ARTE: UMA EXPERIÊNCIA ESTÉTICA EM MUSEU ALVES, Suzy de

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ARTE: UMA EXPERIÊNCIA ESTÉTICA EM MUSEU ALVES, Suzy de
ARTE: UMA EXPERIÊNCIA ESTÉTICA EM MUSEU
ALVES, Suzy de Castro – UNIVALI – [email protected]
GE: Educação e Arte / n.01
Agência Financiadora: Programa de Bolsa de Pesquisa do Artigo 170
1- INTRODUÇÃO
O objetivo desse projeto de pesquisa foi identificar as contribuições que a Disciplina
de Arte em Educação, através de visita ao museu, pode provocar nas acadêmicas1 do Curso
de Pedagogia Séries Iniciais e Educação Infantil da Universidade do Vale do Itajaí situada
no Município de Biguaçu. Através da disciplina de Arte Educação iniciou-se experiências
de viagens de estudo ao museu: Fundação Mundo Ovo da artista plástica Eli Heil. O
processo de observação, apesar das resistências, colocou-se como um grande desafio para
as acadêmicas do 7° período. A experiência inicia em sala e posteriormente no museu com
a participação da turma num sábado, considerando o horário de trabalho das acadêmicas
durante a semana.
Dada à importância as articulações provocadas na disciplina, acredita-se que é
necessário uma investigação no sentido de entender algumas questões que estão presentes
na prática pedagógica. Podem-se trazer muitas questões para investigação, porém é
necessário um recorte específico a fim de discutir uma temática importante relacionada à
observação. Por isso, identificar os significados da experiência de visitação no museu,
identificar e analisar as mudanças provocadas a partir da visita ao museu, verificar a
contribuição na prática pedagógica e quais os elementos que desencadeiam na prática
cotidiana e a importância da disciplina no curso de Pedagogia foram objetivos importantes
para análise dos resultados.
Percebeu-se, a partir das discussões em sala de aula que as acadêmicas não tinham
hábitos de visitar museus, galerias, acervos, instituições culturais entre outros. Na maioria
das turmas, poucos tinham vivenciado uma experiência como essa. Como despertar o
gosto2 nas crianças se o professor “não gosta”, ou pensa que “não gosta”?
1
2
Optou-se utilizar o termo no feminino considerando que a maioria são mulheres.
Sobre gosto ver Ostetto, 2004, p.41.
2
A partir das visitas no museu, muitas reflexões emergem para as acadêmicas, a
experiência estética mexe com os olhares e para entender esse movimento de cada uma foi
necessário uma pesquisa que possibilitasse compreender melhor como isso ocorre. .
A natureza desta pesquisa e os pressupostos que fundamentaram as questões
investigadas exigiram e condicionaram a eleição do método de investigação em virtude das
diferentes formas de desenvolvimento assumidas pela realidade concreta pesquisada. Nesse
sentido, a metodologia escolhida para o presente projeto colocou-se no âmbito da pesquisa
qualitativa. O resultado da pesquisa possibilitou analisar as experiências vividas no museu e
suas repercussões na própria disciplina.
2. METODOLOGIA
Como qualquer ação social, a pesquisa em educação pode ser entendida como a
concretização de um conjunto de procedimentos que encaminha a investigação para
construir um saber científico na e sobre a prática educativa (LEITE, 2002). A natureza
desta pesquisa e os pressupostos que fundamentam as questões investigadas exigem e
condicionam a eleição do método de investigação em virtude das diferentes formas de
desenvolvimento assumidas pela realidade concreta pesquisada. Nesse sentido, a
metodologia escolhida para o presente projeto coloca-se no âmbito da pesquisa qualitativa
(BOGDAN; BIKLEN,1994, ZAGO; CARVALHO; VILELLA, 2003), muito embora lance
mão também da abordagem quantitativa, utilizando-se de um conjunto variado e
complementar de estratégias de investigação: pesquisa bibliográfica, aplicação de
questionários, registros das visitas, relatórios e observação de campo.
