Production Systems in Wetlands

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Production Systems in Wetlands
Production Systems in Wetlands
M.R. Marques, M. Vilanculos, J. Mafalacusser
Instituto de Investigação Agrária de Moçambique (IIAM)
December 2006
Projecto de Maneio de Risco, Mitigação dos Efeitos
da Seca, e de Melhoramento do Uso de Água na
Produção Agrícola na Bacia do Limpopo
(IIAM/UEM-FAEF/WATERNET – CP17)
SISTEMAS DE PRODUÇÃO E USO DE TERRA DA REGIÃO DO BAIXO LIMPOPO –
DISTRITO DE XAI-XAI
Por:
M. R. Marques, M. Vilanculos, e J. Mafalacusser
IIAM/DARN
Maputo, 2006
Instituto de Investigação Agrária de Moçambique, Direcção de Agronomia e
Recursos Naturais (IIAM-DARN)
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SISTEMAS DE PRODUÇÃO DOMINANTES
O Distrito de Xai-Xai é um distrito essencialmente agrícola com a maior parte das
famílias envolvidas em actividades de agricultura. Possui, a seguir ao regadio do Chókwè
(25,000 ha), um dos regadios mais importantes da província, todos situados na Região do
Baixo Limpopo, nas zonas de Magula, Chimbonhanine, e Ponela (regadio moderno,
sendo praticada principalmente a rega por gravidade), nos solos aluvionares da planície
do Rio Limpopo, e talvez com maior expressão e importância actual, a zona de regadio
tradicional, que se pratica nas áreas de drenagem ao longo das encostas marginais do
planalto arenoso, nos solos orgânicos hidromórficos, machongos.
Os machongos recebem água de infiltração lateral dos aquíferos das dunas arenosas,
mantendo um elevado lençol freático na estação húmida, que justifica a drenagem
superficial para a utilização agrícola. Em geral e nos dois casos a produtividade é muito
baixa devido a factores vários. Um dos principais factores que concorre para tão baixa
produtividade e rendimentos agrícolas reduzidos, deve-se às tecnologias menos
adequadas de produção agrícola, muitas vezes dependentes das condições climatéricas
em detrimento das facilidades e infra-estrutura de rega existente, não permitindo explorar
o potencial existente na região.
Ambas as zonas, de regadio moderno (perto de 3.000 ha) e tradicional (cerca de 5.000
ha), perfazem cerca de 7.000 ha, dos quais e no caso dos machongos apenas 5% são
utilizados, percentagem bastante baixa e que é devida ao deficiente funcionamento da
rede de drenagem, permanecendo grande parte dos solos inundados. No caso das áreas do
regadio moderno, os diferentes blocos de regadio encontram-se abandonados uma vez a
infraestrutura de rega destruída, quer por falta de manutenção no passado, quer devido ao
efeito das últimas cheias de 2000 do Rio Limpopo. As terras pertencentes a estes blocos
de rega estão na sua maioria a ser utilizadas na produção agrícola de sequeiro e como
pastagens naturais.
1.1
REGADIO MODERNO
Nos blocos correspondentes às áreas irrigadas no vale e hoje abandonadas em termos de
regadio, têm actualmente uma utilização muito limitada apesar da sua elevada aptidão
agrícola, e um baixo aproveitamento dos recursos de terra, condicionados à destruição
das infra-estruturas de rega e drenagem. Nas áreas ocupadas pelo perímetro irrigado, e
hoje produzindo principlamente sob condições de sequeiro, segundo o estudo apresentado
pelo consórcio acp/BKS/Impacto (2003) e INIA (1995, 1994), dominam agricultores
pequenos e médios, que recorrem ao uso de tracção animal e tractores para a lavoura e
preparação do solo, ocupando áreas entre < 1 ha e > 20 ha (2,34 ha em média).
Cerca de 45% das famílias agricultoras possuem áreas de rega compreendidas entre 0.1
0.5 ha, com apenas 1% das famílias a trabalhar áreas > 10 ha.
