cooperativismo agrícola e a construção de mercados de qualidade
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cooperativismo agrícola e a construção de mercados de qualidade
UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DE PERNAMBUCO – UFRPE DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EXTENSÃO RURAL E DESENVOLVIMENTO LOCAL - POSMEX NÍVEL MESTRADO YASMINA PIMENTEL VICTOR JUSTE COOPERATIVISMO AGRÍCOLA E A CONSTRUÇÃO DE MERCADOS DE QUALIDADE: A EXPERIÊNCIA DA COOPERATIVA AGRÍCOLA NOVA ALIANÇA NO VALE DO SÃO FRANCISCO RECIFE, PERNAMBUCO 2013 COOPERATIVISMO AGRÍCOLA E A CONSTRUÇÃO DE MERCADOS DE QUALIDADE: A EXPERIÊNCIA DA COOPERATIVA AGRÍCOLA NOVA ALIANÇA NO VALE DO SÃO FRANCISCO YASMINA PIMENTEL VISTOR JUSTE Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado do Programa de Pós-Graduação em Extensão Rural e Desenvolvimento Local (Posmex), Área de Concentração em Extensão Rural para o Desenvolvimento Local, da Universidade Federal Rural de Pernambuco, como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Extensão Rural e Desenvolvimento Local. ORIENTADORA: Profª. Drª. Maria Luiza Lins e Silva Pires Coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Extensão Rural e Desenvolvimento Local (POSMEX) RECIFE, PERNAMBUCO 2013 Ficha catalográfica CDD 664 Juste, Yasmina Pimentel Victor Cooperativismo Agrícola e a Construção de Mercados de Qualidade: A experiência da Cooperativa agrícola nova aliança no Vale do São Francisco / Yasmina Pimentel Victor Juste – 2012 82 f. : Il. Orientadora: Maria Luiza Lins e Silva Pires Dissertação (Mestrado em Extensão Rural e Desenvolvimento Local) – Universidade Federal Rural de Pernambuco, Departamento de Educação, Recife, 2012. Inclui referências, anexo e apêndice. 1. Cooperativismo agrícola brasileiro e a Construção social de Mercados de Qualidade 2. Qualidade: histórico e conceitos 3. a fruticultura brasileira e a inserção do vale do São Francisco nos mercados 4. As cooperativas agrícolas do Vale do São Francisco e sua inserção nos mercados de qualidade 5. considerações finais I. Pires, Maria Luiza Lins e Silva, orientadora II Título COOPERATIVISMO AGRÍCOLA E A CONSTRUÇÃO DE MERCADOS DE QUALIDADE: A EXPERIÊNCIA DA COOPERATIVA AGRÍCOLA NOVA ALIANÇA NO VALE DO SÃO FRANCISCO Elaborada por YASMINA PIMENTEL VICTOR JUSTE Como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Extensão Rural e Desenvolvimento Local A Comissão Examinadora, abaixo assinada, aprova a Dissertação de Mestrado COMISSÃO EXAMINADORA: ____________________________________________________________ Profa. Drª Maria Luiza Lins e Silva Pires - Posmex/UFRPE (Presidente/Orientadora) ____________________________________________________________ Profa. Drª Conceição Maria Dias de Lima – UNEAL. (Examinadora Externa) ____________________________________________________________ Profa. Drª Maria Salett Tauk – Posmex/UFRPE (Examinadora Interna) ____________________________________________________________ Profº Dr. Angelo Brás Fernandes Callou – UFRPE (Examinador Interno) RECIFE, PERNAMBUCO 2013 DEDICATÓRIA A minha orientadora Profª Drª Maria Luiza Lins e Silva Pires, pelo carinho, dedicação e comprometimento que vem tendo comigo a longo dos anos, e que é minha fonte de inspiração e motivação para a realização dos meus objetivos de vida. AGRADECIMENTOS Um agradecimento muito especialmente à minha família, meu pai JeanPierre, minha mãe Tâniamara e minha irmã Yanaya pelo carinho, amor, e compreensão no decorrer do processo de construção dessa dissertação. A Profª Drª Maria Luiza Lins e Silva Pires pela confiança, paciência, e comentários críticos e pertinentes, sem o qual não seria possível a realização desse trabalho. A Cooperativa Agrícola Nova Aliança (COANA), pela presteza e amabilidade com que nos atendeu, e sem a qual não seria possível a realização dessa pesquisa. A Profª Drª Josefa Salete Barbosa Cavalcanti, por sua colaboração e inspiração. A todos os professores do Programa de Pós-Graduação em Extensão Rural e Desenvolvimento Local – POSMEX, pelos ensinamentos, cada um de maneira particular contribuiu para a conclusão dessa dissertação, como também para minha formação profissional. Agradeço particularmente ao Profº Drº Ângelo Brás Fernandes Callou, pelas suas valiosas sugestões na ocasião do exame de qualificação. A turma POSMEX- 2010, Luciano, Lorena, Erick, Mariana, Raquel, Juliana, Renata, Renata Rezende, Tathiana, Givanildo, Michele, Simone, Silvana e Leonardo. Um agradecimento muito especial aos meus queridos amigos, companheiros, irmãos, Diana, Luciano, Alexsandro Melo, Lorena, Manuella, Pedro, Luiz, Mariana, Raquel, Juliana, Renata, Roberto (Rô), Filipe Xavier, Thatiana e Paula Pagu. A Adaci, funcionária do PAPE, com quem compartilhei momentos de alegria, e que sempre quando precisei tinha uma palavra de afeto e de motivação. E, por fim, a todos os docentes do Curso de Bacharelado e Licenciatura em Economia Doméstica, especialmente Fátima Massena, os meus sinceros agradecimentos. RESUMO Esta pesquisa analisa as estratégias estabelecidas pela cooperativa agrícola Cooperativa Agrícola Nova Aliança (COANA), no campo da fruticultura para cumprir com os padrões de qualidade exigidos pelos mercados globais. Como se dão os processos de obtenção das certificações? Quais os critérios de qualidade nas cooperativas? As cooperativas têm se ajustado às novas certificações exigidas pelos mercados locais e globais? Para responder a essas questões, elegeu-se como eixo analítico a relação entre cooperativismo, padrões de qualidade e mercados de frutas e tendo como referência empírica a Cooperativa Agrícola Nova Aliança (COANA). Observou-se uma forte preocupação da cooperativa analisada em atender as exigências dos diversos mercados, especialmente no que diz respeito à conquista de certificados de qualidade, como elementos que, por sua vez, definem a forma de inserção nos mercados globais. Ademais, pôde-se também constatar que a cooperativa analisada, por meio de sua estrutura organizacional flexível, vem sendo capaz de responder aos mercados de forma ágil, atendendo as suas especificidades, em termos dos aspectos sensoriais de frutas – tamanho e sabor. A importância deste estudo está em contribuir para uma melhor compreensão dos processos de reestruturação dos sistemas agroalimentares locais, no que diz respeito aos padrões de qualidade para a obtenção de certificações do produto. Palavras-chave: Cooperativismo, Qualidade, Mercados de Qualidade. ABSTRACT This research examines the strategies established by the agricultural Cooperative Nova Aliança (COANA), in the field of horticulture to meet the quality standards required by global markets. How to make the process of obtaining certification? How do you define quality criteria in the cooperative? The cooperatives have adjusted to the new certifications required by local and global markets? To answer these questions, he was elected as the axis cooperative relationship between analytic, standards and markets fruit and with reference to empirical New Agricultural Cooperative Alliance (COANA). There was a strong concern of the cooperative analyzed to meet the demands of various markets, especially with regard to the achievement of quality certificates as evidence that, in turn, define the type of participation in global markets. Moreover, it was also found that analyzed the cooperative, through its flexible organizational structure, has been able to respond to market quickly, given their specificities in terms of sensory aspects of fruit - size and flavor. The importance of this study is to contribute to a better understanding of the restructuring of local agri-food systems, with regard to quality standards to obtain product certifications Keywords: Cooperative, Quality, Quality Markets. RESUMÉ Cette recherche examine les stratégies mises en place par le coopérative agricole Agrícola Nova Aliança (COANA), dans le domaine de fruticulture pour renplir aux normes de qualité exigées par les marchés mondial. Comment rendre le processus d'obtention de la certification? Comment sont définis les critères de qualité dans la coopérative? Les coopératives se sont adaptés aux nouvelles certifications exigées par les marchés locaux et mondiaux? Pour répondre à ces questions, il a été élu comme la relation de coopération entre l'axe d'analyse, les normes et les fruits des marchés et en référence à l'Coopérative Agricole Nouvelle Alliance (COANA). Il y avait une forte préoccupation de la coopérative analysées afin de répondre aux exigences des différents marchés, en particulier en ce qui concerne l'obtention de certificats de qualité comme la preuve que, à son tour, définir le type de participation aux marchés mondiaux. En outre, il a également été constaté que l'analyse de la coopérative, grâce à sa structure organisationnelle souple, a été en mesure de répondre rapidement sur le marché, compte tenu de leurs spécificités en termes d'aspects sensoriels de fruits - taille et la saveur. L'importance de cette étude est de contribuer à une meilleure compréhension de la restructuration de locaux agro-alimentaires des systèmes, en ce qui concerne les normes de qualité pour obtenir des certifications de produits. Mots-clés: Coopératives, Qualité, Marchés de Qualité. LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura 1 - Selo da Produção Integrada de Frutas ............................................. 43 Figura 2 - Localização do Pólo Petrolina/Juazeiro ............................................ 51 Gráfico 1 - Exportações Brasileiras de frutas frescas (2010).............................49 Mapa 1- Distribuição da Fruticultura na Vegetação Natural, 2005. ................................. 82 Gráfico 2 - Evolução da Produção de Uva na Região do Vale do São Francisco nos Estados de Pernambuco e Bahia. .............................................................. 53 LISTA DE TABELAS Tabela 1 - Produção de Frutas na Região Nordeste do Brasil - 2002 (em Toneladas).........................................................................................................50 Tabela 2 - Fazendas da COANA e Capacidade de produção em Toneladas .. 61 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS COANA – Cooperativa Agrícola Nova Aliança CAJ - Cooperativa Agrícola Juazeiro da Bahia COOPEXVALE - Cooperativa dos Exportadores de Frutas do Vale do São Francisco. COOPEXfruit - Cooperativa dos Exportadores de Frutas ACI - Aliança Cooperativa Internacional OCB - Organização das Cooperativas Brasileiras OCE - Organização Estadual de Cooperativas PIF - Produção Integrada de Frutas MAPA - Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento EUREPG.A.P. - Euro-Retailer Produce Working Group, Good Agricultural Practices GLOBALG.A.P. - Global Good Agriculture Pratices CVSF - Comissão do Vale do São Francisco SUVALE - Superintendência do Vale do São Francisco CODEVASF - Companhia do Desenvolvimento do Vale do São Francisco CPATSA - Centro de Pesquisa Agropecuária do Trópico Semiárido Valexport - Associação dos Exportadores de Hortifrutigranjeiros e Derivados do Vale do São Francisco CAC - Cooperativa Agrícola Cotia SUMÁRIO INTRODUÇÃO .................................................................................................. 15 PERCURSO METODOLÓGICO ....................................................................... 20 CAPÍTLO 1- COOPERATIVISMO AGRÍCOLA BRASILEIRO E A CONSTRUÇÃO SOCIAL DE MERCADOS DE QUALIDADE ........................... 21 1.1 COOPERATIVISMO E O SURGIMENTO DAS COOPERATIVAS AGRÍCOLAS NO BRASIL21 1.2 COOPERATIVISMO AGRÍCOLA E A ÊNFASE NOS MERCADOS DE QUALIDADE ....... 25 1.3 A CONSTRUÇÃO SOCIAL DOS MERCADOS DE QUALIDADE ............................... 28 CAPÍTULO 2- QUALIDADE: HISTÓRICO E CONCEITOS ............................... 31 2.1 HISTÓRICO E EVOLUÇÃO DA QUALIDADE ......................................................................... 31 2.2 REGIME ALIMENTAR E TRANSIÇÃO PARA UMA ECONOMIA DA QUALIDADE ..................... 33 2.3 CONCEITO DE QUALIDADE ................................................................................................ 38 2.4 PADRÕES DE QUALIDADE: CERTIFICAÇÕES COMO ESTRATÉGIAS DE COMPETITIVIDADE INTERNACIONAL ........................................................................................................................... 40 2.4.1 CERTIFICAÇÕES NACIONAIS E GLOBAIS PARA A COMERCIALIZAÇÃO DE FRUTAS ..... 42 CAPÍTULO 3- A FRUTICULTURA BRASILEIRA E A INSERÇÃO DO VALE DO SÃO FRANCISCO NOS MERCADOS .............................................................. 48 3.1 MERCADOS DA FRUTICULTURA NO BRASIL ..................................................... 48 3.2 A CONSTRUÇÃO DO VALE DO SÃO FRANCISCO COMO UMA REGIÃO PRODUTORA DE FRUTAS ......................................................................................................... 50 3.3 MERCADO DE EXPORTAÇÃO DE FRUTAS NO VALE DO SÃO FRANCISCO ............ 54 CAPÍTULO 4- AS COOPERATIVAS AGRÍCOLAS DO VALE DO SÃO FRANCISCO E SUA INSERÇÃO NOS MERCADOS DE QUALIDADE ........... 56 4.1 COOPERATIVA AGRÍCOLA NOVA ALIANÇA (COANA)....................................... 58 4.1.1 PERFIL DOS ASSOCIADOS ......................................................................... 64 4.1.2 COMERCIALIZAÇÃO DA UVA....................................................................... 64 CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................. 70 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.................................................................. 