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Área: A Universidade na Sociedade do Conhecimento A visão dos estudantes sobre o uso obrigatório de uma plataforma LMS em um curso presencial Sérgio Lopes dos Santos - [email protected] Roberto B. B. Santos Vagner B. Barbeta Resumo: O objetivo deste trabalho é o de analisar uma metodologia de aplicação de uma ferramenta de educação a distância (EaD) em uma disciplina de um curso presencial de engenharia. Buscamos identificar qual é o sentimento observado nos alunos e o impacto quando estes são obrigados a utilizar uma plataforma LMS (Learning Management System) como instrumento didático complementar às suas aulas. Embora em um primeiro momento haja resistência por parte de alguns, uma grande parcela adere ao sistema de forma tranqüila. No entanto, esta parcela resistente parece se manter mesmo após a utilização do ambiente ao longo do semestre. O pré-conceito que o aluno traz, independentemente das atividades propostas e disponibilizadas através da plataforma, parece se manter durante o transcorrer do tempo, o que indica a necessidade de um trabalho prévio com os estudantes visando à conscientização dos mesmos sobre os benefícios que estes instrumentos podem trazer para o seu aprendizado. Observamos também que os alunos são fortemente motivados por fatores extrínsecos, o que faz com que atividades livres e sem ganho visível de recompensas sejam pouco utilizadas e valorizadas. 2 Introdução As expectativas dos estudantes sobre um curso ou sobre as atividades propostas em um curso podem influenciar decisivamente o resultado de sua aprendizagem (Schoenfeld: 1992). Cada estudante possui, antes de começar um curso, um conjunto de crenças sobre o mesmo, sobre o que será exigido dele, sobre quais conhecimentos deve aprender, sobre quais habilidades deve possuir e, de modo mais geral, sobre como aprender (Redish, Saul, Steinberg: 1998). As expectativas cognitivas dos estudantes, formadas a partir de suas experiências prévias, agem como um filtro pelo qual selecionam e interpretam o material que lhes é oferecido, avaliando a importância das atividades que devem realizar. Um fato notável sobre a formação das expectativas é sua precocidade. Linn e Songer (1991), analisando a postura de estudantes de ensino médio frente ao ensino de ciências, mostraram que já era possível discernir aqueles que apresentavam uma atitude dinâmica e os que apresentavam uma atitude estática. Segundo as autoras, um estudante com atitude dinâmica frente à ciência a percebe como algo que pode ser compreendido e interpretado, enquanto um estudante com atitude estática entende a ciência como algo que depende fundamentalmente de memorização e que não se relaciona diretamente com seus interesses. Entre os fatores envolvidos na formação de expectativas, podemos citar os estilos de aprendizagem (Kolb: 1984, Felder, Silverman: 1988). Um estilo de aprendizagem pode ser definido como o conjunto de traços característicos de um estudante que influencia a sua habilidade de adquirir e interpretar conhecimento, e de interagir com seus pares e com seus professores (Grasha: 1996). Reconhecer que os estudantes possuem estilos de aprendizagem distintos e procurar utilizar metodologias variadas é uma forma de prestar atenção à diversidade de estilos presentes entre os participantes de um curso com o objetivo de criar um ambiente cognitivo e afetivo capaz de permitir a aprendizagem significativa. A aprendizagem significativa é realizada por meio da construção de significados para os novos conhecimentos adquiridos. Para aprender significativamente, o estudante deve procurar relacionar cada novo conhecimento que adquire aos conhecimentos presentes e organizados em sua estrutura cognitiva. Deste modo, há uma incorporação não-arbitrária, substantiva e não-literal do conhecimento novo na estrutura cognitiva prévia (Ausubel: 2000). Para que a aprendizagem seja significativa, é preciso que o estudante envolva-se ativamente em organizar, recuperar e criar relacionamentos entre fatos, conceitos, princípios e teorias que lhe são ensinados. Somente deste modo, o estudante tem condições de reter o conhecimento adquirido e de transferi-lo para uso em situações que fogem ao contexto original em que foi adquirido. Quando o estudante se responsabiliza ativamente por sua 3 aprendizagem, aprende mais e melhor do que se comportando passivamente (Knowles: 1990). Caso a estrutura cognitiva do estudante não possua um conjunto de conceitos gerais inclusivos e relevantes para o material a ser aprendido, a aprendizagem pode se dar de forma literal e não-significativa, baseada em pura memorização. Conceitos aprendidos de modo não-significativo têm grande chance de serem esquecidos rapidamente e não podem ser facilmente transferidos de um contexto para outro. Experiências anteriores de aprendizagem mecânica e não-significativa podem influenciar a formação de expectativas negativas por parte dos estudantes em relação a um determinado assunto. Ausubel propõe que uma estrutura cognitiva inadequada pode ser temporariamente completada com o uso de organizadores prévios. Um organizador prévio é um material que deve ser apresentado ao estudante antes do material propriamente dito e que deve conter os conceitos necessários para permitir a aprendizagem do conteúdo do curso em um nível mais geral e, portanto, mais inclusivo que o próprio material a ser aprendido. Deste modo, o material a ser aprendido encontra alguns conceitos em que se ancorar na estrutura cognitiva do estudante, pois os organizadores prévios permitem que o estudante organize o material em uma estrutura já familiar (Mayer: 1993). Ainda que nem sempre seja muito claro se um dado material serviu como organizador prévio, a disponibilidade atual das tecnologias de informação e de comunicação (TIC) tem permitido que organizadores prévios façam proveito da não-linearidade, característica do hipertexto e dos recursos multimídia (Coffey, Cañas: 2003). A difusão das tecnologias de informação e de comunicação pela sociedade moderna pós-industrial criou um cenário novo, em que formas de interação a distância são possíveis e cada vez mais relevantes. Esta interação a distância expande as capacidades humanas de cooperar e colaborar, bases da inteligência coletiva capaz de produzir, trocar e usar conhecimento em uma escala de tempo e com uma abrangência espacial antes inimagináveis (Lévy: 1998). As possibilidades abertas pelas TIC levaram à progressiva adoção de ferramentas de educação a distância em cursos presenciais, sobretudo nas instituições de ensino superior. Neste contexto, a avaliação das expectativas dos estudantes em relação ao uso de novas tecnologias desempenha um papel importante na definição de estratégias a serem adotadas para estimular o aprendizado dos estudantes. Em geral, os estudantes demonstram atitudes positivas em relação aos Web sites de seus cursos, utilizando algumas de suas ferramentas para aumentar o acesso às informações do curso (Ballard, Stapleton, Carroll: 2004). Contudo, deve-se notar que o uso das TIC pelos estudantes se restringe, na maior parte dos casos, às ferramentas mais simples e menos propensas à colaboração. Uma estrutura de 4 colaboração autêntica, capaz de criar conhecimento, raramente se estabelece de modo espontâneo, sem a mediação do professor. Este trabalho de mediação do professor se estabelece em diversas áreas. O professor é o responsável pela seleção do conteúdo, pela definição da extensão e da profundidade do tratamento dos tópicos e pela ênfase adotada no curso. Porém, o professor também tem um papel afetivo a desempenhar. Por um lado, seus valores e atitudes servem como referência para seus alunos. Por outro lado, o professor acaba sendo o responsável por criar um senso de comunidade entre os alunos ao exercer sua presença social, a qual é definida como a sensação de proximidade entre os membros de uma comunidade (Short, Williams, Christie: 1976). Em um ambiente de comunicação mediada pelas TIC, a presença social é o grau segundo o qual uma pessoa é percebida como real pelos outros participantes (Gunawardena, Zittle: 1997). Em muitas situações de comunicação mediada pelas TIC, o meio de comunicação utilizado é preferencialmente textual. Nestas condições, os interlocutores não conseguem expressar ou captar uma série de informações não-verbais, que são importantes para que sejam percebidos como pessoas reais. Esta dificuldade não é exclusiva dos ambientes eletrônicos de comunicação empregados em cursos de educação a distância online. No ambiente de uma sala de aula em que as relações ocorrem face-a-face, professores e estudantes estão tão acostumados a seus papéis tradicionais que a proximidade física é incapaz de superar a grande distância transacional que muitas vezes se estabelece (Moore: 1993). A distância transacional é uma medida da separação psicológica e comunicacional existente entre aluno e professor e entre os próprios alunos. Para Moore e Kearsley (1996), a qualidade de um curso é conseqüência de sua estruturação, de sua condução e de seu acesso pelos estudantes, estejam eles em uma situação de aprendizagem face-a-face ou a distância. É comum que o professor do ensino superior seja um especialista em sua área de conhecimento sem uma formação específica para a docência (Abreu, Masetto: 1990). Frente a uma sala de aula, sua atitude mais comum é copiar seus próprios professores (Moreira: 1986). Isto se reflete também quando as TIC são introduzidas em cursos presenciais, onde a tendência natural é a da simples transposição de elementos utilizados nos cursos presenciais para as plataformas eletrônicas. Se esta transposição for feita de modo irrefletido, as conseqüências podem ser muito graves e levarem a um efeito inverso àquele pretendido originalmente. Este panorama mostra-se mais dramático no caso das instituições particulares, onde a pressão por parte de estudantes e dirigentes para o uso de TIC como instrumento complementar às aulas tradicionais é crescente. Estas instituições, que por vezes acabam por absorver os alunos menos preparados e que apresentam maiores 5 dificuldades de aprendizagem, precisam aprender a fazer bom uso dos recursos que lhe são disponibilizados. A simples solução de evitar a introdução deste tipo de recurso em cursos presenciais não se apresenta como uma boa alternativa. Não se pode esquecer que os custos crescentes em termos de tempo e de dinheiro necessários para o deslocamento em uma região metropolitana associados aos custos declinantes das telecomunicações fazem deste processo de hibridização da educação superior uma solução economicamente muito atraente e por este motivo cada vez mais crescente ao redor do mundo (IRRODL: 2002). Este processo de hibridização da educação que tem sido observado há bastante tempo fora do Brasil tem crescido em importância em nosso país (Litto: 2002). A opinião de Litto é reforçada pela de Moran (2007), para quem dificilmente teremos um curso totalmente presencial em alguns poucos anos. Por isso, devemos caminhar para fórmulas diferentes de organização de processos de ensino-aprendizagem. Vale a pena inovar, testar, experimentar, porque avançaremos mais rapidamente e com segurança na busca destes novos modelos que estejam de acordo com as mudanças rápidas que experimentamos em todos os campos e com a necessidade de aprender continuamente (Moran, Masetto, Behrens: 2004). 1- Contextualização O Centro Universitário da Fundação Educacional Inaciana Pe. Sabóia de Medeiros (FEI) é uma instituição de ensino superior confessional, ligada à Companhia de Jesus, sem fins lucrativos e que oferece cursos de graduação nas áreas de Engenharia, Administração e Ciência da Computação. Ainda que os cursos de Engenharia, Administração e Ciência da Computação ministrados na instituição sejam presenciais, o Centro Universitário da FEI tem se preocupado em utilizar ferramentas de TIC já há algum tempo como forma de melhorar a relação de ensino-aprendizagem. Em 1996, simulações computacionais de fenômenos físicos foram introduzidas como parte do currículo (Barbeta, Bechara: 1996). Pouco tempo depois, a Internet começou a ser utilizada para a distribuição de material instrucional. Atualmente, há dois ambientes virtuais de aprendizagem em uso na instituição para apoio ao ensino presencial: Learnloop e Moodle. A introdução de uma ferramenta deste tipo como apoio aos cursos presenciais não é uma tarefa simples, pois envolve uma mudança cultural, tanto do lado dos docentes como dos discentes. A primeira plataforma LMS utilizada foi o Learnloop que, apesar da sua simplicidade, tem sido utilizada até os dias de hoje por uma parcela significativa do corpo docente. Tendo em vista que esta plataforma não evoluiu ao longo dos anos, optou-se posteriormente pelo ambiente Moodle (Modular Object-Oriented Dynamic Learning Environment) que tem sido 6 constantemente atualizado e que tem contado com a participação de vários desenvolvedores do mundo inteiro. Encontram-se atualmente cadastradas no Moodle cerca de 100 disciplinas, com mais de 6000 usuários acessando o ambiente. A maioria das disciplinas é aberta a todos os alunos e os recursos disponibilizados não são de uso