Relatório moral do escritório da associação do CIEN
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Relatório moral do escritório da associação do CIEN
Relatório moral do escritório da associação do CIEN “É necessário avançar no campo social, no campo institucional, e nos preparar à mutação da forma da psicanálise. Sua eterna verdade, seu real trans-histórico não serão modificados por esta mutação. Ao contrário, eles serão salvos, se nós compreendermos a lógica dos tempos modernos”. (Miller, J.-A “Le neveu de Lacan, p.124) Na introdução da primeira assembléia geral de nossa associação, do centro interdisciplinar da infância, parece importante redefinir seu objeto tal como ele foi estabelecido no artigo 1, de nosso estatuto. Esse objeto é a psicanálise e se efetua pela pesquisa, pelo ensino e pela formação. Mas sua aproximação se especifica em ser interdisciplinar e em inserir suas atividades como parte importante no campo freudiano, tal como foi definido por Jacques Lacan e a orientação de seu ensino. A associação no artigo 2 , de seu estatuto define também seus meios de ação, que consistem em favorecer o progresso da pesquisa e ajudar psicanalistas, trabalhadores sociais e da saúde mental, professores, médicos, juristas e juízes, especialistas das disciplinas das ciências humanas, pesquisadores e estudantes, colocando à disposição destes locais, equipamentos, bibliotecas e serviços. Nós teremos que examinar durante essa primeira assembléia uma parte desse artigo 2 que, por cautela, ainda não tínhamos colocado em ação na sua totalidade, ou seja, divulgar “o conhecimento da teoria analítica e as ajudas, que esta pode receber das disciplinas ligadas à infância através de estágios, cursos, conferências, colóquios, laboratórios e encontros nacionais ou internacionais. A associação organiza cursos de formação permanente e edita publicações1. Assim, se temos organizado jornadas locais e um colóquio nacional do CIEN, e difundido uma longa parte de nossas publicações, como também no número 64 da “Revue de la cause freudienne: Freud e a juventude,2” nos resta discutir se podemos sustentar de maneira eficaz e rigorosa cursos de formação permanente ou jornadas de formação, onde a dimensão interdisciplinar seria ainda trabalhada. A associação do CIEN na nossa modernidade A apresentação do novo anuário dos laboratórios do CIEN francophone3, durante a reunião geral dos laboratórios do CIEN, na ocasião das XXXV jornadas da ECF em Paris, no dia 22 1 Estatuto da Associação do CIEN, artigo 2. La cause freudienne, Última revista de psicanálise « Freud e a juventude », Navarin editor, outubro 2006, n◦64. 3 O CIEN desde a sua criação em 1996, por Jacques-Alain Miller e Judith Miller, cada ano edita um anuário dos seus laboratórios sob a responsabilidade do responsável de cada laboratório. 2 de outubro de 2006, nos permitiu de extrair vários pontos4, colocando em evidência a vivacidade dos laboratórios do CIEN, sua diversidade, acentuando certas armadilhas a serem evitadas. Assim, no outono de 2006 o CIEN tinha 35 laboratórios declarados, 09 laboratórios em formação e 04 laboratórios em projeto. Nosso último anuário mostra que a interdisciplinaridade está no coração do Cien, ela não deve ser confundida com a pluridisciplinaridade. A inter-disciplinaridade, que é a base da criação da unidade do laboratório, é também aquela que, partindo da oferta elevada de reunir em torno de um tema de pesquisa, os parceiros de outras disciplinas, lhes dando a chance de encontrar lá, material para aprender com as experiências e as práticas de cada um. Assim, o laboratório é nosso meio de ação essencial. O traço da união da inter-disciplinaridade ilustra o fato que o dispositivo do laboratório se estrutura em torno de um lugar deixado vazio, lugar de “saber não saber”5, que não existe apenas pela presença do discurso analítico e que não deve ser sustentado pelo psicanalista, mas no melhor, orientado pela sua presença real, visando a obter um mal entendido, necessário a uma elaboração provocada por vários. Este lugar vazio é garantido pela circulação, no quadro do laboratório, dos diferentes tipos de discurso reunidos em torno de uma pesquisa, justamente envolvendo pontos de impasse específicos destes discursos. Nós estamos lá para aprender a partir da disciplina do Outro. Aqui, o alvo é de circular o uso destes discursos, de tornar viva a língua que os sustenta e de saber criar os momentos