v26 n1 art02 Manejo pratico

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v26 n1 art02 Manejo pratico
ENTOMOLOGIA
MANEJO PRÁTICO DA RESISTÊNCIA
DO ÁCARO-DA-LEPROSE DOS CITROS
SANTIN GRAVENA1, SÉRGIO ROBERTO BENVENGA1, LUÍS CARLOS SOUZA AMORIM1,
JOSÉ LUIZ DA SILVA1 e NILTON ARAUJO JUNIOR1
RESUMO
O manejo prático da resistência a acaricidas do ácaro- daleprose, Brevipalpus phoenicis Geijskes (Acari: Tenuipalpidae)
consiste na análise do histórico de tratamentos fitossanitários realizados no talhão cítrico e a recomendação de um acaricida com
mecanismo de ação distinto ou a rotação de acordo com os casos
de resistência cruzada ou múltipla. As características técnicas
dos acaricidas registrados para a cultura são apresentadas neste
artigo para consulta por parte de citricultores e técnicos. Em
termos práticos, a recomendação do acaricida também pode ser
realizada por meio de um bioensaio prático de laboratório, avaliando-se o índice de mortalidade de uma amostra da população
do ácaro-da-leprose do talhão cítrico, previamente à aplicação.
Garante-se, dessa forma, além do manejo da resistência, a recomendação de acaricidas com eficiência de controle comprovada
sobre o respectivo alvo biológico. Os procedimentos detalhados
de testes de rotina são descritos no artigo, para demonstrar a facilidade perante os resultados consistentes de modo a contribuir
no sucesso do manejo dessa praga-chave na citricultura.
Termos de indexação: Brevipalpus phoenicis, acaricidas, mecanismos de ação, controle integrado, controle químico.
1
Gravena - ManEcol Ltda. Rod. Dep. Cunha Bueno, km 221,5 - SP 253, Caixa Postal 546, 14870-990
Jaboticabal (SP).
ARTIGO TÉCNICO
12
SANTIN GRAVENA et al.
SUMMARY
PRACTICAL MANAGEMENT OF THE CITRUS LEPROSIS MITE
RESISTANCE, IN BRAZIL
The resistance management of leprosis citrus mite, Brevipalpus phoenicis Geijskes (Acari: Tenuipalpidae) is based
on the rotation technique, according to mechanisms of action
mitecides and to the cases of crossed or multiple resistances.
The technical characteristics of the main mitecides registered for
citrus are shown in this article. The practical recommendation of
the mitecide also can be done by a laboratory bioassay, evaluating the mortality rate of a population sample, previously to the
application, guaranteeing both the resistance management and
an effective recommendation on the respective biological target.
The detailed procedures of this routine test are described in this
paper, to demonstrate the easiness before the consistent results to
contribute to the success of this key citrus pest management.
Index terms: Brevipalpus phoenicis, mitecides, mechanisms of
action, integrated management, chemical control.
1. INTRODUÇÃO
O ácaro-da-leprose dos citros, Brevipalpus phoenicis (Geijskes)
(Acari: Tenuipalpidae), é a praga de maior importância na citricultura
brasileira, em se tratando de manejo, sobretudo em vista do elevado custo
dos tratamentos fitossanitários, cerca de 60 milhões de dólares anuais, que,
realizados de forma desordenada e como tática única de manejo, favorecem
o desenvolvimento de populações resistentes a acaricidas. Além disso, os
danos que causam por meio de transmissão do vírus da leprose dos citros
contribuem para a redução da produtividade e, conseqüentemente, da rentabilidade da atividade citrícola.
O controle químico do ácaro-da-leprose, como a única tática de manejo em pomares, intensifica o uso de acaricidas e inseticidas-acaricidas
pelo citricultor e pode resultar em desequilíbrios biológicos pela drástica
redução da população de ácaros predadores (Phytoseiidae e Stigmaeidae) e
de insetos benéficos. É comum a constatação de que acaricidas de eficiência
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comprovada deixam de tê-la, tornando as aplicações mais freqüentes do que
o desejável, havendo pomares com média anual até de três aplicações por talhão. Contribuem para agravar esse desequilíbrio as aplicações sistemáticas de
inseticidas (piretróides + fosforados) realizadas atualmente pelos citricultores
para o controle de insetos-praga como as cigarrinhas transmissoras da clorose
variegada dos citros (CVC), do bicho-furão e da cochonilha Ortézia, bem
como de fungicidas (cúpricos + orgânicos) para a prevenção contra o cancro
cítrico, a pinta-preta e a podridão-floral, entre outros, causando redução da
incidência de insetos benéficos e fungos respectivamente, os quais controlam
naturalmente muitas pragas dos citros. Um exemplo evidente é a ocorrência
de surtos severos da cochonilha branca, Planococcus citri Risso (Hemíptera:
Pseudococcidae), nos últimos quatro anos, em grande parte do parque citrícola
paulista e do Triângulo Mineiro.
