GSI – Global Social Impact Relatório GSI JAM 2011
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GSI – Global Social Impact Relatório GSI JAM 2011
GSI – Global Social Impact SUSTENTABILIDADE ORGANIZACIONAL Ideias e Propostas Relatório GSI JAM 2011 GSI – Global Social Impact SUSTENTABILIDADE ORGANIZACIONAL Ideias e Propostas RELATÓRIO GSI JAM 2011 São Paulo 2011 EXPEDIENTE 2011 GSI – Global Social Impact Todos os direitos reservados pelos autores. É proibida a reprodução total ou parcial desta obra por quaisquer meios: gráficos, reprográficos, mecânicos, eletrônicos, digitais etc. sem citação da fonte. Supervisão: Coordenação editorial: Texto e organização: Capa e diagramação: Andrea Shpak e Alcely Barroso Elidia Novaes Elidia Novaes e Cristina Fedato Pedro Belasco GSI. Sustentabilidade Organizacional: ideias e propostas – Relatório GSI JAM 2011 / GSI Global Social Impact. São Paulo: GSI, 2011. __p. 1. Sustentabilidade Organizacional e Filantropia Estratégica 2. Parcerias Intersetoriais de benefício mútuo 3. Empresa social como alternativa de sustentabilidade 4. Ferramentas de gestão no terceiro setor 5. Iniciativas de investimento público e privado I. GSI Global Social Impact III. Título: Sustentabilidade Organizacional: ideias e propostas – Relatório GSI JAM 2011. GSI – Global Social Impact São Paulo, SP – Brasil www.gsi.org.br/gsi/Default.aspx twitter.com/GSIJAM www.facebook.com/pages/GSI-Global-Social-Impact/148195398545392 SUMÁRIO Agradecimento Agradecimento Especial Epígrafe 1. Introdução 2. A GSI a. Histórico b. Estrutura 3. Os Parceiros 4. A metodologia JAM 5. O GSI JAM a. Conceito e panorama b. Pilares que embasaram cada painel Filantropia Estratégica e Sustentabilidade Parcerias intersetoriais de benefício mútuo A empresa social como alternativa de sustentabilidade Ferramentas de Gestão no Terceiro Setor Iniciativas de investimento público e privado c. Perfil dos participantes d. Levantamento quantitativo e. Levantamento qualitativo Filantropia Estratégica e Sustentabilidade Parcerias intersetoriais de benefício mútuo A empresa social como alternativa de sustentabilidade Ferramentas de Gestão no Terceiro Setor Iniciativas de investimento público e privado f. Word Cloud 6. Considerações finais Relatório GSI JAM 2011 AGRADECIMENTO (IBM) • Instituto Ethos Equipe GSI E aos tradutores Alexandre Stella Pires; Ana Paula Bernardo; Ana Paula Ernesto; Ana Zuleika PiA todos aqueles que tornaram o JAM possível, com nheiro Machado; Cristiane Dias Cardoso; Dulciseu apoio, seu compromisso com os temas da sus- nea Braga Dias Bueno Torres; Eliane Manna Born; tentabilidade organizacional e com sua confiança na Glaucia Cristine Silva Burckler; Ivone Ribeiro Siliniciativa. va Coutinho; Leila Marina Urbas Di Natale; Leslie Benzakein; Liamara Soares da Silva; Maria Claudia Nossos parceiros institucionais: Fernandes de Almeida; Roseli Rubino Pereira; Vera • IBM Dittert Jardim Moreno. • Pamcary Várias redes sociais ajudaram na divulgação do JAM • Roche e na formação do grupo imenso de pessoas que acessaram o espaço virtual e postaram seus comentários. • AES Eletropaulo Somos gratas a todas e, conforme combinado ante• Locaweb cipadamente, queremos informar que, dentre todas, aquela que reuniu o maior número de participantes • Dr. Micro foi o IVA – Instituto Voluntários em Ação, organiE nossos apoiadores institucionais: zação-membro da Aliança de ONGs na América La• ATPIESP (Associação Profissional dos tina e Caribe. Tradutores Públicos e Intérpretes CoToda nossa gratidão por sua mobilização, confianmerciais do Estado de São Paulo) ça, paciência e determinação. Vocês foram, para nós, • ESW – Enterprise for a Sustainable World exemplo e fonte de motivação. • Helix • Pitti’LM • Secretaria de Participação e Parceria da Prefeitura de São Paulo • UNISA (Universidade de Santo Amaro) Queremos agradecer nominalmente aos parceiros de todas as horas, que, com a mão na massa, ergueram o JAM e ajudaram a fazer dele um sucesso: • Bell Pereira • Eliane Ornelas • Fernanda Bornhausen Sá • Jefferson Dousseau • Juliana Nobre Gomes • Luís Miranda • Mario Costa • Ricardo Young Silva Nosso carinho aos “salva-vidas” Luis Carlos dos Anjos e Rafael Rosa (Locaweb), Guilherme Levy e Joyce Ribeiro (Pitti’LM), Edson Luiz Oliveira, Sergio Loza, Claudio Calazans e Rodrigo Canhissare 5 GSI – Global Social Impact, Sustentabilidade Organizacional, Ideias e Propostas AGRADECIMENTO ESPECIAL • Cynthia Rosenburg – Instituto Arapyaú • Dagmar Garroux – Casa do Zezinho • Daniel Barreto – Instituto Bioeste • Daniel Brandão – MOVE A GSI e seus parceiros agradecem especialmente a todas as pessoas que deram sua contribuição sob a forma de reflexões nos cinco paineis do GSI JAM, ajudando a construir a essência do evento, fortalecendo os relacionamentos e o próprio debate dos temas contemporâneos da sustentabilidade organizacional: • Daniel Francisco Moreno de Sousa • Daniel Vaz – Opção Brasil • Daniela Silva dos Santos – Instituto Voluntários em Ação • Daniele Paz – AACD • Alan Harlam – Brown University • Danilo Santos de Miranda – SESC-SP • Alcely Barroso – IBM Brasil • Darcio Centoducato – Pamcary • Ana Carolina Velasco – GIFE • Debora Caldini – McDonald’s • Ana Lucia Silva Marçal – Grupar-RP • Denise Tubino – Golder Associates • Ana Lucia Vieira – Centro Espírita O Consolador • Edgard Barki – FGV • Andrea Shpak – GSI • Edson da Silva Bezerra • Antonio Ribeiro da Silva Jr. – APAE • Eduardo Britto • Augusto Hijo – Ponto de Cultura Bafafá Pró-Rock • Elenice Tamashiro – Zigla Consultores • Bell Pereira – SMPP-SP • Eliane Belfort – CORES-FIESP • Bruno Andreoni – Cidade Escola Aprendiz • Élida Pricila Brasil de Matos – Clube Amador de Foto de Fortaleza • Bruno Elias Menezes – Instituto Teológico Basiléia • Edsmar Resende – Key Associados • Eliana Tiezzi – Papel de Gente • Elidia Novaes – GSI • Carla Botelho – Latin American Hotels • Ester Rosenberg Tarandach – Adere • Carlos Eduardo Faria Ronca – Mattos Filho Advogados • Fabia Alencar – Melitta do Brasil • Carolina de Mattos Ricardo – Instituto Sou da Paz • Ferdinando Fernandes – Denise Alves & Cia • Fabio Gandour – IBM Brasil • Carolina Neri – BTOA • Fernando Alves – Rede Cidadã • Celina Mendes do Prado – Associação Cristã de Osasco • Fernando Nogueira – FGV/ESPM • Celso Bianchi Barroso - UniCapital • Francisco Buonafina – SMPP-SP • Christin Hokenstad – Dalberg Advisors • Cibele Esteves – Formare • Francisco Moura – Fundação Apoio Desenv. Social e Comunit. • Claudia da Silva – IBM Brasil • Franco Reinaudo – ABRAT GLS • Cleide Paiva – Lar Sírio • Fu Kei Lin – CEATS-FIA • Cristina Fedato – consultora em Sustentabilidade • Gilmar Altamirano – Universidade da Água 6 • Fernando Rossetti – GIFE • Gilson Campos – Fundação Voith Relatório GSI JAM 2011 • Graziela Bedoian – Quixote • Marcus Clemente – Total Fleet • Guilherme Campos • Maria Iannarelli – N.Sra do Bom Parto • Gustavo Antonio Duarte Ribeiro – Correios • Mariana Nicolletti – NESsT Brasil • Hazel Henderson – Ethical Markets Media • Marina Spirandelli – Care Brasil • Heiko Spitzeck – Fundação Dom Cabral • Marinus Jan Van Der Molen – ESPRO • Isa Maria Guará – UNIBAN • Mario Costa – IBM Brasil • Ivânia Palmeira – BASF • Marta Salomão – Secretaria da Saúde SP • Janete Hung – Grupo Sempre Vita • Melvyn Levitsky – Michigan University • João Ribas – Serasa • Miriam Duailibi – Instituto Ecoar • Jorge Proença – Instituto Pérola • Monica Lazzerini – APAF Assoc.Paulista Apoio à Família • José Aureo Bigliassi – ConnectUse • José Avando Souza Sales – ATN • José Gilberto Boari – TechSoup Brasil • José Luis Cavaretti – AES Eletropaulo • José Luiz Telles – Ministério da Saúde • José Ricardo Franco Montoro – Deputado estadual SP • Natalia Menhem – Limiar Engenharia Ambiental • Patrícia Diniz – SOS Aldeias Infantis • Patrícia Menezes – IBM Brasil • Paul Kirsch – Michigan University • Paulo Alves • Joseph Haim – CPqD • Paulo Ramicelli – Instituto EDP • Judith Cawhorn – Packard Health • Paulo Roberto Feldmann – FEA/USP • Julia David Franco Gomes • Paulo Vodianitskaia – Hapi Consultoria • Juliana Nobre – IBM Brasil • Péricles Mattar – Fundação Israel Pinheiro • Juliana Ramalho – Mattos Filho Advogados • Polyani Garcia – Santa Casa de Misericórdia de Birigui • Kelly Ramirez – Social Venture Partners Rhode Island • Priscilla Chang – Michigan University • Leonardo Letelier – Sitawi • Regina Miranda – Pamcary • Lia Diskin – Associação Palas Athena • Reinaldo Bulgarelli – FGV • Lilian Juliana Kuwano Buhrer – Rede Marista • Reinaldo Pamponet – Eletrocooperativa • Lucia Maria Araujo – Canal Futura • René José Rodrigues Fernandes – FGV • Luciane Sena – Instituto Cuidando do Futuro • Ricardo Lopes – ASSPROM • Luciano Palma – consultor de novas mídias • Ricardo Young Silva – Instituto Ethos e UniEthos • Luiz Bruno Vianna – ONG Fabricando Empresários • Roberta Guarino – ACAM-RJ • Luiz Carlos Merege – IATS • Rosicler Rodriguez – Roche • Maisa Signor – Inclusiva Negócios Sociais • Ruth Harada – IBM Brasil • Marcelo Carvalho – UNB • Sélio Antonio Moreira da Silva – Transparência Cachoeirense • Marcelo Estraviz – ABCR • Márcia Bellotti – S&V Consultoria • Sergio Amoroso – Grupo Orsa 7 GSI – Global Social Impact, Sustentabilidade Organizacional, Ideias e Propostas • Stuart Hart – Cornell University e ESW • Susana de Vasconcelos Dias – CMDCA • Tamira Gallucci – Instituto Redecard • Tanya Andrade – Incores • Thales Wylton Honorio Barbosa Ribeiro – BASF • Thereza Lobo – Solidaritas • Tiago Biusse Ghion – Fundação Orsa • Tomaz de Aquino Resende – Ministério Público MG • Vanda Scartezini – Altis • Vanderlei Soela – Fundação Dom Cabral • Vania Bulgarelli – Instituto Ecoar • Vera Lucia Barroso Alves Frascino • Vera Lucia Perino Barbosa – Instituto Movere • Victor Barau – Atletas da Cidadania • Wagner Andrade – AW Comunicação Expressiva • Yara Cavini – ONG Guará / Amarribo 8 Relatório GSI JAM 2011 Epígrafe 1. Introdução A mídia social pode ser um facilitador e um acelerador de recursos essenciais, valores, atributos e planos. Pode até ser catalisador para a mudança. Mas não pode magicamente criar o que não existe. – Denise Zimmerman, presidente da NetPlus Marketing Setores, países, pessoas se aproximam. Novas ideias surgem, novas técnicas e soluções. Amplia-se o envolvimento em parcerias estratégicas para aumentar globalmente a escala das iniciativas sociais. Novos modelos são desenvolvidos por organizações sem e com fins lucrativos em busca de impacto social. Vem Aqueles que ignoram o grupo/diálogo/rede quano desafio na priorização de programas que resultem do estão satisfeitos e só decidem se envolver quando na melhor relação custo-benefício socioeconômico e precisam da rede podem não ter êxito. É muito fáambiental e na medição do impacto produzido. cil identificar aqueles que se unem apenas para tomar – não para dar. Portanto, envolva-se no grupo/ Mirando esse momento e todas as possibilidades – diálogo/rede antes que precise que alguém lhe dê favoráveis e desfavoráveis –, a ONG GSI buscava algo. – Jeremiah Owyang, Web-Strategist.com uma forma de reunir pessoas de todos os segmentos – organizações da sociedade civil, governos, empreSuas atitudes falam tão alto que eu não consigo ouvir sas, academia e imprensa. E propor a reflexão sobre o que você diz. – Ralph Emerson, escritor, filósofo e os caminhos da sustentabilidade organizacional e topoeta do séc. 19 dos os meios para esse fim. A organização já havia As empresas do século XXI precisam estabelecer promovido três conferências internacionais, mas espolíticas multistakeholder que lhes permitam per- pecialmente ao abordar o tema da sustentabilidade, manecer informadas do que ocorre nas franjas do buscava uma forma de realizar um debate mais susmercado. Isso significa incorporar à sua cultura de tentável e inclusivo. Em 2001, a IBM – na condição gestão habilidades que normalmente são encontra- de empresa global –, havia desenvolvido uma metodas apenas em ONGs. Diálogos apreciativos na base dologia que permitia reflexões envolvendo simultada pirâmide, produção e comércio justo, e organiza- neamente os funcionários, seus familiares, clientes, ção criativa de comunidades na cadeia produtiva são fornecedores e parceiros de negócios ao redor do alguns destes desafios. Além, é claro, da mitigação mundo, todos contribuindo para que a empresa redos impactos. – Ricardo Young Silva, ex-CEO do definisse seus valores. A metodologia tornou-se um Instituto Ethos e do UniEthos e candidato ao senado serviço prestado a outras empresas, para que promopelo Partido Verde em 2010 – durante o JAM vam debates junto a seus próprios stakeholders. Entendendo as condições especiais de uma organização A crescente ideia de um empreendimento sustentáda sociedade civil e o propósito que a mobilizava, a vel é aquela na qual você, desde o início, consideIBM decidiu apoiar a iniciativa, fornecendo o ferrara todos esses fatores [econômico/financeiro, social mental e todos os serviços necessários para realização e ambiental]. E como pode pensar em verdadeiras de um JAM – o GSI JAM – e aceitando um desafio práticas comerciais para fazê-los melhorar, as quais extra: promover o primeiro JAM bilíngue em toda a também lhe permitiriam ganhar dinheiro? [...] Se história. você fizer isso e fizer direito, acaba com mais valor agregado em todas as três facetas. Em outras pala- Foi assim que, em fevereiro de 2011, realizou-se um vras, não é uma troca, é estratégia incorporada. – fórum totalmente em meio virtual – sem, passagens Stuart Hart, Professor da Universidade de Cornell e aéreas, sem hospedagem, sem coffee break e sem foestudioso das implicações do desenvolvimento sus- lhetos impressos. Tudo de que os participantes pretentável – durante o JAM cisavam era acessar a internet, ainda que pelo celular. E assim se reuniram representantes de todos os segAs fronteiras nacionais são meras lombadas na automentos em torno da reflexão e debate de inovações estrada da rede mundial de informação. – Tim May, que podem ajudar as instituições a se tornarem mais escritor nas áreas técnica e política, cientista sênior sustentáveis. Até pela facilidade de acesso, o grupo aposentado da Intel contou com grandes expoentes da América e de outras partes do mundo, somando mais de 1.500 ins- 9 GSI – Global Social Impact, Sustentabilidade Organizacional, Ideias e Propostas critos de 16 países em quatro continentes e quase 900 reflexões postadas. 2. A GSI As discussões no JAM proporcionaram melhor entendimento da condição presente da sustentabilidade organizacional, a observação de alguns de seus principais desafios, a proposição de ferramentas e estratégias e a abertura de possibilidades de organização e inovação no futuro. A GSI (Global Social Impact) é uma organização sem fins lucrativos, dedicada a apoiar inovações sociais ao estimular a colaboração intra e intersetorial, fomentar a discussão da sustentabilidade e seus temas relevantes, e promover capacitação nos três setores – governos, empresas e organizações sociais, O ambiente de confiança que a GSI conseguiu esta- oferecendo acesso a ferramentas, talentos e recursos belecer trouxe resultados que justificam a organiza- para concretização de ideias, profissionalização das ção de seu conteúdo na presente publicação, com- organizações e maximização do impacto social de partilhando os achados com outros públicos. Este suas ações. Conta com o importante diferencial da material apresenta um extrato dos principais achados participação da Academia em todas as atividades que e ressalta as ideias criativas e reflexões compartilha- desenvolve. das, expondo as principais tendências em modelos sustentáveis de inovação organizacional identifica- Entre as iniciativas que concretizou, foram realizadas conferências internacionais e oficinas na Eslováquia, dos durante o evento. Sérvia, Chile, Estados Unidos e Brasil, sempre com É crucial ressaltar duas características deste fórum, a participação ativa de líderes sociais, corporativos e em sua configuração de JAM: do setor público, além de professores e estudantes de 1. O JAM não é conclusivo. Novas discussões são diversas instituições de ensino. iniciadas o tempo todo e novos temas são abordados, sem que se chegue necessariamente a conclusões. Na verdade, o objetivo do JAM é abrir teorias, hipóteses e propor encaminhamentos posteriores. Adicionalmente, mantém equipes de consultoria que prestam serviços de capacitação para líderes de ONGs, de empresas e órgãos do governo, promovendo o conceito de empresa social e sustentabilidade, com a criação de novo capital intelectual. 2. O modo como é elaborado o relatório qualitativo apresentado a seguir gera um texto que ordena e sintetiza o conjunto de reflexões, sem corresponder às a. Histórico postagens individuais dos participantes. No formato adotado por nós, as sequências de postagens acerca O trabalho da GSI começou em 2003 com a inide um tema se tornam parágrafos e trechos que são ciativa de pesquisa de Social Enterprise no WDI reorganizados para entendimento do leitor. (William Davidson Institute) da Universidade de A partir desta primeira iniciativa exclusivamente re- Michigan. Essa iniciativa apoia organizações interesmota, plasmada no presente texto, novas ações estão sadas em aplicar estratégias de negócio com o intuiplanejadas para o futuro próximo. Mas primeiro, co- to de se tornarem sustentáveis. Também explora a nheça a instituição, seus parceiros e os resultados da mudança no papel das ONGs, empresas e governos com vistas a aumentar o impacto social que promoação. Seja bem-vindo ao GSI JAM. vem. Em um esforço para expandir a iniciativa globalmente e fortalecer as relações com outras instituições de ensino interessadas no tema, a GSI tornou-se uma organização sem fins lucrativos e independente, num esforço de sua fundadora Andrea Shpak. A GSI continua atuando em conjunto com a WDI, na condição de sócia fundadora. 10 Relatório GSI JAM 2011 b. Estrutura gócios & Empreendedorismo Social da Ross School of Business / University of Michigan Diretoria • Andrea de Carvalho Shpak – Fundadora e Presidente • Alcely Strutz Barroso – Vice-Presidente • Elidia Maria de Novaes Souza – Diretora de Relações Institucionais • Celso Bianchi Barroso – Diretor de Relações Governamentais • Magnolia Vieira Carvalho – Secretária • Kelly Janiga – Diretora Executiva da SVPRI (Social Venture Partners Rhode Island) • Melvin Levitsky – Embaixador dos EUA no Brasil 1994-98, Ministro aposentado de Relações Internacionais, professor na Escola Gerald R. Ford de Políticas Públicas da University of Michigan • Norman Bishara – Professor de Legislação Corporativa na Ross School of Business da University of Michigan • Paul Kirsch – Diretor Associado do Instituto Zell Lurie na University of Michigan Comitê Fiscal • João dos Santos Dias – Tesoureiro da GSI • Sonia Bruck Carneiro Pereira – Gerente de Responsabilidade Social da BM&FBovespa • Tomás Carvalhaes Carmona – Gerente de Desenvolvimento Sustentável da SERASA Conselho Consultivo Brasil • Alessandra Gonçalves de França – Fundadora-presidente do Banco Pérola • Claudia de Carvalho Shpak – Gerente Executiva de Produto da IBM Brasil • Eduardo Tacla – Presidente da Helix Tecnologia • Jorge Alberto França Proença – Empresário e Presidente do Instituto Pérola • José Avando Souza Reis – Diretor Geral da ATN (Associação Telecentro de Informação e Negócios) • Renata Amaral Soares – Consultora Sênior da McKinsey • Sérgio Francisco dos Santos – Gestor da Mídia Regional Conselho Consultivo Estados Unidos • Andres Ramirez – Professor de Finanças da Bryant University • Andy Lawler – Professor de Estratégia Corporativa, Desenvolvimento de Negócios e Mercados Internacionais, Planejamento de Ne- 11 GSI – Global Social Impact, Sustentabilidade Organizacional, Ideias e Propostas 3. Os Parceiros no JAM meio ambiente e economia – são interdependentes. A empresa entende que não terá sucesso no longo prazo sem o cumprimento de suas responsabilidades ambientais e sociais; e também que não pode conEmpresas patrocinadoras do GSI JAM: tribuir com a sociedade e a proteção ambiental sem IBM (http://www.ibm.com/br) o sucesso econômico. Sendo assim, busca equilibrar A IBM, uma das maiores empresas de tecnologia da esses elementos em todos os aspectos da gestão de informação do mundo, é líder em soluções comple- seus negócios. tas de TI, que envolvem serviços, consultoria, harPAMCARY (http://www.gps-pamcary.com.br/) dware, software e financiamento. Hoje, a IBM possui soluções de ponta a ponta, adequadas a empresas A Pamcary é uma empresa líder que visa à crescente de todos os portes e perfis de negócios. Presente em eficiência da cadeia logística na gestão de transportes, mais de 170 países, a companhia opera no modelo respeitando os princípios da responsabilidade socioglobalmente integrado e emprega 400 mil funcioná- ambiental. Para isso, oferece soluções inovadoras, integradas e inteligentes em seguros, gerenciamento de rios em todo o mundo. riscos e sistemas. É responsável pela intermediação Este ano, a IBM completa 100 anos de existência. de parte significativa do volume de prêmios de seguAo longo de um século, a companhia desempenhou ros de cargas no Brasil, com uma carteira de clientes um papel fundamental na transformação das emformada por mais de 2.000 indústrias, operadores presas, da ciência e da sociedade. A companhia imlogísticos, transportadoras, corretores parceiros, sepulsionou e, muitas vezes, orientou o progresso e a guradoras, caminhoneiros e pessoas físicas. evolução da sociedade. A dedicação de cada funcionário ao sucesso de cada cliente, a inovação que faz Por acreditar que o papel social das organizações a diferença e a responsabilidade pessoal em todos os deve estar alinhado à estratégia de seus negócios, relacionamentos são os valores que norteiam todas princípios e valores, a Pamcary fundou o Instituto Cuidando do Futuro (ICF), que desenvolve projesuas ações. tos de cunho socioambiental no setor de logística e ROCHE (http://www.roche.com.tw/portal/rochetransportes. O ICF também apoia organizações do brazil/inicio) terceiro setor cujos valores e crenças sejam sinérgicos A Roche é uma das maiores empresas de saúde do com aqueles do próprio Instituto e da Pamcary, reBrasil, e uma referência estratégica e operacional forçando o modelo de empresa social. para outros países da América Latina. Está organiAES ELETROPAULO (http://www.aeseletropaulo. zada em dois segmentos: Farmacêutico e Diagnóscom.br/) tico, sendo que a Roche Diagnóstica é reconhecida pela excelência no suporte aos procedimentos médi- A AES Eletropaulo é a maior distribuidora de enercos e laboratoriais, incluindo desde procedimentos gia elétrica em consumo e faturamento da Amérirealizados pelos próprios pacientes (como testes de ca Latina. Seus acionistas controladores são a AES índice de glicemia para diabetes) até operações labo- Corporation e o BNDES (Banco Nacional de Deratoriais de grande porte envolvendo técnicas de bio- senvolvimento). Empresa de capital aberto na tecnologia. Já a Roche Farmacêutica é responsável BM&FBovespa (Bolsa de Valores, Mercadorias e pelo desenvolvimento e produção de medicamentos Futuros de São Paulo), integra o Nível 2 de Goverpioneiros para doenças como câncer, doenças virais, nança Corporativa e, desde 2005, o ISE (a carteira autoimunes e do sistema nervoso central. Essas duas do Índice de Sustentabilidade Empresarial) entre as grandes áreas estão unidas pela missão corporativa empresas com melhor desempenho em sustentabide gerar valor sustentável por meio de produtos e lidade. Desde janeiro de 2011, também integra o serviços que salvem ou, ao menos, melhorem signifi- ICO2, índice desenvolvido pela BM&FBovespa em cativamente a vida das pessoas, ajudando a detectar, conjunto com o BNDES, cuja carteira é restrita a diagnosticar corretamente e tratar as doenças de for- companhias com práticas transparentes na emissão de gases de efeito estufa. É signatária do Pacto Global ma adequada. e dos Objetivos do Milênio, propostos pela ONU. Os três elementos da sustentabilidade – sociedade, Desde 2009, participa do GRES (Grupo Referencial 12 Relatório GSI JAM 2011 de Empresas em Sustentabilidade) organizado pelo Instituto Ethos como fomento da discussão sobre temas críticos da sustentabilidade por meio de inovação, colaboração e desenvolvimento de lideranças. setor, na capacitação e profissionalização em todo o país. Com o apoio de seus principais parceiros (ATN, Insigne Linux, Techsoup Brasil, Fundação Orsa), participa de projetos de inclusão sociodigital, como o Programa Rede Mineral (que capacitou mais LOCAWEB (http://www.locaweb.com.br/) de 10 mil alunos) e o Projeto Capaz (que visa levar A Locaweb é líder em hosting no Brasil e na América alfabetização digital com educação ambiental para Latina, segundo o relatório IDC Latin America IT mais de 100 mil alunos até o final de 2011). Services 2009 (categoria Infrastructure Hosting SerAlém destas empresas, o GSI JAM contou com o vices). Com 12 anos de experiência e parcerias com apoio de: mais de 16 mil desenvolvedores, a empresa oferece soluções em software (serviço para empresas, como • ATPIESP (Associação Profissional dos TraduEmail, Email Marketing, WebStore, WebChat, tores Públicos e Intérpretes Comerciais do EstaWebDesk e PABX Virtual); Plataforma (serviço de do de São Paulo) (http://www.atpiesp.org.br/) hospedagem de sites); infraestrutura (ofertas sob • ESW – Enterprise for a Sustainademanda, como cloud computing, servidores dedi- ble World (http://www.e4sw.org/) cados e serviços de gestão personalizada). A empresa acredita que a inovação tecnológica aliada à qualida- • Helix Tecnologia (http://www.helix.com.br/) de de serviços e uma equipe altamente qualificada • Instituto Ethos (http://www.ethos.org.br/) são as chaves para o sucesso no mercado. • Pitti’LM Comunicação (http:// A Locaweb apoia instituições que contribuem de www.pittilm.com.br/) forma séria e efetiva, não apenas pela mitigação dos • Secretaria de Participação e Parceria da Prefeiproblemas sociais, mas também pelo desenvolvitura de São Paulo (http://www.prefeitura.sp.gov. mento econômico sustentável, conduzindo seus nebr/cidade/secretarias/participacao_parceria/) gócios de forma que se transforme em um agente de • UNISA (Universidade de Sanevolução social. to Amaro) (http://www.unisa.br/) DR.MICRO (http://www.drmicro.com.br/) A Dr. Micro atua no mercado de ensino profissionalizante, buscando garantir: constante atualização; flexibilidade para concorrer no mercado; e criatividade para garantir resultados de baixo custo e com eficiência comprovada. A partir dessa ideia, desenvolveu um projeto piloto cuja implantação numa rede de escolas com mais de 5.000 alunos permitiu mensurar os resultados e comprovar os possíveis benefícios ao mercado. O produto foi lançado oficialmente na Feira de Novos Negócios e Franchising em Curitiba-PR (2005). No ano seguinte, a empresa lançava o primeiro sistema de ensino a distância 100% multimídia e interativo do mercado e com o menor custo operacional. Desde então, a solução se encontra em mais da metade dos estados brasileiros e o número de alunos que aprendem por seu intermédio cresceu de forma exponencial, somando mais de 500 mil alunos certificados e mais de 2.000 instituições de ensino que já utilizaram ou utilizam esses serviços. Hoje, a Dr. Micro atua bastante junto ao terceiro 13 GSI – Global Social Impact, Sustentabilidade Organizacional, Ideias e Propostas 4. A metodologia JAM a temas propostos por outras e isso é perceptível visualmente – as ideias originais ficam encostadas na margem esquerda e as respostas a cada uma delas vêm abaixo, deslocadas um pouco à direita. Vários temas podem estar em debate simultaneamente e isso é percebido de forma intuitiva pelos participantes. O termo “JAM” surgiu na IBM a partir das boas e tradicionais Jam sessions, nas quais um dos músicos propõe um tema e, a partir daí, cada um dos demais faz sua música com seus próprios instrumentos, sempre voltando ao tema original. É uma “chuva de Mas a principal característica do JAM está na inteideias” de todos os setores, de diversos países, num ligência por trás da tela. Automaticamente, a ferraformato reflexivo. menta produz análises quantitativas sobre os termos Em 2003, dois anos depois de sua criação, a meto- mais usados pelos participantes, o volume e confordologia era usada para redefinir os valores da compa- midade das reflexões. Ela as ordena de várias formas nhia, pelo envolvimento de funcionários IBM e seus úteis para elaboração do sumário. O JAM é uma ferfamiliares, naquele que se tornou conhecido como o ramenta de cognição. Collaboration JAM (https://www.collaborationjam. com/). Em 2006, o Innovation JAM reuniria mais de 150.000 pessoas de 104 países e 67 empresas. Essa ação resultou no lançamento de 10 novos negócios que representam inovações dentro de alguns dos maiores sistemas dos quais todos dependemos, como transporte, energia, água e saúde. Hoje, essas inovações nascidas da colaboração já resultam em mais de 700 milhões de dólares em receita para a IBM e estão ajudando a resolver alguns dos problemas mais prementes do mundo. O JAM não é nem uma palestra, nem uma entrevista – é um compartilhamento de reflexões com a possibilidade de envolvimento de pessoas de todo o mundo. O convidado especial não precisa responder perguntas ou fornecer conclusões – ele municia a reflexão. Por seu conhecimento sobre o tema, ele tem refletido e já conta com suas próprias questões e propostas. Surge a oportunidade de compartilhar e estimular a inserção de representantes de organizações da sociedade civil, de empresas, do governo e da academia. O convidado especial deixa o debate avançar e insere breves provocações de tempos em tempos. No JAM, não é previsto o jorro de ideias simultâneas que se vê em redes sociais como Facebook, Twitter e Orkut. As pessoas lêem o que foi publicado, refletem e depois compartilham seu próprio pensamento. As postagens no JAM são mais extensas e complexas, trazem anexos, são meditativas, propositivas. Até por essa razão, ele não é falado, e sim escrito, reforçando a possibilidade de fazer devagar, de forma mais elaborada. Outra diferença está na ordem – as reflexões não são postadas de forma desordenada. As pessoas reagem 14 Relatório GSI JAM 2011 5. O GSI JAM a. Conceito e panorama O GSI JAM consistiu numa iniciativa pioneira em três vertentes: o primeiro promovido pela sociedade civil organizada, produzindo impacto global e bilíngue (em português e inglês). Tendo como principio a missão da GSI, de apoiar inovações sociais pelo estímulo à colaboração e o fomento à discussão de temas da sustentabilidade, tornou-se um ambiente democrático onde todos os setores puderam compartilhar ideias sobre a sustentabilidade das organizações. Entre os convidados especiais, figuraram empresários, políticos, gestores de organizações sociais, acadêmicos e representantes do poder público, com participantes de 16 países em quatro continentes: Américas (Argentina, Brasil, Colômbia, Equador, Estados Unidos, México e Uruguai); Europa (Alemanha, Espanha, França, Itália e Portugal); Ásia (Brunei Darussalam, Índia e Paquistão); África (Quênia). Durante todo o JAM, equipes de tradutores vertiam as postagens, de modo a viabilizar quase que instantaneamente o entendimento e a participação de pessoas dos vários países. Os organizadores optaram por não indicar o recurso de ferramentas virtuais de tradução, a fim de imprimir maior precisão aos debates bilíngues. Os textos traduzidos eram inseridos com breve atraso após cada publicação original, figurando no mesmo espaço, em cores diferentes, o que ajudou a unificar o debate e torná-lo verdadeiramente internacional. Mesmo em períodos em que não havia a ‘presença’ de convidados especiais, era constante o acesso de internautas lendo e compartilhando suas considerações. Na tarde do segundo dia do JAM, dos quatro previstos, uma dificuldade de acesso começou a se generalizar. Aos poucos, o sistema ficou lento até o ponto de impedir a leitura ou a postagem de textos pelos participantes. Foi necessário interromper o evento durante dois dias até que o problema fosse solucionado. Nesse período, a equipe de organização e os parceiros da área técnica perceberam que o dano ocorrera pelo acesso simultâneo de um número inesperado de pessoas. Foi realizado de 9 a 16 de fevereiro de 2011. PlanejaO GSI JAM enfrentava o melhor dos problemas – do inicialmente para 96 horas ininterruptas de debaexcesso de participantes. te, o JAM abordou cinco temas simultâneos: Com a adequação da infraestrutura, o JAM prosse• Filantropia Estratégica e Sustenguiu – agora sem dificuldades – por mais três dias, tabilidade Organizacional terminando na quarta-feira, dia 16 de fevereiro de • Parcerias Intersetoriais de Benefício Mútuo 2011, às 22 horas (GMT-3). • Ferramentas de Gestão para Organizações do Terceiro Setor • A Empresa Social como alternativa de Sustentabilidade • Iniciativas de investimento Público e Privado Grupos de convidados especiais se sucediam em cada um dos cinco temas, estimulando a reflexão coletiva. Os demais participantes tinham acesso à agenda de paineis e convidados, programando sua própria participação. Algumas pessoas mantinham o acesso por horas e faziam inserções de tempos em tempos; outras visitavam os ‘espaços’ pontualmente. Houve casos de grupos de participantes que se reuniram presencialmente, debatiam os temas e criavam postagens em conjunto, conseguindo ampliar ainda mais a discussão. Vídeos, Transcrições e Anexos As transcrições de todos os paineis realizados ao longo do GSI JAM estão disponíveis em português e inglês no site da GSI (http://www.impactosocial.org. br/gsi/Default.aspx) Todos os documentos compartilhados pelos participantes durante o JAM poderão ser acessados no Centro de Conhecimento / Sugestões de Leitura, também no site da GSI. (http://www.impactosocial. org.br/gsi/Materias/Editoria.aspx?EditoriaId=121) Os vídeos introdutórios feitos por Stuart Hart, Paul Kirsch e Melvyn Levitsky estão sendo hospedados no site da Dr.Micro, parceiro institucional da GSI. (www.drmicro.com.br/gsi) 15 GSI – Global Social Impact, Sustentabilidade Organizacional, Ideias e Propostas b. Pilares Durante a fase de preparação do JAM, a equipe organizadora se reuniu diversas vezes até definir os pilares que embasariam cada um dos cinco paineis. Os temas deviam ser abrangentes a ponto de despertar a reflexão e, juntos, abrir caminho para a sustentabilidade organizacional e os meios para atingi-la. A partir desses encontros presenciais e remotos, cinco textos foram produzidos, traduzidos e posteriormente compartilhados com os participantes, como forma de estabelecer uma base filosófica para o evento, explicitando algumas das questões que a GSI esperava ver discutidos. Ei-los: Filantropia Estratégica e Sustentabilidade Organizacional O princípio da sustentabilidade aplica-se a um empreendimento, a uma comunidade ou ao planeta. Para isso, é preciso que seja: economicamente viável, socialmente justo, ecologicamente correto e culturalmente aceito. É isso que buscam algumas empresas ao pensar tanto seu negócio como as causas que abraçam. E também as organizações da sociedade civil, que buscam sua independência do investimento social oferecido por empresas ou governos. Outras empresas buscam causas sociais e/ou ambientais que estejam estrategicamente vinculadas a sua ação negocial e ali concentram seus esforços, na chamada filantropia estratégica. Mas uma será caminho para a outra? A filantropia estratégica ocorre, por exemplo, quando as parcerias intersetoriais desenvolvem uma atuação sistemática e baseada em estratégias estabelecidas, buscando respeitar o interesse dos parceiros. Nas ações com foco na sustentabilidade, a organização da sociedade civil independe do investimento social oferecido pela empresa parceira, o qual corresponde a uma parcela reduzida dos fundos de que necessita para manter suas iniciativas. Mas será que a filantropia estratégica é um passo que precede a sustentabilidade? Do que precisa uma instituição para atuar com a abordagem da sustentabilidade? Pode-se entender a função da empresa como a criação de produtos e serviços para atender demandas, com isso gerando riqueza. Neste contexto, cabe ao Estado o papel de regulação do mercado, enquanto uma função importante das organizações 16 da sociedade civil consiste no controle social, estabelecendo padrões, formando grupos de pressão e de monitoramento para fazer com que a riqueza gerada na empresa seja compartilhada. É viável transformar esse jogo de poder numa ação orgânica, socialmente responsável, economicamente viável e ambientalmente correta? Quando se pensa em atividades com foco na Base da Pirâmide, conforme preconizado por Prahalad e Hart, vem à mente a visão de pequenos negócios ou da população em geral na condição de fornecedores, funcionários, parceiros ou clientes de grandes corporações. Em que medida pode-se afirmar que essas populações passam a ser incluídas socialmente nesse processo? E será que os mercados são condição necessária e suficiente para dar conta dos problemas sociais e ambientais que afligem as sociedades contemporâneas? Como tem sido elaborada a estratégia de atuação de sua empresa ou organização? O que está funcionando e o que ainda não deslanchou? Você percebe algum incentivo à sustentabilidade de empresas e de organizações participantes de uma mesma cadeia produtiva? Compartilhe essa importante experiência e traga suas dúvidas e propostas. Parcerias Intersetoriais de Benefício Mútuo As empresas que buscam parcerias intersetoriais para executar suas ações sociais consideram tal forma de trabalho mais eficiente e capaz de reduzir os custos da atuação social. Aquelas que preferem se manter autônomas