74 INTRODUÇÃO As constantes transformações da economia e dos sistemas agroalimentares têm elevado o nível de competitividade entre os países produtores de alimentos, exigindo, no caso do Brasil, maior grau de investimentos por parte dos produtores brasileiros. Isso tem levado agricultores experientes a se organizarem em cooperativas para que possam produzir e comercializar os seus produtos em bases competitivas (WILKINSON, 2000). Com efeito, num contexto de produção agrícola voltada para os mercados globais, mercados esses que exigem alto grau de especialização dos agricultores, bem como altos investimentos para adequar-se às exigências dos mercados, a criação de cooperativas vem se mostrando como uma alternativa para minimizar os elevados custos de produção e comercialização dos produtos, permitindo também a possibilidade de barganhar melhores preços e uma inserção mais competitiva nos mercados (PIRES e CAVALCANTI, 2010). Com base nesse cenário, esta dissertação tem como objetivo geral analisar as estratégias1 estabelecidas pela cooperativa agrícola para atender aos padrões de qualidade exigidos pelos mercados globais, tendo como referência empírica as cooperativas do Vale do São Francisco, mais especificamente com a Cooperativa Agrícola Nova Aliança (COANA). Tais estratégias dizem respeito particularmente à obtenção de certificados, critérios de qualidade, ajustes as demandas dos mercados globais, entre outros. A importância da associação cooperativa é identificada como uma forma de dinamizar a atividade de produtores num mundo regido pela competitividade fruto da liberação dos mercados. A sua importância está também associada à possibilidade de agregar valor cultural ao produto, apoiando a preservação e conservação do meio ambiente (PIRES, 2004). Contudo, como observado na literatura, faz-se necessário que as cooperativas estejam estruturadas de forma competitiva, investindo em 1 “Entende-se por estratégia o conjunto de decisões coerentes, unificadoras e integradoras que determinam e revelam a vontade da organização em termos de objetivos de longo prazo, programa de ações e prioridade na utilização de recursos (Dicionário de tecnologia e inovação, pag. 56, 2010)” tecnologia, em práticas cooperativas modernas e em capacitação permanente de seus associados como forma de garantir uma boa governança empresarial (PIRES, 2005). Destarte, Pires (2004), ao situar o cooperativismo 2 enquanto projeto e prática social, admite que além de a cooperativa ser fundamentada num modus operandi pautado em eficiência e numa racionalidade empresarial que lhe garanta uma boa governança, a cooperativa também se apoia num conjunto doutrinário que lhe assegura a preservação de valores relacionados à participação democrática. Tais valores, junto com os princípios cooperativos3, consolidam as chamadas regras de ouro do movimento cooperativo. Além disso, o cooperativismo também se relaciona ao empoderamento dos diversos atores envolvidos e uma ancoragem territorial, imprimindo a cooperativa uma maior responsabilização com os destinos da comunidade na qual está inserida. Eis a razão pela qual essa autora, Pires (2004), identifica no cooperativismo uma ferramenta importante de desenvolvimento local, referindose particularmente a Cooperativa Agrícola Juazeiro (CAJ): [...] A CAJ vem contribuindo para o dinamismo do cooperativismo tanto no que diz respeito à geração de empregos diretos e indiretos como no volume de negócios que realiza, servindo também de referência às práticas cooperativas do Nordeste e especialmente às do Vale do São Francisco (PIRES, 2004, p.242). Ao que acrescenta a autora: A presença da CAJ na região do Vale do São Francisco vem dando notoriedade a região como produtora e exportadora de frutas in natura, bem como um “pólo produtivo dinâmico” no Nordeste e no país (PIRES, 2004, p.242). Esse dinamismo que a região do Vale do São Francisco vem demonstrando nos últimos anos é resultado, principalmente, da capacidade de 2 O cooperativismo baseia-se em valores de ajuda mútua, responsabilidade, democracia, igualdade, liberdade, honestidade, transparência, equidade e solidariedade, e são eles que balizam os princípios cooperativos, segundo sua origem (PIRES, 2004). 3 Os princípios cooperativos, de acordo com a Aliança Cooperativa Internacional (ACI) são: Adesão livre e voluntária; Gestão democrática e livre; Participação econômica dos membros; Autonomia e independência; Educação, formação e informação; Intercooperação; e Interesse pela comunidade. resposta e de inversão que os produtores da região vêm mostrando, no que concernem as exigências dos mercados exportadores acerca dos padrões de qualidade na produção e no produto (CAVALCANTI, 1999; PIRES, 2004). O fato é que, nos últimos 20 anos, a preocupação com a qualidade dos produtos alimentícios, em especial no que se refere à sua segurança, vem se tornando uma ferramenta para atender a consumidores e governos, bem como se tornando um dos principais fatores competitivos das cadeias de produção agroalimentares (BONANNO, 1999). Nesse contexto, os certificados ou selos de qualidade desenvolvidos por iniciativa do Estado e/ou do setor produtivo ganham destaque, funcionando como instrumento de comprovação para o consumidor, com relação aos atributos intrínsecos existentes nos produtos. No caso da uva de mesa do Vale do São Francisco, as certificações exigidas são a GLOBALG.A.P. (internacional) e o Programa Integrado de Frutas – PIF (nacional). A região do Vale do São Francisco se destaca por sua produção e pelos vínculos que estabeleceu com o mercado global ao produzir frutas dentro dos padrões de qualidade esperados pelos compradores e consumidores internacionais. Razão que contribuiu, em grande medida, para permitir a inserção do Vale nos mercados nacional e internacional (CAVALCANTI, 1997). Nesse cenário, dois municípios dessa região têm se destacado na produção de frutas para exportação. São eles: Petrolina em Pernambuco e Juazeiro na Bahia4. A vinculação da fruticultura com os mercados globais faz da região do Vale do São Francisco um laboratório de particular importância para a compreensão das mudanças das questões relacionadas às exigências globais e a capacidade de resposta pelos produtores locais, como já sublinhado por Pires (2004). Assim, interessa-nos, no presente trabalho, concentrar a atenção nas estratégias produtivas e organizacionais inovadoras utilizadas pela COANA, como forma de lhes assegurar a qualidade, atendendo, ao mesmo tempo, as exigências dos mercados globais. Como se dão os processos de obtenção das 4 A região do Vale do São Francisco compreende os municípios de Lagoa Grande, Orocó, Petrolina e Santa Maria da Boa Vista, em Pernambuco, e Casa Nova, Curaçá, Juazeiro e Sobradinho, na Bahia. certificações? Como se definem os critérios de qualidade nas cooperativas estudadas? As cooperativas têm se ajustado às novas certificações exigidas pelos mercados locais e globais? Os motivos que me levaram à escolha do tema se devem a minha trajetória no curso de Bacharelado em Economia Doméstica na Universidade Federal Rural de Pernambuco, quando tive a oportunidade de ser bolsista PIBIC/FACEPE, dos anos de 2008 a 2009 com o projeto “Cooperativas agrícolas, inovação organizacional e produtiva e desenvolvimento local”, sob a orientação da Profª Drª Maria Luiza Lins e Silva Pires. Tal condição me permitiu uma aproximação com o grupo de pesquisa Agricultura e globalização, sob a coordenação da Profª Drª Josefa Salete Barbosa Cavalcanti, do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da UFPE, facilitando a minha inserção na realidade do Vale do São Francisco. Assim, para melhor compreender a relação entre cooperativismo, padrões de qualidade e mercados de frutas, a presente pesquisa tem como objetivos: Objetivo Geral: Analisar as estratégias estabelecidas pela cooperativa, no campo da fruticultura, para cumprir com os padrões de qualidade exigidos pelos mercados globais. Objetivos Específicos: Analisar as exigências dos mercados globais, especialmente no que diz respeito à conquista de certificados que garantem a qualidade dos produtos; Identificar as estratégias utilizadas pela COANA para atender aos critérios de qualidade exigidos pelos mercados. Analisar, com base na discussão teórica e nas evidências empíricas, a importância das certificações na produção da Fruticultura. A importância deste estudo está em contribuir para uma melhor compreensão dos processos de reestruturação dos sistemas agroalimentares locais, no que diz respeito aos padrões de qualidade para a obtenção de certificações do produto, tendo como referência empírica a Cooperativa Agrícola Nova Aliança (COANA). O trabalho está dividido em quatro capítulos. O primeiro aborda o tema do cooperativismo agrícola e sua relação com os mercados de qualidade. Estes, por sua vez, identificados como construções sociais, baseando-se nas referências de John Wilkinson (2000) e de Abramovay (2004). Neste capítulo, o cooperativismo agrícola é visto como um instrumento de fortalecimento dos agricultores ao imperativo dos mercados, através da introdução de novas tecnologias, sistemas organizacionais e qualificação da mão-de-obra e do produto, o que os torna mais competitivos. O segundo capítulo contextualiza a emergência do tema da qualidade, através de uma abordagem histórica, conceitual e tipológica, utilizando-se autores como Denis Bayard (1993), A. David Garvin (2002) e J.C Toledo (1997 e 2000). A qualidade é situada como um conceito subjetivo, e que sofre influências, em particular, das relações entre mercado, estado e sociedade. Este capítulo retoma o conceito de qualidade como construção social, o que nos leva a admitir diversas formas de construção da qualidade. No terceiro capítulo, situa-se o Vale do São Francisco enquanto um pólo de fruticultura voltado aos mercados globais, particularizando as cooperativas enquanto canais importantes de organização dos produtores e de comercialização dos produtos. No quarto capítulo, foram sistematizadas as principais dificuldades e desafios vivenciados pelas cooperativas para se manterem nos mercados globais, bem como seus projetos futuros para uma inserção mais competitiva nestes ditos mercados. PERCURSO METODOLÓGICO Com base nos objetivos propostos, a pesquisa foi realizada por meio de ampla revisão bibliográfica dos principais conceitos aqui trabalhados – Cooperativismo, Padrões de Qualidade, Mercado de qualidade, Mercados Globais, Fordismo e Pós-Fordismo alimentar. A realização da pesquisa pauta-se na idéia de que os acontecimentos sociais não podem ser entendidos quando analisados isoladamente, alheios das influências políticas, econômicas, culturais, presentes na relação local/global. Vale salientar que a presente pesquisa tem caráter qualitativo e, como tal, “é uma atividade situada que localiza o observador no mundo”. Para Denzin e Lincoln (2008), ela envolve uma abordagem interpretativa da realidade, ou seja, confere ao pesquisador compreender, ou interpretar a realidade a partir dos significados que as pessoas lhe atribuem. Neste sentido, é importante destacar a contribuição do Programa em Extensão Rural e Desenvolvimento Local – POSMEX, em especial as disciplinas de Extensão Rural, Fundamentos da Comunicação e do Desenvolvimento Local, Metodologia da Pesquisa em Extensão Rural, e Sociologia Rural e Associativismo, onde através dos textos ampliaram meu conhecimento a cerca do tema trabalhado na pesquisa. Para tal, utilizou-se a Cooperativa Agrícola Nova Aliança (COANA) como objeto empírico de análise. Justifica-se a utilização do método qualitativo como forma de interpretar fenômenos, através da interação entre a observação e a formulação conceitual, entre a pesquisa empírica e o desenvolvimento teórico, entre a percepção e a explicação (BULMER, 1977 apud TERENCE e FILHO, 2006). A pesquisa foi realizada em janeiro de 2009, sob a orientação da Profª Drª Maria Luiza Lins e Silva Pires, onde foi feita uma série de entrevistas gravadas nas sedes das cooperativas junto aos gestores e nas propriedades de alguns associados das quatro cooperativas do Vale do São Francisco. CAPITULO I COOPERATIVISMO AGRÍCOLA BRASILEIRO E A CONSTRUÇÃO SOCIAL DE MERCADOS DE QUALIDADE 1.1 Cooperativismo e o surgimento das cooperativas agrícolas no Brasil O surgimento do cooperativismo liga-se ao desenvolvimento do capitalismo industrial na Europa, especialmente na Inglaterra e na França do século XVIII. Tal fato revelava uma forma de expressão do movimento operário, que reagia às explorações e precárias condições de trabalho envolvendo crianças e adultos. Nessa época, não existia nenhum tipo de sistema previdenciário ou segurança no emprego nem, tampouco, possibilidade de organização e reivindicação da classe trabalhadora. As associações operárias eram proibidas por lei, sendo secretas ou clandestinas (PIRES, 2004). O marco fundamental do cooperativismo está associado ao ano 1844, na cidade de Manchester, Inglaterra, quando os chamados Pioneiros de Rochdale (27 homens e 1 mulher tecelões) motivados por dificuldades financeiras, organizaram um armazém comunitário administrado por todos os sócios, passando a adquirir alimentos com preços mais baixos do que os de mercado. Surgia, assim, o cooperativismo de consumo (CANÇADO, 2004:29). Porém, entre os objetivos dos Pioneiros de Rochdale não estavam apenas à aquisição de alimentos, mas também a educação dos membros e familiares, o acesso à moradia e ao trabalho (através da compra de terra e fábricas) para os desempregados e mal remunerados. Desejavam também o estabelecimento de uma colônia cooperativa autossuficiente (CANÇADO, 2004:30). Em 1862, porém, os Pioneiros de Rochdale abdicaram da idéia de uma “comunidade autônoma” na qual não havia diferenças de tratamento entre associados e empregados. A partir do momento em que os empregados passam a não mais gozarem dos mesmos direitos dos associados, cria-se, assim, conflitos entre o ideal cooperativo e o meio ambiente empresarial existente (Idem). Um dos grandes difusores do cooperativismo e inspiração para os pioneiros de Rochdale foi Robert Owen (1771-1858), defensor da idéia de que o caminho para o socialismo se daria através da criação de comunidades livres e igualitárias, nas quais o trabalho deveria ser pautado em bases cooperativas, a partir do esforço solidário de seus integrantes, pressupondo uma melhor qualidade de vida (PIRES, 2004). O primeiro país a reconhecer o direito à associação foi à Inglaterra, em 1826. Porém, o direito de greve só aconteceu anos mais tarde, em 1875. Na França, esse reconhecimento só ocorreu em 1884 (Idem). Contudo, pode-se afirmar que o cooperativismo surgiu de um movimento operário predominantemente urbano, resultante da criação de um modelo de associação, onde é atribuído aos seus associados direitos iguais, tanto no que diz respeito à contribuição financeira individual, quanto à sua participação nas tomadas de decisão (RIOS, 1979). Em 1895, é criada a Aliança Cooperativa Internacional – ACI – em meio a mudanças em relação ao movimento cooperativista original. Prevaleciam, na época, duas correntes do cooperativismo: aquela que defendia o processo de transformação da sociedade através das cooperativas de produção e da extinção do trabalho assalariado, com a participação dos trabalhadores nos excedentes. E a outra corrente, guiada pelas cooperativas de consumo, que defendia a utilização do trabalho assalariado e a não participação dos trabalhadores nos excedentes gerados, como forma de expandir os setores produtivos industriais e agrícolas (CANÇADO, 2004:33). Como observa Pires (2004), no Brasil, as associações operárias surgiram inicialmente como sociedades de ajuda mútua, como foi o caso da associação dos “Galileus” de Pernambuco, nordeste do Brasil, onde moradores do antigo engenho de açúcar Galiléia viriam a criar posteriormente as “Ligas Camponesas”. Porém, as primeiras experiências do cooperativismo brasileiro remontam ao final do século XIX, com a criação da Associação Cooperativa dos Empregados, em 1891, na cidade de Limeira-SP, e da Cooperativa de Consumo de Camaragibe – Estado de Pernambuco, em 1894. O Sistema Cooperativo Brasileiro é apoiado legalmente na Lei nº 5.764, de 16 de dezembro de 1971 na qual as cooperativas como “sociedades de pessoas com forma e natureza jurídica própria, de natureza civil, não sujeita a falência, constituída para prestar serviços aos associados (...)”