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E USO DE TERRA
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De acordo com aqueles estudos, as parcelas encontram-se muito fragmentadas, sendo
possível encontrar famílias com mais de cinco parcelas de terra, embora a média para a
área de estudo seja de quatro.
1.1.1 Agricultura
As principais culturas praticadas no vale são o arroz, milho, milho x feijão, milho x
abóbora, hortícolas, melancia, cana de açúcar, bananeiras, e algodão. De entre os feijões
no vale importa referir que se produzem diferentes espécies, i.e. feijão nhemba, feijão
cutelinho, feijão manteiga, embora no passado também se produzisse a ervilha, trigo e
algodão com maior expressão que actualmente.
Podem ser diferenciadas duas estações ou épocas agrícolas distintas, correspondendo ao
período quente e chuvoso, onde a produção de milho de sequeiro é a principal cultura,
cultivado quase em exclusivo, apenas com algumas plantas de abóbora. O milho de 1ª
época é colhido entre Fevereiro e Maio dependendo da data de sementeira. Os
rendimentos no vale variam de 900 a 1000 kg/ha.
Poucas são as áreas no vale onde actualmente se cultiva o arroz, normalmente produzido
sob condições de rega, embora no passado e com o regadio a funcionar em pleno,
assumisse destaque uma vez na 1ª época ser a única cultura possível nas condições de
inundação das parcelas. O milho pode ainda ser produzido ao longo da época fresca mas
consociado com o feijão manteiga, sendo colhido em dois períodos diferentes, ainda
fresco como maçaroca e seco para grão. As sementeiras nesta época são feitas a partir de
Abril, sendo a sua maturação mais lenta, e os rendimentos mais altos. O milho é colhido
entre Agosto e Setembro, dependendo do número múltiplo de sementeiras feita. Por
exemplo, sempre que presentes as chuvas de inverno nos meses de Maio, Junho e Julho,
permite a colheita de três culturas de milho entre Agosto e Outubro.
As hortícolas (época fria) são produzidas por um menor número de agricultores, sendo o
alho, cebola e tomate aquelas com maior importância. A batata doce é cultivada nas duas
épocas como cultivo puro.
O algodão foi uma cultura que chegou a ter uma importância considerável no distrito,
quer a nível dos agricultores comerciais que aí operavam, quer a nível dos pequenos
agricultores e camponeses. Estes normalmente produziam algodão em consociação com
milho, com baixa densidade. Trigo e batata reno são culturas que no passado também
foram produzidas por grande parte dos agricultores comerciais.
A preparação dos solos no vale é problemática, sendo praticamente impossível a lavoura
manual devido à forte estrutura e textura do solo superficial. A maioria dos agricultores
recorre ao uso de juntas de bois (tracção animal) na preparação do solo, e aqueles com
mais posses recorrem ao aluguer de tractores para as lavouras e gradagens.
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A preparação das terras é feita de preferência antes do início da estação das chuvas, e
muito antes das datas de sementeira devido à grande limitação imposta pelos solos, i.e.
consistência quando húmido (pegajosidade e plasticidade), que reduz o acesso e a
facilidade de lavoura, para além da circulação do equipamento agrícola e respectivas
alfaias.
Foto 2: Parcela
principal cultura.
com
milho,
a
Foto 1: Recurso à tracção animal nas
lavouras.
Nas condições de humidade residual nos solos argilosos do vale, uma junta de bois
normalmente precisa de 4 a 5 dias para a preparação de 1 ha de terra. Houve casos de
camponeses que recorreram ao reforço de juntas para poder vencer a compacidade e
dureza dos torrões e blocos de solo superficial, quando uma situação de solo mais seco e
duro.
Como norma e nas terras do vale não têm sido observadas rotações de culturas nem de
parcelas para reposição da fertilidade do solo e redução do ataque de pragas e doenças,
sendo as parcelas cultivadas continuamente, duas vezes ao ano (1ª e 2ª épocas agrícolas).
