e outras coisas mais…
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e outras coisas mais…
entrevista Fábio Zaganin Blues, rock e outras coisas mais… Com um currículo recheado de trabalhos ligados aos dois gêneros, Fábio Zaganin não se furta a abandonar rótulos em prol da técnica e do profissionalismo DIVULGAÇÃO Por Marcos Reis Fábio Zaganin é uma referência importante quando se fala em contrabaixo no blues nacional. O instrumentista paulista tem em seu currículo uma extensa lista de trabalhos com artistas brasileiros e estrangeiros ligados ao gênero, mais notadamente o guitarrista André Christovam, com quem toca há anos. Suas raízes, entretanto, estão mais profundamente ligadas ao rock: dos discos de Led Zeppelin e Black Sabbath que tirava de ouvido no início da carreira a trabalhos com Junk, Anjos da Noite e outros grupos, o ritmo sempre se fez presente. Não por acaso, será predominante no primeiro disco-solo do baixista, composto apenas por temas instrumentais, que está previsto para ir às lojas em breve. Além deste projeto, Zaganin projeta para os próximos meses o lançamento do CD de estréia da banda Motto, que montou com Edu Gomes (guitarra) e Mário Fabre (bateria). Recentemente, ele também participou de gravações junto a Christovam, o guitarrista Sérgio Buss, o violonista Marcos Davi e o gaitista Bruce Ewan, dentre outros músicos de vários estilos, mostrando não estar limitado às fronteiras do rock e do blues. Outros planos ainda estão em vista: trabalhos 22 Cover Baixo com os baixistas Cláudio Machado e Renato Muniz, um e-book e a continuidade das atividades como professor da escola EM&T, em São Paulo, e colunista da Cover Baixo. Como foi sua iniciação no mundo da música? No início, pensei que o meu instrumento era a bateria. Ouvia o grave nas músicas e ficava entusiasmado. Com o tempo, notei que este timbre mudava de altura. A partir deste momento, descobri o contrabaixo e fiquei obcecado. Meu pai comprou meu primeiro baixo. Foi inesquecível. Passei a estudar sozinho, tirando músicas de antigos LPs de rock e tentando fazer minhas composições. Tentei me informar ao máximo, assistindo a shows e fazendo pesquisas. Anos após começar a tocar, tive a honra de estudar harmonia funcional e rearmonização com o maestro Cláudio Ferreira Leal. E a partir de que momento você começou a trabalhar com bandas? Em trabalhos desta natureza, qual é a postura ideal para um instrumentista? Iniciei tocando covers de Led Zeppelin, Black Sabbath e outros artistas com meu primo. Em seguida, montei minha primeira banda, Annubis, com amigos da vizinhança e da escola. Um deles era o tecladista Fábio Ribeiro (n.e.: ex-Angra e CARLOS CECCONELLO Fábio Zaganin vai lançar neste ano seu primeiro CD-solo, composto por temas instrumentais de rock Cover Baixo 23 entrevista Fábio Zaganin Shaaman, atualmente trabalhando com o vocalista Andre Matos). Este trabalho foi muito importante para fazer experimentações e pesquisas sonoras. Depois, estive em muitos outros grupos e projetos, seja de canções próprias ou de covers. Creio que a postura ideal de um músico em uma banda é, primeiramente, tocar com amigos. Em segundo, respeitar as limitações e incentivar as virtudes suas e de seus companheiros. Quando você começou a atuar como sideman? Bem, todo mundo sabe que é muito difícil sobreviver tocando apenas composições próprias. Então, senti necessidade de trabalhar para outros artistas e receber por esta atividade. De cara, notei que não ser viria para acompanhar alguém de quem não gostasse do estilo ou da ideologia. Fui convidado para fazer uma audição com o bluesman André Christovam e passei. Desde então, comecei a acompanhar outros músicos, como Lancaster, Flávio Guimarães, Hubert Sumlin, Mark Ford, Bruce Ewan e as cantoras Clara Ghimel e Mônica Tomasi. Em sua opinião, o que é mais importante para um músico se dar bem como sideman? Muitas pessoas não notam que ser profissional está na atitude, não no diploma de uma faculdade. Alguns fatores são essenciais, como ser pontual, educado, seguro, estar com o equipamento em dia, estudar e, acima de tudo, fazer