- InterDISCIPLINARY Journal of Portuguese Diaspora

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Glória de Sant’Anna: uma voz feminina nos confins do
Índico
Giulia Spinuzza
Universidade de Lisboa
Resumo. A obra poética de Glória de Sant’Anna, nascida em Portugal e radicada em
Moçambique ao longo de duas décadas, oferece um importante testemunho literário da vivência
africana durante a época colonial. De facto, a poesia produzida durante a estadia de Sant’Anna em
Moçambique confronta-nos com questões de identidade, alteridade e representação do “outro”,
que serão tratadas na primeira secção do artigo. Na segunda, abordaremos a questão da escrita
feminina, quer na interacção com o objecto representado, a mulher moçambicana, quer desde o
ponto de vista da voz autoral.
As duas secções que compõem o texto são interligadas pelo fio condutor do ensaio: a
temática da representação poética do “outro” no contexto colonial moçambicano; sendo que a
segunda parte do texto se centra exclusivamente na imagem do “outro” feminino, interrogando
não só o objecto representado, a mulher negra, mas também o sujeito representante, a poeta
enquanto mulher.
A análise da problemática representação do “outro”, no âmbito das questões coloniais e de
género apontadas ao longo do artigo, permitirá demostrar que a poesia de Glória de Sant’Anna se
afasta dos moldes poéticos da denúncia explícita da negritude e da escrita anticolonial mas, ao
mesmo tempo, ao manifestar o drama dos nativos, se distancia também da representação exótica,
inferiorizada ou estereotipada do “outro”, que caracteriza parte da Literatura Colonial.
Palavras-chave: poesia, mulher, colonialismo, alteridade, Moçambique
Abstract. The poetry of Glória de Sant’Anna, a poet born in Portugal, who settled in
Mozambique for two decades, bears an important literary witness to African life during the
colonial era. In fact, the poetry produced during Sant’Anna’s stay in Mozambique confronts us
with questions of identity, alterity, and representation of the “other” that will be analysed in the
first section of the article. In the second section we will investigate feminine writing both through
the interaction with the represented object, the Mozambican woman, and from the point of view
of the authorial voice.
The two sections are interconnected by the main thrust of the article: the representation of
the “other” theme in the Mozambican colonial context; considering that the second part of the
text will be centred on the feminine “other,” questioning not only the represented object, the
black woman, but also the subject who represents, the poet as a woman.
The analysis of the problematic representation of the “other” in the framework of colonial
and gender issues exposed throughout the article will enable us to demonstrate that the poetry of
Glória de Sant’Anna distances itself from the explicit condemnation poetry of negritude and
anticolonial writing. But at the same time, by showing the drama of the native population, it does
not conform to the exotic, debased, or stereotyped representation of the “other” that
characterizes part of colonial literature.
Keywords: poetry, woman, colonialism, alterity, Mozambique
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“Minha terra é longe / longe noutro mar / de águas coloridas / de verdes
sargaços” (Um denso 41), é assim que começa um dos poemas escritos em
Moçambique por Glória de Sant’Anna (1925–2009), poeta de origem portuguesa
que viveu e trabalhou neste país africano entre 1951 e 1974, antes de voltar
definitivamente para a sua terra natal.
O percurso de afastamento que a leva de Portugal à margem austral da
África é acompanhado pela consciência certa do retorno: “Partirei em
Dezembro, / quando as acácias brotem do momento / do chão ser todo verde
até ao mar” (Sant’Anna, Um denso 75). Todavia, ao contrário do que esses versos
preanunciam, a poesia desta autora não se constrói no paradigma nostálgico, mas
se abre ao mundo moçambicano, de onde emerge um leque variado de
personagens locais, todos representados de forma empática e com dimensão
íntima. Por isso, a produção lírica de Glória de Sant’Anna, que se torna num
marco importante da produção poética moçambicana, se bem que pouco
estudada 1, convida a repensar algumas questões literárias e identitárias no
contexto colonial moçambicano, nomeadamente a representação poética do
“outro” e as problemáticas conexas à alteridade e ao género.
A escrita da poeta, que se enquadra na vertente lírica intimista, não
representa só um testemunho importante de escrita feminina em âmbito colonial,
mas oferece também uma visão do mundo moçambicano anterior à
independência, de onde emergem figuras locais, como os pescadores ou as
mulheres à beira-mar, representados de uma forma íntima e profundamente
humana, que esquiva o estereótipo racial.
Os seus textos, que se apresentam como “quadros” da sociedade colonial,
manifestam uma convergência com as artes plásticas, não só pelos títulos de
alguns poemas, mas também pelo processo de escrita que procura imitar o acto
pictórico. De facto, os retratos poéticos constroem-se como pinceladas que,
camada por camada, representam os “outros” moçambicanos: “Tudo isto um
quadro (se eu pudesse) / traçado a cinza, sol e verde / e um só nome: / gente”
(Desde que o mundo 69). Essa gente moçambicana que emerge nos seus textos será
o fulcro da nossa análise, cujo objectivo é demonstrar que as representações
literárias do(s) “outros(s)” se afastam do estereótipo gerado pelo sistema colonial
e que a presença do feminino obriga a repensar a relação entre identidade e
alteridade, na busca de uma sensível união humana capaz de ultrapassar as
contingências locais e históricas.
A representação poética do “outro”
Distância, o primeiro livro publicado por Glória de Sant’Anna em 1951, encena
um percurso de afastamento, que é também um caminho em direcção ao novo,
ao desconhecido, ao diferente. A viagem viabiliza o encontro com o “outro” e
com o diferente, em termos humanos, poéticos e geográficos.
Nesse primeiro livro manifestam-se as características de uma escrita poética
incapaz de se distanciar do seu elemento primário: o mar. De facto, são muitos
os poemas da nova vivência moçambicana com uma ambientação marítima,
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dominada por pescadores ou mulheres à beira mar. No poema “Pescador velho”,
por exemplo, a presença do pescador remete para o mar enquanto meio de
subsistência, associado ao trabalho. Nesse poema o pescador transforma-se
metaforicamente nos elementos marítimos à sua volta: as mãos tornam-se
“gaivotas paradas / sobre problemas aquáticos” e os olhos “vãos horizontes /
cheios de brisas e mastros”. Há, então, uma clara fusão entre o pescador e o mar,
não só pela ligação prática devida à sua profissão, mas também por uma relação
íntima e afectiva entre o homem e o mar: “O coração é do mar: / foi emprestado
por Deus” (Distância 59). Também o “Poema do mar”, do livro Poemas do tempo
agreste, repercorre o mesmo elo temático ao criar um intercâmbio entre as feições
do homem e o mundo marítimo. De facto, neste texto o homem transfigura-se
nos elementos aquáticos, acentuando a contiguidade e reversibilidade entre o
corpo e a paisagem marítima: “O pescador vem do mar. / Traz rosto de frio sal
/ e olhos de longa mágoa. / (Ai rede tão larga / que rede tão larga.) / Seu corpo
é vestido / de búzios e algas, / e deixa na areia / um rasto de prata. / (A rede
que o segue / ai, como se arrasta) / O pescador vem do mar / e não trouxe
nada” (41).
