excelentíssimo senhor doutor juiz de direito da 1ª vara da fazenda

Transcrição

excelentíssimo senhor doutor juiz de direito da 1ª vara da fazenda
5ª Promotoria de Justiça da Comarca de Chapecó
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA 1ª VARA DA
FAZENDA PÚBLICA DE CHAPECÓ
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA, por
meio de seu 5ª Promotor de Justiça de Chapecó adiante firmado, no uso de suas atribuições
constitucionais e legais em defesa de interesses coletivos e individuais homogêneos dos
consumidores, com fundamento nos arts. 5º, XXXII, 127, 129, inciso III, da Constituição
Federal, arts. 1º, II e 5º, I da Lei n. 7.347 de 1985, e arts. 4º, 6º, 8º, 10, 28, 39, VIII, 82, I e
91 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), vem perante Vossa Excelência propor a
presente
AÇÃO CIVIL PÚBLICA, com pedido de liminar
em face de WMS Supermercados do Brasil LTDA (nome de fantasia BIG
CHAPECÓ), pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNJPJ sob n.
93.209.765/0462-90, com sucursal situada na Avenida São Pedro, 2242-E, Bairro Engenho
Braun, nesta Comarca de Chapecó, pelas razões de fato e de direito a seguir expostos:
I – DOS FATOS
Em 6 de fevereiro de 2014 a 5ª Promotoria de Justiça desta Comarca instaurou o
Inquérito Civil n. 06.2014.0000726-9 com o objetivo de investigar denúncia de divergên
cia de preços anunciados para venda de mercadorias com o efetivamente praticado e co
brado do consumidor no caixa do Supermercado "BIG" deste município.
O Inquérito Civil acompanha a presente ação como fundamento probatório. Nos
autos respectivos consta que o Supermercado BIG já havia sido autuado pelo PROCON
local em março de 2013, por praticar preços diferentes dos anunciados nas mercadorias
expostas nas suas gôndolas (Ver documentos de fls. 10/11).
Novas denúncias sobre a disparidade de preços no BIG Chapecó aportaram nos
autos a fls. 25, daí a tentativa de obrigar o estabelecimento comercial a adequar a sua prá
tica ao Código de Defesa do Consumidor, por meio de Compromisso de Termo de Ajus
tamento de Conduta (TAC).
A minuta do TAC aparece a fls. 62/63. A ideia era obrigar a ré, dentre outros com
promissos, a "manter eficiente controle de igualdade dos preços promocionais oferecidos
em anúncios publicitários com aquele cadastrado no seu Sistema de Código de Barras"
(cláusula 1ª).
Além da obrigação de fazer, o Supermercado BIG deveria se comprometer-se,
sempre que constatada eventual divergência entre o preço praticado e aquele indicado no
anúncio publicitário, a vender o produto anunciado ao menor preço (cláusula 2ª).
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R. Augusta Muller Boner, 300-D, Fórum de Chapecó, Passo dos Fortes, Chapecó-SC - CEP 89805-900, E-mail: Chape
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5ª Promotoria de Justiça da Comarca de Chapecó
O pagamento de R$ 3.000,00 como multa compensatória e a obrigações acima de
veriam ser cumpridas no prazo de 10 dias, inclusive com a fixação, em local de fácil loca
lização em seu estabelecimento nesta cidade de Chapecó/SC, cópia do termo de ajusta
mento de conduta pelo prazo mínimo de 6 (seis) meses;
De se lamentar, no entanto, que a tentativa extrajudicial de solução do conflito de
direitos coletivos não vingou, por manifesta falta de interesse do Supermercado BIG, por
seu representante legal. A propósito, em resposta escrita e por sua advogada, o estabeleci
mento comercial limitou-se a dizer que estabelecimento estaria adotando medidas internas
para evitar a divergência de preços de seus produtos (fl. 73 do IC).