a manutenção de todos estes itens. O sideman traduz em seu instrumento o que o artista gostaria de fazer. É preciso saber que todo músico quer divulgar e mostrar seu trabalho, mas deve respeitar a função por que foi contratado. Outro ponto importante é saber como exigir seus direitos no que diz respeito a contratos e cachês. E como será seu primeiro discosolo? Vai ter influências de quais ritmos? Como será o repertório? Vai ser um CD instrumental com base no rock, minha principal inspiração, mas tanto a sonoridade como as composições têm influências de vários gêneros e técnicas. O disco está sendo gravado inteiramente no formato básico 24 Cover Baixo de power trio: baixo, bateria e guitarra. Pelo que você observa de seus alunos, a técnica anda sendo priorizada em detrimento do sentimento e da espontaneidade? Qual é o grau de importância que deve ser dado aos estudos e à prática com bandas e audição de discos? Sem dúvida alguma, há a troca equivocada da qualidade pela quantidade. Acima de tudo, no quesito técnica. Vejo que alguns baixistas se matam de estudar e não conseguem executar um groove inteligente e seguro. Equivocadamente, as pessoas não escutam mais música, e sim competem em busca de se transformar em virtuoses. Acho primordial tocar com o máximo de gente possível. Só assim se aprende que, em uma conversa, não é só você quem fala. Tem de aprender a ouvir! O que um baixista mais precisa aprender para tocar bem blues e rock? Como em todos os estilos, é fundamental ter ótima formação em estudos como harmonia, técnica, rítmica e groove. Quem pesquisa as linguagens destes gêneros ao longo de sua história consegue tocar de forma coerente. Também é necessário conhecer as diversas vertentes e subdivisões de cada estilo. Respeite o seu gosto, pois tocar o que não aprecia não traz nenhum benefício. E, para finalizar, a história mostra que os estilos se influenciam e sofrem diversas mutações. Por fim, com quais equipamentos você costuma tocar? Utilizo dois baixos N.Zaganin Fábio Zaganin Amanaîé Model, construídos de acordo com todas as minhas exigências. Os instrumentos estão equipados com captadores humbuckers Cabrera modelo FZ. Uso encordoamento Ernie Ball customizado de medidas .050, .070, .090 e .110 para baixos de quatro cordas e 0.32 e .130 adicionais para cinco e seis cordas, além do set Slinky Bass. Trabalho com os efeitos da Zoom: atualmente, tenho em meu set de shows as pedaleiras B2.1u., 3000B e RP01. Nas aulas, gosto da Zoom 708 II EFX. Estou desenvolvendo junto a uma marca um novo tipo de amplificador valvulado, que deve estar em breve no mercado. master class blues & rock Aproveitando a excelência de Fabio Zaganin como professor e músico de rock e blues, pedimos a ele que ministrasse uma pequena aula aos leitores da Cover Baixo. Gentilmente, o baixista não apenas aceitou a idéia de imediato como disponibilizou uma master class exclusiva para a revista, abordando as técnicas de slap e tapping. Aproveite! Estudo 1: “Slap the Blues” “Slap the Blues” está dividido em dois trechos: A e B. No início, a par te A é repetida duas vezes no tom de Bb por meio da cadência I-IV-V. Em seguida, há uma modulação na par te B para o tom de E, executada apenas uma vez com a mesma seqüência harmônica. Os acidentes são ocorrentes. No fim, a par te A aparece novamente. No início, a velocidade indicada é de 102 bpm. Deve ser utilizada a levada de shuffle feel, uma das mais comuns no blues, em que as colcheias são interpretadas como tercinas (as duas primeiras, com ligadura de valor). Tenha cer teza de que as figuras sejam corretamente lidas. Perceba também que, na par te B, a linha está escrita com colcheias − precisa ser, no entanto, lida como shuffle feel. Na parte A, a linha de baixo está padronizada ritmicamente com tercinas. Melodicamente, os inter valos empregados são de 7ªs, tônicas, 4ªs, 5ªs, 3ªs e blue notes. As técnicas de thumb (T), pluck (P) e hammer-on (H) são empregadas constantemente ao longo do estudo. No trecho B, as colcheias devem ser bem enfatizadas com o shuffle feel. Notas-pedal são mantidas com o pluck, ao