. Até a Constituição de 1988, o movimento cooperativo não tinha autonomia em relação ao Estado, que ficava sob responsabilidade do Ministério da Agricultura, sendo esta conquista de autonomia considerada pelo movimento cooperativista um grande avanço no que diz respeito à legislação específica do movimento (Idem). O cooperativismo brasileiro estava associado a políticas e projetos de modernização implementados por um Estado autoritário (PIRES, 2004) em uma economia predominantemente agro-exportadora, desvinculada dos ideais europeus de solidariedade, e pautada em uma política de controle social e de intervenção do estado, onde foi importada e adequada aos interesses das elites políticas e agrárias (RIOS, 2007). A partir de 1923, motivada pelo poder público e pela promulgação da lei básica do cooperativismo brasileiro, houve um grande crescimento da prática cooperativista no Brasil. Porém, sua história é marcada por diferentes dinâmicas nas diversas regiões do país, onde se pode destacar os estados de Minas Gerais e São Paulo. No nordeste, destaca-se o estado de Pernambuco como o estado de maior representatividade (PIRES, 2004). De acordo com a literatura, o cooperativismo no Brasil vem revelando uma grande heterogeneidade de práticas associativas marcadas por contextos socioeconômicos e culturais distintos entre as diferentes regiões do país (LIMA, 2011). Como destacado por Pires (2004), o cooperativismo nordestino reproduz, em grande medida, um modelo de prática coronelista e elitista com objetivo de controle social e político, desvinculando-se das necessidades de seus membros. De acordo com a literatura, permanece o modelo de “modernização conservadora” que favorece médios e grandes agricultores voltados à cultura de exportação, em detrimento de uma agricultura de subsistência desenvolvida pela agricultura de base familiar (SCHNEIDER, 1999). Por ser organizada a partir de uma estrutura de classes, na qual os cargos mais elevados sempre são ocupados pelos grandes proprietários e pelas lideranças políticas locais e regionais, atendia a benefícios de pessoas e de grupos específicos, identificando-se mais como instrumento de controle do que de mudança social, se distanciando, assim, do ideal europeu que originou o cooperativismo (PIRES, 2004). A falta de planejamento a curto e médio prazo, ligado a baixos investimentos de capital e utilização de mão-de-obra sem qualificação, decisões centralizadas e baixa participação dos associados, foram alguns dos problemas encontrados (Idem). Porém, no contexto atual, algumas experiências se destacam, demonstrando-se como competitivas e dinâmicas, totalmente inseridas no mercado internacional e nacional, graças à introdução de novas tecnologias, ampliação de oferta do produto no mercado e adequação às exigências ditadas por clientes internacionais, via aprimoramento nos processos de qualidade e sanidade dos produtos (PIRES, 2004). Isso pode ser observado na Cooperativa Agrícola Nova Aliança (COANA), nosso objeto de pesquisa, que tem sua criação associada à necessidade sentida por agricultores experientes na exportação de uva em fundar uma cooperativa, potencializando os recursos e minimizando custos de exportação (PIRES e CAVALCANTI, 2009). Fundada em 2005, a Cooperativa Agrícola Nova Aliança (COANA), é formada por produtores com experiência na produção de uva. Localizada na cidade de Petrolina, no Estado de Pernambuco. A COANA é especializada na produção e comercialização de uva com e sem semente para os mercados globais. A Cooperativa é responsável por toda a gerencia da produção de seus cooperados, em suas fazendas, desde a logística de recepção, armazenamento e expedição de pallets em sua câmara fria. Como destaca Pires (2004), o tipo de gestão e nível de tecnologia adotado pela cooperativa, bem como o nível de participação dos associados, assim como seus compromissos em relação à empresa parecem ser os fatores mais decisivos no sucesso do empreendimento, mostrando que o cooperativismo agrícola tem servido de instrumento importante de integração produtiva às cadeias de alimentos numa economia globalizada. 1.2 Cooperativismo Agrícola e a ênfase nos Mercados de Qualidade Como indica Cavalcanti (1995), as mudanças relativas ao mercado e a agricultura resultaram numa profunda transformação no meio agrícola, especialmente no que se refere ao comércio, mercados e produção. A mudança dos hábitos alimentares, estimulados por uma dieta pósfordista e a busca por novos produtos, estimularam as corporações mundiais e distribuidores particulares a criarem novas demandas (CAVALCANTI, 2004:23). O desenvolvimento dos mercados também estimulou a busca pela diversificação dos alimentos frescos, com a ampliação do consumo de produtos diferenciados que, segundo Bonnano (1999), referem-se à produção e ao abastecimento em rede de alimentos frescos, cuja entrada e competição no mercado não se baseiam apenas nos preços, mas também em critérios de qualidade e controle definidos externamente. Na tentativa de sobreviver a essa economia globalizada, as organizações econômicas, particularmente o cooperativismo agrícola, dependem da criação de estratégias para responder aos desafios impostos pelos apelos dos mercados acerca da qualidade (PIRES, 2009). Como sublinha Pires (2003), a criação de associações e cooperativas vem sendo destacada na literatura como uma via importante de produção, organização dos produtores, de agregação de valor e de comercialização da produção. A importância da associação cooperativa está, portanto, ligada a uma forma de manutenção da atividade agrícola e de organização dos produtores num mundo regido pela forte competitividade e liberação dos mercados (PIRES, 2009). Contudo, como se discute na literatura, faz-se necessário que as cooperativas estejam estruturadas de forma competitiva, investindo em tecnologia, na adoção de práticas cooperativas modernas e capacitação permanente de seus associados, garantindo, por conseguinte, uma boa governança empresarial (PIRES, 2005). Com efeito, a utilização de novos modelos organizacionais vem tornando possível à atuação das organizações cooperativas nos mercados, inserindo os pequenos produtores rurais nos grandes circuitos de comércio de alimentos. Ao mesmo tempo também permitem vantagens competitivas no que diz respeito à produção certificada e de qualidade, bem como estratégias de inserção social e econômica de seus associados (BIALOSKORSKI, 2002). No caso do Vale do São Francisco, a criação das cooperativas foi uma forma que produtores já experientes no ramo da fruticultura encontraram para baixar custos operacionais e aumentar o volume de vendas, prática associada a um modelo “pós-fordistas” de acumulação e produtividade (PIRES 2004; PIRES et al., 2009; PIRES e CAVALCANTI, 2010). Cavalcanti (2004) observa que as regiões exportadoras de frutas apresentam cuidados especiais quanto ao cultivo, mais especificamente no que diz respeito ao formato, cor, doçura, entre outros, para poderem circular nos mercados mundiais. Pires (2004) admite que, a produção de frutas no Vale do São Francisco, sob a ótica da qualidade, foi uma via que possibilitou a visibilidade da região como um pólo de fruticultura de qualidade perante o alto grau de competitividade dos mercados globais. Como descreve a autora: [...] a preocupação da CAJ com a qualidade e com a uniformização dos procedimentos vem se constituindo, no discurso da direção, numa marca distintiva da empresa em relação a outras empresas de frutas (PIRES, 2004:242). Tanto na produção como na distribuição, há uma preocupação constante em destacar as características dos produtos, para atender as novas demandas, pois os atuais mercados baseiam-se em alimentos de alto valor, a exemplo de produtos exóticos, não sazonais e certificados pela origem (CAVALCANTI, 2004). Nesse sentindo, como admite Cavalcanti (2004), criam-se hábitos alimentares mais sofisticados, implicando na necessidade de mais modernização das empresas para atender as exigências das organizações reguladoras no que diz respeito não apenas ao alimento em suas características básicas, mas também a sua forma de apresentação, embalagem e marca. Com efeito, como admite Lima (2011), o movimento de coordenação dos sistemas agroalimentares, orientados pela relação entre produtores e consumidores, tem possibilitado a inserção de agroindústrias cooperativas, na dinâmica dos mercados globais a partir da agregação de valor aos produtos, oferecendo serviços de embalagem, transporte, classificação, rastreabilidade, inspeção, entre outros fatores. No contexto da produção dos alimentos, há participação de diversos atores, onde a construção de produtos de qualidade resulta das relações sociais, e a construção da qualidade dos produtos, exige definições do grau de responsabilidade dos vários atores envolvidos (CAVALCANTI, 1999). Deste modo, podemos destacar que a qualidade é hoje uma das principais preocupações não apenas dos distribuidores e consumidores, mas também dos produtores. Isso pode ser observado nos mercados de frutas in natura, que têm se ampliado nas duas últimas décadas. 1.3 A Construção Social dos Mercados de Qualidade De acordo com a literatura especializada, os primeiros estudos sobre a organização dos mercados estavam voltados para os mecanismos de formação dos preços (ABRAMOVAY, 2004). No entanto, como chama a atenção Abramovay (2009), na atualidade, o mecanismo de preço vem se enfraquecendo, na medida em que o consumidor associa ao produto outros dispositivos de julgamento, a exemplo da originalidade e da conformidade5. Como admitem Abramovay (2004) e Wilkinson (2004), esses novos olhares sobre os mercados são recentes e foram influenciados pelos estudos da Nova Sociologia Econômica, em meados dos anos 1980, em especial nos Estados Unidos. O mercado passa a incorporar, além dos mecanismos de formação dos preços, os elementos constitutivos de construções sociais, onde se devem levar em conta os conflitos, dependências, estruturas e imprevisibilidades que os caracterizam. Assim, o mercado pode ser entendido: A partir das necessidades dos agentes, ressaltando aspectos como diversidade, vínculo com o território, as suas formas de coordenação, a sua capacidade de obter e inspirar confiança, de negociar, fazer cumprir contratos, estabelecer e realizar direitos (ABRAMOVAY, 2004:2). Para que os mercados funcionem, faz-se necessária a utilização de mecanismos de coordenação, onde a visão do mercado convencional é incapaz de observar, a exemplo da qualificação do produto e do trabalho (ABRAMOVAY, 2004). De acordo com Karpik (2009), esse mecanismo de coordenação dos mercados deve ser construído em conjunto com todos os atores envolvidos, 5 Lucien Karpik (2004) atendendo a condições essenciais como a confiança, a fidelidade e a reputação, bem como a diversidade. A diversidade, como destaca o autor, é um importante elemento para uma “economia de qualidade”, na medida em que vai de encontro ao modelo dos mercados convencionais de padronização massificada (KARPIK, 2009). O autor também ressalta que os meios de julgamento no qual se constroem os mercados giram em torno de conflitos, necessidades, desejos e aspirações dos atores envolvidos acerca da estética, do serviço personalizado e do estilo de vida (KARPIK, 2009). Neste caso, a coordenação dos mercados se dará a partir da avaliação da “qualidade” feita pelos consumidores em cima do que eles desejam, sejam bens e ou serviços. Como dito anteriormente, os agricultores que antes tinham preocupação em produzir e colocar o seu produto no mercado, têm sido levados a produzir produtos com padrões determinados pelo mercado, no que diz respeito às características como cor, tamanho, meio de produção, precisando também, respeitar convenções sociais, normas ambientais, entre outras. Como acrescenta Wilkinson (2004), cada vez mais, a coordenação dos mercados está ligada a interesses e valores de diferentes grupos. O autor se remete a Teoria das Convenções quando afirma que esses interesses se referem a “qualidade” do produto, dentro de uma visão orientada aos novos padrões de consumo alimentar, ligados à saúde e aos desejos e crenças dos consumidores (WILKINSON, 2004). Assim, para o autor, a importância da Teoria das Convenções para o funcionamento dos mercados reside no conteúdo e na forma de validação dos acordos, ou seja, das práticas produtivas, caracterizadas na forma de certificações e selos de qualidade, que surgem das estruturas sociais e dos critérios de qualidade de produção, em bases que permitam que produtos agroalimentares, circulem em mercados locais e globais (WILKINSON, 2003). A compreensão dos mercados sob a ótica de estruturas sociais reside: [...] na subjetividade dos agentes econômicos, à diversidade e à história de suas formas de coordenação, às representações mentais a partir das quais se relacionam uns com os outros, a sua capacidade de obter e inspirar confiança, de negociar, fazer cumprir contratos, estabelecer e realizar direitos (ABRAMOVAY, 2004:2). Segundo o autor, o estudo dos mercados como estruturas sociais particulariza os interesses dos indivíduos, ou dito em outras palavras, o mercado será orientado a partir das escolhas individuais dos atores envolvidos, sob a influência de suas crenças e normas emergentes das relações sociais (ABRAMOVAY, 2004). As relações sociais, especialmente expressas nas imposições globais, via normas presentes nas certificações dos produtos serão analisados no quarto capítulo. CAPITULO II QUALIDADE: HISTÓRICO E CONCEITOS 2.1 Histórico e evolução da Qualidade Nos séculos XVIII e XIX, o controle de qualidade dos produtos era feito por artesãos, trabalhadores experientes e aprendizes supervisionados por mestres de ofício, diferentemente do que se vê hoje, quando produtos com alto grau de complexidade em sua produção exigem os cuidados de profissionais especializados (GARVIN, 2002). Segundo Carvalho (2005:2), neste período, o controle da qualidade pautava-se no produto e não no processo realizado via inspeção de todos os produtos pelo artesão. Na assim chamada “era da inspeção”, voltada para o produto acabado, apenas encontravam-se produtos defeituosos na razão direta da intensidade da inspeção (LONGO 1995). Foi também nesse período que se deu início da produção em larga escala e da necessidade de produção de peças que poderiam ser utilizadas alternadamente. Percebia-se, com isso, a possibilidade de se desenvolver uma série de exigências baseadas em