Numa última fiscalização do PROCON Municipal constatou a ineficiência do ale
gado controle interno do BIG, tanto é verdade que foram identificadas novas divergências
entre os preços anunciados nas mercadorias e cobrados do consumidor no caixa do super
mercado (fls. 77/78 do IC).
De um total de 15 produtos selecionados aleatoriamente pelas agentes fiscais do
PROCON e passados pelo registros do caixa de saída, 4 (quatro) apresentaram divergência
de preço, o que corresponde a 26,7% do total.
Dentre os produtos alimentícios com diferença de preço aparecem: (i) Suco Del
Valle Goiaba 1L, anunciado a R$ 2,00 e vendido a R$ 3,49. Uma diferença a maior de
74,5% ; (ii) Suco Del Valle 250 ml, anunciado a R$ 1,00 e vendido a R$ 1,58, A diferença
a maior é de 58% do preço; (iii) Substrato Planta Sambaia, anunciado a R$ 2,00 e vendido
a R$ 6,90. O preço praticado foi 345% mais caro que o anunciado.; (iv) Leite Piracanjuba
1L, anunciado a 1,86 e vendido a R$ 2,14. Uma diferença a maior de 15%, conforme se
pode constar do cupom fiscal e da planilha de (fls. 80/81 do IC).
Provocada a se explicar sobre essa última autuação e reiterando a possibilidade de
celebração de Termo de Ajustamento de Conduta, o Supermercado não se manifestou até o
momento (fls. 98/99).
Nesse ambiente, demonstrada a mais absoluta falta de interesse em adequar a prá
tica comercial abusiva à norma legal, não resta ao Ministério Público outra opção que não
promover a ação civil pública em defesa de interesses metaindividuais do consumidor.
II – DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS
As relações de consumo ocupam um lugar de primordial importância na vida mo
derna. A todo momento, conscientemente ou não, lidamos com bens ou serviços que nos
são fornecidos por meio da dinâmica consumerista.
A pressa que rege a vida moderna acaba dificultando o consumidor de ter essa
compreensão, tampouco o permite fiscalizar a atividade comercial. Em visa disso, acaba
ficando à mercê da boa-fé dos fornecedores.
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A vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo foi adotada como prin
cípio na Política Nacional das Relações de Consumo (art. 4º, inciso I, CDC)
Não é por menos que o Código de Defesa do Consumidor prevê como direito bási
co do consumidor "a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comer
ciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas
no fornecimento de bens e serviços" (art. 6º, inciso IV).
Vai dai que o CDC proíbe a publicidade enganosa, considerada como tal a
"modalidade de informação ou comunicação de caráter publicitário, inteira ou parcial
mente falsa, ou, por qualquer outro modo, mesmo por omissão, capaz de induzir em erro o
consumidor a respeito da natureza, características, qualidade, quantidade, propriedade,
origem, preço e quaisquer outros dados sobre produtos e serviços" (art. 37, § 1º do CDC).
Como se nota, o CDC impõe aos fornecedores o dever de informação sobre os
produtos que comercializa, cumprindo-lhes indicar de modo claro e inequívoco a quanti
dade, as características, a composição, a qualidade, os tributos incidentes, o preço e os
riscos que os bens apresentam (art. 6º, inciso II).
Assim, a publicidade enganosa praticada pelo Supermercado BIG, anunciando um
preço e praticando outro de maior, caracteriza uma falsidade, devendo ele responder pelos
vícios que diminuem valor do produto, segundo definição do art. 18 do Código de Defesa
do Consumidor.
A reiteração da prática comercial de preços incoincidentes ficou bem evidenciada
em pelo menos duas fiscalizações do PROCON, além de ter sido objeto de notícias de
consumidores no inquérito civil.
Os fatos imputados ao Supermercado BIG também atentam contra as disposições
da Lei n. 10.962 de 2004 - dispõe sobre a oferta e as formas de afixação de preços de pro
dutos e serviços para o consumidor.
