referencial teorico - Faculdade Alfredo Nasser
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FACULDADE ALFREDO NASSER INSTITUTO SUPERIOR DE EDUCAÇÃO CURSO DE LETRAS ANNA LÍDIA BUENO CHAVES O USO DOS ESTRANGEIRISMOS NA LINGUAGEM DO BRASILEIRO Aparecida de Goiânia-GO 2010 ANNA LÍDIA BUENO CHAVES O USO DOS ESTRANGEIRISMOS NA LINGUAGEM DO BRASILEIRO Monografia apresentada à banca examinadora do Departamento do curso de Letras da Faculdade Alfredo Nasser, como requisito parcial para a obtenção do título de Licenciatura em Letras, sob a orientação do Professor Mestre Newton Paulo Monteiro. Aparecida de Goiânia-GO 2010 O USO DOS ESTRANGEIRISMOS NA LINGUAGEM DO BRASILEIRO Aparecida de Goiânia______/__________/_______. EXAMINADORES __________________________________________ **************** __________________________________________ **************** Dedico este trabalho a minha família – pais, irmão e noivo: meu suporte, meu auxílio, meu esconderijo secreto. AGRADECIMENTOS Agradeço à Deus e meu Anjo da Guarda, pela proteção e por terem me dado a chance de ser aquilo que escolhi. Aos meus pais, Antônio Cícero e Viviane, por me mostrarem o amor incondicional, por acreditarem em mim, por terem me apoiado e por muitas vezes terem se sacrificado para me dar tudo o que precisei. Ao meu irmão, que com seu companheirismo e dedicação sempre me ajudou e apoiou em todos os momentos. Ao João, meu noivo, que com sua presença amorosa, tem compartilhado bons e maus momentos ao meu lado, fazendo meu dia a dia ser diferente e melhor. Que me ajudou a acreditar que eu era capaz e acima de tudo, me ensinou a amar e ser amada. Por todos os conselhos, todo carinho, cumplicidade e compreensão, especialmente nos momentos em que estive ausente. Ao meu professor orientador, Newton Paulo Monteiro, que contribuiu para que este trabalho fosse concluído com sucesso. Muito obrigada, de coração. “...Somos sujeitos porque desejamos, sonhamos, imaginamos e criamos, na busca permanente da alegria, da esperança, do fortalecimento da liberdade, de uma sociedade mais justa, da felicidade a que todos temos direito...” Madalena Freire RESUMO O presente trabalho tem por finalidade demonstrar como o uso dos estrangeirismos, em especial o Inglês, tornou-se comum na Língua Portuguesa, trazendo novos vocábulos que são o resultado das relações políticas, culturais e comerciais com outros países. O Inglês fornece vasta nomenclatura, demonstrando que o processo linguístico está relacionado com a história social, política e cultural de um povo. A entrada de elementos estrangeiros na nossa língua é um fenômeno sociolinguístico ligado ao prestígio de uma língua, vista por muitos com admiração. O Inglês, considerado uma língua universal, permite o mínimo de comunicação entre todos e pode resultar na perda não só da identidade cultural de um país, mas também a idiomática. Constata-se que essa liderança idiomática do Inglês é reflexo de vários fatores, entre os mais relevantes, a globalização, assim como, é perceptível e inegável predileção por termos estrangeiros por usuários do nosso idioma, resultando em influência na língua e na cultura brasileira. Palavras-chave: Língua Portuguesa. Estrangeirismo. Inglês. Influência na língua. ABSTRACT This paper aims to demonstrate how the use of foreign words, especially English, has become common in Portuguese, bringing new words that are the result of political, cultural and trade relations with other countries. English provides a broad nomenclature, demonstrating that the linguistic process is related to social history, politics and culture of a people. The entry of foreign elements in our language is a sociolinguistic phenomenon linked to the prestige of a language, viewed by many with admiration. English, considered a universal language, allows a minimum of communication between everyone and can cause the lost of cultural and idiomatic identity. It seems that the leadership of English is a reflection of several factors, the most important one being globalization, and it is noticeable and undeniable the preference for foreign terms by users of our language, resulting in influences on the Brazilian language and culture. Key-words: Portuguese. Foreignness. English. Influence on the tongue. SUMÁRIO INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 10 1. ORIGENS E EVOLUÇÃO DA LÍNGUA PORTUGUESA .................................... 12 1.1 O surgimento da língua portugesa ........................................................... 12 1.2 A evolução da língua portuguesa ............................................................. 14 2. A LÍNGUA PORTUGUESA NO BRASIL ............................................................ 15 2.1 Fatos históricos ......................................................................................... 15 2.2 As principais características do português no Brasil ............................ 16 2.3 O estrangeirismo na língua portuguesa .................................................. 17 3. A IMPORTÂNCIA DA LÍNGUA NO CONTEXTO SOCIOCULTURAL................ 18 4. EMPRÉSTIMOS E IDENTIDADE CULTURAL ................................................... 22 5. ESTRANGEIRISMOS ......................................................................................... 25 6. O USO DOS ESTRANGEIRISMOS .................................................................... 29 CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................................... 36 REFERÊNCIAS ........................................................................................................ 41 ANEXOS .................................................................................................................. 43 10 INTRODUÇÃO A linguagem é a faculdade do ser humano de se expressar, é uma característica que o diferencia dos outros animais. Ela permite que o homem se comunique, formule leis, crie noções e entre na essência dos fenômenos. A linguagem serve o pensamento, o qual, sem ela, jamais poderia existir. E a língua é o mecanismo de linguagem utilizado por um grupo de indivíduos para transmissão de ideias, de pensamentos. A vida do homem está intimamente associada ao processo de comunicação, cujo aprimoramento acompanha a própria evolução humana. Ao se relacionar com o mundo, ele aperfeiçoa e multiplica a sua capacidade de comunicação. As palavras são a matéria-prima dos idiomas e é por meio delas que se percebe a expansão social, econômica e científica de um povo. Elas são criadas de forma consciente para nomear as coisas e, com o passar do tempo, sofrem modificações, evoluindo o seu sentido espontaneamente. Assim como todos os idiomas, a língua portuguesa sofreu uma evolução histórica, sendo influenciada por vários idiomas e dialetos até chegar ao estágio em que se encontra atualmente. Pode-se observar, nesse processo de evolução, que muitas palavras desapareceram, enquanto novas surgiram. É um processo que nunca tem fim. Não se pode falar em língua pura, todas sofrem influências de outras. E a língua portuguesa não é diferente: é heterogênea e variável. No Brasil, em virtude da demografia histórica, da escravização dos negros africanos, do contato com os indígenas, e do contato com várias outras nações, a língua portuguesa também sofre diversas influências. O estrangeirismo é uma constante nos processos culturais em todo o mundo e a análise do papel da aquisição de “empréstimos‟ linguísticos permeia os processos de colonização e as migrações, uma miscigenação cultural que se processa geralmente sem a voluntariedade de mudanças na vida social, por parte dos moradores de um local. As manifestações culturais dominantes receberam, durante séculos, contribuições advindas da chegada de outros povos, da importação de objetos, da 11 utilização constante de termos associados a ações ou a expressões estrangeiras. Não há, entretanto, uma uniformidade em relação a se quantificar essa prática. Se entre duas línguas, entre povos diferentes, ocorre imposição de um determinado termo, a coexistência entre ambas acaba por modelar o léxico da língua receptora. Essa ascendência de uma nação sobre a outra, caracterizadora do empréstimo, deixa marcas na língua, de modo que se promova uma conexão entre identidades culturais distintas, entre indivíduos e estruturas sociais, sob forte influência da base material da sociedade – muitas vezes associadas ao poder político e econômico. Este estudo tem por objetivo identificar o emprego de estrangeirismos e a miscigenação cultural provocada por essa influência, mostrando a forte presença do Inglês na nossa língua, no nosso dia-a-dia. 12 1. ORIGENS E EVOLUÇÃO DA LÍNGUA PORTUGUESA Para entendermos como os estrangeirismos começaram a fazer parte da nossa língua e como isso nos influencia, é de suma importância voltarmos a origem, assim entenderemos sua constante evolução. A linguagem, que surgiu em virtude da necessidade do homem de se comunicar, é uma de suas maiores habilidades. É a linguagem, juntamente com a capacidade de pensar, que diferencia o ser humano dos demais seres vivos e possibilita que ele se organize socialmente. A língua é um sistema gramatical pertencente a um grupo de indivíduos. É mutável, vive em constante evolução, acompanhando as mudanças do organismo social que a criou (CUNHA e CINTRA, 2008). 