Procedimentos Metodológicos
A população alvo da investigação constituiu-se em egressos e acadêmicos do Curso
de Pedagogia Habilitação Educação Infantil e Séries Iniciais na UNIVALI – Biguaçu, nos
3
anos de 2005 e 2006. O trabalho de pesquisa foi realizado tendo por base uma metodologia
de tipo qualitativo que consistiu nos seguintes instrumentos:
• Análise das impressões registradas pelas alunas sobre a Fundação Mundo Ovo
• Bibliografia específicas sobre artista Eli Heil
• Análise de fontes bibliográficas. .
• Questionários semi-estruturadas e semi-diretivas realizadas com 55 acadêmicas e com
acadêmicos do 1º e 2º semestre 2006 e com 2º semestre 2005 e egressos do 1º semestre
de 2005.
Os dados coletados foram analisados de forma a esclarecer, interpretar e explicar o
fenômeno estudado, de maneira que venham a responder as questões formuladas no estudo.
A pesquisa será realizada em duas etapas:
1) Levantamento de dados preliminares: aplicou-se questionários presenciais junto
aos acadêmicos e questionários on-line enviados por e-mail devido ao conflito de horários e
a dificuldade de encontrar os alunos egressos.
2) Estudo: Observou-se o cotidiano o qual envolveu a viagem de estudos na
Fundação Mundo Ovo a fim de verificar o entendimento dos acadêmicos.
O objetivo desse instrumento é o de coletar dados no sentido de traçar um perfil dos
acadêmicos e os egressos que participaram da disciplina Arte em Educação especificamente
a visita ao Museu. Para a análise dos dados, Mazzotti, e Gewandsz (1999, p.170):
À medida que os dados vão sendo coletados, o pesquisador, vai
procurando tantativamte identificar temas e relações, construindo
interpretações e gerando novas questões/ e ou aperfeiçoando as
anteriores, o que por sua vez, o leva a buscar novos dados,
complementares ou mais específicos, que testem suas interpretações,
num processo de “sintonia fina” que vai além da análise final.
Conforme os atores, os elementos de pesquisa são agregados a outros que nesse
caso foi proporcionado pela participação da coordenadora da pesquisa como professor da
disciplina e os registros, sobre as impressões da viagem e observações de campo.
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3 - FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
O mundo contemporâneo vem apresentando diversas formas de linguagens artísticas
e entre elas destaca-se para esse estudo a linguagem visual. A relação com essa linguagem
estabelece um diálogo próprio por meio da imagem. Esse diálogo vem se estabelecendo na
medida em que seja provocado diante de uma imagem que para a pesquisa utiliza-se o
espaço de um museu de arte. Diante desse cenário criamos possibilidades através do olhar e
da interação. Conforme Parâmetros Curriculares Nacionais – Artes: (1997, p. 61). “ Cada
uma dessas visualidades é utilizada de modo particular e em várias possibilidades de
combinações entre imagens, por intermédio das quais os alunos podem expressar-se e
comunicar-se entre si de diferentes maneiras.”
Com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nº. 9.394/96, Art. 26 – 2º O ensino de
arte constituirá componente curricular obrigatório, nos diversos níveis de educação
básica, de forma a promover o desenvolvimento cultural dos alunos. A Arte é importante
A aprovação da lei veio reafirmar a importância e a permanência da disciplina,
mostrando que a arte é um conhecimento e que possui um campo teórico específico. Para
garantir a disciplina no corpo da lei muitos movimentos organizaram-se para manter sua
obrigatoriedade.
Paralelamente
a
essa
discussão,
muita
questões
emergiram,
principalmente, em termos teórico- metodológico e cursos de Pós Graduação crescem no
Brasil no sentido de aprofundar pesquisas na área e reafirmar sua importância.
Com toda essa modificação sugerida pela Lei e todo o esforço dos movimentos,
percebe-se que é necessário muito estudo e muita articulação no sentido de esclarecer de
fato a função da Disciplina de Artes. Ainda assim está relação entre a produção artística
cultural e a instituição de ensino apresenta-se em conflito conforme discussão trazida por
Leite e Ostetto, (2004) no artigo intitulado: “Formação de professores: um convite da arte”.