A falta de práticas adequadas de maneio agronómico localmente são talvez das principais
causas de incidência de algumas das pragas que afectam as culturas do milho, do arroz,
da mandioca e do feijão.
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Fora da influência do regadio encontram-se extensas áreas de pastagens e uma agricultura
muito afectada pela reduzida e variável precipitação característica da região. As
principais culturas nessas zonas de sequeiro são o milho, mandioca, feijão nhemba e a
batata doce.
No geral podemos afirmar que estamos perante um sistema de Agricultura de baixa a
média intensidade de uso de factores e, a mais das vezes, com pecuária, considerando os
casos dos camponeses, e dos pequenos e médios agricultores respectivamente.
▫



Sistemas de Sequeiro
Culturas de sequeiro de baixa 
exportação/produtividade;
Pastagens
(naturais
ou 
melhoradas);
▫
Sistemas de Regadio
Monocultura de Arroz nos solos
mais pesados e mal drenados;
Policultura de plantas de ciclo curto a
médio, incluindo cereais e hortícolas.
Agro-silvicultura (espécies indígenas
ou exóticas), regeneração natural ou
plantadas.
Outras variáveis que ajudam a melhor compreender as diferenças patenteadas entre estes
diferentes tipos de agricultores, são:
-
-
-
o acesso à terra determina as áreas exploráveis por uma unidade de produção
familiar e, por conseguinte, a produção e o rendimento disponível da família. É,
pois, um critério de diferenciação muito poderoso e actuante em todos os
contextos. O regime de cedência da terra, assegurado por via administrativa no
regadio e por via do direito fundiário tradicional no sequeiro, é portador de alguma
insegurança e precariedade e reflecte-se, naturalmente, nas estratégias de
investimento dos agricultores. Esta precariedade fundiária apresenta várias
consequências no plano produtivo e de conservação da fertilidade do solo, ligadas
ao facto de não sustentar e/ou promover uma visão, uma lógica e uma dinâmica de
médio e longo prazo;
o acesso à água é outro importante factor de diferenciação entre os agricultores.
As explorações situadas na proximidade das valas e colectores gozam,
naturalmente, de uma vantagem comparativa no que concerne à água, dado que as
restantes áreas não têm como ser abastecidas uma vez o sistema destruído. Para as
terras que dispõem deste acesso seguro à água, que representam ainda hoje uma
parte insignificante dos agricultores é fundamental dispor de motobombas. A posse
desse equipamento e a disponibilidade para comprar o gasóleo, determinam a
capacidade do agricultor para valorizar e tirar o melhor partido das suas terras,
acedendo à prática das culturas mais rentáveis (hortícolas);
o acesso aos meios de produção é talvez o factor mais potente para a explicação
das diferenças observadas entre os agricultores. Com efeito, num sistema onde o
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-
-
principal meio de acumulação de riqueza no médio-longo prazo (a terra) está
ausente, as estratégias dos agricultores viraram-se para a aquisição dos factores de
produção chave: o gado e alfaias agrícolas para a preparação das terras e transporte
de bens e mercadorias;
a capacidade de mobilização da força de trabalho está, também, na base da
diferenciação dos agricultores. Uma família não detém uma capacidade de trabalho
(humano e animal) que lhe permita, regra geral trabalhar mais do que 3 a 4
hectares. Embora se possam registar casos de trocas de trabalho entre famílias, elas
não são usuais, donde áreas mais extensas só podem ser trabalhadas com recurso à
contratação de força de trabalho exterior o que requer grandes disponibilidades
monetárias, apenas detidas pelos agricultores empresariais com acesso ao crédito;
a utilização de fertilizantes e pesticidas está muito dependente da possibilidade de
regar (porque é este o principal factor limitante da produtividade potencial). Com
água, fertilizantes e pesticidas os ganhos de produtividade são apreciáveis, o que
permite constituir um fundo de caixa e iniciar um processo de acumulação;
o acesso ao crédito assume-se como fundamental para quebrar o ciclo vicioso da
pobreza (limitados recursos => baixa produção => baixo rendimento) sendo que,
no contexto presente, representa um forte travão à expansão e melhoria do
aproveitamento do elevado potencial agrícola da zona.