um modelo-padrão do produto para assegurar a sua uniformidade. Tal processo deu origem ao sistema nacional de medidas, enquanto um conjunto de exigências baseadas em critérios e normas capazes de garantir que as peças seriam produzidas com exatidão e precisão (GARVIN, 2002:4). Segundo Garvin (2002), no século XX, a inspeção passou a ser mais vinculada ao controle da qualidade, sobretudo a partir dos estudos de Frederick W. Taylor6 e a publicação da obra The Control of Quality in Manufacturing de G. S. Radford, quando na opinião do autor, a função do inspetor passou a ter destaque por ter sido atribuído a ele a responsabilidade pela qualidade dos produtos. Desta forma, a qualidade era obtida através de inspeção, controle, 6 Princípios de Administração Científica. seleção dos produtos, contagem, classificação pela qualidade e reparos. Tinha por objetivo principal obter qualidade igual e uniforme em todos os produtos, cuja principal ênfase estava na conformidade (Idem). Para melhor compreender a construção da qualidade ao longo das décadas, a literatura estabelece alguns personagens históricos como sendo marcos importante na definição de processos de qualidade. Assim destacam-se os estudos do químico e metalúrgico francês Henry Le Chatelier (1850-1936) que afirmava, dentro de uma visão determinista, que não havia lugar para o “azar”, combatendo a “preguiça” dos encarregados que atribuíam ao azar a causa do mau funcionamento dos equipamentos, ao invés de orientar seus esforços para melhoraria dos produtos (BAYART, 1993). Outro personagem presente nas referências é o físico W.E. Shewhart que, no ano de 1924, destacou a insuficiência do paradigma determinista, destacando que a qualidade de determinados objetos não poderiam ser definidos com exatidão se não estivessem definidos em termos estatísticos, diferentemente da perspectiva da época que atribuía ao aumento da qualidade à precisão das máquinas (Idem). O ano de 1931 representou um marco no movimento da qualidade, a partir dos estudos sobre controle estatístico de Shewhart (controle estatístico de processo) que tem como preocupação detectar as causas dos defeitos e sua prevenção. Nesse estudo, Shewardt definiu um método preciso para o controle do processo de produção, estabelecendo princípios para monitorar e avaliar a produção de forma diária, melhorando, assim, a qualidade do produto e controle (GARVIN, 2000). A literatura destaca os anos de 1940 e 1950 como responsáveis pelo desenvolvimento do referencial teórico que daria origem à era da garantia da qualidade nos Estados Unidos (CORDEIRO, 2004). Como sublinha Cordeiro (2004), apesar de muitos autores desse período serem americanos, a utilização efetiva desses processos teve início no Japão. Também em 1950, com o surgimento das usinas nucleares, foi desenvolvido o conceito de “Garantia da Qualidade”, exigindo das empresas fornecedoras a utilização de rígidos conceitos (TOLEDO, 1997). Assim, a “Garantia da Qualidade” expandiu-se para outros setores, utilizando um número grande de fornecedores, que passam a exigir a implantação de Sistemas de Garantia da Qualidade, fazendo com que, os princípios aí contidos chegassem a todos os setores industriais. Nos setores agroalimentares a qualidade passou a ser garantida na forma de exigências contratuais, como: cumprimento de regulamentações governamentais, códigos, leis, técnicas de inspeção, controle da qualidade e auditorias técnicas (TOLEDO, 1997). Essas exigências passaram a ter grande impulso na década de 1980, quando diversas empresas perceberam que a adoção destes enfoques preventivos e sistêmicos poderia contribuir para a melhoria da qualidade e da produtividade (WILKINSON, 2003). Segundo Wilkinson et al (2005), com o surgimento do enfoque sistêmico, a preocupação da qualidade passa a abranger a empresa como um todo, compreende-se a qualidade para além de aspectos técnicos, administrativos e organizacionais. Assim, a qualidade passa a não depender apenas da engenharia e estatística, mas também de outras ciências como psicologia, sociologia, educação, economia, informática, entre outros. Como observa esse autor, a visão sistêmica foi resultado da crescente preocupação da sociedade, a partir do pós-guerra, com a segurança e confiabilidade dos produtos. 2.2 Regime alimentar e Transição para uma Economia da Qualidade O início do século XX foi marcado por diversas transformações, em especial no âmbito da produção, distribuição e consumo dos alimentos, definindo mudanças dos regimes alimentares. Bonanno (1999) afirma que, durante o período do pós-guerra, foram criadas estratégias para sustentar o crescimento da produção e o do consumo em massa, na medida em que as empresas geraram um nível elevado de produtividade valendo-se de estratégias Tayloristas, onde o lucro era obtido através da centralização e racionalização do trabalho. Com a utilização de especialização e mecanização da produção, a burocratização das empresas, o planejamento extensivo e o controle burocrático de “cima para baixo”, que caracterizaram o Fordismo ou "fordismo alto”, foram também adotadas políticas Keynesianas avançadas no âmbito do controle fiscal; política esta muito abrangente e de regulação dos planos socioeconômicos, na saúde, na educação e na área de bem-estar social (Idem). Como observa Bonanno (1999), apesar de diferenças significativas entre os setores econômicos e as regiões geográficas, os processos centralizados nos altos níveis de intervenção do Estado e na inclusão de grupos de trabalhos subordinados na administração da sociedade foram às características principais deste período. Aliados a grande representatividade dos sindicatos, que conseguiram maiores benefícios para os trabalhadores, como o aumento na participação do trabalho no discurso político, nos planejamentos e na esfera da legislação do trabalho, encontrava-se também a classe média que apresentava um crescimento significativo, elevando também seu padrão de vida. Como analisado ainda por Bonanno (1999), o Fordismo representou um aumento da competitividade nos mercados internacionais, fazendo com que empresas mantivessem as normas como forma de satisfazerem as exigências do consumo em massa. Tal forma de consumo foi resultante, como observa esse autor, da recuperação econômica da Europa e da Ásia, depois dos estragos provocados pela Segunda Guerra Mundial, da insuficiência de investimentos de capital em novas tecnologias e da estagnação organizacional. Em meados da década de 1950 até o fim da década de 1960, o fordismo apresentava um aumento da competitividade nos mercados internacionais, resultante da recuperação da Europa e da Ásia quanto aos estragos provocados pela Segunda Guerra Mundial, a insuficiência de investimentos de capital em novas tecnologias e a estagnação organizacional. Ademais, o fracasso do desenvolvimento da política industrial, o aumento dos custos do bem-estar social e outros fatores, impuseram ao capitalismo do pósguerra uma fase de desaceleração (BONANNO, 1999). Além disso, a crise do petróleo, a severa recessão de 1973, o fim do acordo de Bretton Woods e a baixa inflação significaram uma desorganização dos Estados Unidos enquanto centro multinacional capitalista (Idem). No final da década de 1970, com a grande concorrência global e as crises políticas e econômicas, foram adotadas novas estratégias para a redução da inflação, através de um crescimento mais lento, da redução do poder das organizações trabalhistas, da aceitação de níveis mais elevados de desemprego e dos cortes nos salários. O Estado deixou de ser o grande impulsionador do desenvolvimento para ser o grande responsável pela queda econômica. Para Bonanno (1999), o alto nível de competitividade dos mercados globais, provocou uma série de crises políticas e econômicas, levando o Estado a criar medidas para a redução da inflação, acarretando redução do poder dos sindicatos dos trabalhadores da época. Tais estratégias tiveram impacto sobre a elevação do desemprego e da diminuição dos salários, fazendo com que as medidas fordistas tomadas pelo Estado deixassem de ser vistas como benéficas passando a ser identificadas como causadoras da retração econômica. A crise Fordista instalada trouxe com ela alguns aspectos que marcaram o pós-Fordismo, como: Aumento da flexibilidade em escala global, a mobilidade de capital e a liberdade para colonizar e mercantilizar praticamente todas as esferas, destruindo-se as fronteiras sociais e espaciais relativamente fixas e gerando-se uma (Bonanno, 1999:30). descentralização da produção Segundo o autor, o desenvolvimento econômico pós-fordista global e as políticas de livre comércio “utilizam o Estado para aumentar a mobilidade de capital, destruindo os seus próprios instrumentos regulatórios em nível local, regional e nacional e reduzindo o poder de troca e as influências do trabalho”. Ainda para este autor, o pós-fordismo global é um sistema que permite a mobilidade nos mercados globais e garantia de benefício a respeito das novas exigências para evitar a rigidez econômica e social. O processo de globalização se iniciou a partir da década de 1970 e, no Brasil, como admite Bonanno (1999) em meados da década de 1980, quando a economia se baseava no modelo neoliberal, acarretando mudanças nos padrões de produção e de consumo. Os novos padrões de consumo valorizavam a incorporação de serviços no produto final, como a segmentação e descomoditização do mercado, preocupação com a qualidade nutricional (calorias) e a procura por produtos frescos. No contexto pós-fordista de produção, as inovações tecnológicas tiveram um papel importante quando referido às reestruturações dos sistemas agroalimentares, que eram baseadas na flexibilidade produtiva, que consistiam no ajustamento da produção através da segmentação dos mercados, obtendo produtos diferenciados e ligados a um controle das etapas da produção, e integração produtiva, que é responsável pela diminuição do tempo de produção, entrega e armazenamento de produtos, com a diminuição dos custos e gestão de informação (Idem). Diferentemente da economia Fordista, que se baseava na produção em massa dirigida para o consumo padronizado, no pós-fordismo há uma preocupação em produzir produtos de melhor qualidade e que atendam a necessidade de consumidores diferenciados (BONANNO, 1999). Isso pode ser particularmente observado nos sistemas agro- alimentares, devido à natureza das matérias primas, as condições climáticas, os aspectos fito-sanitários da produção, do comportamento sazonal da oferta, a forte regulamentação e a intervenção do Estado na produção e comercialização dos bens, a diversidade dos sistemas de produção na agricultura e, em especial, a dimensão simbólica do consumo dos alimentos. São, todas essas, características que intervêm no padrão tecnológico e da importância da qualidade dos produtos (Idem). Em outros termos, implica em dizer que o período Fordista, que se caracterizava pelo critério de quantidade/preço, deu espaço à economia da qualidade, onde tinha como destaque a qualidade como base da concorrência e das estratégias de marketing, com apelos à natureza, saúde e tradição (WILKINSON, 2000). Segundo Marsden (1999), nesse período houve um crescente interesse com modos de produção, abastecimento e consumo alimentar ligadas a preservação ambiental, e que não oferecessem riscos ao meio ambiente. Além disso, para Wilkinson (2000) no sistema agroalimentar, a produção que antes era orientada pela oferta, passa a ser orientada pela demanda. Ainda para o autor: Enquanto o "fordismo" se baseava na "qualificação" do trabalho para a maior quantificação da produção, a atual dinâmica econômica baseia-se precisamente na qualificação do produto, capturada pela atual obsessão com a "qualidade" (WILKINSON, 2000). No Brasil, esta transição teve início a partir da década de 1990, notadamente com a liberalização dos mercados, o que significou uma passagem da oferta de produtos padronizados para produtos diferenciados por qualidade e origem. A padronização permite a uniformização, estruturação dos produtos, referindo-se à rotina de produtos e processos (DIAS, 2005). Questões essenciais como forma de garantir a qualidade dos produtos agrícolas, satisfazendo, ao mesmo tempo, as exigências dos consumidores, o que fica particularmente acentuado no processo global de mercados, onde a qualidade passa a se constituir como elemento de estratégia competitiva (FLORES, 2002). 2.3 Conceito de Qualidade O termo qualidade é derivado do latim qualitate que, segundo Toledo (1997), quando relacionado a produtos de mercado, significa estar de acordo com as exigências dos clientes, relação custo/benefício, adequação ao uso, valor acrescentado, que produtos similares não possuem; o fazer bem produtos e/ou serviços com efetividade. Segundo o autor, pode-se observar, na literatura, duas vertentes principais na concepção da qualidade: uma primeira que destaca o ponto de vista do consumidor, definindo qualidade como “adequação ao uso”, onde o produto está de acordo com as necessidades e anseios do consumidor; uma segunda que destaca o ponto de vista do produtor, no qual a qualidade está definida como “conformidade com especificações” de produto. Peretti e Araújo (2010) afirmam que o conceito de qualidade em alimentos “é construído em função da dinâmica da relação de consumo e envolve o Estado, o setor produtivo e os consumidores”, isso, considerando a qualidade a partir de uma análise de seus aspectos sanitários, de qualidade nutricional e de valores associados aos produtos alimentícios, tais como respeito ao meio ambiente, respeito aos produtores e o respeito às tradições. Segundo Garvin (1984), existem cinco enfoques nos quais a qualidade pode ser abordada: enfoque transcendental, enfoque baseado no produto, enfoque baseado no usuário, enfoque baseado na fabricação e o enfoque baseado no valor. I. Enfoque transcendental Nessa abordagem, a qualidade é sinônimo de “excelência inata”. No entanto, ela não pode ser definida de forma precisa por ser uma propriedade simples que aprendemos a reconhecer unicamente através das experiências, estando mais relacionada com a marca ou com a especificação, do que propriamente com o seu funcionamento. II.Enfoque baseado no produto A classificação da qualidade de acordo com as características que possui, definindo a qualidade como um conjunto mensurável de ingredientes ou atributos de um produto. III.Enfoque no usuário A qualidade está associada às preferências do consumidor, na capacidade de satisfazer as suas necessidades. IV.Enfoque na fabricação Identifica a qualidade como conformidade das especificações, não considerando as qualidades intrínsecas do produto. V.Enfoque no valor Define a qualidade em termos de custo e preço. De acordo com esse enfoque, um produto de qualidade é aquele que fornece desempenho com um custo aceitável. Nesse sentido, um produto com alto valor no mercado e pouca possibilidade de ser adquirido, não seria considerado um produto de qualidade. Segundo o autor, a dificuldade de se empregar esta abordagem reside na união de dois conceitos relacionados mas distintos. No entanto, segundo Wilkinson: as noções variadas de qualidade estão em concorrência e contestação, revelando os distintos valores por trás da aparente neutralidade de normas e técnicas. O que, para alguns, são valores estéticos associados à produção artesanal, para outros são indicadores de ameaça à saúde pública. O que, para alguns, são os valores de eficiência, para outros são premissas na geração de externalidades inadmissíveis (2002:19). Para Wilkinson et al. (2005), qualidade é um conceito subjetivo, no qual, pode-se destacar duas linhas de pensamentos: a primeira, de origem anglo-saxônica e de inspirações neoclássicas, que define a qualidade de forma generalista e valorizando a finalidade de um produto como um bem econômico, ou como um conjunto de propriedades e características capazes de satisfazer as necessidades do consumidor. A segunda, baseada nos avanços das chamadas “teorias das convenções francesas”, considera a construção dos produtos, onde a qualidade de sucessivas negociações e convenções, desde a produção até o consumo, resulta no compromisso entre os diversos atores com diferentes estratégias (WILKINSON et al., 2005). Aqui, as convenções se apresentam como mecanismo de desenvolvimento dos instrumentos de controle de qualidade, buscando uma qualidade previamente estabelecida entre os diversos atores envolvidos, e tem, nas certificações um instrumento de controle de qualidade. 