onde podemos fazer valer a língua ambígua e equívoca, apenas capaz de fazer circular o uso do sujeito. É este uso, dos diferentes discursos, que evita cair no “clínico demais” ou “o dito controle da prática” ou “o grupo terapêutico”. Se há um controle, ele se deduz no après-coup do processo de conversação interdisciplinar que anima os debates, não perdendo de vista a orientação do laboratório, cujo objetivo de pesquisa foi definido na declaração anual do laboratório, no escritório da Associação. A conversação interdisciplinar Assim, o CIEN, cuja prática é aquela da conversação, não pretende promover uma clínica, mas permitir uma conversação entre o discurso analítico e os discursos das outras disciplinas que têm um mal dizer, para encontrar lá a felicidade de outras palavras encontradas na troca. Desta forma o efeito de transformação do laboratório do CIEN, como testemunham vários dos nossos parceiros engajados nos laboratórios. Particularmente, a clínica releva da ECF, das 4 As revistas que foram citadas ao longo desta reunião são: Mental - Psychanalyse et ordre publique, Revista da NLS, oct 2006, n◦ 18; La cause freudienne – Freud e a juventude , oct 2006, n◦ 64; e Le diable probablement, autonne/hinver 2006, n◦ 1. 5 Expressão de Virginio Baio. escolas da AMP, sem as quais o CIEN não existiria, das seções clínicas ou do CEREDA, mas não do CIEN. A conversação interdisciplinar, além de particularizar o trabalho no laboratório, inaugurou um novo modo de laço social, com certeza orientado pela psicanálise, mas permitindo, sobretudo, a muitos dos parceiros encontrados, entender e medir os efeitos de uma psicanálise além do Édipo, que se orienta pelo real próprio de cada um. Este real está próximo para o sujeito a partir do seu dizer e no quadro preciso de uma clínica sob transferência, estabelecida graças à presença de um psicanalista e no quadro de uma cura particular. É evidente que a maioria dos laboratórios percebem, nos seus diferentes trabalhos, as conseqüências do último ensino de Lacan, muito atual nesta modernidade irônica6, onde o saber do Outro é colocado em questão, provocando efeitos devastadores na maneira pela qual as crianças e os adolescentes nodam seu corpo vivente à língua que eles habitam. É o que demonstram todos os numerosos laboratórios, trabalhando sobre a escola, e também sobre as numerosas instituições de ajudas/tratamento e justiça: todos sensíveis a esta crise da linguagem contemporânea, desta modernidade irônica na qual o CIEN encontra seu lugar, que modifica a maneira pela qual as crianças e os jovens falam e vivem seus corpos. Esses são os diferentes testemunhos que os laboratórios recebem, quando sabem se fazer destinários das pessoas as quais se endereçam, quer seja a partir das pesquisas com os educadores, ou em contato direto, a partir da conversação mantida nos diferentes lugares institucionais, onde vivem estas crianças, a fim de receber a transmissão de um saber necessário à sua maturidade7. Assim, a unidade do laboratório e sua inscrição no campo social, mais freqüente no coração mesmo do campo institucional, recebendo as crianças, permite alcançar os avanços do CIEN e nos preparam para o melhor, para o saber fazer com a mutação dos diferentes discursos, que freqüentemente visam enquadrar a criança nos impasses dos quais não podem sair, mas que, através do CIEN, a parte sintomática é revelada. As conversações estabelecidas com essas crianças, a partir de seus impasses lhes permitem, então, “nomear uma parte do nome de seus sintomas8”. É o que, então, oferece a possibilidade de fazer valer de outra maneira, aquilo que pode trazer a uma criança, a entrada num discurso analítico com um psicanalista. O CIEN encontra aí, seu justo lugar como aquilo que pode favorecer à colocação de condições, para que seja autentificada uma verdadeira demanda da criança, 6 Expressão de Jacques-Alain Miller retomada no texto de Philippe Lacadée : “A modernidade irônica e a Cidade de Deus”, na revista de la cause freudienne n◦ 64, originário da conferência apresentada em Belo Horizonte, onde os laços do CIEN foram estreitados. 7 Em breve será lançado um livro pelo CRDP em Bordeaux, a partir do trabalho do laboratório “Le pari de la conversation”. 