De acordo com o art. 5º da mencionada Lei, "no caso de divergência de preços
para o mesmo produto entre sistemas de informação de preços utilizados pelo estabeleci
mento, o consumidor pagará o menor dentre eles".
III – DANO MORAL COLETIVO
O dano moral coletivo tem natureza não patrimonial, decorrente da violação de di
reitos, interesses ou valores jurídicos inerentes a toda a coletividade, de forma indivisível.
O art. 6º, inciso VI, do CDC prevê a efetiva prevenção e reparação por danos pa
trimoniais e morais como um dos direitos básicos dos consumidores, cuja notória vulnera
bilidade permite concluir que as práticas abusivas em exame acarretaram prejuízos não só
aos clientes da empresa demandada, mas a toda a coletividade, daí a necessidade da repa
ração de dano moral coletivo.
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Importante anotar que não é necessário comprovar a dor, repulsa e o abalo psicoló
gico nos pedidos de dano moral coletivo, tal qual fosse um indivíduo isolado (REsp
1269494/ MG).
Com esse raciocínio, tem-se que a prática reiterada de preços dispares provocou
danos aos consumidores dos produtos fornecidos pelo Supermercado BIG. Ela atingiu um
número expressivo de clientes que, imbuídos de boa-fé, imaginavam estar adquirindo pro
dutos por preço atrativo, mas ao passarem pelas caixas registradoras foram obrigados a
pagar valor bem acima do anunciado.
Nesse caso, a indenização por danos morais coletivos ganha relevo pelo seu efeito
pedagógico na prevenção e inibição de práticas abusivas nas relações de consumo. O fun
damento da medida também está na Lei de Ação Civil Pública, segundo a qual "regem-se
pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da ação popular, as ações de responsabilidade
por danos morais e patrimoniais causados ao consumidor" (art. 1º, inciso II)
O STJ, em julgamento de caso similar, reconheceu a incidência de danos morais
individuais e coletivos (Terceira Turma, REsp 1291213/SC, RECURSO ESPECIAL
2011/0269509-0, Min. SIDNEI BENETI, J. 30/08/2012).
Em casos análogos, o TJSC também reconheceu a obrigação de indenizar danos
aos interesses difusos. A propósito, ver AC n. 2013.075405-5, de Tubarão, rel. Des. Jaime
Ramos, j. 13.02.2014; AC n. 2007.061907-5, de Curitibanos, rel. Des. Luiz Cézar Medei
ros, j. 25-03-2008; Apelação Cível n. 2014.021626-6, de Laguna, rel. Des. Sérgio Roberto
Baasch Luz, j. 09-12-2014; Apelação Cível n. 2011.072904-9, de Sombrio, rel. Des. Van
derlei Romer, j. 22-11-2011, para ficar apenas nesses exemplos.
A quantificação do dano moral coletivo deve pautar-se por critérios de razoabilida
de, atentando-se para a natureza e gravidade dos fatos, a extensão do dano, a vulnerabili
dade das vítimas e a capacidade econômica do causador do dano. Em qualquer caso, o va
lor deve cumprir dupla finalidade: compensatória para as vítimas e pedagógica para o o
fensor.
Nesse caso, a condenação do requerido a pagar R$ 15.0000,00 a título danos morais
coletivos atende aos parâmetros acima mencionados.
IV – TUTELA DE URGÊNCIA ANTECIPADA
Na ação civil pública, a possibilidade de antecipação dos efeitos da tutela ganha
relevo, na medida em que, de regra, a urgência requerida tem a finalidade de tutelar inte
resses transindividuais (art. 11 da Lei n. 7.347/85).
A prova documental serve de suporte e fundamento à ação coletiva. Ela indica, com
elevado grau de certeza, que um número expressivo de consumidores corre risco diário de
sofrer novos danos patrimoniais com os preços díspares praticados no Supermercado BIG.