1.1 O surgimento da língua portuguesa O surgimento da língua portuguesa está ligado ao processo de constituição da Nação Portuguesa. É a continuação ininterrupta, no tempo e no espaço, do latim que chegou à Península Ibérica com a romanização dos povos do oeste e noroeste no início do séc. III a.C (BECHARA, 2006). No sul da Península Itálica, na região do Lácio, onde foi fundada a cidade de Roma, vivia um povo de cultura rústica, que falava a língua latina, que veio a desempenhar um importante papel na história da civilização ocidental. Com as conquistas do Império Romano, novos povos passaram a se juntar aos romanos, sendo impostos aos dominados os seus hábitos, instituições, padrões de vida, suas leis, sua língua (CUNHA e CINTRA, 2008). Até a metade do séc. IV a.C, os romanos ainda não haviam feito muitas conquistas externas. Mas, com a Guerra dos Samnitas, iniciada em 326 a.C e terminada em 295 a.C, com a Batalha de Sentino, começou a penetração dos romanos na Península Itálica (CUNHA e CINTRA, 2008). Foram ocorrendo sucessivas conquistas entre o período de 241 a.C a 107 d.C, sendo subjugados os territórios da Sicília, da Sardenha e da Córsega, da Ilíria, da costa este e sul da Península Ibérica, dos reinos helenísticos do Oriente, da Gália Cisalpina, da Ligúria, de Cartago e Norte da África, da Macedônia e da Grécia, da 13 Gália Narbonense, da Gália do Norte, da Mésia, do Noroeste da África, do resto da Península Ibérica, da Nórica, da Résia, da Panônia, do resto da Mauritânia, da Bretanha, da Trácia, da Dácia, da Arábia Pétrea, da Armênia e da Mesopotâmia, atingindo o máximo de sua expansão geográfica com a anexação da Dácia Romênia (CUNHA e CINTRA, 2008). Desse modo, ao estenderem seus domínios, os romanos ensinavam e aprendiam com as novas civilizações, propagando sua cultura, suas instituições, e assimilando os hábitos de vida dos povos conquistados. Desde o séc. III a.C, sob influência grega, o latim escrito foi se aperfeiçoando, até atingir, no séc. I a.C, a perfeição da prosa de Cícero e César, ou da poesia de Horácio. Consequentemente, essa língua literária, praticada pela elite, foi se separando do latim corrente – o latim vulgar –, falado pelos mais variados povos da Itália e das províncias (CUNHA e CINTRA, 2008). Falado pelos soldados, marinheiros, colonos, funcionários romanos, o latim vulgar foi se diversificando com o tempo, surgindo, assim, as chamadas línguas românicas. Não mais havia no Império, a partir do século III da era cristã, uma unidade linguística, embora as comunidades continuassem interligadas (CUNHA e CINTRA, 2008). Vale destacar vários fatos históricos que contribuíram para a dialetação. Em 212, com o Édito de Caracala, foi estendido a todos os indivíduos livres do Império o direito de cidadania, não mais sendo privilegiados os povos de Roma e da Itália. De 284 a 305, Dioclésio tornou obrigatório o uso do latim. Em 330, Constantino transferiu a sede do Império para Bizâncio, a nova Constantinopla. No final do séc. IV, em 395, com a morte de Teodósio, o domínio foi dividido em Império Romano do Ocidente e Império Romano do Oriente. Este último durou até 1453, enquanto que o primeiro permaneceu apenas até 476 (CUNHA e CINTRA, 2008). No final do séc. V, os falares regionais já se aproximavam mais dos idiomas românicos do que do próprio latim, iniciando-se o período do romance, ou romanço, língua vulgar da fase de transição da qual se originam textos redigidos em línguas româncias: francês, espanhol, italiano, sardo, provençal, rético, catalão, português (séc. XIII), franco-provençal, dálmata e romeno (CUNHA e CINTRA, 2008). Depois do processo de romanização, a Península Ibérica foi invadida pelos germânicos, que trouxeram diversas influências, contribuindo para a fragmentação da língua naquela região. 14 Já no séc. VII, foi a vez de os árabes invadirem a Península, deixando suas marcas na cultura e na língua, embora sem força suficiente para apagar a forte influência românica já exercida sobre aquele povo. 1.2 A evolução da língua portuguesa Foi durante o domínio árabe que as características distintivas dos romances peninsulares se acentuaram, constituindo-se uma unidade linguística que se conservou homogênea até a metade do séc. XIV – o galego-português. No séc. XIII, com os primeiros documentos redigidos em galego-português, se inicia a fase histórica da língua portuguesa. Assim como todos os idiomas, a língua portuguesa está em um constante processo de evolução, no tempo e no espaço. O processo de evolução do latim ao português atual, segundo José Leite de Vasconcelos, apud Cunha e Cintra (2008), pode ser distinguido em cinco etapas: a) latim lusitânico, falado na Lusitânia, desde a implantação do latim até o séc. V, não constando nenhum documento; b) romance lusitânico, falado na Lusitânia, do séc. VI ao séc. IX, também sem nenhum documento; c) português proto-histórico, também falado na Lusitânia, do séc. IX ao séc. XII, com algumas características nos textos bárbaros; d) português arcaico, que vai do séc. XIII à primeira metade do séc. XVI, quando a língua começa a ser codificada gramaticalmente; e e) português moderno, da segunda metade do séc. XVI até os dias atuais. Nos séculos. XV e XVI, com os descobrimentos marítimos, os portugueses levaram a sua língua a outras regiões, outros povos. A língua portuguesa é hoje a língua oficial do Brasil, de Portugal, de Angola, de Cabo Verde, de Guiné-Bissau, de Moçambique, de São Tomé e de Príncipe e de Timor Leste (CUNHA e CINTRA, 2008). 15 2. A LÍNGUA PORTUGUESA NO BRASIL O Brasil, um país imenso, com um território de mais de 8 milhões de quilômetros quadrados, possui um só idioma, e de importância internacional: a rica língua portuguesa. Embora os portugueses tenham chegado ao Brasil em 1500, a colonização apenas se iniciou em 1532, quando foram criadas as capitanias hereditárias. Aos portugueses se juntaram os índios, povos nativos da região, depois os escravos trazidos da África. Esses três povos, além de vários outros vindos da Europa, contribuíram fortemente para a formação da população brasileira. 2.1 Fatos históricos O Brasil, quando aqui chegaram os portugueses, era povoado pelos índios, vindo em seguida, os escravos africanos. Esses três povos se juntaram durante o período colonial, formando-se a nação brasileira. No início, somente o litoral era colonizado. Com a fundação da cidade de São Paulo em 1554 e a descoberta do ouro em Minas Gerais, no séc. XVIII, os povos foram se instalando no interior do país. Segundo Teyssier (1997), a situação linguística do Brasil nesse período se mostrava da seguinte forma: Os “colonos” de origem portuguesa falam o português europeu, mas evidentemente com trações específicos que se acentuam no decorrer do tempo. As populações de origem indígenas, africana ou mestiça aprendem o português, mas manejam-no de uma forma imperfeita. Ao lado do português existe a língua geral, que é o tupi, principal língua indígena das regiões costeiras, mas um tupi simplificado, gramaticalizado pelos jesuítas e, destarte, tornado uma língua comum. Enfim, muitos povos indígenas conservam os seus idiomas particulares, que se denominam línguas travadas. Durante muito tempo o português e o tupi viveram lado a lado como línguas de comunicação. (TEYSSIER, 1997, p. 94) Assim, o português e o tupi conviveram bem até o final do séc. XVIII. Mas a obrigatoriedade do uso oficial da língua portuguesa e a proibição da língua tupi pelas leis pombalinas em 1757, a expulsão dos jesuítas do Brasil – os protetores do tupi – 16 bem como a chegada de numerosos imigrantes portugueses, contribuíram para a decadência da língua nativa. Quando o Brasil se tornou independente em 1822, procurou-se valorizar tudo aquilo que poderia ser diferente de Portugal. Permitiu-se uma infiltração das influências de outras culturas europeias, tais como a francesa, a italiana, a alemã, entre outras. Por volta de 1870, com o Romantismo, buscou-se a originalidade em nossa língua, para torná-la mais viva e autêntica. E é José de Alencar o maior crítico ao purismo exigido pelos padrões dos escritores portugueses naquela época. Embora no séc. XIX tivessem surgido escritores adeptos ao tradicionalismo – Machado de Assis e Rui Barbosa, por exemplo –, no séc. XX os escritores procuram “falar” a língua do povo, recheando suas obras de brasileirismos. E, com o Modernismo, a língua falada no Brasil ganha força. Há uma recusa às influências europeias e um esforço para definir uma língua originariamente brasileira e autêntica (TEYSSIER, 1997). 2.2 As principais características do português no Brasil O português no Brasil possui um vocabulário atual diferenciado do de Portugal. Algumas palavras têm significados bem diferentes, como por exemplo: ônibus no Brasil chama-se autocarro em Portugal. E várias palavras eram escritas de formas diferentes, tais como ação no Brasil, e acção em Portugal. Com a Nova Reforma Ortográfica (que entrou em vigor em 2009), os vocábulos passaram a ser grafados da mesma forma nos países que têm a língua portuguesa como língua oficial. Os filólogos, de um modo geral, reconhecem que, hoje, o Brasil possui uma originalidade linguística muito rica, em virtude de um processo histórico, e que Portugal possui uma unidade linguística superior incontestável. No Brasil, as variações dialetais são mais socioculturais do que geográficas. Primeiro, aparece a língua dos cultos; em seguida, a língua vulgar, das camadas menos instruídas; e, por último, os falares regionais e rurais (TEYSSIER, 1997). Além do mais, a tudo isso se juntam os falares de outros povos, uma vez que o 17 Brasil, um país em desenvolvimento, mantém relações econômicas, sociais, políticas, culturais, etc, com várias outras nações. 2.3 O estrangeirismo na língua portuguesa O estrangeirismo é o uso de palavras, expressões ou construções oriundas de um outro idioma tomadas como empréstimos por uma determinada comunidade. É um fenômeno histórico-social marcante e, no mundo globalizado em que vivemos, propicia, agiliza e facilita os contatos entre diversas nações. Em todas as épocas, e em toda parte do mundo, especialmente nos dias de hoje, com modernas tecnologias na área de comunicação, a troca de informações entre as mais diferentes culturas e línguas resultam uma circulação de hábitos, moda, produtos de um modo geral, entre outros, propiciando a penetração de vocábulos pertencentes a um determinado idioma em outras línguas. É o que ocorre também com a língua portuguesa. Veremos nos capítulos seguintes como as diferentes culturas presentes no nosso dia-a-dia influencia esses estrangeirismos, mostraremos um aspecto técnico do que realmente é estrangeirismo, as polêmicas que permeiam esse assunto e alguns exemplos que pertencem ao nosso cotidiano, mostrando como os estrangeirismo (principalmente o Inglês) estão ligados à nossa fala, hábitos, alimentação, rotina etc. 18 3. A IMPORTÂNCIA DA LÍNGUA NO CONTEXTO SOCIOCULTURAL A vida do ser humano está intimamente associada ao processo de comunicação, e o aprimoramento da capacidade comunicativa acompanha a própria evolução humana. À medida que amplia seu relacionamento com o mundo, o ser humano aperfeiçoa e multiplica a sua capacidade de comunicação, envolvendo palavras, sons e imagens. Textos verbais e não-verbais interagem e contribuem para a representação oral e escrita das sociedades. A língua constitui, pois, um código mutável que integra as relações humanas e que, ao mesmo tempo em que sofre modificações, participa das mudanças nas sociedades. Esse patrimônio social é responsável pela possibilidade de se preservar o conhecimento e de transmiti-lo a outras gerações. Como entidade social, a língua é definida como “[...] um conjunto de regras fonológicas, morfológicas, sintáticas e semânticas, que determinam o emprego dos sons, das formas e relações sintáticas, necessárias para a produção dos significados” (LOPES, 2001, p. 58). Este conceito difere da definição dada por Elia, em que se lê que “[...] língua é o falar de uma comunidade, estruturalmente diferenciado, portador de apreciável tradição cultural e reconhecido oficialmente por um Estado como forma de comunicação em suas relações internas e externas.” (ELIA, 2000, p. 28) Em se tratando de aspecto social, ressalta-se que o caráter social de uma língua é entendido como um sistema de signos convencionais que são facultados aos membros de uma sociedade para a possibilidade de comunicação, constituindose o papel mais importante hoje nas relações humanas. caráter social da língua é facilmente percebido quando levamos em conta que ela existe antes mesmo de nós nascermos: cada um de nós já encontra a língua formada e em funcionamento, pronta para ser usada. E, mesmo quando deixarmos de existir, a língua subsistirá independentemente de nós (TERRA, 1997, p. 20). Entre a língua e a sociedade pode-se perceber que há um mundo de signos linguísticos e inúmeras possibilidades comunicativas que irão formar as mensagens, ou seja, os sons, os gestos, as imagens estarão associados à língua, ligando-a não somente às relações diárias, mas também aos meios de comunicação de massa e à vida cultural, científica ou literária, passando a estabelecer um contrato social. 19 Uma vez interagentes, não se delimitam de forma clara as relações entre língua, cultura e sociedade: é difícil estabelecer onde uma começa e a outra termina, já que se estabelece uma relação íntima entre esses elementos. O estudo de uma língua deve considerar fundamentalmente os contextos socioculturais em que ela se apresenta, pois essa estrutura apresenta elementos básicos e, muitas vezes, determinantes para as variações de linguagem. Essa contextualização permite explicar ou mesmo justificar fatos que, apenas linguisticamente, seriam difíceis ou até impossíveis de se determinarem. O enunciado, portanto, está intrinsecamente associado à ambientação de que faz parte, promovendo interação entre seus interlocutores. E, se, por um lado, o contexto social interfere nas variações linguísticas, por outro a função que a língua exerce na sociedade determina a importância da sua aquisição, fazendo com que sua aprendizagem seja de suma importância para que o indivíduo também faça parte do contexto social. A sociedade, portanto, existe através da linguagem e é representada pela junção de língua e cultura. De acordo com Maingueneau (2002), a linguagem: Seria a capacidade de comunicação oral, e as línguas seriam as formas particulares por meio das quais cada comunidade, cada sociedade ou grupo social realiza a linguagem. A questão do social, portanto, está diretamente ligada à noção de língua, porque é a noção de sociedade que vai permitir a delimitação desse particular que é a língua, à vista do universal que é a linguagem. (MAINGUENEAU, 2002, p. 41). Vale salientar que os seres humanos dela fazem uso, modificam-na, mas não a detêm para si ou não a possuem isoladamente. Para Hall (2006): A língua é um sistema social e não um sistema individual. Ela preexiste a nós. Não podemos, em qualquer sentido simples, ser seus autores. Falar uma língua não significa apenas expressar nossos pensamentos mais interiores e originais; significa também ativar a imensa gama de significados que já estão embutidos em nossa cultura e em nossos sistemas culturais. (HALL, 2006, p. 40) Essa relação intrínseca constitui arranjo fundamental nas atividades cotidianas e a mudança que se processa, tanto na cultura quanto na língua, seja por eliminação, acréscimo ou modificação de elementos, ocorre de forma ininterrupta e involuntária. Os indivíduos reestruturam aspectos linguísticos e valores morais, por exemplo, muitas vezes sem perceber, porque como vimos, a língua se modifica conforme a sociedade muda e evolui. 20 Certamente as sociedades mais antigas, por viverem mais isoladamente, preservavam tanto sua língua quanto sua cultura com diminutas modificações por períodos mais prolongados, havendo pouca diferença mesmo entre gerações mais distantes. Essa caracterização permitiu uma identidade limitada por aspectos físicos, ou seja, delimitações espaciais indicavam uma nacionalidade, uma identidade cultural nacional. Essa cultura nacional abrange, portanto, a padronização de valores e a singularização de costumes, assim como a adoção de uma linguagem unificada. A movimentação do homem por territórios vizinhos e as suas viagens de exploração culminaram, entretanto, numa troca de informações crescentes e numa inevitável transfiguração sociocultural. A facilidade de deslocamento e os avanços tecnológicos, enfaticamente nos meios de comunicação, tornaram essa troca constante e intensa, de modo que se passou a encontrar elementos de uma determinada cultura em outros locais ou em todo o mundo, o que facilitou a entrada de estrangeirismos na nossa língua materna. Os meios de comunicação nos permitem assistir um noticiário, por exemplo, numa emissora norte americana, ao mesmo momento em que está sendo exibido lá. A tecnologia de fácil acesso propiciou que grande parte da nossa sociedade tenha contato com outros países, principalmente através da internet, uma grande rede mundial de pessoas interligadas. O discurso, desse modo, torna-se elemento de disseminação de valores e de ideologias de uma sociedade, de modo que as sociedades receptoras não apenas aceitem, mas passem a adotar a influência desse grupo social. Para Barros (2001): A ideologia dominante é tão abrangente que torna as demais organizações do saber fragmentárias e muitas vezes contraditórias, pois incorporam elementos da representação dominante. O grau de coerência e abrangência dos sistemas ideológicos não é, assim, o mesmo nas diferentes concepções de mundo. (BARROS, 2001, p. 150). Essa influência pode ter muitas origens, uma vez que as relações entre os grupos sociais se fazem não apenas por interesses econômicos, mais muitas vezes por aspectos sociais, como as redes de relacionamentos na internet (facebook, twitter, msn messenger, orkut e tantas outras criadas a cada dia que passa). Mas em qualquer situação é a cultura que acaba se transformando, acrescentando ou modificando elementos. Embora a língua não sofra influência na mesma intensidade, 21 modificações surgem – como é o caso dos empréstimos linguísticos ou do estrangeirismo, que é o uso de palavras, expressões ou construções oriundas de um outro idioma tomadas como empréstimos por uma determinada comunidade. É um fenômeno histórico-social marcante e, no mundo globalizado em que vivemos, propicia, agiliza e facilita os contatos entre diversas nações. Em todas as épocas, e em toda parte do mundo, especialmente nos dias de hoje, com modernas tecnologias na área de comunicação, a troca de informações entre as mais diferentes culturas e línguas resultam uma circulação de hábitos, moda, produtos de um modo geral, entre outros, propiciando a penetração de vocábulos pertencentes a um determinado idioma em outras línguas. É o que ocorre também com a língua portuguesa. 4. EMPRÉSTIMOS E IDENTIDADE CULTURAL O fenômeno linguístico/cultural do estrangeirismo, palavra estrangeira que se introduz em nossa língua, sempre levanta polêmicas O fenômeno não é tão simples quanto possa parecer, nem envolve apenas o aspecto linguístico, mas também questões culturais e políticas. Sabemos que a palavra é um fenômeno ideológico por excelência. Sendo assim, a adoção de uma palavra estrangeira revela-se como algo mais que uma escolha formal: toda importação de termos é uma “intrusão” de uma cultura estrangeira e traz consigo um precipitado de valores que interfere e modifica a cultura importadora. De acordo com Carvalho (2009) a língua-fonte é a que influencia na imposição de um termo, e a que o recebe é a língua receptora. A coexistência entre ambas tende a modelar o vocabulário da receptora por um recorte analógico do mundo objetivo, de acordo com os traços da língua-fonte. A causa não é apenas a vizinhança territorial, nem a convivência linguística. É resultado da ascendência de uma nação sobre a outra no campo em que se dá o empréstimo. Segundo Junqueira (1999) o conceito de identidade cultural diz respeito à conexão entre indivíduos e estrutura social. O mundo das representações, do qual a língua faz parte, tem uma dinâmica própria mas sofre influência da base material da sociedade. Nele surge o conceito de visão do mundo, presente na forma de comunicação. A função social das representações é assegurar a dominação de uma classe por outra, violência simbólica que também acontece entre nações, gerando o dominante e dominado, com base no poder político e econômico, definindo o mundo segundo seus interesses, na língua claro, não poderia ser diferente, sempre aparecerá termos usados por nações que se sobressaem sobre outras. Para Houaiss (1983) a identidade social e cultural é a categoria que define como os indivíduos se inserem no grupo e como eles agem, tornando-se sujeitos sociais. Define, também, a forma como o indivíduo incorpora o mundo material a partir da experiência e projeta essa incorporação como construção simbólica. Essa noção de identidade evoluiu junto com as transformações sociais que se acentuaram no século XX. Houve uma transição do nacionalismo para a 23 globalização, quando tudo passou a fazer parte do mercado dominado pelas potências mais poderosas. Com a globalização, pela circulação planetária de informação e cultura, criou-se uma área comum de referência, onde as identidades específicas vão perdendo os contornos. Com a evolução dos meios de comunicação, o indivíduo tem condições de receber e consumir bens produzidos em outras culturas, incorporando a seu cotidiano valores de realidades distantes. Desta forma, enfraquecem-se os vínculos com a comunidade mais próxima, junto com as noções de regionalismo e nacionalismo. A adoção indiscriminada de termos estrangeiros, provenientes da cultura que domina, torna-se uma consequência natural. Este não é um fenômeno recente: esteve sempre presente nas línguas através de contatos fortuitos ou prolongados. Na atualidade, intensificou-se pelas condições de supremacia de uma única nação sobre as demais. Faz-se a distinção entre o termo já incorporado há muito tempo, um fato histórico e o empréstimo recém-entrado, um fato político contemporâneo. Apesar disso , a linha divisória não é sempre fácil de traçar. Nenhuma língua moderna é tão simples nas suas escolhas que um conjunto de categorias possa descrevê-las exaustivamente. Medidas que façam parte de uma política da língua não pecisam incluir regulamentação de empréstimos. Basta que inclua a alfabetização em larga escala, a melhoria do ensino no nível básico, com a qualificação do professorado de Língua Portuguesa e o incentivo a publicações didáticas adequadas. Abordaremos no presente trabalho, em específico, o caso específico do inglês americano e sua influência na língua portuguesa no Brasil, resultante do domínio de uma nação sobre a outra na área econômica e política. Os empréstimos do inglês americano são de uso recente, relacionados a negócios, cultura de massa, esportes e ciência. Essas palavras que voam sobre as fronteiras linguísticas e políticas e aterrissam tranquilamente no campo “inimigo”, podem ser reformuladas ou não na escrita, porém na fala são sempre adaptadas à moda do freguês. Para Houaiss (1983) a língua, sem sombra de dúvida, acompanha o poderio econômico. As palavras - vindas do inglês têm o peso de 4.500 bilhões de dólares (PIB dos povos de fala da língua inglesa), e têm a seu favor o peso da cultura moderna da sociedade de consumo, com a publicidade, o cinema, a TV, a Internet, divulgando o American way of life, a ser imitado e respeitado internacionalmente. 24 Em Crise da Nossa Língua de Cultura, Antonio Houaiss (1983) identifica os problemas que enfrenta a língua portuguesa para conservar-se como forma de expressar as mudanças e inovações, afirmando que a influência do inglês americano faz com que a língua portuguesa corra o risco de não servir de meio de expressão para as culturas complexas modernas Se qualquer língua recebe sempre uma enxurrada de empréstimos de outra, ela se torna cada vez mais diferenciada de si mesma.Este fato se observa no português brasileiro do ponto de vista quantitativo e qualitativo. O empréstimo se dá, em geral , como item lexical e torna-se testemunho de uma competência insuficiente, concorrendo também para prejudicar o jogo de significações cristalizado na língua. Mas a sintaxe já começa a sofrer consequências, pela disseminação do genitivo saxônico entre usuários em geral sendo perigoso seu uso pelos que não conhecem o inglês. Bar do Zeca’s, Machadu’s Pizza, Intimu’s Shop são formas de alta freqüência nos estabelecimentos da periferia, misto mal digerido de inglês, latim e português. Também as preposições estão sendo adotadas: in,off com valor adjetivo e by como preposição, surgindo as construções do tipo Modelos by OcimarVersolatto. A outra observação é aqueles xenismo, que nunca foram traduzidos, não são entendidos. Assim, por não entender o que diz, já vimos alguém pedir um cheeseburguer sem queijo! Claro isto ocorre nas camadas menos letradas da população. Os profissionais da informática, do marketing, da publicidade, do turismo, empregam de forma pedante e correta os termos em inglês, de alta frequência naqueles jargões profissionais, e que também resultam do desnível sócio-educacional crescente, que atormenta o país. Mas justamente aqueles mais letrados e bem situados, são, às vezes, os que usam desnecessariamente os termos ingleses, para marcar sua diferença da casta inferior e sua identificação com a casta superior: o dominador. 25 5. ESTRANGEIRISMOS Um empréstimo significa, generalizadamente, a utilização de algo que pertença a outrem. Uma unidade lexical estrangeira, ao integrar a língua nacional, representa um “empréstimo linguístico”. A esse neologismo intitula-se estrangeirismo. À medida que passa a fazer parte da língua nacional, não mais sendo considerado estranho, esse empréstimo passa a constar, inclusive, nos dicionários. Para Garcez e Zilles: Estrangeirismo é o emprego, na língua de uma comunidade, de elementos oriundos de outras línguas. No caso brasileiro, posto simplesmente, seria o uso de palavras e expressões estrangeiras no português. Trata-se de fenômeno constante no contato entre comunidades linguísticas, também chamado de empréstimo. A noção de estrangeirismo, contudo, confere ao empréstimo uma suspeita de identidade alienígena, carregada de valores simbólicos relacionados aos falantes da língua que originou o empréstimo (GARCEZ; ZILLES, 2004, p. 15) A utilização de unidades lexicais de outros sistemas linguísticos muitas vezes é adotada no momento em que se importam objetos ou modelos que não possuem nomenclatura equivalente na língua portuguesa. Para Câmara Júnior (1989, p. 269), os empréstimos abrangem “(...) todas aquelas aquisições estrangeiras que uma língua faz em virtude das relações políticas, comerciais ou culturais, propriamente ditas, com povos de outros países”. A sua inserção acontece em campo morfológico, não sintático e as estruturas frasais não se corrompem. Mesmo assim, a opinião entre estudiosos se divide nesse ponto, havendo quem critique o uso abusivo de vocábulos e expressões estrangeiros. Para os puristas, as unidades lexicais estrangeiras devem ser empregadas quando não há termo equivalente na língua portuguesa e quando o seu “aportuguesamento” não é viável. O aportuguesamento dos vocábulos ou a utilização de termos nacionais equivalentes, entretanto, parecem não agradar à população, que largo uso faz de termos estrangeiros, principalmente de origem inglesa, nas mais variadas formas. Não é difícil encontrar, aliás, estrangeirismos escritos de maneira incorreta ou mesmo utilização de vocábulos sem o devido conhecimento de seu significado. 26 A indignação frente a essa realidade não se limita a gramáticos puristas: a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara aprovou, em dezembro de 2007, o Projeto de Lei do deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP) proibindo o uso de estrangeirismos no país. Aldo Rebelo, Deputado Federal, enviou para votação o Projeto de Lei 1.676/99, dispondo sobre “a promoção, proteção, a defesa e o uso da língua portuguesa”. A proposição original foi aprovada na Comissão de Educação, Cultura e Desporto da Câmara dos Deputados, recebendo duas emendas. Foi encaminhada ao Senado e aprovada, nos termos de um substitutivo. Agora se encontra na Câmara, casa de origem, aguardando parecer da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania. O Projeto de Lei 1.676/99 tem por objetivo proibir o uso desnecessário de palavras estrangeiras e, assim, valorizar a língua nacional. A justificativa do projeto se faz com base em argumentos segundo os quais o homem simples terá grande dificuldade diante do excessivo, e desnecessário, uso de palavras de outras línguas, bem com a língua portuguesa ficará descaracterizada. Esse projeto se encontra em tramitação, ainda não foi aprovado, e já se tornou alvo de polêmicas, gerando fortes discussões e controvérsias a respeito do uso do estrangeirismo na língua portuguesa no Brasil. Na justificativa de seu projeto de lei, Aldo Rebelo assim o sustenta: A História nos ensina que uma das formas de dominação de um povo sobre outro se dá pela imposição da língua. Por quê? Porque é o modo mais eficiente, apesar de geralmente lento, para impor toda uma cultura – seus valores, tradições, costumes, inclusive o modelo socioeconômico e o regime político. (...) De fato, estamos a assistir a uma verdadeira descaracterização da língua portuguesa, tal a invasão indiscriminada e desnecessária de estrangeirismos – como “holding”, “recall”, “franchise”, “coffe break”, “self „‟service” – e de aportuguesamentos de gosto duvidoso, em geraldespropositados – como “startar”, “printar”, “bidar”, “atachar”, “database”. Isso vem ocorrendo com voracidade e rapidez tão espantosas que não é exagero supor que estamos na iminência de comprometer, quem sabe até truncar, a comunicação oral e escrita com o nosso homem simples do campo, não afeito às palavras e expressões e importadas, em geral do inglês norte-americano, que dominam o nosso cotidiano, sobretudo a produção, o consumo e a publicidade de bens, produtos e serviços, para não falar das palavras e expressões estrangeiras que nos chegam pela informática, pelos meios de comunicação de massa e pelos modismos em geral.Ora, um dos elementos mais marcantes da nossa identidade nacional 27 reside justamente no fato de termos um imenso território com uma só língua, esta plenamente compreensível por todos os brasileiros de qualquer rincão, independentemente do nível de instrução e das peculiaridades regionais de fala e escrita. Esse – um autêntico milagre – está hoje seriamente ameaçado. Que obrigação tem um cidadão brasileiro de entender, por exemplo que uma mercadoria “on sale”, significa que esteja em liquidação? Ou que “50% off” quer dizer 50% a menos no preço? Isso não é apenas abusivo: é enganoso. E à medida que tais práticas se avolumam (atualmente de uso corrente no comércio das grandes cidades), tornam-se também danosas ao patrimônio cultural representado pela língua. E em entrevista concedida à Revista Isto é, Rebelo, que chegou a ser chamado de xenófobo e autoritário, afirma que a língua portuguesa, culta e bela, está ultrajada, e o objetivo de seu projeto não é proibir o uso de palavras estrangeiras, e sim melhorar o ensino da língua portuguesa. Manifestando-se a favor do projeto, o Senador Ronaldo Cunha Lima, em pronunciamento irônico e sarcástico, descreveu um cotidiano hipotético recheado de palavras estrangeiras: Fui ao freezer, abri uma coca diet e saí cantarolando um jingle,enquanto liga meu disc player para ouvir uma música new age precisava de um relax. Meu check up indicava stress. Dei um time e fui ler um bestseller no living do meu flat. Desci ao playground, depois fui fazer o meu cooper. Na rua, vi novos outdoors e revi velhos amigos do footing. Um deles comunicou-me aquisição de uma nova maison, com quatro suítes e até convidou-me para o opens house. Marcamos, inclusive, um happy hour. Tomaríamos um drink, um scotch, de preferência on the rocks, o bar man, muito chic, parecia um lord inglês. Perguntou-me se eu conhecia o novo point society da cidade: Times Square, ali no Gilberto Salomão, que fica perto do Gaf, o La Basque e o Baby Beef, com serviço a la carte e self service. (...) Voltei para casa, ou aliás, para o flat, pensando no day after.O que fazer? Dei boa noite ao meu chofer que, com muito fair play respondeu-me: Good night. O Deputado Cunha Lima, como se pode observar, posicionando-se a favor da proibição do uso exagerado dos estrangeirismos, manifestou-se especialmente contra o uso de anglicismos. A discussão acerca desse projeto se resume em dois questionamentos: se é necessário proibir o uso dos estrangeirismos por meio de lei; e se esse projeto for