obrigatório. Sua função tem sido a de oferecer acesso fácil à informação, tornando a busca aos materiais didáticos mais simples e organizada. No entanto, alguns docentes que vinham trabalhando no Learnloop, já evoluíram no sentido de tirar mais proveito do maior conjunto de recursos oferecidos pelo Moodle, estabelecendo regras mais rígidas para o uso por parte dos alunos e buscando uma mudança no paradigma tradicional de ensino. A disciplina “Bombas e Instalações Hidráulicas” é de responsabilidade do Departamento de Engenharia Mecânica e é ministrada em quatro turmas: no 6º semestre do período diurno dos cursos de Engenharia Mecânica e Engenharia de Produção, com alunos tendo uma experiência anterior de dois anos e meio de curso; no 7º semestre do período noturno do curso de Engenharia de Produção, com alunos tendo uma experiência anterior de três anos de curso; e no 8º semestre do período noturno do curso de Engenharia Mecânica, com alunos tendo uma experiência anterior de três anos e meio de curso. A maioria dos alunos teve nos semestres iniciais alguma experiência com o uso do Learnloop e do Moodle, já que diversas disciplinas básicas, especialmente as disciplinas de Física, usam estes ambientes para distribuição de material e como instrumento para agilizar a comunicação entre docentes e discentes. Na disciplina “Bombas” foi adotada uma metodologia que privilegiava o estudo dirigido. No ambiente Moodle, os alunos podiam participar de Fóruns, trocar mensagens rápidas e participar de chats. Além disso, havia uma série de atividades de avaliação, como questionários, assim como instrumentos de colaboração como blogs e wikis. Algumas destas atividades eram obrigatórias e as notas obtidas eram usadas na determinação de uma nota de aproveitamento dos alunos. Outras não eram obrigatórias, mas a participação dos estudantes gerava pontos extras em sua nota de aproveitamento. A obrigatoriedade de participação em atividades que ocorriam no contexto de um ambiente virtual de aprendizagem pode ser contrastada com uma experiência anterior na qual uma turma pequena, composta por 25 estudantes em regime de dependência, teve a oportunidade, mas não a obrigação, de utilizar o ambiente Moodle. Foram criadas várias atividades e os alunos tinham total liberdade para participar ou não das mesmas. Ao final do semestre foi observado que uma porcentagem mínima dos alunos fez uso efetivo dos recursos disponibilizados. Uma fração bastante significativa deste grupo de alunos não conseguiu obter aprovação na disciplina, mostrando que todo o trabalho feito no sentido de ajudá-los não foi aproveitado a contento. Por se tratar de alunos na faixa etária de 21 a 25 anos do período noturno, e que a princípio trabalham para obter o próprio sustento, tinha-se 7 a expectativa de que estes adeririam fortemente ao uso dos recursos disponibilizados, já que estes poderiam auxiliá-los na aquisição dos conhecimentos exigidos pela disciplina. A suposta responsabilidade que era esperada deste grupo não foi observada. Deste modo, optou-se por uma postura mais rígida no semestre seguinte (1º semestre de 2006), o que levou a um maior sucesso em relação ao primeiro piloto implementado, indicando assim que o oferecimento de atividades livres pode não surtir os efeitos esperados, pelo menos para uma boa parte dos alunos. Isso permite supor que a utilidade esperada de uma atividade é avaliada pelos estudantes em função de seu valor em termos de obtenção de notas. Uma atividade livre, sem atribuição de notas, é vista como pouco importante. Esta postura é encontrada, tipicamente, em estudantes cujas motivações para aprender são extrínsecas. Estudantes cujas motivações para aprender são intrínsecas tendem a realizar atividades sem serem recompensados externamente. Enquanto a motivação intrínseca de um indivíduo reflete sua autonomia, a motivação extrínseca permite que seu comportamento seja manipulado por outras pessoas de acordo com as recompensas oferecidas (White: 1959). Pode-se esperar que estudantes com motivações extrínsecas para aprender desistam mais facilmente, à medida que encontram dificuldades em sua trajetória acadêmica. Durante todo o curso, os alunos tinham a obrigação de responder a uma série de questões formuladas por meio do ambiente virtual. As questões versavam sobre os conteúdos abordado nas aulas presenciais do curso e, para estimular os alunos a estudarem