acusam questões como falta de confiança, carência de informações e experiências frustradas permeando sua decisão. As organizações da sociedade civil que têm uma visão positiva das parcerias frisam os benefícios: aperfeiçoamento da capacidade de gestão; modernização de práticas gerenciais; ampliação do network e do acesso a recursos etc. Aquelas que evitam fazer alianças ressaltam: incompatibilidade da lógica e dos ritmos de trabalho; falta de conhecimento e sensibilidade da empresa para os problemas sociais; falta de clareza quanto às intenções da empresa e os valores que norteiam sua ação, entre outros. Afinal de contas, as parcerias podem funcionar? A flexibilização das empresas e a profissionalização da sociedade organizada viabilizam esses arranjos? Relatório GSI JAM 2011 As empresas que tendem a buscar parcerias intersetoriais para executar suas ações sociais consideram tal forma de trabalho mais eficiente e capaz de reduzir os custos da atuação social. Aquelas que preferem se manter autônomas acusam questões como falta de confiança, carência de informações e experiências frustradas permeando sua decisão. As organizações da sociedade civil que têm uma visão positiva das parcerias frisam os benefícios: aperfeiçoamento da capacidade de gestão; modernização de práticas gerenciais; ampliação do network; fortalecimento da imagem; ampliação do acesso a recursos. Aquelas que evitam fazer alianças ressaltam: incompatibilidade da lógica e dos ritmos de trabalho; falta de conhecimento e sensibilidade da empresa para os problemas sociais; caráter arrogante e impositivo ou paternalista e condescendente da empresa em relação à entidade; falta de clareza quanto às intenções da empresa e os valores que norteiam sua ação; insegurança quanto à duração do relacionamento. Será que o estímulo à proatividade das organizações da sociedade civil, somado à sensibilização das empresas para um relacionamento mais equilibrado nas decisões vitais para o destino das alianças colabora para o aperfeiçoamento das alianças intersetoriais? É justificado o interesse das empresas pelo benefício de imagem ou o benefício financeiro? E o das organizações sociais pelo benefício financeiro? É viável profissionalizar alianças de cunho assistencialista? De forma transparente, o que é o benefício mútuo? É o benefício meramente financeiro? E ele pode prescindir do bem da coletividade ou as duas coisas estão sempre atreladas? que uma alternativa de captação de recursos, é a busca por sua sustentabilidade. Aos poucos, elas vão se inserindo em cadeias produtivas e assumindo um perfil misto de empresa e organização social. Mas quais são as vantagens e os desafios nesse formato? Ele se aplica a qualquer organização social? As empresas sociais têm capacidade de oferecer produtos e serviços em escala? Onde estão os gargalos? Embora modelares na ação e na firmeza de propósitos, por muitos anos as organizações da sociedade civil contaram com o recebimento de donativos para o cumprimento de sua missão e para sua própria existência. Para tanto, muitas delas mantinham alianças perenes com empresas e recebiam verbas constantes do poder público, tornando-se dependentes desses recursos. Em paralelo, o voluntariado se provava complexo e muitas vezes pouco confiável, o que passou a exigir a contratação de mão de obra e a inserção de novas despesas no balanço mensal. Recentemente, a maioria das organizações passou a desenvolver parcerias menos estáveis com essas instituições, em sua busca por verbas e recursos não financeiros. Tais relações têm a duração de projetos ou de obras, e poucas delas miram a gestão organizacional. A sobrevivência demanda esforços diferenciados e uma linguagem ainda desconhecida. Algumas organizações optaram por desenvolver produtos e serviços com essa finalidade – embora, por vezes, esse esforço as desvie da missão a que se propuseram. Outras, tentando isolar a possibilidade de contaminação de seus propósitos, decidiram estabelecer empresas privadas em paralelo às organizações sociais, em iniciativas com bases intrincadas. Alianças de benefício mútuo que não estejam alinhaSurgiram as empresas sociais: modelos comerciais das com a estratégia e missão corporativa são viáveis implantados pelas organizações da sociedade civil no longo prazo? sem desviá-las de sua missão e reduzindo a depenQual é a sua experiência em parcerias? Quais os pon- dência de iniciativas públicas e privadas. Era mais do tos que gostaria de destacar? E os desafios que obser- que uma alternativa de captação de recursos – essas va? Você percebe algum incentivo à sustentabilidade organizações buscam sua sustentabilidade. Aos poude empresas e de organizações participantes de uma cos, elas vão se inserindo em cadeias produtivas e mesma cadeia produtiva? assumindo um perfil misto de empresa e organização social. Mas quais são as vantagens e os desafios nesse A Empresa Social como alterformato? Ele se aplica a qualquer organização social? nativa de Sustentabilidade Quais são os modelos já existentes? As empresas sociais são modelos comerciais implantados pelas organizações da sociedade civil sem que elas se desviem de sua missão e reduzindo a dependência de iniciativas públicas e privadas. Mais do A empresa social tem capacidade de oferecer produtos e serviços em escala ou deve se organizar em “cooperativas” com organizações semelhantes, a fim de atender grandes corporações? Manter uma linha 17 GSI – Global Social Impact, Sustentabilidade Organizacional, Ideias e Propostas restrita de produtos e/ou um fornecimento em escala reduzida é uma opção? Por outro lado, como se manter fiel aos princípios? Como desenvolver produtos, serviços, inserir-se em cadeias produtivas e continuar com os olhos no bem-estar social? A empresa social é a única saída para as organizações do Terceiro Setor no futuro? E há políticas públicas que apoiem essas iniciativas? Como as organizações sociais podem influenciar na elaboração de políticas que regulamentem essas novas pessoas jurídicas? Qual é a experiência de sua organização – como se configura sua matriz de recursos? Como você avalia sua independência financeira? Quais são suas impressões acerca do surgimento das empresas sociais? Quais as vantagens e os desafios que observa? Ferramentas de Gestão para Organizações do Terceiro Setor Quais ferramentas indicam que a organização está em linha com as estratégias que se propôs? Quais correspondem a uma prestação de contas? Existe algum modelo sintético de planejamento mais adequado às necessidades das organizações sociais? Há ferramentas corporativas de gestão adaptáveis às necessidades das organizações do terceiro setor? E no caso de elaboração de projetos? Como confirmar as reais necessidades aos olhos do apoiador potencial? Como calcular a verba necessária e a destinação a cada rubrica, de modo a garantir a consecução de um projeto? Como você vê sua organização? Percebe algum diferencial em sua atuação, se comparada às demais? Existe dentro do processo de planejamento estratégico da organização oportunidade de buscar nichos inexplorados, como públicos, serviços ou produtos? O acesso a verbas públicas e privadas e mesmo o uso excelente dos recursos exigem uma administração mais profissionalizada das organizações do Terceiro Setor. É cada vez mais importante que as organizações – com e sem fins lucrativos – implementem ferramentas de gestão que lhes concedam transparência, viabilizem processos mais eficientes, permitam o monitoramento de indicadores e, em última análise, tragam sucesso a suas iniciativas. Mas quais são as ferramentas essenciais? Há ferramentas corporativas de gestão adaptáveis às necessidades das organizações do terceiro setor? E vice-versa? Existe espaço para que as empresas e organizações aprendam umas com as outras e adaptem ferramentas, processos e soluções já adotadas? O mero interesse pelo bem da coletividade já não basta. O acesso a verbas públicas e privadas e mesmo o uso excelente dos recursos exigem uma administração mais profissionalizada das organizações do Terceiro Setor. É cada vez mais importante que as organizações – com e sem fins lucrativos – implementem ferramentas de gestão que lhes concedam transparência, viabilizem processos mais eficientes, permitam o monitoramento de indicadores e, em última análise, tragam sucesso a suas iniciativas. Iniciativas de Investimento Público e Privado Definir missão, valores e objetivos e, dentro desse plano maior, implantar ferramentas que permitam o acompanhamento de indicadores de resultados, confirmando o caminho até os objetivos traçados. Mas quais são as ferramentas essenciais? Quais têm implantação mais ágil? Quais são as exigências feitas por possíveis parceiros financiadores no Brasil? 18 E mais: como vai ser operada a gestão das organizações a partir de agora, com as verbas públicas e privadas cada vez menos orientadas para a estrutura organizacional? Como tem sido a experiência de sua organização no uso de ferramentas de gestão? Quais pontos você gostaria de destacar? E os desafios que observa nesse sentido? O Investimento social privado se dá sob a forma do “repasse voluntário de recursos privados de forma planejada, monitorada e sistemática para projetos sociais, ambientais e culturais de interesse público”, conforme definição do GIFE. Contudo, em boa parte das empresas, o negócio ainda é muito isolado da ação socioambiental e o tratamento dado pelos gestores a cada um é diferente, assim como a prioridade. De sua parte, o Estado conta com a sociedade organizada para cumprir parte dos serviços garantidos aos cidadãos e oferece recursos de cunho financeiro e não financeiro para esse fim. Carece, contudo, de transparência na destinação dessas verbas. Será que na primeira crise, tanto um como outro Relatório GSI JAM 2011 pode desistir de ações sociais já entabuladas? E as organizações da sociedade civil podem influenciar as políticas públicas, de modo a fortalecer sua agenda? O Investimento social privado se dá sob a forma do “repasse voluntário de recursos privados de forma planejada, monitorada e sistemática para projetos sociais, ambientais e culturais de interesse público”, conforme definição do GIFE. Contudo, em boa parte das empresas, o negócio ainda é muito isolado da ação socioambiental. Há casos em que os funcionários desconhecem as ações realizadas pelas empresas. E o tratamento dado pelos gestores às iniciativas comerciais ainda costuma ser diferente daquele dado às iniciativas socioambientais. Quando se determina o público ao qual se destinam tais iniciativas e investimentos, sejam eles públicos ou privados – a base da pirâmide – realça-se a necessidade de geração e fortalecimento de novos negócios, incentivo ao empreendedorismo e à inovação. Mas será que outras formas de investimento social devem ser consideradas? Será que as empresas estão refletindo quanto aos públicos a quem destinar os recursos? E o modelo na base da pirâmide, o que muda, o que permanece? c. Perfil dos participantes Sumário de participação no GSI JAM • Número de inscritos = 1534 • Número de log-ins = 540 (35%) • Número de postagens = 882 (1.6 per logged in) • Número de pessoas que postaram = 170 (31%) • Países representados = 16 • Setores representados = 5 • Número de tópicos = 5 De sua parte, o Estado conta com a sociedade organizada para cumprir parte dos serviços garantidos aos cidadãos e oferece recursos de cunho financeiro e não financeiro para esse fim. Carece, contudo, de transparência na destinação dessas verbas. Onde estão esses recursos públicos e privados e quais são os públicos e tipos de projetos preferidos pelos governos e pelas empresas? E o que acontece no exterior – em comparação com o Brasil, a destinação de verbas é mais fluida, menos burocrática, mais transparente? E em termos de políticas públicas, o que existe como ideia e como prática? Como as organizações da sociedade civil podem influenciar as políticas públicas, de modo a fortalecer sua agenda? E como o governo enxerga a sua participação e a da sociedade civil no desenvolvimento das políticas públicas? Qual é a sua experiência na concessão ou no recebimento de investimentos públicos e privados? E você conhece as ações realizadas pela empresa onde trabalha? Quais pontos gostaria de destacar? E os desafios que observa nesse sentido? 19 GSI – Global Social Impact, Sustentabilidade Organizacional, Ideias e Propostas Representação por setores Participação por Estados Brasileiros Observa-se um número significativo de pessoas físicas. Esse dado deve-se – entendemos – pela participação de voluntários (que podem ter optado por não se identificar como representantes das instituições que servem), de pessoas que atuam simultaneamente em empresas e em ONGs, e de estudantes de nível superior (que não representam suas escolas). De qualquer modo, é um dado inconclusivo. Confirmando dados históricos do Brasil, houve maior participação de pessoas do Sul, Sudeste e Distrito Federal. A expectativa dos organizadores é que, com a pulverização do uso de computadores e a ampliação no acesso a redes sociais nas demais regiões, Quanto ao expressivo número de representantes de os números de participantes se tornem mais equiorganizações da sociedade civil e de empresas, con- librados pouco a pouco e a iniciativa atinja maior siderando a vocação da GSI para a atuação junto a número de Estados. ONGs, foi positivo perceber o interesse despertado Países com participantes no JAM pela iniciativa junto a pessoas do segundo setor, seja incentivados pelo convite de empresas, seja atraídos 1. Brasil pelos nomes dos convidados especiais, seja pelo in- 2. Estados Unidos teresse no tema ou ainda pelo desembaraço no uso 3. Colômbia do formato virtual, pois durante o processo de pre- 4. Espanha paração do JAM, observou-se que representantes do 5. Argentina segundo e terceiro setores – especialmente lideranças 6. Equador – ainda demonstram maior dificuldade no acesso a 7. Uruguai 8. México internet e no uso de ferramentas virtuais. 9. Índia Quanto à mais discreta participação de represen- 10. Portugal tantes do primeiro setor, imprensa e academia, esse 11. França dado serve como incentivo para um esforço mais 12. Itália concentrado no convite em ações futuras. 13. Alemanha 14. Quênia 15. Paquistão 16. Brunei Darussalam O GSI JAM consistia no debate de questões conceituais e filosóficas, além de ferramentais. Em razão disso, era esperado o interesse em âmbito nacional. Contudo, como o Brasil tem se configurado como expoente nas ações com foco socioambiental na América Latina, era esperado algum interesse dali, inclusive pela participação de representantes corpo20 Relatório GSI JAM 2011 rativos e acadêmicos de vários países da região, fato futura. que se confirmou. Supostamente pela importância crescente que tem atingido em razão dos BRICs, de sua relativa estabilidade econômica em tempos de crise e da participação de representantes de organizações de segundo e terceiro setores e da academia de países do Primeiro Mundo, também se verificou a presença de pessoas desses locais. Foi especialmente encorajador saber do interesse despertado junto a indivíduos em países da África e Ásia, ainda que a quantidade ainda tenha sido discreta. No primeiro dia do JAM, mais de 330 reflexões foram postadas num período de 24 horas. No segundo d. Levantamento quantitativo dia, mais de 300 postagens foram feitas na metade desse tempo – quando surgiu a lentidão e, posteriormente, a impossibilidade de acesso. Esse dado forneParticipação em ce indícios de que o dobro de postagens poderiam postagens por paineis ter sido feitas nesse segundo dia e que, talvez, esse número teria se repetido nos dois dias subsequentes. Com a interrupção e o retorno em data não prevista originalmente, era esperado que o número de acessos, tanto por convidados especiais como por demais participantes fosse bastante reduzido, tendo atingido cerca de 100 postagens no dia 15 e no dia 16. Ainda assim, a equipe técnica, acostumada a promover JAMs empresariais, observou que, nesse evento de discussão de temas de sustentabilidade organizacional, – de interesse de pessoas físicas e jurídicas – tanto o número quanto a profundidade das postaDas 882 postagens, Iniciativas de Investimento Pú- gens foram inéditos. blico e Privado representaram 47% das contribuições ao JAM. Paralelamente, 20% do total ocorreram na discussão sobre Ferramentas de Gestão em Organizações do Terceiro Setor. Os três outros temas corresponderam a mais de 10% cada um. Talvez essa defasagem se deva à opção por abordar uma multiplicidade de temas pontuais que caracterizou o painel sobre Iniciativas, reunindo pares ou grupos de especialistas, particularmente em investimento público. Também o envolvimento ativo da Secretaria de Participação e Parceria de São Paulo atraiu representantes de organizações da sociedade civil que mantêm proximidade com aquele órgão, seja por meio de convênios, de debates promovidos periodicamente ou outros esforços. Essas iniciativas propostas por empresas e pelo governo podem merecer foco mais exclusivo num JAM ou outra ação 21 GSI – Global Social Impact, Sustentabilidade Organizacional, Ideias e Propostas e. Levantamento qualitativo O GSI JAM consistiu na realização de cinco paineis simultâneos com temas específicos, todos analisando facetas da Sustentabilidade Organizacional. Cada painel teve duração igual ao próprio JAM e foi estruturado em mesas de debate, cada qual com duração de 1 a 2 horas e com a presença de convidados especiais, encarregados de compartilhar suas próprias ideias e estimular a discussão. Filantropia Estratégica é um termo mais frequente nos Estados Unidos e no México. O GIFE (Grupo de Institutos, Fundações e Empresas) tem optado por adotar o termo Investimento Social Privado, definindo-o como o "aporte voluntário de recursos privados, de maneira sistemática, planejada e monitorada, em projetos de interesse público". Para a empresa, é muito útil institucionalizar (em uma fundação ou instituto) e profissionalizar (com colaboradores dedicados exclusivamente) esta área. Se isto ocorre, a área de ISP se torna uma "unidade de inteligência social", que, além de promover melhorias mais diretamente nas comunidades, contribui para a implantação da responsabilidade social na própria empresa. Esse longo e complexo compartilhamento de ideias somou quase 900 reflexões postadas, que aqui se transformam em cinco textos com uma síntese de cada um dos paineis. É importante reforçar que, embora os textos de fato tragam um reflexo do JAM A Filantropia sempre vai ser necessária em momencomo um todo, dificilmente vão corresponder à opi- tos de caos e escassez extrema, mas jamais pode ser nião individual dos participantes. uma forma de operação da empresa. A autonomia é parte fundamental no processo de desenvolvimento de pessoas, empresas e nações. Migrar desse estágio para a responsabilidade corporativa, induzindo novas formas de consumo e de negócios inclusivos requer uma revisão de modelo de mundo e de posicionamento frente à vida e aos negócios que pressupõe abrir mão de algo para que outros possam ganhar, e este é o grande desafio; quem se dispõe a dar o primeiro passo? Filantropia estratégica FILANTROPIA ESTRATÉGICA E SUSTENTABILIDADE A própria denominação Filantropia Estratégica subentende que a filantropia, ao menos na sua condição histórica, não é estratégica. E isso é verdade. Historicamente, a filantropia mais pareceu uma concessão das empresas à sociedade que uma ação a favor dos negócios. Hoje, isso vai mudando, porque o mercado não é um fim em si mesmo – é o espaço das relações econômicas de uma dada sociedade. Ocorre que a qualidade dessa sociedade é determinante para a qualidade dos negócios. Quanto mais desigual for a sociedade, mais restritas as opções de negócio, menores as relações de confiança, maiores os custos de transação. Portanto, uma sociedade desigual e injusta não interessa às empresas, mormente àquelas enraizadas nas sociedades em que operam. É possível afirmar, com pequena margem de erro, que a qualidade dos negócios e da regulação de determinado mercado está na razão direta da redução da desigualdade nesse contexto. Acresçam-se aí as condicionantes que as mudanças climáticas vêm trazendo às variáveis de negócio. Não basta avançar em tecnologias limpas, é necessário repensar o próprio consumo. 22 O importante é pensar na filantropia como "A sociedade pela sociedade". O termo "Filantropia Estratégica" não é o melhor, porque acaba se incorporando à ideia de que a filantropia não passa de um "negócio", e essa não é a essência – as empresas devem fomentar as questões sociais, buscando soluções com base em seus recursos e competências e seus vínculos multistakeholder. A filantropia pela filantropia tem vida curta. O grande desafio está em criar uma situação de "triple win", na qual ganhem a empresa, o consumidor e a sociedade, sendo que o ganho da sociedade ocorre tanto por uma menor pegada ambiental como por maior inclusão social. Dentro do sistema capitalista, a desigualdade social é justamente o alicerce, que nem de longe tem bases humanitárias. Não se constrói um mundo justo nesses moldes. É incompatível pensar em lucro, visibilidade empresarial e uma comunidade (no seu estrito senso), junto com um mundo mais justo. Para que se possa dar um salto quântico na questão da filantropia, é necessário melhorar muito a colaboração entre os diversos atores. Empresas precisam colaborar en- Relatório GSI JAM 2011 tre si, trocando informações e experiências, e também atuando juntas, complementando suas ações. As ONGs precisam trocar experiências e atuar juntas, compartilhando recursos – como, por exemplo, uma infraestrutura de Informática – algo que é caro e difícil de manter; se diversas ONGs, com o mesmo tipo de aplicativo e necessidades pudessem compartilhar os recursos, isso seria proveitoso para todos. do desenvolvimento mundial? Será que a filantropia estratégica deve privilegiar algum ponto exclusivo ou criar um leque de assuntos? E se esse for o caso, como isso deve ser gerido e por quem? Empreendedorismo e Negócios Sociais Martin Luther King disse que "somos desafiados pela urgência feroz do agora". Num momento de grande transformação, uma das propostas possíveis vem do empreendedorismo social. Na era industrial, os empreendedores usaram seu talento, dinheiro e capacidade de trabalho para construir empresas e gerar empregos. Hoje, estão motivados por questões sociais e valores éticos; são eles que vêm vencendo alguns dos grandes desafios da humanidade, sobretudo na mitigação da pobreza e na inclusão social. E podem mudar a cara das empresas e a forma com que elas se relacionam com o lucro e com sua sustentabilidade, além de atuarem como agentes da mudança social, solidificando parcerias e promovendo novos valores. Para que se opere uma mudança significativa em Filantropia Estratégica e Sustentabilidade Empresarial, urge uma infusão de princípios colaborativos: toda a cadeia de gestão precisa estar envolvida e preparada; todos os empreendimentos devem estar abertos para melhorias constantes, principalmente na infraestrutura, e prontos para multiplicar essa cultura entre os usuários de informação e gestores. Com a internet, os usuários finais estão cada vez mais próximos das redes de informação. Percebe-se que, em qualquer área, as armas do mercado são as redes de informação e delas se beneficiam a inovação e a colaboração. O investimento em educação é o principio para o desenvolvimento das cadeias produtivas e sempre É tempo de criar uma economia baseada na visão garante saldo positivo. integrada, em contraponto à abordagem fragmenSempre que se discute filantropia estratégica, parece tada que dominou a economia industrial. Hoje, as que o tema caminha para a reflexão sobre o que é ONGs, com sua capacidade de mobilização e sua vilucro empresarial e como ele promove o desenvol- são diferenciada, têm papel relevante na construção vimento social. Se considerarmos o ato de doar para desta nova realidade. O empreendedorismo social é causas e propostas sociais importantes e estratégicas, um impulso fundamental para influenciar a mudancomo logística de saúde, alimentos e mesmo redução ça e a transformação que já estão em curso. no uso de recursos e gestão sustentável, qual será a Uma chave para o empreendedorismo social está na visão diante de catástrofes e desastres – naturais ou visão estratégica que otimiza os benefícios a todos os não? (terremoto do Haiti e vazamento de petróleo interessados, inclusive os investidores. Com alguma BP). Em anos recentes, é alarmante a visão de dados criatividade e diligência é possível construir essas esreferentes ao direcionamento internacional de recur- tratégias, que extrapolam a visão de que “eu só gasos privados para ações e projetos sociais pelo mun- nho se você perder”, dos tempos da era industrial. do. Segundo a fonte www.foundationcenter.org, importantes fundações deixaram de apoiar organiza- É tempo de buscar mais alternativas de renda para ções sociais ou de pesquisa, reduzindo o valor de US$ organizações sem fins lucrativos, e de estabelecer no 1.973.882.644 em 2009 para US$ 424.519.025 em país o conceito de "empresa social". Os empreende2010. No Haiti como um todo, até 2009, as doações dores que exploram esse caminho e criam empresas não ultrapassavam os 470 mil dólares. Em 2010, sociais são pioneiros – por isso encontram dificuldaesse valor passou para 200 milhões de dólares, sen- des para alavancar seu negócio social. As razões vão do que esses números desconsideram o fato de que, desde a comunicação de sua iniciativa para uma somesmo antes do desastre, o país já figurava nos rela- ciedade que ainda espera ONGs com ação caritativa, tórios internacionais com indicadores alarmantes de passando por uma legislação limitante que coloca as desenvolvimento humano. Será que falhamos com a empresas sociais na mesma classificação de empresas filantropia estratégica, quando não olhamos para os comerciais e de organizações sem fins lucrativos. materiais criados pelas próprias fundações ou para os Supondo que o conceito de ‘negócios sociais’ ou ‘emalertas enviados pelas agências internacionais acerca presas sociais’ desenvolvido por autores como Hart, 23 GSI – Global Social Impact, Sustentabilidade Organizacional, Ideias e Propostas Yunus e Prahalad não esteja incorporado na mente das pessoas que tomam decisões, ou que ainda prevaleçam as ações filantrópicas, talvez seja tempo de diversificar a forma de investimento social. pressionadas a adquirir as "competências" do mundo empresarial, porque aparentemente eram incapazes de produzir transformações sociais duradouras sem adotar estratégias, metodologias, planejamento próprios do setor empresarial. Hoje, as empresas têm Há uma classe de funcionários que se poderia demuito que aprender com elas. Em algumas empresas, nominar ‘intraempreendedores sociais’. Eles podem essa transição no modo de operar já está em andaajudar as empresas a descobrirem o potencial de inmento. Como em toda transformação, o tempo e a tegrar os desafios da sustentabilidade nas estratégias. vontade política de todos os envolvidos determinam As inovações dos intraempreendedores sociais transa velocidade e a qualidade das reais transformações. formam desafios sociais e ambientais em novas plataformas de crescimento econômico para suas em- Quando se diz "trazer a visão social do terceiro setor presas. Afinal, empresas são formadas por pessoas. para o setor privado", supõe-se que isso signifique a São elas que lideram o processo de mudança e con- capacidade de se envolver independentemente de tal seguem fazer valer uma visão de negócio social atre- comportamento atrelar lucros ou não, a capacidalado aos negócios das empresas. de de criar relacionamentos de confiança e de mobilizar pessoas em vista do bem comum. Trata-se de uma mudança na cultura organizacional: uma ONG precisa gerar lucro, como qualquer empresa, embora Mindset sem distribuí-los. Para isso, precisa adotar estratégias Capitalismo em convergência gerenciais, planejamento, planos de ação, marketing O pensamento que considera a relação socioam- e utilizar ferramentas administrativas, a fim de realibiental e cultural busca transformar o modo de as zar sua atividade, prestar seu serviço. empresas verem o mercado do terceiro setor. É esse Ninguém se opõe aos princípios da Sustentabilidao setor que mais cresce no mundo; inclui cultura de, da mesma forma que ninguém se opõe à Paz. e artes entre as molas propulsoras – ecologicamenO mundo empresarial e o mundo as organizações te corretas, não poluentes, lúdicas, introduzindo o da sociedade civil podem e devem aprender juntos, lazer e acima de tudo fomentando grandemente o mutuamente fecundando saberes e experiências que giro econômico. As empresas necessitam mudar suas redundem numa cidadania ativa e assertiva, capaz visões ao desenvolver responsabilidade social. Com de propiciar ao presente e às futuras gerações posrecursos governamentais e principalmente privados, sibilidades de vida saudável e gratificante. Vale despodem atingir comunidades em áreas de risco sotacar que os movimentos da sociedade civil surgem cial por meio de projetos culturais e artísticos; isso da constatação de necessidades básicas não atendisignifica diminuir drasticamente os impactos sociais das nem pelo poder público, nem privado, donde se negativos sobre essas empresas e em sua relação com depreende que essas organizações têm sensibilidade o entorno, promovendo redução significativa nas e expertise que não podem ser ignorados. Ademais, perdas por assalto, implementando uma nova ordem não têm poder centralizado, não atendem a nenhude convivência social com base na tolerância social ma ideologia ou religião específica, são difíceis de sem preconceitos, na cultura de paz, na ordenação e manipular e silenciar. São criadas para atingir um ações dos direitos humanos. propósito e, uma vez alcançado, se dissolvem para As empresas devem estar atentas ao que é de fato assumir novas configurações. Essa fluidez pode ofeimportante e acontece na comunidade. Talvez o se- recer ao mundo empresarial uma percepção rápida gredo seja a construção de uma relação de confiança. das necessidades locais, podendo gerar conjuntaAtravés de uma comunicação constante e desejo real mente oportunidades criativas de bem estar. de entender em detalhes a cultura das organizações Não se deve esquecer que os governos nos diferentes parceiras. O diálogo pode abrir novos e duradouros níveis precisam ser sempre considerados nas estracaminhos – com este esforço, novas aprendizagens tégias, pois são eles que poderão dar escala aos proacontecem para todos os envolvidos e parcerias suscessos. Empresas e ONGs serão sempre indutoras tentáveis e valiosas tornam-se possíveis. Na década de modelos, porém nunca operadoras em escala. O de 80, as organizações da sociedade civil se viram grande desafio está em como tratar com governos 24 Relatório GSI JAM 2011 com diferentes sensibilidades e objetivos. Além desses desafios, existe a troca periódica de poder, o que dificulta a continuidade. Outro grande desafio é o trabalho conjunto de empresas e ONGs que, ao longo dos anos, têm mostrado dificuldade para atuar em rede e/ou parcerias. A conclusão mais próxima seria que temos que começar mudando nosso mindset, ou seja, elevando o nível de consciência para um patamar onde entendamos que, ao fazermos juntos, nada mais estamos fazendo do que praticando a verdadeira boa cidadania. íses, as empresas desenvolvem ações de responsabilidade social como forma de retribuição à comunidade, sem mudar fundamentalmente o que fazem, no espírito do voluntariado corporativo, da filantropia etc. Será que basta a ação filantrópica? Nos dias de hoje, ainda é melhor fazer isso que não fazer nada? Por quanto tempo? Muitas de nossas ações só perpetuam o que já existe e não geram as mudanças necessárias. Este é o grande desafio e ele passa por uma mudança de valores que deve considerar os aspectos econômicos, sociais No livro “Capitalismo na Encruzilhada”, Stuart e ambientais. É sobre esta nova base que serão consHart menciona o modelo de negócio da subsidiá- truídas políticas públicas mais eficazes e ações sociais ria indiana da Unilever, com o desenvolvimento de transformadoras. recursos nativos em seus esforços pioneiros nas áreEntretanto, a melhor maneira de atingir um novo as rurais mais pobres. Naquele país, os funcionários sistema de valor é demonstrar isso através de experipassam seis semanas vivendo em localidades rurais, ências de negócio reais baseadas no conceito de tribuscando opinião dos consumidores e preferências ple bottom line. É melhor "agir até chegar a uma para o desenvolvimento de novos produtos, além da nova forma de pensamento" do que tentar "pensar identificação de matérias-primas de produtores loaté chegar a uma nova forma de agir". cais. A empresa também criou um centro de pesquisa e desenvolvimento na área rural da Índia, focada Para que um empreendimento seja sustentável, não especificamente em tecnologia e desenvolvimento de basta ser economicamente viável, socialmente jusprodutos para atender as necessidades dos pobres. A to, ecologicamente correto e culturalmente aceito. empresa envolve grande número de parceiros locais Antes disso, deve ser reconhecido consensualmente para distribuição de seus produtos e para apoiar os como necessário à coletividade. É comum encontraresforços deles no desenvolvimento de competências mos iniciativas, tanto do mundo empresarial quanto locais. Além disso, a Unilever oferece oportunidades das organizações da sociedade civil, que procuram e formação para empreendedores locais e experimen- ser implementadas dentro de uma comunidade sem ta novos tipos de distribuição, como a venda através serem reconhecidas como necessárias ou prioritárias para ela. Na sustentabilidade, o lema tem que ser de demonstração in loco e em teatros de rua. "não criar necessidades desnecessárias". Ao menos Será que, se empresas investirem nas necessidades e não antes de ter atendido as verdadeiras necessidades cultura locais, dando capacitação e incentivando o primárias. desenvolvimento criativo e flexível do mercado, conseguirão desenvolver economicamente estas comuni- O termo "investimento de impacto" está ganhando dades e ao mesmo tempo gerar receitas substanciais e espaço; contudo, todos os investimentos produzem impacto, negativo ou positivo. Além disso, na velha lucros operando em mercados de baixa renda? visão de organizações sem fins lucrativos em busca Empresas rumo à sustentabilidade de doações, a filantropia leva a projetos inacabados Uma empresa sustentável é aquela que considera to- ou a grandes volumes de esforço desperdiçado na dos os fatores – o financeiro ou econômico, o so- caça ao dinheiro, em vez de levar a cabo a ação procial e o ambiental. Ela reflete sobre problemas reais posta. Empreendimentos sociais e companhias que ocorrendo a sua volta e começa a pensar em práticas assumam uma função social representam um movicomerciais que pudessem ajudar a minimizar esses mento na direção certa. Para aqueles que seguem o problemas e ainda viabilizassem o lucro, não sendo modelo antigo, é melhor que deixem a Era industrial um em detrimento do outro, mas como uma estraté- do combustível fóssil e invistam na transição verde. gia incorporada. Tampouco significa necessariamen- Todos os conceitos de sustentabilidade precisam ter te ganhar menos dinheiro para ter mais valor social exemplos para inspirar organizações. Talvez vejamos ou ambiental. No Brasil, assim como em muitos pa- uma evolução gradual de filantropia para filantropia 25 GSI – Global Social Impact, Sustentabilidade Organizacional, Ideias e Propostas estratégica, realmente atacando desafios da sustentabilidade, e finalmente chegaremos a empresas mais sustentáveis, colaborando com governos, ONGs e comunidades locais. Casos positivos podem inspirar, mas é necessário que haja mais mecanismos. Como motivar empresas para um caminho voltado para a sustentabilidade? A empresa sustentável e social parte de uma lógica que integra no seu plano os problemas atuais, responde a eles e também repensa o que é lucro e divisão monetária. Passa assim a valorizar seus fornecedores, seus clientes e a produzir melhoras sociais a partir do retorno monetário que possui, girando outras rodas de desenvolvimento social. O movimento de sustentabilidade surge tanto dos pequenos empreendimentos quanto das grandes empresas. Adicionalmente, agindo em grupos, as organizações passam a compartilhar valores e a desenvolver formas de ser produtivamente viáveis. Investir em tecnologias limpas e não criar necessidades desnecessárias é um grande avanço. As organizações precisam ser transparentes e verdadeiras nas suas propostas e validar a necessidade de seu negócio junto a uma comunidade. Têm de pensar em ações estratégicas para o seu negócio, mas que também atendam uma demanda real daquela população. Considerando a oportunidade que surge para incorporar à cultura de gestão das empresas habilidades que normalmente são encontradas apenas em ONGs, é possível que empresas e ONGs nunca tenham estado tão próximas, em sua rota de um passado de distanciamento ou mesmo de estranhamento. Os desafios da sustentabilidade obrigam umas e outras a desenvolver olhares comuns, a compartilhar modos de fazer, a buscar caminhos conjuntos. Os métodos de gestão, porém, permanecem essencialmente distintos. ONGs tendem a ser ambientes mais orgânicos, que "aprendem fazendo", com decisões tomadas de modo mais compartilhado. Empresas tendem a ser mais hierárquicas e fechadas – ainda que haja exceções. O modo de operar das ONGs pode mesmo ser levado para as empresas? Por outro lado, que aspectos da gestão empresarial são necessários e adequados ao dia-a-dia das organizações sociais? No modelo econômico atual e também nos processos sociais, surgem muitas questões quanto ao poder das empresas e do dinheiro em relação a sua função social. Seria utópico pensar que uma empresa não precisa aumentar seus lucros e metas para os acionistas, mas sim para a sociedade? Hoje, uma empresa existe e se estabelece; a partir daí, começa a gerar lucro que é destinado aos acionistas e reinvestido para mais crescimento. A utopia seria: uma empresa que define em conjunto com os acionistas quanto de retorno cada acionista quer – algo que seja honesto e justo. O objetivo dela continua sendo gerar cada vez mais lucro, porém uma vez estabelecido o valor do acionista, do reinvestimento, o que sobrar vai para processos sociais desenvolvidos por ela em conjunto com governo e organizações não governamentais. 