2. TALHÕES COM PROBLEMA DE CONTROLE
Supondo-se que o citricultor esteja com um ou mais talhões apresentando sinais de dificuldade no controle do ácaro-da-leprose por determinado
acaricida ou mistura de acaricidas, o primeiro passo recomendado para detectar
as possíveis causas é definir, pelo menos, um dos talhões em dificuldade de
controle. Na referida área, deve-se verificar o histórico de pulverizações, bem
como as condições do pulverizador e do clima durante a pulverização que se
mostrou ineficiente.
Uma das atitudes de grande valia para determinar o que ocasionou a
ineficiência é a realização de um bioensaio de laboratório, cujos procedimentos são apresentados na seqüência. Este ensaio pode ser realizado com o
acaricida utilizado pelo citricultor, sendo importante separar um frasco do lote
do produto, que também poderá ser destinado para outras pesquisas e análise
química, quando necessário.
2.1 Coleta de amostra
Por meio de bioensaios de laboratório de natureza prática, é possível
diagnosticar a situação de um talhão onde o citricultor constata que a pulverização não surtiu o efeito esperado.
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Para isso, alguns aspectos devem ser considerados pelo interessado,
destacando-se, em primeiro lugar, a definição clara do problema pelo citricultor
ou técnico e o fornecimento do histórico completo de pulverizações realizadas
por um longo período no talhão. Atualmente, recomenda-se que esse período
seja de, pelo menos, dois anos. Nessas informações, devem constar o nome
comercial dos inseticidas, acaricidas e fungicidas utilizados, bem como as
doses e o volume de calda aplicados por planta. Em segundo lugar, faz-se
necessário seguir rigorosamente o procedimento de coleta e transporte da
amostra a ser adotada no bioensaio, os quais são descritos a seguir.
Recipiente de transporte: O acondicionamento de frutos infestados
com o ácaro deve, preferencialmente, ser realizado em uma caixa de poliestireno (Isopor®) com tampa, refrigerada com gelo acondicionado em saco plástico
vedado, depositado no fundo da caixa e isolado dos frutos por meio de uma
camada de papel jornal. O número de frutos coletados deve variar em função
da quantidade de bioensaios, bem como da infestação de ácaros no pomar,
mas no interior da caixa de poliestireno o número deve ser suficiente para
evitar que os frutos fiquem soltos, podendo danificar toda a amostra coletada.
Nesses casos, uma quantidade maior de frutos deve ser intercalada em meio
aos frutos infestados, ou sugere-se fazer o acondicionamento dos frutos em
meio a bolas confeccionadas com papel jornal.
Coleta de frutos no talhão-problema: Com o auxílio da lente de inspeção (10 aumentos), deve-se confirmar a presença do ácaro na fase adulta
em cada fruto coletado e acondicioná-lo no interior da caixa de poliestireno
conforme descrito. Para cada cada acaricida a ser testado no laboratório, são
necessários 40 ácaros adultos, sendo esse número referencial para a definição
do número de frutos a coletar. No laboratório, os ácaros devem ser distribuídos
em quatro frutos, correspondendo às quatro repetições de cada acaricida para
validade estatística dos dados de eficiência. O tratamento testemunha, somente
com a aplicação de água, é necessário para avaliação da mortalidade natural
do ácaro a utilizar para corrigir o cálculo da redução populacional ocasionada pelo acaricida. É usual o bioensaio com a referida população coletada no
talhão-problema utilizando-se um acaricida com mecanismo distinto de ação,
visando orientar o citricultor na possível rotação de acaricida com comprovada
eficiência de controle.
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Para avaliar a eficácia do acaricida do mesmo lote utilizado no talhão,
quando há disponibilidade do produto desse lote pelo citricultor, procede-se
ao bioensaio sobre uma população de ácaro-da-leprose mantida em criação
laboratorial (criação-estoque), isenta de tratamentos químicos há, pelo menos,
dois anos, seguindo-se o padrão descrito.
Identificação do talhão e histórico de pulverizações: Identificar com
etiqueta o material coletado, indicando o número do talhão, variedade e portaenxerto, idade e número de plantas; deve acompanhar a amostra o histórico
das pulverizações de um período de, pelo menos, dois anos.