2.4 Padrões de Qualidade: Certificações como Estratégias de Competitividade Internacional Com as exigências da comercialização nacional e internacional de produtos agroalimentares presentes no processo de globalização, no crescimento populacional e nos perigos associados aos gêneros alimentícios, a necessidade da implementação das certificações como garantia de um alimento saudável tornou-se uma realidade comum ao conjunto dos países produtores (AMARAL, BATALHO e TOLEDO, 2000). Entretanto, o investimento produtivo no estrangeiro, feito por empresas de países emergentes, tradicionais importadores de capital, é um fenômeno recente. Um dos ganhos decorrentes do processo de internacionalização para as empresas é a diversificação da base de conhecimentos adquiridos pela exposição às situações diferentes nos diferentes mercados em que a empresa passa a atuar (Idem). Nesse contexto Kraus afirma que: a internacionalização tem sido uma das estratégias que muitas empresas têm buscado para fazer frente aos concorrentes internacionais com o objetivo de melhorarem a competitividade em seus mercados domésticos (2000:56). Além de interagir em novos mercados, as empresas que se internacionalizam buscam acesso a novas tecnologias, facilidades fiscais, redução de custo de mão-de-obra, fortalecimento de sua marca e diversos outros fatores que são preponderantes em uma decisão estratégica desta natureza. Esse processo de internacionalização está caracterizado pela obtenção de certificados de qualidade, capazes de garantir um produto produzido dentro de especificações pré-determinadas. Assim, pode-se afirmar que: A certificação é um instrumento para implementação do sistema de qualidade, tanto nas propriedades rurais quanto na agroindústria de classificação e embalagem (packing house), colocando a necessidade de atendimento de uma série de exigências. Envolve todas as etapas do processo produtivo, em todos os níveis (PAULINO et al, 2008). A partir de meados dos anos 1990, principalmente, em decorrência das crises alimentares provocadas pelo surgimento da “Doença da vaca louca” (Encefalopatia Espongiforme Bovina) e da contaminação inicial de frangos na Bélgica pela presença de dioxinas em rações, a sanidade dos alimentos adquiriu destaque na segurança alimentar (SILVA e AMARAL, 2004). A preocupação dos consumidores com a qualidade dos alimentos tornou-os ainda mais exigente no que se refere a ação do Estado para vigilância e controle da qualidade sanitária dos alimentos. Discute-se que a importância da segurança sanitária dos alimentos deve-se, em grande medida, ao fato de os problemas nessa área terem reflexos, imediatos e graves, na ordem econômica (Idem). Nesse sentido, o termo alimento seguro é um conceito cada vez mais recorrente na atualidade, não somente pela sua importância para a saúde pública, mas também pelo seu importante papel no comércio internacional (BARENDSZ apud FIGUEIREDO & COSTA NETO, 2002). A qualidade e a segurança de um alimento requerem mais do que regulamentações e ações de inspeção, na medida em que também dependem da cultura e do conhecimento de todos, ao longo da cadeia, para a prevenção e a prática da melhoria contínua, tendo em vista o consumidor final (AMARAL, BATALHO e TOLEDO, 2000). Eis a razão pela qual a legislação em segurança do alimento é geralmente entendida como um conjunto de procedimentos, diretrizes e regulamentos elaborados pelas autoridades, direcionados para a proteção da saúde pública (FIGUEIREDO e COSTA NETO, 2001). 2.4.1 Certificações Nacionais e Globais para a comercialização de Frutas No Brasil, na década de 1990, medidas de ordem política e econômica culminaram na abertura do mercado para entrada de produtos estrangeiros, imprimindo às organizações brasileiras variações e mudanças significativas, obrigando-as a encontrar diferentes alternativas para a melhoria da qualidade de seus produtos, processos ou serviços (SILVA e AMARAL, 2004). No caso da produção de frutas, tendo como referência a região frutícola do Vale do São Francisco, a comercialização com os mercados globais se tornou presente a partir da necessidade de modernização e padronização dos produtores para se adequar as exigências dos mercados e dos consumidores, podendo destacar, nesse sentido entre as empresas a tentativa de criar estratégias de exportação, e o apoio do Estado no incentivo a exportação de frutas frescas da região (PIRES, 2004). Na verdade, pressionadas pela abertura do comércio internacional, as empresas brasileiras tiveram que focar suas iniciativas para ações estratégicas, precisando melhorar seu desempenho na qualidade de seus processos, produtos e serviços, sistemas de gestão e pessoal. (Idem). A procura pela qualidade dos produtos comercializados, levaram os produtores a implantar sistemas de padrões de qualidade caracterizados na forma de certificações que controlavam todo o processo de produção, desde a escolha da semente até a embalagem (SILVA e AMARAL, 2004). No campo especialmente da fruticultura, criou-se, no ano de 1997, o sistema de Produção Integrada de Frutas (PIF) pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) que visava a alta qualidade das frutas brasileiras, cujo selo está apresentado na figura abaixo: . Figura 1 - Selo da Produção Integrada de Frutas Fonte: Ministério da Agricultura, 2012. O objetivo da PIF estava relacionado à elevação dos padrões de qualidade e competitividade da fruticultura brasileira ao patamar de excelência requerido pelo mercado internacional. Nesse sentido, como observa Flores (2002), a produção integrada é definida como sendo: um sistema de exploração agrária que produz alimentos e outros produtos de alta qualidade mediante o uso dos recursos naturais e de mecanismos reguladores para minimizar o uso de insumos e contaminantes e para assegurar uma produção agrária sustentável. A implantação do PIF, em 1998, resultou da iniciativa dos produtores de maçã do Rio Grande do Sul e da Embrapa Uva e Vinho, se estendendo para outras frutas, a partir de 1999, já como programa oficial do MAPA (Idem). O PIF foi um dos primeiros selos de qualidade adquiridos pelos produtores do Vale do São Francisco no intuito de comercializar seus produtos em território nacional e internacional. Através do PIF tornou-se possível o rastreamento da produção, conferindo ao agricultor um selo de certificação e ao exportador a qualidade da fruta. Além disso, o PIF já previa a redução do impacto negativo do sistema produtivo no meio ambiente, a partir do uso racional de produtos químicos (Idem). Não se pode negar que, em se tratando do terceiro maior produtor mundial de frutas frescas, o Brasil não pode prescindir de medidas dessa natureza. Grosso modo, a certificação é definida pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) como: um conjunto de atividades desenvolvidas por um organismo independente da relação comercial, com o objetivo de atestar publicamente, por escrito, que determinado produto, processo ou serviço está em conformidade com os requisitos especificados (ABNT – ISO 9000, 2008). As atividades de certificação podem envolver: análise de documentação, auditorias/inspeções na empresa, coleta e ensaios de produtos, no mercado e/ou na fábrica, cujo objetivo é avaliar a conformidade e manutenção dos processos (PESSOA et al, 2002). Nos mercados externos, especialmente, na Europa e nos Estados Unidos, principais importadores das frutas brasileiras, o GLOBALG.A.P. (Good Agriculture Pratices – GAP) se constitui como principal certificado para a exportação. O GLOBALG.A.P. é um protocolo de Pontos Críticos de Controle e Boas Práticas de Manipulação e Produção de Alimentos. Anteriormente era conhecido como EUREPG.A.P. Tal certificado é resultado de pressões de exportadores de frutas e hortaliças para o estabelecimento de regras de produção que levem em consideração: resíduos de agroquímicos, meio ambiente e condições de trabalho e higiene (GLOBALG.A.P., 2008). Nesse sentido, o GLOBALG.A.P, inclui os seguintes itens: Proteção do Meio Ambiente: consiste em Boas Práticas Agrícolas de Proteção Ambiental, com o objetivo de minimizar os impactos negativos da Produção. Nesse sentido, o protocolo destaca seis áreas que consideram mais importantes em termos de preservação ambiental: 1. áreas com alta concentração de biodiversidade com importância mundial, regional ou nacional (espécies endêmicas, espécies ameaçadas, reservas); 2. grandes espaços naturais de importância mundial, nacional ou regional, onde vivem espécies que existem naturalmente nesse habitat; 3. áreas que se encontram em ou que contêm ecossistemas raros ou ameaçados de extinção; 4. áreas que fornecem serviços básicos ao ecossistema em situações críticas (proteção de bacias vertentes, controle de erosão); 5. áreas que são fundamentais para cumprir com as necessidades básicas das comunidades locais (subsistência, saúde); 6. áreas essenciais para a identidade cultural das comunidades locais (áreas de importância cultural, ecológica, econômica ou religiosa identificadas em cooperação com as comunidades locais) (GLOBALG.A.P., 2010). Condições de trabalho, Saúde e Segurança dos Trabalhadores: estabelece um nível global de critérios de higiene e segurança no trabalho nas unidades de produção, bem como a conscientização e responsabilidade quanto a assuntos sociais. No entanto, não substitui auditorias específicas relativas à Responsabilidade Social da Empresa (GLOBALG.A.P., 2010). Avaliação do Impacto Social: análise, monitoriamento e gestão das consequências sociais intencionais e não-intencionais, positivas e negativas, de intervenções planejadas (políticas, programas, planos, projetos) e de quaisquer processos de mudança social provocados por essas intervenções (GLOBALG.A.P, 2010). Vale ressaltar que a GLOBALG.A.P. é uma organização privada que estabelece normas voluntárias para a certificação de produtos agrícolas em todo o mundo. O objetivo do GLOBALG.A.P. é estabelecer uma norma de Boas Práticas Agrícolas (BPA) que inclui diferentes requerimentos para os diferentes produtos e que possa ser adaptada a toda a agricultura mundial. É uma norma dita "pre-farm-gate" (antes da saída da unidade de produção), o que significa que o certificado abarca toda a produção do produto certificado: desde insumos até a sua distribuição. Quanto ao selo GLOBALG.A.P. este é uma marca comercial destinada ao uso de empresa para empresa e, como tal, não é diretamente visível para o consumidor final (GLOBALG.A.P., 2008). Como divulgado pelo GLOBALG.A.P. NEWS Good Agricultural Practice (2008), tal certificação é efetuada por mais de 100 organismos de certificação independentes e oficialmente reconhecidos em mais de 80 países, sendo aberto para todos os produtores no mundo. Neste documento, o GLOBALG.A.P. é definido como um conjunto de documentos normativos que incluem o Regulamento Geral, o documento de Pontos de Controle e Critérios de Cumprimento e o Checklist. Com base nesses critérios, entende-se que o protocolo GLOBALG.A.P. além de ser um sistema de certificação em si, também serve de base para que os produtores se enquadrem em outros sistemas de gestão de qualidade já desenvolvidos, como o PIF (Produção Integrada de Frutas), e outros que ainda estão em desenvolvimento (Idem). No Brasil, o sistema GLOBALG.A.P. vem sendo muito utilizado, principalmente por cooperativas agrícolas e grandes produtores de alimentos que exportam para os mercados Europeu e Norte Americano. No caso do Vale7, o sistema de certificação GLOBALG.A.P., no passado conhecido como EUREPGAP (Euro-Retailer Group, Good Agricultural Produce Working Practices), vem sendo utilizado desde 2004, constituindo-se como o principal certificado requerido pelos distribuidores europeus (CAVALCANTI e PIRES, 2010). Entretanto, para obtenção desse certificado, as cooperativas do Vale têm investido na qualificação dos seus produtores, através de assistência técnica por parte de órgãos como o SEBRAE, EMBRAPA, Universidades Federais, entre outros, ampliando os produtos que já utilizam regularmente tal protocolo. 7 As condições de adoção do GLOBALG.A.P. observado no capítulo quadro. pelos associados da COANA será particularmente CAPITULO III A FRUTICULTURA BRASILEIRA E A INSERÇÃO DO VALE DO SÃO FRANCISCO NOS MERCADOS 3.1 Mercados da Fruticultura no Brasil A fruticultura brasileira vem experimentando um crescimento vertiginoso nos últimos anos, tanto em nível de produção, quanto em nível de comercialização com os diversos mercados mundiais. Isso está diretamente vinculado aos seguintes fatores: transformações estruturais ligadas a uma necessidade de maior integração das unidades de produção às cadeias produtivas; investimento cada vez maior em suporte tecnocientífico na produção agroalimentar; necessidade de atendimento às novas exigências de padronização e controle de qualidade dos produtos; e a necessidade de ações inovadoras nos processos de gestão, bem como ao apoio do estado no incentivo a produção de frutas para exportação (BUSTAMANTE, 2009). Atualmente, o Brasil é o terceiro maior produtor mundial de frutas, apresentando um valor aproximado de 42,6 milhões de toneladas. Destes, 47% são de frutas in natura, sendo, 31% destinadas à exportação, na proporção de 2% de frutas frescas e 29% de frutas processadas (BRAZILLIANFRUIT, 2011). Segundo dados do Ministério da Agricultura, as exportações de frutas no Brasil cresceram 25% nos últimos cinco anos, obtendo, no ano de 2010, um valor estimado em US$ 875 milhões em exportação (GEBRIM, 2011). Isso pode ser melhor observado no gráfico 1, que mostra os principais países para os quais o Brasil tem exportado frutas frescas, apresentando o nível de participação de cada um deles no ano de 2010. Pode-se observar, que a União Européia, constituída pela França, Itália, Portugal, Dinamarca, Irlanda, Alemanha, Espanha e os Países Baixos, absorve 70% do volume exportado, seguidos do Reino Unido e dos Estados Unidos. 