26 Esse processo de revolução e evolução das empresas vai exigir um volume grande de adequações: transparência é uma delas, inclusive nos orçamentos; divisão justa de lucros, com distribuição de renda, resultando num novo entendimento do que é lucro (dinheiro, pessoas, mundo); canais abertos para troca, e copyleft1 ; compartilhamento de valores sociais e ações. Tais práticas podem ajudar nesse processo de confiança. Uma das questões mais intrigantes: quando se fala em sustentabilidade organizacional, quanto as organizações estão efetivamente evoluindo? O discurso da sustentabilidade tornou-se mundialmente o novo mantra das empresas, uma questão fundamental em seu posicionamento público em todos os setores econômicos. A evolução no discurso é clara. Mas e a prática? A distância entre o discurso, as teorias, e suas implementações práticas fica muito mais evidente hoje, com a aceleração do processo de mudança. A produção de conhecimento técnico duplica a cada 72 horas; entretanto, o comportamento e mesmo a aplicação desse conhecimento não se efetiva na mesma velocidade. Mudanças comportamentais requerem variáveis mais difíceis de promover, seja individual ou coletivamente. As ciências cognitivas terão que vir em nosso auxílio para dar conta da lacuna que se abre entre o conhecimento e a vida prática. Um grande número das iniciativas de responsabilidade social adotadas pelas empresas no mundo todo se fundamenta em relações públicas e pode ser classificado como greenwashing2. Entretanto, já há ferramentas desenvolvidas e praticadas, inclusive no Brasil, para uma abordagem estratégica e sistêmica do problema. Relatório GSI JAM 2011 O ponto de equilíbrio entre os aspectos social, ambiental e econômico parece ser, acima de tudo, o grande desafio para a prática da sustentabilidade nas empresas. Isoladamente, percebem-se muitas iniciativas relacionadas a boas práticas ambientais (economia de recursos naturais, reciclagem etc.) e também sociais – neste caso, muitas vezes confundidas com o conceito puro de filantropia. Dessa forma, o que podemos tomar como exemplos de gestão sustentável nas empresas no Brasil? A prática da sustentabilidade ainda é um grande desafio para as empresas. As ações têm sido, na maioria das vezes isoladas, e ainda existe grande distância entre a teoria e a prática. O mero conhecimento dos conceitos não tem sido suficiente para fazer essa transposição. Como alavancar a prática nas empresas? Os executivos já possuem boa noção do tema. Como auxiliar na sua mudança de postura e comportamento? O caminho de mudança de postura fica claro para os executivos quando eles conseguem ver os objetivos e metas de sustentabilidade de suas áreas, ou seja, o papel de cada um para que a organização possa avançar em seu caminho para a sustentabilidade, condição que somente pode ser atingida pela sociedade como um todo, mas por caminhos individuais e institucionais. A chave está em ultrapassar a crença de que, para oferecer mais valor social e ambiental, é preciso sacrificar a criação de valor econômico e financeiro – essa dicotomia é falsa. É possível atingir mais das três formas de valor através de novas estratégias. Este é o principal argumento do livro 'Capitalism at the Crossroads'. É necessário romper esse paradigma e construir o triple win (empresa-consumidor-sociedade). O que se vê é a mesma velha dicotomia, de que não era possível ter qualidade sem aumentar custos. A criação conjunta de valor chega como uma forma de criar um ambiente de negócios com geração de lucros e, ao mesmo tempo, inclusão social. Um exemplo interessante de co-criação é a Itsnoon do Brasil (www. itsnoon.net). O ponto de equilíbrio no triple bottom line pode parecer uma abordagem abstrata demais para encararmos o desafio real da sustentabilidade. A gestão de sustentabilidade eficaz leva a organização a progredir rapidamente no caminho estratégico de sus- tentabilidade, o qual deve ser definido com base em uma visão de futuro sustentável. Aprender com o futuro – há ferramentas para isto, descritas no SSD framework. www.hapiconsult.com.br. A maioria dos estudos sobre os diferenciais corporativos começam pelo desempenho financeiro e vêm daí para trás. Os autores do livro Firms of Endearment, lançado pela Wharton School Publishing em 2007, começaram pelo desempenho humano e avançaram. Eles foram analisando e selecionando empresas até chegar a um pequeno grupo de corporações que realmente conseguem beneficiar todos os stakeholders, sem buscar exclusivamente o lucro para os acionistas. Elas conseguiram beneficiar seus empregados e as comunidades nas quais estavam inseridas; também desenvolveram uma relação participativa com os fornecedores, sendo amadas pelos clientes. Atingiram excelência em termos ambientais, sociais e financeiros. E excederam o esperado em termos de lucro. Como será isso no Brasil nos próximos anos? As grandes corporações devem abandonar o discurso vazio e se engajar em mudanças reais e tangíveis. Que tal mudar suas instalações para fora das grandes cidades, diminuindo os problemas de trânsito e estacionamento, gerenciamento de água e esgoto, sem falar na melhor qualidade de vida de seus empregados? Em empresas privadas que buscam lucro, a prática da filantropia estratégica somente é sustentável se as ações estiverem diretamente vinculadas ao negócio. Caso contrário, qualquer mudança no comando da organização ou restrição de investimento nessas ações corre o risco de ser interrompida. A AES Eletropaulo está eletrificando as favelas e eliminando as ligações clandestinas. Para levar acesso a energia de forma regular e em condições que as comunidades possam pagar pelo serviço, é preciso criar um modelo de negócios agregando práticas que contribuam para o desenvolvimento socioeconômico dessas comunidades; caso contrário, será inevitável o conflito em razão da inadimplência no pagamento das contas de energia elétrica. Assim, além de um amplo trabalho ensinando as comunidades a racionalizarem o consumo de recursos, estão sendo buscadas formas alternativas de agregar valor ao fornecimento de energia elétrica, num processo de co-geração de valor, em prol das melhores alternativas para agregar valor ao produto. 27 GSI – Global Social Impact, Sustentabilidade Organizacional, Ideias e Propostas Como pensar na criação de produtos com valor social num ambiente de consumo de supérfluos, de acumulação de capital? A questão fundamental da razão de ser de cada um de nós e de todos juntos parece não caber no mundo do capital. Mas não é possível subitamente desconstruir as sociedades, assim como não se pode acabar com as empresas nascidas deste modelo econômico. Talvez um caminho esteja em investir no nascimento de novas organizações que já brotem sob a perspectiva do tripé da sustentabilidade e ajudá-las a ocupar os espaços das empresas tradicionais. e serviços sustentáveis. É aí que a questão da Filantropia Estratégica se coloca. As empresas do século XXI precisam estabelecer políticas multistakeholder que permitam a elas estar permanentemente informadas do que ocorre nas franjas do mercado, incorporando à sua cultura de gestão habilidades que costumam ser encontradas apenas em ONGs. Diálogos apreciativos na base da pirâmide, produção e comércio justo, organização criativa de comunidades na cadeia produtiva são alguns destes desafios. Além, é claro, da mitigação dos impactos. Portanto, embora o termo “Filantropia Estratégica” não seja preciso, é chegada a hora de as empresas pensarem estrategicaÉ importante tentar entender como as empresas pomente na sociedade e nos custos que vão derivar da dem aprender com as ONGs e vice-versa. Artigo do falta dessa reflexão. “Além da Filantropia: repensanPrahalad e Brugmann sobre essa questão, mostrando a função social de uma empresa sustentável”. do a evolução da relação entre empresas e ONGs que partiu de uma discordância bastante acirrada no É questionável a visão do "acesso crescente ao conpassado para uma tendência de parceria no presente. sumo" como instrumento para minimizar desigualdades sociais. Urge a revisão do próprio conceito de A globalização das empresas traz benefícios financeiconsumo como base da economia e da convivência ros, mas também várias questões a considerar. Devedentro das comunidades. Não é possível atender às se atentar para o risco de malefícios para a sociedade demandas de consumo nos níveis em que ele aconou rivalidades, ou aumento de conflito entre os patece em sociedades como a norteamericana ou da íses ricos e em desenvolvimento. Para construir uma Europa Ocidental. Não há matéria prima disponírelação onde todos ganhem, as empresas devem vel para tanto. Sendo assim, é hora de revisar nosso adotar uma postura de transparência e humildade modo de ser e estar no mundo, abrindo mão do superante a sociedade e o Pais onde pretendem se espérfluo e descartando a ideia de que as posses detertabelecer. É preciso conhecer e respeitar a cultura, minam o reconhecimento social. a história, compreender as necessidades. É preciso mudar a atitude das empresas para que se crie um O movimento agora é no sentido de extrapolar as clima de confiança relações já estruturadas e estabelecer diálogo e relacionamento entre as empresas e a base da pirâmide. A globalização tem a ver com o forte e veloz cresciUm caminho está na criação conjunta de negócios mento da informação. Num futuro não muito disenvolvendo empresas e populações de baixa renda, tante a empresa terá que agir de fato, seja com invesnuma abordagem bastante nova. Se, na fase BOP timento social privado, talvez em parcerias de gestão, 2.0, as empresas devem assumir uma atitude comtalvez por meio de seus institutos e/ou fundações – pletamente diferente, mais hábeis e interessadas em com isso, mostrará seu nível de envolvimento com o ouvir o que as comunidades querem e precisam, qual todo. Será preciso menos marketing e mais verdade, será a contrapartida dessas populações? Como ir até pois as redes sociais desvendarão a realidade. A gloo meio do caminho, deixando de ser consumidores balização trará uma mudança radical na sociedade e e assumindo o papel de parceiros nos negócios? De quem não estiver atento poderá acordar com muita que forma empresas podem alinhar seus objetivos de dor de cabeça. negócios atuando em parceria com empresas sociais? Base da Pirâmide Em sociedades mais igualitárias, pressupõe-se igualdade de oportunidades e acesso crescente ao consumo. Mas para que este consumo seja benéfico, ele não pode partir da idéia de que o consumidor de baixa renda que ascende é apenas um consumidor – ele deve ser parceiro na própria concepção de produtos 28 A primeira reação das populações de baixa renda que forem convidadas a participar da realização de negócios será de desconfiança. Elas irão suspeitar de uma ação demagógica por trás do convite, já que as empresas nunca demonstram interesse em ouvi-las. Talvez algum tipo de manobra para convertê-las em consumidoras e não em parceiras no negócio. Relatório GSI JAM 2011 força a necessidade de desenvolver um modelo de negócios que considere alguns princípios básicos, a partir de exemplos de sucesso em iniciativas de organizações. O desafio está em buscar uma solução inovadora para atender as necessidades da população de baixa renda dentro de uma lógica empresarial que seja sustentável. Tem sido adotada uma lógica muito interessante, pela qual uma solução sustentável pode ser gerada a partir de um problema surgido das coO movimento da Tecnologia Limpa ocorreu simulmunidades carentes. taneamente ao da base da pirâmide. Nos anos 90, ficou claro que as questões ambientais haviam cresciExperiências compartilhado em importância, assim como as obrigações legais das durante o painel e os custos para o desenvolvimento de negócios. Foi Stephan Schmidheiny, 116º nessa época que o conceito de ecoeficiência ganhou Fundação AVINA: no Ranking da Forbes entre os homens mais ricos força. Alguns começaram a perceber que poderiam reduzir riscos e gerar economia através de iniciati- do mundo em 2003, criou a Fundação AVINA – um vas ambientais. Ao mesmo tempo, o conceito de res- exemplo contundente de investimento em desenvolponsabilidade social corporativa foi se popularizan- vimento sustentável na América Latina. A fundação do, ainda que sob a forma de filantropia empresarial é mantida pelos dividendos do GrupoNueva – hoje e sem a visão das possibilidades de relacionamento basicamente MASISA (Chile), doados por Schmique têm potencial de gerar receita para as empresas. dheiny para o VIVA Trust. É um círculo virtuoso no Hoje, a revolução da Tecnologia Limpa se concentra qual as empresas administradas com diretrizes susmais na inovação da próxima geração, mas parece tentáveis contribuem para uma fundação de fomenser muito orientada para a P&D e menos para o de- to ao desenvolvimento sustentável. senvolvimento de negócios eficazes. São investidos Odebrecht: Na construção da usina de Santo Antôrecursos substanciais no desenvolvimento de Tec- nio, na Amazônia, a Odebrecht promoveu um grannologias Limpas, mas pouco no desenvolvimento de trabalho de engajamento de stakeholders. Para de canais eficazes de comercialização. Se não for re- contribuir com o desenvolvimento local, a empresa solvida essa lacuna de comercialização, poderá ocor- ajudou a formar mais de 20.000 pessoas para trabarer o estouro de uma bolha da Tecnologia Limpa. A lhar na hidrelétrica (o chamado programa ACREpopulação na base da pirâmide é ideal para a incu- DITAR), além de promover ações de capacitação em bação comercial das Tecnologias Limpas do futuro outras formas de empreendedorismo. próximo. No entanto, a maioria das estratégias de Criada em comercialização de Tecnologia Limpa está focaliza- Fundação ArcelorMittal Brasil: 1988, a Fundação ArcelorMittal Brasil desenvolve da no topo da pirâmide de renda. As empresas que adotarem uma abordagem mais criativa estarão um programas e projetos sociais nos municípios onde passo à frente das demais – e entre as empresas mais a empresa está presente, beneficiando cerca de 800 bem sucedidas do século 21. Você vê a base da pi- pessoas por ano. O principal foco é a educação de râmide como um veículo para a comercialização de crianças e adolescentes. A organização www.comuTecnologia Limpa, numa forma mais rápida e eficaz? nidadecarisma.net/centrosocial é um dos parceiros da Fundação, tendo recebido apoio financeiro num A base da pirâmide é o veículo primordial para a projeto com adolescentes através do FUNCAD. Tecnologia Limpa, devido ao universo de pessoas envolvido e à evolução de seus padrões de consumo, Grameen Bank: No sentido de algo utópico ou não, com impacto crescente. A preferência desse públi- um exemplo muito discutido de negócio social é o co por tecnologias limpas somente será conseguida Grameen Bank, de Muhammad Yunus. Foi invenmediante ações de educação para a sustentabilidade. tado o conceito do microcrédito e Yunus ganhou o Empresas, governos, academia e outros atores têm a Prêmio Nobel de Paz. E pensar que este prêmio foi dado a um grupo de pessoas que fundaram um banresponsabilidade de fazer isto acontecer. co pouco antes da crise financeira. Ao mesmo temO conceito de BOP introduzido por Prahalad reO intangível mais importante é a confiança. Demanda algum tempo para que as empresas consigam restabelecer este relacionamento – o pré-requisito para a criação conjunta de um novo empreendimento focado no valor mútuo. É a construção de confiança que solidifica a metodologia do Protocolo da Base da Pirâmide, desenvolvido por mim e meus colegas nos últimos seis anos (www.bop-protocol.org). 29 GSI – Global Social Impact, Sustentabilidade Organizacional, Ideias e Propostas po, várias empresas põem o ser humano no centro (NBA CARES), ativo também no Brasil, comenta das atividades. O recém-lançado livro "Humanistic ter grande dificuldade em descobrir quem é sério. Management in Practice" relata o caso da Semco, Participaram da criação deste tópico além de Grameen-Danone Foods (Bangladesh), Mondragon (Espanha) e Sekem (Egito). Alcely Barroso, Andrea Shpak, Augusto Hijo, BruAW Comunicação: Como sócio de uma empresa de no Andreoni, Carla Botelho, Carolina Neri, Celina comunicação há sete anos no mercado, especialmen- Mendes do Prado, Claudia da Silva, Cynthia Rosente nos últimos quatro anos, adotamos estratégias de burg, Daniel Francisco Moreno de Sousa, Edgard investimento social privado, seja apoiando institui- Barki, Fabia Alencar, Fabio Gandour, Hazel Henções do terceiro setor, seja atendendo ONGs por derson, Heiko Spitzeck, Janete Hung, José Luis Capreços abaixo do mercado. Essa experiência nos fez varetti, José Ricardo Franco Montoro, Julia David refletir sobre o real impacto da nossa atividade na so- Franco Gomes, Lia Diskin, Marcia Bellotti, Patrícia ciedade, afinal somos o pivô da sociedade capitalis- Menezes, Paulo Vodianitskaia, Polyani Garcia, Rita. Estimulamos o consumo desenfreado e contribu- cardo Young Silva, Rosicler Rodriguez, Ruth Haraímos ativamente para a consolidação desse cenário da, Sergio Amoroso, Stuart Hart, Vera Lucia Barroso desigual, mesmo atuando com práticas de responsa- Alves Frascino e Wagner Andrade. bilidade social. Compreendendo esse cenário, iniciamos uma mudança de visão do negócio. Trazer essa experiência, essa visão do terceiro setor para o setor privado. Estamos reposicionando a empresa em todos os aspectos para apresentar ao mercado uma nova forma de pensar em comunicação – usando-a como instrumento de transformação social. Voluntariado IBM: Na IBM e em outras empresas, funcionários de diversos países atuam como voluntários em ONGs em países em desenvolvimento. Estas pessoas passam um mês em contato direto com a comunidade local através de uma ONG, tentando entender os seus problemas e eventualmente propondo soluções. Vê-se nessa experiência uma relação ganha/ganha, onde os funcionários da empresa aprendem a cultura e a experiência de ONGs, sua forma de atuação, e principalmente, aprendem a respeitar e gostar de uma forma diferente de organização. A ONG aprende como uma cultura empresarial pode ser aplicada a sua gestão. E a empresa ganha, formando líderes mais conscientes e preparados para o futuro num mundo globalizado. No Brasil, o projeto de voluntariado da IBM já foi realizado em SP, BH, Campinas e RJ. Agora vai a Salvador. Em cada lugar, diversas ONGs são visitadas – representantes da empresa explicam o trabalho e verificam o interesse das organizações em atuar ou em compartilhar relatos de projetos. Um ponto interessante é ver como a empresa acessa/pesquisa essas ONGS, para que possa ampliar o projeto em suas comunidades. Quais os critérios básicos de que essas ONGS precisam para se qualificar? E onde se qualificam? Uma diretora da NBA que possui um programa parecido 30 PARCERIAS INTERSETORIAIS DE BENEFÍCIO MÚTUO Colaboração e o JAM A colaboração é fundamental para a fluidez das parcerias intersetoriais. Parte do desafio consiste em entender que esses arranjos organizacionais não podem ter por objetivo uma ação ou resultado específico. Colaboração é algo maior, em que pessoas físicas e jurídicas buscam trabalhar juntas em prol de um melhor cenário (ou mercado) para todos os envolvidos, como em situações nas quais empresas concorrentes colaboram para estabelecer práticas e padrões, confiando na perspectiva de executar suas estratégias individuais de forma mais eficiente e eficaz no futuro. Por exemplo, quando se definiu um padrão de características dos containers, empresas concorrentes perceberam que todas seriam beneficiadas. No contexto do debate no JAM, a definição de Colaboração indicava a necessidade de organizações de diferentes setores se verem como redes sociais em suas cadeias de suprimento e junto a seus demais stakeholders. Poder-se-ia pensar numa rede de redes, onde parcerias intersetoriais ocorressem de forma orgânica e espontânea, e não somente através de contratos e acordos formais, pelo estabelecimento de Relatório GSI JAM 2011 cada qual como rede e da sua integração a outras redes de pessoas e instituições. O próprio JAM exemplifica o potencial desse tipo de iniciativa, tendo a tecnologia da informação com seu papel de catalisador em todo o processo. O ambiente virtual, com finalidade específica, governança, foco e ações controladas e medidas torna o contato diferente do que se produz em redes sociais abertas como o Facebook, o Twitter ou outras dessas ferramentas. As tecnologias e eventos como o JAM são importantes para troca de ideias e para detecção de novas tecnologias, mesmo reconhecendo que o público com possibilidade de acesso ainda é restrito. Essas ferramentas validam o diálogo e interação entre os atores, tendo a relação direta e participativa como principal condutor. É um desafio integrar as redes com finalidade prática, mas é certo que o debate em meio virtual possibilita a pessoas e instituições de diferentes regiões discutirem e analisarem trabalhos, ideias e possíveis soluções para seus problemas locais, sendo esse um mérito das tecnologias modernas. na do setor público x privado x sociedade civil: aliança parece sugerir um compromisso em torno de uma causa, implementado por meio de diferentes parcerias e projetos. A ideia de aliança transmite cumplicidade, com as diferentes organizações de mãos dadas no sucesso ou no fracasso. Parceria sofre mais o risco de esvaziamento, tanto do conceito quanto da prática. Segundo relata o livro ‘Paralelos e Paradoxos’, do pensador Edward Said, ele e o maestro Daniel Barenboim selecionaram um grupo de músicos palestinos e israelenses para tocar Wagner em um workshop na Alemanha – ação que resultou numa orquestra que existe até hoje. Se a ideia tivesse sido colocar esses mesmos jovens para discutir política do Oriente Médio, eles provavelmente jamais se entenderiam; contudo, para tocar Wagner, uma ponte de compreensão e aceitação das diferenças se construiu. Parcerias e alianças dependem de colaboração – de laborar, trabalhar com. Em muitos casos, as questões complexas ficam encobertas pela superficialidade dos acordos em papel e dos apertos de mão para fotos. Alguns dos requisitos básicos para forjar aquelas que podem se tornar boas parcerias são disseminação de informações, comunicações regulares e acompanhamento próximo – indispensáveis, ainda que não suficientes. As redes sociais desempenham importante papel quando se fala em colaboração, pois permitem a livre ação/expressão e são movidas pela espontaneidade e por ondas de assuntos. Há que se considerar que essa característica as torna difíceis de mediar. Adicionalmente, o JAM, por exemplo, tem metodologia atemporal, com as pessoas se conectando Projetos que envolvem a execução de políticas púconforme sua conveniência e permanecendo unidas blicas podem ter dificuldade para agregar atores pripelas ideias. vados. Parece que o interesse público é prerrogativa exclusiva do Estado, mesmo em casos como o dos Características das parcerias resíduos sólidos num contexto de intersetorialidade, Dinâmica territorial, desenvolvimento local, capi- onde os indicadores têm se revertido positivamente e tal social e configurações das organizações3. Estado, de maneira drástica, superando metas estabelecidas e empresas e OSCs possuem dinâmicas bastante dife- aumentando a eficácia do programa, dada a sinergia rentes, o que pode levar à desconfiança e à geração na mudança na forma de trabalho. É preciso invesde conflitos. Assim, a construção de articulações e si- tir na ampliação do processo de intersetorialidade, nergias para o desenvolvimento é, ao mesmo tempo, criando fóruns e instâncias que aproximem os três necessária e complexa. O resultado das iniciativas setores, vencendo as desconfianças e aumentando a em um processo de interação entre diferentes ato- efetividade dos recursos investidos. res sofre influência direta das configurações próprias De outra sorte, já são percebidos parceiros financiade cada um deles, donde se conclui que conhecer dores que se aproximam de projetos, fazendo reunitais características é primordial para o planejamen- ões de articulação e acompanhando resultados, num to de projetos de desenvolvimento, pois cada qual esforço que pode estar no bojo do processo de colatem áreas de atuação diferentes e diferentes visões de boração. Num passo subsequente, uma empresa que mundo, inerentes aos papeis que desempenha. apoie um projeto e passe a aproximar as ações sociais Em espanhol, ‘parceria’ se traduz como ‘aliança’. Em que realiza e partilhar o conhecimento adquirido talportuguês, os dois termos expressam significados di- vez esteja começando a partilhar os valores e missões ferentes, não só no idioma como na prática cotidia- institucionais. 31 GSI – Global Social Impact, Sustentabilidade Organizacional, Ideias e Propostas Contudo, é importante ter em mente que sempre que há repasse de recursos, aumenta o risco da dependência entre parceiros. Quantos bons projetos pararam, por contar com um único financiador que tenha mudado os rumos de seus recursos. Boas parcerias devem gerar autonomia. Por outro lado, as dificuldades aparecem tanto nas empresas como nas ONGs e no setor público, embora isso não seja costumeiramente exibido entre parceiros – o que tem influência direta sobre a confiança. A confiança pode ser abalada diante de qualquer sintoma de falta de transparência, de respeito à identidade e vontade do outro. O medo de perder a parceria está sempre no lado mais fraco, em geral daquele que recebe recursos; às vezes, a empresa ou financiador se serve desse medo para impor suas vontades e usa as parcerias para cumprir interesses próprios. Complexo e essencial é aprender a lidar com essas dificuldades, buscando entendê-las e solucioná-las. Mesmo com o risco de gerar dependência em parceiros mais fracos, a interdependência entre sistemas, pessoas e organizações é crucial para o equilíbrio, extrapolando as discussões sobre redes sociais e assumindo os essenciais contornos de organicidade. Conceitualmente, a parceria é uma relação entre iguais, sem cobrados ou cobradores. Contudo, na prática, não existe uma cultura efetiva de gestão democrática participativa, com igual importância para os atores. É necessário aperfeiçoar a construção das políticas públicas e desenvolver gestores com visão mais democrática e participativa – sociedade e poder público precisam avançar nesse sentido. Outro ponto importante é o das legislações para públicos específicos, como a Lei do Aprendiz para jovens e a cota para pessoas com deficiência, as quais criam uma "reserva de mercado" para esses públicos e para ações sociais – por serem obrigações, "engessam" a ação social de um grande número de empresas. Isso deixa uma dúvida quanto à possibilidade de provocarem o desenvolvimento de parcerias intersetoriais. efetiva divulgação dessa informação? Sabidamente é preciso garantir o acesso à informação, encontrando formas de incluir grupos vulneráveis ou isolados geograficamente. Mas como? Os setores público, privado e da sociedade civil organizada têm competências distintas e podem ampliar o alcance de seus esforços, ao fortalecerem as parcerias intersetoriais. Para fazer frente aos complexos desafios que se impõem, a construção de um plano de ação articulado contribui para resultados mais efetivos para a comunidade. Para esse fim, a abertura ao diálogo e a comunicação são fatores críticos que viabilizam a ampliação e solidificação desses arranjos organizacionais, ao mesmo tempo em que minimizam a possibilidade de duplicação de esforços. É crucial a figura do mediador – seja ele empresa, governo ou ONG – centralizando a informação, engajando todos os stakeholders e garantindo o acesso homogêneo a essa informação. Benefício Mútuo O benefício mútuo em uma parceria tem envolvido cada vez mais o compartilhamento de conhecimento e de metodologias, inclusive entre instituições financiadoras. Talvez a maior contribuição dos grandes institutos e fundações empresariais para o impacto social esteja em sua capacidade estrutural de unir tecnologia e conhecimento especializado. O importante é o desenvolvimento da confiança, somente possível pela troca de conhecimentos e a proximidade entre as partes. Reuniões de acompanhamento de projetos passam a ser chamadas reuniões de direcionamento, abrindo espaço para todos aportarem suas práticas e conhecimentos. A Intersetorialidade abrange o maior número possível de áreas e setores sociais para a resolução de questões, o que impõe uma mudança grande nos processos: deixa-se de pensar em partes e benefícios para pensar em conjunto e nos efeitos das ações. As parcerias qualificadas como intersetoriais devem colocar a questão ‘como podemos trabalhar em conjunto?’ Também convidam a pensar sobre fatores como o significado de ‘benefício mútuo’ e quais são os resultados que beneficiam cada um dos envolvidos e E quem é o mediador? a própria sociedade. É tempo de refletir, inclusive, Nas parcerias, quem é o mediador? Empresa, gover- sobre o papel de cada setor e de cada área em cada no ou ONG/Sociedade Civil Organizada? Quem setor (saúde, educação, economia). vai centralizar as informações e, de uma maneira deDe qualquer modo e essencialmente, a transformamocrática, engajar todos os stakeholders e garantir a ção social e a mudança da realidade não devem se 32 Relatório GSI JAM 2011 restringir ao centro de elucubrações semânticas – seriam elas parcerias intersetoriais, alianças estratégicas, benefício mútuo e/ou recíproco? Tudo se resume a exercitar uma metodologia de atuação em comunhão (comum + união), mediante definições e delegações de papéis e tarefas, de modo que cada ator transite de forma pertinente e conforme suas potencialidades, cada qual fazendo uso de sensibilidade operacional, lucidez estratégica e capacidade de agregar e aperfeiçoar recursos e possibilidades em função daquelas mesmas transformação social e mudança da realidade. As políticas públicas são – ou deveriam ser – participativas, democráticas e construídas a partir de negociações diretas e transparentes entre todos os atores e protagonistas do processo. Mas para isso, é necessário promover maior e mais frequente capacitação dos atores, viabilizando a interação e a integração dos recursos. Embora a finalidade central da ação seja uma questão bastante debatida, para que surja a tal parceria com benefício mútuo, o marketing não pode ser o produto principal, e sim o impacto social. Parece pueril, mas é necessário refletir sobre a expectativa de ‘ganho’ de cada parceiro, pois as ações sociais costumam ter pouco poder de comunicação. Até por isso, uma questão resiste: Que benefício mútuo pode ser esse? Será que vale a pena trabalhar com os valores institucionais? Será que o que a empresa defende é o mesmo que a organização não governamental defende? Mas obtendo resposta positiva ou negativa, vale a pena criar mecanismos que convidem ambos a pensarem em meios de juntar forças. Papeis Pode-se entender a empresa e sua função de criar produtos e serviços para atender demandas, gerando riqueza. Neste contexto, o que cabe ao Estado é a regulação do mercado, enquanto o controle social é função das organizações da sociedade civil, estabelecendo padrões, formando grupos de pressão e de monitoramento para fazer com que a riqueza gerada na empresa seja compartilhada. tratégicas baseadas nessas competências específicas. Muitas vezes, a função essencial das organizações pode ser antagônica e isso ganha volume quando se pensa em empresas e ONGs. Preservando missões e objetivos, a imagem que uma e outra detêm e projetam pode ser revista. Pela compreensão mais profunda de Responsabilidade Social e pelo fortalecimento do diálogo, da transparência, da comunicação, do engajamento de stakeholders etc., pode-se chegar a um caminho coerente para a construção de parcerias de longo prazo. Quando se pensa em todas as possibilidades de compartilhamento de conhecimento e metodologias, de envolvimento de todos os setores nas demandas sociais, na imprescindível participação das empresas, antes que grupos comecem a se mobilizar em frente aos portões das fábricas, é importante outra reflexão sobre as competências essenciais. Embora as parcerias sejam indispensáveis para a superação de grandes questões do mundo de hoje e a sociedade tenha evoluído muito dentro do chamado terceiro setor, esse conjunto de ações não pode eximir o Estado de sua missão e propósito. O cumprimento da função essencial da empresa, oferecendo serviços adequados a preços justos, garantindo empregos e pagando impostos ainda precede o envolvimento em projetos sociais e a cegueira diante de prejuízos causados por suas ações. É indispensável seu compromisso com o consumidor, demais stakeholders e com a própria ética empresarial. Durante o JAM, cogitou-se a implantação de ações nos moldes do Sistema S: uma contribuição compulsória por empresas de determinado segmento produtivo que tirasse a ênfase das marcas corporativas e pusesse foco exclusivo na qualidade dos serviços prestados à comunidade, mas isso equivaleria a criar mais um imposto sem ter controle sobre a eficiência e eficácia dos resultados, pois ações como essas, de representatividade de setor com recursos de terceiros, exigem extrema competência e seriedade institucional. Por outro lado, estando inseridas nas comunidades, as organizações percebem / solucionam as demandas com mais presteza – é mais importante a criação de redes de organizações, propondo e executando ações específicas para cada região e agrupamento humano. Ademais, a divulgação das marcas e empresas que apoiam iniciativas continua sendo uma forma de incentivo ao envolvimento. Há quem afirme que, para uma parceria sustentável e que crie impacto com potencial de escala, as contribuições devem ser alinhadas com a função essencial de cada organização, fazendo uso de suas principais competências. Contudo, em grande medida, Quanto aos objetivos dos parceiros, é importante isso ainda não acontece. Algo precisa mudar, mesmo buscar alinhamento entre eles. Muitas vezes, o Seque em longo prazo, para que surjam parcerias es33 GSI – Global Social Impact, Sustentabilidade Organizacional, Ideias e Propostas gundo setor acusa o Primeiro de ineficiente e/ou ausente no que se refere às ações sociais, enquanto que a percepção do Terceiro setor é que o Segundo é burocrático e insensível às causas sociais, mesmo admitindo que é onde estão os recursos para seus projetos. De sua parte, a velocidade de resposta dos governos é mundialmente menor que a dos outros dois setores, pois os processos decisórios têm regras específicas a obedecer – mas é ali que se definem políticas e regulamentos para que parcerias entre empresas e sociedade civil organizada possam se desenvolver, lembrando que é pela interação constante entre estes dois últimos que os projetos e programas tomam corpo. em sua área de atuação, de modo a criar ou potencializar tais tecnologias sociais. É importante observar que esse tipo de relacionamento não envolve a alocação direta de recursos financeiros, além de ser bastante eficiente. O Software Livre fornece exemplos de união entre voluntários e grandes empresas, gerando soluções abertas que competem de igual para igual com soluções proprietárias. Esse modelo pode ser seguido em outras áreas para resolver problemas sociais, muito além do software de um escritório. Uma das tarefas do Terceiro setor é procurar envolver parceiros e prospects do Segundo setor quando eles se mostram insensíveis, e um dos recursos para esse fim é ‘falar a linguagem da empresa’: plano de negócio, resultados esperados, impacto social, indicadores etc. Por outro lado, devem ser respeitadas as empresas que não estão em momento propício para o desenvolvimento de projetos sociais, por exemplo, com questões de recursos humanos a solucionar antes de se abrir para a comunidade. Por vezes, o setor privado é visto apenas como financiador de projetos, embora também tenha características de grande mobilizador. No Brasil, há empresas com mais de 10.000 funcionários, aglutinando grupos maiores do que a população de pequenos municípios, com elevado potencial de ações voluntárias, com equipes qualificadas e prontas para colaborar No processo de ampliação do impacto, universidacom causas sociais. É necessário que se construa a des e centro acadêmicos podem se tornar parceiros, interação, respeitando as características de cada setor reconhecendo, validando e ampliando o conhecie buscando sinergias. mento acadêmico para além dos muros do campus; Mas como é possível fortalecer essa iniciativa? Como buscando contato com instituições sociais e incenuma empresa pode entender o processo de colabo- tivando ali a aplicação dos conhecimentos gerados. ração na construção e estrutura de uma tecnologia De qualquer modo, só o governo tem poder de essocial com perspectiva de ampliação pelo governo, cala, enquanto as empresas e ONGs têm forte poder em políticas públicas? Dois conceitos