As autoras destacam, (2004, p. 12):
a necessidade de trazer uma outra dimensão para a formação de
professores: uma abordagem que vise ampliar olhares, escutas e
movimentos sensíveis, despertar linguagens adormecidas, acionar
esferas diferenciadas de conhecimento, mexer com corpo e alma,
diluindo falsas dicotomias entre corpo e mente, ciência e arte,
afetividade e cognição, realidade e fantasia.
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As autoras chamam ao desafio no sentido se aproximar, se permitir, enfim,
despertar o adormecido no sentido de criar possibilidade em relação ao fazer na formação
dos professores. Na pesquisa sobre museu coloca-se principalmente em ampliar os olhares
ou antecedendo se permitir ao olhar.
Atualmente na instituição o estudante de pedagogia e também professor das séries
iniciais ou da educação infantil em sua maioria das vezes é responsável pela disciplina de
Artes. Por outro lado ao deparar-se com a disciplina de arte em educação, apresenta muitas
expectativas entre elas o de aprender muitas técnicas para trabalhar com as crianças. Porém,
esse professor não conhece museu, não vivenciou experiências de observação, diz não
gostar ou então não se interessar por obras de arte. Um número expressivo de professores
relaciona arte ao desenho e isso demonstra a dificuldade de entender a arte na sua totalidade
aqui entendida nas suas diferentes linguagens como visual, musical e cênica. Leite e
Ostetto, (2004, p.12) expressam bem essa questão:
É o convite da arte que chega, chamando ao ensino de novos olhares,
ao dar-se conta do olhar, do ato de contemplar uma pintura, de entrar
na dança, arriscando os passos, de Fazer, experimentar, sentir a
sensação de caos, da frustração, do erro e também da satisfação da
realização, do acerto. Arte é isso: totalidade!
Essa perspectiva apontada pelas autoras traz uma dimensão que de fato a arte
precisa ser apropriada pelas educadoras. Diante desse desafio, a disciplina precisa fazer a
diferença, no sentido de provocar o olhar para a totalidade. O desafio maior é “desengessar”
o adulto que não se permite, não se abre, sente-se incapaz e por isso não descobre a
totalidade. É como diz Fusari e Ferraz, (1993 p.53): “... que aproxime os estudantes do
legado cultural e artístico da humanidade, permitindo assim, que tenham conhecimento dos
aspectos mais significativos de nossa cultura, em suas diversas manifestações”. As autoras
também destacam a importância do professor de arte no sucesso desse processo
transformador, auxiliando os alunos a melhorarem a sensibilidade e os saberes práticos e
teóricos em arte.
Barbosa, 2003, traz uma reflexão acerca do ensino de arte e a construção do leitor
visual. Por que é importante trazer essa reflexão? Trata-se de discutir possibilidades que
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apontem para a falta do olhar ou olhar não observador se assim posso referir-me. Além da
observação, leitura e releitura de obras de arte na sala de aula é também importante fazê-la
no museu, são possibilidades que precisam se vivenciadas. Para Ramalho e Oliveira (1988
p.4 apud Barbosa, 2003, p. 30):
(...) as pessoas, de um modo geral, têm dificuldades para compreender
as manifestações dos códigos estéticos, indiferentemente do sistema do
qual façam parte e independentemente de se tratarem de informações
artísticas ou estéticas. Uns, para encobrir o desconhecimento, alegam
não gostar de arte ou não ter interesse por tais produtos; outros
simulam que a compreensão é tácita e evitam discuti-los; um terceiro
grupo apela para interpretações baseadas em critérios extra-estéticos,
como os pautados estritamente pelas emoções e pelos sentimentos ou
até mesmo pela valoração comercial. Em suma, o que se ouve e o que
se vê pouco ou nada tem a ver com que há para ver e ouvir.
Educação é um processo dinâmico e ininterrupto que não cabe mais num paradigma
verticalizado de transmissão de saberes consagrados. A revisão do papel dos museus
acompanha o rendimensionamento do conceito de formação e de conhecimento, que não
pode mais ser reduzido à sua dimensão de ciência, deixando de fora a dimensão artística e
cultural (Kramer 1998).