Segundo o estudo de diagnóstico recentemente realizado pelo INIA (em preparação), os
principais desastres naturais que afectam as comunidades neste distrito são, por ordem de
prioridade, as secas, as pragas e doenças das culturas, principalmente dos produtos
armazenados, e as cheias. Quando comparados os impactos das secas e cheias, é consenso
entre as comunidades que as secas, porque mais duradouras, têm um impacto negativo de
maior dimensão do que as cheias. As pragas e doenças das culturas e produtos
armazenados, estão sempre presentes, quer em períodos de seca, quer em períodos de
cheias.
1.1.2 Pecuária
O gado é uma componente importante do sistema de produção agrário do distrito. É
usado como tracção animal para a preparação do solo, no transporte de pessoas e
mercadorias, na produção de leite de subsistência (pouco), produção de carne (não muito
importante para o sector familiar), como reserva de capital para os anos difíceis e como
estatuto social da família. A produção pecuária constitui um tipo de uso de terra
importante e o mais apropriado para as extensas planícies que ocupam a paisagem do vale
e sazonalmente inundáveis, e actualmente salgadas.
Os sistemas pecuários extensivos, que ocupam actualmente uma área estimada da ordem
dos 6.000 mil ha, baseiam-se na exploração bovina e caprina (muito raras vezes ovina) da
pastagem natural, composta, essencialmente, por espécies de Setaria, Panicum,
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Urochloa, Echinocloa, Temeda, Chloris, etc, componentes que ocorrem nos blocos de
terras do regadio, e aqueles tradicionalmente considerados como pastagens.
O período de crescimento activo das gramíneas inicia-se com a ocorrência das primeiras
chuvas (por volta de Setembro-Outubro) e estende-se até à instalação do stress hídrico
acentuado (o teor de água no solo atinge o coeficiente de emurchecimento por volta de
Março). Num ano médio o período de crescimento das gramíneas é de cerca de 5 meses,
podendo atingir-se produções da ordem das 3 t de matéria seca por hectare. Todavia,
trata-se de erva de baixa qualidade, dada a composição florística, cujo conteúdo proteico
se situa à volta dos 400 g/kg.
A melhoria da pastagem pode propiciar uma melhoria do valor forrageiro da pastagem
para um valor da ordem dos 800 g/kg, adoptadas as praticas de maneio mais adequadas.
Foto 3: Sistema de produção pecuário extensivo, na zona do
independentemente se nos blocos de rega, sequeiro ou pastagens naturais.
vale,
O sistema tradicional e familiar é baseado na exploração da pastagem natural com
animais de raças locais. O pastoreio é contínuo havendo, todavia, o cuidado de deixar
para últimas as pastagens das zonas mais frescas e maior humidade residual. O maneio
sanitário limita-se praticamente ao controlo da carraça e ao cumprimento dos programas
de vacinações obrigatórias e gratuitas.
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Uma das particularidades que caracteriza o criador do sector familiar é que este não
possui área de pastagem própria, pelo que utiliza as áreas de pastagem comunal, para
alimentar o seu gado. O tempo de permanência dos animais na pastagem é reduzido ao
período diurno, devido ao risco dos roubos de animais. Normalmente o pastoreio dos
animais é feito por crianças em manadas com animais pertencentes a vários criadores.
Uma importante restrição do sistema, tem a ver com a falta de pontos de abeberamento
do gado. Em algumas zonas, o gado é obrigado a deslocar-se a grandes distâncias na
busca de água, recorrendo às valas de drenagem e colectores, com o risco de degradação
e destruição de tais infra-estruturas e de eventual perda de animais.