8 Expressão utilizada por Alexandre Stevens, assessor do CIEN, durante uma conversação aberta ao público, ao comentar a brochura do laboratório “Le pari de la conversation”. saindo de sua própria palavra, e não mais predicada como medida de controle da parte impossível, que volta ao sujeito pelo fato deste saber nomear. “No CIEN, a resposta é adquirida, o que implica ser colocada permanentemente em questão: ela se elabora sob medida nos laboratórios, sempre diferente e diferenciada graças à troca interdisciplinar, sem ter preconceito do dizer e do fazer de cada um. A excelência do princípio sob medida se baseia na sua precisão: ele induz em cada laboratório uma prática paradoxal, de não dispor de outra unidade se não a unicidade dos sujeitos com quem se engaja a conversação que entrelaçam as várias formações e especializações. Na esfera do Um por Um, ninguém se adapta, cada um é adotado9”. Se nós soubermos entender “a lógica dos tempos modernos”10, então o CIEN terá sua parte naquilo que seria salvo, o que faz o coração da prática psicanalítica, ou seja, o encontro de um psicanalista e a dimensão da transferência. A opinião dos laboratórios O laboratório de Tonneins, por exemplo, que fala de plurisdisciplinaridade, nos testemunha a sua dificuldade em abandonar “o clínico demais”. Não se trata de proibir o recurso de ter as vignetas clínicas, como foi dito durante uma reunião do CIEN em Bordeaux, mas de se servir destas vignetas para que cada um saiba melhor o que fazer com a prática de sua disciplina, o que não impede às referências que nos traz o esclarecimento da descoberta de Freud e o ensino de Lacan. A partir de sua unidade, o CIEN soube criar modalidades de conversação em contato direto com o campo social, que releva do ensino, das instituições de tratamento ou de educação, de locais de prevenção, da justiça, etc. A via do CIEN é de sempre cuidar da ampliação da conversação com os outros atores sociais, que freqüentemente a partir de seus pontos de impasses, demandam encontrar um lugar, ajudando-lhes a transformar seus impasses em questões, e mais adiante em objetivos de pesquisas interdisciplinares. Isso torna possível, por exemplo, o estudo de significantes obscuros, que são cada vez mais veiculados no nosso mundo de avaliação e controle, onde o maior risco é de ver desaparecer a importância da palavra, da língua articulada e a dimensão do dizer. É, de fato, este dizer, o que enuncia um sujeito que está atualmente em perigo, na medida em que este dizer é cada vez mais desacreditado. E como enuncia Lacan: “não há sujeito senão do dizer11”. Os laboratórios do CIEN são os lugares onde cada disciplina pode 9 Miller, J. editorial do jornal “Terre du CIEN”, n◦19. Miller, J.-A. “Le neveu de Lacan”, p.142. 11 Lacan, J. Le Séminaire, livre XVI “D’um Autre à l’autre”, Paris, Seuil, 2006, p.66. 10 testemunhar e depois fazer valer a dimensão (dit-mension) subjetiva e o respeito ao sintoma particular de cada um. Lá onde, cada parceiro fica sensível ao sofrimento ou a palavra da criança, mas não tem lugares onde possa falar, para saber como se desembrulhar sem depois se embrulhar nas respostas pré-estabelecidas, válidas para todos e negando a particularidade de cada um, é responsabilidade do CIEN saber criar laboratórios nesse sentido. Pois, se existe uma verdade que se fala, existe uma outra “da qual se sofre”12 que não se diz como tal, exceto no dito distúrbio do comportamento ou numa passagem ao ato, mas “que é um fato, ou seja, que procede de um dizer”13 que não demanda apenas ser entendido. Eis o que nos permite elevar todo distúrbio de conduta ou do comportamento à dignidade de uma pantomima relevado de um texto que se escreve sem que o sujeito saiba que não é outra coisa senão o produto. Desde então, devemos estabelecer as condições de leitura desse texto como demonstra nossas conversações com as crianças. “Os analistas do campo freudiano, trabalhando nos laboratórios do CIEN, poderão fazer parte deste trabalho no quadro dos encontros PIPOL 3, como um trabalho - não clínico mas tendo como tarefa se colocar no mundo contemporâneo – denunciando os entraves que fazem obstáculos e os falsos semblantes que querem que estes se calem – um espaço onde o inconsciente tornar-se escutado. Por isso, o inconsciente deve ter um destinatário.”14 Os laboratórios e “a lógica do tempo moderno”: a conversação esclarecida frente aos significantes obscuros Os laboratórios do CIEN são os lugares que participam da instalação de um lugar onde o discurso do inconsciente encontra o seu destinatário. Sem fazer clínica, o CIEN tem uma prática que trata “o soucial”15. Aliás, é importante que as brochuras do CIEN se multipliquem para fazer reconhecer o discurso analítico. Temos como exemplos todos estes significantes obscuros que reduzem os sujeitos a objetos – tais como “os hiperativos”, “os delinqüentes”, “os psicopatas”, etc. Os objetivos de pesquisa devem se preocupar em saber como eles apareceram, quais são os seus propósitos e como responder de outro modo senão pela simples denúncia? Alguns trabalhos desses tipos foram conduzidos pelo laboratório franco-búlgaro sobre os delinqüentes, ou ainda pelos laboratórios de Bordeaux e Tournai. O objetivo destas 12 Idem, p.69. Idem, p.69. 