Em relação ao processo de observação, é necessário o exercício no sentido de
possibilitar o desenvolvimento de habilidades de contemplação. Tem-se a impressão que a
correria em que vivem as pessoas, a falta de tempo, dificulta a observação, o contato com o
objeto, os detalhes. De alguma forma isso se comprova quando se desenvolve algumas
atividades de observação em sala de aula e a impressão se confirma quando demonstram,
em fração de segundos, que a tarefa foi cumprida. Esse exercício que dá conta de provocar
a percepção da necessidade de modificar este olhar, devido a insistência da atividade
proposta aos acadêmicos acaba levantando questões como: o que há por trás das sensações
que uma obra de arte transmite? Traços, cores, texturas e formas são transformados. Que
segredos traz o trabalho do artista para o observador? Questões como essas são trazidas por
Leite e Ostetto, (2005), no livro intitulado: “Museu Educação e Cultura”, no qual
emergem discussões em torno da ampliação de vozes e olhares, problematizam e trazem
questões relacionadas à experiência de professores e crianças que foram ao encontro da
obra. Seguindo essa discussão Argolo, (2005), no artigo: “Olhares e saberes do encontro
com a arte” traz uma experiência com guardas no Museu Nacional de Belas-Artes que para
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autora tinha um sentido de controle. Foi surpreendida, no entanto, ao ser ao ser conduzida à
sala Portinari e chegando lá, falava desprendidamente sobre a obra. O artigo apresenta
elementos de apropriação de conhecimentos dos guardas com as obra as quais provocaram
buscas, pesquisas, enfim, apropriação de conhecimentos, uma leitura, vários olhares
despertados. Diante dessa perspectiva, pode-se concluir que falta oportunidade, o não olhar
é fruto da falta de acesso. Ninguém provoca o gosto sem conhecer. Os guardas “foram
rompendo o trabalho alienado” (Argolo, 2005, p. 76). Segundo a autora, eles expõem a
emoção provocadas com o encontro com a arte. Além da emoção, o estudo da história da
arte vem a partir do olhar observador, muitas buscas, levam a pesquisar, a apropriação do
conhecimento em relação a observação em museu. A autora termina o artigo destacando o
processo:
Um grande desafio para os espaços educativos: acreditar na
sensibilidade e no afeto como produtores de conhecimento, na ordem e
na desordem como passíveis caminhos de aprendizagem; nas
diferenças, nas diversidades da vida e na problematização como fontes
de novas descobertas Argolo (2005, p. 83)
Essa perspectiva demonstra as possibilidades de construção de conhecimentos que
os sujeitos elaboram. O maior desafio é disponibilizar-se, considerando a dificuldade e
resistência do adulto em relação ao novo.
4 - RESULTADOS E DISCUSSÕES:
O Projeto desenvolvido buscou identificar a contribuição que a visita ao museu
realizada através da disciplina Arte em Educação provocou nos acadêmicos do curso de
Pedagogia. Foi realizada uma pesquisa em forma de questionamentos via on-line para os
acadêmicas já formados e presencial para os que cursaram a disciplina de Arte. Este grupo
constituiu-se de acadêmicas do 1º e 2º semestre 2006 e 2º semestre 2005 e egressos do 1º
semestre de 2005.
Os entrevistados totalizaram 55 acadêmicas. Houve a necessidade de usar o recurso
e-mail devido à dificuldade de encontrar os acadêmicos que não estão mais na instituição.
Os presenciais foram feitos com os que se disponibilizaram para responder enquanto ainda
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estavam comparecendo à instituição, a fim de buscar subsídios para atingir os objetivos
propostos na pesquisa.
Durante o processo de investigação encontramos alguns obstáculos, devido a
população alvo terem uma vida acadêmica e profissional intensa. Foi necessário insistir por
diversas vezes para que as respostas fossem entregues para elaborara conclusão da análise
de dados.
