
na Redação à disposição dos interessados.
Endereço para
correspondência:
Willian Cassuriaga Aymone
Rua São Paulo, 125/Ap. 502
— Borgo
95700-000
Bento Gonçalves-RS
[email protected]
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
NOVEMBRO/DEZEMBRO, 2013  VOL. 101  No 6
33
traumatologia
Tratamento não cirúrgico do
traumatismo renal contuso
Olival Cirilo Lucena da Fonseca Neto
Consultor em Cirurgia do Trauma e Emergência do Hospital da Restauração, Recife, PE.
Rômulo Vasconcelos
Cirurgião geral e urologista — Hospital da Restauração.
Resumo
Summary
Os rins são os órgãos do trato geniturinário (TGU) mais acometidos por traumas
acidentais. Excluindo-se os pacientes com
indicação de cirurgia imediata, todos os demais deverão ser submetidos a um correto
estadiamento da lesão renal, visando instituir a terapêutica adequada e como fator de
prognóstico da sua doença.
The kidney is the most commonly injured urologic organ and may be treated success fully without operative intervention.
Blunt renal trauma continues to promote
discussion in trauma and urology circles.
Renal exploration is reserved for those patients who become unstable or who develop complications.
Introdução (1, 2, 3)
Conceitos gerais (4, 5, 6, 7)
O tratamento expectante (não cirúrgico)
do traumatismo renal contuso tem sido a
conduta internacionalmente mais aceita na
abordagem inicial desta doença. O momento ideal para a instituição de medidas cirúrgicas é ainda ponto controverso e objetivo de
diversos estudos em centros mundiais.
A instituição deste paradigma em Urologia e Cirurgia do Trauma tem proporcionado
aos profissionais de saúde consequências e
complicações relativamente novas e exigido
dos centros de saúde especializados a disponibilização de tecnologias capazes de tratar
adequadamente estes pacientes.
Diversos estudos internacionais objetivaram descrever as complicações decorrentes
do tratamento não cirúrgico do traumatismo
renal contuso e as técnicas terapêuticas instituídas para estes casos, que podem variar
da expectação à nefrectomia em casos raros.
Tais estudos baseiam-se principalmente na
opinião de especialistas e em estudos retrospectivos em instituições isoladas.
Fonte de financiamento: não há. Conflito de interesse: não declarado.
JBM

O traumatismo renal é uma entidade urológica decorrente da ação de forças físicas
que atuam sobre este órgão por tempo, intensidade e extensão variáveis, tendo como
consequência histológica primordial a lesão
micro ou macroscópica dos diversos elementos renais. A conclusão destes fenômenos
biofísicos pode resultar desde manifestações
clínico-laboratoriais imperceptíveis até a perda do órgão, e eles poderão se manifestar
de imediato ou anos após o evento original.
Topograficamente são classificados como
aberto (penetrante) ou fechado (contuso),
quando há comunicação com o meio externo
ou não. A presença de anomalias anatômicas
congênitas ou adquiridas torna o rim mais
suscetível aos mecanismos do trauma.
Os rins são os órgãos do trato geniturinário (TGU) mais acometidos por forças externas acidentais. Sua lesão representa 3%
dos traumatismos em geral e até 50% dos
abdominais (90% no tipo fechado e 14% no
aberto). A mortalidade decorrente exclusivamente da lesão renal é estimada em 1%-4%.
De acordo com a American Association
for The Surgery of Trauma (AAST), estadia-se o trauma renal, segundo a gravidade, em
graus de I a V. Este tem sido até hoje o fator
NOVEMBRO/DEZEMBRO, 2013  VOL. 101  No 6
Unitermos: Trauma, rim;
complicação; tratamento.
Keywords: Trauma;
kidney; complication;
treatment.
35
Tratamento não cirúrgico do traumatismo renal contuso
lesões de alto grau (III/IV e mesmo V).