Transporte: A caixa de poliestireno contendo os frutos infestados com
ácaros do talhão problema deve ser transportado com todo o cuidado para
o laboratório, onde será realizado o biensaio. Esses cuidados se referem à
prevenção contra impactos bruscos, alta temperatura, contato com amostra
de agrotóxicos e rapidez, ou seja, fazer a programação com o laboratório de
modo que seja coletado e enviado, preferencialmente, no mesmo dia.
2.2 Bioensaio
Os laboratórios credenciados a realizar serviços de bioensaios para ácaros provenientes de talhões com problema de eficácia de pulverizações devem
apresentar certos procedimentos de rotina, sendo os principais os descritos a
seguir.
Preparo de frutos para o teste: Coletar frutos sem histórico de tratamentos fitossanitários com acaricidas e inseticidas, preferencialmente, com
infecções de verrugose, para servirem de substrato ideal aos ácaros; lavá-los
com esponja macia em água corrente para a retirada de impurezas e ácaros
ou insetos presentes, secá-los à sombra e, finalmente, demarcar a área de
confinamento dos ácaros a serem transferidos (arena), utilizando-se caneta
para retroprojetor. Os frutos utilizados no teste devem ser mantidos em uma
bandeja plástica com encaixes, para evitar a rolagem durante o período de
avaliação.
Aplicação dos produtos: Os frutos devidamente identificados com
o número do tratamento e a letra da repetição devem ser imersos em 1 L da
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calda acaricida na concentração recomendada pelo fabricante. É conveniente
verificar o pH da água usada para o bioensaio e fazer as correções na calda
acaricida, adequando-se ao recomendado na bula do acaricida em teste. Nos
casos em que o bioensaio seja realizado com a água da propriedade solicitante, deve-se informar quanto à correção efetuada na data da aplicação em que
fora detectado o insucesso do controle ou proceder ao teste laboratorial com
o pH corrigido, sendo uma das exigências para a recomendação do acaricida.
O recipiente utilizado para esse fim é um becker, havendo a permanência
dos frutos sob imersão por 20 segundos. Imediatamente após, os frutos devem ser retirados e mantidos para secagem à sombra e, em seguida, a arena
demarcada deve ser circulada com uma cola de adesivo permanente “stick”,
com a finalidade de manter os ácaros confinados na referida área e facilitar
as avaliações.
Inoculação dos ácaros: Através da varredura manual dos frutos do
talhão problema ou dos frutos provenientes da criação estoque, os ácaros
devem ser retirados e depositados sobre uma placa de Petri de vidro (15 cm
de diâmetro), mantida sob as lentes de um microscópio estereoscópico (lupa
laboratorial). Em outro equipamento semelhante, deve-se distribur, em seqüência, os frutos do tratamento-testemunha e aqueles tratados com os diferentes
acaricidas, respectivamente nessa ordem, e com o auxílio de um pincel com
poucos fios inicia-se a transferência individual dos ácaros da placa de Petri
para o centro da arena no total de 10 ácaros adultos por fruto (repetição).
Avaliação da eficácia dos produtos: A avaliação do número de ácaros
vivos, mortos e colados na delimitação da arena deve ser realizada diariamente
e por, no máximo 10 dias, variando em função das características dos acaricidas
utilizados do bioensaio. Avaliações superiores a esse período são descartadas
para bioensaios de avaliação de mortalidade de adultos, sendo restritas aos
testes de acaricidas com ação ovicida. Durante todo o período de avaliações,
os frutos devem permanecer no interior de salas climatizadas, com temperatura controlada em 25 ± 2 ºC, umidade relativa em 70 ± 10% e fotofase de 12
horas. Os resultados são expressos em porcentagem, referindo-se ao índice
de redução populacional em relação à testemunha. Os dados relativos ao
número de ácaros que se dirigem para a cola, eventualmente, são analisados
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separadamente e prestam-se para destacar o efeito de dispersão ou a ação
desalojante dos acaricidas testados.
2.3. Exemplos de bioensaios
1o Caso: com um histórico de 16 meses sem tratamentos fitossanitários
com acaricidas num talhão de laranja, mas com 11 aplicações de inseticidas
piretróides nesse período, de forma preventiva, para o controle de cigarrinhas
da CVC, optou-se pela pulverização da mistura de dicofol e hexythiazox
quando a amostragem indicava nível de ação de 10% em fevereiro de 2004;
não reduzindo a infestação do ácaro-da-leprose, decidiu-se pela realização
do bioensaio em 23 de março de 2004, após cerca de um mês da aplicação.
O resultado está na Tabela 1.
