farmacologia e terapêutica para dentistas

Transcrição

farmacologia e terapêutica para dentistas
YAGIEL A · DOWD · JOHNSON · MARIOTTI · NEIDLE
FARMACOLOGIA E TERAPÊUTICA
PARA DENTISTAS
TRADUÇÃO DA 6ª EDIÇÃO
6a edição
JOHN A. YAGIELA, DDS, PhD
Professor and Chair, Division of Diagnostic and Surgical Sciences
School of Dentistry
Professor of Anesthesiology, School of Medicine
University of California, Los Angeles
Los Angeles, California
FRANK J. DOWD, DDS, PhD
Professor, Department of Pharmacology
Professor, Department of Oral Biology
School of Dentistry
Creighton University School of Medicine
Omaha, Nebraska
BARTON S. JOHNSON, DDS, MS
Director, General Practice Residency Program
Swedish Medical Center
Private Practice
Seattle Special Care Dentistry
Seattle, Washington
ANGELO J. MARIOTTI, DDS, PhD
Professor and Chair, Department of Periodontology
College of Dentistry
Ohio State University
Columbus, Ohio
ENID A. NEIDLE, PhD
Professor Emeritus, Pharmacology, New York University
New York, New York
Former Assistant Executive Director, Scientific Affairs
American Dental Association
Chicago, Illinois
© 2011 Elsevier Editora Ltda.
Tradução autorizada do idioma inglês da edição publicada por Mosby – um selo editorial Elsevier Inc.
Todos os direitos reservados e protegidos pela Lei 9.610 de 19/02/1998.
Nenhuma parte deste livro, sem autorização prévia por escrito da editora, poderá ser reproduzida ou transmitida
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ISBN: 978-85-352-3968-3
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This edition of Pharmacology and Therapeutics for Dentistry, 6th edition by John A. Yagiela, Frank J. Dowd, Barton S. Johnson,
Angelo J. Mariotti, Enid A. Neidle is published by arrangement with Mosby, Inc.
ISBN: 978-0-323-05593-2
Capa
Folio Design
Editoração Eletrônica
Rosane Guedes
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NOTA
O conhecimento médico está em permanente mudança. Os cuidados normais de segurança devem ser seguidos, mas, como as
novas pesquisas e a experiência clínica ampliam nosso conhecimento, alterações no tratamento e terapia à base de fármacos podem
ser necessárias ou apropriadas. Os leitores são aconselhados a checar informações mais atuais dos produtos, fornecidas pelos
fabricantes de cada fármaco a ser administrado, para verificar a dose recomendada, o método e a duração da administração e as
contraindicações. É responsabilidade do médico, com base na experiência e contando com o conhecimento do paciente, determinar
as dosagens e o melhor tratamento para cada um individualmente. Nem o editor nem o autor assumem qualquer responsabilidade
por eventual dano ou perda a pessoas ou a propriedade originada por esta publicação.
O Editor
CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTE
SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ
F247
Farmacologia e terapêutica para dentistas / John A. Yagiela... et al. ; [tradução Denise
Costa Rodrigues... et al.]. - Rio de Janeiro : Elsevier, 2011.
960p. : il. ; 28 cm
Tradução de: Pharmacology and therapeutics for dentistry, 6th ed.
Apêndice
Inclui bibliografia e índice
ISBN 978-85-352-3968-3
1. Farmacologia dentária. I. Yagiela, John A.
11-2001.
11.04.11
CDD: 617.6061
CDU: 616.314-085
12.04.11
025682
Revisão Científica e Tradução
REVISÃO CIENTÍFICA*
Pedro Fernandes Lara (Caps. 33 a 54, 56 e Apêndice I)
Professor Doutor do Departamento de Farmacologia, Instituto de Ciências Biomédicas, Universidade de São Paulo (USP)
Serviço de Radioisótopos, Hospital Beneficência Portuguesa de São Paulo
Ricardo Martins Oliveira-Filho (Caps. 1 a 32, 55, Apêndice 2 e Índice)
Professor Doutor do Departamento de Farmacologia, Instituto de Ciências Biomédicas, USP
Os revisores agradecem profundamente a colaboração dos seguintes colegas, que prestaram inestimável auxílio em questões ligadas a
suas áreas de especialidade:
Prof. André Massaru Martins de Oliveira, EMEF Adolpho Otto de Laet, Secretaria Municipal de Educação de São Paulo.
Prof. Dr. Antonio Carlos Oliveira, Departamento de Farmacologia do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo.
Prof. Dr. Bayardo Baptista Torres, Departamento de Bioquímica do Instituto de Química da Universidade de São Paulo.
Prof. Dr. Edson Aparecido Liberti, Departamento de Anatomia do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo.
Dr. Fábio Hideo Martins de Oliveira, Clínica de Oncologia Pélvica, Departamento de Obstetrícia e Ginecologia da Irmandade da
Santa Casa de Misericórdia de São Paulo.
Prof. Dr. Manuel de Jesus Simões, Departamento de Morfologia da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo.
Drª. Rachel Bastos Martins Cruz, Serviço de Pediatria, Hospital Geral de Guarulhos.
Dr. Rogério Almeida da Silva, Serviço de Odontologia do Hospital do Servidor Público Municipal de São Paulo e Serviço de Cirurgia
e Traumatologia Buco-Maxilo-Facial do Hospital Geral de Vila Penteado de São Paulo.
Dr. Tales Eduardo Laurenti, Departamento de Anestesiologia, Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo.
Prof. Dr. Wothan Tavares de Lima, Departamento de Farmacologia do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo.
*Nota: A terminologia de fármacos neste texto está conforme a Lista DCB (Denominações Comuns Brasileiras) 2006 da ANVISA (publicada na
Resolução da Diretoria Colegiada RDC 211/2006) até a sua última atualização disponível, RDC 11/2010.
Os termos anatômicos estão de acordo com a versão atual da Nomina Anatomica Internacional, publicada em português pela Comissão de Terminologia Anatômica, sob os auspícios da Sociedade Brasileira de Anatomia (Terminologia Anatômica, Editora Manole, 1ª ed. 2001).
v
vi
Tradução
TRADUÇÃO
Adriana Paulino do Nascimento (Caps. 52 e 56)
Mestre em Morfologia pela Universidade do Estado do Rio de
Janeiro (UERJ)
Doutora em Biologia Humana e Experimental pela UERJ
Alexandre Barboza de Lemos (Cap. 54)
Mestre em Periodontia pela Universidade Veiga de Almeida
(UVA)
Coordenador dos Cursos de Especialização em Implantodontia
da Odontoclínica Central do Exército (OCEx) e da Faculdade
São Leopoldo Mandic (Campus Laranjeiras - RJ)
Aline Corrêa Abrahão (Apêndice 2)
Professora substituta de Patologia Oral da Faculdade de
Odontologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)
Doutora em Patologia Bucal pela USP (São Paulo)
Camila Moraes Albuquerque (Cap. 44)
Mestre em Odontologia pela Universidade Federal Fluminense
(UFF)
Professora do curso de Especialização em Implantodontia da
São Leopoldo Mandic (Campus Laranjeiras - RJ)
Cibella Maymone Pontes (Cap. 46)
Especialista em Pacientes Especiais pela UFRJ
Especialista em Endodontia pela Marinha do Brasil
Cristiane Matsuura (Caps. 6, 12, 26 e 28)
Professora Adjunta da Escola de Educação Física do Exército
Doutora em Atividade Física e Desempenho Humano pela
Universidade Gama Filho (UGF)
Danielle Resende Camisasca Barroso (Cap. 50)
Professora Adjunta da Faculdade de Odontologia da UFF (Nova
Friburgo – RJ)
Mestre e Doutora em Patologia (Bucodental) pela UFF (Niterói
– RJ)
Débora Rodrigues Fonseca (Caps. 41 e 49)
Mestre em Anatomia (Ciências Morfológicas) pela UFRJ
Cirurgiã Bucomaxilofacial do Hospital Geral do Andaraí – Rio
de Janeiro
Denise Costa Rodrigues (Caps. 11, 13 e 20)
Pós-Graduada em Tradução pela Universidade de Franca
(Unifran)
Bacharel em Tradução pela Universidade de Brasília (UnB)
Eline Barboza da Silva (Caps. 45 e Apêndice 1)
Doutora e Mestre em Ciências (Microbiologia Oral) pela UFRJ
e pela Universidade de Rochester (NY, EUA)
Professora dos Cursos de Especialização e Atualização em
Implantodontia da Faculdade São Leopoldo Mandic (Unidade
Rio de Janeiro, RJ)
Fernando Kok (Caps. 1, 2, 14 e 15)
Professor Livre Docente em Neurologia Infantil pela Faculdade
de Medicina da USP
Gabriella da Silva Mendes (Caps. 38 a 40 e 55)
Mestre em Microbiologia pela UFRJ
Doutoranda em Microbiologia pela UFRJ
Jeanine Salles dos Santos (Cap. 43)
Mestre em Biologia Humana e Experimental (BHEx) pela UERJ
Doutoranda em Biologia Humana e Experimental pela UERJ
José de Assis Silva Júnior (cap. 42)
Especialista em Estomatologia pela UFRJ
Mestre e doutorando em Patologia pela UFF
Lua Lúcia Barreira Machado (Cap. 51)
Formação em Língua Inglesa pelo Instituto Brasil Estados
Unidos (IBEU)
Bacharel em Letras (Português/Inglês) pela Pontifícia
Universidade Católica do Rio de Janeiro
Ludmilla Silva Melo dos Passos (Cap. 32)
Graduada em Fonoaudiologia pela UFRJ
Marcela Anjos Martins (Cap. 29)
Graduada em Nutrição pela Uni-Rio
Doutoranda em Ciências – Biologia Humana e Experimental
– pela UERJ
Maria Inês Corrêa Nascimento (Cap. 3)
Bacharel em Letras (Tradução Bilíngue) pela Pontifícia
Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio)
Mariana Alves de Sá Siqueira (Caps. 19 e 22)
Mestre em Ciências – Pós-Graduação em Ciências Médicas
(UERJ)
Doutoranda em Periodontia – Faculdade de Odontologia da
UERJ
Monique Bandeira Moss (Caps. 30 e 31)
Doutora em Fisiopatologia Clínica e Experimental da UERJ
Médica Graduada pela UERJ
Natália Rodrigues Pereira (Cap. 33)
Mestre em Ciências – Fisiopatologia Clínica e Experimental
pela UERJ
Doutoranda em Ciências – Fisiopatologia Clínica e
Experimental pela UERJ
Oswaldo de Castro Costa Neto (Cap. 53)