O drama dos pescadores, cuja vida consiste numa luta pela sobrevivência,
constitui uma temática recorrente na poética desta autora. Entre peixe e pescador
há um trágico destino comum, porque a morte não afecta só o peixe, mas
também o pescador: “O pescador está morto no fundo. / E o pé, lho sustém um
coral / Desfez-se o m’cota e está nu / – nu e livre dentro do mar” (Desde que o
mundo 27). A dramática imagem do pescador que emerge do mar mostra um
corpo preso aos elementos marítimos: “Quem o busca no cimo, não sabe / quão
perfeito e completo ele está / assim preso pelo último coral / à memória de tudo
o que amava. / E por isso todas as palavras / e apelos e gritos e lágrimas / se
dispersam na sombra do vento / e no azul secreto da água” (27). Esses exemplos
demonstram que a identidade do pescador tem uma profunda dimensão íntima,
definida pelo mundo que habita e pelo trabalho que desenvolve, não é um
simples elemento “decorativo” de um mundo exótico. A ambientação marítima
é frequente também na maioria dos poemas que incluem figuras femininas. O
mar é para a mulher moçambicana, como o era para o pescador, um meio de
sustento, que repete um ciclo imutável. Com efeito, os poemas de ambientação
marítima testemunham uma visão do mar enquanto meio de sobrevivência e de
trabalho, temática que se coloca fora do esquema do mar-imperial 2 e que aponta
para uma problemática relacionada com a marginalidade dos sujeitos
representados. Bastaria pensar nos textos sobre os pescadores, assim como nos
poemas, como este, que retratam mulheres que colhem moluscos à beira-mar:
Por cima dos claros, transparentes búzios
e das lentas algas,
a negra desfia seus tranquilos passos.
E junto das rochas imersas e húmidas,
buscando moluscos,
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a negra desata seu gesto cansado.
[…]
Por dentro da tarde a negra se curva
no horizonte fechado,
e o seu gesto é ancestral
e cansado.
[…]
Negra caminheira,
que dizem as estrelas por sobre os teus passos?
(Sant’Anna, Livro de água 10–11)
A marginalidade delimitada pelo horizonte marítimo circunscreve a negra à
beira-mar, no local de encontro da água com a terra. A mulher é, então, confinada
pelos próprios passos num espaço que define a sua condição, representada pela
repetição do gesto antigo, e que só poderá ser alterada pela vontade do destino.
Outro poema no qual é representada uma mulher negra numa ambientação
marítima é “Quadro”, do mesmo livro, no qual a figura central é uma mulher
negra à beira-mar: “Negrinha faceira, / dentro da água cálida, / quem olhará /
tua graça? . . . Os teus pés estão sobre os búzios claros / e vazios, / e há música
e sol / em teus ouvidos. / Mas quem passa deixando pegadas na areia, / não olha
para ti, negrinha faceira” (9). Neste poema há um jogo de espelhos criado pelo
cruzamento de vários olhares: o da poeta, que observa a cena como se fosse um
quadro, e o dos transeuntes que passam pela mulher negra sem notar a sua
presença. O facto do sujeito poético acentuar, com a pergunta lançada nos
primeiros versos e com a resposta que fecha o poema, que ninguém olha para a
mulher negra, sugere a sua marginalidade na sociedade colonial, porque a mulher
é um sujeito invisível perante os olhares indiferentes de quem passa por ela. A
poeta reconverte, então, a invisibilidade social da mulher numa visibilidade
poética e, ao torná-la o centro temático do texto, dá-lhe valor não só como
mulher, mas como ser humano.
Se no poema “Quadro” a invisibilidade da condição da mulher derivava da
indiferença do olhar dos outros, para os quais ela nada vale, em “Marinha” há
uma inversão do sentido e, desta vez, é para a mulher que nada à sua volta tem
valor: “A negra curvada dentro do mar / colhe conchas (e mágoas). / Seu filho
no dorso virado ao céu / adormece (e que sabe?) . . . Os dois cumprem o instante
/ que lhes cabe, / dentro do sol morno / da manhã exacta. / O resto à sua volta
/ nada vale” (Um denso 35).
Como explica Glória de Sant’Anna na entrevista feita por Michel Laban, é
importante “saber ler o que há para lá das palavras” (172), porque só uma leitura
atenta revela o que uma escrita enigmática esconde. Muitos dos seus textos, ao
representarem os “outros” nas suas actividades diárias, fazem emergir aspectos
aparentemente insignificantes do quotidiano. Aspectos que, porém, oferecem
um importante testemunho da vivência colonial e das relações de alteridade
geradas nesse contexto, como é o caso, por exemplo, do “Poema da mãe negra”,
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que retrata uma mulher que cultiva a sua machamba e canta para o filho que leva
nas costas 3. Nesse poema, a terra e as plantas fundem-se com o corpo da mulher:
Mãe negra está dentro da sua machamba, / seu dorso brilhando por cima das plantas,
/ seus pés emergindo da terra vermelha. . . . E o sol que desliza pelo céu de vidro, /
aquece mãe negra que capina e canta / para a capulana onde dorme o filho. / E mãe
negra canta. . . . para o seu menino. (Sant’Anna, Poemas do tempo 45)
O poema mostra um aspecto crucial da vida moçambicana, ou seja, a
dedicação quase exclusivamente feminina ao trabalho na machamba, assim como
a conciliação desta função com a maternal e com o canto, sendo que a mulher,
para além de lavrar e levar o filho às costas, canta.
Relativamente à presença do canto, referida neste poema, enquanto
elemento que acompanha o trabalho nos campos, há outros textos que a
relacionam não só ao trabalho, mas também ao sofrimento, como podemos ler
nos seguintes versos: “Os corvos marcam / trajectórias largas pelo dia branco, /
por sobre a cabeça / dos negros cantando. / Há vento disperso, / rasgando nas
folhas das árvores altas, / melodias lentas / de antigas desgraças. . . .” (Música
ausente 47). Para além de ser um elemento que denuncia o sofrimento, o canto é
também uma marca da alteridade, uma expressão individual através da qual se
ergue a voz do povo negro, como emerge no poema “A canção do negro”: “O
negro canta / num timbre agudo / (agudo e rápido) / que surpreende. . . . E o
ritmo é tanto, / tão bem marcado, / tão ansioso e / dilacerante, / que me parece
/ que está (sozinho) / cantando as mágoas / de toda a gente” (Um denso 53).
