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1 PRECARIZAÇÃO DO ENSINO SUPERIOR SOB A EGIDE DO CAPITAL E OS REBATIMENTOS NO TRABALHO DOCENTE DO ASSISTENTE SOCIAL Jaqueline de Melo Barros1 Juliana Desidério Lobo Prudencio2 Liandra Lima Carvalho3 RESUMO Este trabalho buscou refletir sobre a precarização da docência em Serviço Social e os rebatimentos da mesma na formação profissional e na categoria profissional, para tal, optamos por analisar os desafios colocados ao Serviço Social na contemporaneidade, sendo um deles a proliferação dos Cursos de Serviço Social, iniciada na década de 1990. Palavras-chave: Trabalho, formação profissional e Serviço Social 1 Assistente Social graduada pela Universidade Federal Fluminense – UFF/ RJ. Mestre em Serviço Social pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro – PUC/RJ. Coordenadora e Docente do Curso de Serviço Social da Faculdade Flama. 2 Assistente social graduada pela Universidade Federal Fluminense - UFF/ RJ. Especialista em Administração e Planejamento de Projetos Social pela UNIGRANRIO. Mestre em Política Social pela UFF/RJ e Docente do Curso de Serviço Social da Faculdade Flama. 3 Assistente Social graduada na Faculdade de Serviço Social Santa Luzia, Mestre em Política Social UFF, Doutoranda em Política Social - UFF. Assistente Social do Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher - Comarca de Duque de Caxias e Docente do Curso de Serviço Social da Faculdade Flama. 1 2 INTRODUÇÃO O presente artigo tem por intuito instigar o debate sobre a precarização do ensino superior e sua interface na atuação docente do assistente social, além de apreender as múltiplas formas de precarização da educação superior brasileira e suas expressões no ensino em Serviço Social. As reflexões trazidas aqui partem do conceito de totalidade, tendo como elemento mediador a dialética e evidenciando o lugar da sociabilidade burguesa no cenário contemporâneo, sob a égide das relações sociais de produção. Propomo-nos inicialmente refletir sobre o Serviço enquanto profissão e seu lugar nesta conflituosa arena de interesses opostos, tendo como pano de fundo o processo de aprofundamento da crise capitalista, traduzida na crescente onda de apropriação do trabalho coletivo, na centralização do capital financeiro e na especulação. Buscando explicitar a contraditória relação entre a precarização do ensino superior e a materialização do projeto ético-político do Serviço Social Tais análises partem de uma abordagem qualitativa, isto porque esse tipo de pesquisa acredita na relação entre pesquisador e pesquisado, possibilitando a construção fundada na busca pelo conhecimento do real a partir da base material, ou seja, da concretude, configurando-se numa reflexão acerca dos rebatimentos no trabalho docente do Assistente Social advindos da precarização do ensino superior braseiro. Diante de um momento ímpar no processo de formação profissional permeado por profundas transformações do mundo do trabalho, tencionada pelas exigências do grande capital a favor do processo de mercantilização e privatização da educação e consequentemente a proliferação dos cursos de Serviço Social. O que torna oportuno ter a região do Triangulo Mineiro na direção de compreender os diversos nuances da precarização do ensino superior e, por este configurar-se como um cenário desafiador. Permitindo-nos, uma melhor compreensão da realidade colocada pelas demandas apresentadas ao Serviço Social. Contribuindo para o debate atual e o fortalecimento da luta pela efetivação do projeto ético político profissional, na contracorrente do sistema. Ao decidir-se pelo desenvolvimento deste estudo 2 3 pretendeu-se levantar conteúdos relevantes para o embasamento à construção de novas pesquisas, que de alguma maneira instigue a categoria profissional e não só, com vistas à consolidação de um projeto societário “utópico”, mas possível. O profissional de Serviço Social é, aqui, também considerado na sua condição de intelectual, considerando nossa inserção em um contexto em que somos profissionais dotados de alta qualificação intelectual. Trata-se do organizador, dirigente e técnico, que coloca sua capacidade a serviço da criação de condições favoráveis à organização da própria classe a que se encontra vinculado, ou seja, o seu reconhecimento como trabalhador que na condição de