14 Comentário de J. Miller durante a reunião dos laboratórios no outono de 2006. 15 Expressão inventada por Martine Matteudi Gorrech e retomada por Philippe Lacadée no seu livro: “Le malentudu de l’enfant”. 13 pode ser duplo: encontrar um modo pelo qual o CIEN possa responder a estes significantes e reintroduzir a causalidade psíquica, lá onde ela desaparece. Um dos ensinos do CIEN é realizar como se pode sustentar, passo a passo, os avanços dos GRP16, mas também a arte das conversações nos diferentes lugares, onde o CIEN é convidado a fazer pontualmente, o mais regular das conversações a fim de permitir mudanças decisivas para algumas crianças em fracasso escolar ou tomadas por provocações linguageiras ou momentos de agitação. É esta a arte da conversação17 que Ariane Chotin deu depoimento na jornada do CIEN em Saintes. Esta leveza de intervenção não pode cair na armadilha de tornar-se uma solução terapêutica típica de grupos de palavra, valendo para todos, mas devese fazer valer aquilo que é a especificidade do CIEN, ou seja, “a aposta da conversação” que faz de modo que seja favorecida a dimensão da tomada de risco da palavra, cujo objetivo é “desamarrar as identificações”18 mais ou menos obscuras, algumas das quais petrificam os sujeitos que nós encontramos. Pudemos ver, também, ao longo destes dois anos, como certos laboratórios aceitam se transformar, inscrevendo-se em contrapartida, ainda mais à “lógica dos tempos modernos”, assim, os laboratórios de Lyon estando abertos ao público, criam o laboratório interlaboratório “novas formas de fazer família” que funciona como um seminário aberto ao público, assim, podemos ler os trabalhos no excelente dossiê do TDC n◦19 “atenção crianças”19 e também na crônica “Novos sem família”. O seminário dos professores também aberto ao público de Bordeaux, mudou seu nome para evitar o equívoco de seu título e se reestruturou reagrupando dois laboratórios: a aposta da conversação que intervém diretamente nos lugares escolares e solicitados; e Serendipity que é o laboratório dos professores, onde estes vivenciam uma conversação entre eles próprios. Esses dois laboratórios mostram os seus resultados a céu aberto cada ano, organizando uma jornada do CIEN em Bordeaux sobre o ensino. Quando alguns laboratórios param: uns o fazem de maneira triste, sem testemunhar, sem que os impasses encontrados sejam formas de aprendizagem para eles e outros, a fim de que melhor repercutam em outros lugares e surjam sob outras formas igualmente eficaz. 16 Grupo de reflexão na prisão criado por Valèrie Lauret e Philippe Lacadée. Chotin Ariane, Le mot de passe – D’une langue l’autre , trabalho apresentado na jornada do CIEN em Saintes, retomado e publicado no Vacarnes n◦ 38, Les lois de l’hospitalité, inverno de 2007. 18 Expressão utilizada por Eric Laurent, assessor do CIEN, ao comentar a brochura do CIEN, durante a conversão do II Colóquio do CIEN em Paris. 19 Dhéret, J. La protection de l’enfant ; Marcepoil, Soutenir une décalage ; Geofroy Adéle, De l’évaluation au soci thérapeutique dans un centre maternel ; Et la formidable rencontre avec Muriel Eglin : une institution décalée. 