continuamente e não apenas às vésperas das avaliações escritas, os prazos eram curtos, variando entre sete e dez dias. A obrigatoriedade de realizar atividades em ambiente eletrônico exige uma série de cuidados. Há a necessidade dos servidores encontrarem-se disponíveis 24 horas por dia, 7 dias por semana. Além disso, a Instituição deve possuir laboratórios de informática suficientes para atender a demanda dos alunos que não possuam computador em casa e que irão acessar os recursos fora de seus horários de aula. Esta situação gera uma série de expectativas iniciais e algumas angústias em parte dos alunos. Tentou-se então captar quais eram estas expectativas, como se alteravam com o passar do tempo e de que modo as mesmas poderiam influenciar a relação dos estudantes com o desenvolvimento da disciplina. Deste modo, no 2º semestre de 2006, foi planejada a aplicação de um conjunto de questionários através do Moodle, em três momentos diferentes do desenvolvimento dos estudos. 8 2- Aplicação dos questionários O primeiro questionário (Q1), aplicado ainda nas semanas iniciais do curso, visou somente avaliar a experiência dos alunos com ferramentas típicas de informática como processadores de texto, navegadores, clientes de email, com os recursos das TIC empregados na engenharia (como programas de CAD) e com os ambientes de EaD em uso na Instituição. Dos 180 inscritos no ambiente eletrônico, 166 alunos (92,2%) responderam ao questionário. Aproximadamente um mês após a aplicação do primeiro questionário, momento em que os estudantes já haviam tido tempo para se familiarizarem com os recursos oferecidos no ambiente, um segundo questionário (Q2) foi aplicado com o objetivo de verificar a opinião dos alunos sobre os materiais e recursos didáticos disponíveis, e como estavam sendo utilizados os mesmos. Dos cerca de 200 alunos agora inscritos, 154 (77%) responderam e, embora não fosse obrigatória, seria considerada como um dos elementos para a verificação da participação na disciplina. Próximo ao final do semestre, antecedendo as avaliações finais, foi liberado um terceiro questionário (Q3), visando fazer um comparativo entre as expectativas dos alunos no início do curso e sua visão dos recursos de aprendizagem disponibilizados ao longo do semestre letivo. Apesar de haver cerca de 240 alunos inscritos nesse momento, apenas 122 (50,8%) colocaram suas respostas. Acreditamos que a aproximação do início do período das provas finais e a necessidade de se realizar diversas atividades ainda pendentes fizeram com que esta avaliação dos recursos, não obrigatória, fosse deixada de lado por diversos alunos. Novamente, esta atitude sugere que mesmo estudantes que já se encontram em uma fase avançada em um curso superior ainda agem por motivações extrínsecas, não tendo conseguido substituir adequadamente as recompensas externas pela satisfação intrínseca de realizar uma tarefa. 3- Análise dos questionários O objetivo do primeiro questionário era determinar a familiaridade dos estudantes com alguns recursos típicos das TIC. Em relação aos ambientes Learnloop e Moodle, foi perguntado se o aluno já tinha utilizado as ferramentas e foi solicitada a avaliação da qualidade da experiência, em uma escala de 5 pontos. A escala foi posteriormente reduzida, durante a análise, para as categorias Ruim (1 e 2 pontos), Regular (3 pontos) e Bom (4 e 5 pontos) para facilitar a interpretação. A figura 1 mostra que o percentual de utilização anterior do Learnloop é muito mais elevado do que do Moodle, refletindo a introdução recente, e ainda limitada a poucas disciplinas, deste ambiente. Porém, a grande maioria dos 9 estudantes que já havia tido contato com o Moodle o avalia como Bom enquanto a avaliação da experiência com o Learnloop fica entre Regular e Bom. Além disso, foi possível descobrir que dos estudantes que já haviam usado anteriormente o ambiente Moodle, apenas 54,4% o fizeram exclusivamente na instituição. Outros 17,7% usavam o Moodle exclusivamente em seus locais de trabalho enquanto 27,8% dos estudantes já havia tido contato com o ambiente tanto em seu local de trabalho quanto na instituição. Estes números reforçam a percepção de que ferramentas de educação a distância têm sido empregadas com regularidade no ambiente corporativo. Figura 1. Avaliação do uso prévio dos ambientes Learnloop e Moodle. Como a experiência geral dos estudantes com informática pode ser