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Osteoblastomas agressivos da coluna vertebral: relato de dois casos / Sabedotti IF et al. Relato de Casos Osteoblastomas agressivos da coluna vertebral: relato de dois casos e revisão da literatura Ismail Fernando Sabedotti1, Felipe Tietbohl Toigo2, Ideval Ferrarini2, Mário Rodrigues Montemór Netto3, Valdir Sabedotti1 Resumo O osteoblastoma é uma neoplasia óssea que na maioria das circunstâncias apresenta-se com aspecto radiológico de baixa agressividade, porém em alguns casos pode adquirir caráter agressivo Descritores: Osteoblastoma; Coluna vertebral; Radiologia. com rompimento da cortical óssea e invasão de estruturas adjacentes. A maioria das lesões ocorre na coluna vertebral, particularmente nos arcos posteriores, podendo eventualmente estender-se para o corpo vertebral. O diagnóstico diferencial das formas agressivas se faz principalmente com os osteossarcomas. O artigo constitui-se no relato de dois casos com padrões radiológicos agressivos e confirmação histológica de osteoblastomas da coluna vertebral. O osteoblastoma é uma neoplasia que corresponde a 1% de todas as neoplasias ósseas e 3% de todas as neoplasias ósseas benignas[1]. Também é chamado de osteoma osteóide gigante, devido às características histológicas semelhantes ao nicho de um osteoma osteóide[2], com a diferença mais notável no potencial de crescimento ilimitado do osteoblastoma e sua capacidade de transformação maligna[3], resultando em uma diferenciação radiológica muitas vezes por seu tamanho (> 1,5 cm)[4,5]. Acomete principalmente indivíduos nas três primeiras décadas de vida, com relação masculino/feminino de 2:1, sendo mais comum na coluna vertebral[4,5], onde possui predileção pelo arco posterior[3]. Outros locais menos comuns de acometimento são: ossos longos, calota craniana, mandíbula e extremidades[6]. O principal sintoma clínico é de dor contínua e pontual que aumenta de forma gradual, especialmente à noite e, na maioria das vezes, não responde ao uso de salicilatos[7]. Existem formas mais raras de osteoblastomas, apresentando caráter agressivo, denominadas osteoblastomas agressivos ou malignos. Recebido para publicação em 20/5/2005. Aceito, após revisão, em 24/8/2005. Trabalho realizado no Departamento de Imagem da Santa Casa de Ponta Grossa, Ponta Grossa, PR. 1 Médicos Radiologistas pelo Colégio Brasileiro de Radiologia e Diagnóstico por Imagem, Preceptores do Serviço de Residência e Pós-graduação da Santa Casa de Ponta Grossa. 2 Médicos Especializandos em Radiologia pela Santa Casa de Ponta Grossa. 3 Médico Patologista pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Correspondência: Dr. Ismail Fernando Sabedotti. Rua Coronel Dulcídio, 1415, Centro. Ponta Grossa, PR, 84010-280. E-mail: ismailsabedotti@uol. com.br Rev Imagem 2007;29(1):29–34 RELATO DOS CASOS Caso 1 – Paciente do sexo masculino, branco, 23 anos de idade, referia redução gradual da força muscular em membros inferiores, evoluindo para redução da força muscular também em membros superiores. Exames realizados: radiografias convencionais da coluna cervical, tomografia computadorizada do arco posterior de C5 e microscopia (Figs. 1A a 1F). Caso 2 – Paciente do sexo masculino, 18 anos de idade, apresentando queixas de tumoração lombar associada a dor e hipoestesia no trajeto de S1 à direita. Exames realizados: radiografias convencionais da coluna lombo-sacra, tomografias computadorizadas ao nível de L5 e microscopia da peça cirúrgica (Figs. 2A a 2I). 29 Sabedotti IF et al. / Osteoblastomas agressivos da coluna vertebral: relato de dois casos A B Fig. 1(A,B) – Radiografias convencionais da coluna cervical em ântero-posterior (A) e perfil (B) demonstrando lesão expansiva de contornos irregulares e densidade heterogênea, apresentando matriz calcificada/ossificada, com epicentro no arco posterior de C5, estendendo-se também para os arcos posteriores de C4 e C6. C D Fig. 1(C,D) – (C) Corte axial de tomografia computadorizada ao nível do arco posterior de C5 demonstrando a matriz calcificada/ossificada da lesão, bem como os contornos irregulares com áreas de rompimento da cortical óssea e componente posterior invadindo o canal medular e a porção posterior do forame vertebral direito. (D) Reconstrução sagital pela tomografia computadorizada demonstrando a extensão da lesão pelos arcos posteriores de C4–C6. 