úteis para resde inovação para resolução de problemas sociais – ponder a estas perguntas são o Copyleft e as Tecnopráticas muitas vezes estudadas e formatadas como logias Sociais. tecnologias sociais. Como dar força a isso? Como O Copyleft é um jogo de palavras em oposição ao uma empresa pode entender o processo de colaboCopyright (a proteção dos direitos autorais). Busca ração na construção e estrutura de uma Tecnologia retirar barreiras à utilização, difusão e modificação, social com perspectiva de ser aplicada pelo governo por exemplo, de um software, tornando livre sua al- em políticas públicas? teração ou extensão e passando adiante a liberdade E fica uma reflexão acerca da sensibilidade no conde copiá-lo e modificá-lo novamente. Uma das ratato entre o segundo e terceiro setores: até que ponzões mais fortes para os autores e criadores aplicato as empresas estão preparadas para compreender a rem copyleft aos seus trabalhos é porque esperam complexidade de alguns eixos de atuação das organicriar condições favoráveis para que mais pessoas poszações sociais – tais como controle social, sistematisam contribuir com melhoramentos e alterações. zação do conhecimento e advocacy? As instituições da sociedade civil conhecem bem os Onde entra a sustentabilidade? problemas locais e, ao desenvolverem soluções, precisam formatá-las sob a forma de tecnologia social e Observando a atuação corporativa, será que a filanpermitir a sua livre utilização/modificação por ou- tropia estratégica é um passo que precede a sustentatras organizações para que surtam o efeito necessário bilidade? Do que precisa uma instituição para atuar em toda a sociedade. Do mesmo modo, as empresas com a abordagem da sustentabilidade? podem contribuir com seu know-how em gestão ou Ademais, a sustentabilidade vai se inserir na gestão 34 Relatório GSI JAM 2011 dos negócios nos próximos 5 a 10 anos, mas a forma de relacionamento sustentável com a população vizinha ainda é uma incógnita, assim como as possibilidades de contribuição das parcerias intersetoriais nesse sentido. A concepção de sustentabilidade parte da visão sistêmica e complexa de mundo e compreende o conjunto de interrelações que sustentam a cadeia de todas as formas de vida, num equilíbrio dinâmico. Relacionar-se com o ambiente em sua totalidade significa, portanto, considerar todos os elementos que afetam e são afetados reciprocamente pela ação humana. Desse modo, a sustentabilidade deve ser entendida em várias dimensões, extrapolando as questões ecológicas – diz respeito também à visão de mundo que permeia as dimensões socioculturais, políticas e econômicas. Experiências compartilhadas durante o painel ESPRO: em busca de compreender e vivenciar o que chamado “benefício mútuo” nas parcerias, o Espro, assim como outras organizações, entendeu a demanda das empresas e optou por buscar o aprimoramento de sua capacidade de gestão, profissionalizando processos, pessoas e serviços prestados. Nesse esforço, passou a adotar inclusive ferramentas de gestão típicas do Segundo Setor, como política de qualidade e certificações. Portanto, quanto maior a credibilidade da organização, maior a disposição da empresa em manter e intensificar sua parceria e menor o risco. Experiências como essa têm resultado em maior impacto social e custos otimizados. Contudo, para alcançar bons resultados, os objetivos em comum entre ONGs e empresas devem estar claramente delineados e alinhados com a missão da cada um dos parceiros. ACAM: Associação de apoio a pacientes com fibrose cística. Há alguns anos, a instituição se preocupa com a forma de organização de seu trabalho. Recebeu uma consultoria para criar processos e hoje conta com metas e objetivos a serem atingidos no mês e no ano. Como conseguir espaço para parcerias para uma doença tão pouco conhecida? Como explicar gastos quando trata da relação vida x morte? E relatou a seguinte experiência: um complexo hospitalar infantil em Curitiba uniu a instituição e sua equipe técnica na elaboração de conteúdo sobre a fibrose cística, desenvolvendo manuais, flyers etc. para labo- ratórios (patrocinadores), a rede pública de educação e a rede de colégios particulares. Nesse projeto, os eventos realizados chegaram a reunir mais de 2.000 pessoas, entre professores e famílias, conscientizando sobre a necessidade do diagnóstico precoce e as formas de tratamento, expondo inclusive questões relacionadas às necessidades específicas, possíveis constrangimentos, entre outros, com a participação de profissionais de várias áreas médicas e relatos de pais de crianças com fibrose. A iniciativa teve grande repercussão na mídia e mobilizou a comunidade em torno da questão. Grupo Sempre Vita: ONG criada em 2009 para reunir e apoiar pacientes com necessidade de terapia nutricional clínica. Difusão de informação, fomento a estudos e contribuição na garantia de acesso igualitário à terapia nutricional. Nesse pouco tempo de existência, aliado a falta de disseminação da informação, a organização tem encontrado dificuldades na construção de parcerias. Solicita a indicação de materiais com subsídios para uma gestão efetiva e indicadores de qualidade para que possa demonstrar o benefício social que trará um paciente nutrido adequadamente para fazer frente ao seu tratamento. NUCAPE: O Brasil investe 10% do PIB em segurança pública e privada. Apesar disso, os índices de violência e criminalidade na década não diminuíram e, em muitos casos, elevaram-se. Se esses imensos recursos tivessem sido aplicados no fortalecimento da família, na educação pública de qualidade, na criação de oportunidades de trabalho e geração de emprego para a juventude e no combate às desigualdades sociais, a realidade atual seria bem diferente. Para atenuar os índices de criminalidade e reduzir a violência no município de Varginha-MG, foi criado o NUCAPE – Núcleo de Estudos e Ações para a Paz – fruto da parceria entre lideranças da sociedade civil, coordenadores de pastorais Diocesanas, membros do Poder Judiciário e instituições de ensino superior. A ferramenta operacional do NUCAPE é a ULCP (Universidade Livre para a Cultura da Paz), proposta de atuação transformadora pela construção de uma cultura de não-violência, implantação da justiça restaurativa e o estabelecimento dos fundamentos para a construção de uma cidade justa, equânime, pacífica e solidária, na qual as pessoas possam usufruir uma qualidade de vida digna, satisfatória e condizente com a dignidade do ser humano, sem violência e sem conflitos traumáticos. 35 GSI – Global Social Impact, Sustentabilidade Organizacional, Ideias e Propostas Instituto EDP: Todo investimento é realizado via Seleção Pública de Projetos. Dentre os vários critérios, destaca-se a necessidade de apresentar parcerias intersetoriais, tanto para incentivar a troca de experiências dos setores quanto para a maior disseminação da causa ou negócio. O resultado é maior mobilização de atores sociais, com vistas à sustentabilidade da organização. Vale salientar, ainda, a inclusão dos colaboradores EDP nos projetos apoiados e desenvolvidos pelo Grupo. em conjunto com empresas, ONGs, universidades e instituições sociais de diferentes perfis. Um exemplo é o projeto A Cor da Cultura, de apoio à implementação da lei que introduziu o ensino de conteúdos sobre a história e cultura afro-brasileira. Essa é uma iniciativa que reúne parceiros como o MEC, a TV Globo, a Petrobras, a Secretaria de Igualdade racial, secretarias municipais e estaduais de educação e mais de 50 ONGs e universidades. Trata-se de um projeto único no mundo, que envolve a produção de programas de TV, kits educativos e capacitação de professores na maioria dos estados brasileiros. Uma rede tão complexa de parcerias intersetores só possível graças à construção de um modelo de gestão que incorpora diálogo, transparência e, sobretudo, foco naquilo que os une e não naquilo que eventualmente os separe. Uma das principais aprendizagens desse processo é a capacidade de mediar conflitos, uma competência vital para a sobrevivência das parcerias. Essa competência engloba o grande desafio a ser enfrentado por quem quer parcerias efetivas. Daí a necessidade de um acordo político entre parceiros, que estabeleça compromissos a cumprir e cobrar. Afinal, parcerias tratam de compartilhamento de poderes e saberes. Projeto Papel de Gente: O tema parceria se tornou central em suas ações, pois perceberam sua abrangência para além de isenções, marketing e até mesmo o valor social daquilo que produzem. A partir de uma ação junto a pessoas portadoras de transtorno psíquico – psicose e neurose grave – associada a uma proposta de fortalecimento da cultura da sustentabilidade, acabaram por entender que o trabalho que realizam é numa versão agravada da realidade dos centros urbanos onde a qualidade de vida estaria perigosamente comprometida apesar das decantadas vantagens das "cidades grandes". Esta visão possibilitou a eles uma compreensão de seu estratégico lugar social, para além da clientela que se dispõem atender. O que as ONGs produzem são novos valores para recortes sociais/culturais, inseridos num Participaram da criação deste tópico contexto macro também ávido por novos encaminhamentos de suas questões como, por exemplo, os Alcely Barroso, Bruno Andreoni, Christin Hokensprogramas de gestão que hoje fazem parte da realida- tad, Cibele Esteves, Danilo Santos de Miranda, Denise Tubino, Eliana Tiezzi, Elidia Novaes, Francisco de empresarial e procuram introduzir valores. Moura, Gilson Campos, Janete Hung, José RicarCanal FUTURA: Segundo Elinor Ostrom, ganha- do Franco Montoro, Lilian Juliana Kuwano Buhrer, dora do Nobel de economia em 2010, a base de uma Lucia Maria Araujo, Luiz Bruno Vianna, Marinus cooperação bem sucedida entre diferentes atores so- Jan Van Der Molen, Mario Costa, Paulo Alves, Pauciais (dos três setores) está no binômio confiança e lo Ramicelli, Pericles Mattar, Roberta Guarino, Thecomunicação. O problema é que, enquanto o mun- reza Lobo e Tiago Biusse Ghion. do está cheio de problemas, nós ainda funcionamos em departamentos, ou seja, cada um dentro de sua “caixinha”. Nesse sentido, o Canal Futura configura um exemplo prático de como as parcerias podem ser essenciais para abordar os principais desafios de uma agenda estratégica de desenvolvimento. Sendo um projeto social de comunicação, voltado para apoiar e acelerar processos de transformação de indivíduos e da sociedade, cuja ação transcende a tela da TV, todas as suas ações resultam de relacionamentos construídos com os vários setores da sociedade. Mantido por doze parceiros (do Segundo e Terceiro setores) há 13 anos, o Futura desenvolve projetos nas áreas de educação, saúde, direitos humanos, cultura – tudo 36 Relatório GSI JAM 2011 A EMPRESA SOCIAL COMO ALTERNATIVA DE SUSTENTABILIDADE também é fundamental para que a missão continue sendo o norte, tanto dos projetos sociais como da empresa social. Isso se torna mais complexo quando a atividade empresarial não está diretamente vinculada à atividade social. ganização de treinamento e terceirização de software e serviços – diz que esta abordagem pode ajudar a delinear um novo formato na sociedade. • Apresenta riscos intrínsecos – qualquer atividade empresarial é vulnerável a condições econômicas, flutuações do mercado A participação dos trabalhadores nos lucros não significa que a empresa tenha foco social. Um exemplo é a legislação da informática, que exige pesquisa & desenvolvimento e participação nos lucros das empresas produtoras para que tenham vantagens fiscais – tais empresas deste segmento em geral não têm foco social. • Se não for bem administrada, pode colocar em risco a reputação da organização social e sua integridade financeira. Ainda é preciso reforçar conceitos sobre esta alternativa empresarial, principalmente junto às pequenas e microempresas. Uma ação de informação, divulgação e eventualmente capacitação pode ajudar a criar Caracterização uma força social mais relevante pela distribuição desHá vários entendimentos do que seria uma empresa tas empresas na maioria dos municípios do país. social. Yunus defende que essa entidade deve focar As "empresas sociais” abordam os principais temas uma demanda socioambiental e atendê-la de forma sociais e ambientais do mundo? Eles estão levantaneconomicamente viável. Alguns costumam confun- do as comunidades carentes e capacitando-as a terem di-la com a teoria de Prahalad, da riqueza na base da mais qualidade de vida? Além do componente da pirâmide, na qual o autor defende que as populações inovação, o que seria interessante considerar quando pobres têm poder de consumo e que as empresas po- você administra uma Empresa Social? O que assegudem adaptar seus produtos e serviços para "explorar" raria sustentabilidade? É possível ter equilíbrio entre esse mercado. As empresas sociais devem ser uma lucratividade e impacto social? ferramenta de combate à pobreza em larga escala. Há riscos e benefícios neste formato com empresa Parcerias intersetoriais muitas vezes traduzem um social. Aquelas que empreendem um negócio social importante trabalho de gerenciamento de interes- como fonte de recursos, conhecimento e experiência ses e expectativas das partes, o que pode dificultar costumam se fortalecer. Contudo, há riscos e esse caa maximização de uso dos recursos e a busca por re- minho não é recomendado para todas. Por exemplo: sultados. Como a empresa social produz seu lucro e reinveste em si própria, é responsável pela decisão • Não é indicada para quem esteja em cridas reais prioridades, buscando ampliação em escala se financeira, pois requer certo nível de estabilidade financeira e experiência e melhoria de qualidade de atuação. Mais do que foco na pobreza, o foco na qualificação • Não gera “dinheiro rápido” – é uma ese na educação em empreendimentos sociais pode tratégia de longo prazo e pode levar altrazer mais resultados. A experiência da Altis – or- guns anos para dar retorno financeiro • Não há receita – o autofinanciamento é específico para capacidades, experiências, missão e abrangência de cada um • Pode gerar conflitos internos – dilemas e É essencial articular a missão social, mantê-la como conflitos podem vir à tona no processo de elafoco desde o princípio da atividade. Para isso é im- boração e implementação da empresa social portante uma preparação organizacional, uma reflexão inicial feita pela equipe sobre a organização naquele momento, sua gestão e os recursos de que ela Algumas organizações sociais do Terceiro setor tridispõe para começar o empreendimento. Planejar lham este caminho para se tornarem empresas so- 37 GSI – Global Social Impact, Sustentabilidade Organizacional, Ideias e Propostas ciais. Será que o inverso é possível? Como uma empresa que visa lucros mudar para o modelo de empresa social, ou será essa apenas uma forma de mascarar o interesse puramente financeiro em um novo mercado a ser explorado? Algo nesse sentido vem ocorrendo com o Yazigi – Escola de inglês. Tinha foco lucrativo e, cada vez mais entrando na área das comunidades indígenas com suporte à comercialização de seus produtos e na educação de carentes, vai transformando seu core business nestas outras atividades. Como sempre existe interesse econômico, há excelentes alternativas na área de reciclagem, mas com baixa rentabilidade, por questões como burocracia fiscal, desconhecimento da lei pelos agentes de fiscalização etc. É necessário um arcabouço legal mais abrangente, onde a empresa social tenha vantagens estruturais de que hoje não dispõe. Há uma diferença entre organizações sociais que criam empresas lucrativas para compor suas fontes de receitas e aquelas que transformam sua missão num serviço social pago pelo mercado. São dimensões diferentes embora com o mesmo objetivo de se tornarem auto-sustentáveis financeiramente. No primeiro caso, trata-se de uma OSC criando uma fábrica de panelas, por exemplo, para gerar receitas. No segundo caso, trata-se das formas de transformar a ação social num ponto de convergência com as dimensões de um serviço ao mercado – nesse caso, a missão social é cumprida no formato de uma empresa social. Há uma mistura grande de conceitos e até mesmo a tentativa de excluir um ou outro modelo, embora devessem ser complementares, cada qual com sua missão. A empresa social é uma empresa com fins lucrativos que se pauta em questões sociais em sua estruturação – por exemplo, que garante a qualidade de vida e inclusão social de seus funcionários, adota políticas de utilização de energias limpas, organiza a rede de fornecedores de forma a garantir que eles compartilhem valores. É o caso da Feira Negra, apoiada pela Artemísia, que promove a venda de materiais criados e desenvolvidos pela comunidade, cuidando para que as pessoas sejam incluídas em todo o processo, conseguindo unir o social e o econômico de forma harmoniosa. Quanto à contribuição da Web 2.0 e das redes sociais (Facebook, Twitter, etc.) para a sustentabilidade das empresas sociais, é fácil perceber que o impacto das redes sociais é indiscutível. Este próprio JAM é um bom exemplo. A busca por conteúdo de qualidade com debatedores de alto nível mostrou que existe demanda pelo uso da tecnologia como ferramenta de debate. O setor precisa de mais mecanismos de interação. Nessa linha de raciocínio, uma empresa social pode usar as redes para divulgar seus produtos e serviços e com isso ganhar novos "clientes" ou "adeptos". A empresa social, porém, deve encarar essa atividade como ação estratégica. Toda a sua comunicação deve estar alinhada com o objetivo da empresa social. O foco na comunicação pode ser um caminho. As redes estão trazendo algo desejável para qualquer tipo de relação: transparência. Infelizmente, não é incomum haver termos como sustentabilidade, ação social, qualidade de vida etc., sendo usados pelas empresas em suas comunicações internas e externas, sem que se transformem em ações efetivas. Além da falta de transparência, este tipo de atitude prejudica Um exemplo é uma pizzaria de Seattle que reverte aqueles que acreditam nestas causas, pois lhes tira a todo o seu lucro para uma ação social: um negócio credibilidade. lucrativo como outro qualquer, mas com a missão de apoiar uma organização sem fins de lucro, a qual Gestão teria dificuldades em se manter. Mais do que a inovação, a sustentabilidade é o foco; Ter o foco na filantropia acima de qualquer outra o que se busca é fazer com que o negócio social concoisa. Uma empresa social não pode seguir na mes- siga uma base de sustento, especialmente se o moma rota que uma empresa privada comum, cujo delo puder ser replicado no futuro. A grande dififoco está sempre na lucratividade. Uma empresa so- culdade ainda está na sustentabilidade e no impacto cial tem como objetivo oferecer melhor qualidade de social gerado. Os investidores querem saber o "retorvida para o meio onde atua como consequência de no do investimento" – não somente financeiro, mas suas ações. Os benefícios para a comunidade serão com quanto, de fato, as empresas sociais contribuem muito superiores àqueles que as empresas privadas para proporcionar mudanças para as comunidades efetuam com suas ações de responsabilidade social. de baixa renda. 38 Relatório GSI JAM 2011 A questão de métricas e indicadores quanti e qualitativos no setor é outro ponto que precisa ser discutido. A organização deve considerar grupos de indicadores desenhados por ela e acompanhados no dia a dia, o que é um desafio. nessas questões jurídicas e tributárias. Ademais, é necessária união do setor para influenciar na revisão do marco legal. A forma legal ‘empresa social’ não existe – ou é empresa ou algum tipo de organização sem fins lucrativos. De qualquer forma, quando se trata de "ONG" que inicia negócio social, a comercialização de produto ou serviço é permitida, desde que todo o lucro seja comprovadamente reinvestido na causa social. A organização paga imposto sobre circulação de mercadoria e permanece isenta do pagamento de imposto de renda. Cada vez mais empresas envolvem seus funcionários no suporte a negócios sociais que estejam começando ou em desenvolvimento. Esses profissionais oferecem apoio em suas áreas de expertise, trabalhando junto à equipe da organização ou da pequena empresa. Com o envolvimento no negócio, essas empresas maiores podem passar a oferecer outro tipo de apoio, É importante contar com o suporte de advogados como doações, acesso à rede de contatos etc. e contadores com experiência no setor, ao longo de Qual é a porcentagem de empresas sociais com es- todo o processo. Por exemplo, o site lançado pela trutura de sustentabilidade que lhes garanta trabalho Thompson Reuters conecta organizações a advogaem longo prazo? Temos visto projetos que florescem dos que fazem trabalho pro bono: http://www.trust. sem ter um modelo sustentável (para comunidades, org/trustlaw/. para eles próprios e investidores). O que é crucial A questão das organizações com fins sociais se impara a empresa social ser bem-sucedida em longo põe. A estruturação deste setor sob o novo marco prazo – depois de ter recebido treinamentos, apoio legal de resíduos sólidos vai demandar um número e mentoring de empreendedores corporativos etc.? expressivo destas empresas para lidar com a questão Como ter sucesso em questões de sustentabilidade do lixo eletrônico – e-waste no Brasil. A nova regulaa ponto de conseguir replicar, ampliar e promover mentação do setor de resíduos sólidos desafia todos impacto contínuo? os setores – do produtor da matéria prima ao consuUma Fundação de Assistência Social tem que seguir midor final – a entender e agir em relação à destinaas normativas pertinentes da legislação brasileira, co- ção correta dos resíduos. Será necessária uma grande nhecidas como LOAS – Lei Orgânica de Assistência articulação para alcançar as metas da lei. Social. Até hoje, a LOAS não é clara quanto à legaliApós contribuir com diversas ações ligadas ao tema dade de operação de uma empresa social. O artigo 25 da reciclagem, seja no apoio a cooperativas, seja na dessa legislação trata dos "projetos de enfrentameneducação ambiental em escolas, a Fundação Orsa to da pobreza..." que podem validar uma ação nesse percebeu que eram necessárias novas ferramentas sentido. Vale salientar que a Fundação Orsa encara a de interação com o setor para atingir os objetivos. empresa social como uma ferramenta econômica de Criou um plano de negócio para uma Empresa Socombate à pobreza, sem a intenção de utilizar esse cial de Reciclagem, que mostrou viabilidade econômecanismo para financiar suas operações, o que não mica e socioambiental. Na análise da cadeia de valor, significa que a instituição seja contrária a esse objetiobservou-se a importância de todos os elos para invo, apenas que não é seu foco. crementar o índice de reciclagem em grandes cidaHá também as questões relacionadas às exigências des. Ocorre que as assimetrias existentes no poder de registro de movimentação financeira por venda favorecem a relação de exploração entre os particide mercadorias. Além dos diferentes entendimentos pantes – no caso da reciclagem, isso impõe pressão sobre o conceito de empresa social, a legislação brasi- nos catadores individuais ou organizados em coopeleira não é clara quanto a processos, operação, tribu- rativas. tação. Se funciona como empresa, tem tributação x; A operação de negócios da OSC é uma "empresa se é ONG mas atua como "empresa", sua tributação social" ou somente uma empresa com fins lucratié y – as empresas consideram desleal essa configuvos atendendo clientes de baixa renda ou oferecendo ração, principalmente quando se trata de produtos produtos de impacto social? E as Casas Bahia? de comunidades de baixa renda entrando na cadeia produtiva de valor. O Brasil tem muito a avançar Quando as coisas vão bem, sempre dá para dizer que 39 GSI – Global Social Impact, Sustentabilidade Organizacional, Ideias e Propostas estamos fazendo as duas coisas, mas quando as coisas vão mal, os recursos escasseiam e uma decisão tem que ser tomada, a intenção original vai dizer para onde a balança pende: para o social ou para os lucros... A legislação brasileira não incentiva a criação de negócios sociais. Não existe nenhum tratamento diferenciado sob o ponto de vista tributário ou societário. Por outro lado, costuma dificultar os negócios, não só para as empresas sociais, mas também para empresas do primeiro setor e até do Governo. A forte burocracia, a falta de automação e as leis até conflitantes geram demanda de pessoal e controles que pesam sobre as operações de qualquer tipo de empresa. É premente a necessidade de organização das empresas sociais, em busca de apoio do legislativo para provocar mudanças na legislação. É válido o modelo criado para ter impacto social e que utiliza mecanismos de mercado/negócios para esse fim. Se a iniciativa foi estabelecida como organização social, é mais fácil visualizar a intenção; afinal de contas, não pode distribuir lucro. Se foi estruturada como empresa, deve-se procurar entender como os benefícios estão distribuídos na cadeia de valor (fornecedores, empregados, clientes e acionistas). E Negócios Sociais e o Terceiro Setor embora a regulamentação seja fundamental para garantir que este tipo de iniciativa comece com deter- Lançar uma empresa social não é uma boa estratégia minado propósito e se mantenha fiel a ele, é sabido para todas as organizações; por exemplo, aquelas que estão passando por uma crise financeira. Há que se que a realidade anda mais rápido que a lei. observar também que os negócios não precisam ser Essa discussão de modelo jurídico para empresa so- necessariamente vinculados a uma ONG. cial é sempre importante. Recentemente, a reflexão feita por um Grupo de Estudos culminou com a A unidade de negócio ou empresa social nem sempre construção de um modelo jurídico genérico de con- será solução para tudo. Deve convergir com o propótrato social para Empresas Sociais. Após vários en- sito da organização, seu momento e muito preparo. contros, o grupo optou por adotar um modelo de Há mitos relacionados ao negócio social empreenLtda. que julgou ser aplicável a muitas dessas em- dido por organizações sem fins lucrativos. Além da presas. No entanto, considerando que se trata de um ideia de que a missão social forçosamente perde o "setor" ainda em construção e que abrange inúmeras foco ao iniciar alguma ação nesse sentido, diz-se possibilidades de formas de atuação, talvez o modelo também que "as atividades empresariais praticadas jurídico mais adequado (Ltda., S.A., associação qua- pelas OSC não são legalmente permitidas"; "não lificada como OSCIP...) deva ser escolhido a partir podemos fazer... não sabemos como fazer negócios"; do caso concreto. Lembrando que há também a pos- e ainda "os beneficiários sentir-se-ão incomodados, sibilidade de se fazer um negócio social por meio de não gostarão da ideia". São preocupações / resistênduas organizações: por exemplo, uma empresa social cias que as organizações têm a ingressar neste novo ("estabelecida PARA ter impacto social e utilizando paradigma de empresa social. mecanismos de mercado/negócios") cuja principal acionista/quotista seja uma ONG com relevante É premente a necessidade de união e articulação das organizações, para buscar a regulamentação do Teratuação social e/ou ambiental. ceiro Setor e finalmente conseguir responder muitas Talvez devesse haver mais legisladores envolvidos dessas questões apresentadas. De fato, as próprias ornessa discussão. Sempre chega o assunto ONGs, fi- ganizações têm receio de iniciar atividades que tralantropia etc. E os negócios sociais acabam chegando gam retorno financeiro, temerosas de ser vistas de ao legislativo de maneira desvirtuada, quando che- forma desvirtuada pela sociedade e pelos investidogam. Uma sugestão é usar o relatório do JAM para res, muito embora a sustentabilidade seja o que vai envolver parlamentares e legisladores. garantir a ampliação dos programas e a continuidade Alguns anos atrás, uma empresa fez parceria com das ações. a FEBRABAN para criar cisternas em municípios da zona de pior IDH do Brasil. A ação incluía treinamento da população e capital inicial de todos os bancos associados. Foram dezenas de negócios feitos com as prefeituras locais. 40 A OSCIP é um modelo adotado no Brasil na abertura de uma organização social. Não começa como uma empresa, mas pode migrar quando estiver saudável. É uma qualificação concedida pelo Ministério da Justiça a determinadas entidades sem fins lucra- Relatório GSI JAM 2011 tivos (associações ou fundações). Não é concedida para qualquer outro tipo de pessoa jurídica. Uma das vantagens é possibilitar a remuneração dos dirigentes estatutários que atuem efetivamente na gestão executiva, sem que a entidade perca isenção de Imposto de Renda, mediante aprovação anual do Ministério da Justiça; além disso, ela pode receber recursos diretamente do governo. Deve ser auto-sustentável e, com essa equação, antes que possa migrar para organização com finalidade de lucro, pode começar e acelerar mais facilmente o processo de empresa social do que usando seus próprios recursos financeiros. A vantagem está na rapidez para atingir estabilidade e poder prestar serviços efetivos à comunidade. Inicialmente, o tema Empresa Social no cenário do Terceiro Setor foi discutido pela dificuldade de profissionalização das organizações sociais e de remuneração dos empreendedores sociais. A OSCIP é a única alternativa de remuneração da diretoria de uma organização, mas os empreendedores no Brasil não recebem vantagens competitivas para adotar este modelo de gestão: muitos editais têm limitado a participação de OSCIPs. Ademais, as isenções também são restritas nestes casos. A estratégia adotada tem sido a criação de negócio social ou empresa social, que não é um ente jurídico reconhecido. Por isto, o caminho é buscar a regulamentação (lei) deste modelo para torná-lo viável. • Melhoria da gestão e dos sistemas das OSC – consequência da disciplina financeira e administrativa requerida • Atração de novos doadores – bons olhos em relação aos esforços pela independência e sustentabilidade financeira • Maior conhecimento da organização por novos públicos – comunicação da empresa social • Ganho de confiança das lideranças da organização e maior comprometimento da diretoria e do conselho – percebem que podem gerar recursos para o trabalho social aplicando seus conhecimentos Há organizações que cumprem muito bem o trabalho social no modelo de OSC e devem permanecer assim. O apoio do Terceiro Setor ajudaria a fortalecer o modelo de empresa social para aqueles que tenham interesse, sem quebra de ideologia. Tem sentido pensar em incentivos especiais para a migração de ONGs, por exemplo, para empresas sociais. Uma boa forma de pensar avanços na legislação é olhar para as experiências de países em um patamar mais avançado na discussão. No entanto, não se sabe de países que prevejam incentivos fiscais específicos para empresas sociais. As L3Cs dos EUA e as CIC do Reino Unido, apesar de já estarem reO reinvestimento de 100% do lucro gerado, busgulamentadas, não trazem isenções fiscais especiais cando aumentar seu poder de impacto parece uma para essas empresas. solução para a sustentabilidade organizacional. Cada instituição é sua maior ‘patrocinadora’. Já há mais de Experiências compartilha60 mil delas só em Londres – a experiência inglesa é das durante o painel impressionante e pode ensinar muito. Mas será que a Empresa Social é a solução para a sustentabilidade NESsT: Há 14 anos, o NESsT apoia organizações ou o modelo pode causar algum tipo de segregação sociais em 10 países, no desenvolvimento de suas "empresas sociais", isso é, apoia suas iniciativas de no Terceiro Setor? oferta estruturada de serviços ou produtos ao merO planejamento e a preparação organizacional4 são cado, gerando recursos a serem reinvestidos na caufundamentais para o sucesso do empreendimento. sa social. Esse tem se mostrado um caminho efetivo Os benefícios, nesse caso, são: para diminuir a dependência em relação às doações e viabilizar investimentos em linhas que costumam • Fluxos mais estáveis de recursos – plaser rejeitadas pelos doadores, como os custos adminejamento e gestão facilitados nistrativos. O NESsT oferece oficinas e acompanha• Menor dependência dos doadores – dimento um-a-um para o início de negócios sociais ou versificação das fontes de financiamento para seu crescimento / expansão, por meio de pla• Recursos financeiros com menos restrinejamento (estudos e plano de negócios), incubação ções – possibilidade de investir no que for (workshops, apoio equipe NESsT e da rede de asmais importante para a organização sessoria) e expansão. Esse processo começa com um 41 GSI – Global Social Impact, Sustentabilidade Organizacional, Ideias e Propostas edital. Changemakers: O programa global Changemakers da Ashoka – uma comunidade global on-line – lançou um desafio colaborativo em parceria com a Artemísia: “Negócios para transformação social” http:// www.changemakers.com/socialbusiness. Alguns estão vinculados a ONGs, outros já nascem como empresas sociais. Ainda há muita confusão em relação ao conceito. Nesse site, é legal o documento ‘discovery framework’ – mapa de inovações com os desafios e os conceitos que as organizações/ empresas sociais trabalham para mudar paradigmas. Mas lá não há planejamento e formação de equipe. A Changemakers, da Ashoka, está conduzindo parcerias com universidades. Aimee Maron (Gerente de Mídia para os Mercados em português e em espanhol): [email protected]. Zigla: A Zigla faz workshops de capacitação principalmente avaliação/ monitoramento e medição de impacto, além de projetos de gestão estratégica de conhecimento. A recomendação para estruturação dos indicadores deve ser feita na fase inicial do projeto, desenhando em conjunto com membros da organização, de modo a criar 'senso de propriedade'. A Zigla faz o acompanhamento ao longo do projeto. Em alguns casos, ajuda no monitoramento também. O site http://ziglaconsultores.com traz uma publicação recente sobre a importância da avaliação/medição de impacto (http://bit.ly/hw40nl) Hoje a Zigla apoia apenas organizações sociais que querem empreender ou desenvolver seus negócios sociais para se tornarem menos dependentes de doações e gerirem seus recursos com mais autonomia. A partir do próximo ano, começa a trabalhar também com empresas sociais não vinculadas a organizações sociais (aquelas que já nascem como negócio, mas com fim social). SVPRI: Estabelecida em 2002, a Social Venture Partners Rhode Island surgiu através de líderes empresariais que desejavam promover uma mudança social sustentável. É uma parceria de filantropos engajados que contribuem com suas habilidades e recursos financeiros para ajudar organizações sem fins lucrativos a se estabelecerem e a criarem emprego e renda. Em resposta às necessidades da crescente comunidade de empreendimentos sociais, a SVPRI lançou o Social Enterprise Rhode Island (SERI), programa de construção comunitária, em 2009. Os programas 42 da SVPRI respondem ao crescente interesse das organizações sem fins lucrativos, líderes comunitários e universidades de todo o estado pelas empresas sociais. Através do programa SERI, a SVPRI construiu uma comunidade engajada de stakeholders com mais de 700 empresas sociais e agregou os 100 principais empreendimentos sociais do estado, os quais estão gerando centenas de oportunidades de capacitação e emprego, inclusive para indivíduos com significativas barreiras ao acesso a emprego. A instituição realiza pesquisas quantitativas e qualitativas para melhor entender e atender as necessidades do setor, produzindo resultados econômicos e sociais e averiguando impacto. Já apoiou o desenvolvimento de mais de 50 empreendimentos através do SVP-University que oferece consultoria gratuita por equipes de alunos para a realização de estudos de viabilidade e planos de negócio. Incuba oito novas empresas sociais através do piloto do Change Accelerator, uma incubadora com o envolvimento de mentores por períodos de oito semanas, alavancando competências de mais de 35 líderes empreendedores. Cria eficiência setorial através do patrocínio fiscal e da Change Place, incubadora que abriga empreendimentos sociais incipientes. Desenvolveu um mercado virtual e associa a campanha de marketing "Eu Compro Com o Coração", a fim de ampliar o poder de mercado do setor. Incentiva e facilita contratos entre grandes corporações e governos, e empreendimentos sociais. Já concedeu US$ 250,000 em grants e empréstimos a juros baixos e condições flexíveis para empreendimentos incipientes e intermediários. Finalmente, defende os interesses do setor, o que resulta em reconhecimento crescente dos empreendimentos sociais como estratégia séria de geração de emprego e de retenção de talentos. O empreendedorismo está criando empreendimentos sociais mais fortes e sustentáveis no estado de Rhode Island. Estão sendo reconhecidos como uma força econômica de desenvolvimento. A SVPRI trabalha com tamanha diversidade de iniciativas que é difícil dizer quão sustentáveis elas são. Muitos modelos sem fins lucrativos têm fortes componentes de desenvolvimento de mão-de-obra, i.e., estão treinando e criando empregos para as comunidades que eles atendem, seja junto a jovens desfavorecidos, ex-desabrigados, viciados... Então, mesmo que suas empresas sociais consigam obter lucro muito reduzido, ainda serão consideradas vitoriosas. Ao mesmo tempo, a SVPRI observa um grande número de iniciativas sendo incorporadas como ‘com Relatório GSI JAM 2011 fins lucrativos’ e projetadas para ser lucrativas e sustentáveis. Este ano, ela planeja trabalhar nas áreas de pesquisa e legislação a fim de entender melhor os impactos do "setor" como