um indicador de sua percepção do curso, verificamos a sua experiência nesse aspecto. Os resultados mostram que programas de uso comum como Word, Excel e PowerPoint ou equivalentes eram usados por mais de 95% dos estudantes do grupo analisado. Ferramentas de comunicação como clientes de email (84%), ou chats (72%) eram familiares à grande maioria dos estudantes e a maioria absoluta (88%) deles já participou de algum site de relacionamento como o Orkut. Quanto às ferramentas mais específicas usadas na engenharia, 87% dos estudantes já haviam usado alguma ferramenta do tipo CAD. Por outro lado, apenas 40% dos estudantes já haviam usado um banco de dados como o Access ou equivalente e apenas 10% dos estudantes possuía alguma familiaridade com ferramentas de produção colaborativa, como wikis. Em relação a equipamentos de informática, 89% dos estudantes deste grupo possui microcomputador em casa e o percentual dos que possuem um computador portátil já é bastante elevado uma vez que 67% possuem um laptop e 40% um palmtop. No segundo questionário, aplicado ainda no primeiro mês letivo, o foco esteve nas expectativas dos estudantes e em suas percepções acerca da utilidade dos recursos 10 disponíveis para seu aprendizado. Neste momento, 48% dos estudantes tinham certeza de que o uso do ambiente iria auxiliá-los no curso, enquanto 9% dos estudantes afirmavam que o ambiente não os auxiliaria. Os 43% restantes não possuíam expectativas bem definidas quanto à utilidade potencial do uso do ambiente, mas 38% expressavam expectativas levemente positivas enquanto 5% expressavam expectativas levemente negativas com relação a este aspecto. Após um mês de curso, apenas 48% dos participantes já haviam utilizado algum dos recursos disponíveis para se comunicar com o professor responsável pela disciplina. Porém, apenas 12% dos estudantes haviam enviado mais de uma mensagem desde o início do semestre letivo. Pode-se entender estes números pelo fato de que, em um curso presencial, o estudante tem a oportunidade de conversar pessoalmente com o professor duas vezes por semana. Desta forma, o acesso fácil ao professor desestimula o uso da comunicação escrita. O mesmo fenômeno pode ser percebido no que diz respeito à comunicação entre os estudantes. Apenas 44% deles haviam utilizado os recursos disponíveis para comunicar-se com seus colegas. No final do curso, no terceiro questionário, perguntamos aos estudantes se suas expectativas quanto à utilidade do ambiente haviam se confirmado. Os resultados ilustrados na Figura 2 indicam que dos alunos que expressavam a opinião de que o ambiente poderia ajudá-los, 94% concluíram que esta expectativa havia sido realizada. Dos alunos que achavam que o ambiente não iria ajudá-los, 84% concluíram que estavam certos, enquanto 16% dos estudantes que não acreditavam que o ambiente poderia auxiliá-los tiveram suas percepções alteradas e concluíram que o ambiente os ajudou. Figura 2. Expectativa, após um mês letivo, e avaliação, ao final do semestre letivo, sobre a utilidade de um ambiente virtual em uma disciplina presencial. 11 Figura 3. Avaliações dos estudantes sobre a contribuição de um ambiente virtual para a melhoria do aprendizado e da comunicação com o professor e com seus colegas. A avaliação da participação do estudante e a freqüência de uso do ambiente são também mostradas. No terceiro questionário, procuramos avaliar a contribuição percebida pelos estudantes do uso do ambiente virtual para a melhoria de aspectos como o aprendizado e a comunicação com o professor e com outros estudantes. Como pode ser visto na figura 3, 31,3% dos estudantes acreditam que o uso do ambiente virtual realizado no curso contribui positivamente para a melhoria do aprendizado contra 25,2% que acreditam que há pouca contribuição. Grande parte dos estudantes (43,5%) faz uma avaliação intermediária sobre a contribuição do ambiente virtual para seu aprendizado em um curso presencial. Já no aspecto comunicação, enquanto 53% dos estudantes acreditam que o ambiente melhorou a comunicação com o professor da disciplina, apenas 11% atribuem utilidade ao ambiente para melhorar sua comunicação com os colegas. Tendo em vista que os alunos usavam o ambiente para comunicar-se com seus colegas em proporção comparável à comunicação com o professor, podemos levantar a hipótese de que os estudantes ainda não vêem seus colegas como fontes potenciais de