17 Outros laboratórios, ao contrário, param para se colocar “em espera” como, por exemplo, “109”, fazendo assim, valer o fundamento de seu nome, sustentado pela língua equívoca o que faz a partir daí, esperar e escutar “sangue novo”. Em Lausanne, uma recente reunião do laboratório “O que faz desordem nas instituições”, que desejava parar, pôde valorizar, em presença do vice-presidente do CIEN, que lá onde pensava haver um impasse, ao contrário, foi possível encontrar uma via para a criação de quatro novos laboratórios, permitindo a partir daí que cada um se orientasse na direção de novos objetivos de pesquisa mais definidos e fazer apelo a novos parceiros. Outros laboratórios “procriaram” como aquele de Saint-Nazaire, que permitiu a criação de um novo laboratório em Nantes ou como o primeiro laboratório franco-búlgaro, que fundou um novo laboratório sobre os adolescentes. Notamos também a criação de um laboratório em formação em Limoges, depois da greve dos estudantes dos liceus, e a criação de laboratórios em formação diretamente ligados à “lógica dos tempos modernos”, como mostra claramente aquilo que está acontecendo em Rennes, onde estiveram a presidente e o vice-presidente do CIEN. Uma nova rubrica apareceu no anuário, testemunhando a viva-cidade do CIEN: aquela dos laboratórios em projeto, que freqüentemente são fundados a partir de conferências feitas recentemente nas cidades da França, como por exemplo, Valence, Angers, Niort, Liége, etc. O CIEN do ponto de vista da Bulgária 20 Philippe Lacadée me propôs dizer algumas palavras sobre o “CIEN do ponto de vista da Bulgária”. Eu gostei da idéia e a adotei. Do ponto de vista da Bulgária, o CIEN com os seus três laboratórios ativos, abriu uma via de aproximação radicalmente nova do sofrimento das crianças e dos adolescentes, submetidos a diversos tipos de segregação. Primeiro tipo: uma segregação material e simbólica, mantendo crianças abandonadas em instituições nomeadas “Maisons mère et enfant”21 por razões ditas médicas. Resultado: crianças sem mães; instituições dirigidas de acordo com normas higienistas; terapeutas desvalorizados no seu trabalho. Uma nova aproximação: Crianças “crescidas sem pais” - 20 Apresentado por Daniel Roy. Nota do tradutor: Optei por deixar em francês no corpo do texto por tratar-se de um tipo de instituição. A tradução dos termos “maisons mères et enfants” seria “casas mães e crianças”. 21 partimos desse fato e vamos elaborar juntos as ferramentas, para permitir que as crianças inventem seus próprios meios e seus limites, as “marcas de sua diferença”22. Segundo tipo: uma segregação baseada na deficiência. Resultado: as equipes educativas submersas pelos problemas da violência e da “sexualidade”, retorno no real de uma foraclusão da posição do sujeito. Uma nova aproximação elaborada a partir de seis anos de trabalho, do laboratório precedente: consideramos a criança com os seus sintomas como um cofre precioso, onde ela fechou o seu desejo; elaboramos juntos uma clínica que permita a criança condensar e traduzir o real sobre o qual ela se encontra e autorizamos a criança a fazer sua educação sozinha e conosco. Terceiro tipo: uma segregação “moderna” traçada pela proliferação dos objetos, roubo, prostituição, drogas, gravidez na adolescência. Resultado: as crianças e os adolescentes entregues ao mercado, ganhando a própria vida ao preço da sua própria pele ou do “produto”. Uma nova aproximação: responder “entre vários” a questão “o que dizer ao adolescente delinqüente”, partindo, então, da constatação de que nessas situações o dizer já é excluído e que é necessário einventá-lo em todas as suas peças, pois ele não é um pressuposto; daí a inanidade dos pactos, contratos, e outros “quadros”, e a necessidade de partir da língua do sujeito, para encontrar para ele um lugar no discurso comum. Eis como vemos o CIEN do ponto de vista da Bulgária: “um céu constelado”23. O Colóquio do CIEN em Paris em 20 de maio de 200624 O colóquio do CIEN de 2006 reuniu mais de trezentas pessoas: “jornada densa, num dos mais antigos teatros de Paris, o Déjazet, boulevard du Temple, ao redor da praça da Republica. Desde de manhã numerosos são os que se deslocaram, vindos de Paris, da província e da Bélgica. A livraria dirigida por três estudantes esforçados não esvaziava, o bar gerido por duas jovens atentas também tornou o ambiente cheio de efervescência. Esta não diminuiu ao longo da jornada, rumo seguido pelas mesas onde os palestrantes e os convidados intervinham, esclarecendo, cada um no seu estilo, o espírito do CIEN, o espírito cujo título da jornada:“eu chamo isso de primavera” e o argumento do vice-presidente foi lançado”25. Jornada conduzida sobre a linha de uma pesquisa, cada vez mais exigente, inventiva em torno da adolescência, que soubemos transmitir a partir do próprio passe de Jacqueline Dhéret e 22 Título da última publicação do laboratório “Crescer sem os pais”, disponível no escritório do CIEN. Lacan J. “Lituraterre”, Em: Autres écrits, Editor Seuil, Paris, 2001. 24 Colóquio organizado por Ariane Chotin, Danièle le Dantec, Françoise Labridy, Normand Chabot e Philippe Lacadée. 