um todo. Se puder demonstrar que essas estratégias fazem sentido em termos econômicos (o sentido em que aqueles envolvidos na área acreditam), pode obter investimentos de capital mais agressivos, permitindo ampliar as iniciativas. Se eles forem bem-sucedidos na criação de empregos e conseguirem incluir indivíduos carentes na cadeia de valor, isso será extremamente valioso – e há um interessante desafio de padronização dos indicadores de impacto em um grupo tão variado. A medição de impacto é sempre crucial, porque valores imensos são investidos em diversas iniciativas e às vezes, não é possível avaliar os impactos concretos – sabe-se mais sobre resultados e impacto qualitativo, mas sem indicadores de impacto. Brown University: Muitos alunos da Brown University procuram o centro de Iniciativa de Inovação Social, interessados no empreendedorismo social. Um programa desenvolvido pelo centro nesse sentido é o Starr Fellowship Program. A partir desse envolvimento, vários participantes se tornaram membros da EchoinGreen e/ou fellows da Ashoka. O Starr Fellowship é um programa de 15 meses que oferece treinamento, apoio e recursos para que os alunos ponham suas ideias em prática. Os fellows participam de toda a experiência de fortalecimento do impacto e da sustentabilidade de seus esforços e também da formação de uma comunidade de inovadores no campus, que apoiarão e incentivarão uns aos outros. Duas universidades brasileiras têm centro de empreendedorismo social que podem ser parceiros da Brown no compartilhamento e criação de novos espaços e oportunidades. Uma delas é a Escola de Administração de Empresas da FGV, com o Prof. Ademar Bueno ([email protected]). O Senac é outra escola de renome, com áreas como gestão de negócios e com fortes componentes sociais e de sustentabilidade em seus programas. Conta com um centro de inovação em parceria com a Neurônio (Camila Figueiredo – [email protected], Bruno Asp – [email protected], Bruno Lima – [email protected]). mercado dos produtos doados, a fim de custear a operação envolvida na prestação desse serviço. Parte das organizações que poderiam ser beneficiadas pelo programa mostra-se resistente, em função da taxa – cuja prática garantiria a sustentabilidade da iniciativa. Embora esse grupo não seja maioria, é importante buscar formas de superar tais resistências, na mudança de conceito de sustentabilidade organizacional. Fundação Orsa: Ao reunir conceitos ‘empresariais’ para solucionar questões socioambientais, há uma quebra de paradigma. A Fundação Orsa, está estudando a implantação de uma Empresa Social de Reciclagem na cidade de São Paulo. Os principais desafios dizem respeito ao caráter jurídico da operação no Brasil. Ainda não existe um arcabouço legal claro para abrigar esse tipo de iniciativa. Estamos aguardando parecer jurídico de um escritório de advocacia especializado na área tributária e terceiro setor. Superada essa questão, esperamos unir forças com iniciativas do setor para empreendermos a construção da Empresa Social de Reciclagem. sitawi: A sitawi (www.sitawi.net) é o primeiro fundo social do Brasil e já emprestou mais de R$ 1.4 milhões para ‘empresas sociais’, sem inadimplência. Os empréstimos são de R$100 mil a 400 mil, com taxas de juros de até 1% ao mês que incluem aconselhamento estratégico. Para a sitawi, a intenção é mais importante do que a figura jurídica (Associação sem fins lucrativos ou S/A com fins lucrativos). Se a organização foi montada PARA ter impacto social e utiliza mecanismos de mercado/negócios, configurase como ‘empresa social’; foi montada PARA ganhar dinheiro e ‘por acaso’ tem impacto social, é uma empresa com foco na base da pirâmide ou com foco em algum setor específico, como saúde, educação etc., embora não seja ‘empresa social’. Os motivos mais comuns para que a sitawi recuse uma solicitação de empréstimo são: organizações sociais: têm um plano de financiamento para o qual um empréstimo não é o tipo de capital adequado; empresas: têm um projeto social em busca de capital mais barato. Nos dois casos, não há nada intrinsecamente errado, mas fundações – no primeiro caso – e bancos tradiTechSoup Brasil: Especificamente quanto aos becionais – no segundo caso – devem procurar outros neficiários, a TechSoup Brasil, em seu programa de fornecedores de capital. A missão da sitawi é desendoação de licenças de software, cobra uma taxa advolver infraestrutura financeira para o setor social ministrativa de aproximadamente 5% do valor de 43 GSI – Global Social Impact, Sustentabilidade Organizacional, Ideias e Propostas – trazer mais ‘tipos’ de dinheiro e mais volume de dinheiro para impacto social. Como há muito mais dinheiro em crédito do que em doações no Brasil, a atividade começou por ‘empréstimos sociais’ e esse modelo será refinado na medida em que forem concedidos empréstimos a quem tenha operações em condição de restituí-lo, mas sem acesso a capital. O propósito não é ceder capital barato a quem já tem acesso a capital, como empresas tradicionais com ou sem projetos sociais. Social Enterprise RI: Em Rhode Island, há muito interesse no empreendedorismo social. A mídia parece estar interessada e os consumidores buscam apoiar esse tipo de negócio. Simultaneamente, o grupo Social Venture Partners Rhode Island www. socialenterpriseri.org criou uma marca guarda-chuva para as 100 maiores iniciativas sociais do Estado e está lançando uma campanha de conscientização. O resultado é que algumas organizações com fins lucrativos estão procurando por eles para tratar de seu rebranding como empreendedores sociais; ao fazer isso, precisam repensar seu modelo de negócio para criar bem social suficiente para que sejam consideradas iniciativas sociais. Talvez essas empresas estejam fazendo isso porque estão interessadas no bem comum ou talvez vejam nisso uma forma de diferenciar seu negócio em tempos de dificuldade econômica. De qualquer modo, é uma boa tendência, embora abra uma imensa área cinzenta quanto à porcentagem de missão social necessária para uma empresa com fins lucrativos ser considerada iniciativa social. Se mais e mais negócios novos e já existentes quiserem se enquadrar como empresas sociais, esse movimento resultará em muito valor social. MICEED: O projeto originalmente chamado Iniciativa das Mulheres para o Auto-Emprego começou mais de quinze anos atrás como uma empresa social de fundo de microcrédito para mulheres de baixa renda que desejassem iniciar seu próprio negócio. A organização ainda segue forte e agora é chamada de Centro de Fortalecimento e Desenvolvimento Econômico. http://www.miceed.org/ Blended Value: Um dos melhores recursos para a empresa social nos EUA é o Blended Value (algo como fusão de valores). Jed Emerson, da Blended Value, teve vasta experiência no lançamento de empresas sociais dentro do setor sem fins lucrativos. Grameen-Danone: Há exemplos interessantes de 44 joint-venture social, como os cases: Grameen-Danone (parceria para venda de iogurtes nutritivos a fim de combater a desnutrição de milhares de crianças em Bangladesh). Ou Grameen-Veolia Water Ltd, (para fornecer água potável às populações mais pobres de Bangladesh) – 50% da empresa serão da Veolia Water AMI (África, Oriente Médio e Índia) e 50% da Grameen Saúde (empresa de negócio social nas áreas de saúde e higiene) e ela terá por missão operar várias plantas de tratamento e produção de água nos vilarejos mais pobres de Bangladesh. Instituto Voluntários em Ação: O Instituto Voluntários em Ação (IVA) auxilia organizações na captação de recursos humanos que atuem em seus projetos e atividades. Trata-se do Temos um Programa de voluntariado online, onde organizações de qualquer parte do território nacional podem se cadastrar e divulgar sua oportunidade na web. O instituto faz a ponte entre quem precisa e quem pode ajudar. Também oferece virtualmente: pesquisas, conteúdos, concursos e editais de interesse das organizações e sociedade civil. Esse é o seu compromisso com a Causa do Voluntariado e com o desenvolvimento sustentável de milhares de ações e práticas de benefício às comunidades. Eletrocooperativa: É tempo de pensar em modelos de organização em rede – o problema de escala e de sustentabilidade da Eletrocooperativa, por exemplo, sempre trava no fato de adotar o modelo de ONG. Fica difícil sustentar uma inovação, pois essa lógica é projeto e quem aprova os projetos está na maioria das vezes olhando para o passado. Continuamos insistindo em uma prática paradoxal: queremos fazer o novo com práticas antigas e com uma mentalidade de controle social, na maioria das vezes equivocada. A sociedade caminha para uma vida em rede e é necessário encontrar meios de redefinir os atuais modelos de contrato social em todos os níveis, ou corre-se o risco de inventar mais uma nova moda com valores antigos. Hoje a Eletrocooperativa em Salvador está sendo dirigida por um grupo de jovens. Durante a gestão anterior, o objetivo maior era aplicar a ‘Sevirologia’ na vida dos jovens – fazer com que eles despertassem para seu potencial e aprendessem a se virar na vida; fazer o melhor que podem com o que têm, donos da sua própria escolha de vida. Agora, estão tentando migrar de um modelo de organização para um modelo de rede. Atuar em rede é mudar a lógica do controle. Na rede, as pessoas são pró-ativas Relatório GSI JAM 2011 quando o assunto é relevante; caso contrário, a própria rede remodela o tema. A mudança na gestão da Eletrocooperativa de Salvador parece emblemática e incomum. A visão mais costumeira é do fundador de uma organização permanecendo lá o máximo possível, fundamental na captação de recursos etc.. Será possível replicar isso? FERRAMENTAS DE GESTÃO NO TERCEIRO SETOR ItsNoon: ItsNoon é uma rede social digital, organi- O Fortalecimento do Terceiro Setor zada como empresa social de propriedade coletiva, que estimula a aprendizagem e o trabalho em rede, Mais e mais, as organizações sem fins lucrativos liberando o potencial de cada indivíduo com o obje- buscam aprimorar sua gestão. Exigências externas tivo de co-criar um novo mundo. http:// itsnoon.net e necessidades internas as impulsionam a se profissionalizar e aprimorar sua forma de gerir pessoas e Participaram da criação deste tópico processos. Com isso, vão descobrindo seu lugar no Alan Harlam, Alcely Barroso, Bell Pereira, Carlos cenário social e, mais do que pedintes, passam a ser Eduardo Faria Ronca, Daniela Silva dos Santos, Ed- parceiras em causas e projetos. Nesse momento, as son da Silva Bezerra, Elenice Tamashiro, Ferdinan- ferramentas de gestão podem se tornar uma preodo Fernandes, Fernando Alves, Guilherme Campos, cupação, como na prestação de contas. É a prática Gustavo Antonio Duarte Ribeiro, Hazel Hender- baseada na transparência que vai sedimentar ações son, Jorge Proença, José Avando Souza Sales, José e ferramentas e, para isso, será preciso criar mecaGilberto Boari, Judith Cawhorn, Julia David Franco nismos objetivos e claros de avaliação e acompanhaGomes, Juliana Nobre, Juliana Ramalho, Kelly Ra- mento dos projetos. mirez, Leonardo Letelier, Luciano Palma, Mariana A menor dependência contribui diretamente para Nicolletti, Mario Costa, Natalia Menhem, Patricia um novo posicionamento da organização frente aos Diniz, Reinaldo Pamponet, Tiago Biusse Ghion e potenciais parceiros e financiadores, planejando e Vanda Scartezini. desenvolvendo estratégias claras. De qualquer forma, estabelecer uma relação de parceria de longo prazo, com compartilhamento de responsabilidades e riscos é um desafio. A parceria com outras organizações da sociedade civil ainda constitui um movimento novo no setor. Pela atuação em rede, torna-se mais fácil potencializar resultados, influenciar políticas públicas e compartilhar experiências. A experiência de redes é o caminho que parece mais saudável para fortalecimento das organizações da sociedade civil, embora ainda persista o medo de disputar verbas e compartilhar boas iniciativas. Elas devem ter em vista seu papel no estímulo a organizações de todos os setores pelo desenvolvimento de projetos consistentes. Cada vez mais, programas de empresas/fundações/ governos/OSCs devem buscar incorporar ferramentas em suas estratégias de investimento social, por exemplo, que ajudem a trazer maior e efetivo impacto. É crucial a inclusão de avaliação e monitoramento de impacto desde a fase inicial do projeto; assim, 45 GSI – Global Social Impact, Sustentabilidade Organizacional, Ideias e Propostas são criados marcos que demonstram a evolução nos Quais são as barreiras impedindo ou dificultando o projetos, sem ver a avaliação como algo punitivo, aporte de conhecimento do setor privado sobre fermas um processo de aprendizagem que só traz be- ramentas de gestão no dia a dia das ONGs? nefício a todos. Uma das maiores barreiras à introdução de ferraAlém dos processos financeiros, será que as organi- mentas é cultural. Há empreendedores sociais com zações já adotam ferramentas de gestão de relaciona- foco exclusivo na causa, que entendem que gestão mento com o cliente, a fim de acompanhar a pres- é perda de tempo. Mas, aos poucos, as ONGs vão tação de serviço? Em caso negativo, como será que percebendo que a captação de recursos sem acordo com o financiador, seja ele uma empresa, organismo anotam suas atividades? internacional ou outro. A prestação de contas é funA demora vem dos dois lados. Por muito tempo, damental e as ONGs que crescem e se fortalecem o mundo empresarial ficou ‘no seu canto’, voltado são aquelas que aprendem a importância da gestão. para seus interesses. Por outro lado, as ONGs hisÉ diferente quando se fala de uma ONG que nasceu toricamente apresentam dificuldade em estabelecer no meio empresarial, onde a cultura já é impregnada parcerias interessantes, se não forem na condição de por essa forma de trabalho. recebedores de verbas e fazedores do bem. Esse cenário tem mudado, com muito ainda que aprender Os alto executivos ainda preservam a mentalidade do marketing acima do tema social. O lucro é a meta dos dois lados. principal que alavanca as atividades produtivas denNão utilizar ferramentas de gestão, independente do tro da cadeia logística. A empresa terá que abarcar setor significa não ter o controle do negócio, mesmo a responsabilidade social, antecipando-se ao futuro que ele seja bem sucedido. Por outro lado, o empreque, em breve, exigirá esse tópico como ferramenendedor também terá dificuldades em ter subsídios ta fundamental nas boas práticas empresariais. Esses para tomada de decisão. Nessa abordagem, não há gestores precisarão reciclar seus conceitos, considediferença nas ferramentas de gestão utilizadas em rando que a ação em prol da melhor condição de vida qualquer setor. A gestão de um empreendimento, da sociedade certamente ampliará seus negócios e o com ou sem fins lucrativos, não está na aplicação de consumo consciente, pela elevação das classes dentro uma única ferramenta, mas em todo um conjunto da pirâmide social. Não seria o uso do social como de ferramentas que subsidiam o controle e a tomada marketing, e sim uma forma de reeducação da posde decisão. tura empresarial socialmente responsável. Pensando no setor privado, as pessoas que assumem Para as ONGs, no momento em que surgem patroa área de Responsabilidade Social Corporativa tamcinadores empresariais e parcerias com órgãos públibém não estão qualificadas ou preparadas; em sua cos, as exigências de relatórios, acompanhamentos e grande maioria, são profissionais de outras áreas prestação de contas exigem aprimoramento gradual como Recursos Humanos ou Comunicação que mino uso dessas ferramentas. No dia a dia, percebe-se gram ou acumulam funções. Estes também precisam que algumas ainda não fazem uso desses recursos, se profissionalizar. mas é questão de tempo, pois isso não é mais um Em função de a maioria das associações ter sido fun- luxo e sim exigência do mercado. Não há dúvida de dada por pessoas leigas, sem conhecimento de ges- que, pelo grande número de organizações sociais já tão, elas hoje têm muita dificuldade em entender o existentes e pelo crescimento potencial estimado, as conceito e desenvolver indicadores para medir, por exigências da sociedade e dos governos sobre os reexemplo, o atendimento oferecido. Também há ca- sultados e as práticas de gestão serão cada vez maiosos e situações específicas onde se buscam ferramen- res. Órgãos de controle (Tribunais de Contas etc.), tas de gestão, sem sucesso. cada vez mais, têm que validar esses resultados e práticas e as organizações também são obrigadas, de forÉ essencial compartilhar propostas para promover a ma transparente, a prestar contas à comunidade que eficácia e eficiência dos programas sociais e obter as as constituem e remuneram. Dessa forma, a adoção necessárias credibilidade e transparência na adaptade boas práticas gerenciais e de ferramentas de gestão ção de ferramentas de gestão, otimizando recursos, passam a ser imprescindíveis para sua sobrevivência. mobilizando pessoas e fomentando o aprendizado. 46 Relatório GSI JAM 2011 As perguntas feitas pelos mais céticos serão: "Quanto estas iniciativas irão aumentar a margem de lucro da empresa?", "o esforço do meu capital humano, que compõe o voluntariado, dará retorno financeiro ou estaremos dissipando energia do foco da organização?", "meus clientes vão percebem valor e estarão dispostos a comprar mais o meu produto, em razão dos meus investimentos nestes programas?" Assim, parece que o maior desafio é "monetizar" o valor agregado dos programas sociais no orçamento da empresa. No entanto, as ferramentas que se apresentem como solução para empresas do terceiro setor precisam ter como proposta básica as respostas inerentes a essas exigências, ou seja: baixo custo de implementação e de utilização, facilidades para publicação dos resultados de forma transparente, monitoramento de indicadores estratégicos e implementação das melhores práticas de gestão. pequenas organizações, embora a implantação desses processos possa gerar custos adicionais significativos (consultoria especializada, por exemplo) que precisam ser estimados antes do inicio de qualquer projeto. Uma boa prática para evitar erros é conhecer a experiência de outras organizações que tiveram sucesso em projetos similares. Talvez a criação de um fórum específico sobre esse assunto constituísse uma forma mais ágil de encontrá-las – nesse espaço, experiências bem sucedidas poderiam ser publicadas. No censo 2009-2010 realizado pelo GIFE, há uma menção sobre o total de Investimento Social que, em 2010, foi de R$ 2 bilhões. O levantamento indica que 84 associados de um total de 102 responderam à pesquisa; 79% dos recursos investidos foram destinados a curso/capacitação no biênio. Embora não haja detalhes sobre qual porcentagem desse total foi aplicada em qual área ou tema, é possível propor um questionamento a partir daí: Conhecimento: supondo que uma organização absorva e adapte as ferramentas de gestão, quanto de fato isso ajudaria a sistematizar o conhecimento gerado em termos institucionais e de projeto? A organização estaria disposta a plasmar esse conhecimento como forma de garantir, por exemplo, a 'sustentabilidade institucional' em longo prazo? Mas será que isso não é gerado pela alta rotatividade nas equipes e pela ausência de investimento no desenvolvimento delas? O foco da missão/visão organizacional será ainda mais sustentável pelo fortalecimento das equiAgregar a atuação social das empresas ao produto pes. Como equilibrar trabalho direto nos projetos é fundamental para que a instituição seja reconhe(exigência dos investidores) + estrutura da organizacida como socialmente responsável e não somente ção que a sustenta? usá-la com finalidade de marketing, na tentativa de mascarar o verdadeiro objetivo corporativo. É uma Investimento em cursos e capacitações: os investidooportunidade de mudança de visão pelos altos car- res usam ferramentas de gestão para avaliar a efetigos executivos nas empresas, diferente da velha sus- vidade de seu investimento? Há necessidade de mais tentabilidade = marketing + boas relações públicas. capacitações? Onde estará o gap? Entendimento de real parceria entre ONGs e corDe fato, a rotatividade nas equipes acaba sendo um porações. grande desafio para as organizações. Talvez as ferA mudança pode vir também das ONGs, se agru- ramentas de gestão em muitas organizações ainda pando inclusive com as pequenas empresas em busca não tenham sido absorvidas e adaptadas de modo a dessa parceria ‘igualitária’, juntando forças nas práti- se tornarem processo – por isso, se perdem à medida que as equipes mudam. cas pela sustentabilidade. No contato com os Tribunais de Contas, as organizações têm reportado dificuldades no controle, em face de morosidade da máquina burocrática estatal. A transparência de todos os atos praticados, orçamentos, aplicação dos recursos captados, além de balanços revisados por auditorias independentes seriam ferramentas imprescindíveis para a credibilidade nas empresas do terceiro setor, a ponto de a sociedade enxergar as ações sociais como transformadoras de valores, não como mera atividade filantrópica. Como as organizações do terceiro setor enxergam o apoio das corporações na implementação de ferramentas de gestão? É imprescindível. Existem ferramentas no mercado que podem dar conta dos processos de gestão com custos viáveis, mesmo para as Gestão qualificada e profissional no Terceiro Setor: capricho ou necessidade? Na história das Organizações do Terceiro Setor, há uma prevalência do "fazer o bem sem alarde". Na 47 GSI – Global Social Impact, Sustentabilidade Organizacional, Ideias e Propostas esteira disso, muito pouco se investiu em aprimorar a gestão. As empresas, por seu lado, sempre investiram nisso porque buscavam o lucro. Assim, só agora as organizações estão descobrindo a importância da gestão. Independente da existência ou uso de ferramentas específicas do mundo corporativo, é fato que ele está começando a adotar posturas, linguagens e mesmo ações que brotam da essência das organizações da sociedade civil. Um exemplo é o livro Marketing 3.0 de Philip Kotler. Nele, o autor aborda temas como a compaixão, o cuidado, a sustentabilidade, o fazer a diferença etc. E muitos outros autores marcadamente do mundo empresarial têm atentado para esses temas, que sempre circularam nas práticas das organizações. A parceria entre segundo e terceiro setores é de mão dupla, pois as empresas também têm muito a aprender com as ONGs, com sua sensibilidade para as questões sociais – competência pouco desenvolvida nas empresas e que pode auxiliá-las a conseguir, por exemplo, melhor relacionamento com as comunidades onde atuam ou despertar para a importância de uma gestão socialmente responsável. O problema é que a dependência financeira cria uma relação hierarquizada entre elas e precisa ser revista; para isso, é fundamental a profissionalização do terceiro setor. ONG que lida com meninos e meninas em área de risco, por exemplo, seu maior concorrente talvez seja o tráfico, que pode atrair esses jovens mais do que as atividades que propõe. Não deve haver ‘concorrência’ na maioria das situações. Porém, em seleções públicas, a instituição mais preparada, vence. Parcerias e redes de relacionamento podem ajudar na otimização de mais organizações, visando o bem comum e não a vitória desta ou daquela. Pelo lado dos recursos, é preciso fortalecer a ideia de clusters e assim, as diferentes instituições se fortalecerem juntas. Por outro lado, mesmo organizações da sociedade civil competem por recursos e "clientes". Vale sempre fazer uma análise do ambiente competitivo antes de levar a cabo qualquer projeto. Olhar fornecedores, fontes de recursos e, principalmente, soluções para problemas, ainda que possa ser um erro a criação de uma organização para solucionar problemas que já estejam sendo atendidos pelo poder público, pela iniciativa privada ou por outra entidade. Para alguns, as organizações do terceiro setor deveriam usar as ferramentas de gerenciamento e ser ‘rentáveis’ como quaisquer outras. Para tanto, devem estar atentas à validação do mercado, planejamento financeiro, construção de uma equipe forte de gestão etc., assim como fazem aquelas do setor privado. A única diferença é que o lucro não será compartilhado entre os sócios ou acionistas, mas reinvestido na missão da organização. No ano passado, o GIFE elaborou uma publicação que resume o resultado de alguns workshops realizados com lideranças do Terceiro Setor e que trata, entre outros assuntos, da relação entre segundo e terceiro setores, como os desafios vividos pelas ONGs nessa relação e o papel dos Institutos e Fundações empresariais. http://www.gife.org.br/publicacao-resHá quem replique que seria ótimo se as organizações ponsabilidade-social-empresarial-por-que-o-guardado Terceiro Setor tivessem recursos institucionais chuva-ficou-pequeno-da3c5fff52ec6f.asp para se estruturar, mas a maior parte dos financiadoNessa migração da vida corporativa para a realida- res só repassa recursos para projetos – em sua maiode da OSC, deve-se levar em consideração o novo ria com prestações de contas detalhadas, a fim de contexto, seja regional, cultural ou organizacional, ‘amarrar’ a destinação da verba conforme o objetivo e não depositar todas as expectativas na ‘tecnologia’ contratado. Raramente se consegue recursos a fundo importada, pois grande parte do investimento vem perdido. Uma possibilidade é as instituições buscada equipe – um dos grandes pilares da sustentabili- rem estratégias para levantar dinheiro ‘sem carimbo’, dade organizacional. Então, quanto existe de espaço espelhando-se nos negócios sociais, pensando em formas de gerar recursos com prestação de serviços. e oportunidade para obter sua adesão? Se são organizações sem fins lucrativos, por que dar importância aos concorrentes? Ao fazer uma leitura de cenários, definição de clientes e áreas de atuação no mercado, as organizações da sociedade civil devem ver que, muitas vezes, a concorrência não é outra ONG, e sim aspectos da realidade. Para uma 48 Em geral, há ferramentas de gestão que migram das empresas (o mundo do privado com fins privados) para o terceiro setor. E o contrário? Muitos estão na intersecção entre as empresas privadas e as organizações do terceiro setor. Não deveriam pensar na possibilidade de produzir ferramentas para um mundo Relatório GSI JAM 2011 que enfrenta o desafio de ser efetivamente sustentável? Ainda no tema da ‘rentabilidade’ das organizações não governamentais, uma vertente acredita que elas não podem competir por recursos – esse não é um pensamento justo com uma causa social. O desenvolvimento de projetos depende de apoio financeiro, seja de pessoas jurídicas ou físicas e é importante entender que, no fundo, todas estão envolvidas em uma missão: desenvolvimento social. É claro que, na prática, falta muita integração entre organizações e ações sociais. Talvez até por isso mesmo, seja difícil a implantação de processos e procedimentos com ferramentas de avaliação e acompanhamento. Uma organização social não pode traçar plano estratégico com análise de concorrência. Fazer uma análise SWOT (FOFA) é um exercício complexo de análise dos pontos fracos e fortes, as oportunidades e ameaças. As redes devem ser utilizadas como espaço democrático de articulação e alinhamento, sem aglomeração de ‘vale tudo’. A organização sem fins lucrativos pode observar a concorrência, como fazem as empresas, em busca de parâmetros, benchmarking etc. • Existe algum outro modelo ou conceito de concorrência que se diferencie do que é praticado entre as empresas privadas? Como uma concorrência social? • A questão está na imagem que se faz dos outros atores do terceiro setor. Diante de recursos escassos, as organizações tendem a se colocar em competição por eles. Duas questões se impõem: • Os recursos são realmente escassos ou nem sempre se sabe como acessá-los? • Atuar em parceria com outras organizações pode facilitar o acesso a esses recursos, com projetos mais consistentes e sistêmicos? prerrogativa: identificar e articular investidores e atores sociais que estejam atuando com o mesmo foco, com especificidades comuns (seja a causa, a área geográfica ou a forma de intervenção) e com interesse genuíno em ações colaborativas e parceiras. Tem por objetivo a definição dos propósitos dos investimentos, que devem ser amplos o suficiente para angariar apoiadores, mas específicos o suficiente para gerar ações concretas. Teoricamente, quanto mais difundida a informação, o conhecimento, melhor para o desenvolvimento de todos. Porém, as capacitações são caras e a única forma que o profissional tem de repor o investimento é, de certa maneira, ‘cuidando’ exacerbadamente de seu conhecimento. Iniciativas como essa, na qual todos podem aprender e ensinar produzem maior disseminação do conhecimento. Como as instituições podem se tornar mais profissionalizadas ao implementar ferramentas adequadas de gestão? Um empreendedor deve se dar conta de que o valor de um plano de negócios não está apenas no documento final, mas no exercício, na pesquisa e nos processos de reflexão necessários para estruturar o plano. O planejamento é um componente importante para a boa gestão. Ele representa um exercício que deveria ser guia para o aprendizado e o avanço gradual de processos e sistemas. Alguns dos benefícios que ele oferece: • Incentiva o empreendedor e os gestores a realizarem análises detalhadas e efetivas. • Oferece um mapa de orientação para o desenvolvimento dos negócios • Ajuda a levantar capital • Monitora o progresso e permite comparar boas práticas. Um ponto fraco num grande número de instituições do terceiro setor é a concentração de suas receitas em poucos provedores de recursos. E se, um dia, aquele fornecedor não quiser mais associar a sua imagem? Mas como ampliar as fontes de recurso? Escrever projetos? Procurar parcerias com (mais) empresas privadas? Partindo da premissa de que as organizações sem fins lucrativos têm o objetivo de atender às necessidades da sociedade e contribuir para a resolução de problemas sociais, de fato, não deveria haver concorrência entre elas, mas sim uma ação estratégica de formação de rede, de mobilização de parcerias e recursos. a ação em grupo facilitaria o acesso aos recursos, os Há também casos de empresas que buscam as orgaprojetos seriam mais consistentes e sem dúvida, os nizações, a fim de vincular a imagem das duas em acordos de parceira, por puro greenwashing. impactos seriam mais significantes. O conceito de Co-funding, por exemplo, traz essa Com o poder público pode ser ainda pior, com so- 49 GSI – Global Social Impact, Sustentabilidade Organizacional, Ideias e Propostas licitação de propinas ou de desvio de verbas. Então recursos, por exemplo. como ampliar o número de mantenedores de uma Ser sustentável é fazer parte do todo, mas também ONG sem ferir princípios éticos? ter em mente necessidades, objetivos e comproÉ importante que organizações sociais comecem a missos sem perder a qualidade nas relações. Mas identificar estratégias que tragam alternativas finan- as ONGs ainda trabalham muito isoladas, buscanceiras, desenvolvendo atividades comerciais com do sustentabilidade a qualquer custo e muitas vezes produtos e serviços que vão em linha com sua missão competindo entre si. Em seu livro “Poder e Amor, Teoria e Prática da Mudança Social”, Adam Kahane e gerem recursos para sua sustentabilidade. (Reos) trata justamente desse equilíbrio em procesEsse tema tem evoluído muito nos últimos anos, mas sos de transformação e como os interesses das partes também crescem algumas preocupações: há organi(como empresas, ONGs e outros agentes trabalhanzações do terceiro setor que incorporam sem críticas do por uma mesma causa) devem ser respeitados e o que há de pior no mundo empresarial. Entendem permeados pelo interesse comum, pois são diferenque ser eficiente, efetivo e eficaz é copiar as ideolotes. E isso pode ser o impulso da parceria. O ganhagias, práticas de gestão, métodos e sistemas utilizados ganha-ganha é primordial, mas na prática isso ainda pelas empresas, tornando-se um clone sem alma de é difícil de perceber nas relações entre ONGs. Por algo que também está sendo questionado. Empreoutro lado, entre negócios sociais, parece haver mesas? Quais empresas, que mundo empresarial, quais lhor entendimento quanto a dividir e somar, ser susreferências servem e não servem? Enquanto há emtentável e se relacionar bem com diferentes agentes. presas que querem aprender com ONGs e precisam delas como referência para entender questões como Na iniciativa privada um dos processos mais imporengajamento, mobilização social, intangibilidade, tantes é o de ‘melhoria contínua’, que depende da responsabilidade social etc., muitas ONGS tentam construção e utilização de "indicadores de desempefazer o caminho inverso e olham para o passado do nho". Peter Drucker dizia: "Se você mede, você memundo empresarial ou o que há de pior nele como lhora!". Um exemplo é o Pacto Rodoviário Mineiro, fonte de inspiração. As ONGs têm muito a apren- que visa reduzir em 40% o índice de vítimas de acider com as empresas e vice-versa, mas é preciso ter dentes com veículos de carga no Estado de Minas postura crítica, ‘traduzir’ conceitos e práticas e não Gerais, no prazo de 3 anos. assimilar mecanicamente e repetir sem inovação. A integração presencial e virtual das organizações Como respeitar as peculiaridades dos movimentos brasileiras depende de mobilização e de um projesociais? Embora as ferramentas e os modelos sejam to de implementação de uma mega-rede, onde seja importantes, talvez seja interessante olhar pelo pris- possível desenvolver: compartilhamento de experima da gestão empresarial para completar a visão ge- ências, avaliação de prestação de contas bem sucedidas, fórum de debates e formatação de Marcos Legais ral do quadro. para as esferas públicas de poder, demonstração de Há o sentido estrito e limitado que diz que ser susresultados positivos (impacto social), promoção de tentável é se bastar, não depender de ninguém. Há o projetos realizados e em andamento (marketing culsentido mais amplo ou resignificado, que diz o opostural), sessão de apoio de Tutoria com profissionais to: ser sustentável é reconhecer-se parte, tomar pare consultores qualificados, inserção das organizações te, saber-se limitado e inserido numa rede de relanas redes sociais mundiais, perspectiva de canal dições interdependentes. Uma organização sustentável reto com ONU, UNESCO e outros órgãos privados é aquela que gerencia suas relações com todos os seus nacionais e internacionais de responsabilidade social públicos, de maneira que todos ganhem com aquilo para proposta de projetos, dentre outras ações. que ela se propõe a ser e fazer. Isso vale para todos os setores. É o ganha-ganha-ganha. “A sustentabilidade Na gestão estratégica, é louvável a participação vomora na qualidade das relações". A sustentabilidade luntária, mas ela deve ser acompanhada de planejade qualquer organização está na sua missão, identi- mento em curto prazo que insira este voluntariado dade, valores e princípios. A identidade da organi- em capacitações acerca das ações empreendidas pelo zação precede a estratégia e as ferramentas a utilizar terceiro setor, com possibilidade de envolvimento ou qualquer outra discussão sobre ‘concorrência’ por junto a equipes remuneradas das Organizações. Re- 50 Relatório GSI JAM 2011 sultado: Profissional qualificado, estimulado, giro econômico, distribuição de renda e oportunidade de emprego. Nada no mundo gira sem dinheiro, portanto é uma chave, também de inclusão socioeconômica. As ONGs necessitam reter know-how como Empresas Culturais, com quadros definidos de Gestão, não necessariamente assumindo os modelos das empresas que atuam no mercado, mas com caráter de mercado e administração por excelência; até mesmo por conta das referências documentais da ONU, ao afirmar que a Cultura é mola propulsora da Economia Mundial, o Setor que mais cresce no mundo (Cultura + Entretenimento), e pela ONGs desenvolverem projetos integrados tendo por temática a questão ambiental e de preservação e o desenvolvimento sustentável. Sendo assim, os responsáveis pela administração das ONGs demandam também formação e especialização na gestão de recursos humanos. Uma das saídas pertinentes encontra-se na parceria das ONGs com o Ministério da Justiça do Brasil, que digna por Lei o reconhecimento das ONGs como OSCIP (Organização da Sociedade Civil de Interesse Público) tendo como aparatos de Gestão: gerar Notas Fiscais série A, formatar e contratar quadro de funcionários, desenvolver investimentos no mercado (CDBs, ações, poupança, etc.) sem perder a característica da administração de recursos públicos e privados pela Sociedade Civil Organizada. Análise das Ferramentas Qualquer organização pode se valer de ferramentas para atingir seus objetivos. Mintzberg coloca isso em seu Safári de Estratégia. Daí, algumas instituições vão procurar receitas – métodos –, como o planejamento estratégico, o BSC, a SWOT e outras. Se a instituição não está apta a usar a ferramenta, por ainda não ter atingido maturidade para isso, ou pela velocidade do mercado (o ambiente), ela busca outra estratégia que não a receita. Umas podem se valer de contatos na linha de lobby para atingir o mesmo objetivo. Outras têm agilidade interna suficiente para ir mudando conforme o ambiente determina. Não há uma solução única – são várias ferramentas passíveis de ajudar na conquista das metas. Ainda assim, deve-se considerar que as ferramentas que conhecemos, adequadas para medir desempenho de empresas, como, lucro, produtividade ou mesmo para indicadores sociais de um país, ainda não são certas para um processo de desenvolvimento