Considerando que as necessidades médias anuais de Matéria Seca (MS) de uma cabeça
normal de bovino (animal com 250 kg de peso vivo) são de 3% do seu peso vivo – 7.5
kgMS/ano, é possível projectar um significativo aumento dos efectivos animais e calcular
a capacidade de carga animal da área de estudo, principalmente dos blocos destinados ao
pastoreio dos animais, de forma a normar e ordenar o espaço do regadio e garantir a sua
sustentabilidade.
A alimentação do gado não oferece problemas de maior no período de Novembro a Maio,
visto estamos na época normal de rebentação das numerosas gramíneas que constituem as
pastagens naturais do Limpopo.
Na época seca, de Maio a Novembro, os problemas agravam-se, pelo que seria
interessante dispor de uma forrageira dessa época. A experimentação de várias espécies
de época fresca - luzerna, azevém, trevos, tremoço, serradela, ervilhaca, latyrus, fenacho,
bersim, beterraba forrageira, nabo forrageiro e soja forrageira (levada a cabo por: Falcão,
A. H. S.,1957. A Experimentação no Posto de Culturas Regadas do Vale do Limpopo.
Serviços de Agricultura de Moçambique. Ministério do Ultramar. Junta de Investigação
do Ultramar. Lisboa).- identificou a luzerna semeada em Abril como a melhor alternativa.
A sementeira deve ocorrer cedo, porque a luzerna tem um crescimento inicial muito lento
e é importante que tenha tempo para se desenvolver antes do rebentamento das gramíneas
em Novembro (1ªs chuvas). O luzernal deve ser explorado em regime de cortes múltiplos
durante 3 a 4 anos. Outras espécies que revelam algum potencial são o nabo forrageiro e
o bersim (sementeiras em Março ou Abril).
Outra estratégia possível será a de produzir fenos e guardá-los para a altura de maiores
carências. A soja forrageira, semeada em Novembro-Dezembro-Janeiro e cortada e
fenada cerca de 4 meses depois, na fase de floração, também parece ser uma boa
alternativa forrageira a estudar. Por outro lado, se for reservada uma área para a produção
de luzerna (feno) no regadio, poder-se-ia considerar o estabelecimento de unidades de
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engorda na periferia do mesmo e/ou, mesmo, um núcleo limitado de vacas leiteiras
poderia desenvolver-se.
Considerando a biomassa produzida durante a estação das chuvas nos blocos de rega e de
pastagem actualmente subaproveitados e acredita-se, na estação seca, que venham a ser
queimados devido à práticas de fogos, uma estratégia para sua conservação e utilização
no período de maior carência, proceder-se ao seu corte e enfardamento.
O papel do gado bovino na economia rural do sector familiar, visa atingir os seguintes
objectivos:
força de tracção animal, com vista ao aumento da produção agrícola através do
aumento da área cultivada/família/ano, com a vantagem de reduzir o tempo que
seria despendido com a lavoura manual;
conferir ao seu proprietário segurança e prestígio social, tendo em conta a
utilização dos bovinos no pagamento do dote e na realização de cerimónias
familiares;
funcionar como reserva de capital, facilmente convertível em receitas para
pagamento de despesas inesperadas e investimento (estudos dos filhos, aumento
do efectivo de fêmeas, sobrevivência do agregado familiar em períodos difíceis).
Ao contrário do que sucede com os bovinos os caprinos são criados primariamente com a
finalidade de venda para a obtenção de receitas, mas também são abatidos com uma certa
frequência para o consumo familiar.