Instabilidade hemodinâmica e associação
com lesão de outras vísceras intra-abdominais têm sido relatadas como as principais
causas de indicação cirúrgica imediata ou
precoce em vítimas de traumatismo renal.
A abordagem mediana e o controle do pedículo renal primordialmente ao tratamento da lesão per se vêm sendo orientados
como técnica cirúrgica ideal e segura.
de prognóstico e orientação terapêutica mais
importante no manuseio desses pacientes
(ver Tabela).
Estadiamento e tratamento (8, 9)
Excluindo-se os pacientes com indicação de cirurgia imediata (como aqueles com
choque hipovolêmico grave decorrente de
hemorragias intracavitárias), todos os demais
deverão ser submetidos a um correto estadiamento da lesão renal, visando instituir a
terapêutica adequada e como fator de prognóstico da sua doença. Diversos exames estão disponíveis para a detecção da evolução
do acometimento dos rins, mas a tomografia
computadorizada (TC) com contraste endovenoso proporciona correta avaliação da
perfusão, da situação do parênquima e do
extravasamento do contraste, além do sistema coletor e hematomas perirrenais. Permite
ainda uma avaliação conjunta de outras vísceras abdominais maciças. Considerando a
associação do trauma renal com o de outros
órgãos intra-abdominais entre 13% e 34%
das agressões fechadas do abdome, a TC
desponta como método de escolha para tais
situações.
Excetuando-se os pacientes com indicação cirúrgica imediata, o tratamento
do trauma renal pode variar de uma conduta expectante à nefrectomia. Ao considerarmos a lesão contusa, que representa
até 90% das modalidades de agressões
externas dos rins, o tratamento não cirúrgico tem sido extensamente relatado
na literatura internacional como primeira opção, mesmo ao considerarmos as
Diversas complicações têm sido descritas
quando instituído o tratamento conservador
do traumatismo renal. Apesar do advento
desta conduta em todo o mundo, houve
pequeno incremento no número de publicações abordando o tema, que pode estar
presente em até 5% dos casos. Não existem
dados precisos quanto à incidência de cada
complicação esperada ou mesmo descrições
de quais as mais comuns.
Dentre estes casos, a hematúria persistente é a mais comumente descrita, bem como
seu tratamento. Em geral, deriva do surgimento de um pseudoaneurisma traumático
intrarrenal, com consequente ruptura de sua
parede e comunicação com o sistema coletor. Pode ser responsável por hematúrias graves, com risco de vida quando não tratadas,
e surgir até 30 dias após o evento traumático. Atualmente a microembolização arteriográfica da lesão arterial pode levar à cura
em 70%-80% dos casos. Tardiamente poderá
causar hipertensão ou, mais precocemente,
perda da função renal.
Pontos-chave:
TABELA: Escala de gravidade de lesão de órgãos da AAST para o rim
> Diversos exames estão
disponíveis para a detecção
da evolução do acometimento
dos rins;
Grau
Tipo
I
Contusão
Hematoma
Hematúria micro ou macroscópica, estudos urológicos normais
Subcapsular, não expansível, sem laceração do parênquima
II
Hematoma
Laceração
Não expansível, perirrenal, confinado ao retroperitônio
< 1cm de profundidade do parênquima, sem extravasamento urinário
III
Laceração
< 1cm de profundidade do parênquima, sem ruptura do sistema coletor
ou extravasamento urinário
IV
Laceração
Parenquimatosa estendendo-se além do córtex, medula e sistema
coletor
V
Vascular
Laceração
Vascular
Hemorragia da artéria ou veia renal contida
Destruição completa do rim (shattered kidney)
Avulsão do hilo renal, desvascularização do rim
> A tomografia
computadorizada (TC) com
contraste endovenoso
proporciona correta avaliação
da perfusão;
> Permite ainda uma avaliação
conjunta de outras vísceras
abdominais maciças.