A realização das entrevistas em três turmas na instituição já citada causou, num
primeiro momento, reações, pois aventaram a idéia de não responder, mas após as devidas
explicações mostraram-se mais disponíveis e concordando em contribuir com a pesquisa.
Para melhor organizar os dados, optou-se em trazer as questões e analisá-las
separadamente.
De um modo geral, a idéia de museu para os entrevistados está relacionada à: “algo
antigo que traz alguma história”; “resgate de um momento histórico; antiguidade,
coleções”; “objetos de valor”. Porém esse universo parece estar longe, dos entrevistados
diante das várias possibilidades que um museu proporciona. Então, para que olhar o velho?
O que fazer? Enfim questões que mostram o distanciamento das acadêmicas. Em relação a
museu. Leite,(2005, p. 25) destaca:
Os museus, historicamente, foram criados por e para os setores
dirigentes, na maioria das vezes com objetivos provenientes de saques
e conquistas. Sua estrutura guardava, e suas mensagens ideológicas
objetivaram, a manutenção do status quo. O acesso era restrito a eleitos
mediante a argumentação de que o povo não se interessava pelos
instrumento de cultura, não sabendo comportar-se em museu.
É importante destacar que essa lógica foi construída historicamente, em que as
pessoas comuns não tiveram acesso aos museus. O gosto é produzido culturalmente e cada
sujeito é fruto dessa relação que foi construída no seu cotidiano. Nesse sentido, o museu foi
visitado com objetivo de quebrar a idéia do velho. A autora continua discussão e traz a
idéia do museu enquanto “depositório e de obras tão diversas quanto adversas, parecendo,
aos olhos de muitos, uma incoerência indemissível. Visto assim, tudo que é colocado no
museu, em vez de conservado, é condenado a morte por essa falsa idéia de objeto
inofensivo, inativo....” (p. 27). Assim o olhar de museu construído pelas acadêmicas foi
construído nessa lógica, estática e sem movimento que pode sem dúvida ser desconstruído.
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Quando se questionou: ao entrar em um museu o que mais chama atenção, percebeu-se o
fortalecimento da distância entre museu e as acadêmicas: “tudo organizado”, “cuidados
com o chão”; “grandiosidade do local”; “os detalhes e conservação das peças e a história
dos mesmos”. Acredito que essa expressão “grandiosidade do local”, expressa exatamente
um sentimento de distancia. Sobre essa questão conferir Argolo3 (2005) que mostra uma
experiência que traduz um outro movimento em relação a museu.
Diante dessa perspectiva, apontada pelas acadêmicas pode-se concluir que falta
oportunidade, o não olhar é fruto da falta de acesso, ninguém provoca o gosto sem
conhecer. A visita ao museu de alguma forma trouxe possibilidades, movimentos,
experiências e acima de tudo o acesso, ninguém gosta do que não conhece, “é no diálogo
com o outro e com a cultura que cada um é constituído, desconstruído, reconstruído,
cotidianamente. Leite (2005, p.23).
Através da disciplina percebe-se que dentre a maioria das turmas, poucos tinham
vivenciado experiência de visitar museus. Se o professor “não gosta”, ou pensa que “não
gosta”, como fazer para despertá-lo. Então, passa a fazer parte do Plano de Ensino viagem
de estudo em Museu. O local escolhido foi a Fundação Mundo Ovo da Artista Plástica Eli
Heil, principalmente para quebrar a visão do velho, do estático, do sem movimento enfim
quebrar o modelo de museu instituído pelas acadêmicas. A Escolha da Fundação deu-se por
várias razões: a primeira está relacionada à produção impactante da autora, as obras são
provocativas quebrando a idéia do “certinho”. A outra, foi em razão da localização do
espaço que permite vários momentos. O quintal apresenta diversas esculturas além do
Cemitério Adão e Eva, o Museu e o atelier da artista, além do contato com a artista que
acompanha pessoalmente toda a visita mediando com o grupo.