25 Chottin Ariane. 23 Laure Naveau, a partir da experiência destas e do trabalho do laboratório de Philippe Cousty, Jocelyne Huguet Manoukian, Jean-Pierre Denis, Jean Luc Mahé, Claire Piette e Anne Ansermet, e também a partir do trabalho conduzido no CPCT por Dominique Miller. Jornada que soubemos esclarecer com bela vivacidade, junto aos nossos convidados: Anne Tristan, Noelle de Smet, Victoire Patouillard e Pierre Zaoui. Jornada enfim com seu “golpe de cena” no momento da seqüência animada por Amélie Armao e Anne Massé, que reuniu três adolescentes que apresentarem um trecho de seu próprio trabalho teatral. O mais singular das práticas, colocadas em lugar de honra nessa jornada repercutiu no número especial do eletrocien do mês de junho. “Naquele dia o mundo dos adolescentes apareceu em cena, é vivo, é vivente!”26. “O trecho da peça teatral, retomando o argumento do colóquio, representa uma das formas do “dom da palavra”27 que se presta a encontrar o lugar e a fórmula”28. Em todas as intervenções, a questão do “bem dizer”29 foi presente, o valor para cada um do uso inventivo da sua língua privada, sua língua de gozo que entrelaçada à língua do Outro “dá ao sintoma sua dimensão de laço social”30. Na apresentação do CIEN, atrás do boletim de inscrição deste colóquio, Judith Miller falou de uma comunidade de trabalho estruturada em torno de um dispositivo original – o laboratório de pesquisa, tendo como coluna vertebral a orientação lacaniana. “No dia 20 de maio essas palavras foram particularmente adequadas: a jornada fazia ressoar em toda sua amplitude, esta orientação que nutria as dimensões de acolhimento e de pesquisa tão queridas ao CIEN desde a sua criação”31. Queremos, também, agradecer especialmente Christiane Alberti, por ter publicado no número 64, alguns textos do colóquio que se transformaram em textos de referência, precisamente os testemunhos de dois AES da ECF, que foram convidados a falar de sua adolescência: Jacqueline Dhéret e Laure Naveau, e, também, os trabalhos de dois professores: Pierre Zaoui e Noelle de Smet sobre a angústia dos estudantes do liceu. As jornadas organizadas por alguns laboratórios em diferentes regiões A jornada de Lausanne foi um grande sucesso, pois estava aberta aos convidados da cidade e parceiros de outras disciplinas. Seu sucesso foi devido também ao fato desta ter sido organizada por dois laboratórios e, assim, pudemos ouvir os trabalhos dos membros dos 26 Frattura Betina. Laurent Eric Em : Jornada do CIEN em Buenos Aires. 28 Rimbaud Athur, Vagabonds, Em :Œuvre-vie, Editora Arléa. 29 Chaveronnier Christian. 30 Sylvestre Grand Marie Josée. 31 Chottin Ariane. 27 laboratórios32, que souberam demonstrar o interesse pela pesquisa interdisciplinar, já que os trabalhos foram preparados no quadro da unidade de um laboratório. A jornada de Saintes “Os caminhos da adolescência entre o urbanismo e urbanidade”, particularmente bem sucedida por estar em contato direto com a vida política e associativa, por ter sido apoiada pela prefeitura local, e por haver intervenções de convidados especialistas de outras disciplinas com trabalhos oriundos de laboratórios de outras regiões33. Monique Variéras marcou novamente, nesta ocasião, que é importante solicitar também financiamentos externos. Foi o que foi feito, por exemplo, para esta jornada em Saintes, junto com a CAF, o Conselho geral, o Conselho Regional e a Prefeitura. O mesmo ocorreu para a jornada de estudos do laboratório de Saint-Nazaire sobre “as línguas dos adolescentes” que soube se preparar antecipadamente com os parceiros da cidade, criando laços estreitos com três lugares: um teatro com uma oficina de espetáculo encenando a peça de Frank Wedekind, “O despetar da primavera”34; uma livraria que recebeu François Bégaudeau; e o liceu Aristide Briand, onde foram organizadas as conversações. Quanto a Jean-Luc Mahé, insistiu sobre os laços necessários a serem estabelecidos com a imprensa local, mas também com as livrarias. A quarta jornada sobre o ensino em Bordeaux, “Fazer suas classes na escola”35, contou com um público fiel de duzentas pessoas e tornou-se agora um verdadeiro ponto de referência quanto à questão do ensino. Tivemos uma grande qualidade de professores convidados, muitos deles autores de livros que são referências sobre a questão da escola (Jeanne Bénameur36, Catherine Henri37, Joseph Rosseto38, François Bégaudeau39, Noelle de Smet40, Gilbert Longhi – fundador do liceu integral em Paris, etc.) e também uma conversação entre dez professores de dois laboratórios, que durante duas horas fizeram uma demonstração ao vivo de uma conversação interdisciplinar, que foi aproveitada por vários. Os efeitos foram 32 De Santis Anne, La tête de ma mère ; Michel Véronique e Paulard ; Odilon : entrer-sortir, Em : Terre du CIEN n◦20, Janvier 2007. 