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Notas de Programa : « Anamorphoses », 1/2
Nr. 4
«Anamorphoses»
(para orquestra)
“Seguiu-se « Anamorphoses », de
Pedro Amaral, página que se caracteriza por um
grande rigor de construção (…) começando a
ocupar um lugar no repertório (…).”
Cristina Fernandes, Público
(Lisboa, Outubro, 2005)
De raízes gregas, a palavra descreve, como é sabido, a deformação de uma
imagem em virtude do seu reflexo num sistema óptico não rectiforme.
Ao longo de toda a história da música, os compositores têm sido
confrontados com o problema da reaparição dos mesmo objectos sonoros ao
longo de uma mesma obra. Soluções diversas emergem, mais ou menos
ciclicamente, elegendo uma maior ou menor facilidade de reconhecimento, à
audição, desses objectos-chave. Por vezes, como em certas fugas de Bach,
as concepções cruzam-se, e um tema, cujas imagens se mantiveram
imutáveis, transpondo-se de voz para voz, de tonalidade para tonalidade,
sofre subitamente uma modificação: os intervalos invertem-se, o carácter
altera-se, a percepção modifica-se radicalmente. É precisamente um
exemplo, ainda que relativamente simples, de anamorfose. Outras vezes,
como em alguns ciclos de variações de Beethoven, os objectos tornam-se,
pouco a pouco, tão profundamente desenvolvidos, numa alquimia incessante,
que quando chegamos ao fim não encontramos já qualquer relação
directamente audível com aquilo que nos tinha sido dado como ponto de
partida.
Em certo sentido, esta pequena obra é uma exposição contínua dos mesmo
objectos , cruzada por um cortejo de variações em permanente
transformação, fazendo suceder estados diversos da mesma matéria. Cada
grupo, no interior da orquestra, desenvolve uma matéria própria, que se
projecta, em seguida, como numa estranha e mágica sala de espelhos, das
mais diversas maneiras, sob as mais diversas aparências, sofrendo, em
suma, os mais diversos graus de anamorfose.
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Notas de Programa : « Anamorphoses », 2/2
Devem essas transformações ser imediatamente perceptíveis e r econhecíveis? Depende da maior ou menor capacidade técnica e precisão dos
intérpretes relativamente à interpretação do texto e, sem dúvida, da maior ou
menor perspicácia dos ouvintes. Algumas estão de tal forma dissimuladas
que apenas uma pluralidade de audições, uma memória morosamente
nutrida através de um contacto repetido com a obra, poderia clarificar.
Outras, pela sua evidência, podem talvez ser descobertas numa primeira
abordagem.
Tendo sido dirigida por diversas orquestras e maestros (Renato Rivolta, Mark
Foster, Muhai Tang, Michael Zilm) « Anamorphoses » constitui,
simultaneamente, uma encomenda do Festival Internacional de Música de
Macau e a minha peça de final de curso, em 1998, no Conservatório
Superior de Paris.
Pedro Amaral