Esses poemas, sem apontarem de forma explícita para o canto enquanto
elemento de resistência e libertação, reconhecem-lhe a capacidade de unir o
individual ao colectivo, tornando-o num elemento identitário da cultura negra,
que exprime a mágoa da sua gente. Note-se, por último, que no contexto da
negritude e da luta anticolonial, o canto é uma temática que será abordada por
outras vozes poéticas, como José Craveirinha e Noémia de Sousa, enquanto
marca da cultura negra e elemento que denuncia a necessidade de redenção. Ao
contrário da poesia anticolonial e da negritude, na obra de Glória de Sant’Anna
o canto não denuncia explicitamente o sistema colonial, mas mostra o drama das
vidas dos moçambicanos, particularmente evidente num lugar geográfico tão
pequeno como a Ilha de Moçambique 4. Um dos poemas sobre a Ilha de
Moçambique, “Bairro negro”, ambienta-se na zona mais pobre. De facto a ilha
divide-se em duas partes: a cidade de pedra e cal, constituída por construções em
pedra ao estilo europeu feitas para os senhores da Ilha, colonos e mercantes, e a
cidade de macuti, casas com o tecto de folhas de palma à maneira local, onde vivia
a população mais pobre. Esta divisão em duas partes da Ilha não só é assinalada
por diferenças arquitectónicas, mas também sociais, raciais e coloniais. Em
“Bairro negro” o olhar do sujeito poético penetra dentro das casas de macuti, o
material tradicional para a cobertura do tecto. Logo no início do poema
vislumbra-se a presença da Ilha enquanto terra que foi capturada ao mar,
existindo uma correlação entre a resistência das casas maticadas e a dos seus
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habitantes: “As pequenas casas maticadas / erguem-se de longe (de séculos, de
antigas datas) / contra o mar e as ondas e as algas” (Livro de água 25). O olhar
poético penetra gradualmente nas casas de macuti, ao passo que avança o
movimento de introspecção nos seus habitantes, numa escrita que se distancia
do olhar paternalista ou pitoresco: “As pequenas casas cúbicas e caladas / onde
os problemas são primários e as janelas fechadas / e os tectos de macúti. . . ./
(Quem sofre dentro das rústicas portas não aplainadas? / Ou se encosta
chorando às trémulas arestas / projectadas entre ângulos de acaso?” (25).
Perante uma escrita que se aproxima cada vez mais das populações locais,
não podemos deixar de nos questionarmos acerca da relação entre a obra de
Glória de Sant’Anna e a Literatura Colonial que se desenvolvia entre os anos 50
e 70 nas ex-colónias 5. A este propósito tencionamos abordar brevemente a
problemática do estereótipo literário gerado no contexto colonial e, depois,
relacionar esta questão com a escrita de autoria feminina.
Jeanne Marie Penvenne, que analisa as representações dos negros nas
fotografias do período colonial tardio, nota que estes estavam praticamente
ausentes, aparecendo somente “em pano de fundo, ou em pose, ou de modo
exótico” (174). Com efeito, na sociedade colonial, o negro era invisível ou
inferiorizado, colocado numa posição de subordinação ou representado como
uma componente paisagística da ambientação exótica. Pelo contrário, nos textos
de Glória de Sant’Anna a população local é colocada no centro, valorizada. Qual
é então a relação da obra poética desta poeta com a literatura colonial? O estudo
exaustivo e aprofundado de Francisco Noa sobre o romance colonial em
Moçambique fornece importantes indicações relativamente às principais
características deste tipo de literatura, produzida, na sua maioria, por portugueses
que viajaram ou viveram nas ex-colónias. Segundo Noa, a Literatura Colonial
reproduz uma visão lusocêntrica (76) e pode ser distinguida por três fases: a
exótica, a doutrinária e a cosmopolita. Para comparar esta literatura com a obra
poética de Glória de Sant’Anna interessa-nos evidenciar a primeira e a última
fase.
Na primeira fase identificada por Noa, a exótica, o africano é um elemento
paisagístico como outro, parte de um mundo exótico que fascina, surpreende e
inquieta. Ao contrário, os poemas de Glória de Sant’Anna apresentam os nativos,
sublinhando, de forma sensível e não gritante, o drama das suas vidas, a luta pela
sobrevivência dos pescadores, a solidão das mulheres nos seus trabalhos diários
e as suas mágoas escondidas. Os poemas apresentam-se como interrogações
sobre um mundo alheio através das quais a poeta, a partir de um ponto de vista
exterior, questiona as dificuldades, mágoas e esperanças da população local. Os
nativos não figuram enquanto estilizados elementos “folclóricos” e adquirem
uma dimensão “humana” que contrasta com a concepção colonial e racista que
os via como gente inferior e não civilizada e, por isso, não plenamente humana.
Dessa forma, podemos dizer que, nos poemas de Glória de Sant’Anna, o mundo
moçambicano não representa uma cor local ou exótica. Embora a sua poesia leve
a marca da consciência de uma realidade diferente, a representação literária do(s)
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“outros(s)” coloca-se além do discurso retórico colonial e dos esquemas da
literatura colonial, que caracterizam aquela que Noa define como fase exótica.
Mais problemática é a identificação, por parte de Noa, de uma fase tardia
da literatura colonial. Denominada de “cosmopolita”, esta fase é influenciada
pelas teorias luso-tropicalistas, assumindo um cunho universalista e sendo
acompanhada por uma série de mudanças, mais ou menos formais, na política
colonial, propulsionadas pelo Estado Novo. Um dos aspectos que nos interessa
evidenciar desta fase tardia é a “apologia das ideias de multirracialidade e de
igualdade” (Noa 74). Como justamente aponta Noa relativamente a esse período,
um dos possíveis desenvolvimentos dessa fase literária é o desembocar na utopia
de uma sociedade diferente da colonial (75), neste caso podemos dizer que
estamos perante um tipo de escrita que coloca a problemática da integração num
específico sistema literário (português ou moçambicano). A hipótese de Noa é
que esta literatura possa conter algumas vertentes que depois, mais tarde, irão
confluir na literatura nacional, que começava a despontar, entretanto, em
território moçambicano (75–76).
Considerando as características identificadas por Noa, notamos que uma
parte da obra de Glória de Sant’Anna pode ter elementos comuns à fase chamada
de cosmopolita. De facto, alguns dos seus poemas expressam a necessidade de
igualdade e harmonia, alcançáveis somente numa sociedade diferente da que
havia na altura. No “Poema para um negro”, o discurso poético evidencia
diferenças e analogias entre o sujeito poético e um idealizado destinatário, que
representa o povo moçambicano:
O que me prende é o que te prende:
largo horizonte de outros passados,
raízes fundas presas ao chão
e um mar tão largo.