30 Rev Imagem 2007;29(1):29–34 Osteoblastomas agressivos da coluna vertebral: relato de dois casos / Sabedotti IF et al. Fig. 1E – Achados microscópicos de espículas irregulares de osso mineralizado e osteóide com os limites circundados por uma camada de osteoblastos, com estroma vascular caracterizado pela presença células fusiformes algo pleomórficas, concluindo-se como osteoblastoma agressivo. DISCUSSÃO Apesar de o osteoblastoma ser uma lesão benigna, pode possuir características locais extremamente agressivas, como a invasão de tecidos moles adjacentes e comprometimento neurológico secundário[7]. Distinguemse quatro categorias de osteoblastomas agressivos ou malignos: osteossarcoma de baixo grau simulando osteoblastoma, osteoblastoma com degeneração secundária em osteossarcoma (pós-cirurgia ou radioterapia), osteoblastoma benigno pseudo-sarcomatoso e osteoblastoma localmente agressivo sem metástases a distância. Os aspectos radiológico e histológico são próximos aos do osteoblastoma benigno, porém alguns critérios favorecem essa diferenciação. A evolução dessas formas agressivas é marcada por maiores índices de recidiva local, metástases e complicações secundárias[6,8]. O padrão radiológico do osteoblastoma com acometimento da coluna vertebral costuma ser o de lesão expansiva lítica, com matriz calcificada/ossificada (55% a 72% dos casos), limites definidos por fina lâmina óssea subperiosteal com epicentro no arco posterior e com extensão variável para o corpo vertebral. A presença de nidus é rara. Pode, menos comumente, ter padrão predominantemente esclerótico difuso, dando aspecto de “vértebra em marfim”[4]. Nas formas agressivas notamse áreas de rompimento da cortical óssea com invasão de tecidos moles adjacentes. Nos ossos longos o acometimento preferencial dos osteoblastomas acontece nas regiões da diáfise e metáfise, podendo ter localização medular, cortical ou periosteal. Costuma ser expansivo e com matriz óssea de permeio, geralmente bem limitado, com casos de reação periosteal adjacente, de padrão variado, com acometimento de partes moles. A B Fig. 2(A,B) – Radiografias convencionais da coluna lombo-sacra em ântero-posterior (A) e perfil (B) demonstrando lesão de aspecto lítico envolvendo o pedículo vertebral de L5 à direita, causando indefinição deste. Rev Imagem 2007;29(1):29–34 31 Sabedotti IF et al. / Osteoblastomas agressivos da coluna vertebral: relato de dois casos C D Fig. 2(C,D,E) – Imagens axiais de tomografia computadorizada ao nível de L5, antes e após a administração do contraste intravenoso e com janela óssea, demonstrando lesão expansiva lítica de caráter expansivo com epicentro no pedículo e processo transverso de L5 à direita, afilando as corticais ósseas adjacentes, com áreas de rompimento destas, estendendo-se para o corpo vertebral e arco posterior à direita. A lesão invade o canal medular e os tecidos moles adjacentes, apresenta matriz predominantemente sólida e heterogênea, contendo níveis líquido-líquido no seu interior. (O Quadro 1 mostra o diagnóstico diferencial das lesões ósseas com nível líquido-líquido). E F G Fig. 2(F,G) – Reconstruções coronal e sagital ilustrando a extensão lateral e posterior da lesão à direita, com envolvimento dos tecidos moles adjacentes. 32 Rev Imagem 2007;29(1):29–34 Osteoblastomas agressivos da coluna vertebral: relato de dois casos / Sabedotti IF et al. H I Fig. 2(H,I) – Fotomicrografias da peça cirúrgica, em que se observam trabeculado ósseo irregular, com camada única de osteoblastos e proliferação fuso-celular entremeados por células capilares, e numerosas células gigantes localizadas nos espaços intertrabeculares. QUADRO 1 – Lesões ósseas contendo nível líquido-líquido. Cisto ósseo aneurismático Osteoblastoma Tumor de células gigantes Condroblastoma Osteossarcoma teleangiectásico Displasia fibrosa Na calota craniana acomete as tábuas ósseas interna e externa, manifestando-se como lesão expansiva bem limitada com calcificação central. Na mandíbula é denominado cementoblastoma, caracterizando-se por lesão expansiva com matriz óssea e de limites definidos por halo radioluscente. Nas extremidades tem aspecto semelhante aos que acometem ossos longos, alguns apresentando aparentes septos finos internos. Na cintilografia óssea costumam ter hipercaptação do radiofármaco. Na tomografia computadorizada caracteriza-se a camada óssea laminar limitante, a matriz