Especialista em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial pela
UFRJ
Professor substituto de Cirurgia Oral da UFRJ
Pedro Setti Perdigão (Caps. 8 e 10)
Formação em Língua Inglesa pelo IBEU
Doutorando em Farmacologia pela UFRJ
Raimundo Rodrigues Santos (Caps. 4, 23 e 24)
Médico Especialista em Neurologia e Neurocirurgia
Mestre em Medicina pela UERJ
Roberta Loyola Del Caro (Caps. 16 a 18)
Especialista em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial pela
UFRJ
Cirurgiã Bucomaxilofacial do Hospital Federal do Andaraí - RJ
Rodrigo Melo do Nascimento (Cap. 9)
Graduado em Odontologia pela UFRJ (Cum Laude)
Pós-Graduado em Radiologia pela UFRJ
Soraya Imon de Oliveira (Caps. 5, 7, 21, 25, 27, 34 a 37)
Especialista em Imunopatologia e Sorodiagnóstico pela
Faculdade de Medicina da UNESP
Doutora em Imunologia pelo Instituto de Ciências Biomédicas
da Universidade de São Paulo (ICB-USP)
Tatiana Ferreira Robaina (Caps. 47, 48 e Índice)
Professora Substituta de Estomatologia da Faculdade de
Odontologia da UFRJ
Mestre em Patologia pela UFF
Colaboradores
Peter W. Abel, PhD
Linsey R. Curtis, PharmD, BCOP
Denis M. Grant, PhD
Professor, Department of Pharmacology
School of Medicine
Creighton University
Omaha, Nebraska
Clinical Pharmacist
University of Washington
Seattle Cancer Care Alliance
Seattle, Washington
Professor and Chair, Department of
Pharmacology and Toxicology
Faculty of Medicine
University of Toronto
Toronto, Ontario, Canada
Jeffrey D. Bennett, DMD
Paul J. Desjardins, DMD, PhD
Professor and Chair
Department of Oral Surgery and Hospital
Dentistry
School of Dentistry
Indiana University
Indianapolis, Indianapolis
Visiting Professor, Department of Oral Biology
New Jersey Dental School
University of Medicine and Dentistry of
New Jersey
Newark, New Jersey
Senior Vice President
Global, Clinical, and Medical Affairs
Wyeth Consumer Healthcare
Madison, New Jersey
Mark Blumenthal, BA
Founder and Executive Director, American
Botanical Council
Austin, Texas
Charles S. Bockman, PhD
Assistant Professor, Department of
Pharmacology
School of Medicine
Creighton University
Omaha, Nebraska
Michael T. Brennan, DDS, MHS
Associate Chairman, Department of
Oral Medicine
Carolina Medical Center
Charlotte, North Carolina
Richard P. Cohan, DDS, MS, MBA
Associate Professor
Diagnostic and Emergency Services
School of Dentistry
University of the Pacific
San Francisco, California
George A. Cook, PhD
Professor, Department of Pharmacology
University of Tennessee, Memphis
Memphis, Tennessee
Stephen A. Cooper
Senior Vice President, Global, Clinical,
and Medical Affairs
Wyeth Consumer Healthcare
Madison, New Jersey
Xi-Qin Ding, PhD
Assistant Professor, Department of
Cell Biology
The University of Oklahoma Health Sciences
Center
Oklahoma City, Oklahoma
Raymond A. Dionne, DDS, PhD
Scientific Director
National Institute of Nursing Research
National Institutes of Health
Bethesda, Maryland
Gail T. Galasko, PhD
Department of Biomedical Sciences
College of Medicine
Florida State University
Tallahassee, Florida
Gerald F. Gebhart, PhD
Director, Center for Pain Research
University of Pittsburgh
Pittsburgh, Pennsylvania
Karen S. Gregson, PhD
Assistant Professor, Department of
Oral Biology
School of Dentistry
Indiana University
Indianapolis, Indiana
Daniel A. Haas, DDS, PhD,
FRCD(c)
Associate Dean, Clinical Sciences
Chapman Chair in Clinical Sciences
Professor and Head of Dental
Anesthesia
Faculty of Dentistry
Department of Pharmacology
Faculty of Medicine
University of Toronto
Toronto, Ontario, Canada
Marc W. Heft, DMD, PhD
Professor and Director
Department of Oral and Maxillofacial
Surgery and Diagnostic Sciences
University of Florida
Gainesville, Florida
David W. Hein, PhD
Chair and Professor, Department of
Pharmacology and Toxicology
School of Medicine
University of Louisville
Louisville, Kentucky
Elliot V. Hersh, DMD, MS, PhD
Joseph A. Giovannitti, Jr., DMD
Associate Professor, Department of
Anesthesiology
School of Dental Medicine
University of Pittsburgh
Pittsburgh, Pennsylvania
Professor, Department of Oral Surgery
and Pharmacology
Director, Division of Pharmacology
School of Dental Medicine
University of Pennsylvania
Philadelphia, Pennsylvania
vii
viii
Colaboradores
Harrell E. Hurst, MS, PhD
Professor, Department of Pharmacology and
Toxicology
School of Medicine
University of Louisville
Louisville, Kentucky
William B. Jeffries, PhD
Senior Associate Dean for Medical Education
College of Medicine
University of Vermont
Burlington, Vermont
Anahid Jewett, PhD, MPH
Professor, Division of Oral Biology and
Medicine
School of Dentistry
University of California, Los Angeles
Los Angeles, California
Mo K. Kang, DDS, PhD, MS
Associate Professor and Chair Section of
Endodontics
School of Dentistry
University of California, Los Angeles
Los Angeles, California
Hyungsuk Kim, DDS, PhD
Pain and Neurosensory Mechanisms Branch
National Institute of Dental and Craniofacial
Research
National Institutes of Health
Bethesda, Maryland
Bruno Kreiner, DMD, MD, MSc
Instructor, Department of Oral and
Maxillofacial Surgery
School of Dental Medicine
Hadassah Medical Organization
The Hebrew University
Jerusalem, Israel
Karl K. Kwok, PharmD
Clinical Professor, Department of Pharmacy
Practice
School of Pharmacy
University of Washington
Seattle, Washington
Clinical Pharmacist-Oncology
Department of Pharmacy Service
University of Washington Medical Center
Seattle, Washington
Rajesh V. Lalla, BDS, PhD, CCRP
Assistant Professor of Oral Medicine
Department of Oral Health and Diagnostic
Sciences
University of Connecticut Health Center
Farmington, Connecticut
Attending Member of Hospital Staff
Department of Dentistry
John Dempsey Hospital
Farmington, Connecticut
Vahn A. Lewis, PharmD, MS,
PhD
University of Texas Health Science Center
at Houston Dental Branch
Houston, Texas
Frank Porreca, PhD
Professor, Department of Pharmacology
University of Arizona School of Medicine
Tucson, Arizona
Morton B. Rosenberg, DMD
Michael D. Martin, DMD, MPH,
PhD
Associate Professor of Oral Medicine
School of Dentistry
University of Washington
Seattle, Washington
Robert L. Merrill, DDS, MS
Director, Graduate Orofacial Pain Clinic
Department of Orofacial Pain
Adjunct Professor
Section of Oral Medicine and Orofacial Pain
Department of Dentistry
University of California, Los Angeles
Los Angeles, California
John A. Molinari, PhD
Professor of Oral and Maxillofacial Surgery
Head, Division of Anesthesia and Pain Control
School of Dental Medicine
Associate Professor of Anesthesia
School of Medicine
Tufts University
Boston, Massachusetts
Mark M. Schubert, DDS, MSD
Professor, Department of Oral Medicine
University of Washington
Director, Department of Oral Medicine
Seattle Cancer Care Alliance and
Fred Hutchinson Cancer Research Center
Seattle, Washington
David H. Shaw, PhD
Professor and Chairman, Department of
Biomedical Sciences
School of Dentistry
University of Detroit Mercy
Detroit, Michigan
Professor and Chairman
Department of Oral Biology
College of Dentistry
University of Nebraska Medical Center
Lincoln, Nebraska
Paul A. Moore, DMD, MPH, PhD
Sarat Thikkurissy, DDS, MS
Professor and Chair, Department of
Anesthesiology
School of Dental Medicine
University of Pittsburgh
Adjunct Professor, Department of
Epidemiology
Graduate School of Public Health
University of Pittsburgh
Pittsburgh, Pennsylvania
Michael H. Ossipov, PhD
Research Professor, Department of
Pharmacology
College of Medicine
University of Arizona
Tucson, Arizona
Thomas J. Pallasch, DDS, MS
Emeritus Professor of Dentistry
University of Southern California
Los Angeles, California
No-Hee Park, DMD, PhD
Dean, School of Dentistry
University of California, Los Angeles
Los Angeles, California
Michael T. Piascik, PhD
Professor, Department of Pharmacology
University of Kentucky
College of Medicine
Lexington, Kentucky
Assistant Professor, Division of Pediatric
Dentistry
College of Dentistry
The Ohio State University
Columbus, Ohio
Clarence L. Trummel, DDS, PhD
Emeritus Professor, Department of
Periodontology
School of Dental Medicine
University of Connecticut Health Center
Farmington, Connecticut
Yaping Tu, PhD
Associate Professor, Department of
Pharmacology
School of Medicine
Creighton University
Omaha, Nebraska
Eileen L. Watson, PhD
Professor Oral Biology and Pharmacology
University of Washington
Seattle, Washington
Dennis W. Wolff, PhD
Resident Assistant Professor
Department of Pharmacology
School of Medicine
Creighton University
Omaha, Nebraska
Prefácio
COMO SE FAMILIARIZAR COM A
FARMACOLOGIA
“dipina”
Embora a Farmacologia possa ser considerada uma ciência básica,
seu propósito final como ciência da saúde é aplicar os princípios
básicos à prática clínica. Este livro é direcionado a estudantes de
Odontologia e a profissionais de Odontologia, e foi projetado para
atingir tal propósito. A farmacologia é importante para o cirurgião-dentista não somente pelos fármacos prescritos ou administrados em seus consultórios, mas também pelo fato de o paciente
poder estar em tratamento médico com outros fármacos. Todos
os fármacos podem afetar o organismo como um todo. Além disso,
quando há uso de mais de um fármaco ao mesmo tempo, existe
a possibilidade da ocorrência de interações medicamentosas que
podem acarretar consequências adversas.