4% 2% 2% 1% 1% 1% 1% 1% 2% 5% 4% 38% 9% 10% 18% 2% Países Baixos (Holanda) Reino Unido Espanha Argentina Estados Unidos Uruguai Alemanha Portugal Itália França Irlanda Canadá Polónia Bangladesh Dinamarca Outros Gráfico 1 - Exportações Brasileiras de frutas frescas (2010) Fonte: Brazilianfruit, 2012. Nesse cenário de produção de frutas para exportação, a região Nordeste do Brasil vem apresentando, nos últimos anos, resultados expressivos. Isso se deve a organização e estruturação da produção em torno da fruticultura, favorecido por modernos sistemas de irrigação, que vem permitindo uma produção anual de frutas tropicais, subtropicais e mesmo frutas temperadas (banana, maçã, melão, melancia, uva, entre outras) (SILVA, 2001; CAVALCANTI, 2003; BUSTAMANTE, 2009; CAVALCANTI e PIRES, 2010). De acordo com a Tabela 1, no ano de 2008, a região Nordeste ocupou o segundo lugar em nível de produção de frutas no país, correspondendo, aproximadamente, a 27% de toda a produção nacional. Tabela 1 - Produção de Frutas na Região Nordeste do Brasil - 2002 (em Toneladas) Produção brasileira de frutas por estado em 2008 Região Total por Região SE 22.118.328 S 5.482.533 CO 1.040.525,1 N 2.379.007 NE 11.657.432 Fonte: IBGE/SIDRA 2011. O Vale do São Francisco destaca-se no contexto da fruticultura do país, atendendo aos padrões de qualidade nacional e internacional (CAVALCANTI, 1999). As características naturais da região, como o clima semi-árido e a baixa umidade, ligadas a produção irrigada, favorecem o cultivo de frutas com mais de duas safras ao ano, o que permite a ocupação de janelas de mercado. Tal fato confere ao Vale uma vantagem em comparação a outras regiões do país, consolidando a região como complexo produtivo (Idem). No Mapa 1 (Anexo), pode-se observar o nível de produção de frutas no Vale do São Francisco, destacando-se a produção de uva e manga das cidades de Petrolina e Juazeiro. As cidades de Petrolina e Juazeiro são responsáveis pela exportação de 97% e 99% de toda a produção de uva e manga, respectivamente (VITAL et al., 2011). 3.2 A Construção do Vale do São Francisco como uma Região Produtora de Frutas O Vale do São Francisco apresenta pólos (figura 2) que são reconhecidos pelo atendimento de padrões de qualidade das frutas, exigidos externamente, o que lhe garanti a conquista de mercados nacionais e internacionais. No entanto, segundo Cavalcanti et al. (2003), isso só se tornou possível a partir de apoio estatal por meio de incentivos fiscais e financeiros e o suporte de instituições públicas. . Figura 2 - Localização do Pólo Petrolina/Juazeiro Fonte: VALEXPORT e a fruticultura no Vale do sub-médio São Francisco Como se pode observar na literatura, até a década de 1940, a principal atividade economia da região era a pecuária extensiva, ficando a agricultura restrita aos cultivos de milho, feijão, melancia, melão, mandioca e cana-deaçúcar, que servia para o abastecimento de agroindústrias da região (SILVA, 2003). No que diz respeito à fruticultura, esta era ainda uma atividade realizada em pequena escala, baseada no cultivo de banana, laranja, limão, manga, entre outras, e voltada basicamente para o autoconsumo das famílias dos pequenos agricultores. Apenas uma pequena quantidade de frutas era destinada ao abastecimento das áreas urbanas adjacentes (Idem). Na década de 1946, o Estado decreta em lei a obrigatoriedade de investimentos direcionados para o desenvolvimento do Vale do São Francisco, favorecendo, posteriormente, o surgimento da fruticultura irrigada (SECRETARIA DE CIÊNCIA E TECNOLOGIA E INOVAÇÃO – SECTI/BAHIA, 2008). Dentre as ações do Estado, destaca-se a criação da Comissão do Vale do São Francisco (1948), que tinha por função difundir a irrigação para os pequenos agricultores ribeirinhos, através dos recursos disponibilizados pelo plano de aproveitamento do Rio como: projetos de irrigação, geração de energia elétrica, construção de estradas, saneamento, entre outros (Idem). No entanto, os primeiros projetos de irrigação pública só se tornaram realidade em 1968, a partir da transformação da Comissão do Vale do São Francisco (CVSF) em Superintendência do Vale do São Francisco – SUVALE, conhecida, a partir de 1974, por Companhia do Desenvolvimento do Vale do São Francisco – CODEVASF (Secretaria de Ciência e Tecnologia e Inovação – SECTI/Bahia, 2008). Porém, segundo Cavalcanti (1999), foi entre os anos de 1970 e 1980 que a região foi se tornando dinâmica no contexto da “modernização conservadora”. Nesse período, a agricultura brasileira passou por transformações que favoreceram regiões específicas, produtos e produtores, beneficiando a configuração de novos espaços produtivos, na modernização da produção e na transformação das relações sociais daí decorrentes, resultando em um grande processo de exclusão social no campo (CAVALCANTI e BENDINI, 2003). Apesar disso, como reconhecem os autores especializados naquela região, o suporte das instituições públicas como a Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco - CODEVASF, e o Centro de Pesquisa Agropecuária do Trópico Semi-Árido (EMBRAPA-CPATSA), em 1976, contribuíram para o desenvolvimento da região e na formação de Arranjos Produtivos Locas (APL) de frutas in natura (BAHIA, 2008). Cavalcanti et al. (2003) destacam que a opção pela fruticultura se inseria no Plano para o Desenvolvimento do Vale do São Francisco, como uma alternativa a agricultura irrigada tradicional que estava em crise. A partir da década de 1980, o perfil econômico da região sofreu grandes mudanças, fazendo-se sentir mais claramente os impactos dos investimentos do Estado. Nesse período, tornou-se expressivo o número de empresas internacionais e nacionais especializadas em fruticultura que se instalaram na região, consolidando as cidades de Petrolina, em Pernambuco e de Juazeiro, na Bahia, como polos agroindustriais (SILVA, 2003). Motivada por uma conjuntura favorável para a produção de frutas, teve inicio, nesse período, o cultivo da uva em larga escala, vinculada a um mercado de produtos “in natura”. Este cultivo esteve diretamente ligado a vinicultura, pois, grande parte das mudas de uvas cultivadas eram voltadas para a produção de vinho (BAHIA, 2008). A produção de frutas de mesa para exportação só veio a se consolidar no início da década de 1990 (BAHIA, 2008). Gráfico 2 - Evolução da Produção de Uva na Região do Vale do São Francisco nos Estados de Pernambuco e Bahia. Fonte: FILHO, 2011:2. Produção Agrícola Municipal (PAM), 2011. Registra-se ainda que o particular interesse na produção de uva e manga por parte das empresas que vieram a se instalar no Vale do São Francisco, se deu pelo grande nível de aceitação dessas culturas nos mercados globais (BAHIA, 2008). 3.3 Mercado de Exportação de Frutas no Vale do São Francisco Estudos sinalizam que as primeiras iniciativas de exportação no Vale tiveram início em 1987, por incentivos fiscais concedidos às empresas produtoras de frutas como forma de resolver problemas da balança comercial. Entretanto, o volume das primeiras exportações não foi significativo, o que teria, mais tarde, estimulado os grandes produtores a se organizarem em cooperativas e associações, de modo que pudessem centralizar as suas ações de comercialização da produção, (BAHIA, 2008). Nesse sentido podemos destacar a importância da VALEXPORT e da CAC no estímulo a criação de cooperativas na região do Vale Um marco importante para o reconhecimento da região como um pólo exportador foi também a criação da Associação dos Exportadores de Hortifrutigranjeiros e Derivados do Vale do São Francisco (Valexport), que ficou responsável por estabelecer vínculos com as cadeias mundiais de distribuição de frutas, mediando às relações entre grandes produtores e cooperativas da região e o mercado externo (SILVA, 2001). Reconhece-se também como um marco importante para a fruticultura a instalação da Cooperativa Agrícola Cotia (CAC) na região. Este fato estimulou o cultivo de uva e manga por parte de seus cooperados, constituindo-se como uma das primeiras empresas da região a exportarem frutas. Com a dissolução da CAC, grande parte dos produtores se unirão através da criação da Cooperativa Agrícola de Juazeiro (CAJ), especializada na produção e comercialização de uva (PIRES, 2004). Outro fator que tem contribuído para o aumento da produção de uvas no Vale do São Francisco, é a procura cada vez maior dos mercados por uvas sem sementes, principalmente o mercado Europeu. De fato, a busca dos mercados exportadores de uvas, vem sendo orientados pelas novas tendências dos consumidores por uvas sem sementes, o que tem levado os produtores do Vale a buscar novas variedades e inovações tecnológicas para atingir esses mercados (CAVALCANTI, 1999). Esse fato foi facilitado com o apoio técnico oferecido pelo Centro de Pesquisa da Embrapa - o CPATSA, com informações sobre variedades de uvas, manejo das culturas nas condições de cultivo irrigado em clima semiárido, entre outros (SILVA, 1999). Segundo Silva (2001), com a produção de frutas voltadas a atender os mercados globais, percebeu-se a necessidade de investimentos em infraestrutura, principalmente no que diz respeito à ampliação do número de packing houses8, impulsionando as exportações e o aumento de produtores e hectares de uva e manga da região. Segundo dados coletados por Pires (2004:191) referentes ao ano de 2006, a CAJ contava com uma câmara frigorifica com capacidade para 15.000 caixas de uva/dia, além de um espaço para armazenamento de 30.000 caixas/dia, possibilitando estender os serviços de resfriamento para outros produtores da região. No caso da CAJ, a construção da câmara fria se configurou como um requisito essencial para a comercialização da uva e da manga, garantindo as exportações. O caso da COANA é particularmente significativo nesse sentido, onde a criação dessa cooperativa se deu em torno da construção de uma câmara fria, como será discutido no capítulo seguinte. 8 Casa de embalagem CAPÍTULO IV AS COOPERATIVAS AGRÍCOLAS DO VALE DO SÃO FRANCISCO E SUA INSERÇÃO NOS MERCADOS DE QUALIDADE Pesquisas recentes realizadas no Vale do São Francisco apontam a existência de cooperativas de forte dinamismo econômico e produtivo, que são capazes de responder as novas demandas dos mercados. No âmbito dessas pesquisas, Pires e Cavalcanti (2010) analisam quatro cooperativas do Vale9 semelhantes pelo seu dinamismo e perfil dos seus associados. Tais cooperativas seriam, segundo as autoras, fundamentadas numa estrutura produtiva e organizacional enxuta, pautada em rigorosa governança administrativa; uma inversão financeira individual expressiva por parte dos associados; um elevado nível de profissionalismo dos produtores e, finalmente, uma forte adesão dos associados na condução dos negócios da cooperativa (PIRES e CAVALCANTI, 2010:7). Razão pela qual, admitem, poderiam ser classificadas como cooperativas de “Nova Onda”. Essa nova onda de cooperativas do Vale, segundo ressalta, aproximase do conceito de “Nova Geração de Cooperativas”, na medida em que engloba produtores com alto grau de empreendedorismo no setor agrícola, e que tem por objetivo o aumento da produção e comercialização dos seus produtos, bem como diminuição dos custos operacionais. Tal modelo está diretamente ligada a modelos de governança orientados a alcançar um produto de excelência (Idem). Porém, reconhecem que o conceito de “nova geração”, por envolver uma forma particular de capitalização via abertura de capitais no mercado, não corresponde integralmente aos casos em questão. 9 a Cooperativa Agrícola dos Exportadores do Vale do São Francisco (COOPEXVALE), Cooperativa dos Exportadores de Frutas do Vale do São Francisco (COOPEXfruit), a Cooperativa Juazeiro da Bahia (CAJ), e a Cooperativa Agrícola Nova Aliança (COANA). Como observa Bialokorski (1999), esse tipo de organização conhecida como de nova geração de cooperativa estimula a capitalização, participação, e a qualidade nos produtos finais, apresentando uma estrutura organizacional que incentiva o estabelecimento e a manutenção de padrões de competitividade e eficiência. Essas organizações cooperativas são criadas com a finalidade de atingir mercados e não estão pautadas tão somente no produto como normalmente ocorre, mas na capitalização, via venda de ações (PIRES, 2004). Uma característica marcante da Nova Geração de Cooperativas referese à fidelidade irrestrita dos cooperados, resultado dos contratos estabelecidos com os mercados, com os quais exige-se não apenas a fidelidade da entrega do produto em quantidade estabelecida, mas também com padrões de qualidade previamente definidos (BIALOKORSKI, 1999). Ainda para esse autor, essas novas cooperativas, por mais que apresentem um caráter inovador, tendem de um modo geral, a manter os objetivos da cooperação10. Ainda assim, reconhece que a rigidez da fundamentação legal e filosófica do cooperativismo tenda a comprometer os princípios do movimento cooperativo, na medida em que constitui um entrave diante da necessidade de flexibilidade requerida para o enfrentamento da abertura dos mercados, acarretando maiores custos de transações (BIALOKORSKI, 1998:100). Assim, observa que o "princípio da democracia" requer altos custos de transação em decorrência das tomadas de decisões serem em assembléias; o "princípio da igualdade", onde cada pessoa tem direito a um único voto, implica diretamente em altos custos de Agency provenientes da falta de incentivo para as atividades junto à empresa; e o "princípio da solidariedade", do retorno pro rata das operações e para fato de existir objetivos que visam o lucro, dificultam uma delimitação clara dos direitos de propriedade, acarretando elevados custos de Agency e de transação. 