social, complexo, promovido por uma organização não governamental, em parceria ou não com primeiro e segundo setores. Uma das ferramentas desenvolvidas no setor cidadão está sendo absorvida por empresas e fundações: é o mapa de inovações e desafios colaborativos, a qual ajuda a orientar o investimento estratégico das empresas. A partir da análise desse framework, elas desenham estratégias relacionadas ao seu enfoque, de forma a construir um investimento mais efetivo e sustentável em longo prazo. Isso foi desenvolvido com o Changemakers da Ashoka e alguns parceiros no mundo: http://www.changemakers.com/ socialbusiness (link 'Pre-competition discovery framework', na primeira página). O Changemakers já fez cerca de 30 destes desafios com análises, incluindo o grupo do G-20, Bill & Melinda Gates, Nike etc. No caso de organizações do segmento da saúde, como mensurar resultados? Como criar indicadores de adesão ao tratamento? A criação de indicadores constitui um grande desafio, principalmente quando se trata de temas subjetivos, como saúde. Talvez os indicadores criados para o FIB (Felicidade Interna Bruta) possam ser uma referência nesse sentido. Foi instituído originalmente no Butão, pequeno país budista no Himalaia. Em 1972, durante sua posse, o novo rei – Jigme Singye – declarou que o FIB era mais importante que o PIB (Produto Interno Bruto). A partir daí, baseou todo seu governo em quatro premissas: desenvolvimento econômico sustentável e equitativo, preservação da cultura, conservação do meio ambiente e boa governança, que, no fundo, são os verdadeiros pilares que podem levar à mitigação da fome, da miséria e da pobreza. Para o atendimento de pacientes com necessidade de acesso ao tratamento e a informação adequada não somente a eles, mas também aos profissionais de saúde envolvidos, é importante o desenvolvimento de uma rede multidisciplinar ampla, visto que costuma haver um paciente na zona norte, 10 no sul, 100 no sudoeste e através de uma rede, todos poderiam ser atendidos em suas demandas. Mas como construir essa rede? Mesmo no setor de saúde humana, é possível começar a estabelecer indicadores progressivos: de eficiência, depois de eficácia e por último de efetividade. Tudo começa pela implantação de um instrumento 51 GSI – Global Social Impact, Sustentabilidade Organizacional, Ideias e Propostas para ajudar a atingir os objetivos, seja ele qual for – planejamento estratégico, Balanced Score Card ou outro modelo. No início, conta-se o número de atendimentos e ao final, a busca é por saber a influência da instituição de saúde na comunidade. E aí a instituição consegue identificar o indicador que permita a medição, quanti ou qualitativamente. Há um número expressivo de ferramentas desenvolvidas para a introdução da Responsabilidade Social nas empresas, adaptadas ou inspiradas nas ferramentas da Administração de Empresas: sistemas de indicadores, modelos de gestão, modelos de plano de ação, modelos de prestação de contas etc. Também há ferramentas desenvolvidas ou adaptadas especificamente para a gestão do Terceiro Setor. Além daquelas listadas acima, o Prof. Paul Kirsch, no vídeo de abertura deste fórum, falava em estudos de viabilidade e planos de negócio. Muitas ONGs parecem ver as ferramentas como um mal necessário para conseguir estabelecer parcerias, e não necessariamente como algo que irá contribuir para a realização de sua missão. Qual será a característica principal de uma ferramenta de gestão para o Terceiro Setor, de modo que ela não vá contra os aspectos culturais das ONGs? Pois uma coisa é a ferramenta ser teoricamente boa, outra coisa é ser efetivamente boa. Uma das principais barreiras à aplicação de ferramentas de gestão pelas ONGs é o custo, pois elas requerem, entre outras coisas, muitas horas de trabalho de pessoas qualificadas. Por exemplo, para fazer uma análise simples, pode-se usar a SWOT Analysis. Seu custo, a princípio, equivale ao tempo das pessoas para a tarefa. No entanto, sua destinação e o modo de aplicação exigem outros esforços e verbas. Mais do que identificar a ferramenta de gestão ideal, é importante estruturar um sistema de gestão que inclua planejamento estratégico com metas claras e realizáveis, cronograma, indicadores, plano de marketing, orçamento, projeções etc., e que seja útil e prático para quem vai utilizá-lo na organização. A partir daí, pode-se tentar demonstrar resultados, impactos e a eficácia, para correção de rota. Muitas instituições relevam a parte financeira em prol da ‘boa ação’, mas isto não é sustentável e não deve ser descuidado. As ferramentas têm por finalidade gerar os melhores dados e informações possíveis para subsidiar as decisões e alcançar os resultados esperados. Muitos mecanismos de sustentabilidade do mercado financeiro (índices, relatórios e agências de financiamento) vêm demandando controle por parte das empresas participantes, com foco estratégico nos investimentos socioambientais. Como exemplos desQuais indicadores ‘básicos’, especialmente da di- ses mecanismos, podem ser destacados os padrões de mensão financeira, poderiam ser sugeridos para aju- relatórios dar a medir o sucesso de um programa social? Eis • GRI – Global Reporting Initiatialguns: ve (http://www.globalreporting.org) 1. Medir o retorno do investimento na for• CDP – Carbon Disclosure Promação educacional e reciclagem dos recurject (https://www.cdproject.net/) sos humanos em todos os níveis hierárqui• os índices de sustentabilidade cos, mediante certificação de entidades. • ISE/Bovespa (http://www.bmfbovespa.com.br) 2. Medir o retorno do investimento financeiro na forma de lucro líquido, após • DJSI – Dow Jones Sustainability Index os valores aportados na área social. (http://www.sustainability-index.com) 3. Acompanhamento das atividades dos • e a agência de investimento Oekom Reseprogramas sociais, mediante auditoria perarch AG (http://www.oekom-research.com) manente por parte do investidor. Uma das ferramentas e metodologias apontadas Uma solução seria a agregação dos custos sociais na como referência é o cadeia produtiva. Como no exemplo dado pela Gestão Ambiental, conforme protagoniza a linha Pigou- • London Benchmarking Group (LBG) – viana sobre a economia sustentável, com a impor- (http://www.lbg-online.net) que orienta o tação desse modelo na Gestão Social. O impacto é Corporate Community Investment (CCI), ou praticamente nulo em relação à cadeia e esse investi- Investimento Corporativo na Comunidade. mento seria de fácil mensuração. É composta por ferramentas de gestão e metodo- 52 Relatório GSI JAM 2011 logias. As perguntas básicas a ser respondidas pelos financiadores que aderem a esse grupo levam em conta quatro temas “How, Why, What e Where?” (Como, Por que, O quê e Onde investir?). Na execução dos projetos, também são cobrados indicadores de processo (ex. número de pessoas presentes às aulas), de resultados (ex. quantos concluíram o curso) e de impacto (ex. O curso gerou “X” valor monetário de renda para os concluintes). Como as organizações podem tomar conhecimento dessas ferramentas? O que uma OSC pode fazer para não ser surpreendida por tais demandas? As ferramentas dos financiadores contribuem efetivamente para a melhor gestão das Organizações e de seus projetos? Pode-se traçar uma estratégia para induzir o mercado financeiro em vez de ser conduzido por ele? Pode haver benefício nessas ferramentas e em sua aplicação no cotidiano de uma organização? Antes da decisão na escolha de qualquer ferramenta de medição de desempenho, deve-se considerar a intenção comunicativa. Alguns parâmetros simples são importantes nesse processo de escolha, como: • Sentir a necessidade de expressar alguma coisa e informação; e tomadas de decisão. O incentivo fiscal a doações é uma importante ferramenta de captação de recursos no Terceiro Setor. No entanto, alguns estudos apontam que parte considerável das entidades não capta recursos incentivados. O mesmo ocorre na outra ponta – os investidores privados aptos a usufruírem desse benefício não costumam se apropriar plenamente dessa ferramenta. Diante de tal cenário, é tempo de compartilhar experiências e reflexões sobre as razões jurídicas, gerenciais e sistêmicas dessa subutilização e propor soluções e alternativas para um uso mais democrático e satisfatório dessa ferramenta. Incentivos fiscais são bastante úteis, embora haja restrições para determinados tipos de projetos, em geral para atividades culturais, podendo ter traços de projetos educacionais. O lado da empresa é mais simples e requer um mínimo de organização e processo. Mas para uma ONG, isso é extremamente burocrático, demanda consultorias especializadas e na maioria das vezes, recursos de que ela não dispõe. Uma solução seria usar tecnologia e inteligência nos processos de análise e aprovação de projetos. Isso requer investimento governamental, mas traria significativo retorno para a sociedade. • Ter objetivo-fim; Nesse enfoque, quanto à reformulação de contrapartidas, o incentivo deve ser equivalente a 100% da de• Selecionar a forma mais adequadução. No caso da Lei de incentivo Semear do Pará, da para o que se deseja realizar; requer 80% de dedução com mais 20% de contra• Ter disposição para transmitir as necessidades; partida financeira em relação aos 100% do valor total do projeto. Isso gera um gargalo problemático, • Ter habilidade no uso de uma ferpois os departamentos de Marketing e Financeiro ramenta e da linguagem; das empresas negam a cessão da contrapartida de • Ter imaginação para romper a as20% e muitas suspeitam da utilização da ferramensimetria de conhecimentos; ta, em razão de, no processo burocrático, estas ações • Manter o foco de atenção para não dispersar. venham a ferir suas contas. É necessário: modernizaPara que surta efeito positivo qualquer tipo de ope- ção e simplificação dos processos burocráticos, forracionalidade, deve-se estar atento ao desempenho mação, especialização de equipe gestora das ONGs. de quatro áreas distintas: Experiências compartilha• Gestão de pessoas • Processos • Clientes • Resultados Quanto ao custo, está diretamente ligado à necessidade interpretar os objetivos – quanto maior conhecimento do negócio mais eficácia e eficiência serão geradas, as quais servirão para sustentar as estratégias das durante o painel UNB: Marcelo Carvalho, professor que ministra a disciplina de planejamento na Universidade de Brasília (UNB). Orienta os trabalhos de planejamento dos alunos para o Terceiro Setor, como forma de eles retribuírem o que o Estado lhes proporciona. Nessa experiência, os gestores e trabalhadores das organizações fazem o planejamento junto com os alunos. Não é para eles e sim com eles. Claro que há mo53 GSI – Global Social Impact, Sustentabilidade Organizacional, Ideias e Propostas mentos desgastantes no processo, como o bloqueio como estratégia de autofinanciamento, diminuindo a dependência de doações. Promove a gestão da orde informações, mas isso é pontual. ganização junto à equipe para o sucesso do empreenMcDonald’s: O McDonald´s promove uma compedimento e para fortalecer a missão social. tição nacional de ações sociais que é a Campanha do Bom Vizinho, com foco na divulgação da organiza- Instituto Teológico Basiléia: Sou pastor de uma peção, para que seu trabalho se torne conhecido na co- quena comunidade cristã em São Luis, Maranhão. munidade. A idéia parte do dito popular "Você nun- A comunidade fica em Zona de palafitas, estamos ca terá uma segunda chance para causar uma boa implementando trabalho social. Temos grandes difiprimeira impressão", o qual pode ser definido como culdades de recursos, pessoas dispostas e também de o paradigma principal do mundo dos negócios na gestão. Sabemos que existem muitas ferramentas disúltima década. As melhores empresas têm em seu es- poníveis, mas muitas vezes não temos material hutatuto a missão, visão e valor "produzir com a maior mano para operá-las ou recursos para adquiri-las. A qualidade possível", "satisfazer nossos clientes" ou urgência de fazer algo prático que alivie o sofrimen"elaborar produtos inovadores que encantem nossos to das pessoas afligidas por fome, crack, prostituição consumidores". Elas tentam causar uma boa primei- muitas vezes não impede de realizar um planejamenra impressão ao fazer produtos com qualidade, tratar to em longo prazo. Criamos uma Rede de instituio cliente como um rei, com o objetivo de torná-lo ções cristãs e ‘seculares’ que trabalham com Ação Soleal à marca. No que tange as organizações do tercei- cial, e o que chamamos no meio cristão de Missão ro setor, a resposta parece estar no marketing social Integral. Pretendemos fazer parte da RENAS (Rede – ele será cada vez mais discutido em Fóruns Econô- Nacional Evangélica de Ação Social) e, em parceria, micos Mundiais, não só por sua importância social, agir de forma mais eficaz. Em nossa comunidade, o mas por sua eficácia. Um projeto social discreto e grande problema é como fazer. Observamos muito bem elaborado será tão importante para a imagem problemas, temos poucos recursos e não sabemos o corporativa quanto a qualidade das marcas produzi- que atender primeiro, e como atender. Bruno Elias das – para isso, no entanto, é necessário que a em- Menezes presa defina a causa social que irá abraçar e tornar-se Grupo Sempre Vita: O Grupo Sempre Vita é uma conhecida por essa via. No caso das OSCs, a questão organização sem fins lucrativos criada com o objeque qualquer membro do conselho executivo deve tivo de reunir e apoiar pacientes com a necessidafazer é "causamos uma boa primeira impressão em de, pontual ou permanente, de terapia nutricional empresas com potencial para garantir nossa manuclínica. Nossa meta é ser um organismo de difusão tenção?". de informação, fomento a estudos e contribuição na Fundação Dom Cabral: Em Belo Horizonte, a garantia de acesso igualitário à terapia nutricional. FDC oferece às instituições seu know-how em ges- Temos necessidade de uma consultoria para captatão. Várias delas estão participando e obtendo bons ção de recursos e perguntamos se a sua associação resultados em sua gestão e projetos. De qualquer for- desenvolve trabalhos nesta área. ma, em tempos de rede (internet, por exemplo) as Zigla: A Zigla trabalha com gestão estratégica do coOSCs precisam descobrir e reunir as riquezas que nhecimento para OSCs, empresas, governo e fundapossuem. A Fundação busca oferecer ao Terceiro Seções, orientando o investimento social, por exemplo, tor as ferramentas de gestão que funcionam nas emcom mapeamento de inovações sociais e programas presas, com adaptação de linguagem. E trabalha na de avaliação. O conhecimento, neste sentido, ajuda manutenção do foco do negócio, ajudando os gesa criar um ciclo virtuoso e contínuo de sustentabilitores a decifrarem seu negócio, para daí se tornarem dade das organizações. A consultoria ajuda a estruadministradores qualificados. Essas organizações deturar e implementar projetos dentro deste escopo. vem apresentar resultados positivos, pois há muitos stakeholders esperando por boa gestão. Talvez só Recente publicação da Zigla Consultores, que pode precisem entender que o seu "lucro" é um pouco di- ser útil como informação de gestão sobre "avaliação, monitoramento e medição de impacto na agenda do ferente de uma empresa com fins lucrativos. investimento social na América Latina”: http://bit. NESsT: O NESsT apoia organizações sociais na esly/hw40nl no mesmo link do blog, também em estruturação e desenvolvimento de negócios sociais 54 Relatório GSI JAM 2011 panhol e inglês. www.ziglaconsultores.com O blog (link no site) tem conteúdos produzidos pelo Observatório de estudos de impacto da América Latina e artigos, links de org internacionais sobre SROI, impacto. Instituto Ecoar: Há tempos, o Instituto Ecoar já não está na condição de "pedinte". Hoje, emprega como qualquer outro segmento, paga impostos e tornou-se profissional talvez com mais perfeccionismo, em função das exigências dos financiadores. Já é visto como parceiro, vinculando a sociedade, o poder público e o privado, com a função de realizar as ações demandadas. Instituto Voluntários em Ação: Sou pesquisadora do Instituto Voluntários em Ação/SC. Colaboro com a Entidade por meio da Web, pois possuímos um programa de voluntariado online, ou seja, é possível ajudar diversas Instituições sem sair de casa. Os materiais pesquisados pelos colaboradores voluntários são postados semanalmente no Portal do Instituto. Auxiliamos as organizações a implementar seus projetos e atividades, alavancando cada vez mais suas práticas. Além de termos a Internet como grande aliada em nosso trabalho, propiciamos capacitações, tanto online como presencialmente (na sede da Entidade) a profissionais e organizações comprometidos com a sustentabilidade do seu negócio. O Portal também disponibiliza materiais de apoio e links de trabalho, para quem desejar complementar pedagogicamente sua atuação na Organização. www. voluntariosonline.org.br CARE Brasil: A CARE Brasil – ONG de combate à pobreza e ajuda humanitária – tem um projeto no Piauí que é o CEFEM (Centro de Formação de Empreendedores), escola para jovens da região rural, principalmente entre 15 e 20 anos, administrada como empreendimento com potencial para se tornar autossuficiente em cinco anos. A escola hospeda microempreendimentos, onde os alunos vivenciam na prática o que aprendem, e revertem o lucro para a manutenção da própria escola! ACAM: Há alguns anos, a ACAM (associação de apoio a pacientes com fibrose cística) se preocupa com a organização de seu trabalho. Apoiada por uma consultoria, criou processos e hoje tem metas e objetivos a ser atingidos no mês e no ano. Mas como mensurar resultados quando trabalham com saúde? Como criar indicadores de adesão ao tratamento quando a influência social atinge diretamente sua população? De fato, organizações voltadas ao atendimento de pacientes, geralmente, iniciam seu trabalho com pessoas leigas atendendo necessidades de parentes, amigos e até mesmo a sua própria. Neste contexto, falta conhecimento de uma gestão efetiva, com tendência ao assistencialismo. Estamos iniciando uma fase de percepção da necessidade de uma gestão mais profissional e com indicadores que demonstrem a efetividade das ações desenvolvidas, mas temos encontrado alguns problemas: falta conhecimento das ferramentas de gestão; indicadores; um novo olhar para o paciente tendo-o como parceiro na construção de políticas públicas de saúde; um diálogo claro entre o profissional de saúde, o paciente, seu cuidador e o Estado; e, especialmente, estudos que demonstrem o benefício/custo social de um tratamento/acompanhamento efetivo do paciente, pois um doente atinge sua estrutura familiar e também seu desempenho/produção profissional, sua vida social e as pessoas do entorno. Pamcary: O trabalho social precisa ser organizado. Partindo dessa premissa a Pamcary fundou o Instituto Cuidando do Futuro, determinada a falar sobre sustentabilidade com foco no segmento de transporte e logística, quando ninguém acreditava ser possível fomentar a mudança de comportamento para empresários do segmento de transportes de cargas, motoristas de caminhões e demais profissionais da área. Saiba mais www.institutocuidandodofuturo. org.br APAF: O ICF através dos voluntários da empresa mantenedora Pamcary, apoia a APAF – instituição que trabalha na profissionalização e resgate da autoestima de mulheres em situação de vulnerabilidade social. Parece que existe sinergia entre a sua atuação (não sei se é Grupar-RP ou Centro Espírita O Consolador) e a nossa. Começamos adaptando um modelo de planejamento estratégico à realidade da ONG, traduzimos os conceitos e criamos um modelo próprio de execução e acompanhamento. A APAF foi fundada em 2004 e desde o início adotou ferramentas de gestão para o seu desenvolvimento. Estabeleceu missão, visão, valores e um planejamento estratégico e orçamentário para atingir seus objetivos. O ICF tem contribuído para seu desenvolvimento e acompanha seus indicadores de resultados e a partir destes, tem recomendado ações para sua melhoria contínua. 55 GSI – Global Social Impact, Sustentabilidade Organizacional, Ideias e Propostas ICF: A experiência do Instituto Cuidando do Futuro. Entendemos a importância da utilização das ferramentas de gestão, e concordamos com a sua colocação, por isso assumimos o desafio de trabalhar de forma organizada, transparente contando com o apoio de profissionais da área de planejamento. Criamos uma estrutura formada por voluntários – profissionais que contribuem durante 2 horas semanais trabalhando no que denominamos Boletim ICF, uma ferramenta que possibilita o acompanhamento e execução dos projetos, num modelo sem custo adicional. TechSoup Brasil: informação sobre doação de softwares da Microsoft e outras empresas, que auxiliam como ferramentas de gestão a quem interessar acesse o site http://www.techsoupbrasil.org.br/ Participaram da criação deste tópico Alcely Barroso, Ana Lucia Silva Marçal, Andrea Shpak, Augusto Hijo, Bruno Andreoni, Bruno Elias Menezes, Carlos Eduardo Faria Ronca, Carolina Neri, Celso Bianchi Barroso, Claudia da Silva, Cristina Fedato, Daniel Barreto, Daniela Silva dos Santos, Darcio Centoducato, Debora Caldini, Edsmar Resende, Eduardo Britto, Elenice Tamashiro, Janete Hung, Jorge Proença, José Aureo Bigliassi, Joseph Haim, Julia David Franco Gomes, Luciane Sena, Luiz Bruno Vianna, Maisa Signor, Marcelo Carvalho, Marcus Clemente, Mariana Nicolletti, Marina Spirandelli, Monica Lazzerini, Paul Kirsch, Regina Miranda, Reinaldo Bulgarelli, René José Rodrigues Fernandes, Ricardo Lopes, Roberta Guarino, Tanya Andrade, Vanderlei Soela, Vania Bulgarelli e Yara Cavini. INICIATIVAS DE INVESTIMENTO PÚBLICO E PRIVADO Investimento público e privado Vivemos num mundo em transformação. Empresas e organizações, cidades, regiões e países experimentam mutação constante, o que requer ações novas e traz em seu bojo incertezas e riscos. Por isso, gerenciar uma empresa, um órgão público ou uma orga- 56 nização social demanda habilidades que extrapolam resultados básicos como lucro, mobilidade social e eficiência. Gerir, hoje, significa ser capaz de criar novos valores para as organizações e para a sociedade – isso demanda criatividade e coragem para buscar novas soluções e implementá-las. Nos últimos 20 anos, o Brasil se democratizou, mas ainda está longe de garantir direitos equânimes a todos os cidadãos. Nesse período, houve significativo avanço nas políticas públicas, principalmente na saúde. O SUS – Sistema Único de Saúde, por exemplo, foi criado na Constituição de 1988 como um conjunto de princípios que se solidificaram em unidades de saúde e hospitais, e hoje garantem o direito básico à saúde da maioria da população brasileira. O Sistema tem conseguido diminuir a mortalidade infantil, realizado amplas campanhas de vacinação, garantido transplantes. As diferenças regionais ainda são significativas e, apesar dos profundos problemas ainda existentes, essa está entre as políticas públicas que mais avançaram a caminho da cidadania. Os setores público e privado devem estabelecer parcerias, sempre procurando estabelecer metas claras quanto ao uso dos recursos públicos diretos e indiretos, conscientes de que a gestão é de incumbência estatal, complementada pela ação do setor privado. Pouco a pouco, o conceito de “público” deixa de significar estatal para nomear o que pertence ao povo. Como tal, lentamente multiplicam-se e fortalecemse as organizações que fiscalizam a aplicação do dinheiro público. O trabalho dessas entidades de controle social, leis como a Ficha Limpa, campanhas como a do Ministério Público contra a corrupção, o empenho de órgãos como a CGU (Controladoria Geral da União) na campanha por transparência e participação popular orientam os olhares para a necessidade premente de saneamento das instituições, mesmo que ainda seja distante, e tornam possível a parceria mais equitativa entre o poder público, a iniciativa privada e o terceiro setor. As transformações socioeconômicas das últimas décadas produziram impacto profundo sobre o comportamento do segundo setor, até então acostumado à maximização do lucro. A ideia de responsabilidade social incorporada aos negócios é relativamente recente, gerando novas demandas e maior exigência por transparência. Nesse contexto, observa-se a consistência dos propósitos dos investimentos sociais ou ambientais: estão eles realmente vinculados às causas Relatório GSI JAM 2011 a que se propõem? Há coerência de propósitos entre o investimento social e a atuação social do investidor? A postura do investidor interfere nos resultados do investimento social? Muito se fala em sustentabilidade, a ponto de a palavra ter perdido o sentido pelo desgaste do uso indevido e excessivo. Mas são poucos os projetos com apoio de investimentos privados que aliam responsabilidade socioambiental ao foco do negócio. Muitas vezes, esse investimento chega a ser realizado longe do entorno da empresa, sem conhecimento e sem envolvimento de seus colaboradores e da comunidade próxima. Tal modelo pode ser visto como ferramenta exitosa do ponto de vista de marketing e de ação social. Porém, quando o investimento social faz uso de recursos de renúncia fiscal, a responsabilidade, a ética e a transparência devem ser observadas com rigor, e as aplicações e resultados fiscalizados pelo poder público. É preciso ainda frisar que o investimento social privado não pode ser confundido com a responsabilidade e os compromissos que as empresas devem assumir com as questões socioambientais na produção de seus bens ou serviços, como está convencionado na norma ISO 26000 – uma empresa pode ter investimentos sociais e não ser socio e ambientalmente responsável. O inverso também pode ser verdadeiro: sem investimento social e responsável na condução do seu negócio. Muitas vezes as ações sociais de empresas são dispersas, sem conexão entre si ou com as próprias estratégias empresariais ou, mesmo com ações de políticas públicas. Mas quanto mais as empresas vincularem as ações de investimento social privado às estratégias de negócios, melhores serão os resultados para a empresa, para a sociedade e para a sustentabilidade das ações sociais. Empresas que utilizam o próprio core business para apoiar ou embasar as ações sociais são as que acabam tendo maior coerência de investimento e aproveitam/potencializam a ‘tecnologia empresarial’ e a ‘tecnologia social’. Passar de uma visão assistencialista ou filantrópica para uma estratégia integrativa, em que os investimentos sociais estão atrelados e combinados às estratégias de negócio é importante para que as ações sejam mais efetivas e sustentáveis. As próprias empresas ganham em consistência e coerência e tornam-se também mais sustentáveis. Além disso, quanto mais as ações sociais se vincularem às ações de políticas públicas, gerando intersetorialidade, maior será a contribuição para a transformação social. Para que isso aconteça de fato, é importante que haja uma mudança de cultura de investimento social, de visão sobre as possibilidades de articulação intersetorial e de gestão organizacional. O fato é que os mais importantes desafios socioambientais dizem respeito a toda a sociedade e precisam do engajamento de todos os setores, cada um com sua competência, para que sejam superados. No Brasil, a evolução da consciência ambiental e os movimentos nessa direção recebem muito mais investimentos que no passado recente. Certamente o acréscimo da palavra ‘social’ – que resultou no termo ‘socioambiental’ – reflete a compreensão de que não é possível a proteção e a preservação da natureza sem preocupação com as pessoas e seu bem-estar. Essa migração de investimento fez muitos projetos sociais serem encerrados ou reduzidos, ainda não profissionalizados e sem ter atingido competência administrativa e técnica; aspectos até então incentivados pelo financiamento corporativo. Esse movimento acompanhou melhora considerável do investimento governamental em ações sociais e da organização de sistemas mais estruturados nas políticas sociais etc.. Contudo, o Estado brasileiro ainda está longe de mudar culturas enraizadas nas quais prevaleciam o ‘favor’ e não os direitos dos cidadãos. Além disso, muitos dos municípios – principais responsáveis pela implantação das ações sociais, ambientais e culturais – ainda não estão preparados para planejar e executar tais ações. A contratação/ parceria/transferência de serviços para organizações da sociedade civil é outro ponto de tensão nas ações sociais. O risco de precarização, com salários muito baixos e falta de formação contínua desqualifica os serviços. Por outro lado, quando se vêem tentativas de execução direta dos serviços pelo poder público, a burocracia e as ingerências políticas tornam os programas muito ineficazes. O que se percebe é a necessidade de profissionalizar a gestão das iniciativas de investimento público/ privado. As políticas públicas sociais, culturais e ambientais vão se organizando pouco a pouco (na figura do Estado brasileiro) e também as iniciativas do setor privado -- especialmente aquelas que buscam maior institucionalização (como na criação de um instituto ou fundação) e profissionalização (colaboradores dedicados exclusivamente a esses assuntos). Mas ainda há muito a caminhar: políticas públicas 57 GSI – Global Social Impact, Sustentabilidade Organizacional, Ideias e Propostas muitas vezes são mais de governo do que do Estado, portanto têm baixa continuidade. No setor privado, as iniciativas com objetivos públicos também ainda não ganharam centralidade -- com exceções -- o que leva também ao reduzido impacto e continuidade. Na parceria entre sociedade civil, iniciativa privada e poder público, cada um tem um papel bem definido. A crença de que o poder público pode resolver tudo é algo que se esgotou. É a mobilização social e todas as formas de participação que legitimam o governo e nesse novo cenário, as ONGs têm um papel relevante a cumprir. Por outro lado, as empresas estão mais conscientes de que seu papel na sociedade vai além do desenvolvimento econômico. Temos aí um grande vazio onde o poder público pode atuar, servindo de ponte entre os dois setores. Esta ponte tem que ser construída, não apenas para condução de dinheiro de um setor a outro via renúncia fiscal, mas aproveitando o talento inovador das ONGs para disseminar políticas públicas que podem modificar a vida da comunidade. Há um ditado africano segundo o qual "se você quiser ir rápido, vá sozinho; se você quiser ir longe, vá junto". Ele é muito importante de ser considerado nas iniciativas público-privadas. As instituições públicas têm natureza, valores, velocidades, até linguagens diversas das do setor privado. Para trabalharem juntos, esses setores precisam dedicar muito tempo alinhando valores, coordenando expectativas de velocidade e de resultados, aprendendo a dialogar. O que se vê com frequência nessas parcerias é a dominação de um dos pólos, em geral, por quem tem mais dinheiro. Isso distorce as relações e tende a di- O papel do terceiro setor é, justamente, o de ofeminuir os resultados públicos que poderiam ser al- recer a sua experiência setorial e territorial, dirigida cançados, em detrimento de interesses privados. aos novos e aos velhos problemas. A área governamental não consegue fazer isso. A função principal Assistência Social do governo é a garantia de direitos universais, sem A necessidade humana tem motivado as grandes setorialização, com linearidade, sem diferenças. Mas descobertas, mudanças e reflexões. Ela aponta para a sociedade hoje é tão diferenciada, são tantas as neas relações sociais e ambientais em busca de soluções cessidades, tão divergentes as culturas, num fenômepara os problemas. O terceiro setor se constrói neste no com o qual o governo precisa lidar. Hoje ele se esforça por manter programas de inclusão e atender olhar e mobiliza, questiona, articula e realiza. os "desiguais, de forma desigual" buscando promoHá uma grande preocupação no campo social quan- ver igualdade, mas para fazer isso tem que se desto a políticas públicas executadas por organizações dobrar, ato que, para ele, é sempre mais difícil, por dos três setores (Estado, empresas e organizações da fugir à lógica da universalização que é sua própria sociedade civil), como o Sistema Único de Saúde, característica. o Sistema Único de Assistência Social ou mesmo a Educação Infantil brasileira. Muitos percebem que, As organizações de controle social que atuam nos no lugar de o Estado aproveitar a originalidade das municípios tomam contato com a maioria dos casos organizações da sociedade civil para qualificar a po- de corrupção. Elas facilitam a identificação, denúnlítica pública, tende a terceirizar sua própria políti- cias e punição dos agentes que colocam em risco o ca, pagando para uma organização da sociedade civil tripé da sustentabilidade. Para reflexão, é recomenexecutar ações determinadas fora e acima delas. Nes- dado o curta-metragem "Ilha das Flores", dirigido sa terceirização, ocorre frequente precarização nas re- por Jorge Furtado, que ilustra a importância da atualações de trabalho das ONGs, além da perda de sua ção conjunta dos vários setores da sociedade. http:// www.youtube.com/watch?v=KAzhAXjUG28 contribuição original para a causa em questão. Seja sob a forma de movimentos sociais, seja como investimento social proposto por empresas privadas ou a sociedade civil organizada, a mobilização popular historicamente tem sido importante para gerar transformação. Nesse sentido, ações derivadas de esforços envolvendo os três setores tornam-se ainda mais essenciais e os recursos tecnológicos constituem elementos para potencializar tais ações em rede. 58 A atual legislação da administração pública, bem como a precariedade na formação dos gestores públicos são dois componentes importantes que dificultam muito iniciativas bem sucedidas de cooperação público-privada. Torna-se urgente atuar nessas duas dimensões para o aperfeiçoamento da gestão pública. De fato, o SUS ilustra muito bem essa complexida- Relatório GSI JAM 2011 de. É um dos melhores sistemas de saúde do mundo e a saúde no Brasil persiste no conhecido caos enquanto o poder público penaliza o contribuinte com mais impostos. A emenda 29, por exemplo, que fixa os percentuais mínimos a serem investidos anualmente em saúde pela União, por estados e municípios, se arrasta desde 2000. Naquele ano, a emenda obrigou a União a investir em saúde, 5% a mais do que havia investido no ano anterior e determinou que nos anos seguintes esse valor fosse corrigido pela variação nominal do PIB. Os estados ficaram obrigados a aplicar 12% da arrecadação de impostos, e os municípios, 15%. Essa regra deveria ter vigorado até 2004, mas que continua em vigor por falta de uma lei complementar que a regulamente. O verdadeiro pacto pelo SUS seria uma atitude corajosa do poder público, se aliada à excelência de administração da iniciativa privada. Investimento Social Privado (ISP) As mudanças profundas que vêm ocorrendo nas últimas décadas na economia mundial têm provocado transformações na maneira como as empresas trabalham e constroem sua imagem ou marca perante a sociedade. No Brasil, fatores adicionais como a democratização do país e problemas sociais e ambientais crescentes também implicam novas demandas para essas empresas. Ao papel tradicional de gerar bens e serviços, lucro, trabalho e pagar impostos, somam-se desafios como tornar-se socialmente responsável e fazer investimentos sociais. E, de fato, muitas empresas já demonstram preocupação, não apenas com o lucro de suas atividades econômicas, mas também com a sustentabilidade socioambiental do entorno. De fato, a expressão Investimento Social Privado (ISP) corresponde ao repasse de recursos privados para projetos de interesse público de forma sistemática, voluntária, planejada e monitorada. E como esse investimento privado de interesse público contribui para a sustentabilidade das empresas? As áreas de atuação do investimento social se alinham entre as necessidades da sociedade e a estratégia da empresa? ideia envolve novas estratégias, conceitos e organizações que atendam as necessidades sociais, ampliando e fortalecendo a sociedade civil. A reflexão sobre sustentabilidade e estratégias corporativas traz à tona o questionamento quanto ao papel da comunidade e suas lideranças locais formais e informais – seja do entorno da empresa ou da própria região onde ela está inserida – e sobre como essa comunidade é ouvida nas suas demandas e expectativas. O diálogo entre as empresas e seus stakeholders deve acontecer a partir de temas de interesse de ambos, garantindo que iniciativas propostas tenham valor compartilhado. Dessa forma, os atores sociais, sejam eles líderes sociais, representantes do poder público etc. poderão atuar como articuladores, mobilizadores, parceiros de estrutura, parceiros de rede... O Investimento Social Privado e a Sustentabilidade se complementam. O ISP tem muito a contribuir, investindo em projetos associados aos pilares da sustentabilidade – impactos econômico, social e ambiental. Dentro da empresa, as áreas de sustentabilidade e ISP devem estar alinhadas – enquanto ISP tem foco mais claro, geralmente na comunidade externa à empresa, a sustentabilidade tem abrangência mais ampla, envolvendo todos os stakeholders. Mesmo com a diferença de foco, o espírito e os valores que guiam sustentabilidade e ISP são muito semelhantes – ética, respeito às diferenças, ênfase no diálogo, entre outros. Há mesmo quem diga que, bem gerida, a área de ISP pode se tornar uma espécie de reserva de ‘inteligência social’ da empresa, por ser onde se desenvolve a capacidade de lidar e conversar com públicos vários, não apenas da forma como uma organização costuma se relacionar, mas também comercial ou institucionalmente. Assim, os aprendizados do investimento social podem contaminar positivamente as outras áreas da empresa, bem como os projetos de sustentabilidade. Um exemplo desse fenômeno é quando um bom projeto de voluntariado consegue reunir funcionários de diferentes níveis hierárquicos, ou mesmo de empresas na cadeia de suprimento. O tipo de ligação que se cria traz outra qualidade às relações entre fornecedores, clientes e parceiros. Nas empresas onde os executivos dão prioridade ao tema, ocorre uma mudança efetiva de cultura. Mas como envolver os executivos, costumeiramente tão voltados para os resultados econômicos? O ISP está ligado à sustentabilidade do negócio, além da transformação social. Esse aspecto traduz um conceito importante acerca da Inovação Social, apresentado por John Elkington, co-fundador da ONG SustainAbility: “o desafio da sustentabilidade não é ser somente bom, mas transformar a economia global num modelo mais sustentável de negócio”. A No mínimo, podem-se adotar duas perspectivas – 59 GSI – Global Social Impact, Sustentabilidade Organizacional, Ideias e Propostas uma pelo custo, outra pela oportunidade. Pelo custo, a idéia é mostrar como o foco exclusivo no econômico pode ser prejudicial à empresa no médio e longo prazo. Por exemplo, os bancos agregam cada vez mais a análise dos riscos ambientais, depois de terem percebido que muitos projetos aparentemente lucrativos resultaram em prejuízo a partir da incorporação dos passivos ambientais na conta. É em oportunidades como essa que as empresas percebem que a abordagem séria de questões sociais, ambientais e culturais pode diferenciá-las de seus concorrentes, além de melhorar a relação com seus diferentes grupos de interesse. Idealmente, devem-se combinar as duas estratégias, embora ainda não seja algo fácil de concretizar. Recentemente, Aerton Paiva (consultor em sustentabilidade) demonstrou uma situação em texto publicado em seu blog (http://gestaoorigami.com. br/aertonpaiva/about/). Em um edifício, 1/3 dos moradores tinham crianças e queriam aprovar um playground, enquanto os demais discordavam. Solicitaram uma avaliação por uma empresa, buscando identificar se esse tipo de melhorias interferiria na valorização do prédio – resultado: instalou-se o playground. Quando se percebe valor financeiro, fica mais fácil argumentar. Dessa forma, as empresas acabam também alinhando seu ISP ao negócio. O engajamento dos altos executivos acontece somente quando eles percebem o valor compartilhado da iniciativa. Isto exige a demonstração de que o interesse público pode produzir impacto sobre o modelo de negócio nos seus ativos tangíveis e intangíveis. Embora esta fala pareça muito empresarial, é o ponto de ligação entre o negócio e o ISP, gerando valor compartilhado. Quando se cria essa conexão, a linha de comando se mobiliza, cria indicadores e gerencia o processo. Daí a importância de avaliar também o investimento social, mesmo que os indicadores sejam intangíveis ou de longo prazo. questões sociais onde podem agregar maior valor. A partir daí, identificam uma agenda social corporativa conforme o grau mais plausível de compartilhamento entre negócio e sociedade: • Questões sociais gerais: são áreas importantes, mas que não são diretamente afetadas pelas atividades da empresa, nem têm influência na competitividade no longo prazo. Estão ligadas à boa cidadania corporativa • Impactos sociais na cadeia de valor: definir as áreas nas quais as empresas têm grande impacto social ou ambiental. Caso, por exemplo, de indústrias que utilizam grande quantidade de água e produzem efluentes, ou utilizam árvores com matéria-prima, ou testam produtos em animais • Dimensões sociais do contexto competitivo: perceber em que medida os ambientes externos afetam a empresa. Para um fabricante de automóveis, por exemplo, um fator importante é a condição das ruas e estradas no mercado onde opera • Dessa forma, quanto maior for o valor estratégico do projeto desenhado, maior será o engajamento dos líderes da organização. • Na BASF, por exemplo, há uma série de iniciativas de investimento social privado que contribuem para o sucesso corporativo e social no longo prazo. Todas têm atuação no desenvolvimento das comunidades do entorno das unidades fabris, tendo como foco a educação e a construção de uma base comum de informações sobre meio ambiente e ciência. Considerando sua atuação na prestação de serviço e não na venda de produtos, e percebendo isso como um desafio adicional para a gestão da sustentabilidade, a Redecard desenvolveu uma proposta de voluntariado num dos programas do Instituto Redecard – o Empreendedorismo Social –, com vistas a capacitar ONGs e Cooperativas em gestão para a sustenMichael Porter, diretor do Institute for Strategy and tabilidade financeira, pela atuação de funcionários Competitiveness, da Harvard Business School aprecomo consultores sociais, compartilhando conhecisenta uma reflexão acerca do desafio enfrentado por mentos de negócio com as organizações. cada empresa a fim de descobrir em quais áreas pode criar valor com suas competências. Primeiro, elas de- É necessário repensar os valores éticos. O avanço e vem entender seu papel em relação às questões so- crescimento da sociedade estão acontecendo numa ciais: 1- as empresas não podem resolver todos os velocidade sem precedentes, difícil de acompanhar. problemas sociais, nem arcar com o custo de fazer Muitos jovens não conseguem perceber como cheisso. 