Palavras soltas num vento agreste,
caminhos rudes determinados,
sombras e sonhos sem condição
e um céu tão vasto.
Meus passos breves não deixam rasto.
Teus passos fundos, fundos estão.
Mas entre o mar e o céu e os nossos passos,
a nossa humanidade é o mesmo laço
irmão. (Sant’Anna, Poemas do tempo 39)
Ao exaltar o princípio de igualdade, o poema conclui com a afirmação de
um sentido humano que vai além das discriminações raciais. A dimensão
histórica e geográfica acomuna os dois sujeitos que, apesar de partilharem uma
identidade humana comum, com seus sonhos e aspirações, se diferenciam por
um aspecto: a ligação à terra. Porque, ao contrário dos passos do negro que estão
vincados na terra natal moçambicana, os passos da poeta não deixam rastos. Esta
diferença, porém, não impede a partilha do mesmo espaço existencial, feito de
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fraternidade e sonho, um espaço de horizontes abertos entre o mar e o céu, onde
a humanidade é única e indivisível, atada por um laço irmão, como citam os
versos finais. A propósito destes versos, notamos que podemos interpretar o
lexema “irmão” não só como adjectivo de “laço”, mas também como apóstrofe,
remetendo assim, de forma ainda mais explícita, para o sentimento de
fraternidade que deveria ser compartilhado com o “outro” moçambicano. Este
texto, mais explicitamente político que outros, sugere a presença de um ideal
igualitário, sonhado utopicamente para o espaço colonial. Porque, apesar das
diferenças que separam o sujeito lírico da população negra, é preciso relembrar
o profundo sentimento humano que deveria ser partilhado por todos, como é
declarado nos versos finais de outro poema: “Que importa / seres meu irmão
noutro País?” (Música ausente 91).
Os elementos presentes nos versos supracitados e no “Poema para um
negro” poderiam encontrar pontos em comum com a fase denominada por Noa
de “cosmopolita”, que antevê e deseja um futuro harmonioso. Esta terceira fase
literária, que corresponde parcialmente ao período histórico tardio do
colonialismo, poderia conduzir a uma sociedade que não faz distinções entre os
seus cidadãos, por perseguir “um ideário utópico de uma nação livre, onde
brancos e pretos viveriam harmoniosamente” (Noa 75). Como nota Noa, a
literatura colonial produzida nesta última fase, devido à cada vez mais evidente
abertura para o mundo do “outro”, vai ao encontro da sua “autodissolução” (76).
Tendo em consideração estes elementos, podemos encontrar alguns pontos
em comum entre a fase cosmopolita identificada por Noa e uma parte da obra
poética de Glória Sant’Anna, sobretudo pelo ideal de uma “harmonia universal”
que ultrapassa as fronteiras e diferenças raciais (75). A poeta sonharia então um
espaço mítico, “uma nação por vir” que, ao celebrar o amor fraterno e a dignidade
humana, iria “transcender” ou “reconfigurar o mito da nação imperial”, assim
como o “da portugalidade pluricontinental e plurirracial” (Noa 230–231).
Os textos de Glória de Sant’Anna evidenciam um percurso de
aprendizagem, ao longo da sua vivência moçambicana, de uma realidade que, se
inicialmente é identificada como sendo diferente da sua, torna-se cada vez mais
próxima. Assim, a autora partilha a dramaticidade e o sofrimento de mulheres,
homens e meninos, não enquanto espectadora impassível e superior, mas
enquanto sujeito que participa empaticamente. A voz lírica que interroga o novo
mundo incorpora aos poucos essa realidade diferente no seu imaginário poético
(Secco 180), tornando o que era um mundo alheio, num universo partilhado pelo
profundo sentimento humano.
Questões de género e colonialismo: uma voz feminina em Moçambique
Desde o ponto de vista do género, a poesia de Glória de Sant’Anna aponta para
duas importantes questões. Em primeiro lugar, atendendo ao contexto social,
histórico e político moçambicano entre os anos 50 e 70 do século XX,
problematiza a posição da mulher portuguesa em relação à moçambicana. E, em
segundo lugar, questiona a identificação sexual do texto poético e a consequente
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definição da sua escrita enquanto feminina. Estas duas perspectivas implicam
respectivamente a presença da mulher enquanto representação e enquanto
sujeito da escrita, por isso encontramo-nos perante dois percursos de análise
paralelos: um é a mulher escrita, outro é a escrita da mulher (Branco 6). No
primeiro, a mulher é o sujeito representado e, no segundo, a mulher é o sujeito
representante (Klobucka 42).
Na poesia moçambicana a imagem da mulher é uma temática recorrente;
na época colonial a mulher era identificada com o continente africano, sendo o
objecto do desejo do sujeito masculino branco e colonizador. Na poesia
anticolonial e na da pós-independência muitos poetas moçambicanos, ao
reconverterem os valores coloniais, reapropriaram-se da imagem da mulher/terra
africana, anteriormente submetida à exploração colonial.
Alguns críticos, entre os quais Hilary Owen e Florence Stratton,
questionaram qual foi o papel das mulheres na construção de uma narrativa
nacional e até que ponto a reapropriação poética pós-colonial da imagem da
mulher africana podia perpetuar uma ideia da mulher enquanto objecto-passivonacional. Essas problemáticas, que interessam de forma específica outros poetas
e escritores moçambicanos, apontam para questões relevantes no âmbito dos
estudos de género na produção literária moçambicana.
Relativamente à representação da mulher nos textos de Glória de
Sant’Anna, deverão ser tidas em conta, para além das questões de género, as
problemáticas ligadas à representação da alteridade no âmbito colonial. Com
efeito, a poesia desta autora distancia-se quer da produção colonial, que vê a
mulher africana como um objecto exótico e fonte de desejo, quer de alguma
produção lírica moçambicana da negritude e da luta anticolonial, que identifica a
mulher em termos utópicos e telúricos, enquanto representação metafórica ou
metonímica de uma nação subjugada à opressão colonial ou libertada do jugo
colonial. Este tipo de representação abrange não só a produção masculina, mas
também a feminina, como é o caso, por exemplo, do livro de poemas Sangue
Negro de Noémia de Sousa. Por outro lado, a produção de Glória de Sant’Anna
distancia-se igualmente de uma representação erotizante da mulher, como
emerge nos poetas moçambicanos das décadas de 50 e 60 que serão retomados
pelas novas vozes poéticas dos anos 80. Podemos dizer, então, que esta poesia
fornece um olhar peculiar sobre a realidade feminina moçambicana na época
colonial. Nestes seus poemas, evidencia-se a mulher comum do dia-a-dia, a
trabalhadora dos campos, a que procura mariscos à beira-mar e a que leva o filho
às costas enquanto trabalha na machamba. Perante a aparente insignificância de
muitos textos, o seu valor, não só literário, esconde-se nas entrelinhas do discurso
poético. De facto, neles é por vezes apontada a invisibilidade social da mulher,
não através de uma poesia explicitamente combativa, mas graças a uma
linguagem subtil que descreve a condição dos esquecidos e marginalizados: as
mulheres, os pescadores e as crianças que povoam a paisagem moçambicana.