óssea e a integridade da cortical óssea. Na ressonância magnética apresentam sinal baixo ou intermediário em T1 e alto ou intermediário em T2, sendo que em algumas situações há alteração de sinal nos tecidos moles e estruturas ósseas limitantes, inclusive com impregnação pelo meio de contraste, o que pode representar reação inflamatória/edema circundante ou uma forma agressiva da neoplasia. As principais afecções a serem consideradas no diagnóstico diferencial do acometimento da coluna são o cisto ósseo aneurismático, o tumor de células gigantes e o osteoma osteóide, e nas formas agressivas incluemse os processos infecciosos e o osteossarcoma. O cisto Rev Imagem 2007;29(1):29–34 ósseo aneurismático também tem predileção pelo arco posterior, porém a presença de matriz calcificada/ossificada no osteoblastoma faz a distinção. O tumor de células gigantes tem caráter expansivo, porém, localização predominante no corpo vertebral e sem matriz óssea interna. O osteoma osteóide é distinto pelas suas dimensões e presença do nidus. Quando o osteoblastoma adquire o aspecto esclerosante de “vértebra em marfim”, o diagnóstico diferencial passa a incluir metástases blásticas, linfoma ósseo, doença de Paget, osteossarcoma e sarcoma de Ewing[6]. A retirada cirúrgica radical deve ser a prioridade no tratamento dos osteoblastomas, pois estudos demonstram que a retirada incompleta pode resultar em recorrências, principalmente nas formas agressivas[6,9]. CONCLUSÃO A forma agressiva é uma apresentação incomum do osteoblastoma, com maior tendência a recidiva e complicações neurológicas. Apesar das apresentações radiológicas não serem sempre características, quando da presença de uma lesão lítica e expansiva, com matriz calcificada/ossificada em arco posterior da coluna vertebral, apresentando fina lâmina óssea periférica limitante, porém com áreas de rompimento da cortical e invasão de tecidos moles limitantes, a possibilidade de um osteoblastoma agressivo deve ser lembrada, considerando-se o ostessarcoma como diagnóstico diferencial principal nesses casos. Salienta-se que a caracterização da lâmina óssea periférica pela radiografia convencional e tomografia computadorizada é um achado importante para o diagnóstico, porém não-específico. 33 Sabedotti IF et al. / Osteoblastomas agressivos da coluna vertebral: relato de dois casos REFERÊNCIAS 1. Dahlin DC, Unni KK. Bone tumors: general aspects and data on 8542 cases. 4th ed. Springfield, Ill.: Thomas, 1986;102–18. 2. Juhl JH, Crummy AB, Kuhlman JE. Paul & Juhl Interpretação radiológica. 7ª ed. Rio de Janeiro, RJ: Guanabara Koogan, 2000; 118-–9. 3. Sonel B, Yagmurlu B, Tuncer S, Erden I, Us AK. Osteoblastoma of the lumbar spine as a cause of chronic low back pain. Rheumatol Int 2002;21:253–5. 4. Sherazi Z, Saifuddin A, Shaikh MI, Natali C, Pringle JAS. Unusual imaging findings in association with spinal osteoblastoma. Clin Radiol 1996;51:644–8. 5. Greenspan A. Radiologia ortopédica. 2ª ed. Rio de Janeiro, RJ: Guanabara Koogan, 1996;16.5–16.12. 6. Chagnon S, Qanadli S, Vallei C. Tumeurs osseuses bénignes: osteoblastoma. Encyc Méd Chir Radiodiagnostic – Neuroradiologie – Appareil locomoteur 1998;31-482-B-10. 7. Orbay T, Ataoglu O, Tali ET, Kaymaz M, Alp H. Vertebral osteoblastoma: are radiologic structural changes necessary for diagnosis? Surg Neurol 1999;51:426–9. 8. Seki T, Fukuda H, Ishii Y, Hanaoka H, Yatabe S, Tanako M. Ma- 34 lignant transformation of benign osteoblastoma: a case report. J Bone Joint Surg 1975;57A:424–6. 9. Kroon HM, Shurmans J. Osteoblastoma: clinical and radiological findings in 98 new cases. Radiology 1990;175:783–90. Abstract. Vertebral column aggressive osteoblastoma: two cases report and literature review. Osteoblastoma is a bone neoplasy that in most circumstances present a low aggressive aspect on radiographic studies, but in some cases may acquire an aggressive pattern, rupturing the bone cortex and invading nearby structures. Most cases occur on the vertebral column, especially at the posterior arch and occasionally involving the vertebral body. Differential diagnosis of the aggressive form is made with osteosarcomas. This review reports two cases of osteoblastomas involving vertebral column, with an aggressive pattern on radiologic studies, and their histologic confirmation. Keywords: Osteoblastoma; Vertebral column; Radiology. Rev Imagem 2007;29(1):29–34