Esta obra tem o objetivo de apontar as aplicações odontológicas específicas para cada classe de fármacos. Nessa informação,
estão incluídos os benefícios e os riscos associados a cada categoria.
No estudo da farmacologia, é importante entender os fármacos por meio de suas classes, com base na semelhança de seus
mecanismos de ação, e não como medicações isoladas. Com o
conhecimento das propriedades de cada classe de fármacos e seus
exemplos dentro de cada classe, pode-se direcionar o processo de
aprendizagem. As informações sobre os fármacos podem, então,
ser organizadas nas seguintes subcategorias. (Estas serão úteis no
estudo da maioria dos fármacos.)
1. Nome da classe do fármaco e exemplos
2. Mecanismo de ação
3. Farmacocinética
4. Indicações
5. Efeitos adversos
6. Contraindicações
7. Outras informações, incluindo interações medicamentosas
8. Implicações na Odontologia
Alguns recursos podem ser úteis para o aprendizado dos nomes dos fármacos. Os nomes comuns (genéricos) dos fármacos
dentro de uma dada classe geralmente apresentam similaridades.
A familiarização com uma lista de sufixos dos nomes genéricos
pode ser de valia na identificação individual do fármaco. Tal lista
é apresentada a seguir.
SUFIXOS COMO LEMBRETES PARA CLASSES DE
FÁRMACOS
SUFIXO
CLASSE FARMACOLÓGICA
EXEMPLO
“azol”
Fármaco antifúngico tipo azol
ou
Fármaco antibiótico/
antiparasitário
Anestésico local
Inibidor de ciclo-oxigenase-2
(COX-2)
Fluconazol
Metronidazol
“caína”
“coxibe”
Lidocaína
Celecoxibe
“ilol” ou
“alol”
“mabe”
“olol”
“ônio” ou
“úrio”
“osina”
“pam” ou
“lam”
“pril” ou
“prilate”
“sartana”
“statina”
“triptana”
“vir”
Diidropiridina, bloqueador de
canais de Ca2+
Bloqueador do receptor
β-adrenérgico que também
bloqueia o receptor
α1-adrenérgico
Anticorpo monoclonal
Bloqueador do receptor
β-adrenérgico
Composto do amônio
quaternário, que costuma ser
empregado como relaxante
musculoesquelético periférico
competitivo
Bloqueador do receptor
α1-adrenérgico
Benzodiazepínico que atua
como ansiolítico ou sedativo/
hipnótico
Inibidor da enzima conversora
de angiotensina (ECA)
Bloqueador do receptor de
angiotensina II
Fármaco antilipídico inibidor da
HMG CoA redutase
Fármaco antienxaquecoso
agonista de receptores
5-HT1B/1D da serotonina
Fármaco antiviral
Nifedipina
Carvedilol,
labetalol
Infliximabe
Propranolol
Pancurônio,
atracúrio
Prazosina
Diazepam,
triazolam
Captopril,
fosinoprilate
Losartana
Lovastatina
Sumatriptana
Aciclovir
A aplicação das informações a casos clínicos pode aumentar
a retenção dos conhecimentos e a apreciação da farmacologia. Por
exemplo, suponha que a um paciente odontológico tenha sido
prescrita darifenacina por seu médico, para tratamento de premência urinária. Deve-se saber quais fármacos como a darifenacina são capazes de provocar xerostomia (secura de boca), e deve
saber-se a razão. Portanto, é razoável supor que a xerostomia seja
uma queixa provável que um paciente possa apresentar após fazer
uso daquele fármaco. Além disso, também seria conveniente considerar os modos pelos quais o dentista pode auxiliar no alívio dos
sintomas da xerostomia sem comprometer o tratamento da premência urinária. Tal processo de raciocínio requer conhecimento
de como esses fármacos agem, incluindo os receptores envolvidos,
e quais respostas estão vinculadas a esses receptores.
Com o constante desenvolvimento de novos fármacos, de
novas classes de fármacos e de novas informações sobre fármacos
antigos, o cenário da farmacologia está sempre em expansão. Além
disso, o crescimento de nosso conhecimento em áreas como a
farmacogenética e a farmacogenômica promete trazer para a
prática clínica a personalização da terapêutica medicamentosa.
Em suma, a farmacologia é uma disciplina estimulante e dinâmica. Este livro cobre as principais áreas da farmacologia e fornece
uma base intelectual para o uso racional de fármacos.
ix
x
Prefácio
AGRADECIMENTOS
As exigências competitivas das instituições no cenário moderno
das ciências da saúde tornam a elaboração de livros-texto como
este, Farmacologia e Terapêutica para Dentistas, uma tarefa desafiadora. Neste esforço, fomos grandemente auxiliados por nossos
autores colaboradores, no passado e no presente, que empregaram
seu tempo e sua experiência para assegurar que as informações
fornecidas aqui são precisas e atuais. Nossos agradecimentos especiais ao Dr. Enid Neidle, que foi o editor principal das primeiras
três edições deste livro, e ao Dr. Tom Pallasch, que faleceu pouco
depois de completar suas revisões para esta edição. Também queremos expressar nossa gratidão aos nossos familiares e colegas por
sua paciência em lidar com nossas distrações e preocupações farmacológicas.
Nosso muito obrigado a diversas pessoas que fizeram contribuições especiais a este trabalho. Ao sr. John Dolan, Editor de
Aquisições; Sr. Joslyn Dumas, Editor de Desenvolvimento; e sra.
Claire Kramer, Gerente de Projetos da Elsevier, que tiveram
papéis cruciais na elaboração desta edição. Queremos agradecer a
Pat Dowd, Mare Akers, Jolene Winterfeld, Andrew Waters, Elizabeth Reese, Karen Bishop, Kristen Koseluk e Leanne Tapper por
seu auxílio na preparação do manuscrito.
John A. Yagiela
Frank J. Dowd
Barton S. Johnson
Angelo J. Mariotti
e Enid A. Neidle
Introdução
A farmacologia pode ser definida como a ciência dos fármacos,
sua preparação, seus usos e seus efeitos. O termo deriva de pharmakon, palavra grega usada para fármacos ou medicamentos, e
logia, sufixo latino tradicionalmente utilizado para designar um
corpo de conhecimentos e seu estudo. Como uma disciplina organizada, a farmacologia é de origem recente, mas o estudo de
substâncias medicinais é tão antigo quanto a própria civilização.
HISTÓRIA
Certa vez, Sir William Osler disse: “O desejo de tomar medicamentos é, talvez, a maior característica que distingue o homem
dos animais.” Embora essa afirmativa tenha sido influenciada por
experimentos envolvendo autoadministração em ratos e outras
espécies de laboratório, ela serve para ilustrar a relação histórica
entre os fármacos e os seres humanos. O uso de produtos naturais
para curar doenças e produzir alterações mentais vem desde a
aurora dos tempos. O papiro de Ebers (cerca de 1550 AC), mostra
mais de 700 receitas para vários distúrbios. Muitos dos ingredientes incorporados nessas preparações – sangue de lagarto, cabelo de
virgem, excretas de moscas – são pitorescos para os padrões atuais,
mas também apareciam diversos compostos hoje reconhecidos
como farmacologicamente ativos. Uma lista de medicamentos
populares e outros remédios que resistiram ao escrutínio científico
revela substâncias como ópio (morfina), beladona (atropina),
squill e dedaleira (digital), casca de cinchona (quinino e quinidina), folhas de coca (cocaína) e ma huang (efedrina). O estudo
empírico de derivados de plantas e produtos animais deve ter sido
extenso para ter sido tão frutífero.
Entretanto, o maior obstáculo para o uso efetivo desses fármacos era o grande número de substâncias geralmente presentes
nas formulações boticárias. Por exemplo, o medicamento mais
popular do século XV, a triaca, continha mais de 100 componentes. Aureolus Paracelsus (1493-1541) foi o primeiro a reconhecer
que a mistura indiscriminada de numerosas substâncias fazia
pouco mais do que diluir quaisquer compostos realmente eficazes
que pudessem estar presentes inicialmente. A atenção de Paracelsus em agentes isolados foi refinada por Felice Fontana (17201805), que deduziu com seus próprios experimentos que cada
fármaco bruto contém um “princípio ativo” que, quando administrado, produz um efeito característico no organismo. Um dos
maiores avanços científicos do século XIX foi o isolamento e a
avaliação objetiva de tais princípios ativos.
Em 1803, um jovem farmacêutico alemão, Frederick Sertürner (1780-1841), extraiu o alcaloide morfina do ópio. Essa conquista singular não só marcou o início da química farmacêutica,
como também levou a uma revolução na biologia experimental.