assalariamento, vende sua força de trabalho, que é tida como intelectual, expressando-se sua mediata circunscrição na divisão social e técnica do trabalho. O assistente social, que na sua qualidade de intelectual tem como instrumento básico a linguagem, poderia ser caracterizado no contexto do capital. Historicamente, não constitui atividade proeminente para essa categoria profissional a produção de conhecimentos científicos. Emerge e se afirma, em sua evolução, como uma categoria voltada para a intervenção na realidade, utilizando-se dos conhecimentos socialmente acumulados e produzidos por outras ciências, aplicando-os à realidade social para subsidiar sua prática. Desta nos propomos discutir de que forma a precarização do ensino superior tem interferido na concretude de um trabalho docente compromissado com um projeto de formação profissional crítico e em consonância ao projeto ético-político profissional crítico e em consonância ao projeto ético-político profissional? O trabalho do assistente social frente à crise contemporânea O cenário contemporâneo traz consigo elementos críticos sobre a inserção do Serviço Social no contexto da (re) produção das relações sociais no âmbito da sociedade burguesa que, se apresenta a partir da sua inserção na divisão social e técnica do trabalho (NETTO, 1991), aqui concebida a partir da parcialização do trabalho coletivo, que se configura na estrutura da sociedade capitalista centrada no trabalho e consequentemente, na acumulação. 3 4 O exercício do assistente social deriva, em todas as direções, do trabalho enquanto atividade indispensável ao ser humano, pois, o consideramos como atividade fundante do ser social, concedendo-lhe humanidade, condições de transformação da natureza e, por conseguinte, a sua própria condição. Por ser categoria fundante do ser social e base do capital Marx configura o trabalho como: [...] o trabalho é um processo entre o homem e a Natureza, um processo em que o homem, por sua própria ação, media, regula e controla seu metabolismo com a Natureza. Ele mesmo se defronta com a matéria natural como uma força natural. Ele põe em movimento as forças naturais pertencentes a sua corporalidade, braços e pernas, cabeça e mão, a fim de apropriar-se da matéria natural numa forma útil para sua própria vida. Ao atuar, por meio desse movimento, sobre a Natureza externa a ele e ao modificá-la, ele modifica, ao mesmo tempo, sua própria natureza. (MARX, 1985: 149) O trabalho é aferido como capacidade emancipadora, criadora, porém, temos que apontar sua posição alienadora, pois representa todo o complexo antagônico do capital. Mesmo com essa complexidade na categoria “alienação”, o trabalho promove ao homem as condições de reconhecimento como um ser social, ou seja, um ser que vai sendo sociabilizado à medida que desenvolve a transformação da natureza. Aliado a este processo, há a necessidade de articular a relação do trabalho coletivo ao processo denominado de reestruturação produtiva, advindo do processo de liberalização da economia e, deste emerge as modificações na relação capital x trabalho, incidindo diretamente no cotidiano da classe operaria e, por conseguinte, no processo de trabalho do assistente social. Compreender a função social do Serviço Social na sociedade capitalista significa, inicialmente, situá-lo como partícipe da reprodução das relações de classes e, principalmente, o relacionamento contraditório entre elas, além de conceber as relações sociais como reprodução da vida material e do modo de produção capitalista, ultrapassando a reprodução no seu sentido amplo, incluindo produção, consumo, distribuição e troca de mercadorias, tido como um processo. Assim, “este processo visa, ao final, a produção não mais de um valor de uso, mas de uma mercadoria que possa ser trocada no mercado por um valor superior àquele investido de capitalista”. (GUERRA, 1995, p. 105). 