36
Complicações do tratamento
conservador (10, 11)
Descrição
JBM

NOVEMBRO/DEZEMBRO, 2013  VOL. 101  No 6
Tratamento não cirúrgico do traumatismo renal contuso
A infecção de coleções perirrenais (hematomas ou urinomas) e de tecidos desvitalizados poderá acarretar quadros sépticos
intracavitários. Está presente em até 4% dos
casos. A orientação de antibioticoprofilaxia
imediata na presença destas coleções ou de
desvitalização extensa de tecidos renais poderá prevenir esta situação. Ao evidenciar o
abscesso formado, a drenagem percutânea
(e opcionalmente a instalação de cateterização ureteral na vigência de urinomas) poderá
resolver a complicação. Urinomas extensos
poderão ser evidenciados até seis meses
após o evento traumático.
A perda da função renal (total ou parcial)
é observada como consequência do próprio
trauma ao parênquima renal (estando diretamente relacionada ao grau da lesão) ou devido aos tratamentos instituídos e complicações que possam surgir.
Referências
1. AL-QUDAH, H.S. & SANTUCCI, R.A. — Complications of renal trauma. Urol. Clin. North Am., 33(1): 41-53, 2006.
2. ALSIKAFI, N.F. & ROSENSTEIN, D.I. — Staging, evaluation,
and nonoperative management of renal injuries. Urol. Clin.
North Am., 33(1): 13-9, 2006.
3. BURNEI, G.; GRIGOREAN, V.T. et al. — Renovascular hypertension: Symptoms and signs. Clinical study on 20 patients.
Chirurgia, 103(3): 301-7, 2008.
4. CHEDID, A.; LE COZ, S. et al. — Blunt renal trauma-induced
hypertension: Prevalence, presentation, and outcome. Am. J.
Hypertens., 19(5): 500-4, 2006.
5. DELGADO, F.J.O.; BONILLO, M.A.G. et al. — Conservative approach in major renal trauma. Actas Urol. Esp., 31(2):
132-9, 2007.
6. DINKEL, H.P.; DANUSER, H. & TRILLER, J. — Blunt renal
trauma: Minimally invasive management with microcatheter
JBM

A hipertensão secundária ao trauma renal
representa menos de 1% das complicações,
podendo surgir de alguns dias a 15 anos
após o evento. Deriva de uma secreção exacerbada de renina pelo rim acometido. Poderá regredir espontaneamente ou ser resolvida definitivamente com a nefrectomia.
Finalmente, a nefrectomia surge como
opção de tratamento quando ocorrer falência do manuseio hemodinâmico da hematúria persistente ou em quadros sépticos e,
como descrito, na resolução da hipertensão
secundária ao trauma renal.
Conclusão
Com a melhoria do atendimento multidisciplinar dos pacientes traumatizados, a
abordagem conservadora dos traumatismos
de órgãos sólidos vem sendo adotada e estabelecida nos grandes centros de trauma,
levando a excelentes resultados.
embolization experience in nine patients. Radiology, 223(3):
723-30, 2002.
7. DE PABLO, C.A.; PINUS, P.M.A. et al. — Severe renal traumatism with conservative treatment. Actas Urol. Esp., 29(4):
436, 2005.
8. MARSZALEK, M.; MADERSBACHIER, S. & RAUCHENWALD, M.
— Grade IV renal trauma in a patient with a solitary kidney.
Urol. Int., 81(2): 241-3, 2008.
9. PFITZENMAIER, J.; BUSE, S. et al. — Kidney trauma. Urologe
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genitourinary trauma. Eastern Association for the Surgery of
Trauma, 2004.
11.SHARIAT, S.F.; JENKINS, A. et al. — Features and outcomes
of patients with grade IV renal injury. BJU Int., 102(6): 72833, 2008.