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Nesse caso, o juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente
os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial quando, presente a probabilidade do direito
e o perigo de dano (arts. 294, § único, e 300 caput do NCPC).
A probabilidade do direito e dano de difícil reparação – pressupostos da tutela de
urgência antecipada – estão bem evidenciados nos autos do Inquérito Civil de n.
06.2014.0000726-9, a exemplo de constatações do PROCON da prática de preços diver
gentes dos anunciados.
De resto, é certo que nas ações de fazer ou não fazer, o juiz determinará o cumpri
mento da prestação da atividade devida ou a cessação da atividade nociva, sob pena de e
xecução específica, ou de cominação de multa diária, se esta for suficiente ou compatível,
independentemente de requerimento do autor (art. 11, da Lei n. 7347/85 e art. 84 do Có
digo de Defesa do Consumidor.
Em casos tais, a tutela de urgência também tem previsão no art. 84, § 3º, do CDC, e
bem assim no art. 12 da Lei n. 7.347/85 e art. 300, caput, do NCPC.
Cabível, portanto, a antecipação parcial dos efeitos da tutela requerida.
V– INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA
Presentes os pressupostos da verossimilhança e a hipossuficiência do consumidor,
cumpre aplicar-se a inversão do ônus probatório como instrumento de facilitação de defe
sa, previsto no art. 6°, VIII, do CDC.
A distribuição dinâmica do ônus da prova também em previsão no Novo Código de
Processo Civil, mais precisamente no seu art. 373,§ 1º).
Viável, pois, a aplicação da inversão do ônus da prova em benefício dos consumi
dores substituídos com legitimação extraordinária conferida ao Ministério Público.
VI– DOS PEDIDOS
Ante todo o exposto, requer o Ministério Público:
1) O recebimento da presente ação civil pública e os documentos que a acompa
nham para registro e autuação em autos eletrônicos.
2) A concessão de liminar, inaudita altera pars, para impor ao requerido as segu
intes obrigações de fazer: (a) manter eficiente controle de igualdade de preços, anun
ciados nos seus produtos ou em anúncios publicitários promocionais, com o preço
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cadastrado no seu Sistema de Código de Barras e cobrado no caixa; (b) sempre que
constatada eventual disparidade entre o preço praticado e aquele indicado no pro
duto ou em anúncio publicitário, garantir ao consumidor a oferta, o fornecimento e a
venda ao menor preço anunciado.
3) Seja fixada multa diária, em valor suficiente para inibir a prática abusiva de pre
ços divergentes, em caso de descumprimento das obrigações de fazer e não fazer indicadas
no item 2, letras "a" e "b".
4) A citação do requerido para comparecer à audiência conciliatória e, querendo,
oferecer resposta à inicial no prazo legal.
5) A produção de todas as provas em Direito admitidas, especialmente a documen
tal reunida nos autos do inquérito civil apenso à inicial, a juntada de documentos novos e,
se necessário, a inquirição de testemunhas oportunamente arroladas.
6) Ao final, julgar procedente a ação civil pública para, confirmando os provimen
tos liminares, condenar o Supermercado BIG a cumprir definitivamente as obrigações de
fazer requeridas em caráter liminar.
7) A condenação do requerido ao pagamento de danos morais no valor de R$
15.000,00, a ser revertido ao Fundo Reparação de Bens Lesados (FRBL) e nas custas e
demais despesas processuais, isentando-se o Ministério Público de emolumentos e outros
encargos, nos termos do art. 18 da Lei n. 7.347/85.
8) Mandar publicar o edital a que alude o art. 94 do Código de Defesa do Consu
midor.
9) Admitir, até o advento do despacho saneador, a inversão do ônus da prova, por
presentes os pressupostos daquele princípio processual.
Dá-se à causa, para efeitos legais, o valor de R$ 15.000,00.
Chapecó, 7 de abril de 2016.
(assinatura eletrônica)
MIGUEL LUÍS GNIGLER
Promotor de Justiça
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