2- precisam abordar sua agenda social de ma- gamos até este ponto, como os eventos do século neira proativa e estratégica. e 3- precisam agir nas passado moldaram o mundo atual; portanto, não 60 Relatório GSI JAM 2011 conseguem perceber riscos no futuro. Uma fórmula precisa ser encontrada rapidamente, a partir da visão utópica – uma nova ordem baseada na união da sociedade para resgatar valores na família, nas empresas, na política, nas relações sociais, nos templos e nas escolas, com vistas a uma sociedade baseada no mérito. em seu território, de modo a tornar-se eficaz. Desta forma, mesmo que mudem os atores, o trabalho cria raízes e vida própria. A definição dos papéis de cada setor é fruto do amadurecimento da estratégia social escolhida. Muitas vezes debate-se o impacto do investimento público na aplicação do investimento privado em tecnologias verdes. Por exemplo, qual é a utilidade desses subsídios no avanço das energias renováveis, quando grandes subsídios são aplicados nas tecnologias da era do combustível fóssil em quantidades ainda maiores? Desde 2007 até meados de 2010, mais de 1,6 trilhões de dólares em investimentos foram aplicados pelos governos na utilização dessas tecnologias nas infraestruturas nacionais. Os resultados podem ser acompanhados pelo site: http:// www.ethicalmarkets.com/category/green-transitionscoreboard/ A compaixão e a solidariedade, que até pouco tempo atrás eram os únicos motivadores para o financiamento de ações sociais, foram paulatinamente substituídas pela busca de resultados eficientes e de incentivos fiscais que beneficiassem empresas e demais doadores. O resultado é que as organizações sociais tiveram que se adaptar ao novo modelo de gestão, imposto de um lado pela iniciativa privada, com suas planilhas e projetos de curto e médio prazo e, de outro, pelo poder público, que oferece incentivos sob a forma de deduções fiscais contra a prestação de contas dos recursos aplicados, nos moldes dos convênios firmados com as empresas contratadas. No Brasil, os investimentos públicos em tecnologias verdes são praticamente inexistentes. As ONGs ambientalistas trabalham com fomento à economia de baixo carbono, com incentivos a tecnologias limpas. Encontram grande dificuldade em obter financiamento, pois os processos licitatórios das grandes empresas públicas acabam elegendo projetos conservadores, sob a alegação de que é mais fácil ter controle sobre o que já é conhecido. As ONGs vivem hoje na intenção de se profissionalizarem, assumindo o desafio de ser empreendedoras em busca de sustentabilidade. Um dos caminhos possíveis é a elaboração de projetos que atendam as exigências das empresas e do poder público, priorizando e/ou redefinindo o foco do seu trabalho. Ir do assistencialismo ao profissionalismo sem perder a visão humanista é um dos principais desafios. Todo este processo exige preparação do público interno para uma nova gestão, que precisará de conhecimentos, ferramentas e instrumentos de avaliação para dar credibilidade a seus resultados e metas observados. É um momento em que a ONG precisa estabelecer novas redes de relacionamentos, demonstrando suas potencialidades, possibilidades de atuação e poder de inovação. Desta forma, é possível fortalecer e criar novos negócios, multiplicando suas fontes de recursos e parcerias. Mobilização Social Parece que a dificuldade em alinhar os três setores reside na natureza, objetivos e resultados esperados por cada um deles. Rebaixar as expectativas governamentais e corporativas quanto aos resultados de imagem, transferindo o foco para a eficiência e eficácia dos programas – isso traria melhor aproveitamento dos recursos e levaria à necessária profissionalização das organizações do terceiro setor, com perspectiva de abandonar a cultura do voluntarismo em prol de Durante a década de 90, o setor estava inspirado e um novo paradigma de fazer junto, mais e melhor. em visível crescimento. As notícias de novas iniciaA questão da educação Ilustra esta fragmentação en- tivas e lideranças visionárias eram constantes. Pestre os setores: ali parece haver consenso quanto a suas soas empreendendo projetos ousados, vencendo os mazelas, os diagnósticos abundam, mas não existe limites da criatividade, propunham soluções para disposição para um projeto conjunto que inclua os problemas antigos. A sensação era de um setor jorecursos dos três setores num pacto pela educação vial e pioneiro. Vinte anos se passaram, a demanda com objetivo, prazo e métrica definidos. pela profissionalização se firmou. Entretanto, houve Sair da esfera do meu para o nosso será o grande pouca renovação de lideranças na maioria das orgadesafio. A ação social não tem fronteiras e é preci- nizações. Quando alavancada, essa fase de desenvolso que o projeto social interaja com todos os atores vimento organizacional pode trazer profundas mu61 GSI – Global Social Impact, Sustentabilidade Organizacional, Ideias e Propostas danças ao setor, mas ainda não é o que se percebe. Por outro lado, essas duas décadas transformaram algumas organizações em executoras de serviços públicos e em propositoras de projetos. Parece que a competência para influenciar nas políticas públicas ainda é pontual. O modo de fazer da empresa é adotado por algumas ONGs. Há quem diga que primeiro e segundo setores agem com a pose de quem paga a conta, tirando das organizações do terceiro setor a espontaneidade e a criatividade. Para outros, avaliação e criatividade podem conviver, não sendo necessariamente incompatíveis na rotina de atividades – a sistematização do aprendizado fornece subsídios para perceber o que está funcionando e o que pode ser melhorado. A criatividade está na essência e dá elementos para – sistematizando e avaliando – aprender a partir do que a organização faz. Tornando parceiros esses movimentos aparentemente antagônicos. E se as ONGs forem capazes de fazer isso, poderão ajudar as empresas, apontando formatos mais adequados para seu próprio uso e para o uso na interface, deslocando o processo burocrático, ‘planilhado’ para um lócus de interesse, curiosidade e participação na avaliação. mas com resultados eficientes e eficazes? Isso talvez diga respeito a quem toma a decisão do investimento na empresa. Se estiver no departamento de comunicação, é natural a preocupação com a repercussão, e isso pode ser saudável. Se estiver em Relações Institucionais ou o projeto derivar da vontade de executivos, pequenos projetos podem florescer, muitas vezes associados aos relacionamentos comunitários que vão sendo construídos. Evidentemente, isso está ligado a uma política de investimento social, mas a maioria das empresas ainda não tem esta estratégia clara. Marcelo Estraviz, da ABCR (Associação Brasileira de Captadores de Recursos) comentou que, em 1992, procurava ações envolvendo crianças em situação de rua onde ser voluntário. Na Praça da Sé, em São Paulo, viu que havia nove organizações trabalhando numa área muito restrita e nenhuma delas cogitava agir em conjunto; cada qual continuaria com sua própria iniciativa e seu próprio método, numa espécie de egoísmo filantrópico. Ressalvou que isso não é prerrogativa das organizações do terceiro setor e que a maioria das empresas e governos preserva suas ações assinadas. Nesse processo de agir em conjunto, Note-se que embora todos saibam que avaliar é pre- será que abririam mão de sua zona de conforto para, ciso, muitas organizações importaram modelos de juntas estabelecerem soluções de consenso para progestão e tiveram que se capacitar para ser medidas blemas complexos? por réguas da iniciativa privada e do poder público. No caso específico do segundo setor, vale observar a Não haverá sucesso no combate aos graves problepresença de empresas em vários estágios evolutivos – mas socioambientais se ações não se derem de forma algumas fazendo o pouco de que dão conta, outras intersetorial. Mas as organizações precisam tornar destinando verba, tempo e energia em ações mais seu discurso um pouco mais transparente, ao adplenas. De outra sorte, há uma dúvida histórica mitir que o conjunto de atores terá mais empenho quanto à validade de desenvolverem suas ações com quando o resultado das ações puder ser contabilium olho na imagem corporativa. Alguns diriam que zado em votos para os governos, em lucro financeié inaceitável e que é função de toda pessoa jurídica ro e imagem para as empresas e em cumprimento cumprir com sua parte. Mas também não se pode de missão pelas organizações, no conhecido jogo do negar que é função da empresa gerar emprego e renganha-ganha-ganha. da. E demonstrar resultados para seus stakeholders. De qualquer modo, do lado da sociedade civil, per- De qualquer modo, deve-se ter em mente que as pescebem-se indícios de um setor que se moderniza, soas jurídicas são constituídas de pessoas físicas e que como no amadurecimento da gestão, com destaque é preferível um empresário engajado a uma empresa para a avaliação; a maior presença de organizações socialmente responsável. Até porque o empresário que têm o judiciário como espaço de atuação; e inspira a empresa, mas o contrário dificilmente ocoro fortalecimento dos negócios sociais, em pauta que re. De qualquer maneira, as empresas continuarão a Ashoka, visionária, trouxe no final dos anos 90. buscando lucro, assim como os acionistas, desde que não seja a qualquer custo. Já os empresários, executiA preparação das ONGs é inevitável e exigida, mas vos, empregados... esses podem ir muito mais longe. como fica a preparação e o foco das empresas acerca de seus investimentos sociais? Como sensibilizá-las Tratando de doações, é possível desenvolver uma para pequenos projetos, sem grandes repercussões, cultura da doação no Brasil na próxima década, 62 Relatório GSI JAM 2011 é dinâmica e, a todo momento, surgem novas lideranças e novas visões de como deve ser a sociedade que queremos. Por esse motivo, há necessidade de estarmos antenados e refletindo permanentemente sobre o que acontece no terceiro setor. Os empreendedores sociais inovam nos campos da educação, da saúde, da cultura etc. e se constituem em uma vanguarda transformadora da sociedade. A liberdade de que gozam não se vê no setor privado, muito menos Além de iniciativas, será que a sociedade tem desenno setor público. Eles potencializam revoluções nos volvido boas "acabativas" – ou o compromisso de campos em que atuam. acabar o trabalho em algum momento? Há ações, projetos, ONGs, fóruns que se reúnem até que um 2. O ciclo de vida de um projeto: na prática fazemos problema seja definitivamente solucionado? En- diferença? Os projetos fazem diferença e ainda bem quanto as organizações estiverem encantadas com que temos tantos prêmios paras as organizações do o resultado que conseguem em suas ações, mas não terceiro setor, que se constituem em um verdadeiro compartilharem isso com a sociedade, não haverá banco de dados de iniciativas que causam impactos. "acabativas". Nesse sentido, o governo pode fazer Eu participei da iniciativa da Fundação Banco do uma ponte entre a iniciativa privada e a sociedade Brasil para criar um banco de tecnologias sociais. civil organizada, transformando as inovações, as Esse projeto é importantíssimo e tem sido a inspipropostas diferenciadas em políticas públicas e am- ração para que tecnologias inovadoras sejam replipliando a escala. De qualquer modo, os resultados cadas. O projeto em si pode até acabar, mas o que precisam ser mais evidentes, fora dos muros da ins- importa é o registro da tecnologia – isso não existia tituição, chegar à escola do bairro, à igreja, enfim, há vinte anos! tornar-se vívidos e palpáveis. 3. O papel das universidades: qual tem sido o papel Uma questão que se impõe, hora ou outra, é a dos das universidades no desenvolvimento das iniciativas recursos financeiros. Eles são suficientes para gerir as de investimento público e privado? A universidade ações sociais e as organizações não sabem onde bus- tem um papel central para formar capital humano cá-los? Ou são escassos mesmo? Talvez as duas situa- que irá viabilizar as iniciativas dos investimentos ções ocorram. Há organizações rivalizando em busca públicos e privados. Os setores público e privado da mesma fonte de financiamento e empresas que somente ganharam peso econômico e social graças gostariam de beneficiar projetos, mas desconhecem à dedicação das universidades na formação de proorganizações de confiança. O caminho para unir os fissionais especializados para tais setores. O capital pontos talvez seja o da divulgação. Exemplo claro humano é o principal capital de qualquer atividade. é o FUMCAD (Fundo Municipal da Criança e do No processo de mobilização, um dos aspectos cenAdolescente), que cresceu muito, mas ainda é destrais é a questão dos grupos de interesse. Só se moconhecido da maioria das empresas e instituições de bilizam os interessados diretos e há espaço para inSão Paulo. O Fundo existe há mais de uma década fluenciar, envolver previamente de modo a gerar esse e as organizações ainda enfrentam dificuldade para interesse. A questão é como fazer isso. É preciso que apresentar projetos, captar recursos, prestar contas e existam objetivos comuns para surgir engajamento. dar visibilidade às ações sociais patrocinadas. TamNessa mobilização, também são válidas as parcerias bém o despreparo de grande parte de organizações entre instituições que atuam numa mesma área, ou do terceiro setor para captar recursos de forma planum mesmo nicho. Muitas vezes, mobilizar organinejada e mediante projetos de médio e longo prazo zações sociais e estabelecer parcerias com elas é o pripode ser um dos fatores que impedem a realização meiro passo para gerar interesse em outros atores, de mais ações. como os próprios investidores e o poder público. Três perguntas feitas por Daniel Brandão (MOVE) e A sociedade brasileira é muito solidária e se mobiliza respondidas por Luis Carlos Merege (IATS): por causas. O problema é que o interesse é passa1. A visão e as lideranças: envelhecemos? A realidade geiro e as causas pontuais. O difícil é manter a mopartindo da condição de pouca qualificação atual. Doamos para o Teleton, doamos até erroneamente nos semáforos, mas poderíamos doar mais e melhor, desde que as organizações soubessem também pedir mais e melhor. Até (utopicamente talvez) o fim dos problemas. Como no slogan da CARE: “somando forças até o fim da pobreza”, como um desafio estimulante, engajado. 63 GSI – Global Social Impact, Sustentabilidade Organizacional, Ideias e Propostas bilização. Mas mobilizar para um projeto de trans- pecíficos. No entanto, pesquisas recentes demonsformação social é mais difícil do que para ajudar as tram que é possível criar uma relação sadia em alianças estratégicas intersetoriais, nas quais os interesses vítimas da enchente. individuais sejam preservados e, ao mesmo tempo, A gestão de uma ONG é algo complexo. Na ponse produzam interesses coletivos. Pesquisas indicam ta, costuma-se oferecer serviços de muita qualidade que empresas que vinculam o que sabem fazer de para quem não pode pagar, inovando a partir das melhor no campo dos negócios ao meio social acaexperiências singulares. Por isso e ao mesmo tembam produzindo ações mais efetivas e sustentáveis. po, há que conquistar terceiros financiadores que se Por exemplo: organizações privadas de tecnologia envolvam na causa. Nesta equação, sob o ponto de que utilizam tais recursos em projetos sociais acavista da gestão da ONG restam algumas dificuldabam gerando uma ação social de maior qualidade, des, como recursos ‘carimbados’ em rubricas, grane isso resulta em benefícios para a iniciativa privade preocupação na prestação de contas e pouco foco da e para a sociedade. Por outro lado, organizações no plano de trabalho, além da dificuldade em consociais também podem trabalhar como parceiras de vencer o investidor quanto à necessidade de também empresas, com seus conhecimentos e metodologias apoiar as despesas fixas. Neste sentido, alguns prode intervenção que são muito efetivos. O importanpõem ‘educar’ o investidor, ao mesmo tempo em que te, aqui, é que elas consigam preservar a autonomia promovem um "choque de credibilidade". Uma hie a qualidade das ações que desenvolvem. Para que pótese é trazer o investidor para mais perto, criando isso aconteça, devem ser construídos projetos coletiuma parceria não apenas econômica, mas também vos nos quais as empresas compreendam seu papel, de gestão, buscando novos modelos e educando não deve haver uma visão de parceria (integrativa) e não apenas o investidor social, mas toda a comunidade de tomador de recursos x investidor (visão assistennesse sentido. cialista) e um olhar para a comunicação e a relação Parece haver certa desconfiança impedindo a fluidez que se estabelece como elementos importantes nesse desse processo. Do lado dos investidores, talvez falte processo. Tudo isso vai ajudar significativamente a uma aposta na competência de quem faz e, do lado aprimorar a qualidade das alianças. das ONGs, a compreensão dos interesses. O investi‘Educar’ investidores pode ser importante e a credidor quer saber qual é a lei de incentivo que está sendo bilidade é a melhor abertura nesse sentido. Há uma usada e, por vezes, demonstra pouco interesse pelo lógica de poder envolvida na idéia de ‘quem paga’ projeto em si. Há aqueles que ‘investem’ porque preque ainda sobrepõe interesses de investidores aos de cisam fazer TACs (Termo de Compromisso de Ajusrealizadores. Contudo, cada vez mais percebemos o te de Conduta) com o poder público e a sociedade. poder implícito dos resultados sociais e sua exposiHá aqueles que se ‘profissionalizam’ para maximização/divulgação. Isso aponta para a importância de ção do uso dessas leis, estabelecendo institutos que avaliar e entender a lógica do marketing, língua são um tipo de investimento para reduzir impostos. muito falada pelos investidores e também necessáPersonagens como esses ajudam a justificar a discusria às organizações sociais. Certas organizações têm são do greenwash no mundo inteiro. De qualquer aprendido muito com as ferramentas e linguagens modo, o investidor social é movido por interesses do mundo corporativo e agregam seu próprio jeito. e não está de todo errado, pois está investindo e busComunicar bem o que fazem, avaliar o que é resulca obter retorno. Mas os representantes do terceiro tado para o trabalho, uma gestão mais eficiente – são setor propõem a criação de modelos novos, que vão todos facilitadores para a aproximação. produzir diferença efetiva: projetos inéditos, inovadores, que consigam envolver a sociedade e mudar a Algumas ferramentas, como o questionário de medirealidade do público alvo. Podem ser simples, mas ção de capital social, ou o Marco Lógico para planede impacto, com perspectiva (e planejamento) de jamentos e avaliações do Banco Mundial, por exemcontinuidade, ‘amarrados‘ de forma que na troca de plo, têm contribuído de forma significativa para que diretoria ou de gestor público, corram menos risco diagnósticos sobre relações e parcerias e planos de de ser cancelados, levando por terra todo o esforço, ação sejam criados de forma mais efetiva. Esses instrumentos têm ajudado muitas comunidades e orrecursos e expectativa. ganizações sociais no processo de construção social. É fato que as organizações sociais têm interesses es64 Relatório GSI JAM 2011 Ainda assim, é sempre importante que tais instrumentos sejam avaliados à luz das necessidades do contexto e, mais do que isso, que possam ser objeto de discussão nas alianças estratégicas setoriais, por exemplo, entre os diversos agentes envolvidos. Eventualmente, é possível combinar um modo de utilização ou de adaptação entre os diversos interessados envolvidos. Essa é uma forma de a ferramenta estar a favor das ONGs. A credibilidade é irmã da Transparência. E ser transparente numa organização social está além de apresentar balanços e planilhas de custos. Transpira na maneira como o gestor se porta dentro da instituição, como as decisões são tomadas, quais os meios de comunicação que usa para falar com a sociedade e para dentro dos seus muros. Muitas organizações usam a roda de conversa com as suas crianças e adolescentes. Seria bom que estas rodas fossem ampliadas para a comunidade e envolvessem os investidores, a mídia, mediante ferramentas do marketing, mas de forma nova, com foco no estabelecimento de redes de comunicação. Uma roda de conversa é uma ótima imagem. Talvez uma reunião de planilhas e relatórios ganhe outra legitimidade e consistência depois que o investidor for convidado a dar uma volta na Praça da República com um educador (no caso de um projeto do Quixote). Talvez indicar para todos os atores as boas práticas nas parcerias fosse um bom jeito de educar a todos. Comunicação deveria ser a ferramenta mais importante do terceiro setor. No frigir dos ovos, os investidores querem mostrar aos seus vários públicos de interesse quais projetos socioambientais estão apoiando. Simultaneamente, o público alvo que está recebendo os benefícios do projeto precisa de esclarecimentos. Essa é uma das grandes dificuldades de quem atua no terceiro e no primeiro setor e que o segundo setor faz muito bem. Ademais, nesta Sociedade do Conhecimento, percebe-se como a comunicação, que acaba se traduzindo em novos meios como o twitter, facebook, orkut etc. tem se tornado o principal elemento de construção social. Pois parcerias, alianças estratégicas intersetoriais, parcerias públicoprivadas somente podem ser originadas a partir das relações que se constroem. E, claro, as relações, no fundo, são feitas de comunicação. ções e gerar transformação social. Em uma pesquisa realizada pelo CEATS, percebeu-se o quanto, muitas vezes, uma aliança estratégica entre empresas, organizações ou governos acaba ficando desalinhada em função de dificuldade de comunicação ou de entendimento. Dessa maneira, olhar para a qualidade da relação que se estabelece entre os diversos atores e aprimorar a comunicação sobre os diversos elementos da ação social é um dos pontos mais importantes em uma ação coletiva. A desconfiança ou a necessidade de criar outra cultura de investimento social, em que os stakeholders acreditem no trabalho desenvolvido e possam se vincular de forma mais efetiva passa por alguns pontos que têm sido observados pelo CEATS em seus estudos. Um desses pontos diz respeito a como as empresas, por exemplo, percebem a ação de investimento social. Quanto mais estiver vinculada à estratégia de negócios corporativos, maior será o vínculo e mais sustentável o investimento. Organizações privadas que utilizam o próprio core business, ou seja, aquilo que sabem fazer de melhor nas ações sociais criam mais aderência nessas ações. Isso é o que alguns estudiosos chamam de estágio integrativo, em que a empresa passa a estar diretamente ligada com suas iniciativas sociais. O pólo oposto seria o das ações meramente filantrópicas. Outro ponto diz respeito à qualidade da relação que se estabelece nas parcerias intersetoriais. O que o Centro tem percebido nesse sentido é que quanto melhor a qualidade de comunicação, maior confiança será gerada nessas alianças. Alinhar expectativas entre os diversos agentes, construir projetos conjuntamente, pensar em indicadores e metas de forma coletiva, preocupar-se com um ambiente onde todos ganhem, garantir qualidade e liberdade de comunicação entre os parceiros é importante para que a aliança estratégica aconteça de forma efetiva. Assim, é possível construir projetos com qualidade e desenvolver um dos aspectos mais críticos na relação: a confiança entre os atores. Ao tratar do investimento público e privado, é essencial focar no compromisso e na continuidade das iniciativas. É claro que primeiro, segundo e terceiro setores têm tempos e formas de trabalhar distintas e que é preciso aprender a agir juntos. Contudo, é Nesse sentido, vários autores têm discutido como o necessário avançar na garantia e compromisso com capital social, ou a capacidade de relacionamento é a continuidade dessas iniciativas. Um bom caminho importante para promover articulações, mobiliza- talvez seja ter um bom projeto, planejado coletiva65 GSI – Global Social Impact, Sustentabilidade Organizacional, Ideias e Propostas mente. Outro ponto importante é garantir a participação da comunidade onde a iniciativa será implantada. Tanto para o poder público quanto para a iniciativa privada, esse processo nem sempre é simples, mas sem essa participação, as iniciativas têm pouca chance de êxito. Do ponto de vista do governo, há ainda dificuldade em estabelecer metas de longo prazo. A participação deve ser buscada constantemente, além de estar prevista como eixo na iniciativa, para que seja efetiva e não mera formalidade. A participação, além de conferir legitimidade ao processo, permite que novos conteúdos sejam agregados e, sobretudo, constrói confiança e vínculos que contribuirão para a sustentabilidade do trabalho. Talvez possa ser desenvolvido um guia para elaboração do plano, com passos básicos que precisam ser dados antes do início da parceria ou como sua primeira atividade. Exemplo de atividade que poderia constar nesse guia: mapeamento preliminar das principais entidades presentes na região e realização de um ou dois encontros com grupo locais para apresentar a proposta do novo projeto que será implantado ali. E depois prever espaços periódicos de troca de informação e prestação de contas entre a entidade que executa o projeto e a comunidade local, sempre com participação do poder público. Assim, o poder público cumpre parte do seu papel ao orientar mais precisamente a entidade que executará o projeto, já que muitas vezes falta essa orientação. Adicionalmente, é fundamental que o Estado/Governo elabore um diagnóstico sério do Terceiro Setor e proponha políticas para ordenar e organizar as atividades dos demais setores e dos governos mesmo. O papel do Estado é de construir estas pontes, mas também o Terceiro Setor precisa se organizar. Em que pese o tempo de atividade das filantrópicas, o Terceiro Setor, na condição de setor distinto do primeiro e do segundo, ainda é novo. Como um setor "nascente" pode se organizar? Talvez da mesma forma que a indústria o fez no século passado. E buscar a definição clara do seu papel, determinando o seu propósito. O conhecimento sobre o terceiro setor necessita avançar dos instrumentos de gerenciamento para a produção de conhecimento sobre o relacionamento do setor com os demais. Este parece ser o desafio ora lançado. Mas qual é o interesse que pode congre66 gar os recursos provenientes dos três setores, como capital, humano, de conhecimento etc.? Talvez as metas do milênio possam ser tomadas como base para uma ação conjunta. Direitos Humanos e o Aprendiz O Brasil vive uma fase de crescimento econômico. Nos últimos anos, vem se destacando como uma ilha de otimismo e pujança, mesmo num cenário internacional de crise econômica e incertezas para a próxima década. Previsões publicadas recentemente prevêem um crescimento para 2010 da ordem de 7,2% em relação a 2009. Isso considerando que, nos últimos três anos, quando a crise econômica mundial eclodiu, o país cresceu a taxas de 0,2%, 5,1% e 5,4% respectivamente. Tal crescimento não se reflete na mesma proporção e velocidade para a melhoria dos indicadores sociais brasileiros. Segundo pesquisa elaborada pela Consultoria Internacional Manpower (veja matéria no site www.placardoaprendiz.org.br) junto a um universo de 1.000 empresas pesquisadas, 64% declaram ter dificuldade para preencher as vagas disponíveis, exatamente pela falta de mão de obra qualificada. Nesse aspecto, a lei da aprendizagem tem muito a contribuir. O grande diferencial está no fato de ela garantir uma quota de vagas para os jovens de 14 a 24 anos, cuja empregabilidade está diretamente vinculada à formação educacional. Além disso, ela determina que o aprendiz esteja obrigatoriamente cursando ou tenha concluído o ensino médio. Hoje em dia, há cerca de 200.000 aprendizes contratados ante um potencial de 1.200.000 no Brasil inteiro. O desafio é aumentar esse número de contratados.5 Mas por que existe um potencial tão grande de geração de vagas não realizado? As empresas têm função social, além da sua tradicional função econômica. Elas devem ser responsáveis por qualificar esses jovens. Certamente se beneficiarão, uma vez que terão pessoal qualificado. Mas há que se considerar que existe a função social, que extrapola a mera capacitação. Mobilização e Saúde O Brasil nos últimos 20 anos avançou muito nas políticas públicas, principalmente na saúde. O SUS tem conseguido diminuir a mortalidade infantil, realizado campanhas de vacinação, garantido trans- Relatório GSI JAM 2011 plantes. As diferenças regionais ainda são enormes, mas segundo alguns, isso decorre do subfinanciamento federal e de alguns estados, pois a maioria dos municípios brasileiros tem investido mais do que o previsto para garantir ações de saúde indispensáveis. O setor público deve estabelecer parcerias com o setor privado, mas com metas claras que garantam a transparência dos recursos públicos diretos e indiretos, pois a responsabilidade da gestão é estatal e o setor privado é complementar. Cabe dizer da necessidade de regulamentar a Emenda Constitucional 29 para garantir o uso correto dos recursos e destinar mais recursos federais para o sistema de saúde. Essa busca é por uma política pública que trabalhe ideias, desde mudanças no planejamento das cidades, maior oferta de transporte público, até o aumento da prática de esportes nas comunidades. E crie novas soluções por meio da educação e informação, com o envolvimento de todos estes setores. Ainda soa estranho o tratamento da obesidade infantil como questão de saúde pública, quando ainda persiste a discussão sobre a miséria e a fome, que ainda provocam milhares de mortes de crianças por desnutrição – aqui fica clara a atualidade da expressão País dos contrastes: entre as oito maiores economias do mundo e entre as cinco piores distribuições de renda do planeta. Tanto os governos quanto o mercado só farão investimento social, seja na saúde ou nas demais áreas a partir do momento em que perceberem nisso vantagens para seus objetivos. Para ser mais claro: voto para políticos e lucro para empresários. O SUS/SP tem como parceiro histórico as Santas Casas, entidades filantrópicas que recebem recursos por serviços prestados a ele ou por convênios globais, além de recursos indiretos pela desoneração do recolhimento patronal da folha de pessoal e outros impostos. Nem sempre essa parceria é fácil, pois falta profissionalização da gerência de algumas instituiNos últimos 35 anos, o Brasil passou por uma imções e a questão do trabalho médico na maioria das pressionante transformação. Completou a transiSantas Casas médias e pequenas ainda não foi resolção de país rural para sociedade urbana e industrial, vida e estabelece uma relação de trabalho precária. deixou para trás índices vergonhosos de mortalidaO Estado de São Paulo criou as OSs (Organizações de infantil e analfabetismo e, depois que conseguiu Sociais) para gerir novos hospitais e, recentemente, a domar a inflação, nos anos 1990, consolidou um Lei foi alterada para permitir atendimento a convê- aumento substancial da renda da população. Esse nios em 25% dos leitos dessas instituições. Tal me- conjunto de fatores permitiu reduzir drasticamendida abre importante precedente que pode prejudi- te o histórico problema da desnutrição no Brasil. E car o atendimento aos pacientes do SUS, que terão resultou numa impressionante mudança no padrão menos leitos disponíveis, fazendo aumentar as filas, físico do brasileiro. Desde 1974, quando foi feita a primeira pesquisa familiar que registrou peso e altura principalmente de cirurgias eletivas. dos entrevistados, a população tornou-se mais alta. O Instituto Movere atua desde 2004 na prevenção e O déficit de altura entre crianças declinou da faixa tratamento da obesidade infantil. Pesquisas recentes dos 30% para menos de 10%. Nesse mesmo períapresentam números alarmantes sobre o aumento da odo, o brasileiro ganhou peso. Muito peso. E é aí obesidade no mundo. Nas últimas três décadas, esse que a boa notícia começa a dar lugar à preocupação. número dobrou entre a população obesa. E o Brasil Pois com esse aumento do poder aquisitivo, as famíacompanhou essa tendência. Porém o que fazer com lias foram gradualmente substituindo a alimentação esse dado? A partir dele, pode-se dirimir que o quatradicional da dieta do brasileiro – arroz, feijão, hordro atual tende a piorar se providências não forem taliças – por bebidas e alimentos industrializados, tomadas. como refrigerantes, biscoitos, carnes processadas e O enfretamento da obesidade encontra as mesmas comida pronta. Tudo mais calórico e, em muitos cadificuldades de interlocução e colaboração entre sos, menos nutritivo. Esses novos alimentos introsetores discutidas neste fórum, o que traz limites duzidos nas práticas alimentares da população são para as soluções compartilhadas e abrangentes que muitas vezes mais baratos e fáceis de ser incorporasão exigidas quando se trata de enfrentar problemas dos. Com essa transição nutricional o déficit de peso complexos. Porém o mote dessa interdisciplinarida- atinge hoje menos de 5% da população – o que é um de deve ser trabalhado pela busca de uma política indicador social positivo da maior relevância. Mas o pública em um novo contexto. sobrepeso e a obesidade explodiram. 