UM JUDEU NO KUWAIT - Meu passado islâmico me deixou

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UM JUDEU NO KUWAIT - Meu passado islâmico me deixou
UM JUDEU NO KUWAIT Meu passado islâmico me deixou preparado para esta chocante descoberta por Mark Halawa (traduzido por Fernando Bisker, Miami) - Publicado no Aish.com
Fui educado no Kuwait, tive sempre tudo do bom e melhor. Meu pai , proprietário de uma grande empresa
de construção civil, sempre nos deu de tudo - aulas de piano, natação, caligrafia e viagens por todo o
mundo. Mesmo sendo muçulmanos, nossa família era e ainda é laica e meu pai nos deixava distantes de
qualquer grupo religioso.
Mesmo assim fomos educados acreditando que os israelenses e os judeus são as criaturas do mais baixo
nível de existência na face da Terra e que foram colocados no mundo com o único propósito de tentar
matar a nós, os árabes. Nas aulas de matemática nossa professora apresentava o problema: " Se um
foguete mata X número de judeus, quantos foguetes seriam necessários para matar X judeus?"
Meu pai sempre foi partidário de uma ideologia anti-Israelense. Foi educado no sistema escolar sob a
visão de Nasser, que seria uma escola muçulmana, com ponto de vista secular, mas dedicada à união dos
árabes em caráter mundial. Israel, em seu parecer, era somente uma colônia americana dentro do Oriente
Médio.
Meu pai sempre apoiou a OLP, desde 1960, quando o então fundador do movimento, Yasser Arafar vivia
no Kuwait, e levantava fundos de empresários vivendo no Golfo Pérsico. Como engenheiro, meu pai
participava da união dos trabalhadores que doavam parte dos seus salários direto da fonte para a OLP.
Meu pai nos dizia que a resistência seria a única maneira de lidar com Israel.
No verão de 1990, quando eu tinha apenas 12 anos de idade, a vida da nossa família mudou para
sempre. Estávamos em férias escolares quando Saddam Hussein invadiu o Kuwait. O negócio do meu
pai, assim como de muitas outras pessoas, foi destruído. Todas as nossas economias se transformaram
em pó. Não podíamos mais retornar ao Kuwait. Fomos morar no Canadá. Meu pai conseguiu retornar ao
Kuwait para pegar alguns documentos, que depois serviriam para conseguir uma compensação financeira
do fundo das Nações Unidas.
REZANDO NO ESCURO
De toda minha família, eu fui o único que segui morando no Canadá. Meu pai nunca se adaptou ao novo
estilo de vida ocidental, e com bons contatos de negócios, foi morar na Jordânia. Toda minha família
retornou ao Oriente Médio. Um dos meus irmãos é um grande empresário na Jordânia, e dois outros
irmãos estudam no Egito, um estuda Economia e um outro, Odontologia. Minha irmã vive em Dubai, onde
trabalha no mercado financeiro.
Em uma noite de 2003, eu estava estudando na biblioteca da universidade em uma cidade que se chama
London, em Ontário, Canadá, quando vi um senhor de idade. Com trajes típicamente chassídicos, parecia
ser um judeu religioso. Tomado por repentina curiosidade, aproximei-me e perguntei: "Você é judeu?"
Com um simpático sorriso ele respondeu, para minha surpresa: "Não, mas gosto de me vestir assim."
Eu não sabia se estava brincando comigo ou não. Todos os religiosos que havia conhecido até este
momento da minha vida eram figuras muito sérias, sisudas. Pensei: "De repente os judeus teriam senso
de humor?"
Seu nome - Dr. Itzhak Block, um professor aposentado de Filosofia. Trocamos umas palavras e ele
perguntou sobre minha família. Disse que a história da minha família é muito complexa e sempre fico com
dor de cabeça quando tenho que contar. Simplesmente disse que sou um árabe do Kuwait e que minha
avó, mãe da minha mãe era judia.
Meu avós se conheceram em Jerusalém, meu avô, um árabe da Cisjordânia, servia no exército de
resistência contra os sionistas. Ele tinha 18 anos de idade, e minha avó 16. O pai da minha avó tinha uma
escola em Jerusalém, e foi lá, de onde ela ficava observando meu belo avô, que acabaram se
conhecendo, casando-se e indo morar em Nablus, na Cisjordânia.
Após meu avô ter sido liberado do exército Jordaniano, a família se mudou para o Kuwait, onde a
promessa de um futuro melhor era promissora. Essa foi a história do casamento dos meus avós.