NOVEMBRO/DEZEMBRO, 2013  VOL. 101  No 6
Endereço para
correspondência:
Olival Cirilo Lucena da
Fonseca Neto
Rua Jacobina, 45 —
Apto. 1002 — Graças
52011-180
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37
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noticiário
Medley ganha prêmio
A Medley Indústria Farmacêutica, uma empresa Sanofi, foi eleita pelo Prêmio Líderes do Brasil a companhia
líder no segmento da Indústria Farmacêutica no ano
de 2013. Organizada pelo LIDE — Grupo de Líderes
Empresariais, a cerimônia de entrega da premiação foi
realizada no dia 9 de dezembro, no Palácio dos Bandeirantes, em São Paulo. O
evento contou com a presença do vice-presidente da República, Michel Temer, e
do governador do Estado de São Paulo, Geraldo Alckmin, além de outras autoridades, executivos e empresários de diversos setores da economia nacional.
“Este é mais um importante prêmio que a Medley conquistou ao longo de
2013, e reitera outras conquistas igualmente relevantes. A melhor estratégia para
ser reconhecida é cumprir o compromisso que marcou a nossa história: contribuir com a ampliação do acesso a medicamentos essenciais e de qualidade. Esse
trabalho, desenvolvido ao longo de muitos anos, é valorizado pelo mercado e
comprova o êxito da Medley em construir uma relação de confiança com a classe
médica, o varejo farmacêutico e os consumidores”, disse Wilson Borges, diretor
geral da Medley.
Pelo quarto ano consecutivo a empresa conquistou o Prêmio Marcas de Confiança Seleções/IBOPE e ainda foi considerada o laboratório de genéricos que
inspira a maior confiança e o mais recomendado por médicos e farmacêuticos.
A ABA Top Brands aponta a Medley como a mais defendida pelo consumidor,
desde 2010. Em 2013, o Instituto Data Folha e o Reputation Institute avaliaram a
companhia como a mais confiável e a de melhor reputação de todo o segmento
farmacêutico, respectivamente.
Faixa etária da vacina
contra o HPV
é ampliada
O Ministério da
Saúde está ampliando a faixa
etária para a vacinação contra o vírus do papiloma humano (HPV), usada na prevenção do câncer
de colo do útero. Meninas dos 11 aos 13
anos receberão as duas primeiras doses
necessárias à imunização, a dose inicial
e a segunda seis meses depois. A terceira dose deverá ser aplicada cinco anos
após a primeira. A vacina estará disponível a partir de março de 2014, e as três
doses serão aplicadas com autorização
dos pais ou responsáveis.
Com a adoção do esquema estendido, como é chamado, será possível
ampliar a oferta da vacina, a partir de
2015, para as pré-adolescentes entre
JBM

nove e 11 anos de idade, sem custo adicional. Assim, quatro faixas etárias serão
beneficiadas, possibilitando imunizar a
população-alvo (nove a 13 anos).
O esquema vacinal estendido adotado tem duas grandes vantagens. A
primeira é que possibilita alcançar a
cobertura vacinal de forma rápida, com
a administração das duas doses. Outro
benefício é que a terceira dose, cinco
anos depois, funciona como um reforço,
prolongando o efeito protetor contra a
doença. O Ministério da Saúde está investindo R$ 360,7 milhões na aquisição
de 12 milhões de doses.
A estratégia segue recomendação
da Organização Pan-americana de Saúde (OPAS) e foi discutida com especialistas brasileiros que integram o Comitê
Técnico Assessor do Programa Nacional
de Imunizações (PNI). A modificação no
esquema vacinal foi anunciada durante a
cerimônia de 40 anos do Programa Nacional de Imunizações.
NOVEMBRO/DEZEMBRO, 2013  VOL. 101  No 6
SUS terá medicamento
para transplantados produzido
no país
O Brasil contará com
um medicamento utilizado por pacientes transplantados de
rim e fígado produzido integralmente
com tecnologia nacional. O ministro da
Saúde, Alexandre Padilha, participou
da cerimônia de entrega do primeiro
lote do imunossupressor Tacrolimo,
fabricado pela Libbs Farmacêutica,
usado para evitar a rejeição a órgãos
e garantir o sucesso dos transplantes.