A disponibilidade de fármacos recém-purificados e a padronização das preparações biológicas existentes encorajaram pioneiros
como François Magendie (1783-1855) e Claude Bernard (18131878) a usar agentes farmacológicos como auxiliares no estudo
de processos fisiológicos. O uso do curare por Bernard para a
elucidação da junção neuromuscular é um exemplo do sucesso
obtido com esse método. O desenvolvimento da farmacologia
como uma disciplina independente foi retardado provavelmente
ao fato de os fármacos terem sido associados a várias ciências
biológicas e, obviamente, considerados como ferramentas das
diversas especialidades médicas.
Rudolph Buchheim (1820-1879) e Oswald Schmiedeberg
(1838-1921) foram os maiores responsáveis pelo estabelecimento
da farmacologia como ciência em seu pleno direito. Buchheim
organizou o primeiro laboratório exclusivamente voltado para a
farmacologia e se tornou o primeiro professor desta disciplina.
Schmiedeberg, aluno de Buchheim, fundou o primeiro periódico
científico de farmacologia. Mais importante, com sua tutela Schmiedeberg ajudou a disseminar a aceitação da farmacologia ao
redor do mundo. Um dos protegidos de Schmiedeberg foi John
Abel (1857-1938), geralmente tido como o pai da farmacologia
americana.
Sendo em seus primórdios uma ciência experimental obscura,
a farmacologia expandiu seus limites a tal ponto que o assunto se
tornou uma importante área de estudo para todos os profissionais
da saúde e também desperta o interesse do público leigo. Na
Odontologia, o impacto da farmacologia foi formalmente reconhecido pela American Dental Association em 1934, com a publicação da primeira edição do Accepted Dental Remedies.
ESCOPO DA FARMACOLOGIA
A farmacologia é uma das poucas ciências médicas que ultrapassa
a linha divisória entre o básico e a clínica. A competência da
farmacologia é tão extensa que diversas subdivisões vieram a ser
reconhecidas. A farmacodinâmica é o estudo da atividade biológica
dos fármacos em sistemas vivos. Aqui se inclui o estudo dos mecanismos de ação dos fármacos e dos exatos processos por eles
afetados. A influência da estrutura química na ação do fármaco (a
relação estrutura-atividade) é também objeto de estudo deste
ramo da farmacologia. A farmacocinética lida com a magnitude e
a evolução temporal do efeito dos fármacos, e tenta explicar estes
aspectos do efeito farmacológico levando em conta a dosagem e
a absorção, a distribuição e o destino das substâncias químicas nos
sistemas vivos. A farmacoterapêutica é a adequada seleção do
agente cujo efeito biológico em organismos vivos seja o mais
apropriado para o tratamento de um estado patológico em particular. Para isso, é necessário levar em consideração, entre muitos
outros fatores, a dose, a duração da terapia e os efeitos adversos
do tratamento com o fármaco. A prática da farmácia envolve a
preparação e a distribuição dos medicamentos. Na realidade,
embora atualmente os farmacêuticos raramente sejam convocados
para preparar fármacos, esses profissionais podem atuar como uma
útil fonte de informações, tanto para o clínico como para o
paciente. A toxicologia é a divisão da farmacologia que trata dos
venenos, das suas ações, da sua detecção, e do tratamento das
intercorrências por eles produzidas. A importância da toxicologia
na vida moderna é continuamente enfatizada a cada nova descoberta de substâncias químicas nocivas no meio ambiente. Assim
como diversas disciplinas da ciência e da medicina passaram por
necessária evolução, áreas promissoras surgiram da união de
campos nos quais os interesses se sobrepunham. Por exemplo, o
estudo das interrelações entre fármacos e hereditariedade, enve-
xi
xii
Introdução
lhecimento e o sistema imunológico levou ao respectivo desenvolvimento da farmacogenética, da farmacologia geriátrica, e da
imunofarmacologia. Uma última subdivisão da farmacologia, a farmacognosia, é hoje algo como uma ciência vestigial. Essencial na
época em que a maioria dos fármacos derivou de plantas, ela
literalmente significa “conhecimento de fármacos” e lida com as
características das plantas e como identificar aquelas com atividade farmacológica. Atualmente, a maioria dos fármacos é sintetizada quimicamente, mas a fitoquímica, especialmente a síntese
de estruturas químicas complexas pelas plantas, continua sendo
uma área de interesse. Por outro lado, a medicina fitoterápica
passou a ganhar importância como disciplina a partir de 1994. O
uso de produtos nessa área tem estimulado o interesse nos compostos ativos de ervas medicinais, sua eficácia clínica e suas aplicações potenciais.
Após a descrição de como o estudo de fármacos é classificado,
convém discutir o que significa a palavra fármaco*∗. Para o farmacologista, um fármaco é qualquer agente químico que tem efeito
sobre processos relacionados com a vida. Obviamente esta definição é ampla e não se ajusta adequadamente para muitos grupos,
que definem o termo de forma mais restritiva para melhor aplicá-lo a suas necessidades particulares. O terapeuta, por exemplo,
considera fármacos como os agentes químicos eficazes para o
tratamento de doenças. Para o público leigo, “droga” geralmente
conota uma substância que causa alterações mentais e psicológicas. Finalmente, agências governamentais preocupam-se com a
receita derivada das taxas impostas sobre a venda de certas subs*Nota da Revisão Científica: “Fármaco” e “droga” são termos aceitos
indiferenciadamente para uso acadêmico no Brasil. Pelo fato de a
expressão “droga” poder ter conotação pejorativa e também ser largamente empregada no sentido médico-legal, optamos por usar, ao longo
do texto, a palavra “fármaco”, reservando “droga” para capítulos que
tratam mais especificamente de substâncias de abuso e ilegais (p.ex.
Cap. 47, Cap 51).
tâncias ou com os problemas de saúde pública associados ao seu
uso. Alguns desses agentes, como o álcool e o tabaco, são legalmente deixados à parte, ou seja, pela lei não são considerados fármacos.
Embora os farmacologistas tenham reconhecido há muito tempo
esses agentes como fármacos potentes, eles estão isentados das
restrições governamentais usuais e não são objeto do escrutínio
normal pela U.S. Food and Drug Administration. Existem outras
substâncias que também ganharam este status especial, não por
acidente histórico como as mencionadas anteriormente, mas por
considerações de saúde pública. Exemplos incluem o cloro e o
flúor adicionados à água de abastecimento público, e o iodo adicionado ao sal de cozinha. Processos judiciais envolvendo o questionamento de essas medidas públicas constituírem uma forma
ilegal de “medicação em massa” têm sido resolvidos nos tribunais,
ao menos em parte, por meio da classificação desses agentes químicos como não fármacos legais, quando usados de maneira específica em benefício público.
Os fármacos discutidos neste livro compreendem quase
exclusivamente apenas as substâncias com aplicação terapêutica
conhecida. Ainda assim, o número de agentes para consideração
é grande – alguns milhares de fármacos comercializados em múltiplas dosagens e, em algumas circunstâncias, em uma desconcertante variedade de combinações. De modo a reduzir a confusão,
colocamos ênfase nos agentes individuais, modelos que representam sua classe farmacológica. Com essa estratégia, pode-se mais
rapidamente compreender as propriedades de agentes correlatos;
ao mesmo tempo, as possíveis diferenças entre eles podem ser
destacadas. Finalmente, é importante reconhecer que existem
certas generalizações que se aplicam a todos os fármacos. Os
princípios da ação farmacológica são tratados nos quatro primeiros capítulos. Dominar os conceitos apresentados nesses capítulos
é condição necessária para o pleno entendimento da farmacologia,
para o uso racional dos agentes terapêuticos, e para a avaliação
objetiva de novos fármacos.
Sumário
PARTE I
Princípios de Farmacologia , 01
1 Farmacodinâmica: Mecanismos de Ação de
Fármacos, 02
John A. Yagiela
2 Farmacocinética: Absorção, Distribuição e
Destino dos Fármacos, 17
John A. Yagiela
3 Farmacoterapêutica: O Uso Clínico de
Fármacos, 48
John A. Yagiela e Frank J. Dowd
4 Farmacogenética e Farmacogenômica, 69
David W. Hein e Denis M. Grant
12 Psicofarmacologia: Fármacos Antipsicóticos e
Antidepressivos, 159
Vahn A. Lewis
13 Sedativos Hipnóticos, Ansiolíticos e
Relaxantes Musculares de Ação Central, 185
Joseph A. Giovannitti, Jr. e Paul A. Moore
14 Anticonvulsivantes, 209
Vahn A. Lewis
15 Fármacos Anti-Parkinsonianos, 227
Vahn A. Lewis
16 Anestésicos Locais, 243
John A. Yagiela
17 Princípios de Anestesia Geral, , 262
John A. Yagiela e Daniel A. Haas
18 Agentes Utilizados em Anestesia Geral e
PARTE II
Farmacologia de Grupos de
Fármacos Específicos, 77
5 Introdução aos Fármacos que Atuam no
Sistema Nervoso Autônomo, 78
Peter W. Abel e Michael T. Piascik
6 Agonistas Adrenérgicos, 91
Yaping Tu, Michael T. Piascik e Peter W. Abel
7 Antagonistas Adrenérgicos, 106
Michael T. Piascik e Peter W. Abel
8
Fármacos Colinérgicos, 117
Frank J. Dowd
9 Fármacos Antimuscarínicos, 128
Frank J. Dowd
10
Fármacos que Afetam os Receptores
Nicotínicos, 135
Xi-Qin Ding
11 Introdução aos Fármacos que Atuam no
Sistema Nervoso Central, 147
Vahn A. Lewis
Sedação, 276
Daniel A. Haas e John A. Yagiela
19 Introdução aos Fármacos Antinociceptivos,
294
Hyungsuk Kim e Raymond A. Dionne
20 Analgésicos Opioides e Antagonistas, 302
Michael H. Ossipov, Gerald F. Gebhart e Frank Porreca
21 Analgésicos não Opioides, Anti-inflamatórios
não Esteroidais e Fármacos Antirreumáticos
e Antigota, 318
Elliot V. Hersh, Paul J. Desjardins, Clarence L. Trummel e
Stephen A. Cooper
22 Histamina e Anti-histamínicos, 353
Clarence L. Trummel
23 Fármacos para o Tratamento de Síndromes
Dolorosas Orofaciais, 366
Robert L. Merrill
24 Fármacos Antiarrítmicos, 386
Frank J. Dowd
25 Fármacos Utilizados no Tratamento de
Insuficiência Cardíaca, 402
Frank J. Dowd
xiii
xiv
Sumário
26 Fármacos Antianginosos, 414
44 Agentes Anticáries, 712
Eileen L. Watson e Frank J. Dowd
27 Fármacos Diuréticos, 423
Sarat Thikkurissy
45 Agentes Antiplaca e Antigengivite, 724
William B. Jeffries e Dennis W. Wolff
28 Fármacos Anti-hipertensivos, 434
Angelo J. Mariotti
46 Antissépticos e Desinfetantes, 736
Frank J. Dowd e William B. Jeffries
John A. Molinari
29 Fármacos Hipolipidemiantes, 450
George A. Cook
30 Fármacos Antianêmicos e Estimulantes do
Sistema Hematopoético, 460
Barton S. Johnson
31 Fármacos Pró-coagulantes, Anticoagulantes e
Trombolíticos, 478
PARTE III
Assuntos Especiais em Farmacologia
e Terapêutica
47 Uso de Analgésicos para Controle Eficaz da
Dor, 744
Barton S. Johnson
32 Fármacos que Agem no Sistema
Respiratório, 502
Karen S. Gregson, Bruno kreiner e Jeffrey D. Bennett
33 Fármacos que Atuam no Trato
Gastrintestinal, 516
David H. Shaw
Paul J. Desjardins e Elliot V. Hersh
48 Controle do Medo e da Ansiedade, 751
Daniel A. Haas
49 Profilaxia Antibiótica, 762
Thomas J. Pallasch
50 Complicações Orais da Terapia contra o
Câncer, 772
34 Farmacologia das Glândulas Hipófise,
Rajesh V. Lalla, Michael T. Brennan e Mark M.
