Examinado teoricamente, o problema da Argentina consistia em

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Examinado teoricamente, o problema da Argentina consistia em
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Examinado teoricamente, o problema da Argentina consistia
em mobilizar seu exército, reuni-lo em lugar adequado, associarlhe as forças orientais previamente organizadas e depois operar
contra nós consoante um plano de manobra antecipadamente elaborado. É claro que não poderiam esquecer-se as medidas de
cobertura. Mas 'como proceder com essa regularidade teórica
nas condições em que ela se encontrava? Km primeiro lugar,
pode-se-dizei* que a verdadeira Argentina ainda não existia, pois
que a: reunião das províncias do Prata era. apenas uma coligação
momentânea contra o Brasil. Depois, como não possuía serviço
obrigatório, a mobilização tinha de ser irregular e tumultuaria.
A reunião também hão era fácil, pois devia assentar num plano
de guerra, de que com certeza ninguém.tinha cogitado. Não havendo exército da República, também não poderia existir estadomaior que lhe provesse às necessidades. E, o que é ainda mais
grave, o exército nacional via-se na obrigação de incorporar ;i
seu seio as tropas de Lavalleja, congregadas à última hora, a
que de certo não faltava patriotismo, mas que não possuíam nem
os quadros, nem o tirocínio de Iropas regulares. Tudo tinha de
ser fruto obrigado de uma rápida improvisação.
r
Restava ainda uma questão delicada: a do comando tia
massa combatente. *Quem deveria ser o general em chefe?
Os argentinos não admitiam discussões nesse terreno. As
Províncias Unidas eram o todo, a Cisplatina apenas uma parte.
•Logo: tocaria às tropas desta juntarem-se às daquelas como fraeão
subordinada. Por isso nomearam logo Martim Rodrigues chefe
militar das províncias de Entre Rios, Corrienies, Missões e Estado Oriental.
Há, porém, quem afirme que Lavalleja sonhou com a supre.ma investidura. Baldricb acusa-o severamente de tergiversação,
deslealdade e desobediência (como no caso do ataque à Colónia,
de combinação com Brown). Intimado pelo general Martim Rodrigues, informa o mesmo autor, para reunir suas forças às do
exército nacional,* obedeceu apenas em parte, de visível má vontade e em contradição flagrante com suas declarações de obediência.
Agravava esta situação o estado de latente rivalidade entre
êíe e Rivera. Sabemos que Lavalleja fora subordinado de Rivera no Regimento de Dragões da União e sempre estivera em
plano inferior na jerarquia do comando. Com a sublevação dos
.33. a que Rivera foi estranho, Lavalleja alçou-se merecida e
naturalmente ao pináculo do mando. Rivera aderiu, foi brin-
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•dado com o título de inspetor de armas, mas guardou porventura
a mágoa daquele golpe com que a fortuna injustamente o castigava. Além disso, não faltou quem o suspeitasse de inteligência
com os brasileiros, para trair a Pátria. Segundo o mesmo Baldrich, ele também aproveitara habilmente a atitude de Lavalleja
para insinuar-se no espírito do general Martim Rodrigues e ganhar-lhe a confiança. A verdade é que este general o empregou
em operações contra nós, em 1826, como veremos em breve. Mais
tarde, porém. Rivera perdeu-lhe de todo a confiança e resolveu
dirigir-se a Buenos Aires. Ao que declara Baldrich, seus partidários praticaram atos de hostilidade contra os argentinos; seu
irmão Barnabé Rivera revoltou-se, abandonando o posto de cobertura que ]he haviam confiado; proceder idêntico tiveram os majores Ranà e Araucho. O mesmo Barnabé apoderou-se das cavalhadas do exército, enquanto outra partida tinha a ousadia de
saquear as carretas que conduziam a bagagem do general Martim
Rodrigues e de seu chefe de Estado-Maior. Complicavam a situação as deserções frequentes que se notavam na tropa.
Parece fora de dúvida ter "havido nesse comenos sintomas
irrefragáveis de indisciplina e desordem nas hostes coletícias dos
orientais. Clemente Fregeiro, escritor honesto e ciente, afirma
'"que foi necessário retirar o exército do povo de Durazno para
sufocar a rebelião iniciada pelos amigos e partidários do general
Rivera. os quais, mal aconselhados e ainda pior inspirados em
circunstâncias tão supremas para a República, não vacilaram um
instante em promovei' e suscitar conflitos, que, no melhor dos
-casos, poriam de novo em problema a liberdade da Província
Oriental" (1).
Em vista desse estado de cousas, percebem-se facilmente as
graves dificuldades que se antolhavam ao general argentino. Não
admira, pois, a lentidão de seus preparativos e por fim o desânimo que o invadiu e levou a solicitar dispensa do cargo de comandante em chefe, alegando, além do mais. seu precário estado
de saúde. O governo deu-lhe como substituto o general Carlos
Maria de Alvear, que exercia o cargo de ministro da guerra (14
•de agosto de 1826).
Pouco tempo depois fl.° de setembro) Alvear assumia as
funções de comandante em chefe no acampamento de Durazno.
Foi seu primeiro cuidado restabelecer a disciplina, compelindo
-os díscolos à obediência, e amalgamar os elementos combatentes
Q)
La batalha ilr, Ititzaingó — pág. 100.
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da Argentina e da Província Oriental. Conta-se que intimou
Lavalleja a qué se pusesse lealmente às suas ordens, dentro de
24 horas, e finalizou dizendo-lhe: "Se o Senhor, general, não
obedece, marcho, imediatamente ao quartel-general do Arroio
Grande e repasso sem demora o Uruguai, resolução para que
estou autorizado, deixando aos orientais que se harmonizem como
possam com os brasileiros e riveristas". Obedecido, marchou
contra Barnabé Rivera, que aprisionou no passo dos Toros. Meteu
então ombros à tarefa de concentrar os elementos indispensáveis
à campanha, e fê-lo com tal energia e atividade, que, no~~dia 26
de dezembro de 1826, estava pronto para.abalar do acampamento
do Arroio Grande em busca do inimigo. .
Verifica-se ^destarte, conforme já disse, que as Províncias
Unidas dispenderam mais de um ano no recrutamento, organização e instrução do exército de uns 12.000 homens, que moveram
oontra nossa * fronteira em princípios de 1*827. Não preciso insistir nas causas determinantes dessa, demora, que, afinal, são
quase as mesmas que farão o Brasil proceder de modo idêntico.
Após o recontro de Sarandí, dissemos que o coronel Bento
Manuel Ribeiro retirou com uma fraçao dos combatentes, juntamente com o tenente-coronel Bento Gonçalves, até o passo do
Pereira, no rio Negro; daí seguiu para Santana do Livramento,
depois de encaminhar Bento Gonçalves para o Cerrito de Jaguarão, com as praças de Cêrro-Largo, o regimento de milícias do
Rio Grande e algumas praças vindas de Montevideu. *
A notícia do desastre de Sarandí ecoou tristemente no Rio
Grande do Sul. Pressentiu-se o perigo do movimento insurreeional uruguaio, ante a amplidão da fronteira e a míngua de combatentes para a defender. As melhores tropas estavam com
Lecor, em Montevideu e Maldonado, e tinham partido com o
comandante das armas, general Abreu. Se este havia sido rechaçado e regressava à fronteira desfeito, abria-se uma crise que
•só com o tempo se poderia vencer. O Visconde de S. Leopoldo,
presidente do Rio Grande do Sul, mediu, sem detença, a grandeza
do perigo e buscou meios de o anteparar, ignorava o paradeiro
de Abreu, de que não havia informes precisos; corriam vozes que
ule descera pelo rio Negro e depois pelo Uruguai, no intuito d«
regressar por mar ao Rio Grande. Eram, sem dúvida, notícias
alarmantes, mas próprias a caracterizar o estado dos espíritos
naquele momento. O Visconde chamou a si a direção militar;
dividiu a fronteira em dois trechos: do mar a Bagé e da margem
do rio Negro ao Uruguai. Confiou o comando do primeiro a<f
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marechal Correia da Câmara e o do segundo ao brigadeiro Sebastião Barreto Pinto (3 e 6 de novembro de 1825).
Só em meados deste mês reapareceu o general Abreu e reassumiu as funções de seu cargo. De S. Gabriel escreveu ao presidente da Província (13 de novembro) participando-lhe estarna fronteira das Missões o coronel Palmeiro com mais de 400
homens, acampado na barra do Ibicuí e vigiando a barra do
Uruguai até Santo Angelo, enquanto da referida barra para baixo
cruzavam pequenas partidas nos passos de Santana, Tucumbu
e Belém; ter posto o coronel Bento Manuel Ribeiro, com 800,
na es'ância do Tenente Batista, à margem do Quaraí, e haver
dirigido o coronel Joaquim José da Silva, que encontrara em
caminho, para a estância de Ricardo José de Magalhães no
mesmo rio Quaraí. E acrescentava ter determinado aos dois últimos coronéis conservassem patrulhas na costa do Arapeí.
Meditando sobre a carta, compreenderá o leitor que a ideia
de Abreu com suas medidas de cobertura era em resumo vigiar
o Uruguai e resguardar-se com o Quaraí, destacando patrulhas
de exploração até o rio Arapeí. Pouco se sabe das precauções
tomadas no outro extremo da fronteira, para onde se havia retirado Bento Gonçalves, por ordem do próprio Abreu. Tínhamos
com certeza uma guarda no forte de Santa Teresa e um destacamento no Chuí, e sem dúvida, forças em Jaguarão; o rio deste
nome servia-nos provavelmente de linha de defesa.
Como era natural, os orientais atacaram sem demora o extremo meridional da fronteira, que era o que lhes ficava mais
próximo. A 31 de dezembro ainda do mesmo ano de 1825. o
coronel Leonardo Oliveira surpreendeu a guarda brasileira de
Santa Teresa, comandada pelo alferes Joaquim de Oliveira e
apossou-se do forte; a seguir atacou o destacamento do Chuí, a
cuja testa se encontrava o major Inácio José Cabral da Costa, e o
desbaratou.
Ressalta do exposto que os orientais dominavam por com.pleto toda a campanha da Cisplatina, ao sul de uma linha que
seguisse o álveo do Quaraim até as suas cabeceiras, depois alcançasse o Jaguarão e descesse por êle. Nada, portanto, mais
.fácil do que a reunião do exército argentino.
• Seria de grande interesse miliíar saberem-se as medidas de
cobertura que êle tomou, enquanto esleve na margem esquerda
do Uruguai e depois que se trasladou para o território cisplatino.
Encontravamo-nos demasiado próximos dele, para que se não
.previssem medidas de precaução. Só a fraqueza numérica dos
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contingentes brasileiros ou, quiçá, a incapacidade estratégica cí<:
seu chefe, explica não termos operado ofensivamente para lá da
linha do Arapeí, ao menos até Salto, na esperança de embaraçar
a passagem do inimigo pelo Uruguai e de perturbar-lhe as comunicações. A verdade incontrastável é que ficamos na defensiva
estratégica, limitando-nos a repelir as incursões do adversário.
Durante o comando do General Martim Rodrigues êle nos faz
algumas, aliás, sem nenhuma importância. Assim é que, em
maio de 1827, o general argentino confia a Rivera a missão de
romper a nossa cobertura no Quaraí e atacar a força de Bento
Manuel Ribeiro. Rivera move-se com cerca de 1.000 homens,
levando como sub-chefe Oribe e Servando Gomes; acomete a^
guardas do Arapeí, mas, segundo Baldrich, pratica o erro ou a
indignidade de não prosseguir na operação. Faz ainda mais.
declara o mesmo autor; facilita a fuga de um recente prisioneiro
brasileiro, por nome André Soares, que sem demora vai participar a Bento Manuel, na margem do Quaraim, as intenções do
adversário.
"Rivera —*• lê-se em Baldrich — haciendo más vituperabUó sospechosa su condueta, opero en ella, pêro ya no sobre el enemigo sino sobre ias vacas y caballadas de los habitantes. En pooo
tiempo sus partidas se aduenaron de millares de millares de cabezas de ganado major, que en mínima parte regalo á los caudi]lejos regionales dei Dayman, para premiar serviços a Ia causa
dela Pátria, reales ó supuestos; en puridad de verdad, para ganar
sus voluntades y associados á sus propósitos personales, mientras el grueso de este botin criminal y vergonzoso, pasaba incesantemente, en grandes tropas, ai Entre Rios y Corrientes, donde
se enajaban á precios.ridículos" (2).
A segunda incursão de alguma importância teve por alvo
a força do tenente-coronel Bento Gonçalves, ao que parece,
quando ela estanciava no Rincão do Francisquito.
Desta vez foi o coronel argentino José Maria Paz quem se
encarregou da entrepresa. Paz marchou do acampamento* àt*
Durazno à frente de seu corpo, o 2.° de cavalaria (27 de julho);
no arroio Cordovez fêz junção com o coronel Inácio Oribe, elevando sua força a pouco mais de 1.000 homens. De Palmas
expediu o capitão Cláudio Verdun, com um pequeno destacamento, a nosso encontro. Nas pontas do arroio Caraguatá, Verdun
foi atacado e completamente batido por um destacamento bra(2)
Guerra dei Brasil — pág. 151.
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sileiro. ao mando do major António de Medeiros Cosia (6 de
agosto de 1826). Não se compreende a razão por que Paz
desistiu da tarefa em seguida a esse revés; salvo se a força de
Verdun era mais numerosa do que dizem os argentinos.
"Este contraste, aunque glorioso, — ousa escrever o inegualável Baldrich — debelando à los ojos de Bento Gonçalves Ia
empresa de ^Paz, Ia malograba de hecho. En consequência, el
Regimento 2, de ordem dei General Rodriguez, se reincorporó
ai ejercito, en el acampamento dei Yi" (3).
No 1.° de dezembro de 1825, tomou o governo imperial
a resolução de afastar o General Abreu do comando de nossas
tropas no Rio Grande do Sul e-de entregar tão espinhoso cargo
ao General Francisco de Paula Massena Rosado. Caíam assim
sobre o incansável e estrénuo lutador das campinas meridionais
as responsabilidades dos desastres que havíamos sofrido nos primeiros recontros com os orientais em revolta.
Rosado viera ao Brasil como tenente-coronel comandante do
2.° batalhão de caçadores da Divisão.de Voluntários d'El-Réi.
Fizera ã campanha do Sul corn Lecor e aderira à independência
do império, recusando-se a acompanhar D. Álvaro da Costa.
Ajudado por alguns oficiais, conseguira desarmar seu próprio
batalhão, quando êle se dispunha a fazer causa comum com
D. Álvaro.
Ao ser nomeado para substituir Abreu, encontrava-se no
Rio. O Imperador entregou-lhe um contingente de tropas e fê-lo
partir para o sul, com a missão de organizar e comandar o exército que deveríamos opor às Províncias Unidas. Rosado tocou
em Santa Catarina, onde permaneceu mais de um mês; a 3 de
fevereiro do ano seguinte (1826) assumia o exercício de seu
novo posto. Nele se conservou até 11 de janeiro de 1827, isto é,
pelo dilatado espaço de pouco mais de onze meses.
As testemunhas da época são contestes em afirmar que lhe
faltavam as principais qualidades para tão elevada tarefa, e que
seu comando se caracterizou pela inépcia mais completa. Começou concentrando as tropas brasileiras na coxilha de Santana
junto a Santana do Livramento, em lugar de todo impróprio e quê
êle denominou pomposamente Acampamento da Imperial Carotina.
"Em um pequeno recinto montuoso desta povoação nova e
isolada, coberto de areia, desarborizado, e banhado apenas em(3)
Guerra dei Brasil — pág. 159.
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uma de suas orlas por pequenos regatos, origens do Ibicuí, que,
no verão, ou secam, ou se tornam insalubres, estabeleceu o general Rosado o seu quartel-general em março de 1826, ocupando
os poucos casebres que ali deparou, e em derredor de si fêz
amontoar as tropas, que em diversos períodos e de diferentes
províncias convergiam para aquele ponto para a organização do
exército" (4).
Recolheu a Santana a brigada de Bento Manuel Ribeiro
estacionada no Rincão do Catalão, e só não procedeu da mesma
forma com a de Bento Gonçalves, destacada para os lados de
Jaguarão, em vista da resistência do respectivo comandante.
É ainda hoje um problema cativante reviver a situação ilc
1826 e remeditá-la na carta como matéria de estudo.
, ^De que se tratava?
De reunir, com todas as garantias de segurança, um exército
combatente, de equipá-lo e adestrá-lo longe das perturbações do
inimigo, e, ao mesmo passo, de impedir, tanto quanto possível,
as incursões deste último em. nosso território, pois só assim poderíamos obstar sobretudo aos prejuízos em nossos rebanhos.
Nessas circunstâncias, é óbvio que um ponto na capela ác
Santana do Livramento ou perto daí não era totalmente desprovido de condições. Se a topografia da coxilha de Rosardo não
oferecia vantagens, nada mais fácil do que escolher outra melhor.
Santana só apresentava o inconveniente da distância excessiva
de Porto Alegre. Sob esse aspecto, fora melhor São Gabriel.
Em todo o caso, deveria ser um dos centros de vigilância de
nossa cavalaria, juntamente com Alegrete, Bagé e Jaguarão; em
todos eles deveríamos ter destacamentos de cobertura, que abrissem antenas tanto para o lado do rio Uruguai como para o sul.
Era um erro, aliás da época, pensar em defender toda a
nossa fronteira mediante tropas diluídas em cordão, ou obstar
por completo a que o inimigo penetrasse por vezes, temporariamente, em nosso território.
, Toda a nossa estratégia devia resumir-se em proteger com a
cavalaria a reunião central das tropas, em pontos bem selecionados da zona periférica. Como estávamos na defensiva, bastaria
vigiar a partir desses pontos, com reconhecimentos e destacamentos de descoberta, os preparativos do inimigo, ou suas linhas de
irrupção.
(4)
Recordações Históricas, por Machado de Oliveira, pág. 504.
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É tradicionala crítica à concentração operada pelo Brigadeiro Rosado. Em princípio não me parece justa pelos motivos
que acabo de referir. .Onde sua conduta se me afigura estranhável é quando êle chama para junto de si as brigadas de Bento
Manuel Ribeiro e Bento Gonçalves, sem nada interpor entre suas
forças e as do adversário.
O Império não se poupou a esforços para ministrar a Rosado todos os elementos necessários à luta. Mandou proceder
a um recrutamento geral e rigoroso, e encaminhou para o sul
quantos recursos pôde reunir. Mas parece que faleciam a
Rosado definitivamente as qualidades próprias de um espírito
organizador. Além disso, sobreveio entre êle e seu colega, o
brigadeiro José Egídio Gordilho Veloso de Barbuda (depois
Visconde de Camamu), presidente do Rio Grande, uma desinteligência de resultados funestíssimos para a concentração do futuro exército. Perdeu-se um tempo precioso em recriminações
recíprocas e reclamações que nada adiantavam. Machado de
Oliveira afirma que o ano de comando de Rosado foi um período
"âe privações, dor e sofrimentos com inimitável constância e
resignação, de que resultou um vazio considerável nas fileiras
dos combatentes".
A opinião pública do Brasil seguia com reservas e até com
protestos a marcha dos acontecimentos militares. Reinava grande inquietação com respeito ao futuro. Ninguém podia compreender que um Império poderoso, armado de uma esquadra
considerável, fosse posto em cheque por compesinos sublevados
ou por forças cèleremente congregadas na Argentina. Soavam
vozes na imprensa contra os abusos do recrutamento, e a situação
indefesa da costa em face do atrevimento dos corsários. Já eram
numerosos os casos de embarcações brasileiras arrebatadas pelos
flibusteiros quase que às nossas vistas. Tornava-se geral a impressão de que a Coroa insistia em lançar-nos em uma aventura
contrária aos sentimentos de justiça e aos interesses reais do
País.
"D. Pedro, apreensivo com os sintomas desfavoráveis da
opinião pública, que começava a revelar-se com franqueza em
relação à guerra, quer pelo tempo que ela já durava, quer pelas
consequências prejudiciais que trazia ao Império, e a todos os
cidadãos; por outro lado igualmente com a situação das cousas
políticas nas províncias do sul, resolveu-se de repente a deixar
o Rio de Janeiro e a visitar o teatro das operações militares.
Desejou ver com seus próprios olhos o exército que há tanto
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tempo mandara reunir e disciplinar nas fronteiras do Rio Grande,
as forças de que ainda dispunha em vários pontos do Rio da
Prata, e a esquadra que devia empregar-se no bloqueio dos
portos da república inimiga, e na perseguição e ruína dos pequenos vasos de guerra argentinos. Quis examinar e conhecer pessoalmente as necessidades das tropas e das províncias meridionais do império, e providenciar quanto em si coubesse para dar
um impulso vigoroso à guerra, e vingar a honra" e dignidade da
nação e da sua Corte' (5).
Antes, porém, de empreender a viagem para o Sul, tomou
D. Pedro I a deliberação de dar um substituto ao general Rosado,
sem dúvida em consequência das informações que lhe chegavam
sobre o estado de desorganização das tropas de Santana. O escolhido foi o tenente-general Felisberto Caldeira Brant Pontes.
Visconde de Barbacena (decreto de 12 de setembro de 1826).
Era Barbacena um cidadão conspícuo, inteligente, culto, de fino
trato e servidor leal do país. Nascera em Minas, no arraial de
S. Sebastião, a 19 de setembro de 1772 e estudara em Lisboa,
primeiro no colégio dos Nobres e depois na Escola de Marinha.
Passara para o exército no posto de major do Estado-Maior e
estivera em África, como ajudante de ordens do governador de
Angola. Viera depois ao Brasil, no posto de tenente-coronel
comandante de um regimento da Bahia. Tivera ali brilhante
e patriótico papel quando ocorreram os movimentos insurrecionais provocados pelas cortes de Lisboa. Fora deputado à Constituinte e era senador pela província das Alagoas, desde 16
de abril de 1826, quando D. Pedro se lembrou de apelar para
a sua energia e atividade, dando-lhe logo o título de marquês
(4 de novembro), e confirmando-o a seguir no de tenente-general
(17 de dezembro).
Barbacena considerou de frente o problema, como em breve
reconhecerá o leitor, quando lhe referir seu plano de operações;
pôs-se em contacto com o imperador D. Pedro e com o ministro
da guerra, e falou-lhes com a franqueza rude de soldado. Ainda
no Rio, escolheu camaradas de merecimento para o auxiliarem
na tarefa e servirem em seu Estado-Maior. Propôs o brigadeiro
Soares de Andréa, depois Barão de Caçapava, para ajudantegeneral; o sargento-mor Silva Ferreira para deputado do mesmo;
o brigadeiro Cunha Matos para quartel-mestre-general; o coronel
(5)
pág, 174.
Pereira da Silva — Segundo Período do reinado de D. Pedro I
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Tomé Fernandes Madeira para comandante de artilharia e o
sargento-mor Ponsadilha para ajudante de ordens. Mais tarde
foi-lhe dado como chefe de estado-maior o marechal Henrique
Brown. Pela primeira vez no Brasil tivemos assim esse cargo
no quartel-general de um comandante em chefe e exercido por
um estrangeiro. Brown era alemão ou,.pêlo menos, descendente
de família alemã. Servira no exército inglês, onde tivera o
posto de coronel, e no português, de que era marechal de campo
reformado. Fora contratado em Londres, a 12 de maio de 1826,
para servir, com o posto de marechal de campo efetivo, no
exército brasileiro, e na Província em que o imperador o quisesse empregar. Por decreto de 22 de agosto de 1826 ficou
incluído no quadro efetivo do exército. Designado para servir
com Barbacena, partiu para o Sul, a 25 dé novembro do mesmo
ano, na corveta de guerra Duquesa de Goiaz.