10 O cooperativismo baseia-se em valores de ajuda mútua, responsabilidade, democracia, igualdade, liberdade, honestidade, transparência, equidade e solidariedade, e são eles que balizam os princípios cooperativos, segundo sua origem (PIRES, 2004). Nesse sentido, Pires (2004) chama a atenção para as tensões existentes entre a “filosofia cooperativa e racionalidade capitalista”, na qual a primeira, muitas vezes, esbarra nas estratégias capitalistas adotadas pelas cooperativas como forma de se manterem competitivas nos mercados. Portanto, para essa autora, a conciliação entre a filosofia cooperativa e a racionalidade capitalista constitui o principal desafio das organizações cooperativas na atualidade. Nesse sentido, a autora questiona “[...] Até que ponto é possível corresponder às demandas próprias da globalização sem comprometer a identidade do movimento? (PIRES, 2004:61)”. Com efeito, para estarem inseridas nos mercado, as cooperativas desenvolvem práticas inovadoras e eficazes capazes de atender, ao mesmo tempo, cooperados e clientes internacionais. Por essa razão, cada vez mais, as cooperativas estão sendo administradas por gerentes executivos, cujas decisões nem sempre são oriundas das assembléias (Idem). Pires (2004) ressalta ainda que, apesar da possibilidade de alterações nos princípios filosóficos e doutrinários - seja por reformulação de alguns princípios ou fim de outros - esses aspectos revelam os limites de ação das cooperativas. É, portanto, no campo dessas discussões que situamos nosso objeto de estudo a Cooperativa Agrícola Nova Aliança (COANA)11. O caso da COANA constitui um exemplo ilustrativo para identificar as estratégias utilizadas pelas cooperativas como forma de atendimento aos critérios de qualidade exigidos pelos mercados. 4.1 Cooperativa Agrícola Nova Aliança (COANA) A Cooperativa Agrícola Nova Aliança (COANA), fundada em 2005, está localizada na cidade de Petrolina, no estado de Pernambuco. A COANA é especializada na produção e comercialização de uva com 11 Além dessa, utilizaremos as demais cooperativas investigadas (CAJ, COOPEXVALE e COOPEXfruit) quando necessário, como forma de complementação das informações. e sem semente para os mercados globais, tendo sua criação associada à necessidade sentida por agricultores experientes na exportação de uva, em fundar uma cooperativa, potencializando os recursos e minimizando custos de exportação (PIRES e CAVALCANTI, 2009). Com a criação da cooperativa centrou-se como primeira providencia a construção de uma câmara fria com capacidade para 160 mil toneladas de uva por dia. A área de recepção das frutas e a câmara fria podem ser visualizadas nas Fotos 1 e 2 (Apêndice). A câmara fria constituiu um recurso de fundamental importância nesse tipo de atividade, dado o alto grau de perecibilidade da uva, constituindo-se, assim, como condição essencial para a exportação da produção dentro das exigências das redes de supermercados e dos protocolos internacionais. Como já observado no terceiro capítulo desse trabalho, as packing houses bem como as câmaras frias encontram-se dentre os investimentos de infraestrutura que vêm garantindo a expansão das frutas no Vale (SILVA, 2001; BUSTAMENTE, 2009). No caso da COANA, a construção desse ambiente refrigerado representava uma grande economia para os associados, na medida em que iria poupar seus recursos com o aluguel desses espaços, como faziam habitualmente, antes da constituição da cooperativa. A câmara fria da COANA apresenta capacidade total para 600 pallets12, o que equivale a 102.000 caixas de uvas de 4,5 Kg, ou 54.000 caixas de uvas 8,2 Kg, ou 51.000 caixas de uvas 9,0 Kg. Para serem transportadas, as caixas de uvas são colocadas em pallets de 4,5Kg (170 caixas), 8,2Kg (90 caixas) e 9,0Kg (85 caixas), respectivamente. Entretanto, durante o período de grande safra, que compreende os meses de setembro a novembro, é utilizado todo o espaço da câmara fria. Esse período, segundo relatado, requer uma especial atenção na logística para evitar riscos de sobrecarga, como observa o entrevistado: 12 Um estrado de plástico, metal ou madeira que é utilizado para movimentação das caixas de uvas. Na verdade, por ser um período de grande concentração de colheita das fazendas, precisamos realizar um excelente trabalho de logística para não corrermos o risco de pararmos o embalamento por falta de espaço na câmara, é necessário que haja uma rotatividade intensa (Coordenado da COANA). No que concerne ao processo de armazenamento das uvas na câmara fria, existe todo um procedimento pautado em cuidados especiais, abrangendo desde o processo de embalamento nas fazendas, até o armazenamento no frio. Ao chegarem das unidades de produção, devidamente embaladas e paletizadas, as uvas são colocadas em túneis de resfriamento e submetidas a um frio de zero grau Celsius (0º C), durante oito horas. Posteriormente, as uvas são levadas para serem armazenadas em salas climatizadas, com essa mesma temperatura, onde ficam até serem enviadas para o carregamento em containers refrigerados, com temperatura, também, de zero grau Celsius. Todo o processo de acondicionamento das uvas fica restrito aos cooperados da COANA, não sendo, portanto disponibilizado espaços de refrigeração para outros produtores do Vale. Isso se explica pela utilização total da capacidade da packing house13, especialmente nos momentos de safra. Tal procedimento diferencia-se do sistema adotado pela CAJ, como ressaltado por Pires (2004) e já comentado. Neste trabalho, de disponibilizar parte da sua câmara fria, servindo inclusive, como forma complementar de capitalização. É importante destacar que o custo individual para utilização da câmara fria na COANA varia de acordo o tipo de uva produzida, e com o período de permanência do produto no ambiente refrigerado. Tal custo pode variar entre 7% e 7,5% do total de uva comercializada. Esse valor já inclui também todos os custos de comercialização, tais como: documentação de exportação, notas fiscais, venda, e transporte do produto. Entretanto, a relação com os mercados não é feita diretamente pela 13 Essa nomenclatura, cuja tradução é casa de embalagem, é habitualmente utilizada na versão inglesa, no Vale do São Francisco, entre produtores e trabalhadores. cooperativa, sendo mediada por uma empresa local chamada Purafruta14. Essa empresa fica responsável pelas negociações e contratos com os mercados exportadores, especializando-se nas seguintes certificações internacionais: GLOBALG.A.P., NSF-CMi15 e LEAF UK16. Participa como membro da SedexGlobal17, uma cadeia de suprimentos global. A COANA é composta por vinte sócios, cumprindo, assim as exigências quanto à composição do número mínimo de associados exigidos pela lei 5.765 de dezembro de 197118. Entretanto, tal número no caso em questão se reduz a cinco famílias, onde cada uma delas é dona de uma fazenda produtora de uva, são elas: Fujiyama, Sweet, Jmm, Ssa e Fan. O volume de produção de cada uma dessas fazendas pode ser visto na tabela 2. Tabela 2- Fazendas da COANA e Capacidade de produção em Toneladas Fazenda Volume da produção em Toneladas Fujiyama 1.200 Sweet 1.000 Jmm 1.000 Ssa 900 Fan 800 Fonte: Dados fornecidos pela cooperativa, 2009. 14 A Purafruta é uma empresa localizada em Petrolina, e que além de produzir frutas, oferece serviços nas áreas de representação comercial, resfriamento e consultoria em mercado fruticultor (Fruit Business) (PURAFRUTA, 2011). www.purafruta.com.br 15 A NSF-CMi é uma marca de origem Estadunidense, que tem por objetivo a garantia de qualidade dos alimentos, que presta serviços de consultoria e certificação para o cumprimento de normas legislativas e da indústria ( http://www.nsf-cmi.com) 16 A LEAF é um órgão não governamental Inglês, que tem por objetivo a criação de soluções sustentáveis no setor agroalimentar, trabalhando com agricultores e organizações de todo o mundo. É um dos membros fundadores da Iniciativa Europeia para o Desenvolvimento Sustentável da Agricultura (www.leafuk.org). 17 SedexGlobal é uma organização sem fins lucrativos, que visa a promoção de melhorias éticas em cadeias globais de abastecimento. Apresenta uma plataforma on-line para compartilhamento e visualização de informações sobre as normas de trabalho, saúde e segurança, meio ambiente e práticas de negócios (www.sedexglobal.com). 18 Lei que define a Política co Cooperativismo e institui o sistema jurídico das sociedades cooperativas no Brasil. Das cinco famílias de produtores da COANA, duas são egressas da Cooperativa Agrícola Juazeiro da Bahia (CAJ-BA). Vale ressaltar que, no passado recente, a CAJ era identificada como a maior cooperativa exportadora de frutas da região (PIRES, 2004). Porém, hoje por manter uma estrutura muito onerosa de serviços oferecidos aos sócios e, por conseguinte, de funcionários, essa cooperativa tem dificuldade em reduzir seus custos de produção, como observa um dos nossos entrevistados da COANA. O nosso custo de cooperativa saiu de mais ou menos, na minha época na CAJ, de uma taxa comercial de 12%, pra 4,5% aqui com uma estrutura enxuta (Presidente da COANA). A referência à estrutura enxuta mencionada pelo entrevistado se insere, segundo a discussão teórica, na noção de fábrica enxuta, ou Just-intime ou Lean Production. Tal noção está ligada a um modelo Toyotista ou pós-fordita de produção personalizada, e que aparece como uma alternativa ao modelo Fordista de produção em massa. Na produção enxuta, o objetivo se apóia na idéia de custos baixos de produtos destinados a mercados diferenciados, que são muito exigentes em termos de diversificação e qualidade. Como já discutido no segundo capítulo, o contexto pós-fordista de produção exigiu a flexibilidade produtiva, ajustada a produção à segmentação dos mercados (BONANNO, 1999). Atrelado a essa produção, estava uma produção Just-in-time, diminuindo o tempo de produção, o tempo de armazenamento e entrega (Idem). Essa produção Just-in-time se contrapõe a idéia de produção em massa, ajustando a produção à demanda como forma de evitar o desperdício (CAVALCANTI, 1999). Segundo Pires (2004) uma estrutura enxuta da cooperativa lhe permite agilidade no atendimento às diferentes demandas, como requerem os mercados. No caso da cooperativa em análise, essa estrutura enxuta refere-se a um quantitativo reduzido de cooperados, no caso cinco membros efetivos, embora englobe o número mínimo exigido por lei de vinte associados, como já referido anteriormente. Esse reduzido número de associados efetivos constitui um dado muito ilustrativo, pela similaridade que apresenta em relação ao modelo de “Nova Geração de Cooperativas” já comentado nesse trabalho, caracterizado também pelo número reduzido de associados. O caráter enxuto de cooperativa está também presente no número reduzido de empregados, e na terceirização dos serviços relativos à comercialização, contabilidade e logística, minimizando os custos da cooperativa relativos à sua operacionalidade e logística. O número de empregados da COANA fica reduzido a 16 pessoas, sendo: - um responsável pela administração; - duas secretárias; - duas pessoas na área de compras; - um funcionário na área contábil; - duas pessoas responsáveis pela parte financeira; - dois na logística e dois operadores de máquinas; - um empregado responsável pelo recebimento e expedição; quatro funcionários responsáveis pela câmara fria e um funcionário que opera a câmara fria. Os associados, por sua fez, dependem de um grande número de empregados, variando de 600 até 1500 nas cinco propriedades. No período de entressafra, a cooperativa garante o seguro desemprego no valor de um salário mínimo para os empregados safristas. Segundo nos foi relatado, grande parte desses “safristas” é proveniente da área agrícola, muitos dos quais são ex-donos de pequenos lotes de terras, que, por não disporem de recursos financeiros e de não terem sido capazes de conquistarem os certificados exigidos para a comercialização de uva, foram compelidos a ingressar no trabalho assalariado. Os associados detêm unidades de produção com um número variado de hectares, na ordem de 35ha o menor e 60ha o maior, totalizado, no conjunto, 220 hectares. 4.1.1 Perfil dos Associados Os associados são produtores com tradição na exportação de uva do Vale do São Francisco. Por conta disso, já tinham a certificação exigida pelos mercados globais, como a GLOBALG.A.P., uma certificação essencial para exportação das uvas no Vale do São Francisco. Como já analisado no segundo capítulo deste trabalho, quando discutimos sobre o papel das certificações para a comercialização de frutas. Porém, Pires e Cavalcanti (2009) observam que apesar do alto grau de profissionalismo desses produtores, são poucos os que vivem exclusivamente da fruticultura. Grande parte dos produtores desta região exerce outras atividades dentro e fora da fruticultura, prestando consultorias técnicas na área de produção. Referindo-se a COANA, tal cenário é ilustrado na fala do entrevistado: Tem um que faz consultoria e é engenheiro agrônomo também. Meu irmão é da consultoria técnica de produção e eu que faço alguns projetos nessa área de refrigeração pra fora. E os demais não, são focados 100% na agricultura (Presidente da COANA). Entretanto, foi possível constatar que todos têm na fruticultura sua atividade principal. 