Schubbert
Tireoide e Paratireoide, 529
Gail T. Galasko
51 Fármacos que Levam ao Abuso, 789
35 Corticosteroides Suprarrenais, 540
Clarence L. Trummel
Charles S. Bockman e Peter W. Abel
52 Toxicologia, 803
36 Insulina, Hipoglicêmicos Orais e Glucagon,
549
Gail T. Galasko
37 Hormônios Esteroides da Reprodução e do
Desenvolvimento Sexual, 558
Angelo J. Mariotti
38 Princípios da Terapia Antibiótica, 571
Harrell E. Hurst e Michael D. Martin
53 Farmacologia Geriátrica, 822
Marc W. Heft e Angelo J. Mariotti
54 Fármacos para Emergências Médicas, 830
Morton B. Rosenberg
55 Prescrição Médica e Regulamentação dos
Fármacos, 839
Thomas J. Pallasch
39 Fármacos Antibacterianos e Antibióticos,
592
Vahn A. Lewis
56 Utilização de Ervas e Suplementos
Dietéticos Fitoterápicos em Odontologia,
855
Thomas J. Pallasch
40 Agentes Antifúngicos e Antivirais, 631
Richard P. Cohan e Mark Blumenthal
No-Hee Park e Mo K. Kang
41 Imunoterapia, 651
APÊNDICES
John A. Yagiela e Anahid Jewett
42 Fármacos Antineoplásicos, 674
1
Interações Medicamentosas na Clínica
Odontológica, 865
2
Glossário de Abreviações, 873
Karl K. Kwok, Linsey R. Curtis e Mark M. Schubert
43 Álcoois Alifáticos, 703
Frank J. Dowd
243
PARTE II
CAPÍTULO
Farmacologia de Grupos de Fármacos Específicos
16
Anestésicos Locais
JOHN A. YAGIELA
Anestésicos locais são agentes que bloqueiam de maneira reversível a condução nervosa quando aplicados em uma área circunscrita do corpo. Embora numerosas substâncias de diversas
estruturas químicas sejam capazes de produzir anestesia local, a
maioria dos fármacos de utilidade clínica comprovada (identificados com o sufixo -caína) tem em comum a configuração fundamental do primeiro anestésico local verdadeiro, a cocaína. Durante
séculos, nativos dos planaltos peruanos utilizavam as folhas da
coca para prevenir a fome, aliviar a fadiga e elevar o espírito. O
interesse europeu nas propriedades psicotrópicas da Erithroxylon
coca levou ao isolamento da cocaína por Niemann em 1859 e ao
estudo de sua farmacologia por von Anrep em 1880. Apesar de
Niemann e von Anrep terem relatado a ação anestésica local da
cocaína, o crédito por sua introdução na medicina pertence a Karl
Koller, um médico vienense. Em 1884, Koller familiarizou-se com
os efeitos fisiológicos da cocaína através de Sigmund Freud. Koller
reconheceu o grande significado clínico do fármaco e demonstrou
seu efeito no alívio da dor em vários procedimentos oftalmológicos. Os benefícios da cocaína foram amplamente reconhecidos; no
período de 1 ano, a anestesia local já tinha sido administrada com
sucesso em diversas operações médicas e odontológicas.
O conhecimento do potencial de reações adversas da cocaína
logo se seguiu à sua aceitação geral como anestésico local. Várias
mortes atribuídas a cocainização aguda deram prova do baixo
índice terapêutico do fármaco. A tendência ao abuso de cocaína
foi dramaticamente ilustrada pela autoviciação de William Halsted,
um pioneiro em bloqueio nervoso regional. Em 1892, Einhorn e
associados instituíram uma pesquisa química em busca de anestésicos locais mais seguros e não viciantes, culminando 13 anos
mais tarde com a síntese da procaína. Desde então, têm sido feitas
numerosas melhorias na fabricação das soluções anestésicas locais,
e muitos agentes úteis têm sido introduzidos na prática clínica.
Entretanto, como nenhum fármaco é desprovido de toxicidade
potencialmente grave, a pesquisa por novos e melhores agentes
anestésicos locais continua.
QUÍMICA E CLASSIFICAÇÃO
São necessárias determinadas características fisioquímicas para
que um fármaco possa ser usado clinicamente como um anestésico
local. Um pré-requisito é que o agente deve deprimir a condução
nervosa. Como um axônio cujo conteúdo citoplasmático tenha
sido completamente removido ainda pode transmitir potenciais de
ação, um fármaco deve ser capaz de interagir diretamente com o
axolema para exercer atividade anestésica local. Uma segunda
consideração importante é que o agente deve apresentar propriedades lipofílicas e hidrofílicas para ser eficaz através de injeção
parenteral. A solubilidade lipídica é essencial para a transposição
das várias barreiras anatômicas existentes entre o fármaco administrado e seu sítio de ação, incluindo a bainha nervosa. A solubilidade em água assegura que, quando injetado em concentração
eficaz, o fármaco não se precipite quando exposto ao líquido
intersticial. Esses requisitos impuseram limitações estruturais importantes aos anestésicos locais clinicamente úteis.
Relações Estrutura-Atividade
A molécula típica de um anestésico local pode ser dividida em três
partes: (1) um grupo aromático, (2) uma cadeia intermediária e
(3) uma terminação amina secundária ou terciária (Fig. 16-1).
Todos os três componentes são determinantes importantes para a
atividade anestésica local do fármaco. O resíduo aromático confere
propriedades lipofílicas à molécula, enquanto o grupamento amina
fornece hidrossolubilidade. A porção intermediária é significativa
em dois aspectos. Primeiro, ela fornece a separação espacial necessária entre as extremidades lipofílica e hidrofílica do anestésico
local. Segundo, a ligação química entre a cadeia central de hidrocarboneto e o anel aromático serve como uma base adequada para
a classificação da maioria dos anestésicos locais em dois grupos, os
ésteres (—COO—) e as amidas (—NHCO—). Essa distinção é útil
porque existem diferenças acentuadas quanto à alergenicidade e
ao metabolismo entre essas duas categorias de fármacos.
Pequenas modificações em qualquer parte da molécula do
anestésico local podem afetar significativamente a ação do fármaco. A adição de um átomo de cloro na posição orto do anel benzênico da procaína produz a cloroprocaína, um anestésico local
lipofílico quatro vezes mais potente do que o composto original
e, ainda assim, 50% menos tóxico em injeção subcutânea. A Tabela
16-1 lista diversas propriedades fisioquímicas importantes dos
anestésicos locais e mostra como elas se relacionam com a atividade clínica.
Influência do pH
Em virtude do grupamento amina substituído, a maioria dos anestésicos locais é composta de bases fracas, com um pKa (i.e., o
logaritmo negativo da constante de ionização do ácido conjugado)
na faixa entre 7,5 e 9,0. Um anestésico local proposto para injeção
é geralmente preparado na forma de sal por adição de ácido clorídrico. Não somente a solubilidade em água é melhorada, mas
também a estabilidade em meio aquoso é aumentada. Quando
injetada, a solução de anestésico local acidificada é rapidamente
neutralizada pelos sistemas tampão dos fluidos teciduais, e uma
fração da forma catiônica é convertida em base não ionizada.
Como determinado pela equação de Henderson-Hasselbalch (Fig.
16-2), a porcentagem de fármaco convertida depende fundamentalmente do pKa do anestésico local e do pH tecidual. Dado que
somente a forma de base pode difundir-se rapidamente para
dentro do nervo, fármacos com pKa elevado tendem a apresentar
início de ação mais lento do que agentes similares com constantes
de dissociação mais favoráveis. A acidez tecidual também pode
impedir o desenvolvimento da anestesia local. Os produtos da
inflamação podem diminuir o pH do tecido afetado e limitar a
formação da base livre. O aprisionamento iônico do anestésico
local no espaço extracelular retarda a instalação da anestesia local
e pode tornar impossível um bloqueio nervoso eficiente.
243
Farmacologia de Grupos de Fármacos Específicos
PARTE II
244
RESÍDUO
AROMÁTICO
CADEIA
INTERMEDIÁRIA
TERMINAÇÃO
AMINA
RESÍDUO
AROMÁTICO
CADEIA
TERMINAÇÃO
INTERMEDIÁRIA
AMINA
AMIDAS
ÉSTERES
CH3
C2H5
C2H5
COOCH2CH2
H2N
NHCOCH2
N
N
C2H5
C2H5
CH3
Lidocaína
Procaína
CH3
CH3
CH3
H9C4
COOCH2CH2
N
NHCOCH
N
N
CH3
H
CH3
Mepivacaína
Tetracaína
CH3
C4H9
CH3
COOCHCH2CH
NHCOCH
N
CH3
COOCH3
Bupivacaína
Cocaína
CH3
CH3
NHCOCH
COOCH2CH3
H2N
N
H
N
C3H7
Prilocaína
Benzocaína
CH3
H9C4O
COCH2CH2
CH3
N
NHCOCH
S
H
N
C3H7
H3COOC
Diclonina*
Articaína
FIGURA 16-1 Fórmulas estruturais de alguns anestésicos locais de uso comum. *A diclonina é uma cetona.
TABELA 16-1
Correlações Fisioquímicas da Atividade dos Anestésicos Locais
FÁRMACO
Procaína
Articaína‡
Mepivacaína
Prilocaína
Lidocaína
Ropivacaína
Bupivacaína
Tetracaína
COEFICIENTE
DE PARTIÇÃO
OCTANOL/
TAMPÃO*
3
17
42
55
110
186
560
541
POTÊNCIA
ANESTÉSICA
(BLOQUEIO
TÔNICO)
DURAÇÃO DA
ANESTESIA
Baixa
Moderada
Moderada
Moderada
Moderada
Alta
Alta
Alta
Curta
Moderada
Moderada
Moderada
Moderada
Prolongada
Prolongada
Prolongada
PESO
MOLECULAR
BLOQUEIO
FÁSICO†
pKa*
INÍCIO DE
AÇÃO
236
284
246
220
234
274
288
264
Moderado
Moderado
Moderado
Baixo
Moderado
Moderado
Alto
Moderado
8,9
7,8
7,7
7,8
7,8
8,1
8,1
8.4
Moderado
Rápido
Rápido
Rápido
Rápido
Moderado
Moderado
Moderado
*Medidas realizadas a 36°C, exceto para prilocaína e ropivacaína, que foram extrapoladas de valores medidos a 25°C. (Dados de Strichartz GR, Sanchez V, Arthur
GR, et al: Fundamental properties of local anesthetics, II: measured octanol/buffer partition coefficients and pKa values of clinically used drugs, Anesth Analg
71:158-170, 1990.)
†
Tendência relativa a causar bloqueio fásico (uso-dependente) em nervo periférico. (Dados de Courtney KR: Structure-activity relations for frequency-dependent
sodium channel block in nerve by local anesthetics, J Pharmacol Exp Ther 213:114-119, 1980.)
‡Dados das bulas de Septocaine with epinephrine 1:100.000 e Septocaine with epinephrine 1:200.000, New Castle, DE, Rev.05/06, Septodont.
Anestésicos Locais
CAPÍTULO 16
CH3
C2H5
CH3
C2H5
+
NH
C
CH2
N
O
CH3
H
NH
C2H5
CH3
245
C
CH2
N
+
H+
C2H5
O
Base não ionizada
Ácido catiônico
Equação de Henderson-Hasselbalch
Log
Base
= pH – pKa
Ácido
Barreiras lipídicas
Para a lidocaína (pKa = 7,8)
no pH tecidual pH (7,4)
(bainha do nervo)
Base
Membrana do neurônio
Base
= 0,4
Ácido
Base
Ácido
*
Ácido
FIGURA 16-2 Distribuição de um anestésico local durante bloqueio nervoso. Após injeção da solução de anestésico local, uma parte do ácido
catiônico é convertida em base livre. A proporção base/ácido no fluido extracelular em equilíbrio está calculada para a lidocaína. Setas em negrito
demonstram a via principal seguida por um anestésico local para alcançar seu sítio de ação (asterisco) dentro da membrana do neurônio. Embora
a forma ácida seja responsável pela maior parte da atividade bloqueadora, a contribuição da base não ionizada (setas finas dentro do axolema)
não deve ser desprezada.
Numerosas tentativas têm sido feitas para aumentar a anestesia local através da influência do pH. Teoricamente, a alcalinização
deveria aumentar a atividade anestésica local por promover a
penetração no tecido e a captação pelo nervo. Muitos agentes
tópicos são comercializados na forma de base para melhorar a
difusão através das barreiras epiteliais. Embora tenha sido demonstrado experimentalmente que a alcalinização das soluções anestésicas locais imediatamente antes do uso melhora o bloqueio
nervoso, considerações de ordem prática limitaram sua aplicação
clínica de rotina. Mesmo assim, o líquido extracelular apresenta,
na maioria das vezes, capacidade tampão suficiente para corrigir
diferenças no pH da solução anestésica logo após a injeção.
Uma estratégia alternativa para modificar a distribuição do
fármaco é pela adição de dióxido de carbono. A carbonatação
de uma solução anestésica local pode aumentar a velocidade de
início da ação e às vezes a profundidade da anestesia. Sugeriu-se
que o sal hidrocarbonatado do anestésico local atravessa as membranas mais rapidamente do que a formulação original, e que a
difusão do dióxido de carbono injetado para o interior do tronco
nervoso diminui o pH interno e concentra as moléculas de anestésico local através de aprisionamento iônico.55 Também há evidências de que o dióxido de carbono pode potencializar a atividade
anestésica local por um efeito direto sobre a membrana nervosa.15,19
Embora promissoras, as soluções de anestésico local carbonatadas
não estão disponíveis nos Estados Unidos, e um estudo sobre a
lidocaína carbonatada utilizada para anestesia mandibular não
revelou nenhum benefício significativo em comparação com o
cloridrato de lidocaína.22
MECANISMO DE AÇÃO
Os anestésicos locais bloqueiam a sensação de dor por interferência na propagação dos impulsos nervosos periféricos. A geração e
a condução dos potenciais de ação são inibidas. Dados eletrofisio-
lógicos indicam que os anestésicos locais não alteram significativamente o potencial de repouso normal da membrana do neurônio,
mas impedem certas respostas dinâmicas à estimulação nervosa.
Efeitos sobre a Permeabilidade Iônica
A membrana nervosa em repouso é impermeável ao Na+. A excitação do neurônio por um estímulo apropriado aumenta temporariamente a condutância ao Na+ e torna a célula nervosa menos
eletronegativa em relação ao meio externo. Se o potencial transmembrana for suficientemente deprimido, atinge-se um limiar
crítico no qual a despolarização se torna autogeradora. Correntes
eletrotônicas locais induzem um rápido influxo de Na+ através de
canais seletivos de Na+ ativados que atravessam a membrana nervosa. A corrente de entrada de Na+, então, cria um potencial de
ação de aproximadamente +40 mV, que é propagado pelo nervo.
O potencial de ação é notavelmente transitório em um dado
segmento da membrana; a perda da permeabilidade ao Na+ (inativação dos canais de Na+) e o fluxo de saída de K+ (em axônios
não mielinizados) rapidamente repolarizam a membrana. Esses
eventos são revisados na Figura 16-3.
Os anestésicos locais interferem na transmissão nervosa por
bloqueio da influência da estimulação sobre a condutância ao Na+.
Um bloqueio anestésico local em desenvolvimento é caracterizado por redução progressiva na velocidade e no grau de despolarização e por diminuição na velocidade de condução. Quando a
despolarização é retardada ao ponto em que os processos de
repolarização se desenvolvem antes que o potencial limiar seja
alcançado, a condução nervosa é interrompida.1
Sítio de Ação
Existem vários sítios na membrana neuronal onde fármacos
podem potencialmente interferir na permeabilidade ao Na+. Já foi
proposto que os anestésicos locais poderiam interagir com os
lipídeos da membrana de modo a comprometer a função do canal
de Na+, assim como há muito tempo foi proposto para os anes-
366
PARTE II
CAPÍTULO
Farmacologia de Grupos de Fármacos Específicos
23
Fármacos para o Tratamento de
Síndromes Dolorosas Orofaciais
ROBERT L. MERRILL
FARMACOLOGIA E DOR CRÔNICA
O tratamento da dor orofacial crônica, quando comparado com o
da dor aguda, exige sólidos conhecimentos farmacológicos e farmacoterapêuticos, pois os distúrbios dolorosos crônicos constituem um grupo heterogêneo de condições com vários mecanismos
patológicos e características que exigem diversas famílias de medicamentos para tratamento. Os dentistas geralmente não usam
esses medicamentos porque o foco tradicional da Odontologia
foram os problemas de dor aguda. As características farmacológicas dos opioides são discutidas no Capítulo 20 e as características
farmacológicas do paracetamol e dos fármacos anti-inflamatórios
não esteroidais (AINEs) são discutidas no Capítulo 21. O tratamento da dor aguda na Odontologia é discutido no Capítulo 47.
Com os avanços mais recentes na compreensão dos distúrbios de dor crônica e o reconhecimento de que tais distúrbios
afetam a região orofacial, os dentistas estão sendo agora treinados para tratar a dor crônica e usar medicamentos tradicionalmente usados apenas no contexto médico. Este capítulo revisa
os medicamentos usados nos distúrbios de dor crônica orofacial
e os relaciona com distúrbios conhecidos ou presumidos e com
os mecanismos da dor.