Barbacena seguiu para o Rio Grande no dia 3 de novembro
de 1826; a 8 do mesmo mês chegou a Santa Catarina; a 11
prosseguiu a viagem e a 23 alcançou Porto Alegre; a 26 estava
no Rio Grande, a 28 na povoação do Norte e a 6 de dezembro
de novo em Porto Alegre. Obrigou-o a ir ao Rio Grande -a
necessidade de conversar diretamente com Lecor, que ali se encontrava. De Porto Alegre escreveu dois ofícios ao ministro da
guerra, Conde de Lages, transmitindo-lhe as suas primeiras impressoes. Participava-lhe no primeiro (8 de dezembro) ter mandado fortificar o Rio Grande, estar o exército reduzido a 3.000
homens disponíveis e haver grande falta de fardamento e calçado, e apenas 50 carretas. Constava-lhe existirem 17.0Q0 cavalos, mas só a metade em condições de servir. Os soldados da
Província estavam pagos até maio e os do Norte até agosto. No
segundo (15 de dezembro) salientava a ignorância de Lecor com
respeito ao efetivo exato da tropa, que êle Barbacena orçava
afinal, incluídos doentes e destacados, em 6.832 praças. Dizia
ter mandado reforçar a esquerda da linha de fronteira, isto é,
a região de Jaguarao, com o 4.° regimento de cavalaria e o 5.°,
bem como com o batalhão que chegara com Brown; e haver
mandado construir duas lanchas para a defesa da Lagoa Mirim.
Anunciava também a criação de um depósito de recrutas e o recolhimento a seus corpos dos oficiais que deles andavam
afastados.
A 17 de dezembro, pôs-se em marcha jiara o acampamento,
fazendo escala em Rio Pardo. Dali escreveu de novo ao ministro
(20 de dezembro) referindo o seu encontro com o Barão de
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Cerro Largo e a oferta feita pelo vellio guerreiro de reunir
1.500 a 2.000 homens, para formar, sob seu comando, a vanguarda do exército brasileiro. No 1.° de janeiro de 1827 chegava a Santana ou, como então se dizia, à Capela do Livramento.
*i
O imperador partiu do Rio no dia 24 de novembro de 1826,
a bordo da nau D. Pedro Primeiro, seguido da fragata Isabel,
da corveta Duquesa de Goiaz e da escuna Primeiro de Dezembro,
além de alguns transportes, segundo Armitage. Comandava a
força naval o almirante Conde de Souzel. Ia na comitiva de
D. Pedro o Visconde de S. Leopoldo, ministro do Império.
Ao quarto dia de viagem, no rumo de Santa Catarina, sobreveio uma cerração e quando a mesma se adelgaçou, viram
os brasileiros, com surpresa, no meio deles, o navio corsário
Chacabuco, ostentando o pavilhão das Províncias Unidas. Roçávamos assim com Brown na sua cruzada para o norte com a
Sarandí e a Chacabuco,'a. que linhas atrás fiz referência. Atacada
pelos nossos, a segunda logrou escapar, embora perseguida até
ao anoitecer pela nossa corveta Isabel.
D. Pedro desembarcou em Santa Catarina no dia 4 de dezembro e dali seguiu por terra para o sul, passando por. Laguna;
ao findar o ano, estava em Porto Alegre. Uma vez ali, buscou
informar-se de tudo, levantar os ânimos abatidos, pelo apelo ao
patriotismo dos riograndenses, e tomar as medidas mais urgentes para a campanha que se ia abrir. Era sua intenção, segundo
alguns, ir até o acampamento de Santana, e só não o fêz por
haver, recebido a notícia da morte de sua esposa, a Imperatriz
D. Leopoldina (11 de dezembro). Compungido pelo acontecimento, regressou, sem demora, a Santa Catarina e daí ao Rio,
onde aportou a 15 de janeiro do ano seguinte (1827).
A explicação, que acabo de dar, da volta repentina de
D. Pedro é a que figura em todos os historiógrafos. Rio Branco,
porém, combate-a. "É preciso — escreve êle — não atribuir a
esse triste acontecimento, como se tem feito até aqui, o regresso
do imperador. Ao ministro inglês Gordon, que o fora encontrar
em Santa Catarina, D. Pedro I já havia declarado que a sua
visita ao Rio Grande «eria curta. Quando o ministro Visconde
de S. Leopoldo chegou a Porto Alegre no dia 14 de dezembro,
estava resolvida a viagem de regresso, e, em proclamação do
dia 16,'dizia o imperador: "A necessidade de minha presença
na Corte para tratar de negócios de alta importância e mandarvos mais socorro, faz com que me retire com brevidade, o que
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sumamente sinto. . . " . Nesta data não se sabia, em Porto Alegre,
da doença e morte da Imperatriz. Só alguns dias depois, na
cidade do Rio Grande, recebeu o imperador estas notícias pelo
brigue americano Ema, saido do Rio de Janeiro no dia 13" (6).
Poucos dias depois de nomeado, isto é, a 2 de outubro de
1826, dirigia Barbacena um Memorandum ao Imperador D.
Pedro, em que lhe expunha seu plano de guerra no Rio Grande.
É um documento de alta relevância, em que transparece larga
visão dos acontecimentos e por onde se vê que lhe não minguava
saber militar.
"Um exército nú — dizia ele começando — descalço, sem
munição de guerra e boca, sem remédios, sem cavalos, e reduzido
depois de um ano à mais humilhante defensiva deveria fazer
sossobrar o meu espírito, se eu não contasse com o génio de
V. M. I.,"com a justiça da causa e com o favor do Onipotente,
tantas vezes manifestado em benefício do Império".
E aduzia: " 0 caráter e a honra dos brasileiros, a glória
c dignidade de V. M. I., estão comprometidos: não se trata da
conservação ou conquista de uma província, mas da existência
da realeza na América, ou do triunfo da Democracia".
Propugnava francamente a ofensiva e o seguinte plano:
1.°,
expulsar o inimigo para além do Uruguai;
2.°,
ocupar depois a província de Entre Rios;
3.°, obrigar a República Argentina a solicitar a paz, sem
nenhuma possibilidade de renovar hostilidades.
Reclamava para a execução do mesmo 15.000 homens, um
depósito de 4.000, o armamento correspondente e 6 milhões de
cruzados para as despesas durante um ano.
Como Abreu, dizia êle, despediu-se de 5.000 homens e o
governo depois mandou 6.000, e, como em Montevidéu e Colónia
existiam então para cima de 5.000, segue-se que sem maior esforço já haviam contado os brasileiros 16.000 homens em armas.
Barbacena tinha, pois, ideias francamente .imperialistas;
para conservar a Cisplatina, que já nos ocasionara tantos tra- ,
balhos, achava que o melhor seria agravar ainda mais a situação
conquistando também Entre .Rios e buscar novos limites pelo rio
Paraná!...
(6)
Efemérides brasileiras— pág. 58*
— 214 —
''Os governos de Santa Fé e Comentes — ponderava —
mandando tropas contra V. M. I., deram junto motivo de conquista, e V. M. I. cometeria grande erro político, perdendo tãò
feliz oportunidade de fechar o Império pelos limites naturais,
que a mão divina nos está indicando".
Aos 15.000 homens pretendia Barbacena dar os seguintes
destinos: 2.500 na fronteira do Rio Grande, 200 no Cerrito,
3.700 em Montevidéu, 1.100 na Colónia e 7.500 no exército
em formação. Faltavam 3.000 para completar aquele número,
mas 1.000 poderiam vir do Rio e 2.000 ser levantados no
próprio Rio Grande.
Preconizava unidade de sistema, esforço geral e concentrado; só assim se chegaria com proveito ao fim da guerra, e
não mediante operações destacadas, pequenas e incapazes de,
resultados decisivos. Era, pois contrário a-operações prematuras, e considerava prejudicial qualquer incursão distante, como
a que, se projetava na Patagônia, e até mesmo a que se tinha
e vista em Entre Rios.
Queria, afinai, ser o único chefe responsável, a quem tudo
obedecesse, e, por isso, reclamava, estas medidas complementares;
1.°,
que ninguém compartisse de sua autoridade;
2.°,
que lhe fosse permitido castigar e premiar;
3.°, qvie o general de mar o ajudasse e não lhe contrariasse
as operações;
4.°, que três embarcações estacionassem no Rio Grande,
para facilitar as ligações com a Corte e os fornecimentos;
5.°,
de soldo;
que a caixa auxiliar tivesse uma reserva de 6 mesen
6.°, que no último de dezembro todo o exército estivesse
completamenle fardado, armado e pago em dia, para entrar ent
campanha;
7.°, que as presas de gado, praia e ouro na província de
Entre Rios e na Cisplatina fossem divididas pelo exército e
pelas guarnições, conforme o modo que indicava.
r
.lal era o plano de Barbacena em suas linhas gerais.
— 215 —
O imperador respondeu-lhe por intermédio do ministro da
guerra, Conde de Lages, a 20 de outubro. Declarava aceitar-lhe
os projetos, mas fazia algumas restrições. Era a primeira concernente à ocupação de Entre Rios, sobre que se deveria guardar
segredo e que só seria posta em execução, se, depois da pacificação da Cisplatina, o governo assim o entendesse, o que não
excluía a passagem do Uruguai por forças nossas, momentaneamente, para bater as do inimigo que dali nos ameaçassem.
Cientificava a Barbacena de que, contrariamente a seus
desejos, dele Barbacena, estavam resolvidas as expedições da
Patagônia e de Entre Rios.
Relativamente às sete medidas solicitadas, concordava: com
a primeira, menos quanto a recrutamento, que pela lei era da
competência dos presidentes de província; com a segunda, não
devendo, porém, ir o prémio conferido além da graduação de
tenente-coronel; com a terceira, quarta, quinta e sexta, de modo
integral, tanto que expedia as ordens nesse sentido, e com a
sétima na forma das leis em vigor.
Falta, como se vê, na exposição de Barbacena o plano de
manobra contra Alvear, mas compreende-se que ainda hesitasse
em formulá-lo, talvez porque estava longe do teatro de operações, para ele desconhecido, e sobretudo porque não dispunha
de um plano de informações que lhe facultasse conceber a manobra adequada àquele meio e àquela situação.
Embora sejam em geral judiciosas as ideias de Barbacena,
parece-me que, num ponto, êle não se inspirou bem nos princípios
da arte da guerra, a saber quando se propôs a deixar em Montevidéu, Colónia e fronteira do Rio Grande 7.300 homens e a
marchar com 7.500 contra o inimigo. ^Qual era o problema
fundamental? Derrotar o exército de Alvear. Logo, cumprialhe reunir a massa combatente mais numerosa que lhe fosse possível, retendo em Colónia e Montevidéu o mínimo de guarnição
e despreocupando-se momentaneamente da fronteira. Aniquilada
a massa de Alvear, tudo lhe viria ter às mãos em consequência
da vitória tática, e para essa vitória não haveria soldado que
fosse de mais, sobretudo se de nada servisse longe do campo de
batalha, guardando cidades que ninguém ia atacar ou vigiando
fronteiras provavelmente só transponíveis por grupos insignificantes.
Quem sabe a influência que essa violação do princípio da
economia de forças não exerceu na refrega de 20 de fevereiro!
IV
Barbacena assume em Santana o comando do exército brasileiro, reorganiza-o e
põe-no em movimento — Marcha estratégica para o fim de juntar-se preliminarmente com o grupo de Brown — Depois de reunidas todas as suas
tropas, lança-se no encalço de Alvear, que avança para o norte — Razão por
que se dirige, afinal, ao passo do Rosário, no rio Santa Maria, perto do qual
irava batalha com os inimigos
Chegando a Santana, foi Barbacena recebido com todas as
honras de seu cargo; no dia 2 de janeiro passou revista às tropas
G começou uma inspeçSo geral e cuidadosa. Sua presença teve
u condão de levantar os ânimos abatidos e dar aspecto militar
àquele agrupamento desordenado. No dia 11 reuniu um conselho para deliberar sobre a mudança de acampamento e a escolha de novo local. Foram unânimes os presentes em que ae
devia abandonar Santana, onde não havia nem pastagens para
a cavalhada, nem campo próprio para receber o inimigo, e procurar Bagé. Tendo Barbacena dito que o adversário parecia vir
naquele momento sobre Santana pela Coxilha Grande e Tacuarembó, enquanto tinha os dois Oribes na cabeceira do rio Negro,
acordaram todos, menos o coronel Olivério José Ortiz, que se
devia abandonar logo o acampamento, procurar lugar mais apropriado às cavalhadas, e aí aguardar notícias mais seguras do contendor, para operar em seguida de acordo com as circunstâncias.
Barbacena resolveu levantar acampamento, o que realizou
dois dias depois (13 de janeiro de 1827). Deu antes à tropa
organização regular; grupou-a em duas divisões, cada uma de
quatro brigadas, a que deveriam juntar-se duas brigadas ligeiras
de cavalaria do Rio Grande, a l. a comandada pelo coronel Bento
Manuel Ribeiro, e a 2. a pelo coronel Bento Gonçalves da Silva.
Esta última encontrava-se, como sabemos, do lado de Jaguarão.
Diziam os respectivos comandantes que uma numerava 1,500
praças e a outra, 800.
"Considerava-se igualmente como uma parte integrante do
exército a força de 900 homens, que constava oficialmente acharse de guarnição à fronteira de Missões e nalguns pontos do Rio
Grande e Entre Rios. A mor parte desta força, composta indistintamente de homens próprios para a guerra, estabelecidos nas
218 —
adjacências das fronteiras, e que por circunstâncias particulares
se achavam inibidos de servir imediatamente no exército, não era
fixa nas localidades, não tinha organização regular, nem restrita
disciplina; vinha a ser como corpos ocasionais, que ou reforçavam um destacamento da respectiva fronteira, que era ameaçada
pelo inimigo, ou acorriam a qualquer ponto dela, que dependesse
de força armada. Os regimentos 24 e 25 de cavalaria de 2. a
linha, incluídos nesta força, e que eram privativos da fronteira
de Missões, guarneciam-na sob as ordens do comandante da
mesma fronteira" (1).
Em consequência da longa demora do exército no acampamento de Santana, havia ali um acúmulo extraordinário de
material de toda espécie, inclusive de víveres, bagagens e arquivos, que não seria possível transportar com as tropas por
deficiência de meios de mobilização. Kesolveu-se deixá-lo no
próprio campo, sob a guarda de uma companhia de infantaria
de 2. a linha, a que se deram como reforço algumas praças estropeadas (ao todo, 232 homens) ; ficaram também ali 278 doentes.
Alguns dias depois da saída do exército, vendo o comandante
desse depósito que forças inimigas se aproximavam, e que não
poderia defendê-lo, decidiu destrui-lo pelo fogo e retirar-se.
E assim desapareceu o último vestígio da obra nefasta de Rosado!
No dia 13, como já disse, o exército de Barbacena levantava
arraiais no meio de júbilo geral. Compunha-se de.4.296 homens, com 12 peças de artilharia (10 de 9 libras e 2 obuses de
conforme se vê deste mapa oficial:
Infantaria
;
Artilharia
Guerrilhas .
Lanoeiros
Cavalaria do Rio
-.
Cavalaria da Bahia
Cavalaria de S. Paulo
Cavalaria do 5.° regimento
Milícias do Rio Pardo, Porto Alegre, Entre
Rios, Missões e Lunarejo
1.540
162
212
198
308
66
323
125
ll,362
,362
4.296
(1)
Machado de Oliveira — Recordações Históricas — pág. 516..
— 219 —
Depois de breve marcha (cerca de uma légua) foi acampar
à margem esquerda do arroio Cunhaperu (esboço n. 3, de Seweloh). Barbacena, que tivera um incómodo repentino e ficara
em Santana, só alcançou o acampamento à noite. Nessa mesma
ocasião chegaram o general Sebastião Barreto Pereira Pinto e o
Esboço n. 1
coronel de engenheiros Elisiáiio de Miranda e Brito, que haviam
sido mandados a Bagé, com o fim de reconhecer, nas cabeceiras
do rio Negro, posições para o exército, e que nada tinham conseguido, visto o inimigo aparecer nas vizinhanças daquele ponto.
O reconhecimento que pretenderam efetuar esses dois oficiais parece consequência natural do que se havia assentado no
conselho de guerra do dia 11. Desde que se projetava marchar
para Bagé, era evidente que convinha escolher de antemão o
novo acampamento na vizinhança do povoado. Caso o inimigo
se achasse distante, Barbacena de certo seguiria pela coxiiha de
Santana, isto é, pelo divisor das águas. Mas, como êle tinha
avançadas em Bagé, convinha naturalmente evitá-lo e, em vez
de marchar sempre para sueste, desviar a coluna mais para o
norte. E foi assim, de fato, que Barbacena procedeu.
- 220 -
No dia 14 a tropa ficou parada. Ao meio-dia, Bento Manuel Ribeiro chegou ao acampamento com a sua brigada de
cavalaria. (l. a ).
Barbacena, baldo de informações seguras de Alvear, resolveu lançar pela direita uma coluna de cavalaria de exploração
ou antesmma flanco-guarda. Reforçou a l. a brigada com outras
unidades, até perfazer 1.700 homens de cavalaria, e entregou-os
ao comando do brigadeiro Sebastião Barreto Pereira Pinto. No
dia 14, à noite, punha-se este general em movimento.
A ideia de Barbacena não só era sensata, mas sobretudo
previdente. Marchando na direçáo geral de leste, ele expunha
o flanco direito à tropa de Alvear. Urgia, portanto, interpor
desse lado, entre OB dois exércitos, um órgão de proteção, que
se encarregasse de explorar na direção do inimigo t de encobrir
a marcha estratégica que se ia realizar. Sabemos infelizmente
poucos pormenores da marcha isolada de Barreto, a qual durou
até Bage, como veremos.
.
'
Cumpre referir que já de Santana havia o general em chefe
buscado'colher notícias do inimigo, para o que dera instruções
ap major Cláudio José Dultra,- destacado na estância da Boa
União, e fizera marchar,* para as cabeceiras do Tacuarembó, o
coronel Joaquim José da Silva, com o 20.° regimento e o coronel
Medeiros com o 22.°. Tudo, porém, sem grande proveito.
No dia 15 Seweloh, ajudante de campo de Barbacena, estudou uma nova posição mais adiante (esboço n. 2).
A tropa continuou parada no dia 16. Neste dia Barbacena,
que ainda" não havia recebido nenhuma informação da coluna de
Barreto, escreveu ao ministro da guerra dizendo-lhe ter sabido,
por outras fontes, que a invasão, isto ê, que o inimigo se aproximava. "No estado em que me acho — declara ele — serei
reduzido à pura defensiva". Compreendendo que era urgente
marchar com celeridade, tomou a resolução enérgica de aliviar
a coluna. Mandou o coronel Carneiro requisitar todas as carretas do distrito e -levar para S. Gabriel o material dispensável e
os doentes.
.No mesmo ofício.ao ministro, informava Barbacena ter expedido uma ordem a Brown, de que remetia cópia. *Que ordem
seria essa? Presumo ter sido a que determinou a junção de
Brown e, provavelmente, os movimentos da 2. a brigada de cavalaria (Bento Gonçalves), a que terei breve de referir-me.
-221
-
A 17 a tropa abalou às dez e meia da manhã, cruzou a
coxilha de Santana e acampou, a uma hora, junto àa cabeceiras
jfl Povotx&o ate Jíotoi/C
/ÍCCL, aLdi. ttmcL. (cal
Esboço n. 2
do Ibicuí-mirim (esboço n. 3). No dia 18 não se moveu. No
dia 19, partiu às seis e um quarto, percorreu "terreno alto e
aberto" e foi acampar, às duas horas e meia, a uma légua da
MtSncia de Bento Correia, junto a um barco do Ibicuí. Distância percorridas 4% a 5 léguaa (esboço n. 4). No dia 20,
abalou às cinco e meia da manhã. Seweloh informa que neste
dia o escoamento do grosso da coluna durara 13 minutos. Apareceram 4 soldados fugitivos de Sarandí, que nada de importante
souberam dizer. Às noveve três quartos, repouso; às 11, continuação da marcha. Às duas horas, acampou-se perto da Lagoa
— 222
0 CAa-tctra, oíot 1'i'uva-.
Serro OUIL
880% et» cèu/ájto
Esboço n. 3
Esboço n. 4
— 223 —
Formosa e da estância de Joaquim Manuel Machado (esboço n.
5). No dia 21 pôs-se a tropa em marcha às quatro e três quartos.
Descanso das 9% às 10 horas. Às 12 alcançou o arroio do
Esboço n. 5
Ponche Verde, por cuja margem esquerda avançou para o N.
um quarto de légua, indo acampar às 12^> à beira do mesmo
arroio (esboço n. 6). No dia 22 rompeu para o N. às 4 e %,
tendo adiante e à direita o rio Santa Maria. Andada uma légua
e um quarto, alcançou o passo de D. Pedrito (Passo Real ou
Passo do Prestes); às 6 horas e um quarto, transpôs o Santa
Maria e acampou na sua margem direita.
— 224
Neste dia, Barbacena escreveu, de novo ao ministro da
guerra, informando-o de que Alvear ocupava, desde o dia 16.
o Rincão do Cardoso, tendo forças destacadas em Jaguarí e
Currales, e que mandara uma partida até Bagé, onde não havia
"nem tropa, nem depósitos", a qual logo se retirara. Acrescentava que o inimigo repassara o Rio Negro no dia 21, no Passo
do Arroio.
Verde
Esboço a. ,7
'Como alcançara tais informações o General em chefe?
Na mesma ocasião afirmava que o flanco esquerdo do inimigo estava sendo observado por Barreto, e o direito por Benio
Gonçalves, enquanto para a "frente do mesmo inimigo marcJuiva
o grosso do exército imperial".
. Desta comunicação ressalta o emprego da 2. a brigada de
cavalaria (Bento Gonçalves) no flanco leste de Alvear. Ora,
como ela pertencia às forças que se achavam com Brown do lado
de Jaguarão, é óbvio que os movimentos dos dois grupos de
forças brasileiras, a saber Barbacena e Brown, estavam sendo
dirigidos com harmonia e propriedade. Dentro em pouco verá.
porém, o leitor que foi o próprio Barbacena quem enviou ordem
a Bento Gonçalves para proceder do modo por que o estava
fazendo.
No dia 23, houve descanso. Barbacena oficiou pela terceira vez ao ministro, anunciando ter recebido partes de Barreto
e Bento Gonçalves. "Todos são unânimes —• diz êle — em que
o inimigo vem reunido entrando por Bagé". Não se lhe sabe
o número certo. Parece indubitável — acrescenta — que a sua
intenção era cortar o nosso exército, a íim debater separadamente
.a esquerda, que estava no Cerrito, e o centro e a direita, que
estavam em Santana, e sem dúvida que o teria conseguido, se
eu me tivesse demorado umv instante em ordenar a imediata
225 —
junção, ou me tivesse deixado embaraçar pelas dificuldades de
todos os géneros que me cercaram, começando por estar a pé,
achar o cartuchame podre e não ter imediato recurso".
"Pelo meu ofício (de 14) conheceria V. Exc a . o que determinei ao brigadeiro Barreto e coronel Bento Gonçalves, bem
como aos coronéis do 4.°, 5.° e 6.° regimentos, quando casualmente soube que o marechal Brown estava em Porto Alegre, supondo-o eu aliás muito ocupado em S. Francisco de Paula, com
a defesa daquele ponto da fronteira, segundo a minha positiva
ordem".
"'Ao mesmo marechal havia eu dado instruções, quando eslava incerto sobre os pontos que seriam atacados e vigorava a
opinião que seriam três. Depois escrevi-lhe ordenando-lhe que
.se reunisse imediaatmente a mim, e, temendo que ainda estivesse
em Porto Alegre, escrevi nesse mesmo sentido aos coronéis".