Saber do lado judaico da minha avó sempre me deixou curioso. Sempre que ia para a Jordânia de férias,
eu assistia ao canal de TV israelense, quando meus pais não estavam por perto. A parte que mais
gostava era o hino nacional Israelense, e ficava às vezes esperando até tarde para escutá-lo, no fim da
programação.
Mas, voltando à biblioteca, aquele senhor, judeu religioso, Dr. Block, olhava para mim enquanto eu
narrava. E, finalmente ele pontuou: "Pela lei muçulmana, você é considerado muçulmano, já que a
religião vai de pai para filho, mas pela lei judaica, a religião passa pela mãe, e sendo assim, você é judeu."
Minha mente começou a trazer memórias da minha infância no Kuwait. Lembrava-me de que minha avó
tinha um nome curioso em seus documentos - Mizrahi - nunca havia conhecido nenhum árabe com esse
nome. Ela também tinha um pequeno livro de rezas, em Hebraico, com o qual ela rezava aos prantos.
Minha avó nunca mencionou nada sobre seu passado judaico - mas agora as peças começavam a se
encaixar. Eu agradeci ao Dr. Block pela conversa e corri para conversar com meu companheiro de quarto
na universidade sobre o que havia acontecido. "Então você é um Muçudeu" - disse meu amigo. Agora
quem estava mais confuso era eu.
Liguei para minha mãe e ela disse: "Não escute estes tipos de pessoas, você é muçulmano como todos
nós."
Liguei para minha avó, e começei a falar do assunto. Começei aos poucos, afinal há 50 anos minha avó já
negava sua origem. Mas perguntei: "Vó, a senhora é judia?"
Minha avó não respondeu esta pergunta de forma direta, mas começou a chorar e falar das guerras entre
árabes e israelenses. Me disse que seu irmão Zaki fora morto em Jerusalém antes de 1948. Para mim já
era o suficiente e parei a conversa por aqui.
Nos próximos meses evitei falar sobre judaísmo, para
não deixar minha mãe triste. Estava terminando a
faculdade e tinha toda minha carreira pela frente. Fiquei
contente em me considerar de uma família mista.
LÁGRIMAS
Um ano depois, estava patinando em meu bairro,
quando cai e me feri bem forte. Na pista de patinação
não havia buracos, e começei a pensar que havia sido
empurrado por "alguém lá de cima". Nunca tive nenhuma
aspiração a nada espiritual e nunca pensei em temas
que me levassem a tópicos religosos. Sempre me
preocupei com meu aspecto físico, meu corpo, centenas
de amigos, e ter uma carreira de sucesso. Então, por
que teria acontecido isso comigo? O que tive que fazer definitivamente foi tirar alguns dias de férias para
minha recuperação.
Dr.Block havia mencionado o nome de uma sinagoga, e logo Sábado de manhã, fui para lá ver o que
acontecia. Fiquei preocupado que todos lá seriam de descendência européia e eu do Oriente Médio, mas
fui mesmo assim.
Chamei um taxi que me deixou na sinagoga. A primeira pessoa que vi pela frente parecia que era da Índia.
Me deu as mãos e disse: Shabat Shalom, e me deu uma kippah (solideu). De repente vi uma pessoa
negra - não imaginara que pudessem exister negros judeus. E, de repente, avistei também o Dr.Block.
Me entregaram um livro de rezas, e estavam todos cantando "VeShamru"- olhei na tradução em Inglês.
"E os filhos de Israel devem cumprir o Shabat, para fazer o pacto para as gerações. Entre Eu e meus
filhos de Israel, porque este é o sinal de que Deus criou o céu e a terra, e no sétimo dia descansou"
Algo me impregnou de força, e inexplicavelmente sentia que já conhecia esta música. Fiquei de pé,
internalizando os sons, sentindo o aroma da sinagoga e assimilando essa bela visão do local. Parecia tudo
perfeito. Porem, isso tudo era totalmente o contrário de tudo o que havia escutado sobre os judeus e sobre
o judaísmo desde pequeno. E foi então que começei a chorar.
Após o Kidush, a reza com o vinho que marca o final da reza de manhã, eu aceitei o convite do Dr.Block
para almoçar em sua casa. Disse: "Não posso acreditar que estou aqui, cantando e rezando em
Hebraico." Antes de sairmos para sua casa, conversei com um casal de judeus de origem egípcia que me
contou um pouco de suas histórias. Judeus de diversas origens - para mim foi mais uma peça do tabuleiro
que se completava.