33 Labridy Françoise, Corps de la Ville, corps dans la ville : comment habiter la ville, Em : Terre du CIEN, n◦20, Janvier 2007. 34 Cruson Elizabeth, En Marge de L’éveil du primtemps, Em : Terre du CIEN, n◦20, Janvier 2007. 35 Nota do tradutor : “Fazer suas classes na escola”, título da jornada realizada em 20 de janeiro de 2007 em Bordeaux , diz ao respeito ao professor como aquele que deve fabricar sua classe, como marcou Philippe Lacadée na abertura desta jornada. 36 Bénameur Jeanne, Les demeurées et présence, Editor Denoel, Paris, 2006, livre présenté dans le Terre du CIEN, , n◦20, Janvier 2007. 37 Catherine Henri, Du Marivaux et du loft, POL 2004 ; Un professeur sentimental POL 2005, apresentado no Terre du CIEN, n◦20, Janvier 2007. 38 Rosseto Joseph, Une école pour les enfants de Seine Saint-Denis, Editions L’harmattan, 2004. Bégaudeau François, Entre les murs, Editions entre les lignes, 2006. 40 De Smett Noelle, Au front des classes, Libre choix, Editions Talus d’approche, 2005. 39 numerosos, sobretudo depois, no nível de pedidos de conversação nas escolas, colégios ou liceus. Um dos efeitos foi, também, à criação do Serendipity41, boletim eletrônico que acolhe e difunde vários textos de professores. Convém marcar que todos os nossos convidados souberam guardar laços estreitos de trabalho, com os laboratórios do CIEN, Jeanne Bénameur foi convidada a uma jornada do PIPOL em Paris; Catherine Henri interveio no salão de revistas42, convidada pela ECF; e François Bégaudeau foi convidado para debater seu livro durante as seções de debates organizadas em algumas livrarias de Saint-Nazaire e Bordeaux. Um projeto de jornada se organiza em Bordeaux com Gilbert Longhi e Philippe Meirieu. Notamos também que a partir do trabalho feito pelo laboratório do CIEN em Bobigny43 e do filme “Quelle classe, ma classe”44, realizado por Philippe Troyon sobre a experiência original deste colégio, cujo responsável é Joseph Rosseto, foram formulados pedidos de projeção e debate do filme. Foi o que se realizou em fevereiro, em Fribourg e Lausanne na Suíça; e acontecerá em março em Saint-Nazaire e no cinema Utopia em Bordeaux durante o mês de junho. Notamos também a organização do debate, depois da projeção do filme “L’esquive”, em Bordeaux, Royan e Antibes. A importância dos correios eletrônicos Notamos que os correios eletrônicos são colocados pelos laboratórios, para favorecer a modalidade de funcionamento destes, por exemplo, o “Sobre o mal estar na educação”. Isto permite que os trabalhos de pesquisa sejam enviados antes, e em seguida sejam discutidos por dois outros membros de laboratório, na noite da reunião, de acordo com a modalidade de uma conversação. Estes correios restritos aos membros dos laboratórios criam, deste modo, uma interatividade maior, permitindo que sejam difundidas informações importantes, referências bibliográficas, e também textos inéditos. Trata-se de uma chance oferecida aos parceiros de outras disciplinas, que não seguem forçadamente às atividades da ECF ou da ACF local, e a grupos do campo freudiano ativos localmente, para se manterem informados sobre o que acontece e reencontrar também a orientação lacaniana. 41 Serendipity, Contato feito por Philippe Cousty. Nota do tradutor : Trata-se de uma Seção da bienal de livros ocorrida no dia 06 de outubro de 2006 em Paris. 43 Nota do tradutor : Em Bobigny, periferia de Paris temos um laboratório do CIEN no colégio Pierre Sémard. 44 Troyon Philippe, “Quelle classe, ma classe”, Podutor Antoine Disle. 