4 5 É necessário entender a profissão a partir das condições sócio-históricas determinadas, tendo como perspectiva de análise uma discussão ampliada, que seja capaz de compreendê-la no âmbito das relações sociais diante da reprodução das forças produtivas. A partir desta vertente de análise, fundada na perspectiva a dialética marxista, matriz esta que proporciona um vetor crítico-analítico às questões tão caras ao Serviço Social. Neste sentido, refere-se à reprodução das forças produtivas e das relações de produção na sua totalidade; o que envolve, também, a reprodução da produção espiritual, ou seja, das formas de consciência social: jurídicas, religiosas, artísticas ou filosóficas, por meio das quais se toma consciência das mudanças ocorridas nas condições materiais de produção. Desta maneira, Marx apud Iamamoto e Carvalho, (1998, p. 30) afirma que: [...] as relações sociais, de acordo com as quais os indivíduos produzem as relações sociais de produção, alteram-se, transformam-se com a modificação e o desenvolvimento dos meios materiais de produção, das forças produtivas. Em sua totalidade, das relações de produção formam o que se chama relações sociais: a sociedade e, particularmente, uma sociedade num determinado estágio de desenvolvimento histórico, uma sociedade com caráter distintivo particular [...]. O Capital também é uma relação social de produção. É uma relação burguesa de produção, relação de produção da sociedade burguesa. O que nos permite analisar que as relações sociais são a reprodução da totalidade do processo social, em que a reprodução de determinado modo de vida envolve o cotidiano da vida em sociedade, ou seja, a sociabilidade. Por seu turno, sociabilidade pode ser interpretada a partir da analise marxiana sobre o funcionamento da sociedade contemporânea, fundada nos princípios do capitalismo, concebida como um conjunto de acontecimentos, fatos, história, concretude, abstração que, funda um conceito mais amplo de sociedade. Esta sociabilidade somente pode ser interpretada a partir do viés capitalista. Podemos entender, ainda, as relações sociais no contexto da relação capitaltrabalho, no sentido antagônico, em que em um pólo existe o capitalista como expressão da compra da força de trabalho e, no outro pólo o trabalhador que dispõe apenas da sua mão-de-obra para venda. Além de configurar-se pela apropriação privada dos meios de produção e pela concentração da propriedade privada nas mãos 5 6 da burguesia. É preciso destacar que, por relações sociais, não se entende como a relação entre seres humanos e, sim, as relações capitalistas de produção, estabelecidas a partir de um contexto social determinado: a apropriação dos meios de produção e a exploração da força de trabalho. Diante da complexidade deste processo, pressupõe considerar a profissão sob dois ângulos indissociáveis entre si, e, ao mesmo tempo, interdependentes. Seja ela como realidade vivida e representada na e pela consciência de seus agentes profissionais, expressa pelo discurso/conteúdo teórico-ideológico sobre o exercício profissional; seja pela atuação profissional como atividade socialmente determinada pelas circunstâncias sociais objetivas que conferem uma direção social à prática profissional, o que condiciona e mesmo ultrapassa a vontade e/ou consciência de seus agentes individuais. Essa complexidade analisada por Iamamoto e Carvalho (1998) sinaliza a contrariedade das duas dimensões, podendo, ainda, haver uma defasagem entre as condições e efeitos sociais objetivos da profissão e as representações que legitimam esse fazer. Noutras palavras, ocorre uma defasagem entre intenções expressas no discurso e no próprio exercício deste fazer, mais conhecido como discurso dicotomizador da relação teórico-prática. Desta forma, o Serviço Social precisa ser apreendido como elemento participante tanto do processo de reprodução dos interesses do capital, quanto das respostas da classe trabalhadora, o que nos permite afirmar que o mesmo participa do movimento contraditório da reprodução e continuidade da luta de classes, visto que: [...] responde tanto a demandas do capital como do trabalho e só pode fortalecer um ou outro pólo pela mediação de seu oposto. Participa tanto dos mecanismos de dominação e exploração como, ao mesmo tempo e pela mesma atividade, da resposta às necessidades de sobrevivência da classe trabalhadora e da reprodução do antagonismo nesses interesses sociais, reforçando as contradições que constituem o móvel básico da história (IAMAMOTO e CARVALHO, 1998, p. 75). Tal reflexão não visa defender uma posição conciliadora do assistente social, e, sim, refletir sobre o caráter mediador da profissão, considerando que não podemos conciliar interesses antagônicos. Interesses esses que integram o movimento de reprodução do