O evento também marcou o início das
obras da nova fábrica do laboratório
Libbs, destinada à produção de medicamentos biológicos.
Em 2009, a empresa firmou parceria
para desenvolvimento produtivo com o
Ministério da Saúde, com transferência
de tecnologia para o laboratório Farmanguinhos/Fiocruz. O instituto acompanhou todo o processo de produção
do medicamento, para internalizar as
técnicas e o conhecimento tecnológico
da empresa privada.
A previsão é que em 2015 o Farmanguinhos passe a produzir o Tacrolimo,
diminuindo assim o custo de aquisição
do medicamento. A partir de 2009, a
compra do produto passou a ser feita
de forma centralizada pelo Ministério
da Saúde, o que gerou uma economia
de R$ 75 milhões. “Produzir um medicamento 100% nacional é um salto de
extrema importância para a indústria
brasileira, com impacto na geração de
mercado para todo o Brasil, além de garantir segurança aos pacientes atendidos pelo SUS”, afirmou Padilha durante
a solenidade.
“O domínio de todas as atividades
de produção resulta em produtos de
qualidade a preços competitivos, garantindo o abastecimento dos serviços
públicos de saúde, com redução da
dependência internacional”, ressaltou o
secretário de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos, Carlos Gadelha.
39
índice geral
Artigos
— A TERAPIA HORMONAL EM PACIENTES COM
NEUROFIBROMATOSE TIPO 1 É SEGURA? —
Drs. Karin Soares Gonçalves Cunha, Nicolle
Cavalcante Gaglionone, Kamila da Silva Peruzini,
Layna Nunes Nascimento e Mauro Geller — no 3
— p. 45
— ABORDAGEM CONTEMPORÂNEA DO CHOQUE CARDIOGÊNICO — Dr. Fernando Oswaldo Dias Rangel — no 2 — p. 19
— APNEIA OBSTRUTIVA DO SONO — DA SUSPEITA DIAGNÓSTICA AO TRATAMENTO —
Profs. Gunther Kissmann, Rafael Leal e Carlos
Alberto de Barros Franco — no 3 — p. 37
—Apoptose no endométrio humano e
endometriose — Drs. Marcos Mendonça, Liv
Braga de Paula e Luciana Moro — no 6 — p. 11
— ASPECTOS ATUAIS DO TRATAMENTO MEDICAMENTOSO DA FIBROMIALGIA — Drs. Rafael
Mendonça da Silva Chakr e Ricardo Machado
Xavier — no 5 — p. 25
—BIOMARCADORES DIAGNÓSTICOS DE TUBERCULOSE EM PLEUROLOGIA — Drs. Cyro
Teixeira da Silva Junior, Joeber Bernardo Soares
de Souza, Jorge Luiz Barillo, Renato Bergalo Bezerra Cardoso, Salim Kanaan, Analúcia Rampazzo Xavier, Gilberto Perez Cardoso e Elizabeth
Giestal de Araujo — no 5 — p. 21
— CIRROSES HEPÁTICAS METABÓLICAS — Dr.
Carlos Eduardo Brandão Mello — no 4 — p. 33
— CONSTIPAÇÃO INTESTINAL — Dr. José Galvão Alves — no 2 — p. 31
— CRISE HIPERTENSIVA — Dr. José Fernando Vilela Martin — no 1 — p. 21
— DENGUE GRAVE — Drs. Luiz José de Souza,
Pedro Gomes de Vasconcelos Silva, Prisicila da
Silva Pereira e Raphael Freitas Jaber de Oliveira
— no 5 — p. 7
—Dificuldades no diagnóstico diferencial entre mesotelioma pleural e adenocarcinoma metastático para pleura
patológica — Drs. Beltrão Paiva Castello Branco, Fernando Antonio Carvalho, Francisco de Assis
Paiva e Igor Torres Castello Branco — no 6 — p. 21
— DOENÇA DE CROHN ESTENOSANTE — Prof.