No período colonial a mulher moçambicana é sujeita a uma dupla acção de
subalternização. Robert Young explica que a dupla colonização (162) 6 da mulher
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deve-se, em primeira instância, à sua condição na esfera doméstica, “the
patriarchy of men” [o patriarcado dos homens] e, em segunda instância, na esfera
pública ao “patriarchy of the colonial power” [o patriarcado do poder colonial]
(162). Aliás, segundo afirma Noa, podemos falar de uma tripla colonização,
porque o patriarcado do poder colonial citado “será responsável, também, pela
terceira forma de dominação: a racial” (325).
Os poemas de Glória de Sant’Anna sobre as mulheres, à excepção de alguns
que veremos a seguir, revelam um sujeito lírico e uma perspectiva que não se
assume necessariamente como feminina, no sentido em que a mulher-poeta não
se revela metadiscursivamente enquanto autora do texto. Nestes poemas a
mulher africana não é exaltada ou representada pela sua beleza exótica e
diferente, seu corpo não é sexualizado, ela não se torna metáfora dos elementos
da natureza ou representação metonímica da terra africana. A mulher, nos textos
de Glória de Sant’Anna, não simboliza, não significa, mas existe, fala ou pensa—
a sua existência salienta a marginalização social e sexual.
Qual é então o olhar desta poeta portuguesa durante a época colonial? Para
responder a esta pergunta deveremos repensar algumas das problemáticas
coloniais desde o ponto de vista do género. Será útil referir brevemente alguns
elementos de carácter social e histórico que irão coadjuvar a análise da escrita
sobre as mulheres e a escrita da mulher na época colonial.
No estudo do fluxo migratório para África, Cláudia Castelo verifica que a
presença das mulheres, em termos relativos, é mais elevada em Moçambique do
que em Angola, o que se deve a uma maior presença de núcleos familiares na
primeira das duas ex-colónias (186), como é o caso também de Glória de
Sant’Anna. Por conseguinte, a posição das mulheres perante o sistema colonial
não pode ser abordada de forma homogénea, visto que, como é evidente, nem
todas as mulheres que emigravam para as então colónias assumiam o papel que
o regime lhes atribuía 7. Na verdade, a maioria dos que deixavam Portugal faziamno porque sonhavam um futuro melhor além-mar. Neste contexto, se da mulher
se esperava que fosse esposa, mãe e dona de casa, o seu papel além-mar incluía
uma contribuição à colonização, devendo encarnar o ideal de colona, segundo os
parâmetros definidos pelo Estado Novo. Desta forma, combinava-se o papel
familiar com a missão “civilizadora”. Uma situação específica é a das muitas
mulheres que foram para Moçambique para acompanharem os maridos em
missão militar durante a Guerra Colonial 8, mas não é este o caso da poeta que,
como sabemos, emigrou com o marido para Moçambique, onde criou a sua
família e exerceu a actividade de professora.
Para além do ensino, ao conciliar o trabalho nas escolas, rádio e jornais com
a criação dos filhos, Glória de Sant’Anna enquadrava-se na concepção moderna
da mulher do pós-guerra. A este propósito note-se que a condição da mulher
portuguesa nas então colónias podia diferir da da Metrópole. De facto, como
afirma Ângela Conceição, que analisa as páginas de jornais publicados em
Moçambique, o afastamento da colónia da Metrópole e a aproximação a outras
regiões de influência inglesa favoreceram a imagem de uma mulher moderna que
Giulia Spinuzza / Glória de Sant’Anna │ 107
seguia as tendências europeias, modelo parcialmente diferente do que era
promulgado em Portugal (46–47) 9. Muitas vezes, os colonos que viviam no meio
urbano eram menos conservadores do que os da Metrópole (Castelo 285), isto
permitiu o desenvolvimento de um modelo de mulher mais aberto e “moderno”
do que o metropolitano. Modelo que, claramente, não incluía a mulher africana.
Apesar das diferenças entre a mulher portuguesa e a moçambicana há, em
muitos poemas de Glória de Sant’Anna, um sentimento de partilha com a mulher
negra. A retórica da alteridade não se alimenta de construções imagéticas cujos
protagonistas são delineados de forma distanciada e com uma visão eurocêntrica.
Porque a mulher negra não é um elemento como outro da paisagem local, não é
tratada com interesse exótico ou curiosidade folclórica, não está ao lado da
mulher branca ou dos seus filhos, é ela mesma que constitui o centro da atenção
poética.
Na poesia de Glória de Sant’Anna, por vezes, a mulher não tem “voz
própria”, no sentido em que é objecto de representação e não o sujeito falante.
Isto não significa que se enquadre na óptica colonial na qual a mulher negra,
representada segundo o paradigma de inferiorização racial e cultural, é objecto
do desejo colonial ou do desejo masculino. Podemos então dizer que, por não
ter voz própria, a mulher negra é inferiorizada ou silenciada? As reflexões de
Rachel Blau DuPlessis a propósito da relação entre poesia e poder no poema
“The Solitary Reaper” de Wordsworth (106–121) podem ajudar-nos a
problematizar essa questão. Tendo em conta as diferenças entre o mundo do
sujeito lírico, que detém a palavra poética, e o do objecto representado, podemos
dizer que o “eu lírico” se coloca numa situação de “poder”? É evidente que
Glória de Sant’Anna coloca-se numa posição privilegiada em relação aos sujeitos
retratados, mas isso não significa que ao representá-los esteja a exercer um acto
de repressão. Ao contrário, pensamos que, apesar de serem os “objectos” da
representação poética, os nativos não são por isso inferiorizados, porque são
seres autónomos, solitários e isolados, que existem e exercem as suas actividades
diárias além do olhar da poeta. Para além disso, a poeta identifica-se com a
mulher negra de um ponto de vista de género e partilha com ela as suas mágoas
e futuras esperanças, como é o caso, por exemplo, do poema “Maternidade”, que
trataremos mais adiante. Pensamos então que a poeta não silencia o “outro”,
porque se deixa levar pela melodia dramática do seu canto, à espera de uma
mudança que reconheça também ao “outro” o direito de falar por voz própria.