capital, que dá continuidade na e da organização dessa sociedade, seja 6 7 pela criação, seja pela apropriação do trabalho excedente, sob a forma de mais-valia, que recria, também, em escala ampliada, os antagonismos de interesses objetivos inerentes às relações sociais, por meio dos quais se efetiva a produção. Esta ideologia é uma constante na profissão, visto que nossa inserção no mundo capitalista nos possibilita sentir esses reflexos, porém, cabe destacar urgentemente sobre nosso compromisso expresso no Código de Ética Profissional de 1993, na Lei de Regulamentação e no Projeto Societário, que elenca todo um conjunto ético e político da profissão, oferecendo um direcionamento das nossas ações cotidianas, com vistas a superar todo esse conjunto conservador. Diante destas condições, o Serviço Social insere-se na dinâmica das relações sociais vigentes na sociedade, que são determinadas pelas conjunturas sóciohistóricas e pela própria constituição do capitalismo como sistema social. Como as classes sociais fundamentais e suas personagens só existem em relação pela mútua mediação entre elas, a atuação do assistente social é necessariamente polarizada pelos interesses de tais classes, tendendo a ser cooptada por aqueles que têm uma posição dominante. (IAMAMOTO, 2008). Fundado neste contexto complexo e contraditório, situamos a atuação do assistente social profundamente polarizada por interesses antagônicos, pois, é forçoso inferir que o Serviço Social mantém um estatuto de compromisso com as demandas da classe trabalhadora, porém, no outro pólo, mantém alianças com os detentores dos meios de produção, ou seja, o capitalismo. Aqui, entendem-se como detentores dos meios de produção todos aqueles mandatários institucionais que compram a força de trabalho dos assistentes sociais, independente de ser público, privado ou filantrópico. Esta situação por si só conflituosa, aliada a um profundo conhecimento teórico da dialética determina ao assistente social uma capacidade indispensável: a mediação, considerada “chaves para que o profissional desenvolva sua intervenção com êxito – sempre tomando como referência o projeto ético-político crítico da profissão – a (re) construção ontológica de seu objeto de intervenção profissional”. (PONTES, 2003: 210). Ao considerarmos a esfera da reprodução das relações sociais a de se considerar o Estado na sua condição de legislador e de controlador das forças repressivas. Esses dois braços do Estado são mutuamente complementares na tarefa 7 8 de assegurar o poder, e a ordem estabelecida, conforme os interesses dominantes. É por meio dele que, tradicionalmente o assistente social opera as políticas públicas de enfrentamento às mais variadas expressões da questão social, além de defrontar-se com a exigência de um Estado Mínimo para o social pautado na lógica de cortes de gastos públicos, tornando-se justificativa para sua intervenção na economia. E como bem sintetiza Netto (2007: 227): [...] é claro que o objetivo real do capital monopolista não é a “diminuição” do Estado, mas a diminuição das funções estatais coesivas, precisamente aquelas que respondem à satisfação de direitos sociais. Na verdade proclamar a necessidade de um “Estado mínimo”, o que pretendem os monopólios e seus representantes nada mais é que um Estado mínimo para o trabalho e máximo para o capital. Noutras palavras, o Estado funciona como um “cartório privilegiado dos interesses do capital”, sem deixar, porém, de atender às requisições da classe trabalhadora, tornando-se uma instituição extremamente polarizada entre interesses contraditórios. Se o poder de Estado exclui as classes dominadas, não pode desconsiderar totalmente suas necessidades e interesses como condição mesma de sua legitimação. Deste modo, o poder estatal vê-se obrigado, pelo poder de pressão das classes empobrecidas, a incorporar, ainda que subordinadamente, alguns de seus interesses, desde que não afetem aqueles da classe dominante. Desta forma, a classe dominante tem, na figura do Estado, seu regulador que, polarizado por interesses antagônicos, denote uma condição claudicante que, ora atende as determinações da elite, ora as necessidades daqueles que necessitam da sua intervenção. Já é notória a discussão entre a esfera da necessidade da classe trabalhadora e as estratégias ideológicas da elite, em fazer com que as políticas sociais demonstrem seu cariz conflituoso na amenização de conflitos entre classes. Ao redimensionar as ações reguladoras, o Estado ao diminui suas funções legitimadoras, concomitante às políticas de estabilização econômica, com redução dos gastos públicos a partir de uma perspectiva privatizadora, o que por sua vez promove uma dualidade discriminatória os podem ou não pagar pelos serviços. A favor de um “nicho lucrativo” para o capital, em especial capital nacional que aos poucos cede espaço com a abertura comercial, como aconteceu com a previdência complementar e a educação superior nos últimos anos (BEHRING, 2008). 