Sender J. Miszputen — no 2 — p. 7
— DPOC — SIGLA PEQUENA PARA UM PROBLEMA ENORME — Dr. Hisbello S. Campos —
no 3 — p. 15
—EMBOLIA PULMONAR — TRATAMENTO DA
FASE AGUDA — Dr. André Volschan — no 1 — p. 7
— ESCLEROSE SISTÊMICA E O FENÔMENO DE
RAYNAUD — MANEJO TERAPÊUTICO — Dra.
Cristiane Kayser — no 4 — p. 13
— ESOFAGITE EOSINOFÍLICA — Drs. Luiz João
Abrahão Junior, Luiz João Abrahão e Ana Cristina de Azevedo Abrahão Oliveira — no 4 — p. 37
—ESTADOS HIPER E HIPOGLICÊMICOS AGUDOS — CONDUTA ATUAL — Profs. Gilberto
Perez Cardoso, Cyro Teixeira da Silva Junior e
Renato Bergallo Bezerra Cardoso — no 2 — p. 41
— EVOLUÇÃO CLÍNICA DA MOLÉSTIA DE CHAGAS — Profs. Andréia Patrícia Gomes, Rodrigo
Roger Vitorino, Luciene Muniz Braga, Aniele de
Pina Costa e Luiz Alberto Santana — no 3 — p. 51
— Evolução das técnicas de transplante de fígado — O papel da veia cava in-
40
ferior — Dr. Olival Cirilo Lucena da Fonseca
Neto — no 6 — p. 7
—FRATURAs FEMORAIS ATÍPICAS POR USO
PROLONGADO DE BISFOSFANATO — MITO
OU VERDADE? — Drs. Vincenzo Giordano,
Marco Martins Lages, Egídio Santana, Felipe
Serrão de Souza, Rodrigo Pires e Albuquerque
e Ney Pecegueiro do Amaral — no 2 — p. 13
— HELICOBACTER PYLORI NÃO ERRADICADO
COM O ESQUEMA TRADICIONAL — O QUE
FAZER? — Profs. Carlos Brito e José Roberto
de Almeida — no 1 — p. 31
—Hemocromatose hereditária — Drs.
Willian Cassuriaga Aymone, Vanessa Valiati, Maria da Graça de Faria Santos Resem e
William Peres — no 6 — p. 27
— HIPOGLICEMIA EM ADULTOS — Dras. Joana
Rodrigues Dantas, Monique Alves da Silva,
Ana Paula Borges Santos de Lucena, Samara
Pimentel de Souza e Melanie Rodacki — no 5
— p. 11
—INSUFICIÊNCIA ADRENAL AGUDA — Dra.