Foram muitos sábados de visitas e com uma variedade de acadêmicos, a cada visita,
muitas questões emergiam, principalmente relacionadas o feio e ao bonito, ao distorcido, à
reciclagem, à ousadia, e à diversidade. O contato com a artista durante a visita foi muito
positivo. A visita, mediada pela própria artista, com ajuda dos filhos também artistas, José
Pedro Heil e Tereza Heil, contribuem para a discussão e exploração das obras. Ao mesmo
tempo em que se observava a obra, a artista estava intermediando, provocando o olhar de
cada um, questões como: o que sentem? Emociona ou não? Houve muitas resistências em
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Museu, Educação e Cultura: encontros de crianças e professores com a arte, 2005
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olhar detalhes. Observar é isso, ao mesmo tempo em que emergia a curiosidade, existia a
preocupação em compreender o observado. Muitos olhares mudaram, com mais ou menos
intensidade, mas alguma coisa modificou, e o que efetivamente ficou diante dessa
experiência estética? Diante dessas questões perguntou-se: Qual a contribuição e os
significados da experiência de uma visita a Fundação Mundo Ovo? “Viagem ao mundo da
arte”, “adquirir mais conhecimentos em arte”, “observar”, “interagir, ser críticos”. Pelo
exposto, uma questão para reflexão: Pillar (2003) iniciou o artigo intitulado “A educação do
olhar no ensino da arte” fazendo os seguintes questionamentos. Se educa o olhar? Como?
Pode-se educar o olhar dentro da escola? Extrair significados do mundo visual? Em relação
ao olhar dentro da escola, para esse estudo tratou-se do olhar das acadêmicas do curso de
Pedagogia. A autora na discussão entre olhar e ver dialoga com vários autores e
referenciou-se a Zamboni que indica: “o ver não diz respeito somente à questão física de
um objeto ser focalizado pelo olho, o ver em sentido mais amplo requer um grau de
profundidade muito maior, porque o indivíduo tem, antes de tudo, de perceber o objeto em
suas relações com o sistema simbólico que lhe dá significado”. A perspectiva do olhar de
cada um em relação à visita ao museu mostra que a relação que cada um estabeleceu foi a
partir das suas experiências individuais e coletivas, seus contatos, suas histórias enfim, a
caminha percorrida por cada um. Porém, mesmo que o contato com o museu tenha sido
pequeno as questões respondidas anteriormente indicam uma perspectiva do velho.
Considerando essa perspectiva, o olhar para a experiência da Fundação Mundo Ovo já foi
impactante na medida em que quebra o modelo construído socialmente. No dizer de Coli
apud Leite (2005, p. 24), “não é apenas necessário termos acesso às artes pelos álbuns, pelo
rádio (...); é necessário também ir a museus, a concertos, a teatro, a cinema, a exposições. É
necessário visitar monumentos. É necessário poder ler”. Essa é a diferença para os
acadêmicos, o estar presente e perceber diferenças para desmistificar uma visão. Os
significados se consolidam através das experiências de cada um.
Ao serem questionados sobre a importância da visita ao museu proporcionada pela
disciplina e acompanhados pela artista mudou a idéia que tinham de museu? A maioria
aponta para mudanças e que a visita impressionou pelo colorido das obras. As obras no
quintal vão contando a trajetória da artista. A construção do olhar para o grupo de
acadêmicas ocorreu com a visita, chegando lá, com a observação, o contato com a artista,
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surgiram às impressões e curiosidades. Para Leite (2005, p.46), “Cada passeio, cada visita,
cada experiência suscita no contemplador sensações e indagações únicas: desperta desejos,
abre portas para novas buscas e isso não poderia ser desperdiçado, encolhido. È o ponto
central do transbordamento, tanto crianças, quanto dos educadores...” ainda no raciocínio
da autora desperta nos acadêmicos da disciplina que também são educadores.