Desta forma, concordamos com as palavras de DuPlessis, segundo a qual um
poema “can express contradictions about social relations, can negotiate its own
queries, and can leave traces of those contradictions and queries for those willing
to engage them” [pode exprimir as contradições das relações sociais, pode
negociar as questões que levanta e pode deixar os vestígios dessas contradições
e questões para aqueles dispostos a tratá-las] (121).
Por último, é importante evidenciar que, se na maioria dos casos a mulher
é o “objecto” da representação e não o “sujeito falante” e o “eu lírico” não se
manifesta metadiscursivamente enquanto feminino, há porém algumas
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Vol. 4.1 (2015)
excepções, como é o caso do poema “Lamento da mulher prostituída”. Este
texto representa o ápice de uma linha temática que aponta a problemática
relacionada com a desvalorização da mulher, submetida a uma “objectificação”
do corpo. O tipo de abordagem à temática da prostituição e a assunção do ponto
de vista da prostituta denunciam a origem feminina do texto (Magalhães 26). O
monólogo dramático, cujo sujeito enunciador é a própria prostituta, denuncia
uma perspectiva interior ligada ao corpo feminino, reificado na evocação do
objecto usurpado por todos, a azagaia. Este é um poema em que uma mulher
conta a dor de outra mulher, a partir de um ponto de vista íntimo e feminino,
pois o sujeito lírico veste a máscara da prostituta e confere-lhe voz própria: “Eu,
no centro desta aldeia / ai, eu / sou como uma azagaia / Todos vêem buscar-me
/ ai, eu / para o seu arco . . .” (Sant’Anna, Desde que o Mundo 61).
O poema, que é construído como uma lamentação, através da repetição da
interjeição, representa metaforicamente o corpo da mulher como uma azagaia, o
instrumento de guerra masculino. O corpo converte-se num objecto na mão de
quem detém a força, o homem. Assim, o lamento da prostituta na primeira
pessoa eleva-se a canto universal e de denúncia. Neste poema, a abordagem à
temática social da prostituição, mas sobretudo o ponto de vista apresentado,
podem ser elementos que denunciam a origem feminina do texto. Como
demonstra Isabel Magalhães, o tratamento de determinadas temáticas pode
fornecer indícios “quanto ao sexo de quem escreve” (25). Para além de alguns
temas sociais, a crítica apresenta o exemplo sobre a guerra colonial na literatura.
De facto, tendo em conta as devidas excepções, podemos dizer que o ângulo de
observação da guerra, que relata o sofrimento individual ou colectivo, tanto dos
portugueses como dos indígenas, e que se afasta do campo de batalha própriamente dito, distancia-se de um modo geral da escrita masculina (29). Glória de
Sant’Anna não participou na guerra, mas pôde ver de perto os seus efeitos sobre
a população civil moçambicana, o que lhe permitiu partilhar a sua dor 10.
Tendo em conta estas considerações, cabe a este ponto determinar em que
medida a escrita desta poeta pode ser definida uma escrita feminina, para além
das abordagens temáticas identificadas por Magalhães. A perspectiva que
propomos adoptar é a de Anna M. Klobucka, a qual não quer traçar os elementos
identificativos de uma “‘poética feminina’ generalizada” que se pode ressentir de
“estereótipos sobre o que é feminino e masculino” (74). Klobucka faz uma
releitura crítica das poéticas do feminino que se constroem com base nas
diferentes especificidades históricas, geográficas e culturais. Assim, a diferença
sexual é reconceptualizada com base no contexto histórico-cultural. Neste
sentido, assumimos como ponto de partida que a diferença sexual pode ser uma
categoria de análise literária, ou seja, não estamos a questionar “o sexo do/a
escritor/a, mas sim o sexo da escrita, liberto da correlação estreita com o corpo de
quem a escreve, ou se deixa escrever por ela” (32).
Segundo Klobucka, as escritas de duas poetas que poderiam parecer antitéticas à primeira vista, Florbela Espanca e Sophia de Mello Breyner Andresen,
Giulia Spinuzza / Glória de Sant’Anna │ 109
respondem a contextos histórico-literários diferentes 11. De facto, a necessidade
da primeira era de afirmar a autoria e autoridade feminina do sujeito lírico no
contexto literário português 12, num “processo de emancipação feminista” (87),
enquanto que a segunda se enquadrava num processo de “desguetização da poesia
de autoria feminina” (77). Por esta e outras razões Florbela é denominada de
“poetisa” e Sophia de “poeta”. Nesse sentido, preferimos utilizar, segundo o
critério de Anna Klobucka, o nome de “poeta”, em vez de “poetisa”, para Glória
de Sant’Anna. Na sua poética, que se constrói com base numa dualidade, encena
por um lado o olhar sobre os “outros”, entre os quais se incluem as mulheres, e
por outro, desdobra o seu percurso introspectivo. Todavia, as duas vertentes
desta poética devem ser lidas de forma complementar, porque estabelecem
relações discursivas e temáticas distintas relativamente à questão do feminino.
Para aprofundar esta questão remetemos para o texto Re-inventing Orpheus: Women
and Poetry Today, em que Maria I. R. de S. Santos define algumas das tendências
da poesia de autoria feminina criadas como resposta à cultura dominante do
momento. Interessa-nos evidenciar duas das cinco mencionadas. Na primeira, as
poetas assumem uma posição neutra: “women poets discretely assume the
traditional neutral position of the Nietzschean ‘objective’ lyric poet” 13 (8) [as
poetas assumem discretamente a posição neutra tradicional do poeta lírico
‘objectivo’ de tipo nietzcheano]. E na segunda, as mulheres são porta-vozes de
poéticas do “insignificante”: “they defiantly propound an explicitly ‘minor’
poetics of ‘feminine’ insignificances and trivialities, obliquely suggesting that it is
in fact ‘major’” [propõem, de forma desafiante, poéticas explicitamente
‘menores’, feitas de insignificâncias e trivialidades ‘femininas’, sugerindo que tal
poéticas são na verdade ‘maiores’”] (9) 14. Estas duas tendências podem ser
aplicadas à produção lírica de Glória de Sant’Anna, pois representam as duas
dimensões da sua escrita: a primeira é a poesia dos “outros” e a segunda é a
poesia lírica intimista.
Na poesia desta autora sobre o “outro” a identificação sexual do texto é
apagada, na maioria dos casos, pela voz universal da poeta. Para além disso, os
sujeitos representados, homens e mulheres, não interagem entre si, mas
relacionam-se com o mundo natural à sua volta. Como é o caso, por exemplo,
do poema “Pescador velho” e de outros poemas analisados na primeira parte do
texto, nos quais há uma contiguidade natural entre os corpos dos pescadores, ou
das mulheres, e o mar, enquanto espaço existencial que os envolve. Nesses
poemas não há um diálogo entre o masculino e o feminino, mas sim entre o ser
humano e o mundo à sua volta.
