o Periódic - Grupo COI

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o Periódic - Grupo COI
Periódico
Janeiro / Fevereiro de 2011 • Ano IV • Número 14
Aspecto histológico da medula óssea de paciente com leucemia aguda: infiltração por células monomórficas em substituição ao tecido hematopoiético normal.
02
03
04
06
EDITORIAL
O uso off label de medicamentos oncológicos
PREVENÇÃO E DETECÇÃO
PRECOCE
“Overdiagnosis” em câncer
CONVIDADO DO MÊS
EVERARDO CANCELA BRAGA
Cuidado oncológico colaborativo
ATUALIZAÇÕES
Gastrointestinal
• Risk of colorectal cancer in men on long-term
androgen deprivation therapy for prostate cancer
Mama
• Alcohol consumption and breast cancer recurrence
and survival among women with early-stage breast
cancer: the life after cancer epidemiology study
Cabeça e Pescoço
• Adjuvant chemotherapy prior to postoperative
concurrent chemoradiotherapy for locoregionally
advanced head and neck cancer
Hematologia
• A randomized comparison of 4 courses of
standard-dose multiagent chemotherapy versus
3 courses of high-dose cytarabine alone in
postremission therapy for acute myeloid leukemia
in adults: the JALSG AML201 Study
Radioterapia
• Reirradiation of large-volume recurrent glioma
with pulsed reduced-dose-rate radiotherapy
Tórax
• Assessment of lung-cancer mortality reduction from
CT Screening
14
18
20
21
22
DESTAQUES
San Antonio 2010
ASH
ANALISANDO OS NÚMEROS
DOS ARTIGOS
Tamanho amostral: há um número mágico?
FARMACOLOGIA
Inibidores de osteólise
SEÇÃO MULTIDISCIPLINAR
PSICOLOGIA
• Depressão e transtorno de ajustamento
CASO CLÍNICO
Câncer de pulmão metastático de longa evolução:
relato de caso e revisão da literatura
EDITORIAL
FERNANDO METON
Diretor do ICOI – Instituto COI
Gerente de Educação e Pesquisa da COI – Clínicas Oncológicas Integradas
Médico Oncologista da Coordenação de Pesquisa Clínica do INCA
Mestrando em Clínica Médica pela UFRJ
02 Editorial
O uso off label de medicamentos oncológicos
Como oncologistas, cada vez mais passamos por
dificuldades na liberação de protocolos de tratamento para nossos pacientes junto às operadoras
de saúde. Muitas vezes, somos solicitados a encaminhar “literatura que justifique a indicação do
tratamento”. Outras vezes, recebemos a negativa
da operadora, com a justificativa de que o tratamento solicitado é off label ou é considerado “tratamento experimental”.
O que precisamos entender é o que a ANVISA
define como off label, bem como esclarecer quais
são os critérios indicados pela ANS para que as
operadoras de saúde ofereçam
O uso off label
os tratamentos prescritos pelos
de medicamento oncologistas no sistema supleé quando este
mentar de saúde.
é utilizado sem
No site da ANVISA, exisaprovação, isto
te umas seção que descreve
é, sem constar
“Como a ANVISA vê o uso
off label de medicamentos”. O
a indicação em
uso off label de medicamento
bula. Mas será
é quando este é utilizado sem
que o uso de
quimioterápicos aprovação, isto é, sem constar
a indicação em bula. Mas será
sem constar a
que o uso de quimioterápicos
indicação em
sem constar a indicação em
bula é uma má
bula é uma má prática médica?
prática médica?
Uma droga pode ser off label,
segundo a ESMO em três situações: (1) as etapas
de solicitação de extensão da indicação ainda não
foram realizadas, apesar da disponibilidade de
evidências; (2) a indicação está na chamada zona
cinzenta da medicina baseada em evidência na
qual o alto nível de evidência é dificil de ser encontrado, como no caso de doenças raras que grandes
ensaios clínicos são necessários para se confirmar o
benefício; (3) devido as drogas serem ineficazes ou
não existirem motivos para se acreditar que elas
sejam eficazes. Creio que, quando indicada, apenas a situação 3 deva ser considerada má prática.