8 9 A Política Educacional e a proliferação dos Cursos de Serviço Social Quando pensada sob a ótica capitalista, a política educacional torna-se um mecanismo de socializar parcelas dos custos de reprodução da força de trabalho com intuito de obter resultados e pela busca de investidores internacionais. Diante dessa lógica a educação brasileira reforça a perspectiva mercantil acelerando a precarização do ensino seguido de uma série de redefinições legais para dar sustentabilidade aos ditames neoliberais. [...] A educação [...] Em outras palavras, tornou-se uma peça do processo de acumulação de capital e de estabelecimento de um consenso que torna possível a reprodução do injusto sistema de classe. Em lugar de instrumento da emancipação humana, agora é mecanismo de perpetuação e reprodução desse sistema. (MÉSZAROS, 2005:15). A Política Educacional brasileira não está imune às transformações ocorridas no mundo do trabalho e também se configura como uma arena de lutas entre projetos societários antagônicos, sendo visivelmente percebido na promulgação da Lei de Diretrizes e Bases de 1996, que por sua vez reflete no aspecto conceitual e de funcionamento, e no caso específico da educação superior enfrenta novos entraves mediados por sucessivas ações governamentais. A ofensiva do Ministério da Educação (MEC), articulada às diretrizes do Banco Mundial, se deu de forma mais flagrante, a partir de 1996, com a aprovação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei nº 9.394 de dezembro de 1996, a partir de uma manobra que retirou da tramitação no Senado o projeto elaborado em 1994, pela Câmara, após anos de discussão e, sobretudo, negociação com os movimentos sociais do campo educacional, que reuniu dezenas de entidades. [...] Desde então o MEC tem induzido uma profunda reforma do campo educacional sem o estabelecimento de qualquer diálogo com a sociedade civil organizada e, principalmente, com os intelectuais e Trabalhadores do campo educacional. (ALMEIDA, 2000, p.157). Tal ofensiva contribui para fragilizar as Universidades no âmbito da produção de conhecimento e ao mesmo tempo incentiva a privatização do ensino superior num discurso de democratização ao acesso, contraditoriamente prioriza-se a preparação para o mercado de trabalho, voltado para a qualificação da mão-de-obra (MARTINS: 2005). O período pós regulamentação da LDB é marcado por sucessivos decretos que primam pela flexibilização das instituições de ensino superior exigindo a 9 10 indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão somente às universidade e a excelência do ensino aos centros universitários, o que foi seguido pela instituição do Exame Nacional dos Cursos, o chamado “provão”, estimulando uma política de rankeamento entre as instituições. Neste contexto, a nova lei considera a qualidade como um direito do cidadão, portanto, na perspectiva de “consumidor” de uma mercadoria, eliminando o dever do Estado de zelar pela qualidade da formação dos cidadãos e dos profissionais. (BELLONI, 2003:133). Assim, o governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso destaca-se pelo incentivo a privatização do ensino superior, seja por meio do por meio do crédito educativo (FIES), seja pela redução dos ingressantes em universidades públicas, além de possibilitar a criação de novos cursos, programas e modalidades de ensino, proporcionando cada vez mais o individualismo e a primazia do aspecto quantitativo ao qualitativo, consequentemente, a mercantilização do ensino. O governo Lula segue em defesa da expansão do ensino superior, banalizando a democratização do acesso por meio da isenção fiscal possibilitada pelo Programa Universidade para Todos (PROUNI) 4, além da