2o Caso: com um histórico de aplicações mensais de inseticida piretróide, durante o período de maturação dos frutos em talhão de tangerina com alta
infestação do ácaro-da-leprose, decidiu-se pela aplicação do acaricida dicofol
para evitar sua migração pelo vento em direção a um talhão de laranja recémTabela 1. Bioensaio prático para monitoramento da resistência aos acaricidas dicofol +
hexythiazox em mistura e cyhexatin sobre o ácaro-da-leprose, Brevipalpus phoenicis,
proveniente de talhão de laranja, Citrus sinensis, com alta freqüência de aplicação de
inseticidas piretróides para o controle de cigarrinhas da CVC (exemplo 1). Teste de
eficiência desses produtos sobre o ácaro-da-leprose da criação estoque da Gravena
ManEcol Ltda. Jaboticabal, 2004
Acaricidas
Procedência dos ácaros
Dicofol + Savey
Pomar da Fazenda
(11 aplicações de
inseticidas piretróides)
Cyhexatin
Dicofol + Savey
Cyhexatin
Pomar da Gravena
(criação estoque para fins
de bioensaios)
Dose (2000 L)
Eficiência
(4 dias após a
inoculação)
1,5 L + 30 g
3%
1,0 L
100%
1,5 L + 30 g
1,0 L
71%
100%
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transplantado; sendo inexpressiva a redução populacional do ácaro nos frutos
e ramos da tangerina após a aplicação do acaricida, optou-se por analisar o
caso de insucesso através de bioensaio, cujo resultado está na Tabela 2.
Nos dois casos, a aplicação de piretróide para controle de outras pragas
dos citros pode ter resultado no desenvolvimento de resistência cruzada e/ou
múltipla no ácaro-da-leprose ao dicofol. A explicação é que tanto o dicofol
como os piretróides têm compostos derivados do DDT, portanto, com mecanismos de ação similares, embora não atuem necessariamente no mesmo sítio
de ação para causar a mortalidade do ácaro. O dicofol atua como inibidor de
elétrons na mitocôndria e os piretróides agem como moduladores dos canais
de sódio do axônio do sistema nervoso do ácaro. A partir desses bioensaios,
está sendo possível orientar os citricultores para melhor manejo de resistência
em seus pomares. Além disso, como se observa nas Tabelas 1 e 2, o biensaio
prático pode ser útil na indicação de melhores produtos para o citricultor
aplicar no talhão analisado.
Tabela 2. Bioensaio prático para monitoramento da resistência aos acaricidas sobre o
ácaro-da-leprose, Brevipalpus phoenicis, proveniente de talhão de tangerina, Citrus
reticulata, com alta freqüência de aplicação de inseticidas piretróides para o controle
de moscas-das-frutas (Exemplo 2o Teste de eficiência desses produtos sobre o ácaroda-leprose da criação estoque da Gravena ManEcol Ltda. Jaboticabal, 2004
Dose
Eficiência
(2 dias após
a inoculação)
Procedência dos
acaricidas
Procedência dos ácaros
Dicofol (Fazenda)
Pomar da Fazenda
Pomar da Gravena
1,5 L
12%
100%
Propargite (Gravena)1
Cyhexatin (Gravena)1
Pomar da Fazenda
1,0 L
1,0 L
95%
100%
1
(2.000 L)
Produtos do estoque da Gravena ManEcol Ltda utilizados como contraprova (ácaros criados em pomar
sem alguma aplicação de produto fitossanitário por, pelo menos, 12 anos).
Passa-se a abordar a seguir a prevenção de resistência do ácaro-da-leprose em pomares cítricos.
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3. DEFINIÇÃO DE RESISTÊNCIA
Segundo GEORGHIOU & MELLON (1983), uma população de insetos
é considerada resistente quando sua resposta a um inseticida em condições de
campo ou em bioensaios diminui significativamente aquém da sua resposta
normal. Pela Organização Mundial de Saúde, resistência é o desenvolvimento
de uma habilidade, numa linhagem de um organismo, de tolerar doses de tóxicos letais para a maioria da população normal (suscetível) da mesma espécie
(OMOTO, 1995). Para GEORGHIOU & TAYLOR, 1977a,b), os fatores que
afetam a evolução da resistência são divididos em genéticos (número de genes envolvidos, dominância e expressividade da resistência), bioecológicos
(características do ácaro ou inseto) e operacionais (características do produto
químico e da sua aplicação). Uma população pode desenvolver resistência
cruzada contra dois produtos diferentes, mas próximos quimicamente, quando um deles causa seleção para um mecanismo de desintoxicação comum
a ambos. Resistência múltipla é quando a seleção é causada separadamente
contra mecanismos de desintoxicação diferentes entre produtos químicos
não relacionados (FRENCH et al., 1992). Múltipla ou cruzada, o fato é que
ocorreu resistência do ácaro-da-leprose ao acaricida dicofol, selecionado por
piretróide. É mais provável que seja múltipla, isto é, pode ser ocasional, pois,
esse tipo de resistência tem mecanismos governados por genes distintos, ao
contrário da resistência cruzada, que é governada por um único gene.