Contudo, se por um lado é verdade que o texto poético, sobretudo na
poesia sobre os “outros”, não se define sexualmente há, como dissemos antes,
algumas excepções, como é o caso da poesia conexa a temáticas sociais ligadas à
questão de género, assim como à temática da guerra colonial, que podem
denunciar uma perspectiva diferente da masculina (Magalhães 29). Embora nos
casos referidos seja possível identificar a marca sexual do texto poético, não é
geralmente visível a assunção explícita da voz feminina por parte do sujeito lírico.
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Vol. 4.1 (2015)
Uma das excepções mais evidentes é representada pelo poema
“Maternidade”, no qual o “eu lírico”, numa linha temática confessional e
biográfica, relata a experiência da maternidade. Este poema representa a
convergência da poesia do eu com a poesia dos “outros”, porque cria um diálogo
poético entre o sujeito, a mulher branca, e o “outro”, a mulher negra. A aparente
alteridade anula-se através da experiência comum da maternidade. Assim, a
igualdade entre as mulheres estende-se a todo o ser humano, graças à presença
da esperança, que é utopicamente albergada nos ventres das duas mulheres. Aqui,
o texto constrói-se com base num jogo de olhares que é também um diálogo sem
palavras, no qual é partilhada intimamente a condição específica que acomuna as
duas mulheres: a experiência da maternidade. O sentido do poema, todavia,
ultrapassa a experiência circunstancial da maternidade e afirma a destruição das
fronteiras raciais, construídas pelo sistema colonial. De facto, os versos iniciais,
que apontam para uma diferença racial com base na cor da pele, numa oposição
dicotómica entre a mulher branca e a negra, são desconstruídos gradualmente
pelo que irmana as duas mulheres, a maternidade. Assim, o canto da poeta erguese como manifesto de igualdade, a partir de uma perspectiva íntima e feminina:
Olho-te: és negra
Olhas-me: sou branca
Mas sorrimos as duas
na tarde que se adeanta.
Tu sabes e eu sei:
o que ergue altivamente o meu vestido
e o que soergue a tua capulana,
é a mesma carga humana.
Quando soar a hora
determinada, crua, dolorosa
de conceder ao mundo o mistério da vida,
seremos tão iguais, tão verdadeiras,
tão míseras, tão fortes
E tão perto da morte …
que este sorriso de hoje,
na tarde que se esvai,
é o testemunho exacto
do erro das fronteiras raciais.
[…]
E ambas estamos certas
– tu, negra e eu, branca –
que é dentro dos nossos ventres
que germina a esperança. (Sant’Anna, Um Denso 15–16)
O poema testemunha a crença numa dimensão utópica, que prevê um
futuro melhor do que o presente, porque o ser que está ainda no ventre
representa a esperança do porvir. A temática deste poema, que apela a um
Giulia Spinuzza / Glória de Sant’Anna │ 111
humanitarismo universalista do ponto de vista íntimo e pessoal da mulher,
poderia encontrar pontos em comum com a nação sonhada de muitos poetas
moçambicanos que, sob o jugo colonial, alimentavam a semente da esperança
(Noa 231). O reconhecimento de uma experiência feminina partilhada e a crença
numa sociedade melhor não obliteram as efectivas diferenças entre a mulher
branca e a negra e não negam a dramática realidade colonial, porque
fundamentam o reconhecimento da igualdade existencial das duas mulheres.
Uma igualdade que vai além das diferenças coloniais e que nem por isso nega ou
oculta as diferentes condições materiais que separam a experiência de
maternidade das duas grávidas. O que interessa à poeta é afirmar uma identidade
de género que é, no fundo, uma igualdade humana, sendo que o fruto da semente
da mulher branca, assim como o da mulher negra, alimentados pela esperança
num mundo melhor, virão à luz numa sociedade diferente. Então, se a mulher
retratada no contexto patriarcal e colonial da poesia de Glória de Sant’Anna
representa ao mesmo tempo a alteridade, ela simboliza também a identidade
feminina, capaz de ultrapassar a diferenciação racial criada pelo colonialismo.
Para além disso, este poema demonstra que as duas dimensões da poética de
Glória de Sant’Anna são inseparáveis, porque a poesia dos “outros” se articula
com a poesia intimista, que se debruça pelos recantos mais íntimos do sujeito
poético.
Essa última é feita de silêncios e retenções e apresenta um universo poético
enquadrado na óptica de análise da perspectiva do género. Com efeito, vários
críticos afirmam que a escrita feminina é também a escrita do indizível ou do
impossível 15, porque, como afirma Anna Klobucka, o discurso “universal”
subentende um sujeito masculino (38). E, como nota Luciana Stegagno Picchio,
“solo chi é donna conosce il tormento di una scrittura in prima persona che,
specie nelle nostre lingue latine, obbliga a rivelare imediatamente nell’aggettivo,
nella forma participiale, il sesso di chi scrive” [só a mulher conhece a aflição de
uma escrita em primeira pessoa que, sobretudo nas nossas línguas latinas, obriga
a revelar imediatamente no adjectivo, na forma participial, o sexo de quem
escreve] (9) 16. É nesse sentido que a partir do corpus literário português de autoria
feminina, ou melhor dito, das “escritoras escrevendo(se) enquanto mulheres”
(Klobucka 41), é possível estabelecer as relações entre a sexualidade e a
textualidade em relação a um discurso canónico idealmente universal, mas
identificado na maioria das vezes como expressão masculina. Tendo em conta
estas reflexões, verificamos que a poesia de Glória de Sant’Anna problematiza a
presença de um sujeito lírico feminino que revela a sua identidade apenas em
alguns textos.
Atendendo a estas questões, consideramos que a poesia desta autora
procura alcançar a união entre o pessoal e o universal, além do paradigma do
género. Entre o infinitamente pequeno e interior e o imensamente grande e
exterior cria-se uma ligação, através da qual o “eu lírico” se dispersa no mundo à
sua volta, num tempo e espaço impossíveis de se fixar. A mulher-poeta não
emerge enquanto corpo nestes textos, mas enquanto olhar sobre o mundo. A
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Vol. 4.1 (2015)
poética do silêncio, da solidão, da noite, do indizível, que caracteriza uma parte
da poesia da autora é a que se poderia aproximar mais de uma poética do
feminino. Todavia, a solidão não é ausência do masculino, e o silêncio e a solidão
são os pressupostos necessários para compreender e integrar o universo que
envolve o sujeito poético. Atrás da palavra não dita e do indizível, oculta-se a voz
feminina, que procura alcançar o universal: “Pela noite clara /busco a palavra/
cujo limite/ seja verdade. . . . Mas a resposta/ mantem-se oculta. / A noite é
morta / e inúmera” (Sant’Anna, Um denso 61).