participação do ensino privado à distancia (EaD)5 e a reestruturação do sistema público de ensino por meio do Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI)6. Mediante essas estratégias, a ideologia dominante permite reestruturar suas bases de sustentação, tanto ideológicas, quanto sociais, no sentido de que reproduzir o próprio modo de produção capitalista, o que CHAUÍ (1999) define como “universidade operacional”, o que significa: 1) eliminar o regime único de trabalho, o concurso público e a dedicação exclusiva, substituindo-os por ‘contratos flexíveis’, isto é, temporários e precários; 2) simplificar os processos de compras (as licitações), a gestão financeira e a prestação de contas (sobretudo para proteção das chamadas ‘outras fontes de financiamento’, que não pretendem se ver publicamente expostas e controladas); 3) adaptar os currículos de graduação e pós-graduação às necessidades profissionais das diferentes regiões do país, isto é, às demandas das empresas 4 Criado peça MP nº 213/2004 e institucionalizado pela Lei nº 11.096, de 13 de janeiro de 2005, Regulamentado pelos decretos 2494/98 e 2561/98 da LDB. 6 Decreto 6.096, de 24 de abril de 2007 5 10 11 locais (aliás, é sistemática nos textos da reforma referentes aos serviços a identificação entre ‘social’ e ‘empresarial’); 4) separar docência e pesquisa, deixando a primeira na universidade e deslocando a segunda para centros autônomos” (CHAUÍ, 1999: 6). O incentivo governamental aliado ao terreno fértil das possibilidades, permeado pelo discurso do aumento da escolarização, os cursos de formação de professores, as licenciaturas e os cursos de Serviço Social tornam-se um grande atrativo para o processo de certificação de larga escala, omitindo a desresponsabilização do Estado, acentuando privatizações internas e externas. No centro deste “furacão”, o serviço social desponta com a criação desenfreada de cursos de EaD e pelo acumulo de transformações ocorridas nas últimas décadas, o que nos alerta para o processo de formação profissional, e se o mesmo é capaz de formar profissionais críticos, atendendo ao perfil preconizado pela ABEPSS em 1996, ou se o mesmo limita-se a reprodução da ideologia dominante, pois a tendência deste perfil não é nada animadora, “pois estará baseada em uma formação profissional a distância, aligeirada, mercantilizada e, portanto, com poucas chances de concretizar o perfil de um profissional crítico e competente teórica, técnica, ética e politicamente”. (Pereira, 2008:194). Se por um lado há uma preocupação dos órgãos da categoria representados pelo conjunto CFESS-CRESS, ABEPSS e ENESSO com a formação crítica, amplia-se o debate sobre a repercussão da precarização no âmbito da formação, por outro nos indagamos sobre as condições de trabalho dos assistentes sociais na condição de trabalhadores assalariados que vendem sua força de trabalho, pois a reconfiguração das formas de exploração do capital vem reforçar o processo de heterogeneização, fragmentação e complexificação da classe trabalhadora (ANTUNES: 2008) As reformas educacionais de cunho neoliberal têm conduzido a práticas que aprofundam o individualismo e a competição, levando os docentes a se autorresponsabilizarem pelas falhas em seu trabalho, trazendo à tona o sentimento de culpa, que aliada à redução salarial, às péssimas condições de trabalho e à intensificação das jornadas de trabalho, gera frustrações e desmotivação.(AVILA, 2010:165) Ao considerarmos a polarização dos interesses das classes envolvidas, tencionados imediatamente pelo rebatimento das lutas de classes, que não podem ser 11 12 analisadas isoladamente; ao contrário, precisam ser compreendidas num contexto das condições objetivas e subjetivas, entretanto a de salientar que o assistente social [...] durante o período em que trabalha, sua atividade é socialmente apropriada por outro: o sujeito que trabalha não tem o poder de livremente estabelecer suas prioridades, seu modo de operar, acessar todos os recursos necessários, direcionar o trabalho exclusivamente segundo suas intenções, o que é comumente denunciado como o “peso do poder institucional”. Simultaneamente, o assistente social tem como base social de sustentação de sua relativa autonomia -, e com ela a possibilidade de redirecionar o seu trabalho para rumos sociais distintos daqueles esperados pelos