42 É necessário ressaltar que a “lettre électronique du GRP”45 é muito ativa e organizou várias tardes de trabalho em Paris e na região, bem como jornadas de formação no interior das prisões e tem como projeto uma jornada de formação à l´ENAP em Agen. A “lettre Serendipity” para professores é difundida amplamente nos laboratórios do CIEN para aqueles que a solicitam. As diferentes publicações do CIEN Como é importante que as brochuras do CIEN se multipliquem para que o discurso analítico seja reconhecido, como aquelas de Saint-Nazaire e de um laboratório de Lyon, o jornal “Terre du CIEN” sob a responsabilidade de Michèle Rivoire é um meio de apresentação do que é a interdisciplinaridade do CIEN, a partir da orientação lacaniana. Em torno de 250 fiéis assinaturas, ele é um meio de acolher textos e trabalhos dos parceiros de outras disciplinas, particularmente nas rubricas do Dossiê e Crônicas. Assim, no último Terre du CIEN, Catherine Henri nos informa a utilidade tanto para ela e como para seus colegas professores, de um lugar como o CIEN. Este jornal dedica um amplo espaço aos trabalhos dos laboratórios do CIEN, o vetor a céu aberto dos resultados de nossa pesquisa. Deste modo, ele tem um lugar essencial no campo social e cultural. Este deveria como tal ser melhor considerado por cada laboratório e cada membro do CIEN, que possui a assinatura, e deveria divulgar esse jornal muito apreciado como lugar de reflexão da orientação lacaniana no campo social. Ele acolhe também os laboratórios da Bulgária e da América do Sul. Um dossiê especial sobre as favelas das cidades brasileiras está em preparação, após a apresentação de nossas amigas de Belo Horizonte, na ocasião do não-laboratório de Paris. Um novo laço foi criado entre os laboratórios do Brasil e da França, depois da viagem do vice-presidente à Belo Horizonte no mês de junho. O Eletrocien sob a responsabilidade de Agnès Giraudel, vai além do objetivo de informação sobre a vida do CIEN e dos laboratórios, uma ferramenta de trabalho que se tornou um lugar de endereçamento para aqueles que escrevem, um meio de transmissão de ensino e “uma profissão de fazer laços”. Compostos de rubricas dedicadas aos eventos – jornadas e colóquios do CIEN – assim como textos curtos oriundos do trabalho dos laboratórios, e também aberto à atualidade e a cultura, os números periódicos do eletrocien difundidos mensalmente, constituem um vetor de laços e trocas, de transmissão e informação privilegiados. Os principais encontros do CIEN e os eventos importantes que o concernem são 45 Carta do GRP, Contato feito por Valérie Lauret. anunciados, apresentados e comentados nessas publicações mensais, assim como “nos números especiais” e “flash infos” que, tendo um contato estreito com as atividades do CIEN, refletem a brisa e a vivacidade46. No coração do CIEN – a serviço dos membros dos laboratórios, mas também dedicado aos seus parceiros e futuros parceiros de outras disciplinas – o eletrocien, boletim eletrônico do CIEN é um instrumento, cada vez mais indispensável ao desenvolvimento do CIEN e à difusão dos ensinamentos da psicanálise lacaniana que o orienta. O número de seus destinários regulares encontra-se em constante progressão. Atualmente temos em torno de 700 destinários na França e no exterior. Em Conclusão Hoje o CIEN tem mais do que nunca “a tarefa do bem dizer” de sua inscrição no campo social, através de implicações cada vez mais numerosas e variadas de seus laboratórios. Ele mostrou que poderia sustentar uma associação, e que pode a partir daí realizar um verdadeiro projeto interdisciplinar cuja coluna vertebral seria a orientação lacaniana. Fortalecido por um certo sucesso, o CIEN tem que se inspirar também nos seus pontos de impasse. Ele deverá escolher a forma que adotará para melhor encontrar os objetivos de seus laboratórios, saber se ele pode oferecer aos seus parceiros de outras disciplinas, a possibilidade de encontrar as instâncias de formação interdisciplinar, permitindo a eles, um saber fazer melhor na prática das suas disciplinas e para melhor acolher os pontos de sofrimento das crianças e dos jovens, dos quais eles se ocupam no quadro de suas profissões. Uma melhor divulgação implica um rigor ainda maior e uma cautela na pesquisa, em todas as disciplinas referentes às crianças, tais como a medicina, a pediatria, a justiça, etc. nem sempre representadas em seus lugares devidos nos nossos laboratórios. Isso implica também em fazer um esforço nas nossas publicações, difusões e invenções. O CIEN deve então, cada vez mais, definir a melhor forma que ele adota para alcançar seu objetivo, que foi definido nos dois primeiros artigos da nossa associação e lembrados na introdução do nosso relatório. Bordeaux, 03 de março de 2007. Em nome do escritório do CIEN, o vice-presidente. Tradução: Simone Bianchi. 46 Giradeul Agnès.
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