. Ressalta desse trecho quão previdente fora Barbacena nas
suas resoluções para a reunião estratégica de nosso exército.
"Estou seguro — continuava — de reunir todas as forças,
se os corpos de Barreto e Bento Gonçalves cumprirem minhas
ordens, como espero".
" 0 meu plano está feito e, com o favor de Deus e dos
bravos que me acompanham, espero que será coroado de feliz
sucesso, qualquer que seja a contrária aparência por algum
tempo".
"Enquanto eu não tiver força igual à sua, ou não cometer
o inimigo algum grande erro estratégico, permanecerei em pura
defensiva, atraindo-o quanto puder para o interior, porque nesta
direção eu ficarei cada dia mais forte em gente, cavalos e munições, e ele mais fraco em todos estes elementos .
Barbacena expõe com tal clareza e precisão seus pensamentos, que excusa comentários.
Segundo êle escreveu mais tarde (5 de fevereiro) ao ministro da guerra, "a primeira e sexta brigadas, comandadas pelo
brigadeiro Barreto, tomando no mesmo dia (23 de janeiro) a
posição de Santa Tecla, cobriram a marcha do exército, observando completamente o inimigo, que não ousou atacá-lo até o
dia 31, posto que todos os dias prendesse alguns prisioneiros
e desertores".
No dia 24 a tropa iniciou a.marcha às 5 e % ; caminhou
para leste. Às 9 e % descanso; às 11, reencetamento da marcha.
226
A l e 'Yéf acampou no Tacuarembó-Chico (esboço n. 8 ) . Além
deste esboço, dá-nos Seweloh mais o de n. 9, dizendo ter sido
feito por Barbacena, para indicar as disposiÕes das tropas, caso
fossem atacadas no acampamento. São duas linhas, comandadas
. *t I / /
oto fntyr
d*
/
Albasio
Esboço n. 8
respectivamente por Barreto e Soares de Andréa, e uma pequena
reserva de cavalaria. Os profissionais adivinharão com clareza,
nesse pequeno desenho, as ideias táticas de Barbacena.
Esboço n. 9
Neste dia, declara o nosso General em chefe que ordenou
a Barreto se reunisse ao exército, deixando de observação a sexta
brigada.
— 227 —
No dia 25 não se marchou; choveu toda a noite e o rio
ficou de nado. No dia 26 a tropa atravessou-o e prosseguiu a
marcha, primeiro na direção N. E. e depois na de E, Partida
às 5 horas e grande alto às 9. Às 10 e % continuação da marcha.
Acampou-se na Guarda-Velha de Tacuarembó, à margem esquerda do Tacuarembó-Grande (esboço n. 10). À tarde chegou, o
Esboço n. 10
general Barreto com a l . a brigada, tendo ficado a 6. a de observação ao inimigo. No dia 27 não se marchou. No dia 28 a
tropa prosseguiu o avanço, atravessou a Coxilha Grande debaixo
de tempestade e foi bivacar em ordem de marcha, junto às nascentes do Camacuan-Chico. No dia 29 abalou de novo e foi
acampar à margem esquerda deste rio, que estava quase de nado,
em consequência das chuvas torrenciais dos dois dias precedentes.
Como era urgente transpô-lo, e o exército não dispunha de material de pontes, a infantaria passou "com água pelos peitos,
levando as munições à cabeça" e a artilharia em pelotas, isto é,
em uma espécie de balsa feita de couro de boi. A travessia
durou 36 horas e foi penosa.
No dia 30, enquanto estava o exército empenhado em efetuar a passagem, as forças de Alvear marchavam contra êle.
O momento era crítico e demandava espírito calmo e firme nas
resoluções.
— 228 —
"O coronel Bento Gonçalves — escrevia dias depois Barba cena em seu boletim de 5 de fevereiro — batendo-se em retirada,
conseguiu retardar a marcha da vanguarda inimiga, e, sem perder
um só homem, fêz alguns prisioneiros, mortos e feridos".
"No dia 31 continuou o inimigo com mais força sobre o
coronel Bento Gonçalves, e, porque então ainda não haviam
Esboço n. 11
Esboço n. 12
passado as bagagens, mandou o general em chefe ao brigadeiro
Barreto repassar o Camacuan com os regimentos 20.° e Lunarejo.
para apoiar a 6.a brigada".
— 229 —
No mesmo dia 31 passaram as carretas de munição de guerra e boca.
"A vanguarda do inimigo — prossegue Barbacena — esteve
a menos de uma légua de distância em continuado tiroteio, que
cessou depois da noite".
fasto,
~
mPant* tCc «/•«* °í* j>?w-»
Esboço n. 13
:
'A ó.a brigada ficou do outro lado do rio cobrindo a retaguarda; e o brigadeiro Barreto reuniu-se no dia 1.° de fevereiro
. ao exército. . ."'
Resulta do exposto que a tropa chegou à borda esquerda do
Camacuan-Chico no dia 29 e só a 31 estava toda do outro lado.
e que, na crise da passagem, lhe serviu de cobertura a brigada
de Bento Gonçalves (a 2. a ), que se bateu com as avançadas de
Alvear.
Esboço n. 14
,
'
Convém chamar a atenção do leitor para os movimentos
de Barreto e Bento Gonçalves. 0 primeiro saiu para a missão
de exploração e segurança no dia 14 à noite e regressou a 26.
— 230
Não sabemos as minúcias de seus movimentos. Também
nos achamos na mesma ignorância com relação a Bento
Gonçalves (2. a brigada de cavalaria ligeira). Estamos apenas
informados de que operou, por ordem de Barbacena, na direita
de Alvear e que nos dias 30 e 31 se encontrava interposto entre
a vanguarda argentina e o exército brasileiro, protegendo a passagem deste último pelo rio Camacuan-Chico. Todas essas operações de cavalaria são prenhes de interesse para nós, pois foi
à sombra delas que. Barbacena velou a'os contendores a su:i
marcha estratégica e realizou afinal a união ambicionada com u
grupo de Brown. Façamos votos para que ainda se descubram
os documentos suscetíveis de permitir a reconstituição integrai
desses instrutivos episódios.
.
. Escreve Machado de Oliveira: "A l . a divisão do exército,
que. como acima fica dito, fora mandada em observação aos movimentos do inimigo, regressou no dia 26. E se ela muito'pouco
pôde obter do que fora essencialmente incumbida, ao menos
prestou o serviço de fazer reunir a si, e em seguida ao exército,
a 2. a brigada ligeira, que tivera ordem para incorporar-se ao
mesmo exército, quando este largou o seu antigo acampamento.
e que. deslocando-se de um dos pontos da fronteira do Rio Gran-
Esboço n.'15
fie, onde, estivera estacionada; pôde nas adjacências de Haaé
manobrar na frente de uma coluna avançada do inimigo, que ?r
esforçava em reconhecer p exército em sua passagem por ali, e
impedir-lhe essa tentativa. Esta brigada susteve-se à vista do
inimigo até o dia 30, em que foi investida por maiores forças
da sua cavalaria, e teve, por isso, de retroceder, aproximando-se
ao. exército, que então passava o rio Çamacuan-Chico,. posto de
— 231
nado, e teve de fazer repassar um corpo de cavalaria em suporte
daquela brigada" (2).
Esboço n. 16
No dia 1.° de fevereiro o exército de Barbacena continuou
A marcha, às 6 horas da manha, por terrenos ásperos e pedregosos, e foi acampar em excelente posição, à beira do arroio
Traíras (esboço n. 17).
Esboço n. 17
Convém abrir aqui um parêntese e prevenir o leitor de que,
tendo Seweloh partido no dia 27 do acampamento do Tacua(2>
Recordações Históricas — pág. 521.
— 232 —
rembó-Grande para fazer um reconhecimento até São Gabriel,
não pôde acompanhar a marcha de Barbacena desde aquele
acampamento até a beira do Tacuarembó-Chico, onde se apresentou de volta de S. Gabriel no.dia 31. Faltam-nos, por isso.
os esboços dos acampamentos intermédios. Em compensação,
deixou-nos os de sua excursão a S. Gabriel (ns. 11, 12, 13, 14.
15 e 16); este último é uma planta grosseira da Capela de
S. Gabriel daquela época.
Descrevendo o acampamento no dia 1:° de fevereiro, St>
weloh faz reflexões sobre os meios de transporte. Pinta as
carretas carregarias com 80 arrobas (2.560 libras) e puxadas
por 12 e mais bois. "Dez carretas — diz êle — estão debaixo
das ordens de um capataz e todas das de um oficial subalterna
(comissário de transportes)."
Esboço n. 18
No dia 2 de fevereiro o exército prosseguiu às 6 horas da
manhã; às 7 e % atravessava o arroio das Palmas e acampava
na margem direita dele (esboço n. 18). Foi, portanto, uma
marcha insignificante, só para mudança de acampamento.
233
Aí deu Barbacena a seu exército esta organização:
l . a Divisão — Brigadeiro Barreto.
l.a Brigada de cavalaria — Coronel José Egídio Calmon.
Regimento n. 1.
Regimento n. 24.
2.a Brigada de cavalaria — Coronel Tomás José da Silva.
Regimento n. 3.
Regimento de Lunarejo.
l.a Brigada de infantaria — Coronel Leitão.
Batalhão n. 3.
Batalhão n. 4.
Seis bocas de fogo.
.
2.ã Divisão — Brigadeiro Calado.
S.a Brigada de cavalaria — Coronel Joaquim Cláudio de
Barbosa Pita.
Regimento n. 6.
Regimento n. 20.
Esquadrões da Bahia.
4.a Brigada de cavalaria — Coronel Miguel Pereira de
Araújo.
Regimento n. 4.
Regimento n. 5.
.;
2.a Brigada de infantaria — Coronel Leite.
Batalhão n. 13.
Batalhão n. 18.
Haverá mais duas brigadas ligeiras de cavalaria,
l.a Brigada -— Coronel Bento Manuel Ribeiro.
Regimento n. 22.
Regimento n. 23.
Oito companhias de guerrilhas.
Duas companhias de lanceiros.
— 234
2.a Brigada
Coronel Bento Gonçalves.
Regimento n. 21.
Regimento de Cerro Largo.
Quatro companhias de. guerrilhas.
A 7 de fevereiro fêz-se, nesta ordem de batalha, ligeira alteração: permutou-se o 3.° regimento de cavalaria com o 4.° da
mesma arma; e o comandante da 2. a brigada com o da 4. a .
No dia 3 não se marchou. Seweloh foi mandado reconhecer o Passo de S. Simão.
Havendo notícia — escreveu Barbacena — de que o inimigo
jazia algum movimento para sua esquerda mandei marchar às
11 horas da noite a l. a brigada ligeira, do comando do coronel
Bento Manuel Ribeiro, para observar a sua direção ulterior.
Esboço n. 19
Np dia 4, transferiu-se o acampamento para melhor posição nas nascentes do Lexiguana, a meia légua de distância. No
dia 5, ao meio-dia, chegou a divisão do general Brown, composta
áo 4.°e 5.° regimentos de cavalaria, do 27.° batalhão de caçadores alemães (500 homens), de 80 lanceiros alemães incorporados ao 4.°, e de metade do 18.° batalhão de caçadores. Brown
estabeleceu-se no acampamento de Traíras, que o exército havia
abandonado.
— 235
Ao assumir.o comando de seu destacamento na fronteira de
Jaguarão, encontrou êle em Pelotas os batalhões de caçadores
18.° e 27.°, o 5.° regimento de cavalaria, os lanceiros alemães
e 4 canhões; e no Jaguarão-Chico, o 4.° regimento de cavalaria.
Encaminhou de Pelotas para,este último ponto o 18.° de caçadores, o 5.° regimento de cavalaria, as bocas de fogo e, um pouco
mais tarde, o 6.° regimento. Mandou de Pelotas para Jaguarão,
pela Lagoa Mirim, o 27.° de caçadores e os-lanceiros alemães,
eom ordem de subir daí o rio até o Jaguarão-Chico. Deste ponto,
escolhido para reunião das forças, avançou para o norte, ao encontro de Barbacena, passando pela capela de Santa Rosa (3).
Barbacena rejubilou com a vinda oportuna de Brown, pois
afastava um grande perigo e lhe trazia mais 1.572 homens, elevando o seu efetivo a 6.348, segundo êle declarou ao ministro,
em ofício do dia 5.
Neste mesmo dia, às 5 horas da tarde, chegaram alguns
prisioneiros feitos pelo alferes José Teodoro da Silva "que fora
mandado sobre a retaguarda do inimigo observar seus movimentos". Silva marchara na véspera pela costa do Piraí em direçao
a Bagé e lá penetrara de noite* fazendo prisioneiro um lanceiro
inimigo, que o informara de ter partido naquela tarde um grupo
de 30 homens vindos de Maldonado. Em vista disso correu-lhes
ao encalço, à frente de 10 companheiros; derrotou-os completamente na manha de 5, fêz 13 prisioneiros, deixou mortos 11
adversários, e apossou-se de muita cousa, inclusivamente de toda
a correspondência particular e oficial destinada ao exército de
Alvear.
Barbacena sentia-se bem na posição em que se encontrava.
Oficiando ao ministro da guerra sobre a junção das tropas, comentava a situação desta maneira:
tQ u e fará agora Alvear? iAtacar? A vantagem local ó
toda nossa. ^Esperar que eu o vá atacar? Também teremos
a vantagem de aumentar em força, recebendo socorros todos os
<lias, entretanto que êle diminui nela por moléstias e, sobretudo,
por deserções.
tQue resta? ^Retirar-se? Irei em seu encalço até o Uruguai, e a derrota em uma tropa desmoralizada será completa".
• (3) Informações úo livro: Contribuição para a História da guerra entre o
Brasil e Buenos Aires, por uma lestemunha ocular (em alemão) — 1834 — página 213. Rio Branco atribuía a autoria do mesmo a um certo major von
Leenhoff.
— 236 —
Chamo" a atenção do leitor para estas reflexões escritas m>
campo, na sazão dos acontecimentos, e não depois como recurso
para justificações.
O exército não se deslocou nos dias 6, 7, 8 e 9 de fevereiro.
•-'•Por que? Ignoramo-lo.
É grande lacuna não sabermos de modo preciso as suas
medidas de segurança e exploração nesse período.
No dia 10 de fevereiro, à 1 hora da madrugada, abalou,
retrogradando pelas posições abandonadas de Palmas e Traíras;
às 10 e meia estava de novo à beira do Camacuan-Chico, onde
acampava por divisões (esboço n. 20). No dia 11 não se moveu.
Esboço n. 20
Barbacena dirigiu novo ofício ao ministro da guerra.
"Até o referido dia 5 — pondera êle — fêz o inimigo todos
os preparativos de passar o Camacuan, mas, longe disso, tomou
d direção de Tacuarembó, dizendo ao exército, segundo um pòi Uiguês desertor, que ia tomar a caixa militar que-ficara em
Santana".
"Para mim-é indubitável que o inimigo se retira, suposto
haver nó exército quem pense que Alvear procura os campos 'de
Santana, vantajosos à sua cavalhada, pela mesma razão que eu
procuro as montanhas pedregosas de Camacuan".
"A incerteza não pode durar 48 horas, porque .destaquei
sobre seus flancos as duas brigadas ligeiras de Bento Manuel
:
Ribeiro e Bento Gonçalves e vou em seu seguimento".
— 237
Depois de escritas estas- linhas, sabia Barbacena, por um
índio, que o exército inimigo entrara em S. Gabriel no dia 9,
pela manhã. A notícia surpreendeu-o. "Se fôr verdadeira —
escrevia ao ministro — Alvear comete o desatino de se entranhar
e sua perda total parece segura mas duvido de tal movimento
por muitas razoes: l. a , porque, batido este exército, podia dispor
da província como quisesse, e se ele o teme agora, icomo avançar
para o interior, deixando-o na retaguarda e com meios de crescer
<3m força?; 2. a , porque, estando a brigada de Bento Manuel à
vista, e comunicando-me todos os movimentos do inimigo, ainda
não me deu parte da marcha de todo o exército além de
Jaguaré".
Porém horas depois Barbacena tinha certeza de que o inimigo estava de fato em S. Gabriel, conforme participou mais
tarde ao ministro, em data de 17 de fevereiro, e por isso correu
após ele na diregão desse povoado, sem demorar-se mais de
24 horas.
0 general Abreu (Barão de Cerro Largo) apresentou-se a
Barbacena, trazendo consigo 243 homens. Vinha juntar-se, por
patriotismo, às tropas nacionais, apesar do castigo que lhe havia
imposto o governo imperial depois dos desastres do Rincão e do
Sarandí. Barbacena pô-lo como vanguarda de sua coluna, em
substituição à l. a brigada.
Esboço n. 21
No dia 12, o exército partiu às 5 e % da manhã, transpôs
o Camacuan-Chico num ponto distante um terço de légua do
lugar em que o havia vadeado nos dias 30 e 31 de janeiro, e
— 238
prosseguiu em marcha retrógrada pelo caminho que havia trilhado vindo de Tacuarembó. Às 2 horas acampou nas vertentes do
Camacuan. No dia 13 continuou a marcha, a partir das 5
horas, e foi acampar nas pontas do Jaguarí. No dia 14 rompeu
ainda às 5 e fez grande alto das 10 e % às 11 e %. Às 2
acampou junto à estância do velho Serpa (José Francisco). No
dia 15 permaneceu no mesmo acampamento. No dia 16 abalou
à meia hora depois de meia-noíte no rumo do norte; às 3 e ^4
transpunha o Passo do Pau Arcado de Vacacaí; às 6 e ^> chegava
à estância de Bernardo do Canto e às 10 fazia alto, para acampai'
nas vertentes do Vacacaí. No dia 17 rompeu às 3 horas da ma^
dragada; às 11 a vanguarda alcançava S; Gabriel, onde a coluna
se detinha.
'
O inimigo avançara para o norte, cobrindo-se com uma retaguarda sob o comando de Lavalleja, a qual deixara S. Gabriel
às 4 horas da tarde do dia 16, ao saber da aproximação do
exército imperial.
As 5 horas da tarde de 17,'Barbacena recebeu uma informação de Bento Manuel Ribeiro, da máxima importância, datada no
dia 15. Até aquele momento estava na dúvida sobre a direção
exata qae tomaria Alvear no seu avanço para o norte. ^Penderia
para leste ou para oeste? ^Persistiria no rumo do norte? O informe de Bento Manuel esclarecia o caso, pois nele se afirmava
categoricamente que Alvear retirava pelo passo de S. Simão (no
rio Santa Maria).
.
•
Eis o documento:
.
"O carretame do inimigo baixou hoje pelo Campo
da Cruz, entre o banhado do Jacaré e Cacequí; é cerla
a retirada por S. Simão.
Eu hoje vou ficar em lbicuí, no Passo do Umbu.,
pôr as minhas cavalhadas em segurança, e fazer-lhe
guerrilhas, até passar em Santa Maria, logo que passem
no fundo do Loreto, e vou sair adiante. Eles, segundo
as suas marchas, só depois de amanhã poderão chegar
ao passo.
->
Campo do coronel Carneiro, 15 de fevereiro âe
1827 — Bento Manuel Ribeiro, coronel comandante
da IP brigada ligeira".
- 239 -
Vendo què o inimigo ia transpor o Santa Maria, no passo
de S. Simão, resolveu Barbacena vadear o mesmo rio muito
mais a montante, isto é, no Passo do Rosário.
"A derrota do inimigo — escrevia êle — de S. Gabriel, no
dia 17, ao ministro — será certa e total, se eu conseguir alcançá-lo. Para esse fim marcho amanhã (18) de madrugada pelo
Passo do Rosário, deixando aqui doentes, bagagens e munições
de boca. Também deixo algumas de guerra, e farei quanto
couber em minhas faculdades para dar um combate, que terminará a guerra para sempre e cobrirá de glória o exército
nacional".
Barbacena estava de tal modo convencido de que Alvear
retirava cíim a máxima celeridade, que temia que seus cavalos
não lhe permitissem "seguí-lo até o Uruguai'.
Todo serviço de exploração executado nesse período pela
l. a brigada de cavalaria, provavelmente na retaguarda e no
flanco direito de Alvear, poderia proporcionar-nos elementos
para estudos de grande proveito; estamos, porém, reduzidos a
conjeturas.
De S. Gabriel lançou Barbacena uma proclamação a suas
tropas, concitando-as à batalha. Nela anunciou que Alvear deixara após si uma retaguarda sob o comando de Lavalleja, e
"adiantara de quatro marchas a infantaria e a artilharia".
Tudo isso espalhou no exército entusiasmo indescritível.
Releva interpolar aqui algumas ponderações oportunas:
Acabei de dizer estar Barbacena convencido de que Alvear
se afastava dele deliberadamente para o evitar; em sua proclamação de S. Gabriel denominou o avanço do general argentino
fuga vergonhosa e precipitada. Só o que o general brasileiro
não deixou escrito foram as razões por que lhe ia no encalço
mediante a passagem do rio Santa Maria no Passo do Rosário.
Depois de sair de S. Gabriel, o exército argentino penetrou
no ângulo formado pelo Santa Maria e o Ibicuí. Três estradas
se lhe abriam, conforme a díreçao que desejasse seguir: a l. a ,
era a do Passo do Umbu, se lhe fosse intenção caminhar no rumo
geral do norte; a 2. a , a do Passo de S. Simão, por onde pareceu
a Bento Ribeiro que êle iria prosseguir, e a 3. a , a do Passo do
Kosário.
Estando, convencido de que seu adversário continuaria a
marcha pelo Passo de S. Simão, Barbacena podia ir atacá-lo t
trilhando a mesma estrada e surpreenf/endo-o, se possível, na
— 240
momento da travessia do rio Santa Maria, ou obliquando, à esquerda, e vadeando este rio no Passo do Rosário.
*Por que preferiu a segunda solução? Ninguém hoje poderia dizê-lo com absoluta certeza. Todavia, minha conjetura
é que, estando o general brasileiro firmemente convencido de
que Alvear fugia para oeste, portanto no rumo de Alegrete,
entendeu que o único meio de alcançá-lo sem tropeço seria
transpor o Santa Maria mais a montante, seguindo uma estrada mais direita até Alegrete, de modo a arpoá-lo no flanco
esquerdo. Ora, partindo de S. Gabriel, a estrada que melhor
satisfazia a essa condição, era, sem dúvida, a do Passo do Rosário pelo banhado de Inhatium e, por isso, êle a tomou. De
resto, não havia tempo que perder. Bento Ribeiro dera aviso
de que Alvear passaria o Santa Maria a 17, isto é, no mesmu
dia em que tal comunicação o alcançava em S. Gabriel; logo,
urgia abalar pelo caminho mais rápido e sem um minuto de
hesitação.
Esboço „. 22
No dia 18, Barbacena prosseguiu a marcha, atravessou o
referido banhado e deteve-se, para acampar, junto ao arroio do
Salso e do porto de João de Deus (esboço n. 22). No dia 19,
partiu o exército às 5 e ^ j da manhã, sempre pela estrada que
conduz ao Passo do Rosário; às 8 tinha notícia de estar próximo
o inimigo; às 11 e % chegava à estância de Feliciano Duarte e,
uma hora depois, acampava perto da de Manuel Pereira, afastada uma légua do referido passo*(esbôço n. 23). Machado de
Oliveira diz que essa estância era de Francisco José, nome que,
de fato, figura em uma das plantas de Seweloh.
Nossa vanguarda tiroteou com o inimigo durante o dia c
recolheu-se à noite. Participou, informa Machado de Oliveira.
que êle havia sobreestado na passagem do rio e iria oferecer-nos
batalha.
— 241
Vemos assim que, partindo de S. Gabriel, Aívear havia
penetrado no rincão formado pelo Santa Maria e o Caoequí, que
nele se detivera um pouco, arrebanhando quanto podia, e afinal
tomara a deliberação de sair do mesmo pelo Passo do Rosário.
Destarte, enquanto percorria um arco de curva, nós não adiantávamos pela respectiva corda e o surpreendíamos quando tentava
passar um rio, que,-como veremos, estava de nado.
Esboço n. 23
Barbacena ainda a 19 reuniu um conselho de guerra de
generais e comandantes de brigada. Foram todos de opinião
<jue se devia acometer o inimigo em qualquer lugar e disposição
em que fosse'encontrado; que a fadiga na cavalhada nada justificava, pois também deveria existir no partido contrário, e que
a ausência da brigada de Bento Manuel ficava compensada pelo
.talo de ser o terreno favorável à infantaria.
Barbacena resolveu o ataque para o dia seguinte. .
Entrementes, ionde se, encontrava a l. a brigada ligeira?
'Por que não veio participar na peleja do dia 20?
É questão difícil de elucidar, mas em que de novo tocarei
mais tarde.
O momento é azado para nos.ocuparmos da ordem de batalha -e do efetivo dos brasileiros.
Com a chegada de Brown ao acampamento de Palmas, no
dia 5 de fevereiro, o exército de Barbacena sofreu nova modificação, de que resultou esta ordem de batalha no Passo do
Rosário:
— 242 —
l.a Divisão
(General Sebastião Barreto Pereira Pinto)
l.a Brigada de infantaria.
(Cel. Leitão Bandeira)
j a) Batalhão de caçadores n. 3
(Do Rio de Janeiro) — Major J. Crisóstomo da Silva;
è) Batalhão de caçadores n. 4
(Do Rio de Janeiro) — Tenente-coronel Freire de Andrade ;
c) Batalhão de caçadores número 27 (de alemães) —
Major L. M. de Jesus.
l .a Brigada de cavalaria
(Cel. Emídio Calmon
a) 1.° Regimento (do Rio de
Janeiro) — Tenente-coronel
Sousa da Silveira;
b) 24 Regimento de milícias
(Guaranis das Missões) —
Major Severiano de Abreu.
2.a Brigada de cavalaria.
(Cel. Araújo Barreto)
a) Regimento (Rio Grande do
Sul) — Tenente-coronel M.
Barreto Pereira Pinto;
b) Esquadrão de lanceiros (de
alemães) — Cap. vonQuast;
c) 40.° Regimento de milícias
(de Santana do Livramento, também chamado de Lunarejo) — Tenente-coronel
José Rodrigues Barbosa.
2.° Divisão
(General João Crisóstomo Calado)
2.a Brigada de infantaria.
(Cel. Leite Pacheco)
a) Batalhão de caçador número
13.° (da Bahia) —Tenentecoronel Morais Cíd; 6) Batalhão de caçadores número 18.° (de Pernambuco) —
Coronel Lamenha Lins.
— 243— -
3.a Brigada de cavalaria. .,
(Cel. Barbosa Pita)
a) 6.° Regimento (do Rio Grande do Sul) — Major Bernardo Joaquim Correia;
b) Esquadrão da Bahia — Major Pinto Garcez;
c) 20.° Regimento de milícias
(de Porto Alegre) — Coronel J. J. da Silva.
4.a Brigada de cavalaria.
(Gel. Tomás da Silva)
a) 3.° Regimento (de S. Paulo)
— Tenente-coronel Xavier
de Sousa;
b) 5.° Regimento (do Rio Grande do Sul) — Tenente-coronel Felipe Néri de Oliveira.
Corpo de voluntários do Ge, neral Abreu
(Barão do Cerro Largo)
(11 companhias de gaúchos a
cavalo, congregadas por
2.a Brigada ligeira de cavalaria — (Coronel Bento Gonçalves) .
21.° Regimento de milícias (da vila do Rio Grande) —
Major M. Soares da Silva.
39.° Regimento de milícias (da vila do Cerro Largo) —
Tenente-coronel Isas Calderon.
ARTILHARIA
(Coronel Tomé Madeira)
11 bocas de fogo de calibre 6.
1 obus cilíndrico de 6 polegadas.
grupadas e distribuídas desta maneira:
o
ff) 4 baterias de 2 bocas de fogo cada uma (do 1.° corpo
de artilharia montada do Rio de Janeiro, sob o comando do
2.° tenente Mallet, 1.° tenente Português Pereira, capitães Correia Caldas e Lopo Botelho) (associadas à l. a Divisão);
— 244 —
b) -4 peças (do 4.° corpo de artilharia de posição de
Santa Catarina comandadas pelo major Samuel da Paz (associadas à 2. a Divisão).
Segundo o Barão do Rio Branco, escritor sempre escrupuloso e bem informado, o efetivo do exército de Barbacena que
combateu no dia 20 de fevereiro era o seguinte:
Estado-Maior
• infantaria
Cavalaria
Artilharia
25 homens
2.294 "
3.734 "
v
285 "
,
6.338
Alguns deles tinham estes destinos:
a)
Empregados na guarda e /
condução do parque, hos- i
pitai, bagagens e cavalríada •
\
b)
Doentes deixados em São \
Gabriel
(
,
c)
'
d)
„
rresos
Escolta do General
361 homens de cavalaria
68
"
de infantaria
40
"
de artilharia
469
183 homens de cavalaria
83
"
de infantaria
5
"
de artilharia
271
( 4
homens
í
„
o
I
2
— 46 homens
de cavalaria
i .£ . .
de infantaria
de cavalaria.
Donde se infere que estiveram prontos no campo da ação
6.067 homens.
A l. a Brigada ligeira de cavalaria (Bento Manuel Ribeiro)
compunha-se, segundo Osório:
a)
Do regimento de cavalaria n. 22;
b)
Do regimento de cavalaria n. 23;
c)
De paisanos e guerrilhas.
Ao todo 1.100 homens.
V
Alvear põe em movimento o exército argentino — Invasão do Rio Grande do Su '
— Insucesso completo do plano de manobra que êle pretende haver concebido
Antes de levar à batalha as tropas brasileiras, volvamos,
mais uma vez, a atenção para o exército das Províncias Unidas.
Deixamo-lo, no acampamento do Arroio Grande, pronto
para marchar. Pelo que já sabemos, deveria compor-se de argentinos e orientais, sendo que provavelmente aqueles entrariam
em maior número, vista a extensão territorial das província*
unidas comparada à da Cisplatina.
'Qual a sua ordem de batalha e força numérica?
Durante largo tempo reinou grande incerteza com respeito
à última destas questões; os argentinos e orientais preocupavamse com realçar a sua inferioridade numérica no dia da peleja.
o que positivamente não é verdade, como espero mais adianle
patentear ao leitor.
Por enquanto, limito-me a declarar que vou seguir no
cômputo numérico dos argentinos as informações do tenentecoronel Amadeu Baldrich, em seu livro História de Ia Guerra
dei Brasil, a que, mais de uma vez, já fiz referência. Trata-se
de um autor que nos é hostil, a que falta imparcialidade, que
baralha os assuntos para os expor num estilo gongórico, e que
carece das qualidades essenciais no historiador, segundo Frejeiro, mas que declara o seguinte:
"No obstante, después de una laboriosa investigación en los
legajos inéditos, hemos llegado á un resultado que, sin duda
aiguna, es el más exacto que pueda ofrecerse. Con Ias listas
de revista podemos, pues, restablecer aquel organismo complejo
que, en el mes de Diciembre de 1826, muy poços dias antes de
iniciar el General Alvear su admirable marcha estratégica hacia
el enemigo, por Ia linea dei Rio Negro, en vísperas de Ituzaingo,
por consequência, tenía Ia seguinte organización y personal" ( ] ) .
(D
Pág. 200.
— 246 —
Segundo o mesmo Baldrich, eram estes os corpos argentinos
e sua força numérica, tais como resultam do Arquivo Nacional da
República Argentina:
INFANTARIA
Bat. de caç. n. 1. (Cel. Manuel Correia)
Bat. de caç. n. 2 (Cel. Ventura Alegre) . . . . . .
Bat. de caç. n. 3 (Cel. Eugênio Carzón)
Bat. de caç. n. 5 (Cel.
Felix Olazábal) . . . .
452 homens (oficiais e praças)
416
534
"
499
"
1.901
CAVALARIA
Regimento n. 1 (Gel. Frederico Brandsen) .. .
Regimento n. 2 (Cel. José
Maria Paz)
Regimento n. 3 (Cel. Anjel
Pacheco)
/
Regimento n. 4 (Cel. Juan
Gallo Lavalle)
Regimento n. 8 (Cel. Juan
Zufriatégui)
Regimento n. 9 (Cel. D.
Manuel Oribe)
Regimento n. 16 (lanceiros) (Cel. José de
. Olavárria)
Colorados de linha (Cel.
José Maria Vilela) . .
Esquadrão de couraceiros
(Cel. Anacleto Medina)
510 homens
574
"
351
393
"
473
512
415
"
422
"
140
"
3.790
"
— 247 —
ARTILHARIA
Um regimento de artilharia •
ligeira de 2 esquadrões de duas companhias (16 peças) (Coronel Tomás Iriarte)
503 homens
Ou, em resumo:
Infantaria
1.901
"
Cavalaria
3.790
"
Artilharia
503
"
6.194
"
Cumpriria juntar ainda a este número o quartel-generai e,
aduz Baldrich, "un pequeno plantei de injenieros, ai mando dei
comandante Trellé y el parque, maestranza y el personal de Ias
escoltas particulares de Soler, Mannilla y Lavalleja, que, en total,
arrojan un efectivo de un centenar de plazas, entre oficiales,
clases, obreros y soldados".
Os corpos. orientais, segundo Clemente Frejeiro, escritor
escrupuloso e sincero —- eram compostos de milícias da Província Cisplatina e tinham estas denominações ( 2 ) :
Dragões libertadores
Divisão Maldonado
Divisão de Colónia
Divisão de Paysandu
Milícia de Pando
Milícia passiva de Paysandu . .
Milícia de Mercedes e atiradores de San José
(Coronel Servando Gomes).
(Coronel Leonardo Oliveira).
(Coronel Arenas).
(Comte. Rana e Melilla).
(Tenente-coronel Burgueno).
(Comte. Tejera).
(Tenente-coronel Adrian Medina).
Ascendiam ao todo — ajunta o mesmo autor — a mais de
2.000 homens.
Figuravam também entre as milícias da Província, Baltaojeda, vaqueano principal do exército, com uma companhia;
Carnaval e sua partida de vaqueanos, que acompanhavam o general Lavalleja e os capitães Caballero, Benavidez e Fernandez,
chefes de guerrilhas" (3).
(2 e 3)
La batalha de Ituzaingó — pág. 110.
248 —
Tomando por base essas informações, que me parecem a.~
mais fidedignas, chega-se à conclusão de que o exército de Alvear
numerava, seguramente, mais de 8..000 homens. 0 general argentino subdividiu essas massas em três grupos, que denominou
corpos; compôs o primeiro das unidades orientais e agregou-llu^.
como núcleo sólido, o 9.° de cavalaria; e o 2.° e 3.° de. tropas
argentinas e uma fração insignificante de orientais.
Eis a sua ordem de batalha:
COMANDANTE EM CHEFE
General Carlos Maria Alvear
1.° Corpo (La
valleja) . . .
a) Os corpos de milícias orientais;
b) Regimento de cavalaria n. 9.
a)
b)
2.° Corpo (Al- ! c)
vear)
j d)
e)
/)
3-° Corpo (Soler) .'
c)
b)
c)
d)
e)
/)
g)
h)
í)
Regimento de cavalaria n. 1;
Regimento de cavalaria n. 4;
Regimento de cavalaria n. 8;
Regimento de cavalaria n. 16;
Esquadrão de couraceiros;
Milícias da Colónia.
Batalhão de caçadores n. 1;
Batalhão de caçadores n. 2;
Batalhão *de caçadores n. 3;
Batalhão de caçadores n. 5;
Regimento de artilharia ligeira;
Regimento de cavalaria n. 2;
Regimento de cavalaria n. 3;
Milícias de Mercedes;
Parque e mestrança do exército.
No dia 5 de janeiro reuniu-se a essa tropa o general Lúcio
Mansilla, com o regimento de Colorados, Milícias de Pando e
atiradores de S. José. Estas unidades foram incorporadas ao
2.° corpo e Mansilla nomeado chefe de Estado Maior.
Fregeiro informa que o corpo de Lavalleja (1.°) estava fracionado em 4 divisões, comandadas, respectivamente, pelo gene•ral Laguna e coronéis Gomez, Oliveira, Manuel e Inácio
Dribe (4).
(4)
La batalha de Ituzaingó — púg. 111.
— 249
Em seu livro sobre a Guerra do Brasil, declara Baldrich
serem os efeíivos que ele extraiu dos arquivos nacionais, e que
eu reproduzi, os do exército ao abrir das operações; e que, se
levarmos em conta as baixas até o dia da batalha (enfermos,
prisioneiros, guardas das bagagens, destacados no passo, ele.
e t e ) , poder-se-á afirmar que os combatentes no campo da açao
não excediam 7.000. Também declara haver compulsado uns
manuscritos inéditos de Iriarte, donde se deduzem as seguintes
informações sobre o exército nacional, no dia 20 de fevereiro:
1.° Corpo (Lavalleja) . ...
l . a Divisão
2. a Divisão
3. a Divisão.
Laguna.
Manuel Oribe.'
Inácio Oribe.
l . a Divisão Bran- (a) Regimento n. 1;
dseii)
(6) Regimento n. 3.
2.° Corpo Al- 2. a Divisão (La- (a) Regimento n. 4;
vear)
valle)
\b) Colorados;
\c) Esq. de couraceiros.
3. a Divisão (Zufriatégui) . . . .
(a)
\b)
Regimento n. 8;
Regimento n. 16.
i aa rDivisão
v • - (Paz)
Í D \ <í o)( Regimento
6
l.
,n. 2:'.., .
7
TT
(o) Um corpo de milícias.
2 a Divisão (01azábal)
3.° Corpo (Soler)
f o)
1 b)
1 c)
' d)
Batalhão n. 1;
Batalhão n. 2;
Batalhão n. 3 ;
Batalhão n. 5.
«) Vm regimento de artilharia de 16 * peças
-I
(11 canhões ligeiro?
a
3. Divisão (Iri- '
de 4, 2 de 8 e 3 obuarte)
i . ses de 7 polegadas) :
* b) Um esquadrão de mi;
lícias de Mercedes;
c) Parque e mestrança-
250 —
"O parque e impedimento, geral do exército •— ajunta o
sobredito autor — constavam de 120 veículos, muito pesados,
em que se conduziam objetos de hospital, enfermos, feridos e
munições de infantaria e artilharia, de carretilhas (com equipamento, reparos de sobressalente, etc, etc), e de 20 galeras para
o equipamento dos chefes e generais".
Segundo o operoso escritor Clemente Fregeiro, quase todas
as províncias argentinas estavam representadas no exército de
Alvear. "La masa de el se compunia, en buena parte, de hombres tomados a Ia fuerza; y aunque les cuerpos podian considerar-se, en su casi totalidad, no occurria Io. mismo con les. jefes
y les officiales, a excepción de los alfereces. Muchos reformados habian vuelto ai servicio activo, algunos con ascenso; asi
como otros dei antiguo ejército de lps Andes que sucessivamente
fueran llegando dei Peru".
"La.habilidad de jefes y officiales y Ia constância y decisión de todos, hicieran en poços dias de un punado de reclutas
un ejército de veteranos. Los infantes eran negros, viejos soldados en su majoria" (5).
Os recursos materiais dos orientais e argentinos não deviam
ser nem de primeira ordem, nem abundantes, a julgar pelo que
se passava entrenós naquele período.
Eduardo Acevedo Diaz, explana em seu livro Épocas Militares de los Países dei Plata, as dificuldades encontradas no
provimento do exército.
O autor dispunha de um manancial precioso, a saber as
memórias do tenente?coronel António Dias, 2.°' comandante do
batalhão de caçadores n. 5 e de fato seu comandante no Passo
do Rosário, no dia 20 de fevereiro.
Terei de citá-lo dentro em pouco mais de uma vez e nele
me apoiarei de preferencia para reconstituir a batalha do lado
argentino.v Pena é que o Sr. Eduardo Dias não desse outra
organização a seus escritos, apagando-se nalguns lances de modo
bem claro, a fim de que o leitor não tivesse a mínima dúvida
sobre- o que é informação histórica original do avô e lavor
literário do ilustre neto.
"A mas de esto — escreve Diaz — el ejército carecia
absolutamente de zapadores, de equipajes, de puentes ó armazones, de botes para el paso de los rios, de buenos guias pratico?
(5)
La batalha de Ituzaingó — pág. 108.
— 251 —
dei pais invadido, y hasta de planos exatos que pudieran servirle
de auxilio en sus operaciones"
"Adernas de aquella grande falta en el vestuário, todas Ias
tropas dei ejército hicieran Ia campana descalzas. La infantería
habia recebido un par de zapatos por plaza en acampamento dei
Arroyo Grande; pêro de tan mala calidad, que à los ocho dias
de marcha no habia un solo par servible, y toda Ia infantería
quedo descalza; por conseguinte, rara era Ia jornada en que no
resultasen algunos soldados imposibilitados de marchar 'por
efecto de Ias espinas y de Ias piedras agudas en el país quebrado"
"La infantería estaba provista de buenos fusiles; pêro como
tropas ligeras que eran, no tenían cananas á propósito con cinturones, sino fornituras antiguas pendientes dei hombro, que á
mas de ser de mucho embarazo para maniobrar ai paso de
earrera y destruir los cartuchos por su mala contrucción, no
resguardaban bien Ias municiones dei agua, ni dei fuego. Por
encima de todo, aquella tropa no tenia polvorines, tan útilcs
para Ia celeridad de los fuegos y para Ia conservación de Ias
municiones en los atos de guerra"
'"Otra falta de mucha consideratión era Ia de caramanolas
para agua en aquella infantería; falta que en un ejército que ila
á hacer Ia guerra en un clima ardiente y desierto, es superior á
rodo encarecimiento.
u También Ias mochilas que se destinaron á aquelle infantería.
eran poças y malas. . .
Del mismo modo que en Ia infantería, habia defectos d«
trascendencia en el armamento y equipo de Ia caballeria".
Pelo que nos conta Fregeiro, o mais bem armado de todos
os corpos de cavalaria era ó l . ° ; o 3.° dispunha de coraza e sable
largo; o pior armamento estava com as milícias orientais.
Ao contrário do que se deu com Barbacena, Alvear não
formulou um plano de operações antes de assumir o comando
do exército nacional, ou, se o formulou, não o deu à publicidade,
pois que até hoje ninguém fçz a esse documento a mais leve
referência. Durante a marcha para a fronteira do Rio Grande
do Sul, conversou por vezes com alguns de seus subordinados
sobre o plano que estava executando; Brandsen transmitiu-nos
fragmentos dessas conversas. Terminada, porém, a campanha
e vendo-se acusado pelo governo argentino em uma mensagem
que este dirigiu à Sala dos Representantes, publicou em sua
defesa um papel a que deu este título: Exposição que faz o
— 252 —
general. Alvear
para contestar
a mensagem
do governo
de 1-Í
de setembro de 1827. É documento de suma importância e at*'j
imprescindível no estudo da Batalha do Passo do Rosário.
Põe em relevo a necessidade, que o autor sentia, de se defender de graves acusações. Com respeito a seu plano, deparanos este trecho:
"Se se examina atentamente a topografia da Banda Oriental
e a da Capitania Geral de S. Pedro, e se se tem presente a posição
que ocupava a força imperial destinada a defendê-la, conter-se-ão
cinco pontos vulneráveis. 0 primeiro é o Quaraí, por onde
havia entrado antes uma divisão; mas, afora o pedregoso do
caminho e das serras por onde transitou, o país a que conduz
este caminho é um dos mais despovoados do continente. 0 segundo era Santana, onde o inimigo linha seu quartel-general e para
onde se poderia avançar de frente; porém este plano carecia
de destreza e dava ao adversário a grande vantagem de esperai nos intacto, enquanto o movimento que deveríamos fazer para
alcançá-lo, por isso que nos obrigava a atravessar um vasto deserto, ter-nos-ia destruído as cavalhadas, diminuído as forças e
aumentado as privações. Os imperiais mantinham cobertos ali
todos os seus depósitos e fácil lhes seria evílar o combate, passando o caudaloso rio Santa Maria, que lhes ficava na retaguarda e cuja margem direita poderiam defender a despeito de
todos os esforços do exército republicano. O terceiro era a
Coxilha Grande, que se poderia seguir francamente desde a
Banda Oriental. Este caminho oferecia o grande inconveniente
de indicar com sobrada antecipação o ponto do ataque. Por
outro lado, em todas as guerras da monarquia o exército espanhol
e o português haviam seguido a mesma direção, donde a preocupação geral e arraigada de que só por ali poderiam marchar
exércitos regulares, com bagagens, parque e artilharia.
Os dois pontos que vamos indicar eram os únicos que proporcionavam a um general hábil obrar com acerto. Lançar sobre
Santana um corpo volante de tropas para chamar a atenção âo^
imperiais, mantê-los em contínuo alarme, enquanto o grosso do
exército se encaminhava para o Rio Grande por Santa Teresa v
com direção ao norte. El otro plano, que jué el adotado, consistia en achar un cuerpo de caballeria sobre Santana, mientras
Ia masa de Ia tropa subia en rio Negro, maniobrando alternativamente sobre sus dos margenes, segan Io permitiesen Ias circunstancias y los movimientos dei enemigo. Esta maniobra debiu
seguir se hasta Bagé, y alli entrar âla Cuchilha Grande, para
253 —
ponerse en disposición de tomar de flanco todos tos rios dei
continente, que por todas partes presentaban obstáculos"
Reproduzi de propósito em castelhano o trecho principal e
grifei-o para facilitar a meditação do assunto. Alvear apenas
" descreve de modo vago o que praticou durante a invasão. Note
bem o leitor que êle não fala aí por forma clara de bater separadamente os dois núcleos de forças brasileiras (Barbacena e
Brown), como parece ter sido seu intento, conforme provarei
dentro em breve; e não o faz porque todos já estavam no conhecimento de que tal ideia se havia malogrado. No entanto,
se fosse sincero, é por aí que deveria ter começado sem rodeios.
Seus partidários apelam invariavelmente para essa ideia quando
pretendem comparar-lhe a habilidade de estrategista à de Napoleão Bonaparte.
De sua explicação apenas se deduz isto, e foi mais ou menos
o que êle fêz: Subir o rio Negro e manobrar alternativamente
nas duas margens dele. segundo as. circunstâncias e os movimentos do inimigo.
Devo expor agora a marcha do exército nacional com a
minúcia que me fôr possível. Vou utilizar-me, para isso, do
diário de Brandsen, do de capitão Revillo, dos boletins de Alvear
e do livro de Fregeiro.
Alveàr pôs-se em movimento com o 2.° corpo e o 3.° na
direção geral de Bagé e ao longo do rio Negro. Lançou peia
esquerda um destacamento fl.° corpo, Lavalleja) ou antes
(ima flanco-guarda de cavalaria, idêntica à de Barreto pelo
flanco direito* de Barbacena. É o tal cuerpo de cabaUeria
.sobre Santana, a que alude em sua exposição. Pelo flanco direito não tomou nenhuma medida especial, motivo por que terá
<íe esbarrai- com a brigada de Bento Gonçalves. Nessa marcha
para o norte, até Bagé, os meios de informações de Alvear serão
impotentes para lhe ministrar qualquer notícia de valor com
respeito às tropas de Barbacena. 0 exército nacional caminhará
no vazio, sem antenas assaz poderosas e penetrantes para romperem o véu com que Barbacena (por detrás de Barreto) e
Brown (por detrás de Bento Gonçalves) buscarão reunir-se com
segurança.
É problema dificultoso traçar numa "carta o itinerário dos
combatentes.
Como não havia, naquela época, muitos núcleos de população, os pontos de referência dados pelos escritores são estâncuis, passos de rios e outros acidentes topográficos, que, ou não
— 254 —
figuram nos mapas atuais, ou são difíceis de identificar.
Enquanto um oficial ou escritor uruguaio não preencher tão sensível lacuna, valendo-se de seu conhecimento da região, deve
o leitor ser tolerante com os esquemas como os que lhe apresento,
embora depois de haver tomado em consideração as fontes conhecidas e dignas de apreço, inclusive o mapa de Fregeiro.
O 2.° corpo è ó 3.° estavam quase todos reunidos no acampamento do Arroio Grande; os do 1.° (Lavalleja) parece que se
achavam disseminados, quiçá por motivos de cobertura. Segundo
Fregeiro, a divisão de Gomez encontrava-se no passo de Bustillos,
no rio Negro; a de Oliveira em marcha para Santa Luzia; a de
Laguna no passo dos Sauces, no rio Queguai, e a de Inácio Oribe
no Cordovez. A divisão de cavalaria do 2.° corpo, mandada
pelo general Mansilla, estava em Toledo (6).
No dia 26 de dezembro de 1826, Alvear forma as tropas
do 2.° corpo e do 3.° no acampamento do Arroio Grande, e dirige-lhes a palavra, exaltando-lhes o patriotismo. Inicia a marcha
o 2.° corpo (em que vai Brandsen) ; caminha através de campos
abrasados e de aspecto estéril. No dia 27 prossegue a marcha
e vai acampar, sob a chuva, junto ao arroio Porongo. . No dia 28
o 3.° corpo abala do Arroio Grande; o 2.° continua até acampar
no rio Yi, a uma légua do arroio Maciel e a outra de Durazno.
Brandsen toma o comando da 2. a divisão de cavalaria, formada
pelos regimentos ns. 1 (de seu comando) e 8 (Zufriatégui).
No dia 29 chega ao Passo de Durazno, atravessa o rio,e vai
acampar junto ao Texera. No dia 30 remonta o Texera cerca
de 5 léguas e acampa. No dia 31 prossegue até o arroio das
Conchas, afluente do rio Negro, cerca de meia légua da foz.
Nos dias 1, 2 e 3 não se marcha. No dia 3 chegam a l. a e 3. a
divisões do 3.° corpo, depois o-parque e a bagagem do exército.
No dia 4 também não se marcha. Chega a divisão Olazábal.
No dia 5 o grosso de Alvear continua o movimento, passa o rio
Carpinteria e o Negro (nõ passo do Bustillos) e acampa na
margem direita deste. No dia 6 reenceta a marcha até o arroio
Tigre, onde acampa. No dia 7 avança até o arroio Clara,
afluente do Tigre, depois até o Carpinteria. Caminha durante a
noite, com breve repouso. No dia 8 rompe de madrugada e vai
até o arroio Maio. No dia 9 não marcha. No dia 10 continua
o avanço para o arroio Clara. No dia 11 avança de novo e vai,
por uma marcha noturna, até o Tacuarembó, onde acampa. No
(6)
Batalha de Ituzeângâ — paga. 119-120.
— 255 —
dia 12 atravessa o Tacuarembó e estaciona. No dia 13 não se
move. No dia 14 avança ainda. A divisão de Brandsen perde
o regimento n. 8, que é substituído pelo n. 3 (Pacheco). No dia
15 prossegue a marcha.
Brandsen recebe a visita do general Mansilla. "Sufocado
por tudo quanto vê — escreve aquele coronel — Mansilla não
pode resistir a abrir-me seu coração; deplora a ignorância do
general em chefe no que concerne à prática da ciência militar.
Não sabe manobrar, nem acampar, nem prever nada; os cavalos
deperecem a olhos vistos; a tropa está mal cuidada. 0 general
em chefe, apesar de sua nenhuma experiência, só consulta a sua
vontade e o seu capricho. Confunde todos os ramos de serviço,
paralisa o talento e a experiência, e compromete a cada passo
a existência do exercito e do país. 0 general Soler pensa da
mesma forma. Reconheço em meu coração a justiça desses
conceitos".
No dia 16 novo avanço. A fadiga invade os cavalos.
"Esta jornada — diz Brandsen —' parece ser o último suspiro da cavalhada do exército". No dia 17 continua o avanço.
Novas queixas de Mansilla, o qual refere a Brandsen correrem
mil anedotas escandalosas sobre as "imprudências, imoralidades
e falta de valor" de Alvear. No dia 18 parece que não se
marcha. No dia 19 há movimento, ao menos para o 3.° corpo
(Soler). No dia 20 prepara-se o Passo do Mazangano, por onde
toda a tropa se desloca para a margem direita do rio Negro.
Convém lembrar ao leitor que, neste mesmo dia, Barbacena. estacionava à beira da Lagoa Formosa, entre Santana e o rio Santa
Maria.
É de toda a.vantagem, para maior clareza do assunto,
ocuparmo-nos agora de Lavalleja (1.° corpo). Seguimos até
aqui o que se poderia chamar a marcha do grosso de Alvear
(2.° corpo e 3.°), com as incertezas inerentes à imperfeição dos
documentos. Já referi que o general argentino fêz de Lavalleja
um destacamento de segurança pelo seu flanco esquerdo. ^Por
onde se encaminhou êle?
Escudado no depoimento de Joaquim Revillo, publicado na
Revista Histórica de Montevidéu, ousei esboçar.o itinerário do
que se poderia chamar o grosso de Lavalleja. Durante a marcha,
lançava este general reconhecimentos e destacamentos de descoberta, para colher novas do inimigo, cujos movimentos seria
difícil acompanhar de perto, mas que o leitor deve ter presentes.
Segundo Revillo, Lavalleja ordenou a convergência de todos 03
— 256
?cus corpos para o passo de Bustillos, e daí partiu no desempenho de sua missão no dia 3 de janeiro, portanto 3 dias antes
de Alvear, já tendo expedido na frente, para o arroio Maio, o
regimento de Dragões (coronel Servando Gomez) e a divisão
Laguna. No dia 4 avançou até o Achar, onde acampou. No
dia 5 foi estanciar à margem do arroio Maio, com as unidades
«jue o haviam precedido. No dia 6 lançou para a frente o regimento de Dragões, e.foi acampar junto ao arroio de Ciam.
No dia 7 e 8 não se mexeu. No dia 9, avançou até o passo
dó Cerro do Cardoso no Tacuarembó-Grande, transpôs o rio <;
acampou do outro lado. Nesse dia, refere Joaquim Revillo, o
corpo de Lavalleja numerava 2.300 homens. O coronel Servando Gomez estava na frente, em serviço de exploração. Mandouse-lhe um esquadrão de reforço. Lavalleja marchou na noite
de 10. e a 11 permaneceu junto ao arroio Jaguarí. Aí recebeu
notícia de haver Servando" tomado alguns prisioneiros. Ês!e
oficial também se ocupava de arrebanhar gado vaccum e cavalar.
No dia 12 remontou de noite o Tacuarembó. No dia 13 chegaram
os 26 prisioneiros ,do coronel Servando. Pouco depois recebia
Lavalleja uma informação deste oficial, em que ele comunicava
ter sabido de um morador que uma. força inimiga de 800 homens
lhe vinha em cima. Lavalleja respondeu que continuasse vigilante e se lhe fosse juntar na barra do Cunaperú, para onde se
deu pressa em avançar. No dia 14 permaneceu perto da referida barra. Viram-se bombeiros (espias) inimigos na costa do
Jaguarí e aprisionou-se um deles. À noite chegou a força ilo
coronel Servando Gomez. Lavalleja abalou, sem perder tempo,
no rumo da foz do Carpinteria de Jaguarí, e estacionou a dua^
léguas desse ponto. No dia 15 avançou até à beira do rio
Jaguarí, que atravessou no dia seguinte (16), trasladando-se
para a margem esquerda, depois de haver recebido notícia, de
suas avançadas, de que uma coluna inimiga parecia dirigir-se ao
local ocupado pelo 1.° corpo. Esses inimigos que reagiam contra
Lavalleja pertenciam provavelmente ao destacameno de Barreto,
que Barbacena havia expedido desde a noite de 14. No dia 17
continuou a marcha; enviaram-se patrulhas de exploração.
Mandou-se uma partida ao Cerro Chato, onde se suspeitava
a existência de espias inimigos. Na noite de 18 para 19.
Lavalleja moveu-se e foi amanhecer na margem do arroio Hospital, onde repousou no dia 19. Na noite de 19 para 20, pós->cem marcha e foi surgir, ao romper do dia, no arroio S. Luis.
-
257
-
Soube por dois prisioneiros que o inimigo estava em los
Curales (^arroio?) ese dirigia contra êle Lavalleja. As patrulhas mandadas para o ver nada descobriram. Continuou até o
Pira!, junto do qual acampou.
No dia 20 permaneceu em estação. A exploração em todos
os sentidos nada colheu do adversário.
Cumpre salientar que nesse dia (20) Alvear estava com o
grosso de seu exército à margem esquerda do rio Negro, perto
do Passo de Mazangano, e Barbacena à margem da Lagoa Formosa. Assim como até aquele instante Barbacena nada soubera
de importância com relação a Alvear, também este quase tudo
ignorava com respeito àquele. O véu distendido pela cavalaria
fora eficaz em ambos os partidos. Em todo o caso, note o leitor,
examinando o esquema junto a este livro, que se Alvear e Lavalleja operassem com energia a partir daí, no rumo do norte, conseguiriam atravessar-se na frente do adversário acima de Bagé.
Mas o ardimento e a celeridade exigidos pela operação não eram
.apanágio de nenhum desses chefes e, por isso, a oportunidade
se lhes vai escapar^ como veremos em pouco.
Continuemos a narrativa da marcha dos argentinos e
uruguaios.
No dia 21, segundo Brandsen, o general Alvear participou
a seus chefes de divisão ter sabido que Bento Gonçalves se aproximava com uma divisão numerosa e a resolução em que estava
ííe ir acampar na planície.
Não se esqueça o leitor de que Alvear se encontra agora
impossibilitado de ter o auxílio imediato de Lavalleja, pois que
n deixou èm marcha do outro lado do rio Negro.
iQue é que o teria levado a transpor o rio?
Supunha que Barbacena estava na margem direita, tanto que
aí conservara o 1.° corpo. Logo, se veio ocupar a esquerda, é
porque intentava atacar nesta margem o adversário, talvez emterreno mais favorável.
"O general republicano — lê-se no boletim n. 3 — para
não perder a vantagem de manobrar pelo flanco esquerdo do
inimigo e, levando sempre adiante seu projeto de interceptar-lhe
a comunicação com o Rio Grande e ocupar Bagé, repassou o rio
Negro com o 2.° corpo e o 3.° na tarde de 20, colocando-se em
sua margem esquerda".
Agora está relativamente claro o pensamento de Alvear:
interceptar a comunicação de Barbacena e Browii.
— 258 —
Mas aparece á ideia de ocupar Bagé e a frase, até certo
ponto enigmática, de manobrar pelo flanco esquerdo do inimigo.
<i Estaria já esse inimigo a sudoeste para facultar-lhe taí
manobra?
No dia 22 continua o avanço; há um alarma em marcha por
se haver avistado a duas léguas um grupo de adversários.
No dia 23 prossegue o movimento. "O general em' chefe
nos anuncia — escreve Brandsen — que o exército inimigo,
saído de Santana, está em marcha sobre nós. Alegria causada
pela notícia. Alvear, sempre ansioso por exibir seus conhecimentos estratégicos (sublinha Brandsen) diz-nos que, caso o
adversário transponha o rio Negro, ele pensa dirigir-se sobre
.Taguarão, volver atrás e dar batalha nas magníficas planuras da
margem esquerda, que estava'pisando".
Não pode haver maior documento da ignorância em que se
encontrava Alvear relativamente às tropas de Barbacena. Julgava-o em marcha contra êíe, ao passo que o chefe~brasileiro
repousava à beira do Santa Maria, no Passo de D. Pedrito.
No dia 23 reinou alarma no grosso de Alvear. Supunha-se
o inimigo tão próximo, que tudo parecia denunciar-lhe o aparecimen'o; ouviram-se estrondos ao longe. "Pretendem muitos —
refere Brandsen — que são descargas de mosquetaria e artilharia; que Lavalleja foi atacado e acossado ao rio. Sustento a
opinião contrária: que o ruído é de trovão e que Lavalleja é
demasiado ativo para se deixar surpreender, com 2.500 cavalos,
por infantaria e artilharia. 0 sucesso confirma minhas ideias.
Hesitação do general em chefe; manda chamar Oribe, ordena
que o n. 8 ensilhe; suspende o movimento das divisões. Por fim
declara-se o temporal; desaparecem evidentemente todas as dúvidas e o corpo de exército acampa nas margens do rio Negro".
Nesse mesmo dia há conferência com o general em chefe.
"Êle deplora — narra Brandsen — a necessidade de subordinar
suas operações militares ao estado dos cavalos; manifesta-nos a
situação do general Lavalleja, que considera naquele intante
comprometido e exposto a ver-se atacado pelo inimigo inteiro, o
qual, acrescenta, baixou desde Santana até o Hospital (na altura
de Aceguá, desde a margem direita) de onde regressou para
Bagé, ocupado pelo general Lavalleja, com o ânimo de atacá-lo.
Este general perdeu o fruto de sua expedição com ocupar Bagé,
após a retirada de todas as famílias. O general Soler, que já
deyia ter-se reunido com seu corpo de exército, está ainda a duas.
— 259 —
léguas daqui. Nesse estado de cousas, o general em chefe resolve-se a não abandonar a atual posição e a esperar o inimigo".
"Proponho apoiar a retirada de Lavalleja, que se supõe ser
perigosa, com uma divisão do 2.° corpo. A opinião é rebatida
com o fundamento de que, já estando exposta a vanguarda, seria
duplo erro expor mais uma divisão, argumento que não me convence, pois, se a vanguarda está, com efeito, exposta, pode-se
^ibertá-la apoiando-a em tempo; e, se não o está, a marcha da
divisão não oferece outro inconveniente senão o de conservar a
tropa a cavalo".
"Ninguém abraça a minha opinião. Decide-se esperar Lavalleja, porém mover o 2.° corpo na direção de Soler, para ficar
em condições de apoiá-lo se estivesse sendo atacado".
Toda essa confidência de Brandsen tem inestimável valor;'
sublinha o perigo a que Alvear deixara exposto Lavalleja interpondo entre as duas frações do exército nacional um curso de
água como o rio Negro, na crença (aliás errada) de que o inimigo iria cair em massa sobre seu loco-tenente. Felizmente
para ambos, Barbacena estava ainda longe e o adversário que
descera de Santana para o Hospital era apenas a flanco-guarda
de Barreto. A insuficiência do serviço de exploração criava o
estado de dúvidas e inquietações em que se debatia o general
argentino.
Deixamos Lavalleja à beira do Piraí. Acompanhemo-lo de
novo por instantes.
Na noite de 20 para 21, êle levanta acampamento e sobe
a coxilha entre o Piraí e o rio Negro, onde permanece, diz
Revillo, con el caballo de Ia rienda, por ignorarse el paradero
de los enemigos. Havendo suspeitas de que estes se tivessem
recolhido a Bagé, para lá se envia de madrugada uma partida
de reconhecimento a qual volta comunicando não haver novidade.
Lavalleja regressa então à margem do Piraí (dia 21), para um
ponto duas léguas abaixo do que antes havia ocupado. A tarde
CMUVC copiosamente. 0 temporal e a obscuridade não lhe p ^
miíem caminhar durante a noite. No dia 22 um prisioneiro
tomado em Bagé diz constar-lhe (lê-se em Revillo) que a coluna
inimiga se encontrava nas ilhetas do Guaviju, pontas do Hospital,
e Bento Gonçalves no Guaviju, da outra parte do rio Negro, com
ordem de reunir-se à coluna".
Todos esses informes têm visos de realidade-e devera referir-se às forças de Barreto e Bento Gonçalves,-no momento ora
que buscavam congregar-se.
- 260 -
Em vista disso, Lavalleja abala até o Passo do.Lemos, no
rio Negro, "para cortar a Bento Gonçalves" ou "por-se em contacto com Alvear", caso fosse alacado pelo chefe brasileiro.
Na noite de 22 para 23 transporta-se para a coxilha, onde
se demora até o alvorecer. Avança depois e acampa, às 11
horas de 23, na fralda da serra de Bagé. Daí vai ao povoado,
. à frente de um esquadrão. Bagé estava deserta; só se encontrou
nela um português que cuidava de um carregamento de farinha.
Lavalleja regressa e põe-se em movimento com sua divisão para
o Passo do Valente, "em razão — diz Revillo — de ter-se avistado na tarde anterior uma coluna inimiga, formada, segundo
informes dos moradores, por Bento Gonçalves e pela brigada de
Barrero, que seguiam para se reunir ao exército". No dia 24
Lavalleja permanece no dito passo.' À tarde chega Alvear.
Ambos vão a Bagé e de noite estão de regresso nos respectivos
acampamentos. Como no dia 24 o 2.° corpo não se move, e só
a 25 se dirige ao Passo do Valente, que alcança às 7 e % , já
noite fechada, e como de seu último pouso ao dito passo há
apenas duas léguas, creio que é somente com pequena escolta,
que Alvear se encaminha, no dia 24, ao encontro de Lavalleja
no já mencionado Passo do Valente.
No dia 26 o mesmo-Alvear ocupa a povoação de Bagé com
a infantaria, enquanto a cavalaria e a artilharia acampam nos
arredores. No dia 27 não marcha e parece que apenas toma
medidas de segurança imediata.
"O saque faz-se geral — reflete Brandsen compungido —
tanto na povoação, como na campanha, para eterna desonra do
general e do exércitOj mas sobretudo do primeiro, em cujas mãos
estava evitá-lo".
Desde 26 que Lavalleja tomara posição duas léguas ao norte
de Bagé, na costa do Piraí, constituindo-se em vanguarda de
Alvear. Choveu torrencialmente a 26; a 27 e 28 continuou o
mau tempo. No dia 29 Lavalleja avançou em direçãp às pontas
do Camacuan. Os dias 30 e 31 de janeiro, e 1.° e 2 de fevereiro empregou-os em rastrear o inimigo e arrebanhar animais
nos arredores. Apesar dè alguns tiroteios com a retaguarda dos
imperiais, soube apenas que Barbacena se internara pelo
Camacuan.
Até essa data, isto é, de 26, a 30 de janeiro ^que fazia
Alvear imobilizado em Bagé, enquanto o adversário lhe cruzava
na frente em busca de Brown e de terreno favorável?
— 261
Nada, absolutamente nada! O inimigo desaparecia encoberto num véu de incertezas. Alvear, porém, crê que êle já
está todo reunido e em marcha; a 31 leva o fato ao conhecimento
de Brandsen, e prevê uma batalha para o dia seguinte (1.° de
fevereiro). No entanto, no dia 30 não se corre de dizer em
boletim (n. 3) a suas tropas:
"O general inimigo, depois de haver andado em marchas
e contramarchas por falsas direçÕes, buscando o exército da Re-
pública, encontra-se, hoje, por fim, a oito léguas de distância.. .
A habilidade das manobras do exército republicano o, honra
tanto, quanto desfavorece militarmente as do general inimigo".
O leitor, que possui agora os documentos, pode aquilatar
da ousadia, e pretensão do general Alvear! Avança contra os
grupos do adversário com o intuito de os separar, nada consegue
e fica paralisado sem saber *b que estão fazendo. Supõe que
já se encontram reunidos, quando eles ainda permanecem distantes. Cuida que lhe vêem ao encontro, enquanto só os preocupa
nesse momento o desejo de se reunirem. E nada obstante, ousa
proclamar a habilidade das manobras do exército republicano!
De sua inação em Bagé,' deu tempos mais tarde esta explicação:
"Na verdade, nada era mais urgente do que atacar o marquês de Barbacena, quando ainda se não havia reunido a Brown.
Às 11 horas do dia 26, todo o exército republicano se encontrava
era Bagé. Dirigiu-se imediatamente a vanguarda para o Pirai,
com o objetivo de obrigar à retirada a cavalaria de Barreto, que
inundava a margem- esquerda daquele arroio. Todas as medidas estavam tomadas para que- o exército se pusesse eni marcha
às 4 da manhã de 27. Porém às dez da noite dá véspera
desabou horrível tormenta, que inutilizou toda combinação.
A chuva descia em torrentes e continuou com singular tenacidade
até às 5 da manhã de 30. Era extrema a impaciência do general
em chefe, mas tanto os outros generais, como o coronel de artilharia e comandante do parque, manifestaram àquele general,
nas três vezes que quis pôr-se em movimento, a impossibilidade
de realizá-lo. Na verdade, as quebradas e arroios mais humildes
estavam de nado, o terreno impraticável, e, por fatalidade, o
temporal, que tinha sido furioso nas imediações de Bagé, fora
leve no espaço em que transitava o exército inimigo. Tinha este
de mais a vantagem de vir seguindo uma coxilha direita, que o
— 262 —
levava :t tomar a serra de Camacuan. 0 temporal foi a sua
salvação" ( 7 ) .
No dia 31, todo o exército se desloca para o ponto do
antigo Forte de Santa Tecla e aí estaciona. Lavalleja deve
estar na frente buscando contacto com os inimigos. No dia 1.°
de fevereiro o mesmo exército avança 4 ou 5 léguas, até uma
estância, perto do arroio Iratacuá ( ? ) . Alvear supõe que Barbacena se dirige ao Passo dos Enforcados, no Camacuan-Cbi<;o
(Boletim argentino n. 4, de 11 de fevereiro). No" mesmo documento se declara que os argentinos acamparam nas pontas do
Camacuan. "Temporal furioso, diz Srandsen; chove e. troveja
toda a noite". No dia 2 creio que não se marcha, a julgar pelo
diário de Brandsen; mas o boletim n. 4 afirma qile os republicanos se internaram na serra em perseguição dos contrários.
Continua o aguaceiro. No dia 3 Jirandsen tem uma explicação
pessoal com Alvear, que o ^hama à sua presença. Desfazem-se
as intrigas entre os dois. Logo depois ocorre o mesmo com
Pacheco., "acusado de hav<;r atribuído a inaçao do general em
chefe ao encontro de uma nina bonita, que ficoii enferma na
casa em que se havia apeado o mesmo general". Brandsen e
Lavalle tomam a resolução de ajudar a Alvear, quaisquer que
sejam seus planos, apesar de decidida repugnância que êle inspira a alguns camaradas. Às 11 horas desse dia (3) o exército
avança, descreve Braiuàieu, seguindo o adversário, cujo rastro,
na direção do Rio Grande e Porto Alegre, se encontra a duas
léguas do iratacuá, no caminho real.. .Vai acampar nas pontas
do Camacuan.
" 0 inimigo — pondera Brandsen — logrou seu ofrjetivo e
está envçomunicação dire!a e perfeitamente livre com as.divisões
que espera e que estão marchando do Rio Grande e Porto Alegre.
Acerca-se o momento decisivo".
^
Note o leitor que Brandsen afirma isso a 3. quando só a
5 tal reunião se efetuou.
No dia 4 Brandsen recebe a visita de Garzón, com quem
troca ideias sobre a discórdia que começa a lavrar no exército.
"Nossa posição, de fato — escreve êle -— sem ter nada de
alarmante, é crítica, arriscada e requer de todos união e os mais
eficazes esforços. 0 inimigo vê-se na necessidade de ceder ao
clamor geral e de proteger o país invadido, após haver obrigado
a população a abandonar os lares. Concentradas suas forças.
(7)
Exposição — págs. 49 i; :i(!.
— 263 —
ninguém duvida de que tomará por seu turno a ofensiva. A sorte
de ambos os países depende de uma batalha. Os portugueses
não podem evitá-la sem incorrer na execração dos povos, e o
general inimigo, salvo se tiver instruções em contrário, sem se
expor a morrer na forca. Dentro de oito a 10-dias, a província
do Rio Grande do Sul, será livre ou subjugada, a Banda Oriental
salva ou perdida, e a República constituída ou desmantelada, e
reduzida a humilhar seu orgulho e sua existência à lei do
vencedor".
"Nestas ciicunstâncias parece prudente desistir-se de seguir
o inimigo, que o estado de nossas cavalhadas não nos permite
alcançar, escolker nosso campo de batalha, procurar remontar
a cavalaria e aguardar o adversário. Toda esperança de retirada seria ridícula. É preciso vencer ou morrer".
As frases grifadas caracterizam as opiniões de Brandsen.
das quais, sem dúvida participavam os chefes do valor dele.
Nesse mesmo dia 4, Alvear reuniu primeiro um conselho
privado de generais e depois outro, geral, em que tomaram parte
os coronéis. Brandsen relata o que se passou no segundo. Alvear
expõe as operações até ali e diz que a consequência da ocupação
militar do país abandonado, da tomadia de seus recursos e da
remonta da cavalaria "será provavelmente obrigar o exército
brasileiro a ceder ao clamor de seus habitantes ou à confiança
que deve ter em si, após a incorporação da divisão do Rio
Grande, saindo das foríes posições que elegeu, e vindo apresentar-lhes batalha em um campo-já por eles escolhido e favorável ao desenvolvimento de sua numerosa cavalaria, que é a
principal força do exército republicano".
Só Brandsen quebra o silêncio subsequente, perguntando se
está perdida toda a esperança de se impedir a reunião das forças
de Barbacena. Ante a resposta afirmativa, aplaude a determinação de "desistir, por ahora, de todo plan de persecutíón hasta
depues de remontada Ia caballeria y-de occupar el território
enemigo".
Foi sem dúvida nesse conselho privado de generais que se
assentou a seguinte resolução, firmada no mesmo dia:
"Os generais abaixo assinados, tendo sido reunidos em junta
de guerra pelo Sr. General em Chefe, declaram, depois de haver
ouvido o que expôs S. Excia., que as marchas e manobras executadas pelo exército foram as mais hábeis e acertadas, e merecem a aprovação dos que abaixo firmam; que a demora do
exército em Bagé foi indispensável e necessária, pois não poderia
— 264 —
ter-se movido em vista do estado intransitável dos caminhos e
quebradas, como consequência das chuvas; que em vista da
posição escabrosa ocupada na Serra peio inimigo e da inferioridade de nossa infantaria, atendendo igualmente ao estado das
cavalhadas do exército, são de opinião que se não ataque o
adversário e se manobre para tomar as pontas do Santa Maria.
Quartel General na Serra de Camacuan, 4 de fevereiro
de 1827 — Miguel Soler — Juàn António Lavalleja — Lúcio
Mansilia — Julian Laguna" (8).
Compreendendo a importância do insucesso, que lhe abalava
a reputação, apressou-se Alvear em cobrir-se para o futuro com
a opinião dos subordinados.
No dia 4, marcha-se pouco, creio que pela Coxilha Grande.
No dia 5 continua a marcha por cima da dita coxilha e pelo
caminho real, até as pontas do Tacuarembó, em cuja margem
se acampa.
No dia.6 Lavalleja avança pelo Jaguarí abaixo e recebe
comunicação de Alvear de que vai cruzar com o exército no
passo real de Jaguarí, com rumo a S. Gabriel, e que o 1.° corpo
lhe deverá servir de retaguarda.
Disse há pouco que Lavalleja estava na frente de Alvear:
agora, com esta ordem, ficamos sabendo que, enquanto o comandante em chefe desfila para o norte, o 1.° corpo o cobrirá
pela retaguarda, interpondo-se entre o exército nacional e o de
Barbacena. No dia 7 os dois grupos — grosso e retaguarda —
estavam à vista e Lavalleja em comunicação direta com Alvear.
0 grosso argentino, que tinha a 6 passado o Tacuarembó,
chega ao meio dia de 7 ao arroio Jaguarí, em cuja margem
bivaca. No dia 8 desce pela margem esquerda desse arroio,
transpõe-no e vai acampar nas fraldas do Cerro de Batoví. No
dia 9 há um alarma infundado e preparativos de combate.
O suposto inimigo reduz-se ao corpo de Lavalleja, que-se aproxima e reúne ao grosso. 0 exército avança parq. o norte atf1
o Vacacaí. "Todo dpaís é magnífico, escreve Brandsen; o mato
exala perfumes". No dia 10 prossegue o avanço. O general
em chefe vai reconhecer S. Gabriel., O diário de Brandsen
fecha no dia 11, com a indicação de movimentos sem importância. É neste mesmo dia, à 1 hora da madrugada, que a tropa
brasileira, volve sobre seus passos ao encontro dos inimigos.
(8)
Exposição — pág. 16.
— 265 -
O diário de Revillo vai mais longe e permite-nos acompanhar a marcha da retaguarda; para a do grosso temos o boletim
argentino n. 5.
No dia 13, Lavalleja entra em S. Gabriel e acampa junto
à vila; aí permanece, por ordem superior, nos dias 14 e 15.
^A 16, recebe ordem de Alvear para lhe ir ao encontro num
ponto afastado dez léguas, a que se havia retirado.
<SQue fizera o general em chefe de 12 a 17 vde fevereiro?
^Caminhara para o norte, penetrando no triângulo formado
pelo Cacequí e o Santa Maria? •
Eis certos pormenores dessa marcha, segundo o boletim
n. 5: A 12 estava no Vacacaí e daí partiu para S. Gabriel, em
cujas imediações estacionou; a 13 não se moveu; na noite de
13 para 14 tomou o caminho da Coxilha Grande e acampou
junto ao cemitério; a 14 mudou de direção, e pendendo à direita,
caminhou toda a noite; às 8 da manhã tomou posição junto ao
Jacaré; a 15 abandonou o Jacaré e na tarde de 16 chegou a
Cacequí. Neste dia, segundo Alvear afirma na Exposição, enquanto Barbacena entrava em S. Gabriel, seu exército encontrava-se cinco léguas curtas mais ao norte.
Ignoramos, o que é lacuna sensibilíssima, as minudências
da exploração dos coronéis Bento Manuel Ribeiro e Benta Gonçalves contra Alvear. Barbacena dizia a 11 de fevereiro que
os tinha expedido sobre os flancos do adversário. O que é fora
de dúvida é que Bento Manuel operou no flanco direito de
Alvear; suas partidas o molestaram de tal forma, que êle se viu
forçado a reagir com toda a energia. Daí os combates de
Vacacaí e Umbu (13 e 15 de fevereiro).
No primeiro, dizem os argentinos que Lavalle se lançou
com seu regimento contra a brigada de Bento Manuel Ribeiro
e a derrotou.
A tradição entre nós, confirmada por Osório, é diferente.
Bento Manuel tinha uma vanguarda sob -o comando do major
Gabriel Gomes Lisboa, de que fazia parte o tenente Marcelino
Ferreira do Amaral. Este tenente, à frente de 70 homens, surpreendeu um destacamento argentino de 100, junto ao rio Vacacaí, matando-lhe dois oficiais e 20 soldados. Como, porém,
acudisse Lavalle com muita força, o tenente Marcelino retirou
e foi juntar-se à coluna de Bento Manuel, tendo perdido apenas
dois mortos e três feridos.
Com intuito de livrar-se de vez de Bento Manuel Ribeiro,
organizou um destacamento sob ,as ordens do general
— 266
Mansilla e composto, segundo o boletim h.'5, de 300 lanceiros
do regimento n. 8 (Zufriatégui), 200 do 16.° (Olavárria), 100
do 1.° (comandante Cortinas), 100 do 2.° (capitão San Martin
e capitão Albarracin) e dos couraceiros de Medina.
O leitor deve lembrar-se ter sido no dia 15 de fevereiro
que Bento Manuel escreveu a Barbacena avisando-o, dos campos
do coronel Carneiro, de que Alvear ia passar o Santa Maria no
passo de São Simão e de que, êle Bento Manuel, se dirigiria
ao Passo do Umbu. É, pois, natural supor que Mansilla o
atacasse, como atacou, no mesmo dia 15, quando êle se encontrava em marcha para o sobredito passo. Também é possível
que o fizesse antes, determinando a partida mais acelerada de
Bento Manuel naquele rumo. O que é fora de dúvida é que,
atacado com energia, o chefe brasileiro cruzou o Ibicur, no sobredito passo, cobrindo-se antes dele, na Sanga Funda, com três
esquadrões; ao mando do major Gomes Lisboa, que afinal se lhe
juntaram. Perdemos um oficial e 20 praças. Mansilla não
pôde passar o rio. •
Daí, informa Osório, Bento Manuel dirigiu-se ao rio Jaguarí, donde voltou ao Ibicuí; a 19 de fevereiro estava no Passo
de Santa Vitória.
A reação de Mansilla contra Bento Manuel teve influência
capital, como verificaremos, no desenlace da batalha do Passo
<lo Rosário, e merece os mais francos encómios.
Tornemos aos movimentos de Alvear.
"No dia 17 — lê-se em Revillo — receberam-se partes rlc
que a coluna (inimiga) parara em Vacacaí, passara de S. Gabriel
e que seguia com o rumo do Passo do Rosário no Santa Maria.
Mandou-se aviso da ocorrência ao general; às duas da tarde
chegou nova informação de que os inimigos continuavam a
marcha no mesmo rumo e se encontravam a duas léguas de
nosso campo. Então o Sr. General Lavalleja foi em pessoa falar
ao general em chefe e convidá-lo a continuar a marcha até Santo
Maria, para evitar que o inimigo nos ganhasse a retaguarda".
No di 17 ou, o mais tardar, na manha de 18, soube, por
conseguinte, Alvear que o exército brasileiro se encaminhava an
Passo do Rosário.
'No entanto disse na Exposição:
"No dia 18 os imperiais avançaram duas léguas e fizeram
alto. Às 10 da manhã tomaram uma direçao que podia conduzi-los ao Cacequí ou ao passo do Rosário de Santa Maria".
— 267
O leitor'* já sabe que isso não exprime a verdade. Desde
17 que a retaguarda de Alvear afirmara que Barbacena ia no
rumo do dito passo. Por outro lado, já expliquei que, no dia
18, êle atravessou o banhado de Inhatim. ^Como, pois, ousa
o general inimigo levantar essa dúvida? *Nao tinha confiança
nos informes de Lavalleja?
Nos dias 17 e 18 Alvear não se moveu. *Por que?
Explicou seu-procedimento, neste dia, do seguinte modo:
"O exército republicano esteve pronto para marchar todo
o dia 18; mas, havendo o imperial feito alto na hora que' se
disse, não quis aquele mover-se. O inimigo distava sete léguas
do Passo do Rosário; os republicanos cinco, tendo que andar
duas menos que aquele (para chegar ao passo) as circunstâncias
eram críticas; aproximava-se o momento de obrar. 0 general
republicano, usando do cálculo das probabilidades (!!) viu que
era preciso marchar durante a noite de 18, porque se êle o não
fizesse, e o fizesse o inimigo, caía aquele nos mesmos laços que
pretendia armar a este" (9).
E foi em virtude desse cálculo das probabilidades que
Alvear se pôs em movimento às 4 horas e meia da tarde de 18,
caminhou toda a noite e às 4 da manhã de 19 fêz um alto de
duas horas perto das quebradas do campo em que se bateu no
dia 20 (10). Saiu da margem do Cacequí deixando tudo quanto
podia empecer-lhe a marcha,cinclusive "os objetos que não eram
absolutamente necessários e facilmente transportáveis por cada
indivíduo".
"Ao dar essa ordem —; escreve D. Francisco Muniz, então
cirurgiao-mor do exército argentino — disse Alvear que se ganhássemos teríamos tudo e se perdêssemos tudo nos sobraria" (11).
Na verdade, êle perdeu o material abandonado, como havemos de ver, não só porque não regressou pelo Passo de Cacequí,
mas porque tudo caiu em mão de Barbacena, quando cruzou em
retirada pelo referido passo.
Enquanto êle praticava essa marcha noturna, Barbacena estava parado à beira do Salso, donde rompia às 5 e % do dia 19.
Na manhã deste dia, como era natural em consequência do terreno e da proximidade em que se encontravam, os dois exércitos
(9)
(10)
(Jl>
Exposição — pág. 55. A frase entre imrênteses é minha — T. F.
Memórias, do Coronel António Dias.
Vida e escritos do Coronel D. Francisco Muniz — pág. 305.
— 268 —
avistaram-se. "O do inimigo — lê-se no Boletim n. õ — Vinha
na mesma direção que o da República".
- Barbacena caminhou, como disse, até às-12 e % e pousou
junto à estância de Francisco José, a 18 klms. do Passo do
Rosário e 9k,6 do ponto de cruzamento das estradas Caoequí
Passo do Rosário e Passo do Rosário S. Gabriel.
Depois do alto, Alvear prosseguiu até o passo, aonde chegou
às 11 horas da manha.
"Desde o instante — informa o comandante António Diaz
— em que se descobriu o terreno imediato ao passo, viu-se o
risco que o exército corria naquela posição, sem dúvida à pior
que se pode imaginar para uma batalha, particularmente com um
exército de cavalaria, que era' a arma que primava.
Era um banhado, de largura de uma milha ou mais, naquele
ponto, situado entre o rio e uma alta cadeia de colinas quase
paralelas a seu curso e que dominavam a planície formadora do
banhado. 0 solo deste era arenoso, coberto de macegas e espadanas com numerosas e pequenas proeminências de terra, e tudo
constituía outros tantos obstáculos à manobra da cavalaria.
0 exército fizera, pois, alto no banhado, abandonando as
imihências.
0 inimigo oncontrava-ae à hora e meia de jornada; era indispensável deliberar e resolver com prontidão, porque, se êle
continuasse a marcha, estaria dentro em pouco ao alcance de
tiro de peça, ocupando as colinas, e o exército republicano verse-ia acometido de repente e talvez impossibilitado de contramarchar a uma posição adequada para inutilizar todos os recursos
da arte e todos os esforços do valor.
0 general em chefe deu ordem imediata para a passagem
do rio, mas até as picadas estavam de nado, e, se bem que a
artilharia pudesse passar puxada com as prolongas (conforme
propôs o coronel daquele corpo), e a cavalaria nadando, nem a
infantaria, nem o parque poderiam fazê-lo. Um esquadrão de
couraceiros atravessou o rio a nado, e à tarde regressou do
mesmo modo" (12),.
Às 4 da tarde Alvear reuniu um conselho de guerra. "Manifesta-nos — relata o coronel Angelo Pacheco — a sua intenção
de volver na noite desse mesmo dia sobre o inimigo. Dá-nos
ordem de arrojar todo o equipamento dos oficiais e da tropa, e
faz-nòs passíveis de morte se distrairmos um só soldado
(12)
Épocas Militares — paga. 340 e 341.
269
em assunto particular. Sua linguagem foi decidida, porém
áspera" (13).
"Em consequência disso •— continua António Diaz — tornaram-se todas as medidas preparatórias da batalha. Nessas criticas circunstâncias, vários dos corpos de cavalaria de linha, e à
frente deles o coronel Lavalle, conceberam o diabólico projeto
de depor o general Alvear e, reunidos para esse fim, propuseram
ao general Lavalleja que se encarregasse do comando do exército.
Este general era um dos que mais criticavam a conduta do chefe
argentino e, talvez se houvesse resolvido a aceitar tão perigosa
honra, se o coronel Oribe não o tivesse aconselhado a não cometer
semelhante imprudência, fazendo-lhe ver que a consequência
inevitável seria a ruína do exército naquele momento, bem como
a de seu crédito, além de que o plano dos revolucionários era
pô-lo à frente da tropa momentaneamente, a fim de poderem
contar com o 1.° corpo que êle mandava, e passar depois a chefia
a Soler.
Prevendo-se a batalha, deram-se às tropas divisas brancas
para o braço esquerdo.
Por um artigo da ordem geral, todos os chefes ficavam prevenidos de que só deveriam receber ordens do General Alvear,
sendo que aos ajudantes encarregados de as transmitir caberia
apresentarem um papel escrito e firmado pelo punho do mesmo
general" (14).
Às 6 da tarde ou, como diz o coronel Pacheco, ao pôr do'
sol, o exército contramarchou pela mesma estrada que havia
trilhado de manha, "deixando o parque, o hospital e todas as
viaturas (equipajes) na costa do rio. Ia na frente, informa
aquele coronel, o 1.° corpo (Lavalleja), depois a infantaria, os
regimentos ns. 8 e 16 (divisão Zufriatégui) e a seguir o resto
da tropa.
ÀAte onde marchou? i ^Quem.hoje poderia sabê-lo! ? Certo
é que ficou entre o Passo e o campo de batalha do dia seguinte.
"Às onze horas da noite — revela-nos o comandante António
Diaz — acampamos entre uns cerritos e umas sangas profundas
que os dividiam, mais ou menos a uma milha do caminho de
(13)
(14)
Diário de Campanha.
Épocas Militares — pág. 343.
— 270 —
Cacequíao Passo do Rosário, que corria quase paralelamente
à frente de nossa posição. Não havia sido possível reconhecer
o inimigo no escuro da noite.
"Foi sem dúvida por causa dessa obscuridade — acrescenta
adiante — que alguns corpos não puderam acampar com a regularidade habitual, do que resultou aparecerem, na manhã de
20, várias divisões orientais situadas diante da infantaria do 3.°
corpo e à retaguarda deste algumas peças de artilharia".
Ressalta destes informes que o bivaque ficou a uma milha
da"estrada e, provavelmente ao norte dela. Mas ía que distância
do campo de batalha?
Não pude descobri-lo, porém acredito não fosse longe, em
vista do tempo gasto na contramarchá e do que nos refere António
Diaz. A opinião deste oficial é que, se Barbacena tivesse sabido,
na. manhã de 20, estar tão próximo o adversário "em-terreno
desigual e difícil para desenvolver-se" e se houvesse tomado, com
sua infantaria, as alturas que o dominavam "dificilmente esse
mesmo adversário teria.logrado desenvolver-se e ir ocupar melhor
posição sob os fogos do contendor". "Porém o erro ou a inadvertência do chefe da vanguarda brasileira — pondera Diaz —
deu-nos tempo para sair daquele mau lance".
VI
A batalha
Vejamos o que se passava, entretanto, no exército de Barbacena.
Deixamo-lo repousando, no dia 19 de fevereiro, junto à
estância de Francisco José. No dia 20, às duas horas da manhã,
prosseguiu a marcha pela mesma estrada. Depois da vanguarda,
constituída pelos voluntários de Abreu e pela 2. a brigada de
Bento Gonçalves, seguiam-se a 2. a divisão (Calado), a artilharia
(Madeira) e a l. a divisão (Barreto). A cavalaria levava a
dextra os cavalos de reserva (1).
Ao alvorecer, apresentaram-se ao general em chefe dois
homens, que tinham sido obrigados pelo inimigo a acompanhá-lo,
mas que haviam podido.fugir do seu acampamento (2). Informaram que o adversário deixara a margem do Santa Maria, aí
depositando o trem pesado, ambulâncias e cavalhada inservível,
e passara a noite na coxilha em frente ao Passo.
"Às 6 horas da manha — escreve Barbacena — deu parte
a vanguarda de estar o inimigo postado nos montes vizinhos do
Passo do Rosário, e mandando mudar os cavalos imediatamente,
segundo o costume do país, avancei com o marechal Brown a
reconhecer o campo; fácil me foi avaliar a força inimiga, porque
estavam postados em duas linhas, com numerosa reserva, além
de muitos esquadrões que destacaram para ocupar as montanhas
distantes, as quais ficavam à direita e à esquerda do exército.
Unanimemente assentamos que, não obstante a superioridade numérica do inimigo, um ataque imediato e vigoroso, durante o entusiasmo de nossa tropa, poderia decidir da batalha e,
quando fôssemos infelizes, havia retirada segura para o Cacequí
e montanhas da capela de Santa Maria" (3).
O terreno em que se encontravam os adversários, e onde
afinal se ia travar a peleja, é formado por um grupo de coxilhas,
(1) Pela parte do Ajudante General (Soare3 de Andréa) a vanguarda rompera ao sair da lua e o grosso à uma da madrugada.
(2) Machado de Oliveira — Recordações Históricas — pág. 539.
(3) Carta de Barbacena ao General Cunha Matos, de 2 àe março de 1829.
— 272 —
que se sucedem dentro do ângulo delimitado pelo Santa Maria
e o Imbaé, seu afluente da margem direita, e que fenecem nas
proximidades destes cursos de água, dando lugar a algumas
zonas planas. Logo à leste do Passo do Rosário, no rio Santa
Maria, há uma região extensa dessa natureza; cruzam-na duas
estradas, uma para S. Simão e outra para leste; esta última
divide-se mais adiante em duas outras, das quais a mais setentrional leva a S. Gabriel e foi provavelmente deslocada para o
terreno elevado no intuito de se evitarem os banhados; por ela
avançou Barbacena.
Várias sangas, isto é, calhas naturais, formadas pelo encontro de fraldas de coxilhas, colctam na estação chuvosa as águas
que por elas deslizam e lhes dão escoamento imediato ou reprepor elas deslizam e lhes dão escoamento imediato ou represamsam-nas durante algum tempo.
Saindo do Passo pela estrada atual, o viandante percorra
primeiro a várzea, ascende depois a uma primeira coxilha, desce
a sanga do Branquilho, percorre uma segunda coxilha (do Olho
de Água), passa a sanga do Barro Negro (prolongamento da do
Areal) e galga a seguir a terceira coxilha.
Da coxilha do Olho de Água desprende-se uma garupa grande na direção do sul e outras menores na de leste; e pelo vale
ou calha, que separa aquela de uma destas, desce a estrada para
S. Gabriel.
Todo o terreno apresenta a feição geral da campanha do
Rio Grande: ondulações mais ou menos suaves'se escalonam em
todos os sentidos, tapizadas de relva, dando ao observador que
as contempla pela primeira vez, a sensação estranha, posta em
relevo por um geógrafo distinto, de um mar de vagas gigantescas
e roladas, que mãos poderosas houvessem de súbito imobilizado
numa misteriosa solidificação.
A sanga que dividia os combatentes, não constituía obstáculo
de grande valor como pode parecer a primeira vista, pelo menos
no trecho em que se operou o recontro. Quando a visitei cm
1911, sendo comandante do 8.° regimento de cavalaria em Uruguaiana, surpreendeu-me verificar não ser um acidente topográfico merecedor da importância que os argentinos costumam emprestar-lhe; não só dava passagem livre, mas estava completamente seca.
Em seu relatório sobre o levantamento da planta do campo
de batalha, disse o 1.° tenente Carlos Alberto Bastos, chefe da
turma que o eíetuou:
Passo da barca no Rio Santa Maria, junto à vila do Rosário
273
"As cabeceiras mais altas da sanga atingem a cota de 140m.,
donde deslizando céleres, rasgam suas águas, nas fraldas das
coxilhas, sulcos de cerca de 2 metros de largura por 1,50 a 2m.
de profundidade.
Atingindo a várzea, reunem-se as diversas cabeceiras e constituem uma única sanga, que se prolonga rumo norte-sul, suavizando, à proporção que avança, o aspecto de seus barrancos
marginais, ora deprimindo-as, ora dando-lhes uma inclinação
sensível, facilitando assim a passagem em qualquer ponto. Ao
atingir a estrada de S. Gabriel, ela se apresenta inteiramente
demudada. Seu leito arenoso perde a homogeneidade do curso
superior, mostrando-nos então uma sucessão de pequenas lagoas
mais ou menos profundas ligadas entre si por filetes de água
que aliás se interrompem mal se acentua a estiagem. E assim,
oompletamente deprimida, ela avança irresoluta pela várzea, e.
já com o nome de Sanga do Barro Negro, corta o caminho que
da estrada de S. Gabriel vai ao passo do Cacequí, banha o sopé
da coxilha onde se acha o monumento do general José de Abreu,
« ruma ao arroio Ituzaigo, sem todavia lograr alcançá-lo, pois.
como que esgotada, desaparece na várzea.
0 Sr. Avelino Dias Medina, proprietário da estância do Itu.
onde se acha o campo de batalha, me, afirmou que a sanga de
que tratamos muito se tem modificado desde 1888, ano em que
êle ali. se estabeleceu. Naquela época ela mal lograva alcançar
a estrada de S. Gabriel, constituindo o terreno por onde hoje
traça o seu curso, daquele ponto para baixo, um banhado caracterizado unicamente no inverno.
0 solo na várzea, como no leito da sanga, é firme; não há
tremedais.
Em síntese: a sanga de que me ocupo, apesar de caracteriv.ar-se em suas cabeceiras por barrancos íngremes e mais ou
menos profundos, não constitui no seu curso pela várzea um
obstáculo aceitável como capaz de prejudicar os movimentos de
uma força em ação. Somente para o trânsito de viaturas exige
um ligeiro trabalho prévio".
No capítulo anterior deixamos o exército argentino estacionado, na noite de 19 para 20 de fevereiro, perto do campo de
batalha.
"Ao amanhecer de 20 — escreve António Dia/ — uma
avançada do 1.° corpo descobriu o exército imperial, que, à
distância de pouco mais de meia légua do republicano, marchava
•em direção ao Passo do Rosário, na crença de que iria encontrar
— 274 —
parte deste exército na margem direita e parte na esquerda do
Santa Maria".
"Às cinco da manhã — acrescenta mais adiante o mesmo
oficial — o 1.° corpo, ao mando do General Lavalleja, que já
tinha mudado de cavalos, e o 5.° batalhão de caçadores (4) receberam ordem de sair ao encontro do inimigo, transpondo as
alturas intermédias por uma aberta que facilitava a passagem
das colunas".
"O General Alvear marchou com o dito batalhão e determinou-lhe que formasse e se mantivesse em uma coxilha de elevação média num terreno assaz dobrado, e em cuja frente existia
uma sanga ou canhada seca, que dividia as posições de um e de
outro exército".
"As divisões orientais formaram em linha na mesma coxilha,
à direita do 5.° batalhão, e à esquerda deste formou a divisão,
também oriental, do General Laguna, em campo mais baixo e um
pouco mais acidentado".
Dispositivo inicial da vanguarda argentina (segundo
António Dia2)
1
Em vista da resolução que havia tomado, ordenou Barbacena o desdobramento de sua força. As unidades sairam da
coluna de marcha pelo flanco direito e foram tomar posição na
referida coxilha.
Determinou-se à 2. a Brigada ligeira (Bento Gonçalves) que
se fosse postar à direita e nos cobrisse o flanco por esse lado.
Da leitura de alguns documentos brasileiros, ressalta a impressão de que os nossos estavam convencidos, no primeiro
instante, de enfrentarem apenas parte do exército de Alvear, ou
de que os inimigos se apresentavam numa frente muito mais
estreita do que aquela que de fato ocuparam mais tarde., Brown
conta que os brasileiros marcharam para o ataque em duas
linhas: na l. a , a l. a Divisão (Barreto) e na 2. a , a 2. a (Calado).
(4) António Diaz, era o 2° chefe do 5.° e parece ter sido seu comandante
(sfelivo no dia da' batalha, pois que o coronel Olazábal exercia o cargo de comandante
geral da infantaria e no (Ha 20 estava enfermo em uma carreta, conforme se lê no
livro Épocas Militares, págs. 381-382 — T. F.
Estância do Rosário
(Antiga estância de António Francisco Ferreira)
275 —
Mas, devendo o engajamento, em vista disso, fazer-se pela divisão
da retaguarda de rtossa coluna de marcha, necessitou esta percorrer um grande trecho de terreno antes de conseguir postar-se
em frente a seu setor de ataque, isto é, à posição balisada pela
vanguarda dos contrários.
(Abreu)
Bento Goncalves)
2 Divisao
(Calado)
flrtifhczria
(• Ma.de/ra)
1*Divisao
(Barreto)
Comboio
Desdobramento da coluna de marcha dos brasileiros
Coluna de marcha dos
brasileiros
Destarte, enquanto a l . a divisão se destacava para levar o
a-aque em primeira linha, a 2. a , protegida num flanco por Abreu,
deslocava-se muito menos, ficando, segundo informação de
Brown, com o flanco esquerdo quase apoiado à estrada de S.
Gabriel ao Passo do Rosário.
Calado-explica, em sua parte, que Barbacena, no primeiro
momento, lhe ordenara fosse colocar-se com a l . a divisão' numa
colina distante 1.800 passos do ponto em que êle se detivera
— 276
na marcha, mas que, quando o Quartel Mestre-General o guiava
para lá, foi-lhe ordenado em caminho formar'mais unido à divisão de Barreto. Durante a execução deste movimento, lobrigou-o
de longe Alvear e quis atacá-lo em marcha.
Marcha de aproximação dos brasileiros
Eis como António Diaz descreve este incidente:
"Às seis e meia da manhã, enquanto os corpos do exército
iam chegando aos postos que deviam ocupar na linha, o General
Alvear achava-se, com seus ajudantes de ordens, em uma pequena
elevação na retaguarda, .entre o 1.° corpo e o 5.° batalhão de
caçadores, em observação aos movimentos do inimigo. Na ocasião em que as tropas da ala esquerda deste marchavam apressadamente pelo flanco direito para se unir ao centro, de que se
encontravam afastadas obra de um terço de légua, o mesmo
general dirigiu-se a galope largo para o 1.° corpo, onde estava
Lavalleja, e deu-lhe ordem pessoalmente de carregar contra as
tropas inimigas que lhe ficavam em frende, enquanto executavam
a sobredita evolução de flanco, ajuntando em voz alta que a carga
nesse momento poderia assegurar o bom êxito da jornada.
Lavalleja respondeu que estava pronto para carregar, porém
que seria bom darem-lhe uma reserva na previsão do que pudesse
suceder".
Chegando ao alto da coxilha fronteira à posição inimiga,
começaram os brasileiros a sentir os efeitos da artilharia adversa.
Barreto ou antes Brown (pois parece ter sido este quem de faio
dirigiu os movimentos da l . a divisão), deixou sua artilharia em
lugar adequado, guardada por uma companhia de caçadores, r.
avançou com a coluna de ataque neste dispositivo; em primeiro
escalão as duas-brigadas de cavalaria, e em segundo a l. a . bri-
— 277 —
gada. de infantaria (coronel Leitão Bandeira). A direção do
ataque frontal era a de um perpendicular ao centro da posição
inimiga (5). Apoiava-o a artilharia da divisão, a um de cujos
Dispositivo provável dos argentinos antes da chegada do grosso da infantaria
e da artilharia
tiros, logo no começo da batalha, atribuem os argentinos a morte,
por decapitação, de Besares, 2.° comandante do regimento n.
2 (Paz).
0 5.° Batalhão inimigo já havia desenvolvido atiradores
(volíeadores) em. sua frente e elementos de cavalaria tinham
transposto a sanga, marchando sobre a l. a Divisão (6). Brown
enviou contra estes últimos a 2. a brigada de cavalaria (4.° regimento de Lunarejo e esquadrão de lanceiros) (7), que os repeliu
e lançou do outro lado da sanga, obrigando os volteadores do 5.°
a abandonarem esse trecho do terreno e a retirarem-se para o
lado de seu corpo. Barreto declara em sua parte que ao' regimento de Lunarejo coube a glória de ser o primeiro a medir-se
com o inimigo.
À cavalaria segue a infantaria da Divisão, que avança, pela
frente desembaraçada, atravessa a sanga, e,,num ímpeto irresistível, busca ascender pela fralda da coxilha, disposta a assaltar
a posição do contendor. Segue-a, nesse movimento, a referida
2. a brigada de cavalaria (8).
(5) Parte de Brown.
(6) Informações do autor anónimo das Contribuições para a História da
Guerra entre o Brasil e Buenos Aires — pág. 230.
(7) Parte de Brown e informações do autor das Contribuições para a História da Guerra entre o Brasil e Buenos Aires — pág. 230.
(8) O autor anónimo das Contribuições diz que toda a nossa cavalaria
passou para o lado oposto da sanga. A planta de Seweloh só indica a 2.a brigada,
o que é confirmado pelo comandante Diaz. As partes brasileiras não são claras
a respeito.
— 278
"Debaixo desse fogo (da1 artilharia brasileira) escreve
António Diaz — três batalhões de infantaria, com três regimentos de cavalaria e dois canhões, empreenderam o ataque de
/." DIVISÃO' GENfftAL 8fiRR£T0
Formação na segunda posição
27
Jf
J
- lumu-ejo
lane "'
Formação na ierceira posição
nosso centro; aqueles passaram, a sanga que dividia os dois
exércitos, ficando a artilharia dó lado oposto; prontamente se
empenhou a açao entre os volteadores do 5-° e os do baiaihão 27.°
de alemães ao serviço do Império".
N
•Nessa' conjuntura, o general argentino lança contra a l . a
Divisão, para deter-lhe a marcha, a cavalaria de Laguna, que se
encontrava, como vimos, à esquerda do 5.° Batalhão, e que sr
move em carga contra a nossa 2. a brigada de cavalaria.
"Os corpos de cavalaria do general Laguna — prossegue
Diaz — carregaram denodadamente a cavalaria inimiga, que
ocupava a ala direita da infantaria imperial; porém, tendo forças
muito inferiores àquelas, foram rechaçadas com perdas de alguns
mortos e feridos, entre estes o coronel Leonardo Oliveira, e
deixaram prisioneiro o capitão Pedro' de Melilla, com vários homens de tropa. Ao mesmo tempo morreram um capitão e diversos soldados volteadores do 5.°, ficando outros feridos pe.íos
fogos do batalhão 27.° do inimigo, sendo necessário reforçar
aqueles com os carabineiros do mesmo 5.°. Todavia, nossa
cavalaria do centro renovou prestesmente o ataque e deu repetidas cargas, sustentando a açãò com valor e fortuna vária".
— 279 —
Em seu Diário de Campanha, o tenente-coronel Angelo Pacheco, comandante do 3,° regimento de cavalaria argentina, confirma o bom êxito de nossa primeira investida nestas frases
curtas e palpitantes de verdade:
"Carrega a Divisão Laguna contra o inimigo e é rechaçada
três vezes, com bastantes perdas." Nesse momento, ó batalhão 5.°
e as guerrilhas retrocediam com alguma confusão" (9).
Baldrich*não é menos expressivo:
"Esse ataque prematuro e, sobretudo, muito mal preparado,
sem o apoio oportuno e enérgico que reclamava, foi repelido,
comprometendo em seu princípio o êxito da batalha" (10).
Diante das cargas da cavalaria argentina, e'natural que
nossa coluna de ataque, desenvolvida em linha já do outro lado
da sanga e na encosta da coxilha, hesitasse um instante no avanço
e tomasse medidas momentâneas de defesa, enquanto a cavalaria
contra atacava a do partido oposto. Diaz, comandante do 5.°
Batalhão, corpo que nós de preferência acometíamos, descreve
à maravilha esse período da açao:
"Até esse momento — diz êle — as tropas do centro brasileiro marchavam de frente, ao parecer com a decisão franca de
varrer de suas posições as tropas que se lhes opunham; porém,
à vista das que o exército republicano ia desenvolvendo em sua
frente, toda essa divisão imperial do centro deteve a marcha naquele ponto, mantendo-se largo tempo na ofensiva, reforçando os
caçadores de sua esquerda, dando e repelindo cargas de cavalaria
sem resultado notável nem de uma, nem de outra parte".
"Entrementes, nossa artilharia chegava à posição que
ocupou cm uma colina, pondo ali quatro baterias e os batalhões
ris. 2 e 3 num flanco e o 1.° a alguma distância do outro, porém
na mesma linha".
Pelo testemunho de Diaz, o grosso da infantaria e da artilharia argentina só entrou em ação depois de desencadeado o
ataque da l . a Divisão brasileira e quando, pelo menos, a maior
parle das tropas desta unidade já se encontravam do outro lado
da sanga.
Prossegue o mesmo autor:
"Do local que ocupavam, podiam nossas baterias alcançar
com a metralha a cavalaria e dois batalhões inimigos; como,
porém, estivesse em frente delas toda a cavalaria de Laguna,
(9)
Revista Rcnascimiento — 1910.
(10)
Guerra dei Brasil — pág. 37(>.
— 280 —
demoraram as peças cerca de meia hora para laborar, pois foi
esse o tempo que a dita cavalaria gastou em separar-se, já por
causa dos acidentes do terreno, já pela necessidade de repelir,
durante as evoluções, um corpo de lanceiros alemães".
"Logo que a frente ficou livre, romperam fogo a um tempo
as 16 peças de que constavam as nossas seçoes, causando ao inimigo perdas de consideração, com impunidade, porque nossa artilharia e os batalhões que a custodiavam encontravam-se fora
do alcance da fuzilaria dos imperiais. Aqueles corpos conservaram-se assim até o fim da batalha,' sem ter durante ela,1 nem
depois, um só morto ou ferido".
Brown confirma tudo isso em sua parte, pois salienta ter a
Divisão Barreto sofrido, na marcha de aproximação, vivíssimo '
fogo de artilharia e infantaria. De outro lado, Machado de
Oliveira escreve: "Imediatamente que foi reconhecido pelo inimigo o verdadeiro fim que queria atingir a ala direita do exército (a l. a Divisão) na inversão que deu ao seu primeiro movimento, fêz contra êle jogar toda a sua artilharia" (11)Sigamos um pouco mais a interessante narrativa de António
Diaz:
"Não obstante os danos que nossa artilharia, servida com
atividade e acerto, causava ao centro e a direita da divisão brasileira, esta manteve-se largo espaço, sob a ação do fogo, até
que depois das doze toda sua infantaria e cavalaria marchou de
frente, com a intenção dé atacar-nos as baterias".
Machado de Oliveira corrobora esta disposição dos brasileiros, pois escreve:
'Enquanto essas cavalarias se -entrechocavam, acutilando-se
reciprocamente, posto que a do inimigo cedesse terreno e a vantagem da refrega fosse da nossa parte, a infantaria da ala, que
já não tinha ante si a cavalaria que a acometera, perseverando em
sua primordial tentativa, avançava contra a artilharia inimiga,
que nunca cessou de a metralhar com lastimoso efeito; e, quando
já se achava à curta distância dela, foi acometida de improviso
pelo corpo de couraceiros,que confiado em sua armadura, e não
vacilando em arrostar a forma maciça que logo tomou a infantaria, resistiu às incessantes descargas que esta lhe fazia, e a
grande impulso arremessou-se às suas baionetas. A esforçada
firmeza e sangue frio com que a infantaria susteve esta vigorosa
carga deu em resultado que esse corpo retrocedesse, depois de
(11)
Recordações
Históricas — pág. 548.
Commissão da Carta. Geral do Brasil
Escala
Horjzonfsl = 1-3oooo
verNcat
=• 1 ; 6.000
Fotografia
de um plano em relevo do campo de batalha feito pela Comissão da Carla Geral do Brasil
POSIÇÃO DOS ARGENTINOS
(Vista do sul da posição brasileira)
—282-
ciar prisioneiro o-seu'comandante MeliJla e de ser posta fora
de combate grande parte de sua força; e, se bem que por êsí<modo desentravada se'viu a infantaria para que prosseguisse em
sua primeira tentativa, foi compelida a renunciá-la pelo devei
de entrar na formatura anterior, visto que rompendo-se a linha
-esquerda do inimigo, que tinha sido levada de vencida até a sua
primeira posição, com toda a sua reserva e outras forças que
ainda se não tinham engajado seriamente em fogo, dava ela
indícios' de dispor novo ataque por esse lado e convinha por isso
«por-lhe a mesma vigorosa resistência, que já havia sofrido e de
que se não escarmentara" (12).
Em vista do malogro da Divisão Laguna e da atitude dosbrasileiros da l. a Divisão, compreendeu Alvear a iminência e
grandeza do perigo que o ameaçava se não entravasse com celeridade o movimento de Barreto e, por isso, fêz um apelo às suas
melhores tropas montadas para» o paralisar.
Martiniano Chilavert, comandante da bateria da vanguarda
segundo alguns, apreciou esse instante, subsequente ao desasíre
de Laguna, com os seguintes conceitos:
" 0 momento era crítico, era um dos que se apresentam na
guerra e em qu« necessitamos dispender os maiores esforços <•
sacrificar-nos para vencer, senão para não ser vencidos. Parte
de nossa artilharia e infantaria ainda não havia chegado ao
campo de batalha, marchava por um desfiladeiro. A intenção
manifesta do inimigo era apoderar-se das elevadas posições que
o exército republicano devia ocupar. Se o conseguisse, este último seria roto pelo centro e sua sorte ficaria, portanto, comprometida. Este ponto era o decisivo. Tornara-sé indispensável
fazer-se nele um esforço concentrado com o máximo de força?.
Eis o ^motivo por que o general em chefe aplicou no referido
ponto todas as que teve em suas mãos" (13).
0 primeiro corpo de que se socorreu Alvear foi o 1.° regimento, do comando do coronel Frederico de Brandsen, que com
o 3.° (tenente'-coronel Pacheco) formava a 2. a divisão.
Sentindo a ameaça da carga, Leitão Bandeira ordenou que
seus três batalhões formassem quadrado e esperou, sereno e resoluto, o choque dos inimigos.
Alvear deu a ordem de ataque diretamente ao coronel
Brandsen. Parece que este oficial, vendo a formação dos hm112) • Recordações Históricas —- paga, 547-548.
{13) História da Confederação' Argentina — Saldias.
f
i
;
POSIÇÃO BRASILEIRA
(Vista <Ja coxilha do Olho de Agua)
284
sileiros em quadrado, ponderou ser mais promissora de êxito
uma carga por esquadrões sucessivos do que em linha, como
desejava o general em chefe.
"A esta observação — comenta Diaz — feita com a sagacidade do soldado de escola, Alvear, que já estava irritado com
outras análogas de Lavalleja, o qual lhe pedira uma reserva
antes de carregar contra a cavalaria de Abreu (14), acabou de
exasperar-se e replicou a Brandsen: "se tem medo, carregarei".
— Medo não, revidou o Coronel com energia..
E, dando a voz de carga, arrancou na frente â rédea solta.
Com ele partiu por sua vez o general em chefe, no flanco do
primeiro escalão.
Correndo para a morte, que o espreitava à borda da sanga,
Brandsen disse a Alvear que deplorava vê-lo num posto-que êh
Brandsen julgava ocupar dignamente.
A carga de Brandsen, por escalões, dirigiu-se, pois, contra
a infantaria de Leitão Bandeira. Pacheco, que estava com seu
regimento em linha perto dele, Brandsen, e foi de tudo testemunha ocular, escreveu em seu Diário:
"Carrega o primeiro esquadrão e volta perseguido pela cavalaria inimiga; carrega o segundo, com seu coronel e parte do
terceiro; chega até as baionetas, é repelido e desvia-se para a
direita perseguindo a cavalaria inimiga, que já estava em confusão. 0 coronel recebe, no peito, ferida mortal; morre enraivecido, porém excitando seus homens à carga com estas palavras:
Carreguem, canalhas!!" (15).
Segundo Diaz, Brandsen desprendeu-se ern carga pela esquerda do 5.° batalhão, de cujo flanco ^seus esquadrões passaram afastados cerca de 30 a 40 metros.
Não foi a sanga, como muitos acreditam, que ocasionou A
morte de Brandsen, mas um tiro de fuzil. O malogro de sua
carga resultou primeiro da energia e serenidade de nossos infantes, e depois da referida sanga, que talvez houvesse dificultado
o escoamento dos cavaleiros após a refrega.
Segundo Pacheco, depois de Brandsen, o coronel Paz
também carrega ínfrutuosamente contra nossa infantaria, ã testa
de seu regimento (o n. 2 ) .
"O coronel Paz — diz êle — recebe ordem de carregar
sobre a infantaria inimiga que mantém as posições. Fá-lo e é
1.14) Deve ser Calado — T.,F.
(15) Renascimiento.
_ 285 —
rechaçado. Escoa-se para a direita, reorganiza seu regimento e
carrega contra uma cavalaria que se lhe apresenta em frente,
golpeia-a de lança, porém é repelido pela infantaria. 0 general
aí mesmo o suspende do emprego e o censura.
A suspensão foi justificada com o fundamento de que Paz
comprometia a vitória, porque poderiam empreender um novo
ataque" (16).
Apesar de todas estas vitórias de nossa parte, a Divisão
Barreto retirou para a primeira posição que havia ocupado, ,
provavelmente acossada pelos contrários, que viam, nesse movimento, uma demonstração evidente de desânimo.
Segundo Diaz, -desceram a coxilha para nos agredir o 1.°,2.° e 3.° batalhões de caçadores; a cavalaria do coronel Leonardo
Oliveira também atacou a nossa.
íQuem deu.essa ordem de retirada? ^Brown ou Barbacena?
iEm qúe momento?
A fim de lhe compreendermos a causa determinante, desviemos o olhar para outro ponto do campo de batalha.
Dissemos que a brigada de Bento Gonçalves havia sido
destacada logo no começo da ação para o flanco direito, onde
se estabeleceu a umas 200 braças (440 metros) à direita da
l. a Divisão (17).
Quando Brown preparava o ataque desta unidade, notou-se
que o flanco esquerdo do inimigo se desenvolvia cada vez mais,
o que parecia denunciar um ataque con*ra o flanco direito brasileiro. Em vista disso, Barbacena mandou ordem a Calado
para que destacasse a sua 3. a brigada de cavalaria (6.° regido) Renascimiento — Sem embargo, alguns autores afirmam que Paz carregou contra Calado, o que não me parece admissível, não só pela posição que
seu regimento ocupava na frente argentina, mas porque Martiniano Chilavert
declara que êle se lançou contra três batalhões, e Calado só tinha dois. Três
batalhões existiam apenas na Divisão Barreto. Eis as palavras de Chilavert, eseritas tempos depois:
"O general Paz não esteve nunca no flanco direito do exército; ocupou o
flanco direito do centro, e foi ali que encontrou os três batalhões de infantaria
e alguns piquetes de cavaleiros, que começavam a reorganizar-se em uma canhada
coberta de espesso pajotuã. O general Paz (então comandante do 2.°) empreendeu
a carga com eles. Percebendo o movimento, o general Alvear mandou o tenentecoronel Martinez Fontes, oficial de Estado-Maior, com ordem para que Paz não
carregasse. Quando este oficial chegou, já os três primeiros esquadrões haviam
eido repelidos com a perda de alguns oficiais e praças". (História da Confederação
Argentina, por Saldias).
.
,
Resta, acredito, apenas uma dúvida: saber se esta carga se realizou quando
a
a l. Divisão estava além da sanga ou quando do lado de cá e já em retirada.
(17) Informação do tenente-coronel Aniônio Elisiário de Miranda e Brito,
Quartel Mestre General de Barbacena, em um manuscrito existente no Arquivo
do Barão do Rio Branco.
286
mento, 20.° regimento de milícias e esquadrão da Bahia), a fim
de proteger o flanco direito da l. a Divisão. Não possuo nenhum
esclarecimento sobre os feitos desta brigada; sei apenas que Barbacena elogiou a atitude do 20.° regimento, talvez pelo papel que
desempenhou junto à 2. a brigada e antes de mover-se para a
direita (18).