A seguir, a questão solicitada aos acadêmicos referiu-se às impressões das obras
observadas durante a visita na Fundação Mundo Ovo – Eli Heil. As obras da artista
apresentam um universo colorido, povoado por estranhas criaturas. Apresenta símbolos de
fertilidade, úteros, ovários, barrigas, e ovos. O vermelho aparece para simbolizar o sangue
do parir, o sofrimento para nascer e ou renascer4. Ao chegar ao museu reações como:
“choque com as formas das figuras e as cores usadas”; foram como um susto para a maioria
dos acadêmicos, Interessante observar que o choque nem sempre é manifestado através das
palavras, porém observou-se os olhares, as conversas entre elas e até que alguém se
“encoraja”, e comenta com a professora que não está acostumada, que as formas
deformadas assustam. Porém, vivida a experiência da observação, o diálogo consigo
mesmo, vai permitindo ao observador o processo de apropriação da obra. Já no final da
visita, ou mesmo na aula seguinte destacam questões tais como: “análise e compreensão das
obras e o pensamento da autora”, “São obras maravilhosas e importantes, representam a
caminhada da artista”, “as obras expressam – inspiração”, “relato do cotidiano da autora”,
“a artista faz das obras como se fossem um filho”; “é vida” “são fortes e vibrantes”. Esses
fragmentos relembram o artigo de Ostetto (2005) intitulado “De luzes e de vôos: em busca
da beleza para ser humano, quando se refere as instalações dos artista alemães; que me
permita a autora em comparar sentimentos das acadêmicas diante das obras de Eli Heil:
Imagens. Informação. Não saber. Implicação. Desejo. Imaginação.
Essencial foi estar lá, vendo, sentindo pensando estranhando,
perguntando, compreendendo, sonhando, compartilhando o espanto,
rompendo limites. A arte pode levar-nos até onde nosso controle perde
o domínio. Basta querer, deixar-se tomar pelo convite da obra – a
imagem está sempre nos chamando. Ouvimos sua voz atendemos ao
seu pedido? Imaginamos-voamos?
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Sobre a artista plástica e suas obras ver: Construtores das artes visuais, 2005 e Vomitando Sentimentos,
2000.
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Esse processo relatado pela autora e as impressões das acadêmicas revelam a
importância do olhar, da observação e da permissão que são elementos importantes no
processo de apropriação. Pillar (2003, p. 75) ao referir sobre imagem: “Há múltiplas
definições de imagem. A imagem é, hoje, um componente central da comunicação(...)”.
Essa comunicação que precisa ser permitida e provocada desmistificando o modelo imposto
pela sociedade dividida em classes em que os acessos são para poucos.
Em relação à contribuição da disciplina de artes, muitas das respostas ficaram vinculadas à
visita ao museu como: “desenvolve a sensibilidade e observação”; “respeito”,
“desmistificar a idéia de museu” Para as questões incompletas ou que não tenham atendido
os objetivos, não houve tempo de retomar com as acadêmicas para complementar. Além
dos relatos das entrevistas muitas impressões no período de desenvolvimento da disciplina
foram registradas e contribuem para as análises.
No desenvolvimento do trabalho, as questões acima foram contempladas, porém
destaca-se a importância da observação como elemento diferenciador no museu. Nesse
sentido não podemos esquecer que o próprio espaço foi provocador. Segue um depoimento
de uma acadêmica no sentido de ajudar a compreender esse processo:
Sou educadora já faz algum tempo, confesso nunca tive um olhar
voltado para arte e hoje posso perceber o quanto esse conhecimento é
importante para a construção de cada indivíduo. (...). Ao chegar ali,
bem no início, tudo me pareceu muito estranho inusitado porque tanto
vermelho e um cemitério de Adão e Eva? (...). Chamou-me atenção o
fato de que todas as paredes da casa eram decoradas pela artista.(...)
Ainda não sei se tenho um novo olhar mais aprendi, olhar com calma
(...).
O depoimento revela a permissão para observar: “cada passeio, cada visita, cada
experiência suscita no contemplador sensações e indagações únicas; desperta desejos, abre
portas para novas buscas – e isso não poderia ser desperdiçado, encolhido. É o ponto
central do transbordamento, tanto de crianças, quanto dos educadores. (...)” Leite, (2005,
p.46). a autora ainda destaca a importância das exposições no sentido de estar presente.