Dr. Block retrucou: "Não é difícil de acreditar na sua história. Todo judeu nasce com uma pequena Torah e
uma Menorah dentro de si. Me deu um leve abraço e disse: O que falta é simplesmente vir um outro judeu,
e ajudá-lo a acender sua chama."
Sonho de Paz
Meu interesse cresceu e começei a estudar Torah e cumprir Shabat. Ano passado eu passei um mês em
Israel, passeando e estudando no programa da Aish Hatorá em Jerusalém. Foi excelente "chegar em
casa".
Ainda mantenho contato com minha família e velhos amigos. São pessoas maravilhosas e eu os amo, a
todos eles. Com certeza é difícil o relacionamento em alguns níveis, já que no mundo árabe existe um
entendimento distorcido a respeito de Israel. Estou trabalhando em um projeto para educar os árabes
sobre Judeus e Judaísmo, para tentar divulgá-lo em escolas muçulmanas e para a mídia. Eu acredito que
meu passado e minha origem me tornem uma pessoa apta para realizar este projeto.
Um outro caminho que vejo é estabelecer relações econômicas mais fortes entre Israel e países árabes.
Isso poderia gerar respeito, confiança e bons resultados.
Outro assunto que estou trabalhando é a questão do Holocausto, já que muitos árabes negam sua
existência. No verão passado estive em Auschwitz e estou produzindo o primeiro documentário em Árabe
sobre o Holocausto. Eu quero explicar aos árabes, em sua própria linguagem, sobre o que aconteceu. Às
vezes, pensamos que o conflito árabe-israelense é irreversível. No entanto, eu acredito que ainda existe a
possibilidade de mudar. Atualmente os árabes tem mais acesso à educação formal, universal, o que os
transforma em pessoas mais abertas e curiosas. Além de encontrar com israelenses e judeus em suas
viagens pelo mundo, e ter informações via internet, o que pode ser usado para alcançar a paz. Um outro
assunto que chama a atenção é a assimilação em Israel. Meus primos judeus, por exemplo, vivem como
muçulmanos no Oriente Médio. Infelizmente a história de minha avó não é tão rara como se pensa.
Muitas jovens judias são procuradas por jovens árabes. E, como minha avó, acabam casando-se e indo
morar em suas vilas. Os filhos e netos terminam por não saber da verdade, principalmente pela tensão
política e pressão familiar. Como resultado, o povo judeu perde parte de seu próprio povo. Minha mãe tem
cinco irmãs, e tenho algumas dezenas de primos, todos judeus - e todos vivendo como muçulmanos no
Oriente Médio. Há pouco tempo me encontrei com um israelense de sétima geração, cuja prima casou-se
com um palestino e foi morar na Arábia Saudita. Seus descendentes são judeus, vivendo como
muçulmanos na Arábia Saudita. Todos os meus parentes sabem que pratico o judaísmo e a maioria deles
aceitam. Eu posso falar com eles sobre judaísmo e eles se mostram interessados, politicamente corretos.
Nos amamos e nos respeitamos. Meu pai não aceita muito, devido ao seu passado, seu estilo de vida
muçulmano laico, e a memória das guerras contra Israel, que são os pilares de sua vida. Quando comecei
a me interessar pelo Judaísmo, não contei ao meu pai imediatamente. Um dia, estávamos tendo uma
discussão política, e eu mencionei que apoio o Estado de Israel. Minha fala causou uma grande polêmica,
e aprendi a tratar deste assunto com meu pai somente de forma indireta. Sempre quando eu "passo dos
limites" na discussão ele fica muito nervoso e me chama de Sionista. Uma outra excessão, por incrível que
pareça, é minha avó. Eu sempre pergunto sobre sua família e seu passado e ela se recusa a falar. Espero
algum dia encontrar alguma abertura para conversar a respeito. Fui cresendo tendo acreditado que os
judeus são as fontes do mal no mundo, descendentes dos macacos e porcos. Mas em contra-partida,
acostumei-me a ver em segredo minha avó com seu pequeno livro de rezas em Hebraico, rezando com
grande devoção. Ela me deu uma alma judia, e, mesmo que involuntariamente, deixou acesa a chama do
meu judaísmo.
Visite o Blog do Mark: www.markhalawa.com E neste link (no final da
página) http://www.aish.com/sp/so/70138567.html poderá escutar sua história - Inglês -