O poema citado faz parte dos textos de Glória de Sant’Anna mais intimistas
e existenciais que demostram a busca da harmonia entre o mundo interior e o
exterior. Em alguns dos poemas mais intimistas o sujeito poético cumpre um
percurso que o levará a um exílio existencial a partir de uma origem e de um
destino desconhecidos: “Não sei de que distância fui trazida. / Não sei por que
distância sou levada. . . . Não sei de mim, mais do que o vento sabe / a causa
porque sopra. . . . O mesmo longo fio inexplicado, / me liga ao vento, ao mar /
e à gaivota” (Livro de água 31). Assim, a identidade do sujeito poético desvinculase aos poucos da sua ligação com a terra, para se dispersar na imensidão: “Aqui
estou / como uma pétala solta / O vento me levará / ao último azul / E serei
horizonte” (Desde que o mundo 41).
À medida que o sujeito se confunde com os elementos naturais e se
desprende da sua ligação à terra, a poesia reconverte a alteridade numa partilha
humana do sentimento e da esperança. E se por um lado esse desejo de harmonia
e igualdade tem pontos em comum com a fase final da produção literária colonial
identificada por Noa, por outro, o sujeito poético não se faz porta-voz da
perspectiva hegemónica colonial, por isso a poesia de Glória de Sant’Anna não
pode ser incluída na produção literária colonial. O “outro” não é, então, um
elemento paisagístico de um mundo exótico, mas é um indivíduo que o sujeito
poético observa e retrata. E enquanto o sujeito lírico se aproxima do “outro”
evocando a partilha do “laço” humano (Sant’Anna, Poemas do tempo 39), a poesia
torna-se palco de uma relação que seria incomunicável.
Em conclusão, verificamos que a representação literária dos “outros” se
afasta dos estereótipos gerados pelo discurso colonial. Assim, a obra desta autora
oferece, no âmbito do colonialismo tardio 17, uma leitura do mundo
moçambicano que não coincide com a visão dominante. Embora os seus poemas
não condenem de forma explícita as injustiças perpetuadas pelo sistema colonial,
demonstram que, através da escrita, é possível estabelecer um diálogo silencioso
entre o mundo do sujeito poético e o mundo do “outro” e, ao mesmo tempo, é
a partir desse diálogo que se verifica a negociação identitária entre os dois
mundos. Como evidencia Cláudia Castelo a este propósito, é necessário
ultrapassar as interpretações binárias que reduzem a complexidade das situações
coloniais a uma mera oposição dicotómica: “nem os colonos nem as populações
locais podem ser encarados como membros de dois grupos raciais estanque,
distintos e diametralmente opostos em termos políticos, económicos, sociais e
culturais” (245). Nesse sentido, considerando que, em geral, a poesia de Glória
Giulia Spinuzza / Glória de Sant’Anna │ 113
de Sant’Anna não revela a identidade do sujeito lírico, a assunção da voz feminina
permite estabelecer uma ligação entre a mulher branca e a negra além das
barreiras raciais. O diálogo poético com a mulher africana testemunha, então,
que a alteridade racial pode ser ultrapassada graças à identidade de género.
Notas
1 São muito escassos os estudos dedicados a esta autora. Recentemente foi defendida na
Universidade Federal do Rio de Janeiro uma dissertação de mestrado sobre Glória de Sant’Anna
por Guilherme de Sousa Bezerra Gonçalves, sob a orientação da Professora Carmen Lucia Tindó
Ribeiro Secco.
2 A esse propósito, Ana Mafalda Leite afirma que o “Mar Imperial tinha já começado a ser
reinvestido de novas significações. . . na poesia anterior à independência, pela escrita de Campos de
Oliveira. . . e no século XX por Rui Knopfli, Alberto de Lacerda, Virgílio de Lemos, Orlando
Mendes, ou por Glória de Sant’Anna, para citar apenas alguns exemplos” (154).
3 Terreno familiar para a cultivação de uma horta. Normalmente são as mulheres a cuidarem das
próprias machambas.
4 Para um estudo da Ilha de Moçambique na poesia moçambicana consulte-se o texto de Jessica
Falconi.
5 A Literatura Colonial, que foi produzida e que circulou sobretudo entre 1930 e 1974 (Noa 20),
reproduz uma visão “do mundo do europeu enquanto valor dominante” (77). Tal perspectiva não
coincide com a que emerge da obra de Glória de Sant’Anna, apesar da poeta ter recebido em 1962
o Prémio Camilo Pessanha, no âmbito do Concurso de Literatura Colonial da Agência Geral do
Ultramar (397).
6 Young cita o estudo de Holst-Peterson e Rutherford, A Double Colonization.
7 Oficialmente as colonas deviam cumprir uma missão “civilizadora” e de aculturação dos locais.
8 Lembre-se a este propósito que, como nota Margarida Calafate Ribeiro, o papel das mulheres em
relação à guerra foi sobretudo dar “apoio” ao homem (14).
9 Note-se, por exemplo, que nas colónias vai crescendo o número de enfermeiras, parteiras e
professoras, sobretudo do ensino primário. Para aprofundar esta questão consulte-se Cláudia
Castelo.
10 Apesar de não caber aqui o estudo desses poemas, remetemos todavia para a leitura dos
numerosos poemas sobre a guerra colonial, muitos dos quais foram recolhidos sob o título de
“Cancioneiro incompleto (temas da guerra em Moçambique) 1961–1971” na antologia poética
Amaranto, publicada em 1988, que reúne a obra poética de Glória de Sant’Anna desde 1951 até 1983.
11 Klobucka acentua a identidade “mulher” da primeira, enquanto apela a segunda de “poeta antes
de mais nada” (82).
12 E reconverter a tradição literária, na qual o objeto de representação, a mulher, passa a sujeito
representante.
13 Exemplos destas tendências são, segundo a autora, Sophia de Mello Breyner Andresen e Fiama
Hasse Pais Brandão, entre outras.
14 É aqui referido o caso de Irene Lisboa.
15 Consulte-se também Lúcia Castello Branco (112).
16 A este propósito, Isabel Allegro Magalhães nota que “a matéria da língua—em particular a das
línguas latinas, no Ocidente—é toda ela sexuada” (9).
17 No caso de Moçambique o tardo-colonialismo “tem início nos anos 1950 e alcança, alegadamente,
o seu fim em 1975” (Castelo et al. 22).
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Giulia Spinuzza is a Ph.D. candidate in the Department of Romance Studies at Universidade de
Lisboa, Portugal, and is supported by Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT).