Agenda Tecnológica Setorial – ATS
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Agenda Tecnológica Setorial – ATS
Agenda Tecnológica Setorial – A T S Química Q UÍMICA DE R ENOVÁVEIS PANORAMA ECONÔMICO O Ph R Me NH N N O O N Centro de Gestão e Estudos Estratégicos Ciência, Tecnologia e Inovação Este texto integra um conjunto de documentos que compõem o projeto Agenda Tecnológica Setorial (ATS), que inclui: Panorama Econômico Setorial Panorama Tecnológico Setorial Relatório Descritivo da Consulta Estruturada Relatório Analítico da Consulta Estruturada O material completo está disponível no site da ABDI: www. abdi.com.br ©2016 – Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial – ABDI Qualquer parte desta obra pode ser reproduzida, desde que citada a fonte. REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL Michel Temer Presidenta Interino MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO, DA INDÚSTRIA, COMÉRCIO EXTERIOR E SERVIÇOS Marcos Pereira Ministro MINISTÉRIO DA CIÊNCIA, TECNOLOGIA E INOVAÇÃO Gilberto Kassab Ministro Miguel Nery Presidente Interino ABDI Mariano Francisco Laplane Presidente CGEE Maria Luisa Campos Machado Leal Diretora de Desenvolvimento Tecnológico e Inovação Marcio de Miranda Santos Diretor Executivo Paulo César Marques da Silva Diretor do Desenvolvimento Produtivo – Substituto Antonio Carlos Filgueira Galvão Gerson Gomes José Messias de Souza (a partir de 19/08/15) Diretores Carla Maria Naves Ferreira Gerente de Desenvolvimento Tecnológico e Inovação Leonardo Reisman Chefe de Gabinete ©2016 – Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial – ABDI Qualquer parte desta obra pode ser reproduzida, desde que citada a fonte. SUPERVISÃO Maria Luisa Campos Machado Leal SUPERVISÃO Marcio de Miranda Santos EQUIPE TÉCNICA DA ABDI EQUIPE TÉCNICA CGEE Carla Maria Naves Ferreira Gerente de Desenvolvimento Tecnológico e Inovação Liliane Sampaio Rank de Vasconcelos Coordenadora Maria Sueli Soares Felipe Coordenadora de Desenvolvimento Tecnológico e Sustentabilidade Kátia Regina Araújo de Alencar Assessora Cynthia Araújo Nascimento Mattos Coordenadora de Promoção da Inovação Zil Miranda Assessora Especial Rodrigo Alves Rodrigues Analista Sênior Adriana dos Santos Ghizoni Assistente de Projetos ESPECIALISTAS SETORIAIS Bruno Jorge Carlos Venicius Frees Claudionel de Campos Leite Cleila Guimarães Pimenta Jorge Luis Ferreira Boeira Junia Casadei Lima Motta Larissa de Freitas Querino Ricardo Gonzaga Martins Valdênio Miranda Araújo Vandete Cardoso Mendonça Kleber de Barros Alcanfôr Assessor Lilian M. Thomé Andrade Brandão Assessora Rogério Mendes Castilho Assessor Simone Rodrigues Neto Andrade Assistente Administrativo COMITÊ TÉCNICO DE ESPECIALISTAS Claudio Mota Felipe Pereira Manoel Teixeira Paulo Coutinho Suzana Bobchiver COORDENAÇÃO TÉCNICA GERAL COORDENAÇÃO DE COMUNICAÇÃO Fabio Stallivieri (UFF) Ricardo Naveiro (UFRJ) Rodrigo Sabbatini (UNICAMP) Simone Zerbinato Coordenadora de Comunicação Substituta COORDENAÇÃO TÉCNICA SETORIAL Rachel Mortari Edição/Organização José Victor Bontempo (UFRJ) Panorama Econômico Maria Irene Lima Mariano Revisão Flavia Chaves Alves (UFRJ) Panorama Tecnológico Rodrigo Martins (Tikinet) Projeto Gráfico Bruna Orkki (Tikinet) Diagramação ABDI Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial SCN Quadra 1, Bloco D, Ed. Vega Luxury Design Offices, Torre Empresarial A Asa Norte, Brasília – DF CEP 70.711-040 – Tel.: (61) 3962 8700 www.abdi.com.br CGEE Centro de Gestão e Estudos Estratégicos SCS Quadra 9, Torre C, 4º andar Ed. Parque Cidade Corporate CEP: 70.308-200 +55 61 3424-9600 Sumário 1. Introdução. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7 2. Demanda: principais drivers e projeções. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9 2.1. Principais drivers . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9 2.2. Potencial de mercado. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 12 3. Características econômicas do setor . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15 4. Espaços de estruturação da indústria: matérias-primas, tecnologias, produtos e estratégias. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18 4.1. Matéria-prima. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18 4.1.1. A transição do carvão para o petróleo e gás natural na indústria química . . 19 4.1.2. O desafio das matérias-primas renováveis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20 4.2. Tecnologias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21 4.3. Produtos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 24 4.4. Estratégias e modelos de negócios. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27 5. Atributos de competitividade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 32 6. Recomendações para a situação Brasileira. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34 7. Considerações finais. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 36 Referências bibliográficas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37 Lista de Tabela Tabela 1 – Bioplásticos – Distribuição da capacidade prevista (2016). . . . . . . . 13 Tabela 2 – Produtos químicos derivados de biomassa – empresas e potencial comercial. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14 Lista de Quadros Quadros 1 – Perfis de empresas e perspectivas em relação à bioeconomia . . . . . . . . . . . . 29 Quadros 2 – Estratégias de inovação e competição na bioeconomia – Quadro analítico. . . 31 1. Introdução Este documento apresenta e discute a estrutura de competição e a dinâmica econômica e de inovação do setor de química baseada em matérias-primas renováveis. Em algumas situações, esse setor costuma ser confundido imprecisamente com a denominação mais ampla de química verde. No âmbito deste relatório, a química verde é entendida de forma restrita como a química baseada em matérias-primas renováveis.1 O processo de inovação em curso, que busca o desenvolvimento de uma indústria baseada em matérias-primas renováveis, faz parte de um movimento mais amplo que costuma ser designado como bioeconomia ou indústria dos produtos bioderivados (biobased industry).2 Este novo setor industrial encontra-se em processo de estruturação. Sua dinâmica de concorrência é orientada pela inovação num ambiente ainda de elevado nível de incertezas. As vantagens comparativas brasileiras são expressivas, mas dependem de esforços tecnológicos e empresariais para se tornarem vantagens competitivas na nova indústria e darem ao país uma posição de destaque na indústria química do futuro. Nos últimos anos, tem sido crescente o interesse em tecnologias que levem ao desenvolvimento de uma economia de baixo carbono. Aceita-se uma ideia geral de que os sistemas tecnológicos construídos e consolidados durante o século XX estariam vivendo um período de transição no qual, entre outras transformações, a sua base fóssil tenderia a ser objeto de questionamento e busca de alternativas. A exploração industrial da biomassa para a produção de biocombustíveis, produtos químicos, materiais e energia se inscreve nesse processo de transição. O relatório limita-se ao segmento industrial voltado para a transição dentro do âmbito da indústria química/petroquímica, considerando o sistema tecnológico que engloba os produtos hoje obtidos a partir de matérias-primas fósseis, em geral petróleo e gás natural. Trata-se, portanto, de discutir a estrutura econômica e a dinâmica de um setor industrial que tem como ambição avançar na substituição das matérias-primas fósseis, base da indústria estruturada no século XX. A transição em sistemas tecnológicos consolidados, como o de materiais e produtos químicos, é um processo complexo (Geels, 2004; Berkout, 2004), que depende da estruturação de um novo regime de produção. Existem, como ponto de partida, indicações no ambiente industrial de que uma demanda crescente se oferece como oportunidade para os inovadores. Apesar de se apresentar como um setor ainda em estruturação, as oportunidades para a indústria química baseada em matérias-primas renováveis são vis1 Para uma visão ampla do conceito de química verde, ver Química Verde no Brasil, 2010 – 2030 (CGEE, 2010). 2 Os termos bioeconomia e biobased industry têm sido definidos de diversas formas, mas em todas elas destaca-se o potencial de inovação para a economia nas próximas décadas. Ver, por exemplo, OECD (2009); European Commission (2012); White House (2012); Reddy et al. (2012). 7 Agenda Tecnológica Setorial – ATS Panorama Econômico tas como expressivas e têm atraído a atenção de políticas governamentais e estratégias empresariais. Na seção 2, discutem-se a dimensão e os principais drivers da demanda. Na busca da demanda percebida, uma oferta encontra-se em estruturação. Na seção 3, discutem-se as características do setor, sublinhando-se as dimensões que dão um caráter ainda indefinido à sua estrutura. Na compreensão da dinâmica de inovação do setor, quatro espaços de estruturação devem ser destacados e discutidos. São eles: as matérias-primas, as tecnologias de conversão da biomassa, a dinâmica de inovações em produtos e as estratégias e modelos de negócios em experimentação. Na seção 4, os quatro espaços são discutidos. Os atributos de competitividade do setor são apresentados na seção 5, destacando-se as recomendações e proposições que, à luz da análise desenvolvida com base na dinâmica de competição e inovação do setor em nível mundial, podem ser sugeridas para as iniciativas de políticas industriais e de inovação no caso brasileiro. Na seção 6, apresentam-se as considerações finais do estudo. 8 Complexo Industrial da Química Química de Renováveis 2. Demanda: principais drivers e projeções O ponto inicial para se compreender a demanda é a identificação dos grandes drivers que dão corpo aos esforços de desenvolvimento dos processos inovadores e às iniciativas de políticas, estratégias e modelos de negócio. Discutem-se inicialmente os principais drivers e apresentam-se em seguida estimativas do potencial de mercado que têm sido projetadas para a indústria de produtos bioderivados. 2.1. Principais drivers3 Diversos fatores podem ser vistos como determinantes do interesse crescente pela utilização de matérias-primas renováveis. Esses fatores sugerem que o processo tem perspectiva de vir a ter peso importante na indústria no decorrer do século XXI. Podem ser citados como fatores de maior peso (Coutinho e Bomtempo, 2011; Bomtempo, 2010): a. o potencial da biotecnologia industrial ou white biotechnology; b. as restrições ambientais ao uso de matérias-primas fósseis; c. a orientação das estratégias empresariais; d. a perspectiva da inovação tecnológica como saída de crise. A biologia está se tornando um poderoso vetor de dinamismo da economia mundial, como base da inovação no século XXI (OECD, 2009). A evolução dos conhecimentos em biologia contribui para maior utilização das biomassas, seja na preparação e produção de matérias-primas, seja no desenvolvimento de novas tecnologias de conversão. Novos conhecimentos baseados em engenharia genética, novos processos fermentativos e enzimáticos estarão crescentemente disponíveis. Além da otimização e evolução de processos já conhecidos, a chamada biologia sintética surge como uma poderosa ferramenta que pode permitir o desenho de rotas metabólicas inovadoras (UK Synthetic Biology Roadmap, 2012). Assim, torna-se possível obter diretamente novas moléculas ou moléculas já conhecidas que antes exigiam múltiplas etapas reacionais. Esse potencial, além de ter despertado o interesse de numerosas startups que tentam viabilizar comercialmente os conceitos da biologia sintética, tem influenciado e modificado a própria agenda americana de financiamento à inovação (DOE, 2013; Regalbuto, 2011). A questão ambiental é sem dúvida outro fator de peso no aumento do interesse pelas matérias-primas renováveis. Apesar das dificuldades políticas que têm cercado as decisões dos grandes fóruns internacionais, pode ser tomada como consensual a ideia de que as 3 Este item retoma e atualiza a discussão apresentada em Coutinho e Bomtempo (2011) e Bomtempo (2010). 9 Agenda Tecnológica Setorial – ATS Panorama Econômico restrições ambientais às tecnologias ligadas ao aquecimento global serão crescentes nas próximas décadas. Nos últimos anos, a situação da economia mundial não tem efetivamente favorecido a adoção de regulação restritiva aos produtos de origem fóssil, o que facilitaria a entrada e difusão dos produtos bioderivados. Entretanto, o quadro regulatório continua a ter como tendência a transição da estrutura industrial na direção de uma base de baixo carbono. No que se refere especificamente aos bioprodutos, diversos mecanismos têm sido colocados em prática, principalmente na Europa, Estados Unidos e Japão. Entretanto, na avaliação de Hermann et al. (2011), a efetividade da maioria deles para a difusão dos produtos biobased ainda não se fez sentir ou é apenas ligeiramente positiva. Existiria, portanto, um espaço de evolução e aprimoramento dos mecanismos regulatórios que poderiam favorecer a difusão dos produtos da bioeconomia. As orientações estratégicas definidas por algumas empresas importantes reforçam o processo de construção de uma indústria baseada em biomassa. Alguns exemplos podem ser destacados no âmbito da atual indústria química.4 A DuPont estabeleceu, no final dos anos 1990, princípios de sustentabilidade para a sua trajetória de crescimento no século XXI que se baseiam fortemente na biotecnologia e na utilização de matérias-primas renováveis (West, 1999; Holliday, 2001). A DSM é outra empresa química que tem estabelecido com clareza princípios de atuação voltados para a transição do fóssil para os biorrecursos (Sijbesma, 2011; Kirchbaum e Wubbolts, 2010). Mais recentemente, a BASF também passou a identificar em seus documentos estratégicos a biotecnologia e as matérias-primas renováveis como bases do crescimento futuro da empresa (Lane, 2012). Outros exemplos de incorporação crescente da dimensão verde nas estratégias corporativas na indústria química podem ser citados: Dow, Solvay, Mitsubishi e, no caso brasileiro, Braskem. Uma pesquisa recente (Burr, 2013; Baker, 2013), realizada com empresas químicas e petroquímicas em âmbito mundial, identificou, entre 190 respondentes, que 45% dos produtores de produtos químicos básicos e intermediários desenvolvem atualmente atividades de pesquisa e desenvolvimento (P&D) em matérias-primas renováveis. No mesmo grupo, 36% das empresas declaram comprometimento estratégico com o uso de matérias-primas renováveis e 26% estão investindo na construção de unidades de produção a partir de renováveis. Pode-se, portanto, tomar como ponto de partida que iniciativas voltadas para a utilização de matérias-primas renováveis estão incorporadas por numerosas empresas químicas e são, cada vez mais, centrais para as empresas líderes do setor. No campo das estratégias, não pode deixar de ser percebida a importância de segmentos utilizadores chaves (end users), como embalagens, automóveis, higiene e limpeza e outros segmentos de bens finais. Esses segmentos não são, como regra, clientes diretos da indústria química. Mas podem ter um papel central como fontes funcionais das inovações em bioprodutos. Como estudos clássicos em inovação demonstram (von Hippel, 1988; 2005), o agente dinâmico no desenvolvimento das inovações nem sempre é o produtor, deslocando-se em diversas situações para outros agentes, como fornece4 As estratégias das empresas estabelecidas, assim como de potenciais entrantes na biobased industry, serão apresentadas e discutidas na seção 4 deste relatório. 10 Complexo Industrial da Química Química de Renováveis dores e utilizadores finais. Os esforços da Coca-Cola com a chamada plantbottle, e mais recentemente com a formação do Plant PET Technology Collaborative (PTC), envolvendo, além da Coca-Cola, Ford, Heinz, Nike e Procter and Gamble, indicam o papel crucial que as estratégias de sustentabilidade dos end users representam como drivers da demanda futura dos bioprodutos. O desenvolvimento do PE verde da Braskem foi fortemente apoiado na receptividade de end users como Natura, Toyota, Tetra Pack, Johnson & Johnson, Procter & Gamble e outros. A Unilever tem como estratégia explícita reduzir à metade o seu footprint no horizonte de planejamento em que as vendas atuais passem de 40 a 80 bilhões de euros (Polman, 2012), o que representa uma demanda potencial para a química renovável. Em outras palavras, uma oportunidade a ser explorada pela capacidade inovadora da indústria química que pode oferecer produtos e materiais capazes de contribuir para que a Unilever atinja o objetivo fixado. Potencialmente, movimentos de empresas como a Coca-Cola e outros end users de grande peso têm efeito muito importante no estabelecimento de novos conceitos que podem se difundir pela economia. O segmento de embalagens sustentáveis, por exemplo, é visto como um campo de muitas iniciativas das empresas mais diretamente ligadas ao consumidor final, como os produtores de alimentos e os grandes distribuidores, o que sugere oportunidades de atuação para as empresas capazes de oferecer novos materiais e novos conceitos de embalagens. No caso da indústria automobilística, duas tendências fortes influenciam as perspectivas da utilização de produtos derivados de matérias-primas renováveis. A primeira refere-se à redução de emissões e melhora de eficiência ambiental dos carros. Nesse ponto, os biocombustíveis encontram-se em competição com os carros elétricos que são atualmente objeto de estratégias específicas da indústria automobilística ou de outras soluções que afetem a organização do sistema de transporte e mobilidade urbana. No que se refere aos materiais estruturais, algumas montadoras anunciam em seus relatórios de sustentabilidade metas de utilização de materiais biobased, como é o caso da Toyota, que tem como meta utilizar materiais renováveis ou reciclados em 15% das peças em resinas. A segunda tendência forte está relacionada às perspectivas de crescimento da indústria hoje voltadas, em sua parte mais dinâmica, para os mercados emergentes. Nesses mercados, a necessidade de reduzir custos e produzir carros adaptados às condições locais abre oportunidades de inovações nos materiais e nos modelos de negócios que podem oferecer também oportunidades aos biocombustíveis e bioprodutos. Finalmente, cabe valorizar o papel da utilização de matérias-primas renováveis como parte das inovações tecnológicas que devem constar da estratégia de saída de crise. As linhas de financiamento à inovação desenvolvidas nos Estados Unidos para biocombustíveis e bioprodutos são estruturadas explicitamente, ao lado dos objetivos de segurança de abastecimento e redução da dependência, como plataformas de construção de uma base tecnológica visando estabelecer uma posição de liderança na bioeconomia do século XXI, como atestam os programas dos Departamentos de Energia (DOE), Agricultura 11 Agenda Tecnológica Setorial – ATS Panorama Econômico (USDA) e Defesa (DOD).5 Em maior ou menor grau, identificam-se diversas iniciativas nacionais de políticas voltadas para a transição para a bioeconomia (Kircher, 2012). Economistas estudiosos dos grandes ciclos tecnológicos como estruturação da dinâmica do capitalismo colocam a chamada green economy no centro da recuperação da atual crise econômica e da construção de uma possível nova era de ouro de crescimento da economia mundial (Perez, 2012, 2011). 2.2. Potencial de mercado O principal uso das matérias-primas renováveis ainda é muito mais expressivo para a produção de biocombustíveis do que para produtos químicos. Entretanto, enquanto as taxas de crescimento dos biocombustíveis são estimadas em torno de 10% a.a., as taxas para os bioprodutos costumam se situar acima de 20% a.a. Além disso, os estudos de impactos e efeitos ambientais têm sido favoráveis aos bioprodutos em comparação com os biocombustíveis (Hermann et al., 2011) e a própria viabilidade econômica parece ser favorecida nos mercados de bioplásticos e outros bioprodutos que permitem margens maiores e eventualmente prêmios em relação aos similares de base fóssil. A produção integrada de biocombustíveis e bioprodutos em biorrefinarias continua sendo um conceito em construção que deve contribuir para a estruturação da indústria do futuro baseada em biomassa Diversas estimativas têm sido divulgadas sobre o mercado potencial de polímeros e produtos químicos baseados em biomassa (Shen et al., 2009; USDA, 2008; Patel et al., 2006; Raschka e Carus, 2012; IEA Bioenergy Task 42, 2012; De Jong et al., 2012, entre outras fontes). O potencial de substituição para um grupo de produtos químicos de grande volume, considerando condições favoráveis de mercado, foi estimado pelo chamado projeto BREW (Patel et al., 2006) em cerca de 113 milhões de toneladas até 2050. Isso representaria 38% de toda a produção da química orgânica. Na hipótese mais conservadora, o estudo estima um mercado ainda expressivo da ordem de 26 milhões de toneladas, o que corresponderia a 17,5% da química orgânica (Patel et al., 2006). A produção atual da indústria química, incluindo também produtos inorgânicos, é da ordem de 330 milhões de toneladas anuais (De Jong et al., 2012). Na avaliação do potencial de mercados dos bioprodutos, costuma-se separar os bioplásticos e os demais produtos químicos. A capacidade de produção atual dos bioplásticos é da ordem de 1 milhão de toneladas/ano, o que se situa em torno de 1% da capacidade global dos plásticos convencionais. Entretanto, prevê-se para os próximos anos uma taxa de crescimento anual da ordem de 31% (European Bioplastics Association, 2012), o que resultaria, em 2016, numa capacidade de produção de cerca de 6 milhões de tone- 5 Referências e detalhes sobre esses programas podem ser encontrados em diversos documentos disponíveis em <www.doe. gov> e <www.usda.gov>. Uma visão abrangente do programa americano de biomassa pode ser visto em The Biomass Program Today: working across the supply chain, disponível em <http://www1.eere.energy.gov/biomass/pdfs/biomass_walkthrough. pdf>. A visão estratégica dos Estados Unidos para a bioeconomia está apresentada em White House (2012). 12 Complexo Industrial da Química Química de Renováveis ladas. A perspectiva de manutenção de taxas de crescimento dessa ordem, sustentada pelos drivers discutidos anteriormente, tem atraído o interesse das empresas. É importante destacar os principais tipos de bioplásticos que devem contribuir para o crescimento da oferta nos próximos anos, pelo menos no curto e médio prazos. Na tabela 1, apresentam-se os principais bioplásticos que devem ser produzidos em 2016 e a distribuição das capacidades instaladas. A maior parte corresponde aos bioplásticos não biodegradáveis, ditos drop-in,6 como bio-PE (100% renovável) e bio-PET (atualmente com 30% de material renovável), cujas capacidades de produção podem atingir nos próximos cinco anos mais de 500 mil toneladas cada. Outros drop-ins, como PP, PA e PVC, são esperados no mercado nos próximos anos. As taxas de crescimento dos bioplásticos biodegradáveis, não drop-in, como PLA e PHA, devem se manter expressivas, mas isso não impedirá que esse grupo de bioplásticos perca espaço para os não biodegradáveis nos próximos anos. Tabela 1 – Bioplásticos – Distribuição da capacidade prevista (2016) Bioplástico Participação em capacidade (%) BIO PET 30 (30% renovável) 80,1 BIO PE 4,3 BIO PA 1,2 Outros não biodegradáveis 1,0 Total não biodegradável (A) 86,6 PLA 5,1 Poliésteres biodegradáveis 2,7 Blendas com amido 2,5 PHA 2,5 Outros biodegradáveis 0,6 Total biodegradável (B) 13,4 Total (A + B) 100 Fonte: European Bioplastics Association (2012) No caso dos produtos químicos bioderivados, em sua maioria considerados building blocks (básicos e intermediários) para a conversão em produtos finais, listam-se numerosos produtos com projetos identificados. Na tabela 2, apresenta-se uma lista desses produtos, incluindo as principais empresas envolvidas. Alguns desses produtos encontram-se em produção comercial ou pré-comercial e já demonstram efetivo potencial de crescimento. Outros são vistos como produtos ainda em pipeline, com potencial comercial dependendo de desenvolvimentos tecnológicos e comerciais. Na seção 4, a natureza dos produtos será discutida em subseção dedicada à análise da evolução dos produtos como espaço de estruturação da indústria. 6 O termo drop-in refere-se a produtos, biocombustíveis ou bioprodutos, que podem ser utilizados em substituição aos produtos de base fóssil sem necessidade de qualquer adaptação na infraestrutura de distribuição e equipamentos de transformação e utilização. Os produtos drop-in utilizam integralmente os ativos complementares já instalados e desenvolvidos pela atual estrutura industrial. 13 Agenda Tecnológica Setorial – ATS Panorama Econômico Tabela 2 – Produtos químicos derivados de biomassa – empresas e potencial comercial Produtos 1 Metanol Ácido fórmico Metano Gás de síntese 2 Eteno Acetato de etila Etanol Etilenoglicol Ácido glicólico Ácido acético 3 Ácido láctico Ácido acrílico Glicerol 3-hidroxi-propiônico Propeno Epicloridrina 1,3 propanodiol n-propanol Isopropanol Lactato de etila Propileno glicol 4 n-butanol 1,4 butanodiol Isobutanol Iso-buteno Metaacrilato de metila Ácido succínico Isobuteno 5 Furfural Ácido itacônico Xilitol Isopreno/farneseno Ácido glutâmico Ácido levulínico 6 Sorbitol Ácido adípico Lisina Isosorbide Ácido glucárico Ácido cítrico FDCA Caprolactama NPHA Para - xileno Ácidos dicarboxilícos Derivados de ácidos graxos Empresas BioMCN, Chemrec Maine Muitas empresas BioMCN, Chemrec Braskem, Dow/Mitsui, SongyuanJi Zeachem Muitas empresas India Glycols, Greencol Metex Wacker, Zeachem Purac, Natureworks, Galactic, Henan Jindan, BBCA Cargill, Perstorp, OPX Bio, Dow, Arkema Muitasempresas Cargill Braskem, Mitsubishi, Mitsui Solvay, Dow DuPont/Tate&Lyle Braskem Genomatica, Mitsui Vertec ADM, Oleon/BASF Cathay, Butamax, Butalco, Cobalt/Rhodia Genomatica com M&G, Mitsubishi, Tate&Lyle Butamax, Gevo Gevo/Lanxess, Lucite/Mitsubishi, Evonik/Arkema BioAmber, Myriant, BASF/PURAC, DSM/Roquette, PTT Chem/Mitsubishi Gevo/Lanxess Muitas empresas Qingdao, Itaconix Danisco/Lenzing, Xylitol Canada Goodyear/Genencor, GlycosBio, Amyris Global Biotech, Melhua, Fufeng, Juhua Maine, Avantium, Segetis, Circa Roquette, ADM Verdezyne, Rennovia, BioAmber, Genomatica Global Biotech, Evonik/Rus, BBCA, Draths, Ajinomoto Roquette Rivertop Cargill, DSM, BBCA, Ensign, TTCA, RZBC Avantium DSM Metabolix, Meridian, Tianjin, Gevo, Draths, UOP, Annellotech, Virent Cathay, Evonik Potencial Crescimento Pipeline Crescimento Crescimento Crescimento Pipeline Crescimento Crescimento Pipeline Crescimento Crescimento Pipeline Crescimento Pipeline Pipeline Crescimento Crescimento Pipeline Pipeline Crescimento Crescimento Crescimento Pipeline Crescimento Pipeline Pipeline Crescimento Pipeline Crescimento Pipeline Crescimento Pipeline Crescimento Pipeline Crescimento Pipeline Crescimento Crescimento Pipeline Crescimento Pipeline Pipeline Crescimento Pipeline Crescimento Croda, Elevance Crescimento Fonte: IEA Bioenergy Task 42 Biorefinery (2012) 14 Complexo Industrial da Química Química de Renováveis 3. Características econômicas do setor O setor de bioprodutos derivados de matérias-primas renováveis deve ser analisado como um setor emergente ainda sem estrutura industrial definida. A dinâmica de competição e inovação nesse setor segue, portanto, a lógica das indústrias emergentes. Para justificar essa condição de indefinição estrutural, algumas características econômicas podem ser destacadas: a. grande número de projetos inovadores em competição, propondo soluções diferentes em resposta às oportunidades do ambiente; b. incorporação de novas bases de conhecimento, em particular a biotecnologia avançada; c. surgimento de numerosas startups apoiadas por grants e políticas de inovação e por volumes expressivos de recursos de venture capital; d. participação de empresas estabelecidas de diversas indústrias, além dos players da própria indústria química; e. envolvimento de um processo de transição de matéria-prima, o que gera incertezas e leva a transformações de fundo na indústria. Matéria-prima é fator estruturante na indústria química. A tabela 2 (lista ilustrativa dos projetos inovadores para a obtenção de produtos químicos) destaca em boa medida o ambiente de variedade que envolve uma indústria em formação e em busca de definições de conceitos dominantes. Incluindo tanto biocombustíveis quanto bioprodutos, a base de dados elaborada pelo site Biofuels Digest (Biofuelsdigest.com, 2013) conta com 138 empresas diferentes desenvolvendo projetos inovadores, a maioria em estágios piloto ou demonstração. Há soluções propostas para um grande número de produtos que, se viabilizados comercialmente, trariam alternativas de substituição de um amplo espectro de produtos da indústria de base fóssil. Entretanto, na maioria dos casos citados não é possível indicar as inovações que vão ser efetivamente adotadas e difundidas pelo mercado. Trata-se de um processo voltado para a geração de variedades que, dentro da dinâmica da inovação,7 serão selecionadas ao longo do tempo e contribuirão para a construção da futura indústria baseada em biomassa. Os projetos em desenvolvimento voltam-se para a busca de melhores produtos, melhores processos e melhores matérias-primas (de 7 A dinâmica de inovação da indústria é retomada e atualizada neste relatório a partir de Bomtempo (2010) e Coutinho e Bomtempo (2011). Uma revisão dos conceitos em economia da inovação que dão fundamentação teórica à discussão encontra-se em Bomtempo (2010). 15 Agenda Tecnológica Setorial – ATS Panorama Econômico preços mais baixos e estáveis, e de fácil disponibilidade) para a produção de biocombustíveis e de bioprodutos, que possam se apresentar como alternativas aos produtos de base fóssil. Seguindo a denominação clássica de Abernathy e Utterback (1978), a quantidade e a diversidade das alternativas propostas sugerem que a tecnologia encontra-se na fase fluida. Encontram-se ainda em definição processos e produtos que vão ocupar parcelas expressivas de mercado. Por isso, as decisões na indústria se fazem ainda com elevado grau de incerteza. A análise das inovações de processo mostra em primeiro lugar uma amplitude de técnicas em desenvolvimento, utilizando diversas bases de conhecimento (indo da biotecnologia convencional de processos fermentativos e enzimáticos à biotecnologia avançada que utiliza novos conhecimentos em biologia sintética, passando pela catálise, pelos processos de síntese química e processos termoquímicos). A variedade de processos aponta ainda para a presença de empresas com backgrounds variados de conhecimento e que tradicionalmente não estavam presentes nos mercados de energia e de química. É o caso das empresas de biotecnologia, algumas com histórico de desenvolvimentos importantes em outras indústrias, como a médico-farmacêutica. A incorporação da biotecnologia sintética representa uma nova base de conhecimento que desafia fortemente a indústria química e a coloca em competição com novas empresas detentoras dessa base de conhecimento, mas sem competências na produção em escala e comercialização. A variedade do perfil das empresas envolvidas é notável. Entre as empresas envolvidas nos projetos inovadores (tabela 2), destaca-se a presença de numerosas startups de base tecnológica, em geral saídas de universidades. Essas empresas têm sido financiadas nas fases iniciais de desenvolvimento (prova de conceito, piloto, demonstração) por grants de agências públicas, complementados frequentemente por recursos de venture capital. Os fundos de venture capital têm se interessado pelas oportunidades da economia verde e em particular pela indústria baseada em biomassa.8 A presença de startups e o interesse do venture capital reforçam o caráter emergente do setor e a sua indefinição estrutural. A entrada das startups no setor biobased apoia-se naturalmente no seu conhecimento tecnológico de base: empresas de biotecnologia, com experiência anterior em outras indústrias, como a médico-farmacêutica, ou criadas diretamente para atuar na bioeconomia, ao lado de startups com bases de conhecimento em química e engenharia química. Um grupo expressivo de participantes é o formado pelas empresas da indústria química. Identificam-se empresas cujo processo de transformação da base produtiva já incorpora em boa medida a biotecnologia e as matérias-primas renováveis como foco estratégico (DuPont e DSM), ao lado de empresas ainda identificadas com a indústria química/ petroquímica (Braskem, Dow, BASF, Solvay, Lanxess). O setor de produtos químicos renováveis tem atraído ainda empresas identificadas com ingredientes para a indústria 8 Apesar de uma queda expressiva em relação a 2011, o volume de recursos aplicados nos Estados Unidos pelo venture capital no segmento dito de Tecnologias Limpas (Clean Tech), em 2012, foi de US$ 6,46 bilhões, dos quais 14,8% foram destinados para biocombustíveis (LaMonica, 2013). 16 Complexo Industrial da Química Química de Renováveis de alimentos (Purac, Roquette, Tate & Lyle) e empresas do agronegócio (ADM, Bunge, Cargill). Devem ser mencionadas ainda as empresas de petróleo e gás que, voltadas principalmente para os biocombustíveis, têm construído negócios importantes no processamento industrial de biomassa, muitas vezes em associação com startups ou com empresas químicas destacadas na tabela 2. É o caso notadamente de Shell, BP, Total, Neste Oil e Petrobras. Por fim, as empresas da indústria de papel e celulose (Stora Enso, UPM, Borregaard, Fibria) têm crescentemente se interessado pela diversificação de seu core business a partir do expressivo know-how que acumulam no cultivo, tratamento e processamento de recursos florestais. Esse grupo variado de empresas – de uma pequena startup de base tecnológica a uma gigante do agronegócio – representa na verdade um portfólio de competências complementares que devem ser combinadas no processo de estruturação do setor. A natureza das estratégias e dos modelos de negócios colocados em prática pelos diferentes perfis de empresas será discutida na seção 4. Além das características econômicas mencionadas até agora – grande número e variedade de projetos inovadores, incorporação de novas bases de conhecimento, presença de startups e do venture capital, e participação de entrantes de diversas indústrias –, uma quinta dimensão completa o quadro de um setor em estruturação: a transição de matéria-prima. A matéria-prima é um fator estruturante histórico na indústria química. Em transições anteriores – o surgimento do carvão como matéria-prima e a passagem do carvão para o petróleo/gás –, o processo de adoção da matéria-prima representou também mudanças estruturais importantes. Uma discussão dos aspectos estruturais envolvidos nas transições de matéria-prima e das especificidades das matérias-primas renováveis é desenvolvida na seção 4. As características econômicas discutidas nesta seção trazem evidências de que o setor deve ser visto como uma indústria emergente cuja estrutura encontra-se em processo de construção. A competição nessas condições se dá pela inovação e pela capacidade dos inovadores em atuarem para moldar a estrutura do setor. O processo de estruturação da indústria pode ser entendido como o resultado da interação de quatro dimensões: matérias-primas, tecnologias, produtos e estratégias, e modelos de negócio. Esses espaços de estruturação – discutidos a seguir – permitem identificar a formação da oferta do setor. 17 Agenda Tecnológica Setorial – ATS Panorama Econômico 4. Espaços de estruturação da indústria: matérias-primas, tecnologias, produtos e estratégias A estruturação da oferta do setor de bioprodutos depende da evolução, ainda em curso, de um conjunto de variáveis. Esse processo evolutivo busca encontrar respostas aos múltiplos problemas a serem superados para se viabilizar e consolidar comercialmente as oportunidades identificadas. Neste relatório, considera-se que essas soluções dependem de quatro espaços de estruturação que são, com efeito, espaços de inovações interdependentes. A estruturação da oferta do setor depende da dinâmica de inovação em: a. matérias-primas; b. tecnologias de conversão da biomassa; c. produtos; d. modelos de negócio e estratégias. À medida que os espaços de estruturação evoluam, o nível de variedade na indústria tende a diminuir. A consolidação de uma indústria passa pela busca de conceitos dominantes (Abernathy e Utterback, 1978) que propiciem o seu amadurecimento estrutural. Discutem-se a seguir as dinâmicas dos quatro espaços de estruturação identificados. 4.1. Matéria-prima9 A adoção de um tipo de matéria-prima deve ser vista como um elemento que exerce influência importante na estrutura da indústria. Por isso, a transição de um tipo de matéria-prima para outro é um tema central na história da indústria química orgânica. Segundo Spitz (1988), a história da indústria química orgânica sugere que a disponibilidade de matéria-prima, muito mais do que a tecnologia ou o mercado, tem sido o direcionador chave da indústria. Assim, a disponibilidade de grandes quantidades de derivados do carvão na segunda metade do século XIX permitiu a produção de corantes e produtos farmacêuticos. Da mesma forma, a disponibilidade de grandes quantidades de hidrocarbonetos reativos, gerados pelo refino de petróleo, levou à criação dos petroquímicos nos anos 1930. A disponibilidade seria então, na perspectiva histórica, a condição de base para a adoção de uma matéria-prima industrial. 9 A discussão sobre matéria-prima é feita a partir de Bomtempo (2012). 18 Complexo Industrial da Química Química de Renováveis 4.1.1. A transição do carvão para o petróleo e gás natural na indústria química O surgimento da petroquímica, que representou a substituição do carvão por petróleo e gás natural, pode trazer alguns elementos para refletir sobre o processo de transição de uma matéria-prima para outra e levantar pontos que podem ser úteis para entender alguns dos problemas de incorporação das matérias-primas renováveis. A consolidação da petroquímica se dá efetivamente a partir da definição da natureza das matérias-primas. A produção de químicos a partir de petróleo inicia-se nos Estados Unidos nos anos 1920. Exxon (Standard Oil), Shell, Union Carbide e Dow identificaram oportunidades na exploração do eteno. Até então, o offgas do refino era usado apenas como combustível, mas a sua disponibilidade crescente e o potencial reativo das moléculas motivaram algumas empresas a trabalharem no desenvolvimento de novos usos. Entre 1921 e 1939, a produção de químicos orgânicos não derivados do carvão passou de 21 milhões de libras (US$ 9,3 milhões) para 3 bilhões de libras (US$ 394 milhões) (Spitz, 1988): a base de matérias-primas da indústria química se transformava rapidamente. No entanto, a indústria química na época via com desconfiança a perspectiva de se tornar dependente do petróleo e de suas poderosas empresas. Nos anos 1930, ao anunciar o nylon como uma grande inovação, a DuPont sublinhava, ao lado das extraordinárias propriedades do novo material, o fato de que poderia ser obtido a partir de carvão, ar e água. Lembre-se que a produção industrial de nylon inicia-se em 1937, quando a produção de químicos derivados do petróleo crescia rapidamente (Spitz, 1988; Bomtempo, 1994). Na Europa, onde o desenvolvimento da carboquímica era mais forte, a adesão à petroquímica é um pouco mais lenta. ICI, o grande conglomerado inglês da indústria química, apresentava, ainda em 1944, carvão, petróleo e biomassa como matérias-primas alternativas a serem combinadas de forma complementar nas suas linhas de produtos. Na Alemanha, terra da carboquímica, a transição se dá nos anos 1950, durante o processo de reconstrução industrial do pós-guerra. Em 1953, a BASF se associa à Shell e assim se forma a ROW (Rheinische Olefinwerke), dedicada à produção de petroquímicos básicos. Na mesma época, as duas outras grandes empresas químicas alemãs – Bayer e Hoechst – também aderem ao petróleo. Apesar disso, o carvão foi sendo deslocado lentamente na Alemanha. Em 1960, apenas 40% da química orgânica alemã era baseada em petróleo ou gás natural, contra 80% nos Estados Unidos (Stokes, 1994; Spitz, 1988). Bennet e Pearson (2009) descrevem a transição do carvão para o petróleo no Reino Unido e identificam um processo que se estendeu por cerca de 30 anos, completando-se apenas no começo dos anos 1970. A mudança de matéria-prima trouxe desafios para os competidores estabelecidos e oportunidades para novos entrantes. As características estruturais da indústria 19 Agenda Tecnológica Setorial – ATS Panorama Econômico foram redefinidas. Por influência dos conhecimentos de engenharia química desenvolvidos para refino do petróleo, a concepção das unidades industriais se modifica em diversos aspectos, e em particular pela adoção de novos patamares de economia de escala. Ocorreu ainda uma redefinição geográfica, com deslocamento do polo dinâmico da indústria – antes Europa, na carboquímica – para os Estados Unidos, com o advento de petróleo e gás natural como matérias-primas predominantes. Assim, a competição na indústria se redefine com o surgimento de novos líderes (países e empresas) e perdas de posições dominantes. 4.1.2. O desafio das matérias-primas renováveis O primeiro ponto, que representa uma grande diferença com os processos de transição anteriores, é que a disponibilidade de matérias-primas renováveis não é um dado que facilita – ou mesmo induz – a transição. No caso da biomassa, a disponibilidade deve ser construída. A natureza e a composição causam dificuldades para a indústria que se desenvolveu processando fluidos (líquidos e gases) e deve rever seus processos para lidar também com sólidos de processamento mais difícil. A produção dispersa em grandes áreas desafia as cadeias de suprimento e a logística. A competição com outros usos de algumas das matérias-primas renováveis cria dificuldades adicionais, tanto econômicas quanto éticas, no caso dos alimentos. A escala de produção, a sazonalidade e a influência dos ciclos climáticos geram incertezas para os operadores industriais, que podem ser levados a rever seus conceitos de escala e de eficiência operacional. A interrupção da atividade industrial por conta da entressafra é uma restrição importante para a concepção atual de indústria intensiva em capital. A busca da matéria-prima “ideal” é foco estratégico das empresas envolvidas na bioeconomia. Em todas as suas apresentações, as startups de base tecnológica sublinham sempre a posição e visão em relação às matérias-primas utilizadas. Existe sempre um esforço de mostrar flexibilidade em relação às matérias-primas potenciais. Ao mesmo tempo, grandes empresas com interesse na bioeconomia – como BP, Shell, Dow, Petrobras, Bunge, ADM e outras – têm realizado movimentos estratégicos de posicionamento na competição pelas fontes mais promissoras de matérias-primas. É notável que essas empresas tenham se envolvido com o agronegócio no Brasil e se tornado, de certa forma, “plantadores de cana”. A cana-de-açúcar é a matéria-prima de referência para a bioindústria hoje. Como a biotecnologia e os processos fermentativos e enzimáticos são centrais para as tecnologias de conversão em desenvolvimento, a oferta estruturada de substratos fermentáveis se torna estratégica para a viabilização dos projetos inovadores. Isso explica dois movimentos importantes no processo de estruturação da indústria: 20 Complexo Industrial da Química Química de Renováveis • o grande interesse pelas fontes existentes de plantas sacarídeas, o que tem motivado a inserção no Brasil de um amplo espectro de empresas, incluindo startups e incumbentes. • o grande interesse, reforçado nos últimos anos, pelo desenvolvimento dos açúcares de segunda geração, que são os açúcares derivados dos materiais lignocelulósicos (Bomtempo, 2011). Ao mesmo tempo, diversas fontes de matérias-primas se apresentam com algum potencial, mas com dificuldades que desafiam os esforços inovadores de pesquisadores e empresas: resíduos florestais e agrícolas, resíduos urbanos, florestas energéticas, algas, novas culturas energéticas. Múltiplas oportunidades existem em matérias-primas renováveis. Todavia, a estruturação de uma oferta articulada às correspondentes tecnologias de conversão, aos produtos e aos modelos de negócio é uma construção que desafia a capacidade inovadora da indústria. Destaque-se que, ao contrário de transições anteriores, a utilização de matérias-primas renováveis não é movida pela disponibilidade abundante de moléculas reativas. A estruturação da disponibilidade faz parte do processo de inovação que busca construir a indústria do futuro. A estruturação da oferta de matérias-primas passa por desenvolvimentos na parte da tecnologia agrícola (produtividade, características), na estruturação logística da cadeia produtiva (Frohling et al., 2011) e no tratamento da biomassa para obtenção dos produtos de partida a serem processados pelas tecnologias de conversão.10 As tecnologias de conversão, por sua vez, são igualmente um espaço de estruturação em evolução. 4.2. Tecnologias A evolução das tecnologias de conversão é particularmente importante como espaço de estruturação da indústria. As iniciativas de entrada na indústria são em geral motivadas por um conhecimento científico-tecnológico de base que um ator vislumbra como oportunidade de aplicação para explorar o potencial das matérias-primas renováveis. No caso das startups, o conhecimento tecnológico de base é, como regra, o ponto de partida. Compreende-se, assim, que essas empresas procurem demonstrar um certo grau de flexibilidade em relação às matérias-primas, e em alguns casos considerem até mesmo a utilização de matérias-primas fósseis como forma de garantir a aplicação da tecnologia de conversão que é, em última instância, o conhecimento central que podem valorizar no mercado. 10 Para mais detalhes sobre os aspectos tecnológicos envolvidos no desenvolvimento das matérias-primas renováveis necessários para estruturar a oferta, ver o Panorama Tecnológico que faz parte da ATS Química Verde. 21 Agenda Tecnológica Setorial – ATS Panorama Econômico A LanzaTech, por exemplo, uma empresa que vem merecendo grande destaque como uma das empresas mais promissoras entre as startups da nova indústria, sublinha com clareza em suas apresentações que sua tecnologia de fermentação de gases (CO2, CO, H2) é adaptável a diversas fontes de matérias-primas: offgas de processos industriais, gases obtidos por gaseificação e até mesmo a partir do gás natural (Holmgren, 2012). A adoção de uma tecnologia de conversão tem relação direta com as matérias-primas, e reciprocamente. Os processos biotecnológicos vão exigir açúcares ou substratos fermentáveis. A utilização de resíduos urbanos como matéria-prima se associa naturalmente a tecnologias de gaseificação. No sentido oposto, a disponibilidade de gás natural abundante e a preço interessante nos Estados Unidos, em decorrência do shale gas, tem levado algumas empresas cuja base tecnológica é a gaseificação a abandonar a biomassa como matéria-prima. As dificuldades de desenvolvimento tecnológico e viabilização econômica a partir da biomassa foram aparentemente resolvidas pela adoção do gás natural. Na mesma linha, a disponibilidade de gás natural tem levado ao surgimento de empresas inovadoras, algumas baseadas em biotecnologia avançada, utilizando já como proposta inicial o gás natural no lugar de biomassa (Bullis, 2012). No desenvolvimento recente da indústria, as tecnologias de conversão foram o foco dos inovadores. A agenda dos biocombustíveis, um mercado de grande volume, contribuiu para reforçar o foco nas tecnologias de conversão. A agenda dos biocombustíveis era, até três ou quatro anos atrás, essencialmente uma agenda de inovações de processo que pudessem ampliar e melhorar a qualidade da oferta de etanol e biodiesel (Bomtempo, 2010; Regalbuto, 2011). Nesse cenário se inscreve o grande esforço tecnológico – até hoje não consolidado – de desenvolvimento do etanol celulósico, visto como o alvo a ser perseguido como biocombustível avançado ou de segunda geração. Esse foco significa efetivamente que o elemento definidor da indústria seria fortemente a tecnologia de conversão da matéria-prima. Naturalmente, as tecnologias de conversão não perderam seu caráter estratégico. Entretanto, a própria definição das tecnologias vencedoras passou a depender nos últimos anos, cada vez mais, de elementos ligados à dinâmica das matérias-primas e dos produtos e ainda dos modelos de negócios e estratégias que as empresas tentam colocar em jogo. No nível das tecnologias de conversão,11a variedade contempla rotas bioquímicas, termoquímicas ou químicas que podem ainda ser combinadas entre si em alguns processos. A variedade ocorre ainda dentro de cada uma das rotas, como a utilização de enzimas e fermentações diversas ou as diferentes opções testadas para a gaseificação da biomassa e conversão em bio-óleo (Coutinho e Bomtempo, 2011; Bomtempo, 2010). Ampliando o grau de variedade e multiplicidade das alternativas em jogo, mesmo tecnologias de conversão de mesma natureza apresentam variantes em desenvolvimento. 11 Para mais detalhes sobre as tecnologias de conversão em desenvolvimento, ver o Panorama Tecnológico que faz parte da ATS Química Verde. 22 Complexo Industrial da Química Química de Renováveis Os processos biotecnológicos podem ser enzimáticos ou fermentativos. Os processos fermentativos podem ser conduzidos por microrganismos convencionais aprimorados – como, por exemplo, a fermentação para obtenção do etanol a partir do caldo da cana-de-açúcar. No entanto, novos processos fermentativos têm sido propostos utilizando recursos da biologia sintética. A biologia sintética poderia permitir a obtenção de novas moléculas de interesse e assim consolidar, numa única etapa, rotas que exigem diversas etapas reacionais. Esse processo de consolidação tem despertado interesse crescente das empresas, em razão da redução substancial em investimento fixo (capital expenditure – capex) que pode proporcionar. A adoção da biologia sintética tende a deslocar o alvo dos inovadores. Ao invés de, como na tradição da química de síntese, buscar a obtenção de moléculas simples que funcionam como blocos de construção (building blocks), o alvo passa a ser uma molécula mais complexa e próxima da estrutura final de utilização. Alguns dos processos em competição hoje em desenvolvimento colocam frente a frente esses conceitos. O potencial estruturante para a indústria é considerável. A via termoquímica propõe diversas alternativas para a gaseificação, algumas inovadoras – como a gaseificação por plasma e por metal líquido –, outras mais próximas das utilizadas comercialmente, e ainda diversas opções para transformar o gás de síntese gerado em produto final, incluindo a mais conhecida conversão FT (Fisher-Tropsch) ou a ação de microrganismos, como propõem a Coskata e a Lanzatech, entre outras. Ainda no campo dos tratamentos térmicos, não se pode deixar de mencionar as alternativas em pirólise para produção de bio-óleo, tanto visando à produção de combustíveis quanto de substitutos de petroquímicos. Da mesma forma, os processos químicos continuam sendo testados, e alguns projetos destacados têm proposto a utilização de rotas catalíticas para a conversão química de açúcares em combustíveis drop-in ou produtos químicos. A rota química tem ainda sido mencionada em algumas pesquisas como alternativa para a produção de intermediários de síntese para a construção de plataformas químicas, como a do hidroximetilfurfural (HMF), que vem despertando interesse crescente. A utilização de diferentes bases de conhecimento faz com que na maioria dos casos as empresas se vejam inevitavelmente em projetos que privilegiam uma das rotas, o que coloca um nível de incerteza elevado no futuro dessas empresas caso suas apostas venham a perder espaço na evolução da indústria. Algumas empresas e investidores de maior porte e disponibilidade de recursos têm tratado essa incerteza multiplicando suas apostas em diversas plataformas, com a perspectiva de desmobilizar eventualmente as que se mostrarem menos competitivas. É o caso, por exemplo, de Shell e Khosla Ventures. Interessante notar nesse aspecto a trajetória da Shell, que, após investir em cinco projetos conceitualmente diferentes, vem, desde 2010, reduzindo essa variedade e concentrando-se aparentemente no etanol celulósico (Iogen) e na conversão química de açúcares (Virent). Outras empresas de porte e com volumes de investimento importantes em biocombustíveis e bioprodutos, entretanto, têm diversificando suas apostas de forma mais orientada em termos de tecnologia de conversão, focalizando determinadas áreas 23 Agenda Tecnológica Setorial – ATS Panorama Econômico do conhecimento. É o caso de BP, DuPont e DSM, que se concentram na biotecnologia e nas rotas bioquímicas em suas diversas iniciativas. 4.3. Produtos A dimensão produtos é um espaço de importância crescente na estruturação do setor. A dinâmica inicial voltada para biocombustíveis orientou-se num primeiro momento para a produção de etanol e biodiesel. Esses dois produtos podem ser vistos como substitutos relativamente imperfeitos dos combustíveis de base fóssil. O etanol tem densidade energética inferior à gasolina em 30%; exige adaptação dos motores e estrutura dedicada de distribuição. O biodiesel, em função das matérias-primas utilizadas, pode ter comportamentos variados, conforme as condições de temperatura ambiente. O aumento do teor de biodiesel na mistura depende de testes e avaliações para que os fabricantes de equipamento assegurem as garantias de seus produtos. Por conta das limitações dos biocombustíveis de primeira geração, e principalmente em razão dos desenvolvimentos tecnológicos dos últimos anos e da existência de oportunidades, como as dos combustíveis de aviação, surgiram nos últimos anos os combustíveis ditos drop-in. Esses biocombustíveis são hidrocarbonetos e podem ser utilizados sem necessidade de adaptação, aproveitando dessa forma os ativos complementares já existentes e utilizados pelos derivados de petróleo. Na dinâmica dos bioprodutos, outras variáveis devem ser identificadas e analisadas. As tabelas 1 e 2 mostram a variedade de bioprodutos em desenvolvimento ou em início de comercialização. Algumas distinções importantes devem ser feitas para a compreensão desse espaço de estruturação. Os bioprodutos podem ser finais ou intermediários; drop-in ou não drop-in; commodities ou especialidades. As diversas combinações entre essas possíveis alternativas dão margem a uma variedade de abordagens do mercado e logo a uma variedade de modelos de negócio que se ajustem a cada grupo de produtos. Produtos finais: é o caso dos bioplásticos e biopolímeros, principalmente, e de produtos que vão entrar em formulações em indústrias clientes da indústria química. São comercializados atualmente PE verde (Braskem), PET verde (30% renovável; diversos produtores), PLA (Nature Works), PHA (pequenos produtores). Entre esses produtos a primeira grande distinção é entre os drop-in e os não drop-in. Os drop-in são idênticos aos de base fóssil. Como substitutos perfeitos, adaptam-se perfeitamente à cadeia produtiva existente e têm, assim, sua adoção facilitada. Essa adoção passa a depender dos custos compatíveis com os critérios dos end users (indústrias utilizadoras dos plásticos na comercialização de seus produtos, como as de alimentos, cosméticos e materiais de higiene e limpeza). Cabe ao produtor de um drop-in ser capaz de produzir em condições que atendam a esse requisito. No caso, os fatores chave para competitividade seriam a disponibilidade de matéria-prima a preços competitivos e a capacidade de desenvolvimento da tecnologia para produção dos monômeros. 24 Complexo Industrial da Química Química de Renováveis Os não drop-in são produtos novos que entram em substituição a outros plásticos de origem fóssil. São em geral biodegradáveis. O mais conhecido deles é o PLA, cuja produção comercial foi iniciada por uma joint venture Cargill-Dow no final dos anos 1990. Esses produtos exigem para sua difusão que novas aplicações sejam desenvolvidas. Essas aplicações envolvem complementadores a jusante na cadeia produtiva: produtores de aditivos, transformadores, além de esforços de desenvolvimento de aplicações para adoção pelos end users. Nesse caso, os ativos complementares existentes devem ser adaptados ou em alguns casos construídos para alcançar a utilização final do produto. A trajetória do PLA em quase 15 anos de história atesta as dificuldades de difusão de um novo plástico. Em 1997, Cargill e Dow formam uma joint venture para a produção de PLA. Estimaram na época que em dez anos o PLA chegaria a 450 mil t/a. A biodegradabilidade era a proposição de valor que deveria atrair os utilizadores finais, principalmente no segmento de embalagens. Entretanto, as expectativas dos produtores não se confirmaram. A Dow abandonou o negócio alguns anos depois. A demanda atual ainda está na faixa de 150 mil t/a. A Cargill continuou no negócio. A empresa foi redominada Natureworks e é atualmente uma joint venture Cargill-PTT Chemicals. Recentemente, a Purac, o mais importante produtor de ácido láctico – bloco de construção para o PLA –, se interessou pelo bioplástico e começou a desenvolver um novo modelo de negócio. Esse modelo de negócio facilita a entrada de novos produtores em nichos de aplicação voltados para usos técnicos do PLA nos quais a biodegradabilidade não é a propriedade de interesse. Os fatores chave de competitividade no caso dos novos bioplásticos, além dos mencionados para os drop-in, incluem também o esforço de difusão do produto. Esse esforço inclui desenvolvimento de aplicações e estruturação das relações a jusante da cadeia, de modo a adquirir sólidas competências na compreensão da utilização final. Esse é o dilema drop-in ou não drop-in (Oroski, Bomtempo e Alves, 2013). O dilema drop-in ou não drop-in é hoje muito presente na indústria biobased e representa uma escolha estratégica importante para as empresas envolvidas. O caso das alternativas em desenvolvimento com o apoio da Coca-Cola para a produção de um substituto renovável para o PET ilustra bem esse dilema.12 A Coca-Cola apoia o desenvolvimento de um novo plástico, o PEF, polietileno-furanoato, que teria propriedades até superiores ao PET e seria biodegradável. O projeto é desenvolvido pela empresa holandesa Avantium. Como novo produto, o PEF exigiria adaptações ou novos desenvolvimentos nas etapas de transformação da resina e fabricação das garrafas. Seria, portanto, uma solução não drop-in. Mas a Coca-cola, reconhecendo que não resolveu o dilema, apoia igualmente uma solução drop-in. Trata-se de produzir um PET 100% renovável. Para este desafio é neces12 Uma retrospectiva da história da busca de uma garrafa sustentável pela Coca-Cola pode ser encontrada em diversos artigos do blog Green Chemicals (Doris de Guzman; <http://greenchemicalsblog.com/>). 25 Agenda Tecnológica Setorial – ATS Panorama Econômico sário produzir um intermediário – o p-xileno – por rota renovável, o que é um processo bastante desafiador. Nessa linha, a Coca-cola tem apoiado duas empresas que seguem duas rotas diferentes: Gevo, que parte do butanol, obtido por fermentação; e Virent, que segue uma rota por catálise química (bioforming) a partir de açúcar. A solução drop-in preservaria não só os ativos complementares de transformação e utilização do PET, como também os esquemas de reciclagem já montados. No caso de bioprodutos intermediários ou plataformas, além da questão drop-in ou não drop-in, pode ser necessário em alguns casos o desenvolvimento de novos mercados de utilização dentro da indústria química. Entre os produtos citados como mais promissores, incluem-se diversos blocos de construção que somente serão difundidos se for possível desenvolver novas árvores de aplicações. A perspectiva de desenvolver uma produção expressiva de ácido succínico, na qual apostam hoje diversas empresas, pressupõe o desenvolvimento de um conjunto de novas utilizações do produto, hoje não desenvolvidas nas cadeias químicas. O processo de substituição deve ser promovido ao longo das cadeias químicas, o que pode ser um desafio para o produtor, principalmente se ele não se integra para frente e se torna apenas um fornecedor de produtos básicos ou intermediários. A exemplo do ácido succínico, outros produtos com elevados rendimentos em relação ao açúcar utilizado, como os ácidos glucárico, fumárico e málico,13 podem oferecer grandes oportunidades de consolidação de vantagens competitivas. Esses produtos representam de certa forma inovações que exploram efetivamente o potencial das matérias-primas renováveis, no caso os açúcares, tirando vantagem do fato de serem oxigenados. Existe entretanto um desafio importante para desenvolver as aplicações finais desses produtos. Essas aplicações tenderiam a ser especialidades e exigiriam transformações químicas para finalização do produto, seguida do desenvolvimento comercial do mercado. A finalização química depende de esforços de desenvolvimento em síntese química e testes de adequação inicial à utilização pretendida. No caso de produtos finais destinados a formulações em outras indústrias (higiene e limpeza e cosméticos, por exemplo), o processo de adoção de um produto não drop-in exige o desenvolvimento de formulações nas quais cabe em geral ao produtor químico demonstrar e desenvolver a nova aplicação para convencer o end user. Por isso, o desenvolvimento de relações de cooperação com end users estratégicos, como Procter & Gamble ou Unilever, pode ser indispensável para a introdução de inovações. Assim, nesse ambiente ainda pouco estruturado da bioeconomia, para um inovador, escolher um produto é enfrentar diversos dilemas. Convém apostar em produtos drop-in ou em produtos não drop-in? Finais ou intermediários? Os produtos drop-in simplificam a adoção, mas podem ser vistos como inovações 13 Esses produtos têm rendimento acima de 100% em relação ao açúcar consumido, o que os torna potencialmente competitivos em termos de custos. 26 Complexo Industrial da Química Química de Renováveis apenas de sustentação da indústria em seu modelo atual. Por outro lado, apostar em produtos não drop-in exige esforços significativos e arriscados para o desenvolvimento da rede de complementadores para a difusão de novos bioplásticos ou biopolímeros ou, no caso de produtos para formulações por outras indústrias, o desenvolvimento de know-how de aplicação específico da indústria final (por exemplo: cosméticos ou alimentos). Convém apostar em produtos intermediários? Investir em produtos integrados com a produção final? Ou ser um fornecedor de outras empresas químicas? Ainda um ponto de dúvida: como a introdução do bioproduto é quase sempre em nicho, que pode ou não crescer, isso pode favorecer produtos com vocação de especialidades em detrimento de produtos com vocação de commodities, como plásticos para embalagens. Produzir e introduzir no mercado uma especialidade química exige competências bem diversas das que são mobilizadas para um produto tipo commodity. A evolução dos dilemas dos produtos está relacionada à evolução dos dilemas em matérias-primas, tecnologias e modelos de negócios na estruturação da indústria biobased. Aborda-se a seguir o espaço das estratégias e modelos de negócios. 4.4. Estratégias e modelos de negócios Atuando nos espaços de estruturação estudados – matérias-primas, tecnologias de conversão e produtos –, pode ser identificado um conjunto variado de empresas de portes, origens e bases de conhecimento diferentes. Identificam-se startups, como Genomatica, Solazyme, LanzaTech, Gevo, Amyris, Renmatix, Kior, entre muitas outras; empresas da indústria química e petroquímica, como DuPont, DSM, BASF, Braskem, Dow, Solvay; empresas de petróleo e gás, como Shell, BP, Petrobras, Total; empresas do agronegócio, como ADM, Bunge, Cargill; empresas das indústrias de alimentos e ingredientes, como Tate &Lily, Roquette, Purac; empresas da indústria de papel e celulose, como StoraEnso, UPM, Borregaard, Fibria. Além disso, note-se a participação expressiva de fundos de venture capital. A oferta deve ser entendida como inicial e quase exploratória na maioria de casos. Dirigem-se predominantemente a nichos. As empresas líderes são as que introduziram alguns produtos ou as que têm dirigido estrategicamente seus esforços para o desenvolvimento da química baseada em biomassa. Não cabe, portanto, identificar líderes, já que a indústria está em formação, mas sim estratégias e posicionamentos importantes na construção do negócio. A título ilustrativo, vale mencionar a pesquisa realizada por Burr (2013), na qual BASF, Dow, DuPont, Braskem e Cargill foram identificados por profissionais ligados à indústria química como os cinco produtores mais destacados em química sustentável. Assim, esta seção discute o perfil e as características de atuação dos diferentes players que têm se apresentado como inovadores no setor. 27 Agenda Tecnológica Setorial – ATS Panorama Econômico Para discutir as formas de participação desses diferentes perfis de competidores, é importante distinguir as diferentes perspectivas que têm em relação ao negócio. O quadro 1 compara os principais perfis de empresas envolvidas no setor em relação às suas competências chave, competências complementares, fontes de recursos, importância do setor para a empresa e importância das iniciativas da empresa para o desenvolvimento do setor. As competências chave dos diferentes perfis de competidores e as correspondentes competências complementares, não detidas pelos players, mas indispensáveis para o desenvolvimento, produção e comercialização dos produtos inovadores, reforçam a dimensão ainda não estruturada da indústria. Além disso, mostram uma tendência natural de alianças e associações na busca de complementaridade das competências de cada um. Assim, se as tecnologias mais inovadoras têm surgido a partir das startups de base tecnológica, o acesso e a estruturação da cadeia de suprimento de matérias-primas, o scale-up dessas tecnologias, a produção em escala e a comercialização dos produtos dependem na maioria dos casos de competências detidas por empresas estabelecidas. Essas empresas – por exemplo, as empresas químicas e petroquímicas – detêm competências e ativos complementares específicos necessários para estabelecer relações com as indústrias utilizadoras (end users) e desenvolver aplicações comerciais dos novos produtos. Além disso, a disponibilidade de recursos e as fontes de acesso a financiamento variam segundo os diferentes perfis de empresas. No ambiente competitivo do setor, essas relações de complementaridade têm levado a numerosas associações entre empresas. O Plano Conjunto BNDES-FINEP de Apoio à Inovação Tecnológica Industrial dos Setores Sucroenergético e Sucroquímico (programa PAISS), recentemente lançado pelo BNDES FINEP, valorizou com ênfase essa dimensão, ao definir planos de negócio que contemplassem associações entre empresas detentoras de capacitações complementares. As associações são naturais, e possivelmente crescentes, à medida que a estruturação da cadeia produtiva da indústria biobased evolui e adquire contornos mais estáveis. Uma dimensão ainda abordada no quadro 1 e pouco considerada nos estudos sobre indústrias emergentes é a da importância relativa do novo setor para os diferentes perfis de empresas envolvidas. As grandes empresas de petróleo e gás têm orçamento de investimentos em seus negócios centrais extraordinariamente mais elevados do que os recursos que aplicam em biocombustíveis. Entretanto, para o volume de investimentos e necessidades de desenvolvimento dessa indústria, as iniciativas das empresas de petróleo têm peso significativo tanto no aporte de recursos quanto nas competências para difusão dos conceitos inovadores. Situação semelhante pode ser identificada no papel dos grandes grupos do agronegócio. A importância relativa pode ser vista também no caminho inverso, isto é, a importância dos novos negócios em bioeconomia para o portfólio das grandes empresas estabelecidas. O problema da pequena importância dos novos negócios para as grandes empresas estabelecidas pode ser o da inconstância dos esforços, interrompidos ou descontinuados sem grandes dificuldades, se as perspectivas do negócio principal assim sugerirem. 28 Complexo Industrial da Química Química de Renováveis Em outras palavras, esses recursos podem ser relativamente impacientes e as decisões serem revertidas, criando dificuldades quase intransponíveis para as startups envolvidas. Quadro 1 – Perfis de empresas e perspectivas em relação à bioeconomia Startup Química Agronegócios petroquímica Alimentos Produção; comercialização Acesso a Competência Processamento Tecnologia de materiais matéria-prima; chave de biomassa e produtos logística químicos Acesso a Acesso a matématéria-prima; Tecnologia; Tecnologia; Competências ria-prima; tecnologia; produção; produção; complementares produção; cobiotecnologia comercialização comercialização mercialização avançada Recursos Importância da bioindústria para a empresa Importância da empresa para a bioindústria Petróleo e gás Papel e celulose Produção; comercialização de combustíveis Acesso a matéria-prima; logística; pré-tratamento Acesso a matéria-prima; Tecnologia, tecnologia; comercialização biotecnologia avançada Grants; venture capital; IPO; associações Próprios e públicos Próprios e públicos Próprios e públicos Próprios Próprios e públicos Total Variável, dependendo da visão estratégica Variável, dependendo da visão estratégica Média Pequena Média Pequena de cada empresa isolada; essencial do conjunto de startups Grande Grande Média Grande Média Fonte: Elaboração própria Partindo-se da caracterização dos perfis de competências acima, podem-se analisar as bases das estratégias de inovação e competição na bioindústria. Propõe-se um quadro analítico partindo da relação entre a natureza da estrutura industrial e as dimensões competitivas relevantes (estratégia de base, tipo de oportunidade, estágio tecnológico e tipo de trajetória tecnológica). O quadro 2 apresenta o quadro analítico, colocando em perspectiva três arenas de competição baseadas em matérias-primas renováveis. São elas: a indústria de biocombustíveis convencionais ou de primeira geração (etanol e biodiesel); os novos biocombustíveis e bioprodutos que têm sido lançados ou estão em estágio piloto/demonstração; e, por último, as biorrefinarias, que representam o conceito mais avançado da indústria baseada em matérias-primas renováveis. A indústria de biocombustíveis de primeira geração – etanol e biodiesel – representa um setor baseado em biomassa que teve grande destaque na última década em todo o mundo. Esse segmento tem relação de proximidade tecnológica e estratégica com os bioprodutos. Muitas empresas inovadoras que iniciaram suas atividades nos anos 2000 dirigiram-se inicialmente para os mercados de combustíveis e posteriormente redirecionaram seus alvos para a produção de químicos e materiais. A estrutura industrial dos biocombustíveis de primeira geração, etanol principalmente, é bem definida em suas principais dimensões: os produtos estão definidos e especificados como combustíveis líquidos para uso em transporte, há trajetórias tecnológicas estabelecidas, as escalas econômicas de produção são 29 Agenda Tecnológica Setorial – ATS Panorama Econômico conhecidas e um processo de concentração e consolidação da indústria pode ser observado em alguns países. Assim, a competição nessa indústria se dá dentro da lógica do paradigma clássico estrutura- conduta-desempenho. Em outras palavras, conhecendo-se a estrutura da indústria e seu padrão de concorrência, os competidores podem seguir estratégias de posicionamento dentro do espaço competitivo. Os segmentos mais dinâmicos e inovadores – identificados no quadro 2 como novos biocombustíveis (biohidrocarbonetos e combustíveis de aviação) e bioprodutos – não apresentam características estruturais definidas e exigem dos competidores uma estratégia voltada para inovação, construção de capacitações (no sentido de dynamic capabilities, conforme Teece, Pisano e Shuen, 1997) e aquisição de competências complementares. Não é possível uma estratégia de posicionamento ao modo de Porter nesse ambiente. A maior parte das ofertas ainda se encontra em estágio piloto ou demonstração, e mesmo algumas em estágio de laboratório. Algumas poucas já são comerciais, mas ainda exploram nichos dentro da indústria química e petroquímica. O amadurecimento da indústria corresponderá ao desenvolvimento de alguns desses nichos – por exemplo, bioplásticos para embalagens –, que poderão se aproximar de volumes compatíveis com commodities petroquímicas. No caso dos produtos químicos drop-in – PE verde e PET verde, por exemplo, entre outros –, as características estruturais da indústria química são parcialmente preservadas, permitindo que o competidor explore em certa medida seus parâmetros de posicionamento. Os volumes são pequenos, existe um desafio tecnológico e econômico na construção da oferta, mas a cadeia produtiva a jusante da transformação química é preservada, valorizando os ativos complementares já existentes. No caso dos produtos não drop-in, entretanto, como já discutido na subseção “Produtos”, os modelos de negócio devem ser capazes de estruturar uma nova cadeia de complementadores para assegurar a difusão de suas inovações. O setor biobased poderia ainda apresentar um terceiro espaço, que pode ser denominado biorrefinaria e corresponde ao conceito ainda emergente de uma química baseada em matérias-primas renováveis, explorando de forma integrada e integral a biomassa. As condições de competição nesse espaço estariam ainda em aberto, com menos definições do que no caso dos novos biocombustíveis e bioprodutos já em desenvolvimento. Uma distinção essencial entre os espaços de competição identificados no quadro 2 refere-se à natureza das trajetórias tecnológicas envolvidas. Adotando-se a classificação clássica de Pavitt (1984), a indústria de biocombustíveis de primeira geração se caracteriza como uma indústria dominada pelos fornecedores. Isto quer dizer que as tecnologias são detidas pelos fornecedores (equipamentos, engenharia, projetos, insumos), cabendo aos produtores operarem eficientemente essas tecnologias adquiridas no mercado. As barreiras de entrada na indústria não são altas e se situam muito mais no acesso à matéria-prima do que na tecnologia ou capital. A transição para os biocombustíveis avançados e bioprodutos marca uma notável diferença na natureza da trajetória tecnológica, que passa a ter características de science based, segundo a tipologia de Pavitt. As empresas partem de uma tecnologia, em muitos casos com origem em laboratório de 30 Complexo Industrial da Química Química de Renováveis universidade ou centro de pesquisa, e tentam construir um novo negócio, agregando os ativos complementares necessários para estruturar a produção e comercialização. Essa distinção entre as duas trajetórias tecnológicas pode ser de grande importância, tanto nas estratégias empresariais quanto nas políticas governamentais que visem à passagem de uma indústria baseada em biomassa de primeira geração à indústria do futuro baseada em matérias-primas renováveis. Isso quer dizer que os atributos de competitividade da indústria do futuro tendem a ser em boa medida distintos daqueles da indústria de primeira geração, como a de etanol. Na seção seguinte, discutem-se esses atributos de competitividade. Quadro 2 – Estratégias de inovação e competição na bioeconomia – Quadro analítico Estrutura industrial Etanol e biodiesel 1ª geração Conhecida Estágio tecnológico Maduro Estratégia de base Oportunidade Trajetória tecnológica Posicionamento Commodities Dominada pelos fornecedores Biohidrocarbonetos e bioprodutos Biorrefinaria do futuro Fluida Laboratório/piloto/demo Início de comercialização Inovação: construção de capacitações; aquisição de competências Diversificada (commodities e especialidades) Exploração de nichos disruptivos Em aberto Inovação: construção de capacitações; aquisição de competências Em aberto; a ser construída Exploração de nichos disruptivos Science based Science based Laboratório/piloto Fonte: Elaboração própria 31 Agenda Tecnológica Setorial – ATS Panorama Econômico 5. Atributos de competitividade A análise desenvolvida neste relatório – caracterizando o setor de química renovável como um setor em estruturação – conduz à identificação dos atributos de competitividade como intimamente ligados a estratégias de inovação em setores emergentes, ainda em fase fluida. Esses setores se caracterizam por um elevado nível de incerteza. No presente caso, as variantes se multiplicam no nível das matérias-primas, das tecnologias de conversão e dos produtos, multiplicando o número de alternativas que um investidor pode adotar para explorar o potencial de demanda existente. O processo de evolução da indústria deve levar a uma redução da variedade, com algumas definições vencedoras entre as alternativas hoje colocadas. Essa situação coloca o tomador de decisões, tanto no nível das políticas públicas quanto no nível das estratégias empresariais, numa posição difícil. Dois riscos opostos podem advir das decisões, ao se considerarem a multiplicidade de alternativas tecnológicas e a imaturidade da indústria. Num polo, na tentativa de se distribuir as apostas em diversas alternativas, valorizando a indefinição dos designs dominantes, corre-se o risco de investir insuficientemente para desenvolvê-las. No outro polo, a escolha de uma alternativa a ser privilegiada pode levar à escolha de opções perdedoras e correr-se o risco de perder os investimentos e esforços realizados. O primeiro atributo de competitividade é, portanto, a capacidade de captar a dinâmica do setor e orientar seus investimentos e políticas num ambiente de incerteza para a construção de uma base tecnológica sólida e, a partir daí, assegurar a competitividade futura na química renovável. Compreender a indústria é uma habilidade difícil no caso de indústrias emergentes. Exige capacitação científico-tecnológica, mas também percepções de economia e gestão da inovação para entender a dinâmica da indústria. Esse entendimento necessita assim de forte conhecimento setorial associado a bases científico-tecnológicas. Esse é um atributo particularmente crítico para os órgãos de formulação de políticas industriais e financiamento, sem deixar de ser valioso para as decisões empresariais. A inexistência de experiência brasileira na participação de corridas tecnológicas reforça a importância desse ponto. O segundo atributo seria certamente ligado às tecnologias propriamente ditas. Nesse ponto, a biotecnologia industrial aparece como base incontornável do futuro da indústria, principalmente em campos mais avançados e ainda sem experiência industrial expressiva, como a biologia sintética. A adaptação de outros conhecimentos tecnológicos tradicionais da química e da engenharia química, por exemplo a catálise, ganham também importância crescente. Ainda no terreno das capacitações tecnológicas, deve ser destacado o desafio de pré-tratamento de matérias-primas. Nesse ponto, a busca de tecnologias capazes de disponibilizar de forma competitiva os açúcares dos materiais lignocelulósicos tem aparecido crescentemente como fator decisivo para o desenvol32 Complexo Industrial da Química Química de Renováveis vimento da indústria. Um número crescente de projetos inovadores tem se dedicado especificamente a essa etapa inicial, que se mostra um desafio crítico para a viabilidade e crescimento da indústria. Ainda relacionado à matéria-prima, um terceiro atributo de competitividade deve ser destacado. Trata-se da estruturação da oferta de biomassa, atendendo os requisitos de produtividade, disponibilidade, qualidade, custo, performance ambiental, além da cadeia logística de suprimento. No campo tecnológico, além do conhecimento tecnológico central que permite o desenvolvimento inicial em escala piloto, o scale-up e a operação dos novos processos constituem atributos de competitividade importantes, já que os novos processos, principalmente os baseados em biotecnologia avançada, exigem novos conhecimentos de engenharia. Conceber e operar uma unidade industrial utilizando processo baseados em biologia sintética será um grande desafio para a indústria. Por fim, a capacidade de introdução e difusão de novos produtos é também um atributo de competitividade de grande importância. A compreensão da utilização dos produtos e o desenvolvimento de relações com os end users estarão no centro dos requisitos para a introdução de inovações. No caso dos novos produtos drop-in, o custo adequado à substituição pode ser suficiente e reduzir muito o processo de desenvolvimento de novas aplicações. Entretanto, para os produtos novos não drop-in, o desenvolvimento de ativos complementares e relações com os end users exigirá grande empenho dos produtores. Sublinhe-se que produtos novos, não drop-in, podem ser justamente os mais interessantes para explorar o verdadeiro potencial da indústria biobased e obter vantagens competitivas sustentáveis. Considerando a posição brasileira, a capacidade de desenvolver aplicações para novos produtos, muitos deles com características de especialidades químicas, pode ser um atributo chave para uma posição competitiva na indústria do futuro. Os atributos de competitividade acima discutidos podem ser colocados no ambiente brasileiro para uma discussão inicial de proposições de políticas e estratégias. 33 Agenda Tecnológica Setorial – ATS Panorama Econômico 6. Recomendações para a situação Brasileira A principal vantagem comparativa brasileira reside na produtividade agrícola, em particular da cana-de-açúcar. Entretanto, existem desafios importantes na produção de biomassa que desafiam a capacidade de pesquisa e inovação do país. O relatório Panorama Tecnológico descreveu alguns desses desafios. Destaque-se que, mesmo no caso da cana-de-açúcar, existem desafios ligados ao atual estágio de produtividade que devem ser enfrentados nos próximos anos.14 O histórico de desenvolvimentos relevantes na agricultura pode ser um indicador favorável para a capacidade de inovação brasileira nas tecnologias agrícolas. Entretanto, existem ainda lacunas em condições básicas que se recomenda fortemente sejam atacadas, sob pena de se constituírem em fatores limitantes para os estudos e projetos inovadores. É o caso da inexistência de um mapa georreferenciado de resíduos e da limitada capacidade em estudos de análise de ciclo de vida (life cycle assessment – LCA). A experiência em biocombustíveis, em particular etanol, é um ponto a explorar. Entretanto, a mudança de base de conhecimento, a complexidade das novas tecnologias de conversão e o esforço de introdução de novos produtos trazem um desafio de porte para as empresas estabelecidas na indústria de primeira geração. Um aspecto original no desenvolvimento da indústria da biomassa é a mudança no perfil empresarial dos competidores se comparado com o perfil tradicional e histórico da indústria sucroalcooleira. Além da presença de players internacionais, como Shell (Raizen), BP, Bunge, DSM, Dow, da participação de players nacionais ligados à petroquímica (Petrobras e Braskem), de novos players nacionais, como Odebrecht Agroindustrial e GranBio, deve ser destacado o interesse pela implantação no Brasil de startups americanas, como Amyris e Solazyme. Algumas dessas empresas, como a GranBio e as startups americanas, desenvolvem projetos de notável ambição inovadora. Existe, portanto, uma expressiva mudança no perfil empresarial da indústria baseada em biomassa que não pode deixar de ser explorada. O programa PAISS (BNDES/FINEP) considerou esse ponto ao apoiar o processo de inserção dessas empresas no país. Mas, considerando que o PAISS foi apenas o primeiro passo nessa direção, recomenda-se que esse processo de atração seja aprofundado, explorando o potencial de inovação gerado nos países desenvolvidos e buscando criativamente novos formatos, que favoreçam tanto a instalação de capacidade produtiva quanto o desenvolvimento tecnológico no Brasil. 14 Nyko et al. (2013) desenvolvem a questão das tecnologias agrícolas no caso da cana no artigo A evolução das tecnologias agrícolas do setor sucroenergético: estagnação passageira ou crise estrutural? O artigo conclui que “o atual SPIS (Sistema de Produção e Inovação Sucroalcooleiro) conquistou consistentes ganhos de produtividade na cultura da cana, mas vem enfrentando problemas para manter o ritmo dos resultados alcançados no passado. De fato, o período mais recente pode ser considerado frustrante e, se extrapolado para o futuro, aponta para ganhos de rendimento agrícola cada vez mais reduzidos”. 34 Complexo Industrial da Química Química de Renováveis A experiência recente do PAISS tem ainda uma lição a ser ampliada: a integração dos programas e políticas em biocombustíveis e bioprodutos. Biocombustíveis e química renovável, como este relatório procurou mostrar, estão intimamente relacionados na mobilização de novas bases de conhecimento e no processo de estruturação industrial. Recomenda-se que, nas diversas esferas de governo e agências envolvidas na indústria baseada em biomassa, biocombustíveis e bioprodutos sejam sempre tratados e discutidos nos mesmos fóruns. Além disso, as políticas e estratégias não podem se satisfazer em promover a produção, estabelecendo apenas metas de volume. Recomenda-se que os programas tenham sempre metas de inovação explícitas e não apenas volumes a serem produzidos ou consumidos. Esse parece ser um ponto a explorar de forma efetiva na bioeconomia, na busca de uma posição de liderança na nova indústria. As metas representam redução de incertezas, por apontarem perspectivas pelo menos indicativas de mercado, e principalmente são indicadores da direção dos esforços de inovação. Na linha do estabelecimento de metas de inovação no apoio à indústria, cabe uma recomendação em relação às políticas de subvenção econômica. Esse mecanismo pode ser de grande importância numa corrida tecnológica, como a da bioeconomia, mas deve ser aperfeiçoado. Recomenda-se que a concessão das subvenções seja condicionada a resultados previamente definidos, em moldes semelhantes aos mecanismos de financiamento de grants já utilizados internacionalmente. Além da perspectiva da indústria, cabe destacar ainda a questão da criação e expansão da base de conhecimento, principalmente em biotecnologia. É possível identificar uma evolução recente da capacidade local de pesquisa baseada nos esforços do Centro de Tecnologia Canavieira (CTC), Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol (CTBE) e outros, além da instalação de centros de pesquisa internacionais, como o finlandês Technical Research Centre (VTT), especializado na bioindústria, e o centro de pesquisa da GE, com agenda mais ampla, mas com áreas de interesse em biocombustíveis e oportunidades tecnológicas relacionadas à bioeconomia. Nesse terreno, cabem igualmente agendas ambiciosas de nível internacional, buscando reforçar, se necessário, a capacitação local com a atração de pesquisadores estrangeiros aos quais, a exemplo das startups inovadoras, podem ser oferecidas melhores condições de desenvolvimento no país. Envolvendo todas as recomendações acima mencionadas, deve ser destacada a importância dos mecanismos de coordenação dos processos. Mais uma vez o PAISS surge como um exemplo ou ponto de partida importante para as políticas de inovação. É indispensável inovar na forma de promover a inovação, principalmente no caso da bioeconomia, que se distingue dos esforços tradicionais de catching-up em relação a setores estruturados. 35 Agenda Tecnológica Setorial – ATS Panorama Econômico 7. Considerações finais Este documento apresentou e discutiu a estrutura de competição e a dinâmica econômica do setor de química renovável. Esse setor foi descrito segundo a sua dinâmica tecnológica e de inovação e foi interpretado como um setor com estrutura industrial ainda em processo de definição, com características de indústria emergente. Múltiplas oportunidades existem em matérias-primas renováveis. Todavia, a estruturação de uma oferta articulada às correspondentes tecnologias de conversão, aos produtos e aos modelos de negócio é uma construção que desafia a capacidade inovadora da indústria. Destaque-se que, ao contrário de transições anteriores, como a da passagem do carvão para o petróleo e o gás, a utilização de matérias-primas renováveis não é movida pela disponibilidade abundante de moléculas reativas. A estruturação da disponibilidade faz parte do processo de inovação que busca construir a indústria do futuro. Cabe reforçar uma vez mais a perspectiva que representa na indústria química a mudança de base de matéria-prima. Essa mudança é uma oportunidade de redefinição da indústria e uma oportunidade para um país como o Brasil, detentor privilegiado de vantagens comparativas na biomassa. As vantagens comparativas brasileiras são expressivas, mas dependem de esforços tecnológicos e empresariais para se tornarem vantagens competitivas na nova indústria e darem ao país uma posição de destaque na indústria química do futuro. 36 Complexo Industrial da Química Química de Renováveis Referências bibliográficas ABERNATHY, W. J.; UTTERBACK, J. M. Patterns of industrial innovation. Technology Review, v. 80, n. 7, p. 40-47, June-July 1978. BAKER, J. Green concepts take firm root ICIS Chemical Business, 21-27, p 27-30, Jan. 2013. BENNET, S.; PEARSON, P. From petrochemical complexes to biorefineries? The pastand prospective co-evolution of liquid fuels and chemicals production in the UK. Chemical Engineering Research and Design, v. 8, n. 7, p. 1.120-1.139, 2009. BERKHOUT, F.; SMITH, A.; STIRLING, A. 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