aprovado, ou seja, se se tornar lei federal, se surtirá efeitos. Como se observa, não se trata de uma perspectiva gramatical apenas, mas 28 da própria valoração da língua portuguesa no contexto sociocultural, visando à preservação da língua como elemento de identidade nacional. Os períodos mais recentes indicam uma grande influência da língua inglesa no Brasil, mesmo que não se configure resultado de processo imigratório. Há de se destacar que se evidencia uma presença maciça de vocábulos advindos da língua inglesa, por influência norte-americana, no país. Infante (2001, p. 193) ressalta que “deve-se levar em conta que muitos empréstimos da língua portuguesa atual do Brasil não ocorreram em Portugal e nas colônias africanas, onde a influência cultural e econômica dos Estados Unidos é menor.” Essa presença revela uma crescente absorção da cultura norte-americana, generalizadamente, como fruto do desejo de se estruturar um padrão de vida baseado no cotidiano americano. Evidencia-se um comportamento coletivo que permite às diversas áreas sociais e econômicas a exploração desse desejo como forma de imposição de determinados produtos, como é o caso da moda. Tamanha tendência apresenta registros históricos desde o período de colonização, época em que Portugal e a própria Europa serviam de referência para o Brasil. Valorizava-se o que vinha de lá, desde roupas e móveis até expressões e valores morais. Com o passar dos anos, a situação não mudou: a França colaborou, mais tarde, com a sofisticação na indumentária e na decoração e, obviamente, apareceram vocábulos e expressões francesas na língua portuguesa. No que concerne à adoção maciça de vocábulos da língua inglesa, pode-se vislumbrar uma intencional utilização do estrangeirismo como busca de identidade cultural. Os Estados Unidos, símbolo de um excelente padrão de vida, estariam representados em seus vocábulos, como se estes fossem ícones daqueles. Infante (2001, p. 193) destaca que atualmente, na língua portuguesa do Brasil “a maior fonte de empréstimos é o inglês norte-americano”. O Brasil, assim como outras nações, não se esquivará da adoção dessas expressões, é um fenômeno natural quando se considera a globalização e a miscigenação cultural. 29 6. O USO DOS ESTRANGEIRISMOS O léxico parte mais sensível de uma língua, é o agrupamento de forma que tiveram origem em diversas outras línguas. É resultado da história de um povo, de seus contatos, das divisas internacionais de trabalho num dado momento, da convivência entre vários países. Desses contatos com outros povos, outras culturas, outras línguas, surgem os estrangeirismos, que são meios de renovação lexical. A língua portuguesa não é uma unidade, não é um veículo de cultura uniforme. No caso do português no Brasil, o maior número de empréstimos é atualmente, proveniente da língua inglesa, mais precisamente dos Estados Unidos, considerados paradigmas de desenvolvimento. Não é por acaso que há uma adoção indiscriminada de nomes próprios em inglês, sobretudo nos estratos sociais urbanos, bem como nas designações de estabelecimentos comerciais, estes presentes nos grandes centros e também nos mais afastados lugarejos (CARVALHO, 2009). Carvalho (2009, p. 37), a respeito de mudanças linguísticas, afirma: A língua se faz mediante mudanças que são manifestações de criatividade na linguagem. Mas estudar mudanças não consiste apenas em estudar alterações e desvios. As necessidades expressivas se renovam, porque o homem não pensa e diz aquilo que pensou e disse antes. Como a língua não é um produto pronto e acabado, ela se refaz continuamente e se fundamenta em modelos anteriores. Ela é dinâmica, porque a atividade linguística é falar e entender algo novo por meio de uma língua. Assim, esse dinamismo da língua é resultante de alguns fatores: da convivência de populações diferentes em um mesmo território, como por exemplo, os empréstimos árabes deixados à língua da Península Ibérica; do predomínio cultural de um país em determinada época, como a penetração dos italianismos na língua portuguesa na época renascentista; e do poder econômico de uma nação sobre outras, que leva, junto com sua tecnologia, com sua ciência, sua língua (CARVALHO, 2009). Desse modo, torna-se muito difícil, hoje, evitar os empréstimos linguísticos, uma vez que a situação político-econômica mundial faz com que outras línguas se incorporem a outros idiomas. E é a partir da frequência de uso de palavras que se detecta qual língua exerce mais influência sobre outro idioma. E a 30 língua que exerce maior influência na língua portuguesa, atualmente, sem dúvida, é a globalizada língua inglesa (CARVALHO, 2009). Corrobora com esse pensamento Hall: a „globalização‟ se refere àqueles processos, atuantes numa escala global, que atravessam fronteiras nacionais, integrando e conectando comunidades e organizações em novas combinações de tempoespaço, tornando o mundo, em realidade e em experiência, mais interconectado. (HALL, 2006, p. 67) Uma vez que a economia e o mercado tenham se tornado globalizados, os produtos e os processos tecnológicos, uniformizados, exigem a utilização de termos e de vocábulos de compreensão também global. Mas não se trata apenas de uma necessidade econômica ou de trabalho: as comunidades globais também interagem por meio de uma universalização de linguagem que certamente privilegia uma língua em maior evidência na sociedade mundial. Zilles (2004) aponta: No campo das mudanças linguísticas, os empréstimos de palavras ou expressões são em geral associados a atitudes valorativas positivas do povo que os toma em relação à língua e à cultura do povo que lhes deu origem. Muitas vezes são utilíssimos à elite, que assim se demarca como diferente e superior [...]. Outras vezes, são felizes incidências na constituição identitária e cultural de um povo [...]. (ZILLES, 2004, p. 156) Um sujeito, nos mais distintos agrupamentos de que faz parte, emprega universos simbólicos na expressão de valores sociais, morais, culturais e políticos, de modo que se estabeleça entre ele e seu grupo uma coesão e uma interação permeada pela comunicação, daí serem adotados diversos estrangeirismos à nossa língua. Trata-se de uma identificação social ou cultural por meio de adoção de determinados símbolos no discurso – no caso os empréstimos, como ferramenta de identificação entre o objeto do discurso e a sua valorização atribuída à menção de uma língua considerada elitizada. O empréstimo da língua inglesa no Brasil contemporâneo, dessa forma, representa mais que uma necessidade: falar inglês é mostrar-se um indivíduo superior aos outros, capacitado para falar essa língua elitizada. Para Brandão (2004, p. 42), “os processos discursivos constituem a fonte da produção dos efeitos de sentido no discurso e a língua é o lugar material em que se realizam os efeitos do discurso”, de modo que um estrangeirismo seja a fonte 31 desse efeito para os ouvintes. Considerando-se que a identificação semântica de vocábulos de língua estrangeira – e mesmo a sua correta pronúncia – não sejam de domínio de grande parte da população, o emprego de estrangeirismos sem necessidade denuncia uma busca de sofisticação e de elitismo. Em se tratando de anglicismos, mais especificamente, pode-se associar a essa busca a tentativa de aproximação de uma sociedade que se observa mais próspera que a do Brasil. Consoante a isso, Garcez e Zilles (2004) declaram que: Em uma sociedade como a brasileira, na qual é imensa a disparidade na capacidade de consumo dos cidadãos e na qual a classe social consumidora sofre de grande insegurança social e se mira em modelo externo de consumo, norte-americano ou europeu, não surpreende que o anglicismo se preste para marcar a diferenciação competitiva entre quem dispõe desse capital simbólico e a massa não-consumidora. (ZILLES, 2004, p. 23) Imitação ou identificação, usar termos em inglês soa como sofisticação e elegância por parte do falante. Para ele, ser moderno, estar na moda, ser atual é usar os mesmos termos que o país de referência usa. Qualquer modificação formal em benefício do acervo lexical brasileiro desconfiguraria, portanto, a elegância das unidades lexicais inglesas. Os processos midiáticos e a publicidade aproveitam essa valorização, por parte do consumidor, e abusam da substituição de vocábulos da língua portuguesa por estrangeirismos. Para Schmitz (2004, p. 95), “é necessário um pouco de bomsenso [...]