conhecimento ou como capazes de apoiá-los no processo de aprendizagem. Sobre a participação dos alunos, 61,5% deram notas 3 e 4 para a própria participação em todas as atividades, enquanto 79,5% atribuíram notas 2 e 3 para a 12 freqüência dos acessos ao ambiente, equivalente a apenas um acesso ao ambiente por semana, o que pode ser considerado pouco frente às atividades propostas. Este dado indica que os estudantes avaliam sua participação nas atividades de modo exagerado, ou seja, superestimam a dedicação que deram às atividades propostas. Na terceira pesquisa, ao final do curso, procuramos verificar se os prazos curtos dos questionários disponibilizados motivaram os alunos a estudar antes do que realmente costumam fazer. O resultado é que 54% dos estudantes afirmaram que foram motivados a estudar antes do que costumavam fazer, mas a maioria deles (56%) admitiu não haver estudado do modo correto. Dos 46% que afirmaram que não foram levados a estudar antecipadamente, 48% já possuíam o hábito de não deixar para estudar às vésperas das avaliações escritas. Neste contexto, uma questão que se propõe para um estudo posterior é a natureza do que os estudantes consideram estudar corretamente. 4- Conclusões Investigamos as expectativas e as percepções de estudantes de uma disciplina de um curso de engenharia que foram obrigados a realizar uma série de atividades em um ambiente virtual de aprendizagem como forma de melhorar o aprendizado e a comunicação dos alunos com os professores e entre si. As expectativas iniciais dos alunos mostraram-se positivas quanto à utilidade do ambiente. Porém, a julgar pela freqüência de acesso ao ambiente, as evidências sugerem que os estudantes fizeram um uso muito restrito dos recursos oferecidos. Em nossa interpretação, isto sugere que mesmo estudantes que completaram em torno de metade do curso ainda são motivados por fatores extrínsecos. Verificamos que a percepção final dos estudantes sobre a utilidade do uso do ambiente foi pouco alterada em relação à expectativa inicial. De modo geral, os estudantes que acreditavam que o ambiente lhes ajudaria concluíram que o ambiente os ajudou. Apenas uma pequena fração dos estudantes mudou de opinião ao longo do curso quanto à utilidade do ambiente. Este resultado reforça a noção de que as expectativas iniciais são muito resistentes à mudança. Finalmente, é importante mencionar o fato de que os estudantes afirmaram que o uso do ambiente melhorou a comunicação com o professor, mas não com seus colegas. Uma vez que o ambiente é usado para comunicação de cunho mais acadêmico, pode-se concluir que os estudantes não vêem seus colegas como parceiros válidos na atribuição de significado ao conhecimento, recorrendo exclusivamente ao professor para este fim. O estudo apresentado sugere que a suposta familiaridade do estudante atual com as TIC é, na realidade, bastante superficial. Ainda que os estudantes realizem corriqueiramente 13 diversas atividades que envolvem uso das TIC, seu desempenho em um ambiente educacional deixa muito a desejar. Os estudantes não conseguem fazer uso adequado das possibilidades abertas pelas TIC em sua educação e são os primeiros a reproduzirem os processos de aprendizagem estritamente centrados no professor. Alterar a atitude dos alunos frente ao conhecimento é um trabalho de longo prazo que exige a indução por parte dos professores. Neste contexto, as ferramentas típicas da EaD têm um papel a desempenhar ao facilitar a introdução de atividades centradas nos alunos e permitir o desenvolvimento de um ambiente de diálogo entre pares e de autêntica cooperação entre as partes envolvidas no processo educacional. Referências Bibliográficas ABREU, M.C.; MASETTO, M.T. O Professor Universitário em Aula. 8.ed. São Paulo: MG Editores Associados, 1990. AUSUBEL, D.P. The Acquisition and Retention of Knowledge. New York: Kluwer, 2000. BALLARD, S.; STAPLETON, J.; CARROLL, E. Students’ perceptions of course Web sites used in face-to-face instruction. Journal of Interactive Learning Research v.15, n.3, p.197211, 2004. BARBETA, V.B.; BECHARA, J.M. Uso de simulações em computador em aulas de laboratório de física In: Anais do XXIV Cobenge-Congresso Brasileiro de Ensino de Engenharia, 1996, Manaus. COFFEY, J.W.D.; CAÑAS, A.J.D. LEO: A Learning Environment Organizer to Support Computer-Mediated Instruction. 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