Disse linhas atrás que a Divisão Lavalle, ao chegar ao
campo de batalha, tomara posição à esquerda de Laguna, ou na
extrema.esquerda argentina. Danei, ajudante daquele general,
relata em sua autobiografia que seu chefe, impaciente por entrar
na refrega, pedira ordens por intermédio dele ao general Alvear.
•Logo que as recebeu, .acometeu-nos pelo flanco direito da l. a
Divisão; desbaratando a cavalaria que encontrou na sua frente.
A tradição corrente é que êle se chocou com a brigada de Bento
Gonçalves.
"A 2. a brigada ligeira — lê-se nas Recordações Históricas
— que, como já se disse, tomou posição no ponto que correspondia ao flanco esquerdo do inimigo, e fora do alcance de sua
artilharia, ali jazeu em inaçao, e sem que, por si ou por ordem
superior, tomasse parte no combate em que se empenhara a ala
direita do exército; e, quando pela segunda vez foi o inimigo
rechaçado por aquele lado recolhendo-se à sua linha, partiu
desta uma coluna de cavalaria coni direçao à Brigada, a qual
sem esperá-la, se desalojou de sua posição, retrocedendo para
a retaguarda da linha do exército; e nesse movimento desmembrou-se-lhe metade de sua força, que, tendo à sua testa o tenentecoronel Calderón, se dirigiu a muitas léguas para o interior da
Província" (19).
Esta é a versão de Machado de Oliveira. No entanto,
Barbacena elogia o proceder de Bento Gonçalves, em sua parte
da batalha, embora estigmatize a de Calderón. Miranda e Brito
menciona Bento Gonçalves como um dos que nos protegeram na
/
retirada, prova cabal de que não abandonou o campo.
(18) Carta de Cunha Maios, de 25 de fevereiro de 1827.
(19) 0 procedimeno do lenente-coronel Bonifácio Isás Calderón'não deve
surpreender-nos; era um oriental ao serviço do Brasil e que seus compatriotas
haviam julgado severamente, conforme se vê do documento abaixo, publicado pelo
ajudante José Brito del^Pino em seu Diário da Guerra do Brasil:
"Ha recebido este gobierno el processo formado a los rcos de Lesa Pátria don
Bonifácio Isás y don Juan Turreyto, que por aprobacíón de Ia sentencia pronunciada por el consejo de guerra el dia anterior acompana V. E. en Oficio de
esta a que contesta. Ds. g. á V. E. ms. ans. Florida Junio 23, de 1825 —
Manuel Calleros — Manuel Dnrãn — Loreto de Gomensoro — Juan José Vasquez —
Francisco Joaquim Ntinoz — Francisco Araucho, secretario. Al Exrno. Sr. Brigadier
General en Jefe dei Ejército de Ia Província.
— 287 —
Em sua planta da batalha, Seweloh indica um ataque de cavalaria argentina contra a do flanco direito da l. a Divisão e a
atribuí a Lavalleja. ^Seria a carga de Lavalle?- Ou por outra:
^Teriaêste general carregado não só contra Bento Gonçalves,
senão também contra a cavalaria da Divisão Barreto?
Como quer que seja, o fato incontrastável é que, enquanto
a l. a Divisão atacava o linha argentina, os adversários, por intermédio de Lavalle e Vilela, a golpeavam sábia e oportunamente
no flanco direito e na retaguarda, rompendo o ténue véu protetor.
com que ela intentara precatar-se nessa região.
Examinemos agora que ocorria, nesse mesmo tempo, no
outro extremo da linha.
Segundo o tenente-coronel António Elisiário de Miranda e
Brito (20), ao começar o desdobramento da coluna brasileira,
"a vanguarda teve ordem de atravessar a sanga e de ficar cautelosa de observação sobre o flanco direito do inimigo".
" 0 chefe de Estado Maior — explica o mesmo oficial —•
ordenou que a 2. a Divisão passasse a sanga e a mim que a conduzisse, colocando-a na atitude de afrontar Lavalleja e do mesmo
modo proteger e poder ser protegida pela l. a Divisão".
A julgar por estas informações, o primeiro pensamento de
Brown parece ter sido empenhar a ação simultaneamente com as'--,
duas divisões, embora reservando a primeira para o ataque
principal.
, .' Diz ainda Miranda e Brito:
"Com efeito, aquela (a 2. a Divisão) marchou com a maior
galhardia; porém, como bastante tivesse avançado e não encontrasse um ponto de estabelecimento conveniente ao fim indicado,
1" DIViSAO • GENtRfít
CALAÕO
Dispositivo inicial (segundo Seweloh)
correndo aliás risco, no seu isolamento, de ser afrontada pela
direita do inimigo e sua reserva em força dupla da que tinha a
Divisão, tomei a deliberação, de acordo com o comandante da
Divisão e os dás Brigadas de cavalaria e infantaria,' de que ela
(20) Manuscrito de seu punho, existente no Arquivo de Rio Branco.
288
se compunha, de contramarchar para a primeira posição; t-,
dando disto parte ao chefe do Estado Maior e ao General em
chefe, eles aprovaram tal deliberação, ajuntando que já a tinham
julgado necessária, tanto que iam mandar ordem no mesmo sentido, se não vissem tal movimento e foi, segundo penso, ordenado
à mesma divisão permanecer naquele lugar em frente a Lavalleja".
Vendo o pequeno número e o isolamento relativo das forças
de Abre, composta em sua quase totalidade de desertores indultados e paisanos, Lavalleja carrega com suas tropas sobre êle,
atacando-o num flanco, segundo nos informa Machado de Oliveira. 0 contingente de Areu não pode resistir à impetuosidade
do inimigo; cede, faz meia volta e corre desabaladamente para
o lado da 2. a Divisão, abandonando uma peça que lhe estava
confiada. É provável que Abreu haja tentado conter seus subordinados, mas infelizmente não conseguiu dominar-lhes o
pânico.
POSIÇÃO BRASILEIRA
(Vista do centro da posição argentina)
Calado prepara-se para recebê-los; forma quadrado com os
dois batalhões, dispõe a 4. a Brigada de cavalaria em coluna de
esquadrões à esquerda, para apoiar Abreu e repelir o inimigo,
a 3. a da mesma arma para atender ao flanco direito (centro do
exército) e duas peças nos ângulos do quadrado.
A gente de Abreu chega atordoada de envolta com os inimigos, atropela o 5.° regimento (tenente-coronel Felipe Néri) da
4. a brigada e cai sobre o quadrado de infantaria. Calado não
hesita um momento; fuzila-os a todos, amigos e adversários.
Abreu tomba, ali mesmo, ferido de morte.
Marechal Gustavo Henrique Brown
Schewiâ prováveT~c[o engajamento
CAMPO DA BATALHA DE ITUZAINGO
MUNICIPIO DO ROSARIO
— 289 —
"Assim terminou sua gloriosa carreira militar um dos mais
afamados guerreiros do sul, que unicamente por seus distintos
feitos de armas ascendeu a um dos maiores postos do exército,
Z. posição tíc
2*Mitnsàti
•
Dispositivo da divisão Calado, para resistir a novas cargas
(segundo Seweloh)
e foi enobrecido com um título. Como que vaticinando o fim
de sua existência, ele dizia aos seus amigos, que aplaudiam a
sua reaparição na campanha, que ia restituir à guerra o que só
dela havia recebido" (21).
Estava repelida a primeira investida de Lavalleja, embora
fiom o aniquilamento de nossa vanguarda. O 5.° regimento voltou
logo à ordem e foi buscar, por determinação de Calado, a peça
abandonada pela gente de Abreu.
"Essa carga (de Lavalleja) — escreve Diaz — não teve
bom êxito em alguns pontos da linha que formava o primeiro
corpo, particularmente no centro ;~e, como o regimento n. 9, do
coronel Manuel Oribe, se desordenou completam ente, ao mesmo
tempo que outros esquadrões eram perseguidos pelas forças imperiais, todo o primeiro corpo se pós em debandada" (22).
Envergonhado com a fuga de seus comandados, Oribe arrancou do uniforme as dragonas de coronel, exclamando: Quien
manda soldados que huyen, nó és digno de llevar estas insignias" (23).
(21) Recordações Históricas — Machado de Oliveira.
(22) Épocas Militares — Acevedo Diaz — págs. 356-357.
(23) Berra — Bosquejo histórico de-Ia República Orienial — l. a edição,
pág. 131.
Encontra-se, todavia, na obra de Acevedo Diaz csla frase: pêro el ejercito
no creyó que ese fuera el verdadero motivo, sino el de evitar que el enemigo que
le perseguia se dirigiese á él á vista de aquellas insígnias (pág. 395).
— 290 —
Q inimigo faz novo ataque, que Calado repele com o 5.°
regimento e o 20.°. É depois deste incidente que ele recebe e
executa a ordem de destacar para a Divisão de Barreto a 3.;L
Brigada de Cavalaria.
Vendo passar ao longe, pela esquerda, um esquadrão que
se dirige à retaguarda, manda atacá-lo por outro do 5.°, de que
êle logra escapar-se. Neste momento, percebe cerca de dez esquadrões que se preparam para acometê-lo em duas linhas.
Chega então o coronel Joaquim António de Alencastro com a
ordem para que êle se reuna ã. divisão da direita (Barreto),
caso esteja desembaraçado do inimigo.
Dispositivo da divisão Calado, para resistir às primeiras
cargas (segundo Seweloh)
Era sem dúvida o momento da crise aguda nesta Divisão;
o chefe brasileiro sentia as consequências do erro do dispositivo
inicial e tentava corrigi-lo estendendo a mão para agarrar, num
derradeiro esforço, as asas fugidia^ da vitória. : Mas Calado,
comprometido a fundo na peleja, já não tem liberdade de ação,
mostra ao coronel Alencastro a impossibilidade em que se encontra de obedecer e permanece em seu posto, resolução que
Alencastro aprova em nome do general.
Desencadeia-se a carga argentina e é repelida como as anteriores. "Espero-a, diz Calado, a 20 passos de distância e
mando, fazer-lhe fogo; o inimigo recua em debandada; saio do
quadrado e ordeno ao 5-° regimento que o persiga". O próprio Calado põe-se ã testa desta unidade, ao lado de seu »•«>*pectivo comandante, a fim de animar com êle os subordinados.
Além do corpo de Lavalleja, *que outras unidades carregaram contra Calado?
Não é fácil destriçá-lo em as narrativas argentinas, sempre
pouco claras e, não raro, contraditórias.
Eis o que disse Alvear, em seu boletim referente à batalha:
291
"Então o General em chefe proclamou aos corpos do exército com a veemência de seus sentimentos, animados pela grande
solenidade daquele dia, e destinou o general Lavalleja para carregar, com a espada na mão, e os valentes do 1.° corpo, a "esquerda do adversário, envolvê-la"e desbaratá-la. Ia na segunda
linha, para apoiar o ataque do 1.° corpo, a divisão.Zufriatégui,
composta dos regimentos 8 e 16 de lanceiros, mandados pelo
valente Olavárria*, e do esquadrão de couraoeiros, com seu bravo
comandante Medina".
E mais adiante:
"Na direita disputavam a glória os comandantes Gomez e
Medina. Carregaram contra uma forte coluna de cavalaria, golpearam-na e obrigaram-na a refugiar-se debaixo dos fogos àe um
batalhão que estava resguardado por umas árvores. 0 ardor
dos chefes levou até aí as tropas, que um fogo abrasador fêz
retroceder um pouco; a massa de cavalaria lançou-se então sobre
eles no mesmo instante; o regimento ]6 recebeu ordem de sustentar seus companheiros de armas; os couraceiros e dragões
correram pela direita e esquerda, pondo-se no flanco deles. E 05
bravos lanceiros, manobrando como em dia de parada, num
campo já coberto de cadáveres, carregaram e romperam o inimigo, alancearam-no e perseguiram-no até uma bateria de três
peças, que também tomaram. 0 regimento n. 8 apoiava essa
carga, que foi decisiva. O coronel Olavárria sustentou nela a
reputação que havia adquirido em Junih e Ayacucho".
Creio-que basta o trecho transcrito; o leitor deve estar
saturado de estilo ampuloso e confuso.
Infere-se, porém, do boletim argentino que, afora as tropas
de Lavalleja, se bateram com certeza contra Calado três regimentos do 2.° corpo, a saber: o 8.° (Zufriatégui), o 16 (lanceiros.
coronel Olavárria) e o esquadrão de couraceiros (corone í
Medina).
.Depois de repelida a última carga, tem Calado notícia
(pelas duas horas da tarde) que a direita do exército se retira.
Dois esquadrões inimigos avançam sobre seu flanco direito,
"como para cortar o 5.° regimento". 0 quadrado faz fogo
"com- tanta felicidade'" que do 1.° esquadrão inimigo só ficarani
a cavalo 16 a 20 homens, e o 2.° debandou todo. ,
Iniciou então a retirada a exemplo da l. a divisão.
Afora os pormenores da luta em torno das duas massas
combatentes brasileiras, cumpre referir que forças de cavalaria
argentina desviadas para a retaguarda haviam caído sobre o
— 292
nosso comboio, carros de munição e bagagens, tudo roubando
e inutilizando. Só não se apossaram da cavalhada de reserva.
porque os respectivos condutores a haviam tocado para S. Gabriel (24). Ficamos assim sem mais munições das que estavam
com os combatentes. 0 pasto ardia em mais de um lugar, incendiado pelos argentinos; segundo o autor anónimo das Contribuições, o fogo começara na sanga, provocado pelos primeiros
atiradores inimigos que recuaram.
Vendo-se dividido em dois blocos separados, que não puderam congregar esforços, embora estivessem ambos, até certo
ponto, vitoriosos, um na defensiva e outro na ofensiva, e sem
cavalaria ligeira que os protegesse nos flancos exteriores, sentindo-se cercado por todos os lados pela do inimigo, sem munições e com as tropas cansadas por seis horas de peleja, achou
Barbacena que a menor solução era romper o combate e abandonar aquele campo ardente e sem água.
0 sinal de retirada soou do centro — segundo Machado
de Oliveira — e foi respondido ao mesmo tempo de todos os
pontos ocupados^ pelo exército.
A retirada fêz-se pela estrada do Passo de Cacequí. Rompeu
na frente a l. a Divisão, que era a mais vizinha dessa estrada;
atrás dela colocou-se a segunda.
"Principio a minha retirada — escreveu Calado em sua
parte — levando a minha infantaria em quadrado, com os feridos no centro; parte da 4, a brigada de cavalaria em atiradores
na retaguarda do quadrado e o resto em coluna na frente, sendo
eu perseguido constantemente pelo inimigo; encontro no caminho
a maior parte de nossa artilharia em dispersão, alguns carros de
munições, a cavalhada, a boiada, que tudo levo na minha frente
e guarda; diligência arriscada que para ativá-la muito cooperou
o tenente-coronel comandante do 5.° regimento de cavalaria,
sustentando contínuo fogo contra meus perseguidores, que haviam incendiado o pasto, sendo todo o campo um vulcão, que
éramos obrigados a trilhar, menos a minha 3. a Brigada de cavalaria, que destaquei por ordem de V. Excia. para a l. a Divisão".
"Quando esta ia em retirada e já se encontrava na contraencosta da colina que havia ocupado, operaram contra nós uns
dois esquadrões do inimigo gritando: Viva Ia Pátria!, ao que
respondeu a Divisão: Viva o Imperador! (25).
(24 e 25)
Partes de Miranda e Brito.
293 —
«i-Seria essa a derradeira carga, dada por Paz, de que falam
alguns argentinos? iOu a de Paz foi a última lançada contra
Calado?
António Diaz informa que fomos perseguidos pelos quatro
batalhões de caçadores, o regimento de cavalaria n. 3 e o 3.°
corpo às ordens de Soler, o que é singular, pois aquelas unidades
pertenciam todas a este corpo.
"Todos os demais regimentos do exército republicano estavam a uma grande distância e fora de vista, seguindo outra das
divisões inimigas. Repetidas vezes o general Alvear, que marchava na retaguarda, mandou ordem a Lavalleja e aos outros
chefes para que se reunissem ao terceiro corpo. 0 2.°, o 8.°
e o ló.° obedeceram, se bem que com bastante demora pela distância em que se encontravam; porém as divisões orientais de
Lavalleja e as de Lavalle não se reuniram, apesar das ordens
reiteradas. Vendo o general em chefe que não era atendido,
enviou um ajudante com ordem a Lavalleja para que se incorporasse imediatamente ao 3.° corpo, responsabilizando-o pelos
resultados de sua desobediência. Então fêz alto, às 4 e ^ da
tarde; mas nem aquele general, nem o coronel Lavalle volveram
ao exército com suas divisões até o dia seguinte pela manhã,
quando o dito exército já se encontrava acampado no Passo do
Rosário" (26).
' *
Sabe-se pela mesma fonte que o 3.° corpo, ao. cabo de uma
hora de. perseguição, estava à distância de tiro de peça dos imperiaisoe a seguir à distância de fuzil, mas que não fêz fogo
sobre o inimigo. Alvear ordenou a Soler que se detivesse.
Nossa infantaria estava em frente,knuma coxilha elevada e fêz
alto, permanecendo vinte minutos em descanso e pondo ordem
em seus elementos.
Conta Diaz que Alvear dissera a Soler ter notícias de que
uma forte coluna inimiga vinha ao Passo do Rosário pela margem
esquerda do Santa Maria. &Seria Bento Manuel? ' Verificou-se
depois que era uma tropa ou boiada de particulares.
Entretanto, nós, brasileiros, avançamos e só de longe o inimigo nos via quando subíamos.as coxilhas da estrada (27).
Diaz afirma que a maior parte do 3.° corpo continuou em
nosso encalço e só depois das 5 horas, quando já havíamos
desaparecido no horizonte, fêz "alto e armou barraca numa que(26)
(27)
Épocas Militares — Acevedo Diaz.
Épocas Militares, por Acevedo Diaz
págs. 363-364.
— 294 —
brada em que se encontrou água, embora pouca e má. Aí descansou e, ao anoitecer, voltou ao Passo do Rosário.
"A marcha de regresso durou cinco horas, e "foi a mais
penosa da campanha", Parou-se ao lado do campo de batalha,
que ardia ainda, produzindo calor sufocante. Mal se podia ver
com as fagulhas trazidas pela fumaça",
"No meio daquele mai» de chamas, que por todas as partes
fechava o horizonte, lobrigamos às dez da noite, em um pequeno
trecho'de campo não queimado, vários feridos do inimigo, abandonados por êle na retirada. Moviam-se penosamente de uni
lado para outro, procurando debalde fugir ao suplício lento com
que o fogo os ameaçava. Naquele conflito não lhes restava esperança, nem a nós era possível socorrê-los, visto como as chamas
que os circundavam erguiam barreira intransponível" (28).
Convém trasladar também para aqui mais este trecho tio
mesmo autor:
.
"Relativamente a perdas, tivemos que lamentar a morte de
alguns dos nossos, que pereceram nas chamas com que o pasto
ardia, particularmente no centro da linha, pois o incêndio se
extendera com tal rapidez à porção mais crescida e abundante
desse pasto, que mal deu tempo para recolher os ditos feridos
e conduzi-los ao hospital de-sangue afastado do mais de légua.
Para isso contribuiu muito o abandono em que ficaram vários
deles, tanto quanto a confusão, gerada pelo fogo, pela densidade
da fumaça, pelo ruído estrondoso das armas, pelos gritos dos
combatentes, pelo lamento dos caídos e pelas descargas "combinadas do fuzil e do canhão.
Porém os • que tiveram especialmente aquela sorte-infeliz
foram os feridos do exército imperial, a quem não foi possível
socorrer para libertar do incêndio. A maior parte dos que
ficaram no flanco esquerdo e no centro morreram com certeza
queimados, porque o' exército republicano marchou sem deter-se
em perseguição dos quadrados e o estado maior general só dois
dias depois mandou percorrer o campo de batalha, quando já
estava reduzido a cinzas.
Ocorreu ainda uma cousa cruel que é forçoso narrar, a saber
o procedimento desumano de grande niimero de condutores o
chinas que seguiam o parque, os quais, enquanto marchávamos
atrás dos últimos fugitivos, se lançaram sobre o campo de ação
(28)
Êpuras Militares — por Acuvedo Diaz — púfís. 363-361. -
295 —
estimulados pelo desejo ardente do saque, e até pelo abandono
em que êle ficara, se porventura não o foram pela insensível
ferocidade que em todas as partes caracteriza as multidões.
Havíamo-nos afastado cerca de meia légua de Ituzaigo,
quando começámos a ouvir no campo vários tiros de fuzil, cuja
causa não podíamos descobrir em vista do acidentado do terreno
e da espessa fumaça que o envolvia. Como íamos ainda à pouca
distância do inimigo, não prestamos muita atenção a essas descargas, além de que as atribuímos a circunstância do fogo do
pasto se haver comunicado as armas esparsas no campo levando-as a se descarregarem, o que de fato em parte sucedeu. As
detonações, porém, aumentaram depois por muito tempo, e em
toda a' extensão da zona, até que várias ordenanças do estado
maior, que se nos juntaram ao anoitecer, informaram que além
da cansa referida, um grupo considerável de peões do parque
e mulheres que o seguiam se haviam espalhado pelo campo de
batalha, e, enquanto se apoderavam das armas e munições, todavia não atingidas pelo fogo, tinham ido saqueando todos os
mortos e matando os feridos do inimigo, com o fim de os aliviar,
segundo sua própria expressão".
Apesar de tudo, a impressão deixada pela leitura dos documentos existentes é de que fomos frouxamente perseguidos.
" 0 vagar com que marchava o exército — comenta Machado
de Oliveira — por causa de sua artilharia, e por não dever
abandonar nenhum dos seus feridos, fêz com que se lhe avizinhasse mais a infantaria inimiga, que em ordem estendida lhe
picava a retaguarda, e que era protegida por cavalaria nos flancos: e, para baldar-lhe a ousadia, cobriu-se esse lado com uma
linha de atiradores, que fêz retroceder e desaparecer completamente a do inimigo.
"Pela esquerda deste, deslocou-se uma forte coluna de cavalaria, que seguindo pelo lado esquerdo do exército, já posto
em marcha, foi tornar-lhe a frente, aí manobrou por algum tempo
com aparências de obstar à sua retirada; mas, como observasse
que nenhum tenção se prestava a isso, e que o exército, prosseguindo com seu movimento vagaroso e bem regulado, tinha disposição e suficiente força dessa arma para carregá-la logo que
estivesse a seu alcance, dissuadiu-se dessa tentativa, ou de outra
qualquer que ela fosse, e retirando-se contentou-se apenas com
dar viva» à Pátria"
— 296
Finalmente, Seweloh declara que a retirada se executou "à
custa de muitos esforços, na maior ordem, mostrando os soldados
grande serenidade e sangue1 frio, como êle nunca esperava ver
no Brasil (29).
Às onze da noite fêz o exército alto à meia légua do passo
do Cacequí, para acampar; mas, após um descanso, em-vez de
permanecer onde estava, como Barbacena tinha ordenado, avançou dizem'que por ordem de Brown, e foi postar-se do outro lado
do rio.
*
No Passo encontrou o general brasileiro as cousas de que
Alvear se havia desembaraçado (armamento, ferramentas, caixões de balas, ferraduras e reparos de artilharia) e mandou
queimar-lhe 15 carretas.
(29)
Reminiscências,
do coronel A. A. T. dê Seweloh — pág. 437.
Planta Da Batalha
Do dia 20 de Fevereiro de 1827
íiM CHEFE MARQUEZ U£ BÂRBACBNA, E O EXERCITO agPUBUCANO DE
BUEKOS-AYSBS, COMM4FÍDADO PELO GENEflAL ALVBAR, UVANT4DA
POR ADOf.FO ANTOMO P. Dg 5EW2L0H M A J O a o g gNCRMH^UOS
E AJUDANTE DE ORDENS.