Legalização da Canábis, A História Recente e Algumas

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Legalização da Canábis, A História Recente e Algumas
Portal do Bloco de Esquerda
Legalização da Canábis, A História Recente e Algumas Anotações
12-Mar-2015
Contributo de Gonçalo Pessa e João Nuno Paulo
Nos últimos dois anos assistimos a importantes avanços no enquadramento legal da Marijuana. O cultivo e a venda
foram legalizados no Uruguai em Dezembro de 2013. Qualquer maior de idade pode comprar erva numa farmácia
autorizada, em segurança, sabendo o que está a comprar, e não se expondo ao narcotráfico para poder fumar umas
ganzas. Foi o primeiro país a fazê-lo após a onda proibicionista dos anos 70 encabeçada pelos Estados Unidos e pela
ONU.
Nos Estados Unidos o movimento pró-legalização alcançou grandes vitórias. Nos estados do Colorado, Washington, Alaska e
Oregon, na cidade de Portland, e no distrito de Columbia foi legalizada a venda e o cultivo. Recorde-se que, apesar de
ter impulsionado o movimento de políticas proibicionistas, os Estados Unidos tinham já vindo em vários estados a
legalizar a canábis para fins medicinais desde 2010. Neste momento, além dos estados onde foi legalizado o consumo
e venda, outros 19 aceitam legalmente o uso medicinal da canábis.
Este avanço da legislação no continente americano não tem tido paralelo muito notório na Europa. Em países como a França
o uso para fins medicinais é permitido desde 2013, se bem que com restrições relevantes, sendo sempre necessária
uma receita médica. Em Espanha, na Suíça e na Bélgica é possível plantar alguns pés de canábis e a posse de
algumas gramas é tolerada. Mas nenhum país avançou para a legalização do cultivo e da venda, nem mesmo os Países
Baixos, onde o cultivo e o transporte que fornecem as coffee-shops continuam a ser ilegais, originando uma enorme
contradição na lei em vigor que acaba por perpetuar as organizações criminosas ligadas à canábis.
Portugal foi o primeiro país a descriminalizar o consumo de drogas na Europa. Foi um bom começo e uma vitória do Bloco.
Houve melhorias para a saúde pública e o dramático aumento do consumo que conservadores professavam nunca
se materializou.
Mas hoje, 14 anos depois, a descriminalização é muito pouco. A descriminalização faz do consumidor de canábis um
doente aos olhos da lei. Se apanhada com canábis, uma pessoa fica obrigada a comparecer em consultas nos centros
de dissuasão da toxicodependência. A legislação moralista sobre o consumo de canábis não acabou em 2001. Além
disso, como a descriminalização só contempla a posse de quantidades inferiores a dez vezes a dose média diária, podem
ser condenadas por tráfico de droga consumidoras que comprarem por atacado, ou que comprem quantidades maiores
para dividir com amigos, para economizar no preço e no contato com o tráfico. Pessoas que cultivem para uso pessoal
podem também ser condenadas e presas.
Não podemos, por isso, estar satisfeitos com o atual enquadramento legal do consumo de marijuana em Portugal. Por
isso apresentámos em 2013 a proposta de legalização do autocultivo e do consumo de canábis.
Os argumentos que sustentam a luta pela legalização da marijuana são conhecidos. A bitola social em relação à maior parte
das drogas não é proibicionista. O álcool e o tabaco são comercializados sem restrições a maiores de 16 anos, outras
drogas estão sujeitas a receita médica e estão disponíveis em farmácias. O consumo recreativo da canábis pelo ser
humano tem uma história milenar, não se conhecem mortes por overdose e os níveis de adição são baixos. O mesmo não se
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pode dizer do álcool ou de outros medicamentos como alguns narcóticos analgésicos. A comercialização controlada de
marijuana permitiria controlar a qualidade, proteger os consumidores dando lhes a conhecer detalhadamente o que
consomem, cortar a relação dos consumidores com os narcotraficantes e consequentemente, com drogas mais duras. É a
única solução possível que salvaguarda a saúde pública e preserva a dignidade dos e das cidadãs.
Além disso, a legalização permitiria tirar ao narcotráfico uma importantíssima fonte de rendimento e trazer este mercado
para a esfera legal. Permitiria criar empregos com direitos na indústria e comércio e obter importantes receitas fiscais.
É conhecido o resultado da “Guerra às Drogas” que os Estados Unidos e a ONU montaram. Não houve
nenhuma redução efetiva da oferta. Na verdade, esta ideologia é responsável pelo aumento do consumo de opiáceos e
cocaína no EUA e pelo fortalecimento do narcotráfico que se estima que mova 322 mil milhões de dólares anuais,
segundo o United Nations Office on Drugs and Crime. Contribuiu para uma subalternização social dos consumidores e
para a desintegração social de meios pobres que o narcotráfico controlou. É na verdade uma guerra contra as pessoas.
Reprime e controla consumidores, é uma resposta primária à forma como a sociedade deve lidar com as drogas e deve
ir para o caixote do lixo das ideias falhadas e estúpidas.
Os movimentos pela legalização da canábis em Portugal ganhou maior expressão em 2006, com a primeira Marcha
Global da Marijuana organizada em Portugal. Ganhou dimensão nos anos seguintes, e espalhou-se pelo país, registandose marchas em Lisboa, Leiria, Coimbra, Braga e no Porto. No entanto, no último par de anos perdeu algum fulgor e tem
tido dificuldades em renovar-se.
Sabemos do que é capaz um movimento pró-legalização forte e agregador. Não é possível compreender a mudança da
política em relação às drogas nos Estados Unidos sem reconhecer a dimensão do movimento. Um movimento histórico,
dinâmico desde os anos 70.
É importante, por isso, aproveitar o momentum criado pela onda de legalização nos EUA para continuar a batalhar nela
com iniciativas legislativas, revitalizar e agregar mais pessoas no movimento pró-legalização, alargar a discussão, envolver
a comunidade científica. Só a legalização interessa à sociedade e protege os cidadãos e cidadãs.
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