67 GSI – Global Social Impact, Sustentabilidade Organizacional, Ideias e Propostas A última pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostrou que, se persistir o ritmo de crescimento no número de pessoas acima do peso, em dez anos o país terá se igualado aos Estados Unidos. A Pesquisa de Orçamento Familiar (POF) divulgada pelo IBGE mostra que em todas as regiões do país, em todas as faixas etárias e em todas as faixas de renda aumentou contínua e substancialmente o percentual de pessoas obesas e com excesso de peso. O sobrepeso atinge mais de 30% das crianças entre 5 e 9 anos de idade, cerca de 20% da população entre 10 e 19 anos e nada menos que 48% das mulheres e 50,1% dos homens acima de 20 anos. Entre os 20% mais ricos, o excesso de peso chega a 61,8% na população de mais de 20 anos. Também nesse grupo concentra-se o maior percentual de obesos: 16,9%. O Instituto Movere vem recebendo requisições de atendimento da Secretaria do Estado da Saúde, para atendimento de crianças. Esse dado já comprova que a demanda está crescendo. Ademais, o SUS tem um papel fundamental no trabalho com obesidade mórbida, mas não tem estrutura para fazer certo tipo de intervenção. Nunca é demais reforçar a orientação quanto aos problemas que esta doença pode acarretar a saúde da população. Obesidade é mais do que um problema com a aparência, é um perigo para a saúde. Milhares de mortes relacionadas acontecem todos os anos. Vários problemas médicos graves têm sido ligados à obesidade, incluindo diabetes tipo 2, doenças no coração, pressão alta e infarto. A obesidade também está relacionada a maiores taxas de certos tipos de câncer. Homens obesos têm maior probabilidade de morrer de câncer de cólon, reto ou próstata. Mulheres obesas têm mais chances de morrer de câncer de mama, útero e ovários. Outras doenças e problemas de saúde relacionados à obesidade incluem: • Cálculo biliar e doença na vesícula biliar. • Doença no fígado • Osteoartrite, uma doença na qual as articulações se deterioram. Isso pode ser resultado de excesso de peso nas articulações. • Gota, outra doença que afeta as articulações. • Problemas pulmonares, incluindo apnéia do sono. • Problemas no sistema reprodutivo de 68 mulheres, incluindo infertilidade e irregularidades no ciclo menstrual. Acrescente-se o fato de que importantes custos recaem sobre a sociedade, principalmente médicos e hospitalares para tratar a obesidade e doenças associadas. Em muitos países, os custos diretos chegam a 2 ou 7% do orçamento total de gastos com saúde. No Brasil, o total dos gastos foi equivalente a 3,02% dos custos totais de hospitalização de homens e a 5,83% em mulheres, correspondendo a 6,8 e 9,3% de todas as hospitalizações. Hoje se gasta 1,5 bilhão com a obesidade em nosso país, portanto seu tratamento precoce e prevenção trarão benefícios econômicos, sociais e ambientais. Transparência A luta contra a corrupção, a impunidade e a busca por maior transparência por vezes leva a fazer indagações como a provocação a seguir, compartilhada por Yara Cavini (Guará – Associação Guardiões da rainha das Águas, filiada à Rede Amarribo/IFC): Somos todos corruptos “A conclusão do título é abrupta, vem de chofre como um tapa, mas é verdadeira. A corrupção, não apenas em nosso país, mas em nosso Estado, em nossa cidade, é aplaudida e, quando não ostensivamente, admitida como um fato da vida, como as chuvas de verão ou enchentes em Santa Catarina. E muitas vezes abertamente. Aliás, o Estado Brasileiro nos trata como súditos corruptos aos duvidar de nossa palavra e exigir sempre um carimbo, uma autenticação, um documento a mais, para comprovar o que afirmamos. Somos, desde o início, tratados como malfeitores, em qualquer lugar, especialmente numa repartição pública. Acostumamo-nos com esse tratamento e o reproduzimos na esfera privada. Afinal, como saberei se o que o outro fala é verdade se todos somos corruptos e impera a esperteza?” A corrupção muitas vezes é endêmica e acontece com tanta frequência que nos sentimos como que anestesiados. Esquecemos que há uma diferença entre o habitual e o normal. Temos enfrentado sérios problemas no trabalho de combate à corrupção em nosso município: A princípio enfrentamos a ira e a oposição dos detentores dos Poderes, Executivo e Legislativo. O Legislativo tem procurado dificultar ao máximo o nosso trabalho em Cachoeira Dourada/GO, inclusive até com ameaças. Relatório GSI JAM 2011 O Executivo, além de não atender nossas Petições e Solicitações, ainda tem procurado colocar a população contra a ONG; a comunidade de Cachoeira Dourada é muito dependente de programas sociais e sempre as famílias têm algum parente que depende de contratos de terceirização do governo municipal. O que dificulta ainda mais nosso trabalho. Pessoas ligadas ao Executivo, não sei se por medo de perderem os contratos, tem também nos ameaçado verbalmente. O Ministério Público, que tem o dever constitucional de fazer valer as leis, defender os interesses da sociedade e velar pelo erário público, não tem dado andamento na maioria de nossas representações e nem se pronunciado o porquê. Como continuar um trabalho de voluntariado em meio a todas essas dificuldades e empecilhos? Onde encontrar estímulo para tanto? Necessitamos de mudanças urgentes nas leis, nos costumes e no aprimoramento das instituições! Sustentabilidade das Organizações A intersetorialidade é defendida como um meio eficaz de aplicação de recursos em projetos que buscam resolver problemas socioambientais. Pode ser compreendida como ações conectadas e ordenadas, onde Governos, Mercado e Organizações sem fins lucrativos se alinham, cada qual com seu papel e sem sobreposição, na busca de soluções para questões que demandam ação conjunta. A grande maioria dos participantes do JAM já não tem dúvida quanto à necessidade de gestão profissional, transparência pública e avaliação de resultados como condições para o sucesso de qualquer empreendimento social. Mas como tratar as relações entre público e privado, de forma que não haja confusão de papéis e nem substituição de atribuições, como quando instituições da sociedade civil se tornam responsáveis por programas públicos, como se fossem o próprio governo? As entidades bem intencionadas – empresas ou ONGs – precisam ter em mente que o que compete ao poder público cabe a ele realizar. A rede Amarribo/IFC, em seu trabalho junto às ONGs de Controle Social nos municípios brasileiros, costuma vê-las tomando o lugar do poder público onde ele não funciona. Como tratar essa questão? A resposta é: deixar claros os limites de atuação e o objetivo de auxiliar, nunca de realizar o que é competência do Estado. Alguns pontos sintetizados e questões propostas por Isa Guará (UNIBAN): Parece consensual que o investimento privado em projetos sociais, ambientais e culturais é importante para a promoção do desenvolvimento local, a mitigação da pobreza, a preservação ambiental, o atendimento as necessidades globais de sujeitos e comunidades, mas também está claro que é “preciso fazer junto” (investidores + organizações; organizações + governos; Organizações/empresas + comunidades) desde o planejamento das ações para que o impacto seja maior e mais efetivo. Isto é muito complexo, quando se tem de um lado interesses corporativos, resistência a temas mais polêmicos e a investimento em controle social, equipes com boa formação acadêmica, focalização desvirtuada das demandas efetivas da comunidade e, de outro, instituições ainda pouco profissionalizadas com equipes mal remuneradas, falta de recursos para a garantia da sobrevivência institucional básica, cultura assistencialista etc. Um desequilíbrio de poder financeiro e técnico que leva algumas organizações a usar expedientes inadequados e às vezes ilegais para manter-se atuando (mera constatação, sem base de pesquisa a respeito) O estabelecimento de certo grau de confiança e segurança entre investidores e organizações parece fundamental para se obter apoio. Mas as causas, motivações e estratégias de cada um dos lados têm vários pontos de tensão. Um deles, já apresentado aqui: A exigência de planejamento e de resultado, o monitoramento das ações foram contribuições importantes que os investidores aportaram para as ONGs, mas não houve correspondência em investimentos que garantissem a continuidade destas ações. Os investidores esperam que a organização tenha o básico para atender ao que se dispõe, com o apoio de poder público, mas esta equação não fecha. Portanto, as ações não são planejadas ou avaliadas para produzir conhecimento e sim, quando ocorre, para responder a uma demanda formal do investidor – seja ele público ou privado. O governo, que hoje é o principal “parceiro”- financiador das ações desenvolvidas pela maioria das organizações “terceiriza” serviços, é burocrático, mastodôntico (difícil estabelecer contatos, articular e definir projetos de trabalho entre tantos departamentos, chefes, coordenadores, secretários etc.) que, como diz uma colega aqui, tem talento para a procrastinação. Mas o governo é o único capaz de esta69 GSI – Global Social Impact, Sustentabilidade Organizacional, Ideias e Propostas belecer políticas e programas contínuos, de atender aos direitos universais da população, etc.. E, além disso, o poder público tem limitações legais, normas e limites que ajudam a imobilizar ou postergar ações. Trabalhei lá e sei que há uma barreira quase incontornável nos “departamentos jurídicos”. Vejam que mesmo assim a corrupção não dá trégua. Que tal pensarmos em outras formas legais de controle dos recursos públicos? Como ajudar os governos a valorizar outros resultados além de pretender fazer marketing com “inaugurações, construções, discursos...”? Seremos capazes de influenciar as políticas públicas com as “tecnologias sociais” (como pretendemos) ou será necessária uma ação política de outro tipo? Daniel nos provocou dizendo: na prática fazemos diferença? Eu responderia: construímos algumas pequenas mudanças, mas a diferença só acontecerá se estas mudanças forem potencializadas pelas comunidades e pelo poder público local. A mobilização para determinadas ações têm momentos de ápice – quando se acende a fogueira – mas há um declínio na manutenção e no acompanhamento dos processos, porque isto exige disposição e tempo para “manter acesa a chama”. Por isso, gostei bastante da interrogação colocada aqui sobre “iniciativas” e “acabativas”. Diz o colega Marcelo (Estraviz): Teríamos coragem de abrir mão de nossas zonas de conforto, para junto a mais gente, estabelecer soluções de consenso para problemas complexos? Ou: Seria possível pensarmos acordos para resolução de problemas, até o fim deles? Preciso contar que não li nenhuma referência aos fundos públicos frutos de incentivos fiscais como o Fundo dos Direitos da Criança e do Adolescente, gerido pelos Conselhos, que, aliás, foram instituídos com a clara intenção de que fossem uma Câmara de negociação e de estabelecimento de consenso sobre prioridades de investimento e controle social da aplicação de recursos públicos ampliados com a contribuição das empresas. Infelizmente sua operação tem sido muito precária, com a luta de interesses político-partidários e institucionais prevalecendo sobre um planejamento/avaliação sério das ações desenvolvidas. Só lembrando, a Constituição brasileira (art. 204) e o ECA definem a execução municipalizada das ações; a criação dos Conselhos; a manutenção de fundos da infância e da adolescência vinculados aos Conselhos de Direitos e a necessidade de mobilização da opinião pública para participação nos es- 70 paços de formulação, gestão e controle da política de direitos (art. 88, ECA). Gostaria de ouvir os colegas sobre isto. Fiz uma provocação ontem sobre a mudança de foco do investimento social – lato senso- para o investimento ambiental – strictu senso. Será que minha percepção está equivocada? Será que sob a bandeira da sustentabilidade, as questões sociais (demandas de proteção social, educação, saúde, renda) estão equilibradamente contempladas em relação à questão ambiental, que hoje se tornou a ‘bola da vez’? As coisas têm melhorado muito e rápido, considerando que 85% das organizações sem fins de lucro têm menos de 15 anos de existência. Em muitas situações, as ONGs são mais eficientes que o poder público – as Santas Casas de Misericórdia demonstram isso há mais de cinco séculos no Brasil. Há experiências reportadas em diversos setores, da assistência social à preservação ambiental. Em São Paulo, mais de 80% do serviço social e de saúde está nas mãos das instituições sem fins lucrativos. A parceria é bem-vinda, mas demanda definição clara de papéis e de fiscalização adequada. Qual é o papel de quem? Muitas ONGs, para ter patrocínio e sobreviver, aceitam as condições do governo, com a relação difícil que isso acarreta. Um exemplo são as metodologias do tempo em que, da liberação do orçamento até a liberação para compra do equipamento, passa-se tanto tempo que os valores mudam. E depois, seguese um processo burocrático longo e complexo. Essas organizações, em sua maioria, conhecem a comunidade melhor que o poder público e a iniciativa privada. Mas assim como o Estado pode muito, mas não pode tudo, também elas não podem se arrogar a incumbência sozinhas, especialmente em tarefas que são função do Estado. A parceria, neste sentido, tem que ser ampla, solidificada em propósitos que não sejam pontuais e pactuada com foco no desenvolvimento local. Ademais, o que aconteceria se essas organizações decidissem não trabalhar? seria o caos! A falta de transparência, por exemplo, é um misto de descaso, preguiça e medo. O aparato estatal é lento, procrastina e teme ser transparente. Este medo é filho direto do temor da participação popular. O modelo de gestão pública no Brasil – em que pese a Constituição Parlamentarista – está muito mais para uma estrutura hierarquizada com um poder central do que para uma estrutura mais linear e de trabalho em Relatório GSI JAM 2011 rede, como propõe o Terceiro Setor. Ainda se vêem governos "cabrestando6" eleitores com ações sociais que poderiam ser feitas com maior alcance e eficácia. Há empresas fazendo propaganda de responsabilidade social com dinheiro de tributos (renúncia fiscal), e pessoas vivendo à custa de organizações sem fins de lucro que transformam em verdadeira finalidade os "empregos" de seus associados, em lugar de atender a questão de interesse geral, mesmo considerando que essa não é a regra. Se houvesse um levantamento consistente sobre o volume de recursos investidos naquilo que se chama genericamente de programas sociais e que incluem programas de geração de trabalho e renda, de inserção pela cultura, pelo esporte, de segurança alimentar, de cultura de paz, de educação assistiva, de apoio aos portadores de necessidades especiais etc., seria possível ver que se trata de um montante expressivo de recursos financeiros de origem nacional ou estrangeira, de empresas privadas ou órgãos públicos ou ainda um mix de todas estas fontes. No entanto, apesar do investimento, os resultados obtidos deixam a desejar. A inserção cidadã, a autonomia e a emancipação das comunidades-foco destes investimentos estão longe de ser alcançadas. Por que os investimentos públicos e privados na questão social e também na questão ambiental têm resultados tão modestos e capacidade tão reduzida de promover as transformações perseguidas? Quando as empresas querem propor parcerias para realização de cursos rápidos de capacitação, geração de renda, desenvolvimento humano e local, esquecem que há alguns passos anteriores, quando a maioria desse público termina o segundo grau e é analfabeto funcional. A ONG não é responsável pela falta de base na educação do país, mas mesmo assim, tenta suprir a deficiência. Três meses não capacitam ninguém. Esse é um tempo mínimo e não factível. Talvez esteja faltando compromisso com o término da ação. As tecnologias sociais que as ONGs desenvolveram no correr dos últimos anos podem se tornar políticas públicas para atender um número maior de pessoas. São experiências testadas e moduladas no dia-adia. Reaplicadas em outras comunidades mediante a adaptação de atores e situações, pode surgir um caminho comum. Pois de que adianta um livro paradidático com o texto “Papai foi ao supermercado, estacionou o carro na garagem e a mamãe guardou as compras no freezer.” Que papai? Que carro? Que supermercado? Que freezer? O Estado acaba tendo que fazer o genérico e não consegue descer na especificidade, como as ONGs fazem com sabedoria e naturalidade, preocupadas com os jovens que falam alto, que dormem por exaustão, que levam em média duas horas de condução para chegar ao seu destino e não são respeitados em seus direitos e deveres. Segundo o Aurélio7, ser cidadão é ter direito civil, político e social. As ONGs têm capacidade, conhecimento construído e credibilidade, além de flexibilidade para agir e provocar transformações muito mais efetiva e rapidamente que o poder público ou as empresas. Ocorre que elas raramente têm os recursos para implementar ações no tempo devido e a abrangência necessária, inclusive porque, no Brasil, elas foram vítimas de uma campanha difamatória que as tornou sinônimas das ONGs fictícias, criadas por políticos e mentirosas. A partir daí, as ONGs de verdade com história e trabalho sério, encontraram portas fechadas em alguns órgãos governamentais e empresas públicas. As empresas privadas, por sua vez, passaram a criar seus próprios departamentos de responsabilidade social, sustentabilidade, meio ambiente etc. Eles criam e implementam suas ações. As ONGs ambientalistas especificamente, se profissionalizaram muito. Cresceram em conhecimento e hoje têm grande número de doutores, mestres e pesquisadores em seus quadros, passaram a produzir conhecimento de alto nível. Muitas vezes, como no caso das mudanças climáticas, subsidiaram os governos e até mesmo órgãos internacionais. Por outro lado, não têm reconhecimento no Brasil, tratados com desconfiança por políticos e pela mídia, acusados de querer barrar o progresso, de estar a serviço das instituições estrangeiras etc. Têm buscado fundos no exterior para poder avançar com seus projetos e programas, pois sem as elas, sem seu trabalho sistemático e focado na esfera ambiental, sem os estudos de impacto e sem o saber acumulado nos últimos anos, não há progresso. De qualquer modo, nem todos os políticos são ruins. Há muita gente boa, interessada e pronta a se unir às lideranças sociais. Nem todas as empresas estão preocupadas apenas com seu marketing. O que precisa ser feito no Brasil é unir os recursos e a capacidade de gestão das empresas, com o respaldo jurídico e legal 71 GSI – Global Social Impact, Sustentabilidade Organizacional, Ideias e Propostas do governo e a expertise, flexibilidade e capilaridade das ONGs. Desta forma, haverá projetos com possibilidade de se transformarem em políticas públicas. Caso contrário, o trabalho será sempre pontual. Experiências compartilhadas durante o painel GUARÁ: A Associação Guardiões da Rainha das Águas – GUARÁ é uma Ong de Controle Social, filiada à Rede Amarribo/IFC. Foi criada em 2007 para lutar contra a corrupção que, há décadas, vinha destruindo a cidade de Águas da Prata SP. Temos aqui um santuário ecológico – são 52 cachoeiras catalogadas –águas medicinais milagrosas e um balneário que já foi o maior da América Latina, de arquitetura premiadíssima do arquiteto João Walter Toscano, que foi escolhida para fazer parte do acervo permanente do museu George Pompidou, em Paris. Esse balneário está fechado há vinte anos por incompetência do poder público local. Conseguimos muitas vitórias contra a corrupção, afastamos o grupo que vinha dominando a cidade e agora estamos começando a desenvolver projetos para a recuperação da estância, dos seus pontos turísticos, projetos para capacitar jovens para a cidadania e nosso sonho é ver o Balneário em pleno funcionamento. Para isso buscamos contar com investimento de empresas privadas interessadas em explorar esse filão que é o turismo saúde, turismo ecológico e esportes radicais (rapel de cachoeira, voo livre - temos uma plataforma de salto no Pico do Gavião que é uma das melhores do país, arvorismo, canoismo, etc). Essa infraestrutura de esportes já existe e alguns empresários locais vem investindo em pousadas e locais para recuperação da saúde e do equilíbrio interior em meio à natureza mágica de Águas da Prata. As entidades de Controle Social como as da rede Amarribo/IFC preparam o terreno, limpam a área, arrancam as ervas daninhas da corrupção para que as verbas públicas cheguem intocadas ao seu destino e sejam usadas corretamente pelos gestores municipais (prefeitos e vereadores) e assim o setor privado sintase motivado a participar. Esse trabalho, feita há dez anos, já mostra resultados animadores e nossa meta é que haja pelo menos uma entidade de Controle Social em cada município brasileiro. tem por missão atuar na educação para o empreendedorismo. Essa iniciativa está totalmente vinculada à estratégia empresarial da Redecard e à visão da UNESCO de que a educação para o empreendedorismo é uma das vertentes para o desenvolvimento social. A Redecard conta com significativa participação do pequeno e médio varejo em sua base de clientes; dessa forma, o Instituto Redecard tem o papel de ser a Inteligência Social da empresa, levando conhecimento de gestão para esse público que enfrenta elevado índice de mortalidade, contribuindo para sua redução. Além disso, capta, através de iniciativas específicas, oportunidades, demandas e expectativas desse público para atendê-los da melhor maneira. Ou seja, essa é uma iniciativa que gera valor compartilhado entre o negócio e a sociedade. Uma das iniciativas do Instituto é desenvolver/adequar produtos e serviços ao público de MPEs e MEIs (microempreendedores individuais) com o objetivo de contribuir para o desenvolvimento real de seus negócios, saindo do conceito de oferecer os mesmo pacotes de serviço oferecido para os grandes clientes. É sabido que as demandas e expectativas são diferentes, mas para torná-las mais tangíveis, conduzimos encontros em três capitais para conversar com empreendedores de diferentes segmentos, com o objetivo de ouvi-los e captar suas expectativas, seu entendimento com relação ao desenvolvimento dos meios de pagamentos, demandas e até mesmo problemas. Foi uma experiência muito rica que deixou claro a problemática do capital de giro, elemento fundamental para esses empreendedores. O Instituto teve o papel de articulação de todo o processo e de consolidação das percepções captadas e a Redecard, por sua vez, irá trabalhar esses aspectos de forma a atender o máximo possível essas demandas. Segundo levantamentos do SEBRAE, mais de 50% dos empreendimentos morrem até o terceiros ano de existência. Muito decorrente da falta de conhecimento de gestão por parte dos empreendedores. Consequentemente, pode-se dizer que esse índice deve ser uma preocupação da Redecard, por ter esse público como cliente. Universidade da Água: Atualmente nós da Universidade da Água estamos envolvidos num projeto que pretende mobilizar uma comunidade para que preservem um córrego importante contribuinte de um de nossos reservatórios de água que é a GuarapiranInstituto Redecard: Para reforçar o seu compromis- ga. Isto inclui mudança de comportamento para que so com a Sustentabilidade, a Redecard implemen- não se atire lixo no córrego e se conscientizem do tou, em janeiro de 2010, o Instituto Redecard, que risco de ocupar as suas margens. Remoção das mo72 Relatório GSI JAM 2011 radias já entra num outro plano que já não temos se com a iniciativa pioneira de criar o Centro de Estudos do Terceiro Setor - CETS, na FGV. O impoder. pacto de tal iniciativa foi compensador visto que ouOutra dificuldade que encontramos foi a reforma de tros centros acadêmicos foram criados com o mesmo uma calçada no bairro da Vila Pompéia onde se lepropósito. Quebrou-se um paradigma já que o covou dois anos para convencer o patrocinador, entrar nhecimento de gestão estava limitado à gestão públiem entendimento com o poder público e até com ca e privada. os vizinhos que iriam receber a reforma da calçada de graça. Participaram da criação deste tópico A violência nas regiões metropolitanas vem aumentando exponencialmente. Os condomínios verticais estão virando verdadeiros campos de concentração, inclusive com os mesmos arames farpados. (Lançamos a Campanha Conheça o Seu Vizinho como forma de tentar resgatar a ajuda mútua e solidariedade) http://www.calameo.com/ books/00019162354ca001530e9 Vivemos um momento expansão constante do numero de ONGs, fazendo parte do papel do estado. Que no caso das ONGs chamadas ambientalistas, grupo de que fazemos parte com a Universidade da Água www.uniagua.org.br, essa expansão se dá a partir da Eco 92 como sabemos. Entretanto, como andam os investimentos públicos e privados, que são a fonte de financiamento das ONGs para executar seus projetos socioambientais, tentando cumprir a missão que se destinou cada uma delas? Como anda a sustentabilidade dessas ONGs nos quesitos recursos humanos e materiais para poder exercer os seus papeis? Temos profissionalismo suficiente para captar e gerir os parcos recursos disponíveis no "mercado"? Como podemos remunerar o tempo/serviço desses profissionais, voluntários ou não, para que não tenham que se dedicar a outras atividades para sobreviverem? A produção de projetos candidatos a os fundos oficiais tem a qualidade necessária para obtenção de resultados efetivos? Como podemos reduzir a pressão do greenwash? Na falta de transparência o que predomina: incapacidade de gestão, falta de controle e fiscalização ou má fé? Investimento social privado ou continência com o chapéu alheio (leis de incentivos)? Alcely Barroso, Ana Carolina Velasco, Ana Lucia Vieira, Andrea Shpak, Antonio Ribeiro da Silva Jr., Bell Pereira, Carolina de Mattos Ricardo, Cleide Paiva, Dagmar Garroux, Daniel Brandão, Daniel Vaz, Daniele Paz, Eliane Belfort, Élida Pricila Brasil de Matos, Elidia Novaes, Ester Rosenberg Tarandach, Fernando Nogueira, Fernando Rossetti, Francisco Buonafina, Franco Reinaudo, Fu Kei Lin, Gilmar Altamirano, Graziela Bedoian, Hazel Henderson, Isa Maria Guará, João Ribas, José Luiz Telles, José Ricardo Franco Montoro, Luiz Carlos Merege, Marcelo Estraviz, Maria Iannarelli, Marta Salomão, Melvyn Levitsky, Miriam Duailibi, Paulo Roberto Feldmann, Priscilla Chang, Selio Antonio Moreira da Silva, Susana de Vasconcelos Dias, Tamira Gallucci, Thales Wylton Honorio Barbosa Ribeiro, Tomaz de Aquino Resende, Vera Lucia Perino Barbosa, Victor Barau e Yara Cavini. Artigo de autoria de Cláudia Feliz, Jornalista Amiga da Criança. Link: http://www.promenino.org. br/Ferramentas/DireitosdasCriancaseAdolescentes/ tabid/77/ConteudoId/7128ec18-8909-4c36-b64b5a742145a213/Default.aspx CETS – FGV: Durante 16 anos contribui para a profissionalização da gestão das OTS, que iniciou73 GSI – Global Social Impact, Sustentabilidade Organizacional, Ideias e Propostas f. Word Cloud A ferramenta JAM cria automaticamente uma Word Cloud – ou Nuvem de Palavras – na qual figuram com maior proeminência os termos mais frequentes no debate. Não é surpreendente observar Social, Sustentabilidade, Investimento etc. como mais relevantes. 74 Relatório GSI JAM 2011 6. Considerações finais A colaboração é fundamental para a fluidez das parcerias intersetoriais e é necessário entender que esses arranjos organizacionais não podem ter por objetivo uma ação ou resultado específico. Colaboração é algo maior, em que pessoas físicas e jurídicas buscam trabalhar juntas em prol de um melhor cenário para todos. Considerando o estabelecimento de organizações de diferentes setores como redes sociais em suas cadeias de suprimento e junto a seus demais stakeholders, poder-se-ia pensar numa rede de redes, onde parcerias intersetoriais ocorressem de forma orgânica e espontânea, e não somente através de contratos e acordos formais, pelo estabelecimento de cada qual como rede e da sua integração a outras redes de pessoas e instituições. O próprio JAM exemplifica o potencial desse tipo de iniciativa, tendo a tecnologia da informação com seu papel de catalisador em todo o processo. O ambiente virtual – com finalidade específica, com governança, foco e ações controladas e medidas – torna o contato diferente do que se produz em redes sociais abertas como o Facebook, o Twitter ou outras ferramentas semelhantes. As tecnologias e eventos como o JAM são importantes para troca de ideias, mesmo reconhecendo que o público com possibilidade de acesso ainda é restrito. Essas ferramentas validam o diálogo e as interações entre os atores, tendo a relação direta e participativa como principal condutor. É um desafio integrar as redes com finalidade prática, mas é certo que o debate em meio virtual possibilita a pessoas e instituições de diferentes regiões discutirem e analisarem trabalhos, ideias e possíveis soluções para seus problemas locais, sendo esse um mérito das tecnologias modernas. A estrutura do JAM demandava alguma intimidade com o computador e a linguagem virtual, especialmente com o formato de fórum, o que atraiu alguns e afastou outros. Não foi exigida a anotação de idade, mas talvez tenha havido maior participação de pessoas mais jovens. Embora a princípio tenha sido aferido certo desconforto no acesso, relatado pelo sistema de auxílio ao usuário via skype ou telefone, era perceptível que isso se devia muito mais ao contato ainda incipiente com as ferramentas – de qualquer modo, pode ter dificultado, mas não inviabilizou a participação. Por outro lado, a forte ‘presença’ de pessoas com agendas muito exigentes e o afluxo internacional jamais teriam acontecido se o convite tivesse sido feito para um evento com os mesmos temas e duração, fosse ele presencial. A inserção de expoentes dos três setores promoveu um efeito de onda, que se estendeu por estados e países, pequenas e grandes organizações, atraiu pessoas interessadas. Também os convites feitos por redes sociais, empresas, órgãos do governo e organizações da sociedade civil ao mesmo tempo ampliou e orientou para a criação de um grupo com efetivo interesse pela matéria. Quanto à participação mais reduzida de representantes do primeiro setor, da imprensa e da academia, os organizadores têm como certa a necessidade de esforço mais concentrado nesses convites em ações futuras. Pela configuração do JAM, a grande variedade de temas propostos pulverizou a discussão e fez emergir duas evidências: a viabilidade dos debates em meio virtual e a necessidade/oportunidade de aprofundamento dos assuntos abordados, confirmando a impressão de que o evento teria tocado a ponta de icebergs cruciais. Temática e grupos envolvidos fizeram do GSI JAM um evento de reflexão, com grande número de postagens e evidente expectativa pela observação mais minuciosa das questões propostas. Também pôde ser percebido o grande interesse por questões práticas e ferramentais e pela mobilização e a busca por novos agrupamentos, mais do que pelos temas conceituais e filosóficos. Mesmo o problema de acesso surgido a partir do segundo dia de JAM – com os dissabores na mudança de datas e na consequente diminuição no número de participantes no retorno – permitiu algumas observações por conta da mudança de datas, se somado ao sucesso geral do JAM: O interesse pela sustentabilidade organizacional, suas ferramentas e agrupamentos é real e significativo. Esse interesse é verdadeiro em diversos países. A observação internacional dos avanços ocorridos no Brasil é fato. Um debate realizado em meio remoto é possível e já vai se tornando confortável para mais participantes. Há expectativa de pessoas de todos os segmentos por 75 GSI – Global Social Impact, Sustentabilidade Organizacional, Ideias e Propostas sões mais focadas, com temas mais pontuais, mantendo a configuração virtual e a oportunidade de A busca por soluções mundiais para problemas locompartilhamento internacional de ideias. cais já é palpável. Antes de novos debates, a GSI planeja a produção de Durante os paineis, temas sensíveis e essenciais como mais uma publicação virtual sob a forma de ensaio, benefício mútuo, confiança, transparência, aporte de derivada do presente relatório, dando mais corpo à conhecimentos e de metodologias, o risco de depenreflexão iniciada no JAM. Tudo será sempre comdência entre instituições, políticas públicas, papeis partilhado com todos os participantes e parceiros da nas parcerias foram abordados sem análise abissal. GSI e mantido disponível em seu site. A premência de alinhamento e de ação articulada foi Neste meio-tempo, a GSI convida todos a opinarem conclamada com frequência. O mesmo com a exe avançarem com as reflexões, enquanto novas ações pectativa de novas reflexões que permitissem o aprosão elaboradas: fundamento de ideias e a identificação de irmãos de www.gsi.org.br/gsi/Default.aspx armas. uma reflexão coletiva. O fato é que os mais importantes desafios socioam- twitter.com/GSIJAM bientais dizem respeito a toda a sociedade e preciwww.facebook.com/pages/GSI-Global-Social-Imsam do engajamento de todos os setores, cada um pact/148195398545392 com sua competência, para que sejam superados. A evolução da consciência ambiental e o acréscimo da palavra ‘social’ – que resultou no termo ‘socioambiental’ – reflete a compreensão de que a proteção e a preservação da natureza só são possíveis mediante o cuidado com as pessoas e seu bem-estar. Contudo, o debate dos papeis nas parcerias se impõe, com a urgente demanda por definição de tarefas e fontes de recursos em prol do respeito pelos direitos dos cidadãos. É tempo de profissionalizar a gestão das iniciativas de investimento público/privado. As políticas públicas sociais, culturais e ambientais vão se organizando pouco a pouco (na figura do Estado brasileiro) e também as iniciativas do setor privado – especialmente aquelas que buscam maior institucionalização (como na criação de um instituto ou fundação) e profissionalização (colaboradores dedicados exclusivamente a esses assuntos). Mas ainda há muito a caminhar. Durante o JAM, já foi possível atestar a consciência generalizada de que, ao fazermos juntos, estamos praticando a verdadeira boa cidadania, com a incógnita quanto à prontidão de pessoas físicas e jurídicas para abandonarem sua zona de conforto e atuarem juntas, em busca de soluções coletivas. Até a realização do JAM, a GSI se preparava para promover uma Conferência Internacional no segundo semestre de 2011, contando que o JAM apontaria para temas que só poderiam ser aprofundados presencialmente. Os resultados percebidos fizeram a instituição refletir e rever os próximos passos. O GSI JAM abriu uma brecha para futuras discus- 76 Relatório GSI JAM 2011 GSI – Global Social Impact Diretoria Andrea de Carvalho Shpak – Fundadora e Presidente Alcely Strutz Barroso – Vice-Presidente Elidia Maria de Novaes Souza – Diretora de Relações Institucionais Celso Bianchi Barroso – Diretor de Relações Governamentais Magnolia Vieira Carvalho – Secretária Comitê Fiscal João dos Santos Dias – Tesoureiro da GSI Sonia Bruck Carneiro Pereira – Gerente de Responsabilidade Social da BM&FBovespa Tomás Carvalhaes Carmona – Gerente de Desenvolvimento Sustentável da SERASA Conselho Consultivo Brasil Alessandra Gonçalves de França – Fundadora-presidente do Banco Pérola Claudia de Carvalho Shpak – Gerente Executiva de Produto da IBM Brasil Eduardo Tacla – Presidente da Helix Tecnologia Jorge Alberto França Proença – Empresário e Presidente do Instituto Pérola José Avando Souza Reis – Diretor Geral da Associação Telecentro de Informação e Negócios (ATN) Renata Amaral Soares – Consultora Sênior da McKinsey Sérgio Francisco dos Santos – Gestor da Mídia Regional Conselho Consultivo Estados Unidos Andres Ramirez – Professor de Finanças da Bryant University Andy Lawler – Professor de Estratégia Corporativa, Desenvolvimento de Negócios e Mercados Internacionais, Planejamento de Negócios & Empreendedorismo Social da Ross School of Business / University of Michigan Kelly Janiga – Diretora Executiva da Social Venture Partners Rhode Island (SVPRI) Melvin Levitsky – Embaixador dos EUA no Brasil 1994-98, Ministro aposentado de Relações Internacionais, professor na Escola Gerald R. Ford de Políticas Públicas da University of Michigan Norman Bishara – Professor de Legislação Corporativa na Ross School of Business da University of Michigan Paul Kirsch – Diretor Associado do Instituto Zell Lurie na University of Michigan 77 GSI JAM 2011 REALIZAÇÃO PATROCÍNIO APOIO