Yolanda Schrank — no 5 — p. 43
— LEIOMIOMATOSE UTERINA — REVISÃO —
Drs. Marcos Mendonça, Stephanie Viveiros da
Silva Teixeira, Tatiane Barroso Maciel, Warley
Cézar da Silveira, Sarah de Lima e Silva, Walkíria Monteiro Lopes e Camila Milagres Macedo
Pereira — no 1 — p. 49
— LOMBALGIAS — O QUE O CLÍNICO PRECISA
SABER — Dr. Luiz Fellipe Favoreto Genelhu —
no 4 — p. 19
— OSTEOARTRITE — FISIOPATOLOGIA E TRATAMENTO MEDICAMENTOSo — Dr. Fábio
Freire José — no 2 — p. 47
— PANCREATITE AGUDA — TERAPÊUTICA CLÍNICA — Dr. José Galvão-Alves — no 5 — p. 33
— PROBIÓTICOS E PREBIÓTICOS NA DIARREIA
AGUDA — REVISÃO — Profs. José Miguel Luz
Parente e Mirian Perpétua Palha Dias Parente
— no 1 — p. 41
— PROPEDÊUTICA BÁSICA DA INFERTILIDADE
CONJUGAL — Drs. Rívia Mara Lamaita, Cláudia Lourdes Soares Laranjeira, Izabela Vieira
Botelho, Maria Luísa Braga Veira e Agnaldo
Lopes da Silva Filho — no 4 — p. 25
—Síncope vasovagal em criança com
Wolff-Parkinson-White — Drs. Maria
Natividade Santos Costa Lopes, Cecílio Kassem
Salamé e Camila Costa Oliveira — n o 6 —
p. 17
— SÍNDROME DO INTESTINO IRRITÁVEL PÓS-INFECÇÃO INTESTINAL — Profa. Maria do
Carmo Friche Passos — no 3 — p. 7
—TERAPÊUTICA DA ILEÍTE NA DOENÇA DE
CROHN — Dra. Andrea Vieira — no 3 — p. 33
— Tratamento não cirúrgico do traumatismo renal contuso — Drs. Olival Cirilo
Lucena da Fonseca Neto e Rômulo Vasconcelos
— no 6 — p. 35
— TRATAMENTO OTIMIZADO ANTIPLAQUETÁRIO, ANTILIPÊMICO, CONTROLE DA PRESSÃO ARTERIAL E FREQUÊNCIA CARDÍACA
NA DOENÇA CORONARIANA CRÔNICA ASSINTOMÁTICA OU ANGINA CLASSE I — Dra.
Vivian Lerner Amato — no 4 — p. 7
—TROMBOEMBOLISMO PULMONAR — TERAPIA PÓS-CRISE — Dra. Isabela Volschan
— no 1 — p. 13
JBM

Seções
Atualidades médicas
— no 1 — p. 39 — no 2 — p. 54 — no 3 — p. 14 —
no 4 — p. 24 — no 6 — p. 16
Diagnóstico laboratorial
— Gastroenterites infecciosas — Dr. Helio
Magarinos Torres Filho — no 2 — p. 25
Editorial
— Atualizações relevantes — no 6 — p. 3
— Uma edição especial — no 5 — p. 3
— Examinando o corpo com os olhos
da alma — no 2 — p. 3
— Fomentar ciência, tecnologia e
inovação é essencial! — no 1 — p. 3
—Médicos e população: os caminhos
são os mesmos— no 4 — p. 3
— Nota da Academia Nacional de Medicina — no 3 — p. 3
Imagem em medicina interna
(Coordenação: Dra. Marta Carvalho Galvão)
— Adenocracinoma brônquico com
atelectasia — Dras. Marta Carvalho Galvão, Lívia lopes Pinheiro e Maria Luíza Rodrigues Laguardia — no 2 — p. 38
— Lipossarcoma retroperitoneal — Dras.
Marta Carvalho Galvão e Taiza Dourado Ribeiro
— no 1 — p. 56
Noticiário
— no 1 — p. 58 — n o 2 — p. 58 — n o 3 — p. 58
— no 4 — p. 42 — no 5 — p. 50 — no 6 — p. 39
Panorama internacional
— no 1 — p. 11 — no 2 — p. 12 — no 3 — p. 31 —
no 6 — p. 26
Relato de caso
— Gastroparesia — Uso da cintilografia
para diagnóstico e quantificação —
Drs. Bernardo S. L. Vianna, Nilton Lavatori, Gustavo Barbirato, Jader C. de Azevedo, Talita B.
P. dos Santos, Allan V. Barlete, Tatiane Santos,
Maria Fernanda Rezende, Marcos Frederico
Cavalcanti, Alan Chambi, Claudio T. Mesquita
e José Galvão-Alves — no 3 — p. 56
— Mesenterite — Drs. José Galvão-Alves,
Marta Carvalho Galvão e Daniella Cavalcante
— no 2 — p. 56
NOVEMBRO/DEZEMBRO, 2013

VOL. 101  No 6
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