“Freqüentar exposições amplia o repertório imagético – sonoro, visual, corporal – de todos.
Independente de gênero, etnia, credo, classe social ou idade, é parte de sua formação, sedo
assim , antes de tudo, um direito. (...)”. Leite (2005, 51)
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Através dos relatos constatou-se que a disciplina de Arte é de extrema necessidade
acadêmica para o enriquecimento da prática pedagógica. A saída de estudo ao museu
Fundação Mundo Ovo traçou um perfil interessante para análise, em que os acadêmicos
confrontaram conceitos pré-estabelecidos sobre museu e puderam desmistificar a idéia de
velho para novas possibilidades de interação que ao contrário de estático se depararam com
movimento.
5 - CONSIDERAÇÕES FINAIS:
Ao concluir a análise dos dados coletados foi possível perceber pelos relatos, que a
maioria das acadêmicas trouxe perspectivas diferentes em relação a museu. O que era visto
como algo antigo, velho e até mesmo distante modificou-se na medida em que foram
oportunizadas a visitar um museu. A própria características da Fundação Mundo Ovo se
coloca com outro movimento. Depara-se então com uma questão fundamental que se
coloca em discussão que está relacionada à provocação, ou seja, ninguém gosta do que não
conhece e para isso é necessário oportunizar o contato.
Durante a visita percebeu-se que no primeiro momento as acadêmicas estavam
retraídas fechadas e no decorrer da visita foram se soltando, interagindo com as esculturas
no quintal o que foi provocando o olhar, a curiosidade e o olhar mais atento e observador.
Verificou-se que a experiência vivenciada trouxe muitos fatores positivos quanto ao
estímulo, a visita em museus ampliou pois a visão de mundo, proporcionou aquisição de
conhecimentos, despertou o interesse pela Arte, definiu que as mudanças são possíveis e
nesse sentido o gosto pode ser desenvolvido.
Ficou evidenciado que a disciplina de Arte é de grande importância, pois contribuiu
para ao vivenciar e experiênciar, exercitar o olhar.
Sendo assim, a pesquisa realizada detectou o quanto é necessário para a formação
acadêmica a sustentação teórica, relacionada à prática pedagógica no sentido de confrontar
posturas.
Esse recorte para a pesquisa surgiu da inquietude em relação às resistências
mostradas pelas alunas e a própria falta de conhecimento em relação aos espaços culturais e
como se dá o acesso.
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Em relação ao objetivo de identificar a contribuição da visita ao museu provocada
pela disciplina às acadêmicas permitiram-se ao desafio. Evidenciou que esta visita foi além
do proposto, pois além da provocação de observar, provocar o olhar e viver a experiência
entre o olhar e analisar o que percebe. As acadêmicas se permitiram e na permissão se
desafiaram. Até o final da disciplina muitas relações foram estabelecidas e outras foram
criadas. As viagens de estudo são importantes, pois permitem a cada um a apropriação de
novos conhecimentos.
Apenas um único objetivo não foi atingido, pois se tratou de verificar a contribuição
na prática pedagógica e quais os elementos que desencadeiam na prática cotidiana. Essa
última questão ficou impossibilitada de ser investigada porque não houve tempo. Algumas
ações foram desenvolvidas em escolas, alguns convites foram feitos para acompanhar
atividade com os alunos, porém em função dos horários e dias o acompanhamento não foi
possível. É possível, porém, a continuidade dessa pesquisa na tentativa de analisar os
desdobramentos da prática pedagógica.
6. REFERÊNCIAS
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BRASIL. Lei de Diretrizes da Educação Nacional. Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de
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FERREIRA, Sueli, (org). O ensino das artes: construindo caminhos. Campinas, SP:
Papirus, 2001.
FUSARI, Maria F. de Resende e & FERRAZ, Maria H. C. de T. Metodologia do Ensino
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HEIL, Eli. Vomitando sentimentos. Florianópolis: fundação Mundo Ovo de Eli Heil,
2000.
KRAMER, Sonia. Produção cultural da educação: Algumas críticas sobre educar em
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