. Muitos estrangeirismos [grifo do autor] são desnecessários, mas os termos no momento são essenciais para a progressão temática do discurso.” Dentro da perspectiva da globalização são os meios de comunicação que se revelam particularmente eficazes no desenhar, no tecer o inimaginável de todo ser humano. São os responsáveis, sempre, por nos fornecer uma delicada dose de magia dentro de um mundo que, por vezes, não é tão mágico assim. Nem todos os indivíduos, entretanto, são igualmente atingidos por esse processo, uma vez que eles encontram obstáculos na diversidade das pessoas e em diferentes lugares. Fielmente ligados à noção de aldeia global, que é tida como “uma expressão da globalidade de ideias, padrões e valores sócio-culturais, imaginários” (Ianni, 2004, p. 119), os meios de comunicação podem expandir suas influências em todos os aspectos. Eles detêm um determinado controle sobre como determinados fatores 32 nacionais, regionais, locais ou mundiais serão difundidos mundo afora. Esse processo de revolução cultural que passou a influenciar o comportamento do homem aconteceu de forma lenta e, para alguns grupos sociais, não houve respeito às suas culturas - o que, de certa forma, transparecia que os mesmos já estavam inseridos nesse processo naturalmente. O fenômeno da comunicação de massa, depois dos anos 1980, com o processo de informatização e, em seguida, com o surgimento da rede mundial de computadores, supervalorizou a internacionalização instantânea da comunicação. Ferramenta que beneficiou o processo de globalização, ao eliminar fronteiras e barreiras para a comunicação com outras nações, a Internet acelerou a autonomia entre os povos de cada região, tornou dinâmico o processo de ensino e aprendizagem e influenciou o desenvolvimento social e moral das pessoas. Imaginem-se milhares de informações acessíveis a indivíduos pertencentes às mais diferentes culturas, nos mais diversos lugares. Dessa forma, o acesso às informações, ao conhecimento de novas tradições e aos costumes é totalmente acessível, e essa grande acessibilidade que a Internet proporciona, pode ser benéfica em vários aspectos, mas pode também acarretar declínio de conceito de sociedade local, uma vez que se passa por um processo de multiculturalismo. Participar desse processo de globalização exige competência intercultural, uma vez que as pessoas sentem a necessidade de adaptar-se a diferentes estilos de ser, de operar e de comunicar-se. Essa competência implica conhecer outras culturas e as diversas maneiras como as pessoas se comunicam. [...] sempre se pensou que só pode haver um único motivo para alguém querer aprender uma língua estrangeira: o acesso a um mundo melhor. As pessoas se dedicam à tarefa de aprender línguas estrangeiras porque querem subir na vida. A língua estrangeira sempre representou prestígio. Quem domina uma língua estrangeira é admirado como pessoa culta e distinta (RAJAGOPALAN, 2003, p. 65). O estrangeirismo, por conseguinte, deixa de ser mera necessidade e passa a ser um mecanismo de inclusão ou de exclusão de indivíduos numa determinada esfera social. As sociedades dominantes sabem de sua capacidade de imposição de determinados valores e o estrangeirismo passa a se constituir ferramenta de discursos globalizados. 33 Essa forma de dominação pouco é percebida por aqueles que a absorvem e que aceitam passivamente a mudança sociocultural e a uniformização advinda da adoção da cultura dominante. A língua passa a ser meio de dominação ao acompanhar a disseminação de valores, a aquisição de produtos, a negociação entre países. Muitos estrangeirismos são usados no Brasil. Alguns deles já fazem parte de nosso dia-a-dia. Alguns, porém são usados de forma errônea, se considerarmos seu significado original. Mas todo esse processo sociocultural adotado em nosso país trouxe todas essas expressões usadas constantemente. Não é preciso andar muito para encontrar diversos estrangeirismos espalhados, eles estão por todas as partes: em lojas, supermercados, produtos de beleza, marcas de roupas, etc. Para ilustrar a acumulação de estrangeirismos na língua portuguesa no Brasil, provenientes dos contatos, especialmente com o povo norte-americano, interessante citar a música “Samba do aproach”, composta por Zeca Baleiro: Venha provar o meu brunch Saiba que eu tenho aproach Na hora do lunch Eu ando de ferryboat Eu tenho savoir-faire Meu temperamento é light Minha casa é hi-tech Toda hora rola um insight Já fui fã do Jethro Hoje me amarro no Slash Minha vida agora é cool Meu passado é que foi trash Fica ligada no link Que eu vou confessar meu love Depois do décimo drink Só um bom e velho engov Eu tirei o meu green card E fui para Miami Beach Posso não ser um pop star Mas já sou um noveaiu ric Eu tenho appeal Saca só meu background Veloz como Demom Hill Tenaz como Fittipaldi Não dispenso um happy end Quero jogar num dream teen De dia um cacho man E de noite um drag queen 34 Convém, ainda, citar trechos da música “Estrangeirismos”, composta por Carlos Silva e Sandra Regina, que retrata bem as influências do inglês na língua portuguesa, importadas especialmente dos Estados Unidos da América: Outro dia me chamaram para ir ao McDonald´s comermos cheese burgers. O salão estava lotado e fizemos o pedido por um tal de drive thru. Os colegas percebendo a minha irritação, disseram: se tu tiver com pressa, eles têm um sistema delivery maravilhoso. Desacostumado com esse linguajar, chamei os cabras: vamos simbora (...) Seguimos mais adiante avistamos um restaurante bonito e luxuoso e na porta de entrada uma luz néon piscando escrita OPEN. Quando olhei pro chão, pude ver estampado um capacho com uma bandeira americana me convidando: WELCOME. Ao adentrarmos naquele recinto, eu pude observar na sua decoração, e nas paredes estava escrito: ICE CAKE, CHEESE CAKE, CHEESE BURGER E FAST FOOD. Eu pensei comigo FOOD na Bahia a gente USA numa outra situação. Observa-se que, nessas músicas, os compositores usam o exagero para criticar, de uma forma bem humorada, o uso dos estrangeirismos na língua portuguesa no Brasil. Várias discussões, comentários e análises têm sido feitos a respeito da língua portuguesa, não só da língua falada ou da língua escrita, mas também sobre suas variantes, a norma culta, a respeito dos conceitos de linguagem, sobre a questão da dominação, sobre a questão de se ter uma língua única e pura, sobre a identidade nacional e especialmente sobre o uso, ou mais ainda, sobre os abusos dos estrangeirismos pelos brasileiros. Na concepção purista da língua, a língua “pura” seria uma língua “limpa”, sem a incorporação de palavras estrangeiras, ou seja, preservada de empréstimos e mais ainda protegida do seu uso exagerado. Visam, então, os “puristas” a conservação de uma língua imutável, conservada em sua integridade e juventude. Referindo-se a essa concepção, Bréal (1992) afirma que os “puristas” acreditam que a língua se assemelha à pureza da raça, motivo pelo qual entendem que a palavra estrangeira representa uma contaminação que deve ser repudiada. Entretanto, sabe-se que, desde os primórdios, o homem não pertence apenas a um único grupo ético ou nacional, uma vez que ele necessita fazer comunidades que compartilhem ideais (BRÉAL, 1992). Diferentes grupos sentem a necessidade 35 de se encontrar, trocar experiências, e isso se faz por meio da ciência, da música, filmes, literatura, moda, garantindo, assim, a incorporação de uma língua à outra. Segundo Mattoso Câmara Jr. (1989), a língua não é propriedade privada – tudo é socializado. A variabilidade da língua se faz no espaço, na hierarquia social, no tempo, e de indivíduo para indivíduo, visando alcançar maior expressividade na comunicação. No atual cenário mundial não é diferente. A língua, em virtude do mundo globalizado, por meio dos avanços da ciência e tecnologia vem, cada vez mais, ultrapassando barreiras, no campo político, econômico e sociolinguístico. E é nesse cenário mundial, de intercâmbio social, cultural, político, econômico, que as línguas influenciam as outras e de outras sofrem múltiplas influências. 