1.2
REGADIO TRADICIONAL – MACHONGOS
O seu desenvolvimento e aproveitamento data de princípios de 1950, quando se iniciou o
processo de reclamação e resgate dos machongos com vista à valorização do enorme
potencial de solo através do mínimo dispêndio de recursos financeiros. Para o efeito
foram construídas importantes redes de drenagem, verdadeiras obras de engenharia, com
vista ao parcelamento dos machongos e sua utilização agrícola pelas famílias
camponesas, tendo o primeiro sistema de drenagem e consequente parcelamento, sido
feito no actual bloco de Inhamissa. De acordo com a informação do passado (Monteiro,
1957), nos machongos havia princípios básicos de exploração, correspondendo aos
cultivos e respectivas normas de maneio, com destaque para a produção de cereais, i.e.
culturas de arroz, milho e trigo, hortícolas e feijões.
Aliás, o parcelamento nos machongos considerava uma área média de 1 ha por família
camponesa, obedecendo a um calendário agrícola programado para quatro anos, que
incluía a produção de cereais nas duas épocas agrícolas, sempre com o arroz a dominar a
1ª época (Novembro a Abril), e as culturas de milho, feijão, hortícolas e outras
leguminosas para pousio, sideração, no esquema de rotação das parcelas de produção.
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Anualmente a bananeira e cana de açúcar são culturas que são plantadas na perifieria e
bordaduras das parcelas e das valas de drenagem. Actualmente o sistema de produção de
culturas dominante mantém o arroz como a principal cultura de 1ª época, com milho e
feijão como culturas de 2ª época, complementadas pelo grupo das hortícolas.
Foto 4: Campo com cultura de milho
Outra cultura alimentar que merece destaque é a batata doce, plantada não só como
cultura pura mas também ao longo das bordaduras das parcelas de produção e das valas
de drenagem. Bananeiras e cana de açúcar com maior protagonismo pois devido às más
condições de drenagem algumas parcelas hoje estão ocupadas por estas culturas em
termos permanentes.
Nos machongos os solos turfosos recebem naturalmente escoamento de água lateral
proveniente dos aquíferos das dunas arenosas da serra.
Foto 5: Campo de hortícolas
A água deste escoamento é de
boa qualidade, e os caudais
suficientes para manterem a
humidade disponível para o
aproveitamento agrícola, desde
conjugadas com uma boa
gestão da drenagem
O nível do lençol freático
elevado e quase à superfície
proporciona nos solos turfosos
de alta permeabilidade um tipo
de rega sub-superficial ao
longo de todo o ano.
Enquanto na época das chuvas a drenagem deverá ser considerada como fundamental
para proporcionar uma boa colheita de arroz, na 2ª época será quase que por obrigação
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necessário recorrer à obstrução das valas terciárias para poder manter à superfície o nível
de água, sob risco de iniciar por oxidação a mineralização da turfa e outro material
orgânico, elemento essencial na estrutura do solo.
Dadas as características do machongo, inundado ou mal drenado durante grande parte do
ano, para manter algumas das suas propriedades únicas, quase que só pode ser cultivado o
arroz. Nas partes mais elevadas e melhor drenadas dos campos de arroz, é normal ver
plantas de madumbe (Colocásia sp.) plantadas, e ainda núcleos de plantas de batata doce
dispersos, conforme ilustrado na fotos a seguir. O arroz e batata doce são as culturas que
dominam as parcelas durante o período quente e chuvoso.
A preparação dos solos é feita entre Setembro e Novembro antes das grandes chuvas ,
que inundando os terrenos, inviabilizam a preparação do solo para a sementeira. Durante
os meses de Janeiro e Fevereiro procede-se à monda dos campos de arroz e o transplante
das jovens plantas. O arroz deverá ser semeado antes do final de Fevereiro e
transplantado antes do final de Março porque as variedades são sensíveis ao
fotoperiodismo, ocorrendo a sua maturação em Junho e colheita em Julho. Após a
colheita do arroz é plantado o milho de 2ª época, nos meses de Julho e Agosto, embora
seja possível a sementeira de milho em Abril/Maio, no início da época fresca.