seus empregadores -, o próprio caráter contraditório das relações sociais. Ou seja, nela se encontram interesses sociais e antagônicos que se refratam no terreno institucional enquanto forças sociopolíticas em luta pela hegemonia e que podem ancorar politicamente o trabalho realizado. As necessidades sociais e aspirações dos segmentos subalternos, que são o público alvo do trabalho profissional, podem potenciar e legitimar os rumos impressos ao trabalho do assistente social, na contramão das definições “oficiais”. [...] (IAMAMOTO, 2007:422) Diante desta realidade, a busca pela escolarização tornou-se um terreno fértil aos olhos dos “empresários da educação”, favorecendo a proliferação dos cursos das áreas humanas atrelado ao rápido retorno financeiro, considerando que não exigem grandes investimentos para sua implantação. Destarte, este se constitui como cenário desafiador e instigante a medida que desponta para proliferação dos cursos de Serviço Social e consequentemente aponta que as funções desempenhadas pelos assistentes sociais vinculadas ao magistério vislumbra um cotidiano que aponta para dissocialização do tripé Ensino, Pesquisa e Extensão, além aferir um complexo antagônico, expondo o trabalho flexibilizado diante das exigências das agencias financiadoras, nas palavras de “trabalho se tornou cada vez mais individualizado e a competitividade cada vez mais presente, dificultando o trabalho coletivo e a luta por melhores condições de trabalho”(AVILA, 2010:165). Portanto, pretende-se com esta pesquisa contribuir para o debate, consideramos ainda, que este estudo possa ser compartilhado no âmbito acadêmico, instigando novas produções e discussões. Assim, pesquisar e desvelar a prática docente na formação profissional em Serviço Social, como trabalho profissional de apreensão e leitura crítica da realidade social, deve ser visualizado como projeto educacional de ruptura ao pragmatismo e aos anseios alheios a emancipação sócio-político do homem. 12 13 Este debate só se torna possível, se partirmos da premissa de que as constantes e profundas transformações ocorridas na realidade social já mencionadas seja no aspecto sócio-econômico, político, cultural e intelectual, nos obriga à busca pela compreensão de que todas essas transformações refletem diretamente durante o processo de formação dos discentes na graduação e na intervenção cotidiana do assistente social. A contemporaneidade exige cada vez mais profissionais qualificados, dotados de conhecimentos especializados e atualizados, flexibilidade intelectual no encaminhamento de diferentes situações e capacidade de análise para decodificar a realidade. (OLIVEIRA, 2004, p. 61) Cada vez mais, nos defrontamos com a urgência e a importância de promovermos espaços de reflexões e discussões que tenham como tônica, a formação de qualidade em Serviço Social, e a prática docente enquanto espaço de atuação profissional do assistente social, propondo a realização de estudos sobre o processo ensino-aprendizagem, que está intimamente ligado à prática profissional do assistente social, e às demandas advindas do sistema capitalista, que se configuram na busca por propostas interventivas de cunho propositivo, criativo, pautadas no código de ética da profissão, com vistas a materialização do Projeto Ético Político. Ainda que de forma preliminar esperamos suscitar para um novo repensar do mundo que permitem absorver a realidade do Serviço Social, enquanto profissão inserida na dinâmica social, além de despertar o olhar para docência enquanto espaço sócio-ocupacionais, e o repensar de uma proposta formativa cada vez mais qualificada, visando traçar o perfil profissional defendido pelas Diretrizes Curriculares. 13 14 REFERÊNCIAS ABEPSS. Desafios à Formação Profissional em tempos de crise mundial: a ABEPSS nas atividades comemorativas de 15 de maio de 2009, disponível em http://www.abepss.org.br/briefing/documentos/15_maio.pdf , 2009 ALMEIDA, Ney Luiz Teixeira de. Políticas Sociais Setoriais e por Segmento: Educação. Capacitação em Serviço Social e Política Social, módulo 3. Brasília: UnB, Centro de Educação Aberta, Continuada a Distância, 2000, p. 153 -163. ANTUNES, R. Adeus ao trabalho? Ensaios sobre as metamorfoses e a centralidade do mundo do trabalho. 13. ed. São Paulo: Cortez, 2008. 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