36 CONSIDERAÇÕES FINAIS O presente trabalho buscou fazer uma reflexão acerca da influência do estrangeirismo na língua portuguesa. Procurou esclarecer os mitos sobre o uso de empréstimos linguísticos e demonstrou a importância deles em nossa língua. Constatou-se que são elementos enriquecedores, mas que não devem ser usados de forma abusiva, o que pode tornar a linguagem pedante, esnobe e de difícil compreensão. A língua é um organismo vivo, nunca acabado, está em constantes transformações. Não é estática, imutável, inerte. Sempre foi assim, e assim sempre será. É importante anotar que o processo linguístico e suas contribuições foram e sempre serão importantes para a composição do sistema lexical de todas as línguas. Entretanto, devem-se preservar os termos já existentes na língua portuguesa, em manifestação de amor ao nosso idioma. O estrangeirismo se encontra presente em todas as línguas do mundo. É um fenômeno natural. Os empréstimos linguísticos surgem das relações entre os povos, em virtude de processos de colonização, de miscigenação, ou seja, da interação entre culturas diferentes, de línguas diferentes. Observa-se se assim que o uso de empréstimos linguísticos por todos os povos não é uma prática nova, vem ocorrendo desde que o homem buscou novas regiões para dominar e ampliar os seus impérios. Mas, sem dúvida, fatos e descobertas recentes têm provocado uma modificação considerável no uso do estrangeirismo. A globalização é responsável pelo rompimento de barreiras entre várias nações, de forma rápida e dinâmica. Integra e conecta diferentes comunidades, facilitando a troca de informações por meio de um poderoso aparato tecnológico de comunicação. E as pessoas vão se adaptando aos diferentes estilos de ser, de operar e de comunicar-se. Após a década de 80, com o processo de informatização e com o surgimento da rede mundial de computadores, o fenômeno da comunicação de massa se intensificou. O desenvolvimento de novas tecnologias, especialmente da internet acarretou uma verdadeira revolução cultural, que passou a influenciar o 37 comportamento dos indivíduos de uma forma bastante rápida e dinâmica. O Brasil, formado por um território gigantesco, um dos maiores países do mundo em extensão, mantém sua unidade linguística, com um idioma comum, plenamente compreensível por todos os brasileiros, independente do grau de instrução ou espaço geográfico. E esse é o elemento mais marcante da nossa identidade nacional. A língua portuguesa, todavia, como ocorre com todas as outras línguas, sofre interferências de outros idiomas, bem como também os influencia. E nos últimos séculos, tem-se percebido uma presença mais intensa da língua inglesa em nosso idioma. O domínio econômico, científico e tecnológico da Inglaterra, e atualmente dos Estados Unidos da América, tem interferido de forma avassaladora, impondo seus valores e trazendo com estes os empréstimos linguísticos. Assim, percebe-se que o motivo da valorização dos estrangeirismos em inglês é o contato cotidiano com a língua inglesa, mais precisamente com os norteamericanos, em virtude da globalização. Alguns brasileiros exageram, por acreditarem que o uso de palavras ou expressões da língua inglesa passa uma ideia de status, de comportamento fino e elegante. Sabe-se que o Brasil, cuja língua nativa era a tupi, ao ser colonizado por Portugal, adotou como padrão a língua portuguesa. Empregaram-se, ainda, em virtude da escravização, os empréstimos linguísticos das línguas africanas. Então, houve um uso concomitante da língua portuguesa, da língua nativa e das africanas. Além do mais, a língua portuguesa, àquela época, já registrava empréstimos linguísticos provenientes de outros idiomas europeus. O Brasil abriga pessoas das mais diversas regiões do mundo há várias gerações. Com isso, a miscigenação vem propiciando a incorporação de outras línguas em nosso idioma. Além disso, devido à globalização, as pessoas vêm absorvendo os costumes de várias culturas do mundo com mais intensidade e muito mais rapidez. Desse modo, o estrangeirismo é simplesmente uma consequência das relações entre os povos. No Brasil, essa tendência apresenta registros históricos, desde o período da colonização, quando Portugal e a Europa eram referência para o povo brasileiro. Atualmente, evidencia-se uma presença maciça de palavras advindas da língua inglesa, em virtude do desejo de se estruturar um padrão de vida baseado no cotidiano americano. 38 Com efeito, o Brasil não tem uma cultura muito expressiva no cenário mundial, motivo por que o povo acaba se conformando com a condição de usuário de criações alheias. O acesso fácil às informações, ao conhecimento de novas tradições, a novos costumes, por meio, especialmente da internet, pode ser benéfico, mas esse processo de multiculturismo pode acarretar o declínio de conceito de sociedade local. O estrangeirismo encontra lugar privilegiado na língua portuguesa. Não distingue sexo ou idade, e se consolida também nas relações comerciais, Os puristas querem eliminar essas “anomalias” injetadas na nossa cultura, buscando conservar a língua portuguesa livre de qualquer influência estrangeira. Sem razão os puristas, uma vez que a língua é dinâmica e mutável. A língua portuguesa já nasceu com influências de outras línguas, que, por sua vez, já eram influenciadas. Nenhuma nação vive isolada e afastada completamente do restante do mundo. As transformações fazem parte do curso natural das línguas, e os empréstimos linguísticos contribuem para o seu enriquecimento. Assim, a tentativa de Aldo Rebelo, em seu projeto de lei, bem como dos “puristas”, de proibir o uso do estrangeirismo na língua portuguesa, se mostra inócua, uma vez que as manifestações de linguagem ultrapassam os mecanismos linguísticos e concretizam transformações sociais e delimitações culturais. Quem muda uma língua e quem nela manda são os seus falantes. É importante ressaltar que não se pode, em um mundo globalizado, em que as relações acontecem de forma intensa, principalmente em virtude da internet e da televisão, isolar uma cultura ou uma língua. As barreiras entre os povos foram rompidas e, nessa relação entre eles, formou-se um multiculturismo, transformando a linguagem das mais diversas nações. Assim, tudo caminha para uma interseção de línguas. Deve-se reconhecer a contribuição de palavras estrangeiras, aquelas devidamente aportuguesadas, enriquecedoras do nosso idioma. No entanto, devemse condenar aquelas presentes nos meios de comunicação, que possuem um termo correspondente na língua portuguesa, como, por exemplo, o uso de linkar em vez de “ligar”, delivery em lugar de “entrega em domicílio, etc. Embora considere louvável a iniciativa do Deputado Aldo Rebelo, com seu projeto, a proibição do uso de estrangeirismo por meio de lei me parece tão inútil quanto proibir desvios gramaticais e gírias. Além de o brasileiro ter dificuldades de 39 cumprir leis, não será possível fiscalizar diálogos, propagandas publicitárias, músicas, o registro de nome pessoas, de mercadorias, de estabelecimentos comerciais, etc. Enfim, os empréstimos tomados de outras línguas não descaracterizam a língua portuguesa, enriquecem-na. Mas deve-se usar o bom-senso e evitar o emprego abusivo de palavras estrangeiras. Compreender a adoção do estrangeirismo como resultado da inserção de elementos culturais por meio das ferramentas do contexto linguístico é considerar que língua e sociedade estão intrinsecamente relacionadas e que não se pode sustentar uma sem a presença da outra. Na verdade, o estrangeirismo não constitui uma realidade isolada. Ele surge inserido nas estruturas frasais da língua portuguesa, muitas vezes hibridamente flexionados. O estrangeirismo participa, pois, dos próprios processos culturais e da convergência de interesses cerceada pela imposição da mídia. Usar o empréstimo linguístico seria, então, uma opção mais por imposição de uma estrutura que por consciência. Se, por um lado, isso representa modificação da linguagem, por outro representa um enriquecimento cultural. De qualquer forma, é interessante ressaltar que não se pode, num mundo cujo funcionamento tem se globalizado e cujas relações se fazem por meios como a televisão e a Internet, isolar completamente uma cultura ou uma língua. Mais importante seria tornar os usuários dessa língua cientes do fenômeno para que essa adoção de estrangeirismos seja uma opção meramente. É preciso ter essa consciência para que se faça melhor uso de tão rica troca. 40 REFERÊNCIAS BARROS, Diana Luz Pessoa de. Teoria semiótica do texto. São Paulo: Ática, 2001. BECHARA, Evanildo. Moderna gramática portuguesa. 37 ed. Rio de Janeiro, Lucerna, 2006. BRANDÃO, Helena H. N. Introdução à análise do discurso. 2ª ed. rev. Campinas: Unicamp, 2004. BRASIL, Diário da Câmara dos Deputados. 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