4. PROCESSO DA RESISTÊNCIA
Para que o citricultor entenda o processo da resistência e defina um
programa de prevenção, são apresentadas as Figuras 1 e 2, embasadas nas
indicações do IRAC-BR (Comitê Brasileiro de Ação a Resistência a Inseticidas, folheto) (GLOBAL PEST RESISTANCE MANAGEMENT SUMMER
INSTITUTE, 1995).
Na Figura 1, é simulada uma situação A, em que uma população de
ácaros-da-leprose supostamente nunca recebeu agrotóxico algum. Sabe-se que,
na natureza, toda população de insetos ou ácaros apresenta uma proporção
naturalmente resistente, sem nunca ter sido submetida a nenhum tratamento
fitossanitário. Partindo-se, portanto, da premissa de que apenas 10% da população seja naturalmente resistente (ácaro ilustrado em cor preta), reiniciam-se
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Figura 1. Simulação de seleção de indivíduos resistentes em população inicial de ácaros-da-leprose suscetível. (Situação
A: Com acaricidas de mesmo mecanismo de ação). Fonte: Folheto do Boletim IRAC-BR.
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Figura 2. Simulação de seleção de indivíduos resistentes em população inicial de ácaros-da-leprose suscetível. (Situação
B: Com rotação de acaricidas de mecanismos de ação distintos). Fonte: Folheto do Boletim IRAC-BR.
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as aplicações de um acaricida de mesmo grupo químico ou mecanismo de
ação semelhante. Verifica-se que, após cada aplicação, eleva-se a proporção
de indivíduos resistentes. Pela simulação, o controle passa a ser totalmente
ineficiente com três aplicações, pois ocorre seleção de indivíduos resistentes
ao(s) referido(s) acaricida(s).
Na Figura 2 simula-se uma situação B, em que o citricultor rotaciona
o acaricida ou o mecanismo de ação a partir da primeira aplicação, sobre
uma população de ácaros-da-leprose supostamente igual à verificada no
início da situação A. Nesse caso, não foi favorecida a seleção de indivíduos
resistentes após a segunda aplicação e espera-se que o período de controle do
ácaro-da--leprose seja semelhante entre as aplicações, excluindo-se as demais
variáveis que influenciam a eficácia de controle. Com isso, o citricultor estará
contribuindo para o manejo da resistência do ácaro-da-leprose, bem como
escolhendo melhor os produtos mais eficazes, obtendo, assim, redução nos
custos de produção e preservando a longevidade das moléculas dos acaricidas
registrados para a cultura.
5. MANEJO PRÁTICO DE RESISTÊNCIA
Na tomada de decisão de pulverização para o controle do ácaro-da-leprose, o citricultor ou técnico deve analisar o histórico de pulverização no
talhão e optar pela rotação de acaricidas de grupos químicos e mecanismos
de ação distintos e que não apresentem resistência cruzada e/ou múltipla.
Para tanto, o Quadro 1 constitui boa referência para a escolha dos acaricidas
a utilizar em rotação ou mistura de produtos. Associada a essa indicação, o
uso de bioensaios práticos para a escolha de produtos eficientes para o manejo
do ácaro em cada talhão constitui boa estratégia para assegurar a eficiência
do manejo da resistência e redução de gastos com aplicações ineficientes.
Um fator que também contribui para o sucesso do controle do ácaro-da-leprose diz respeito ao hábito do citricultor em analisar, diariamente, as
fichas de inspeção de pragas elaboradas pela equipe de inspetores capacitada
no assunto, e decidir pela pulverização no dia seguinte em que for constatado índice de infestação do ácaro superior ao referencial de controle (nível
de ação). Desse modo, evitam-se incrementos populacionais despercebidos
e a tomada de decisão de controle sob altas infestações, o que torna o alvo
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e piretróides
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neurotransmissor
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comportamental
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biológico muito disperso nas diversas partes da planta. A boa regulagem do
equipamento de pulverização e a observação das características técnicas dos
produtos são fatores importantes ou essenciais para o manejo do ácaro-da-leprose.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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