Quando um paciente é avaliado com relação a dor orofacial
crônica, o clínico deve determinar qual das várias condições potenciais pode ser a fonte da dor. Em geral, descartadas fontes intra- e
extracranianas, o diagnóstico diferencial reduz-se para dor musculoesquelética, neurovascular e dor neuropática periférica ou central,
ou uma combinação destas. Estas categorias de dor têm diferentes
mecanismos fisiopatológicos e requerem diferentes modalidades
ou estratégias de tratamento. Interligadas com o problema da dor
estão as questões psicológicas que se desenvolvem em conjunção
com a dor crônica. Essas questões precisam ser resolvidas para se
otimizar o tratamento da dor e obter um desfecho benéfico.
Os medicamentos usados no tratamento de certa condição
podem ser usados para outra. Os antidepressivos tricíclicos (ATCs)
empregados no tratamento da depressão são úteis na profilaxia da
enxaqueca e podem ser os fármacos mais eficazes no tratamento
de certos distúrbios dolorosos neuropáticos ou musculoesqueléticos. Além disso, os medicamentos podem ser usados diferentemente em cada uma das categorias da dor. Para compreender a
dor orofacial crônica, o clínico precisa compreender os mecanismos envolvidos nas várias condições porque este conhecimento
pode ser útil na escolha dos medicamentos mais benéficos para o
paciente. Este capítulo revisa os medicamentos usados no tratamento dessas categorias de dor crônica e, para cada estratégia
terapêutica listada, discute os mecanismos gerais e específicos de
ação conhecidos. Neste capítulo não se discute o uso de opioides
para dor crônica além de indicar que nos casos de dor intratável
resultante de câncer ou outras condições como neuropatia crônica
366
resultante de cirurgia malsucedida da articulação temporomandibular (ATM), o uso de longo prazo de opioides pode ser a única
opção para auxiliar o paciente. Esta situação entretanto é rara, pois
os opioides são geralmente menos eficazes que vários outros fármacos para o tratamento da dor neuropática.
SEROTONINA (5-HIDROXITRIPTAMINA, 5-HT)
Para entender a dor crônica e seu tratamento farmacológico, é
necessário compreender o sistema 5-hidroxitriptaminérgico e seu
impacto na modulação da dor. Além da dor crônica, alterações na
função 5-HT estão implicadas em numerosas outras condições
clínicas, incluindo distúrbios afetivos, distúrbios obsessivo-compulsivos, esquizofrenia, estados de ansiedade, distúrbios fóbicos, distúrbios alimentares, enxaqueca e distúrbios do sono. Encontram-se
receptores de serotonina em neurônios pré- e pós-sinápticos. Os
dois receptores pré-sinápticos serotoninérgicos fundamentais são
5-HT1A e 5-HT1D. Os receptores pós-sinápticos da 5-HT incluem
5-HT1A, 5-HT1D, 5-HT2A, 5-HT2C, 5-HT3 e 5-HT4. Os receptores
pré-sinápticos funcionam como autorreceptores, controlando a liberação de serotonina e os potenciais de ação serotoninérgicos. O
receptor 5-HT1A é um autorreceptor somatodendrítico que reduz
a velocidade de condução dos potenciais de ação. O autorreceptor
5-HT1D pré-sináptico detecta a 5-HT sendo liberada na fenda
sináptica e inibe sua liberação adicional; o receptor 5-HT1D é
também denominado autorreceptor terminal.
Uma ampla gama de fármacos afeta a neurotransmissão serotoninérgica, incluindo antidepressivos (ATCs, inibidores seletivos
da recaptura de serotonina [ISRSs] e antidepressivos heterocíclicos), alucinógenos, ansiolíticos, antieméticos, agentes antienxaquecosos, antipsicóticos atípicos e moderadores do apetite. Muitos
outros fármacos geralmente não considerados interferentes sobre
o sistema 5-HT apresentam mesmo assim um efeito presumido
em receptores 5-HT, por causa de sua influência em condições
ligadas à desregulação serotoninérgica, como a enxaqueca.
Aspectos Históricos da Serotonina
Desde 1868 sabia-se que o soro (sero-) dos coágulos sanguíneos
possui uma substância que causa constrição de vasos sanguíneos,
aumentando o tônus (-tonina) de sua musculatura lisa. Estudos
fisiológicos subsequentes sobre a causa desta atividade vasoconstritora vacilaram entre alguma substância desconhecida e a epinefrina. A questão foi finalmente esclarecida pela observação de que
o soro provocava constrição de preparações vasculares de sapo e
intestinais de coelho, enquanto a epinefrina causava apenas relaxamento do intestino. Como não se encontraram evidências de
epinefrina no plasma sanguíneo, assumiu-se que a vasoconstrição
era causada por uma substância presente no sangue coagulado e,
Fármacos para o Tratamento de Síndromes Dolorosas Orofaciais
CAPÍTULO 23
no início dos anos 1900, as plaquetas foram identificadas como a
fonte da substância.
Janeway e associados20 empreenderam uma detalhada investigação sobre a substância vasoconstritora e observaram que ela não
estava presente no sangue não coagulado ou tratado com citrato,
que estava definitivamente associada com as plaquetas, que era
mais solúvel em água que em éter ou clorofórmio e que o fator não
dependia da formação do coágulo mas da desintegração das plaquetas no coágulo. A substância foi por fim isolada e denominada
serotonina por Rapport e colegas em 1948.36 Logo depois, Rapport
e colaboradores identificaram o agente como sendo a 5-HT, e
Hamlin e Fischer18 relataram sua síntese em 1951.
Enquanto isso, na Itália, em uma série separada de estudos,
Erspamer e Asero8 isolaram uma substância da mucosa do estômago de coelho e verificaram que sua ocorrência nas células enterocromafins do intestino era abundante, que podia ser extraída com
álcool e acetona, era uma amina que afetava a musculatura lisa e
era inativada por desaminação. Erspamer e Asero denominaram-na
enteramina. Em 1952, a serotonina e a enteramina foram identificadas quimicamente como a 5-HT, provocando uma disputa internacional sobre a denominação da 5-HT. Argumentou-se que
“enteramina” não estava correto porque a substância era encontrada em outros locais além do intestino, e “serotonina” era igualmente inadequado em função de sua origem e ação farmacológica.
Em 1986, por ocasião da organização do International Serotonin
Club, os pesquisadores americanos prevaleceram sobre o contingente europeu denominando a substância serotonina com base nos
argumentos de que serotonina era o nome mais amplamente aceito,
que 5-hidroxitriptamina era muito grande e 5-HT era apenas uma
abreviatura (porém a que usamos aqui).
5-HT e Dor
Mostrou-se que a estimulação da substância cinzenta periaquedutal (CPA) modula a nocicepção em nível de medula espinal.28 Este
efeito é conhecido como analgesia produzida por estimulação (APE).
Embora uma série de áreas tenham sido estudadas em animais, os
estudos em seres humanos foram necessariamente limitados. Em
animais, sabe-se que a estimulação da região mesencefálica CPA e
das áreas ligeiramente mais rostrais da substância cinzenta periventricular do hipotálamo produz APE. Em neurocirurgias foi possível
demonstrar APE pela estimulação dos sítios equivalentes no mesencéfalo humano; pesquisas em animais determinaram que a estimulação elétrica da CPA do tronco cerebral produz analgesia. Embora
os limites exatos da área responsiva não tenham sido claramente
definidos, os sítios mais responsivos à APE foram: ventralmente ao
367
aqueduto cerebral no mesencéfalo; na CPA; em regiões laterais a
esta estrutura; a parte rostroventral do bulbo (RVB), incluindo o
núcleo mediano magno da rafe (NRM) e a formação reticular; o
hipotálamo; o lobo frontal, e a medula espinal. Áreas fora do
mesencéfalo não foram sistematicamente estudadas.
A maioria das projeções do RVB/CPA são triptaminérgicas. A
injeção de morfina na CPA tem também efeito antinociceptivo
similar e pensa-se que seja mediado pela ativação de uma via rafeespinal. Outros estudos implicaram fibras serotoninérgicas descendentes e outras fibras não contendo 5-HT nesse processo. O
aumento da produção de 5-HT nos neurônios serotoninérgicos
bulboespinais apoia o papel da 5-HT na modulação da dor nestas
vias. Os estudos das vias da rafe confirmaram que com tal estimulação há um aumento concomitante no corno posterior de ácido
5-hidroxi-indolacético (5-HIAA), um importante metabólito da
5-HT, implicando ativação e degradação de 5-HT no processo.
Distribuição Anatômica
A 5-HT é uma monoamina biogênica e está amplamente distribuída nos reinos vegetal e animal. Nos mamíferos, as maiores concentrações são encontradas nas células enterocromafins da mucosa
gastrintestinal, no sistema nervoso central (SNC) e nas plaquetas.
A Figura 23-1 mostra a estrutura da 5-HT. Suas características mais
notáveis são o grupo hidroxila na posição 5 do núcleo indol e o
amino nitrogênio primário que pode aceitar um próton, tornando
o composto hidrofílico e incapaz de atravessar com facilidade a
barreira hematencefálica. Rapport e colegas36 encontraram a substância no cérebro, e indicaram que nesse local ela devia ser sintetizada e desempenhar alguma função não identificada na época.
Assumiu-se subsequentemente que a 5-HT estava associada com
distúrbios psiquiátricos como a depressão e a esquizofrenia quando
foi demonstrado que o fármaco psicodélico dietilamida do ácido
lisérgico (lysergic acid diethylamide, LSD) antagonizava a função da
5-HT. Sabe-se agora que a 5-HT está envolvida em muitos distúrbios comportamentais e psiquiátricos, tais como esquizofrenia,
distúrbio obsessivo-compulsivo, depressão e ansiedade, e que fármacos com efeito sobre o sistema serotoninérgico têm-se mostrado
benéficos no tratamento desses distúrbios (Cap. 12).