mesmo tempo em que o thumb desenvolve um walking bass. Analise a escolha dos intervalos utilizados, com notas pertencentes ao acorde e aproximações cromáticas. Um bom exemplo disto está no primeiro e segundo compassos da parte B, em que o walking bass se desenvolve em tônica, 5ª, 7ª e nota cromática. O segundo compasso começa com tônica, 7ª, 5ª e nota cromática, que faz a passagem para a Cover Baixo 25 mensuração seguinte, onde este tipo de idéia prossegue. É importante ver que cada estilo pede determinada abordagem e, em muitas situações, menos é mais. master class blues & rock Estudo 2: “Slap the Rock” Neste tema, dividido em duas par tes, o slap é utilizado em um contexto ligado ao rock. A composição é formada por uma par te A (duas vezes) no tom de Ré maior, que sofre modulação para Lá bemol na B, tocada apenas uma vez. Perceba que, no fim deste segmento, pede-se para retornar (DC ao Fine) apenas uma vez à par te A, onde é realizada a conclusão do tema (Fine). Este estudo está desenvolvido a par tir da cadência I-V/VI-IV-IVm. Não se esqueça dos acidentes de cada tonalidade e os bequadros ocorrentes. Verifique também a armadura de clave. Outro fator impor tante para o “respiro” e o suingue da linha é respeitar a velocidade de 102 bpm. Para realizar este estudo, aconselho o uso do metrônomo, o acompanhamento de uma programação rítmica feita por bateria eletrônica ou, melhor ainda, a execução da música com uma banda. Em relação à técnica, o tema exige a aplicação de thumb (T), pluck (P), hammer-on (H), pull-of f (PO), dead note (X) e do ornamento de vibrato. Você tem a possibilidade de desenvolver outras ar ticulações, como bends e slides. Na par te A, há um padrão definido nos três primeiros compassos de cada linha, sendo que o quar to traz uma “resposta” a eles. A digitação pode ser a sugerida na tablatura ou outra qualquer, de acordo com suas preferências. Este trecho dá ênfase à nota Ré durante toda a progressão: deste modo, no terceiro e quar to compassos, aparece o acorde de G com a quinta no baixo. No trecho B, há alternâncias entre thumb e pluck. No primeiro e terceiro compassos, a levada trabalha com um contraponto melódico. Preste 26 Cover Baixo atenção nas notas interpretadas com o pluck. Nas mensurações dois e quatro, este processo é desenvolvido com o uso do thumb. Analise os inter valos em relação aos acordes. É impor tante que este estudo seja feito devagar para que não crie vícios, esquecimentos ou digitações erradas. master class blues & rock Estudo 3: “Tap the Blues” Neste estudo, a técnica de two hands é aplicada no estilo por meio de uma linha de baixo construída com acordes e um walking bass tradicional. Note que o trabalho deve ser realizado em um blues tradicional de 12 compassos, no formato fast change. A música possui ainda tom de Ré maior, com acordes dominantes (T, 3, 5 e 7). Pode ser tocada na velocidade de 102 bpm. A canção foi escrita com D7, G7 e A7, que formam a cadência I-IV-V. Em sua linha de baixo, os quatro primeiros compassos recebem a seguinte análise: D7 (T, 3, 5 e nota cromática), G7 (T, 3, 4 e nota cromática), D7 (T, 3, 5 e 6), D7 (T, 7, 6 e 5). Faça a mesma pesquisa nos oito restantes a fim de entender a construção da levada a ser tocada com a mão esquerda. A harmonia da música é aplicada por meio de bicordes (acordes com duas notas da formação geral da tétrade), executados com a mão direita. São indicados na partitura com o sinal de oitava (8va) e uma linha, mostrando que estão localizados no braço do instrumento a seis tons acima de sua representação gráfica. A digitação a ser feita está apontada com números sozinhos (mão esquerda) e dentro de um círculo (direita). Trabalhe primeiro com uma das partituras, executando o arranjo em andamentos mais lentos que o original. Depois que decorar tudo direitinho, passe a treinar com a outra, também individualmente. Após ter certeza de que consegue tocar cada linha de forma separada, inicie a aplicação conjunta dos acordes e da linha do baixo, compasso por compasso. Tome cuidado com as figuras de semínima e semibreve. Cover Baixo 27