Foto 6: Batata doce e bananeiras como culturas
de bordadura, e batata doce e arroz em
consociação
A preparação dos solos no machongo é limitada
pelo grau de encharcamento e inundação, reduzindo
o período de tempo útil para tal prática, muitas
vezes condicionado pela velocidade de regeneração do caniço e outras infestantes de
difícil controle.
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Para a sementeira do arroz normalmente exige uma lavoura manual relativamente
profunda com enxadas de cabo comprido. Nos machongos não é possível o uso de
tracção animal e muito menos de tractores e alfaias agrícolas devido às características dos
solos.
Os agricultores praticamente que não usam qualquer outro insumo para além de
sementes, a maioria de variedades locais. A longo prazo nos machongos e na ausência de
normas e práticas agronómicas que concorrem para o uso sustentável dos solos, poderá
resultar no declínio gradual da fertilidade natural do solo, de forma a restituir as enormes
reservas de nitrogénio utilizado pelas culturas e vegetação, para além de outros macronutrientes como fósforo, potássio, cálcio e magnésio que eventualmente associados à
mineralização da matéria orgânica poderão aparecer de forma mais limitada para as
plantas.
Tal prática deve-se à aparente elevada fertilidade natural dos solos orgânicos que não
constitui preocupação imediata ao nível do agricultor.
Foto 7: Preparação do solo no Machongo recorrendo à enxada de cabo comprido e
ao trabalho manual.
Alerta-se ainda para o grande risco que é a prática da queimada que poder resultar na
cobustão do próprio solo e a perda completa do machongo, sendo tal recomendado
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localmente e quando os resíduos de plantas e culturas são amontoados, e na presença do
solo no estado húmido.
Quadro 1: Calendário dos sistemas de cultivo nos Machongos
Culturas
Milho
Arroz
Batata doce
Hortícolas
F. manteiga
Ser
==
Out
=<0
0
0
0
0
Nov
0
///
///
Dez
Jan
Fev
Mar
///
///
X
X
///
==
X
///
==
==
X
///
Abr
X
A
0
X
X
Mai
X
A
0
X
==
Jun
==
0
///
0
==
Jul
==
0
X
0
0
Ago
X
==
0
/// Prep Terras; X Plantar Semear; == Sachar Mondar; 0 Colheita; <0 Colher precoce;
A Guarda pássaros
Em termos de acesso à terra, e de acordo com estudos anteriores, a área média por
agricultor varia entre blocos de 0,25 ha a 5,0 ha, mas sendo o valor médio de 1,1 ha a
área por agricultor, o que não é muito diferente do tamanho das parcelas aquando do
parcelamento original.
A maioria das famílias (cerca de 50%) com acesso aos machongos possui parcelas entre
0,25 a 1 ha, e as restantes 50% das famílias possui parcelas entre 1 e 5 ha. A exploração
destas parcelas é na sua maioria feita pelo sector familiar e por um número reduzido de
agricultores privados.
Foto 8: O sistema de
produção
agrícola
familiar é o que mais
se
adequa
às
características
do
solo.
O machongo, apesar
das suas possibilidades
de
produção
de
espécies forrageiras,
não é utilizado na
pastagem
por
constituir um risco
muito
grande
de
afundamento
dos
animais, e para não
constituir
conflito
entre animais e cultivos, dada a dimensão reduzida das parcelas e ausência de quaisquer
medidas de protecção das áreas de produção contra a invasão dos animais.
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Ainda no que respeita à utilização dos machongos, e porque tradicionalmente essas áreas
são cobertas de caniço, há verdadeiras reservas de qualidade óptima para os diferentes
fins e aplicação (principalmente na construção), constituindo ao nível local importante
fonte de rendimento para as famílias camponesas, com parcelas completamente
dominadas por este tipo de vegetação natural, a conservar em termos futuros, por ser um
tipo de utilização de terra alternativo à agricultura nas zonas mais marginais.
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