A despeito das sugestões iniciais de que a 5-HT era um neurotransmissor sintetizado no cérebro, a localização real de neurônios serotoninérgicos não foi determinada por pelo menos mais
10 anos. Usando-se técnicas de lesão e fracionamento, a 5-HT foi
grosso modo associada com elementos neuronais específicos, porém
foi impossível observar diretamente essa correlação até que as
técnicas histoquímicas de fluorescência fossem desenvolvidas.
CH2CHNH2COOH
CH2CHNH2COOH
OH
Triptofano
5-hidroxilase
N
N
Triptofano
5-Hidroxitriptofano
CH2CHO
Descarboxilase
OH
FIGURA 23-1 Biossíntese e metabolismo da serotonina. MAO, Monoamino-oxidase.
Aldeído
desidrogenase
CH2CH2NH2
N
OH
5-Hidroxi-indolacetaldeído
CH2COOH
OH
MAO
N
5-Hidroxitriptamina
(serotonina)
N
Ácido 5-hidroxi-indolacético
368
PARTE II
Farmacologia de Grupos de Fármacos Específicos
Este processo tem, no entanto, problemas inerentes que fazem
com que a identificação constitua um desafio significativo. Dahlström e Fuxe,7 usando técnicas imunocitoquímicas, localizaram
neurônios associados à 5-HT em nove grupos discretos de células
ao longo da linha média da parte superior do tronco cerebral e da
ponte. Estes corpos celulares contendo 5-HT, designados B1 a B9,
correspondem em sua maior parte aos núcleos da rafe dorsal.
Apenas cerca de 40% a 50% dos núcleos da rafe dorsal são neurônios serotoninérgicos e alguns núcleos serotoninérgicos são encontrados fora da área dos núcleos da linha média da rafe, embora a
principal concentração cerebral esteja nos núcleos da rafe dorsal.
Estudos adicionais mostraram que os tegmentos pontinos
lateral e dorsolateral, que contêm muitos neurônios noradrenérgicos, estão também envolvidos na modulação nociceptiva quando
estimulados, e estes sítios enviam projeções para a CPA, para o
RVB e para a medula espinal. As projeções das partes lateral e
dorsolateral da ponte são noradrenérgicas e possuem importantes
receptores α2-adrenérgicos. Em estudos com animais, a norepinefrina (NE) aplicada diretamente na medula espinal bloqueia a
resposta à nocicepção através da inibição seletiva dos neurônios
nociceptivos do corno posterior (Cap. 20). A lesão da substância
branca do funículo dorsolateral da medula espinal bloqueia o
efeito inibitório da APE e confirma a existência de uma via moduladora descendente que trafega no funículo dorsolateral. Outros
estudos sobre as projeções do funículo dorsolateral para a medula
espinal revelaram que a maioria das projeções do tronco cerebral
origina-se no RVB e na parte dorsolateral da ponte, com poucas
projeções provenientes da CPA. Este achado implica que as projeções da CPA devem ser retransmitidas através do RVB. Isto foi
confirmado por estudos mostrando que os principais impulsos
neuronais que chegam ao RVB originam-se da CPA e estruturas
adjacentes, e que a lesão ou o bloqueio de células do RVB elimina
o efeito analgésico obtido com a estimulação da CPA.
A marcação com anticorpos anti-5-HT mostrou a presença de
5-HT em todas as lâminas do corno posterior, porém as maiores
densidades são encontradas nas lâminas I, II, IV, V e X. As projeções do RVB terminam principalmente nas lâminas I, II e V. Estas
áreas são importantes para a dor porque aqui são encontradas as
terminações centrais dos nociceptivos aferentes e os corpos celulares dos neurônios de segunda ordem. Esta área do corno posterior é o principal “painel de interruptores” para a dor, sendo este
o local onde a estimulação da CPA e do RVB modula a atividade
nociceptiva (Cap. 20).
Estudos imunocitoquímicos também encontraram células
5-HT reativas na área postrema, na parte caudal do locus ceruleus
e em torno do núcleo interpeduncular. Através de estudos de lesão,
observou-se que os grupos caudais projetam-se principalmente
para o bulbo e a medula espinal, os grupos rostrais projetam-se para
o telencéfalo e o diencéfalo, e os grupos localizados mais centralmente projetam-se rostralmente e inferiormente. Em geral, entretanto, as células serotonérgicas enviam axônios para virtualmente
todas as partes do SNC, e achados mais recentes indicam falta de
padrão desta inervação.
A transmissão de mensagens sensitivas e, particularmente,
nociceptivas pelas fibras aferentes que penetram no corno posterior da medula espinal está sob o controle de vias que se originam
na parte ventromedial do bulbo. Observou-se que certos neurônios dos núcleos da rafe bulbar e particularmente do NRM projetam-se predominantemente para o corno posterior, incluindo as
lâminas superficiais e a área em torno do canal central, e estão
envolvidos em uma via inibitória descendente com função moduladora sobre os impulsos nociceptivos. Como nesta área foram
encontrados neurônios serotoninérgicos em abundância, os pesquisadores postularam que a 5-HT seria um neurotransmissor no
sistema descendente modulador da dor. Neurônios contendo
5-HT estão localizados na parte rostroventromedial do bulbo e
na parte caudal da ponte, e particularmente no NRM, no núcleo
paragigantocelular e na porção ventral do núcleo gigantocelular.
Estudos mais recentes descreveram outras projeções descendentes
provindas do bulbo e do mesencéfalo para a medula espinal que
não contêm 5-HT e são mais numerosas no bulbo e na parte
caudal da ponte, indicando que a modulação descendente não está
limitada a fibras serotoninérgicas.24
Estudos imunocitoquímicos empregando anticorpos anti-5-HT
mostraram que dois tipos distintos de neurônios serotoninérgicos
inervam o córtex cerebral de muitos mamíferos. Os estudos encontraram axônios delicados com pequenas varicosidades com origem
nos núcleos da rafe dorsal e em axônios especializadosi com
grandes varicosidades esféricas originando-se nos núcleos da rafe
mediana. Aparentemente os dois tipos de axônios têm diferentes
distribuições reagionais e laminares, e mostram sensibilidades diferentes a fármacos neurotóxicos como a 3,4-metilenodioximetanfetamina, conhecida comumente como “ecstasy”. Os axônios
delicados parecem ser mais sensíveis aos efeitos neurotóxicos, com
perda funcional que pode ser de longo prazo ou permanente.
Cooper e associados6 sugeriram que os achados em animais de
laboratório podem ter relação com o uso do fármaco por seres humanos, dado que as doses comumente usadas por usuários recreacionais do fármaco são similares às usadas em estudos com animais.
Os usuários de ecstasy exibiram diminuição de 26% no 5-HIAA
(o metabólito da 5-HT). A diminuição do metabólito pode indicar
uma diminuição da função serotoninérgica cerebral relacionada
com a perda de alguns neurônios serotoninérgicos. Entretanto, a
distinção funcional entre esses dois tipos de neurônios permanece
em geral obscura.
Síntese, Armazenamento e Destino
A 5-HT é sintetizada a partir do aminoácido L-triptofano (Fig.
23-1). Embora as plaquetas contenham grandes quantidades de
5-HT, sua presença é devida a acúmulo, e não a síntese local. A
síntese no SNC envolve o transporte ativo de triptofano através
da barreira hematencefálica. O triptofano é derivado primariamente da dieta, e sua exclusão da dieta pode causar profunda
diminuição de 5-HT cerebral. Além disso, o transporte ativo de
triptofano é afetado por sua concentração no sangue e pela concentração relativa de outros aminoácidos que são transportados
pelo mesmo mecanismo de transporte ativo. A conversão do
L-triptofano ocorre nos neurônios serotoninérgicos que contêm a
enzima triptofano hidroxilase (L-triptofano-5-mono-oxigenase).
O passo inicial da síntese é a reação de hidroxilação do triptofano na posição 5 dando origem ao 5-hidroxitriptofano (Fig.
23-1), catalisada pela triptofano hidroxilase. Esta enzima, cujo
isolamento provou ser difícil, ocorre em baixas concentrações na
maioria dos tecidos, inclusive no cérebro.
A triptofano hidroxilase tem uma necessidade de oxigênio que
limita sua velocidade. Além disso, evidências crescentes sugerem
que o sistema é ajustado conforme a quantidade de triptofano
disponível. Mostrou-se que tratamentos farmacológicos que afetam
o sistema serotoninérgico são rapidamente contrabalançados por
um mecanismo de retroalimentação intrínseco, envolvendo regulação da síntese de 5-HT. Tratamentos de curto prazo com sais de
lítio inicialmente aumentam a captação de triptofano, causando
aumento das quantidades de triptofano convertidas a 5-HT; entretanto, com o tratamento de longo prazo, apesar de o aumento na
captação ser ainda mensurável, a síntese de 5-HT a partir do triptofano aumentado retorna aos níveis anteriores ao tratamento.
O 5-hidroxitriptofano é rapidamente descarboxilado para
formar a 5-HT pela enzima L-aminoácido aromático descarboxilase, que é a mesma enzima que catalisa a descarboxilação da
L-dopamina nos neurônios catecolaminérgicos (Fig. 23-1). Como
a velocidade da reação é tão rápida e requer menos substrato que
a reação inicial, a ação da triptofano hidroxilase no primeiro passo
é considerada como o passo limitante de velocidade na síntese de
5-HT, e os fármacos cujo alvo é a ação da descarboxilase não se
mostraram eficazes.
A síntese de 5-HT aumenta acentuadamente com a estimulação elétrica do soma serotonérgico. Isto é o resultado do aumento
da conversão de triptofano para 5-HT e depende do Ca2+ extracelular. Uma vez que, como discutido anteriormente, o passo
limitante da velocidade é a ação da triptofano hidroxilase sobre o
i
Nota da Revisão Científica: Beaded axons: refere-se a neurônios portadores de botões sinápticos ao longo do seu trajeto (em francês
denominados boutons en passant). Em português são denominados
botões de passagem, em contraposição aos axônios que apresentam
botão sináptico terminal.
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