4.1.2 Comercialização da uva A COANA produz e comercializa uva de mesa, com e sem semente, destinado quase à totalidade de sua produção para os mercados externos (95%), o que corresponde a 540 toneladas de uva exportadas. Portanto, apenas, 5% das uvas são destinados ao mercado interno. A cooperativa comercializa para os três principais mercados importadores: Europa Continental, Inglaterra e Estados Unidos, tendo o seu volume de produção estimado entre 4.0000 e 5.000 toneladas. É importante destacar que essa estratégia de dividir a produção entre os três mercados, vem sendo utilizada pela cooperativa como uma maneira de se proteger dos impactos causados pela “crise” que recaiu sobre os produtores de frutas do Vale do São Francisco no ano 2008, como descrito abaixo: Essa estratégia nos poupou grandes transtornos naquele ano, onde muitos quebraram por concentrar toda produção nos EUA, outrora com os melhores preços. Normalmente distribuímos 1/3 da fatia para cada mercado e recebemos as divisas nas suas respectivas moedas: Dólar, Euro e Libra. Assim não ficamos refém de uma única moeda, como acontece comumente (Coordenador da COANA). Segundo Pires e Cavalcanti (2010), a crise global que se revelou para os atores do Vale do São Francisco através das ameaças da redução e cancelamento dos contratos de comercialização, e da queda de preços dos produtos nos mercados internacionais, levou os produtores e cooperativas do Vale do São Francisco a criarem estratégias produtivas e organizacionais, e a diversificar os seus mercados importadores. Todos os mercados importadores são muito exigentes no que diz respeito a padrões de qualidade, como: rastreabilidade, condições fitossanitárias, aspectos ambientais, registros, entre outros, presentes no protocolo GLOBALG.A.P. De acordo com Mafra (2008), o protocolo GLOBAG.A.P. assegura ao mercado internacional que as normas de produção definidas por esse selo de certificação sejam devidamente incorporadas pelo produtor, criando, ao mesmo tempo, uma unificação das normas de produção. Pires e Cavalcanti (2009) apontam para os altos investimentos requeridos na implantação dessas normas para a obtenção da certificação GLOBALG.A.P., em termos de colheita, tratamento pós-colheita, tipo de cultivo e espécie, proteção do meio ambiente, manejo de solo, utilização de insumos agrícolas, rastreabilidade, condições higiênico-sanitárias, registros, segurança dos trabalhadores, entre outros, constituindo-se, por conseguinte, como um entrave para que produtores menos capitalizados possam implementá-la. Essa foi a razão pela qual, como já observado nessa sessão, que pequenos proprietários não conseguem uma inserção competitiva nos mercados precisando, muitos deles, se converterem em trabalhadores assalariados. Além dessas exigências contidas nos protocolos de certificação, existem outras condições impostas pelos compradores internacionais, nas quais os produtores precisam permanentemente se adequar. Essas condições estão relacionadas aos tipos de embalagem e características sensoriais como cor, sabor e tamanho. Pires e Cavalcanti (2009) afirmam que a garantia da qualidade está associada a uma política de qualidade, apresentando uma padronização conforme as normas rigorosas de produção e comercialização pré- estabelecidas pelos compradores internacionais, como: cor, sabor, tamanho, teor de açúcar, entre outros. Critérios que, segundo as autoras, determinam um produto como “tipo exportação”. Para Bonanno (1999), a economia atual, tida como pós-fordista, vem orientar a produção de alimentos para obtenção de produtos de melhor qualidade e que venha a atender as necessidades de consumidores exigentes e diferenciados. Os novos modelos de produção ligados a um contexto pós-fordista de produção de alimentos consiste no ajustamento da produção através da segmentação dos mercados, obtendo produtos diferenciados e ligados a um controle das etapas da produção, e integração produtiva, que é responsável pela diminuição do tempo de produção, entrega e armazenamento de produtos, com a diminuição dos custos e gestão de informação (BONANNO, 1999). Cavalcanti (1996) chama a atenção para o fato de que a inserção do Vale nos mercados globais deva-se a uma concepção de dieta pós-fordista e pós-moderna, pautada em forte valorização das frutas frescas e exóticas, sob rigorosos padrões de qualidade. Padrões estes que determinam embalagem, acondicionamento dos produtos em câmaras frigoríficas, tipo de transporte associados a condições ambientais e higiênicas sob os quais os produtos são preparados para a exportação (CAVALCANTI, 1995). Tal constatação é facilmente relacionada ao caso da COANA, onde os critérios quanto às condições de higiene das câmaras frigoríficas e do sistema de embalagens são presentes no cotidiano daquela empresa. No que diz respeito particularmente às embalagens, a COANA comercializa para a Europa, Estados Unidos e Inglaterra por meio de embalagens, de 4.5Kg, 8Kg e 9Kg, respectivamente. Desta maneira, as caixas são comercializadas para os diferentes mercados exportadores representados por: TESCO e MAXSPENCER para a Inglaterra, CHIQUITA na Europa, e FRUCOM para os Estados Unidos, entre outros mercados. Para que haja a comercialização com esses mercados, todas as fazendas dos associados da COANA possuem sua própria packing house. Nela é feita todo o acondicionamento das uvas produzidas pelos associados, que vai desde a limpeza, lavagem, sanitização, seleção final, embalagem e rotulagem. Só depois de todo esse processo, e que as caixas são levadas pelos associados à cooperativa, ficando acondicionadas na câmara fria. A COANA dispõe de um sistema de rastreamento on-line em todas as fazendas dos associados, onde ficam dispostas as informações acerca de todas as fases de produção do produto, aí incluindo a colheita nas fazendas, o tipo de uva, a procedência do cliente, o volume diário, entre outras informações. Segundo o Coordenador da COANA, esse tipo de sistema contribui para a dinâmica de comercialização da cooperativa: Isso facilita muito para a equipe de logística, que precisa destas informações para providenciar programação de carregamento dos containers, minimizando o tempo de permanência da uva na armazenagem (Coordenador da COANA). Embora, não se saiba o número exato de parking fuzis presente no Vale do São Francisco, estima-se que, até o ano de 2008, existam, aproximadamente, 45 unidades, das quais, 16 destinadas para exportação de frutas, especialmente a uva (BAHIA, 2008). Como se pode observar na fala dos nossos entrevistados, apesar de haver normas gerais quanto à qualidade e aspectos físicos do produto, há particularidades próprias de cada mercado, no que diz respeito às suas preferências. Os americanos valorizam o aspecto visual da uva. Gostam de uma uva grande, bonita, uniforme, com uma coloração uniforme, com uma embalagem bonita, não precisa nem ser muito doce, mas tem que ser bonita e grande. Eles valorizam mais o visual. Pode ser um festival de variedades que parece um isopor, mas eles adoram porque é bonita (Presidente da COANA). Procedimentos diferentes adotam os ingleses, como observado por um dos nossos informantes: Os ingleses já gostam de uma uva que seja doce e saborosa, tem que ser bonita também. Entre as duas coisas eles valorizam mais o sabor (Presidente da COANA, 2009). A Europa é um pouco menos exigente, como destacado: Eles já gostam de uma uva também com mais sabor só que são menos exigentes em qualidade então pode ser um pouquinho mais azeda, e não ser tão bonita, eles aceitam (Presidente da COANA). Como afirma nosso entrevistado, a grande dificuldade para se exportar está exatamente no atendimento ao conjunto das exigências impostas pelos mercados importadores. O exportar é muito fácil, atender a todas as exigências que é difícil. Então, por exemplo, um produtor que tenha acesso a todo tipo de informação, ele sabe qual é a exigência e atende. Pra esse pessoal é fácil exportar (Presidente da COANA) O que nos leva a concordar com Cavalcanti (1999) quando afirma que o conhecimento acerca do produto e do processo de produção se constitui como requisito essencial para uma inserção competitiva nos mercados. Entretanto, como afirma essa autora, para que isso aconteça, faz-se necessário que a cooperativa invista em educação, formação e informação dos seus cooperados e trabalhadores, o que vem demonstrar o grau de diferenciação desse empreendimento nos mercados. Nesse sentindo, Cavalcanti (2005) se refere ao processo de “externalização” a que se submetem os produtores e suas unidades de produção, para atender aos requisitos das cadeias internacionais de alimentos. Segundo Cavalcanti et al. (1999), esse processo de “externalização” da produção está diretamente ligado à procura de alimentos com alto padrão de qualidade, o que significa dizer que o produto deva ser produzido de acordo com normas e regras de qualidade definidos pelos diversos mercados importadores, requerendo dos produtores estratégias que se traduzem em investimentos tecnológicos e ambientais. No entanto, como discutido por Pires e Cavalcanti (2010)19, apesar das dificuldades na exportação, o fato de ser cooperativa minimiza os impactos resultantes dos custos de investimentos, como também em situações de crise, amenizam seus impactos, facilitando a busca de soluções em comum. 19 As autoras referindo-se particularmente a crise global e suas percussões sobre o Vale do São Francisco iniciadas no final de 2008. CONSIDERAÇÕES FINAIS Com o objetivo de analisar as estratégias estabelecidas pelas cooperativas agrícolas para atender aos padrões de qualidade exigidos pelos mercados globais, pôde-se constatar que a COANA foi concebida enquanto fruto da ação autônoma de agricultores experientes no cultivo da uva, visando a otimização da sua capacidade produtiva. No processo de criação da COANA, a construção de uma câmara fria representou possibilidade de ampliar o volume de vendas do grupo a partir de mobilização de significativos recursos financeiros, permitindo uma inserção mais competitiva nos mercados. Com efeito, a câmara fria garantiu os objetivos iniciais do grupo, especificamente no que diz respeito ao fato de não precisarem mais desprender gastos com o aluguel de ambientes refrigerados, como habitualmente faziam antes da cooperativa. Tal perspectiva traz a tona à idéia de fábrica enxuta que, no caso da cooperativa, se caracteriza pelo reduzido número de empregados e associados, e na terceirização dos serviços, reduzindo os custos da cooperativa e da sua estrutura organizacional. Tal processo também assegura que as relações estabelecidas entre atores locais e globais, e que se pautam em fortes exigências, impliquem em respostas ágeis no cumprimento dos contratos com os mercados. No que concerne à participação dos associados, observou-se uma participação ativa dos seus membros na dinâmica da cooperativa, motivo, inclusive, destacado pelos nossos entrevistados. A busca constante de decisões em conjunto parece se constituir como um elemento decisivo no sucesso daquele empreendimento. Tal realidade traduz, no cooperativismo, o princípio de “controle democrático” pelos sócios, onde cada membro tem direito a “um voto”, e participam ativamente nas decisões. Entretanto, o mesmo não pode ser dito em relação ao princípio de “adesão livre e voluntária”, na media em que, a cooperativa limita seu corpo social a 20 associados englobando tão somente cinco famílias. Conforme analisado, a cooperativa é formada por produtores com larga experiência na produção de uva, e que atendem as exigências dos mercados globais no que concerne aos padrões de qualidade, especialmente, a conquista de certificados internacionais, a exemplo da GLOBALG.A.P. A experiência nesse campo fora adquirida antes mesmo da organização de cooperativa. O objetivo do grupo na constituição da cooperativa foi minimizar custos de produção, ampliando sua capacidade produtiva em torno da construção da câmara fria. A cooperativa tem buscado criar estratégias para cumprir com as exigências dos mercados, investido na idéia de flexibilização da sua estrutura a partir de procedimentos “enxutos” como forma de se ajustar mais facilmente às exigências impostas pelos mercados. O que nos faz concordar com Pires (2004) quando afirma, que frente a esses novos processos de globalização e das constantes mudanças nos mercados globais de alimentos, o cooperativismo tem sido um dos principais instrumentos de modernização dos agricultores do Vale do São Francisco, fazendo-os capazes de atender às novas necessidades de produção e de consumo, decorrentes dos novos modos de vida. A incorporação de um sistema on-line de rastreamento dos produtos, onde ficam armazenados os dados acerca de todas as fases de produção do produto, se configura como um diferencial para a COANA, demonstrando o grau de competitividade e modernização no qual a cooperativa vem se estruturando. Diante disso, a cooperativa tem se valido da utilização de prática de gestão de qualidade para obtenção de concessão de novos certificados, para a inserção nos mercados internacionais, a partir de um número reduzido de empregados situados em postos estratégicos. Nesse sentido, constatou-se que a construção de uma packing house nas unidades produtivas, onde é realizada limpeza, lavagem, sanitização, seleção final, utilização de embalagens especificas para cada mercado exportador e a rotulagem, é um elemento importante para adequação do produto aos padrões aceitáveis de qualidade. As condições higiênico-sanitárias, as características sensoriais relativas à cor, sabor e tamanho, bem como os aspectos físico-químicos (pH, acidez titulável, sólidos solúveis, relação sólidos solúveis/acidez titulável) dos produtos, também se fizeram presentes nos diversos discursos, corroborando pesquisas anteriores no Vale do São Francisco que apontam para a preocupação com a qualidade como requisito de uma inserção competitiva nos mercados. Deste modo, vale salientar que o grau excessivo de exigências dos mercados exportadores, como destacado na literatura especializada tem dificultado as exportações por parte dos produtores, na medida em que é necessário alto nível de investimentos, demonstrando com isso, o processo de “externalização” o qual está subordina as regiões produtivas. No caso da COANA, entretanto, a estrutura enxuta na qual está apoiada, tem facilitado o enfrentamento das dificuldades do ambiente de forte comum as regiões exportadoras. Além disso, o fato de estarem constituídas como cooperativa tem facilitado também o enfrentamento aos momentos de crise. Esses motivos têm contribuído para que a COANA venha respondendo, com rapidez e eficiência aos apelos do mercado. O que nos leva a concordar com Pires (2005), quando afirma que o sucesso da cooperativa depende da “capacidade de organização da produção e da rede de relações expressos entre as imposições produtivas globais e a capacidade de respostas em nível local”. No âmbito do desenvolvimento local, a Cooperativa tem contribuído para a dinâmica da região a partir da geração de empregos e renda, da ampliação do debate democrático e no estabelecimento de parcerias com o poder local para a ampliação de um posto de saúde numa comunidade rural, no âmbito de UN-10. Desta forma, como foi observado, há uma tendência global acerca das novas exigências da qualidade, no que se refere às condições com a qual o produto é produzido, particularmente, em termos das condições de trabalho, da preservação do meio ambiente e do desenvolvimento local, e que estão claramente especificadas na GLOBALG.A.P. Ficou evidente, a preocupação da Cooperativa no cumprimento dessas novas exigências dos mercados, incitando iniciativas dentro da perspectiva do desenvolvimento local. O que, por conseguinte, tende a assegurar o sétimo princípio cooperativo referente ao “interesse pela comunidade”. O comprometimento com o local dado ao “enraizamento” da cooperativa com o meio no qual está inserido. Embora tenha se tornado evidente a capacidade da COANA em atender às exigências dos diversos mercados, em termos de aspectos sensoriais de uva, segurança alimentar e ambiental, o crescimento das exigências desses mercados, ao longo dos anos, poderá impor novos desafios à cooperativa analisada e por em xeque a sua atual performance empresarial. O que tende a justificar a continuidade das investigações. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABRAMOVAY, Ricardo. Entre Deus e o Diabo: mercados e interação humana nas ciências sociais. Revista de Sociologia da USP. Volume 16, nº 2, novembro de 2004. BAHIA. 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