Uma grande dificuldade encontrada é quando
a patente de uma medicação chega ao fim. Dessa forma, nenhuma indústria farmacêutica passa
a ter interesse em realizar caros ensaios clínicos
para estender a indicação da droga.
Periódico Científico • Instituto COI • Janeiro / Fevereiro de 2011 • Ano IV • Número 14
Um bom exemplo que nos deparamos com frequência é a dificuldade para conseguirmos aprovação
de tratamento de pacientes com câncer de estômago previamente tratados. O único estudo de fase
III com indicação de segunda linha de tratamento
paliativo foi apresentado no congresso da ASCO
de 2009, onde se comparou o uso do irinotecano
vs o melhor suporte clínico. Apesar de o estudo ter
sido interrompido precocemente devido à dificuldade na inclusão de pacientes, demonstrou-se o
benefício em sobrevida global a favor do irinotecano [HR=2,85; IC 95%: 1,41-5,79; teste de log rank
bicaudal: P=0,0027)]. A dificulAté que ponto
dade de inclusão para este esdeveremos
exigir
tudo ficou clara, pois a maioria
altos níveis de
dos centros pelo mundo ofereevidência para
cem algum tratamento off label
em segunda linha. Poucos onco- liberação de um
logistas ofereceriam para seus tratamento sem
pacientes a participação em um comprometer os
estudo em que um dos braços preceitos éticos?
fosse o melhor suporte clínico.
Atualmente, estamos com grande dificuldade junto a algumas operadoras de saúde em conseguir
liberação do tratamento com esta indicação.
No caso acima, ou as agências regulatórias reavaliam os critérios de extensão em bula com base em
estudos de fase II ou será necessária a realização
de estudos de fase III incentivados pelo governo.
A Italian Medical Oncology Association publicou
recentemente um estudo no qual foram avaliadas prescrições de quimioterapia realizadas em
pacientes de 15 centros de oncologia italianos em
maio de 2006. Cerca de 644 pacientes que receberam 1.053 medicações foram avaliados nesse estudo. Destes, 199 (18,9%) das prescrições foram
consideradas off label. Em 92 casos (46,2%), as medicações foram utilizadas para uma neoplasia que
não tinha aprovação, porém com evidência científica (um ou mais ensaios clínicos randomizados
ou ensaios clínicos de fase II publicados em revistas oncológicas importantes).
Fica para reflexão: até que ponto deveremos exigir altos níveis de evidência para liberação de um
tratamento sem comprometer os preceitos éticos?
PREVENÇÃO E DETECÇÃO PRECOCE
RONALDO SILVA
Médico Responsável pela Área de Prevenção e Detecção Precoce da COI
Mestre e Doutorando em Saúde Pública pela ENSP/FIOCRUZ
Especialista em Oncologia Clínica pelo INCA
Especialista em Gestão de Sistemas e Serviços de Saúde pela ENSP/FIOCRUZ
Muitos de minha geração aprenderam nos bancos
das faculdades de medicina que o câncer é “uma
neoplasia maligna cujo curso natural é a morte”.
Isso foi há mais de 20 anos, antes do aparecimento
das estratégias recentes de detecção precoce dos
cânceres. Com o advento de técnicas de diagnóstico que permitem a identificação do câncer antes
do aparecimento de sinais e sintomas, a palavra
“câncer” agora significa um
As neoplasias
conjunto de alterações celulares
malignas de
com comportamentos biológicomportamento cos heterogêneos.
muito lento ou Alguns cânceres crescem ranão progressivo pidamente, outros mais lentajamais seriam
mente, alguns são extremamendiagnosticadas te lentos e até mesmo param
de crescer ou regridem. As
se não fosse
neoplasias malignas de compela oferta de
portamento muito lento ou
alguns exames
não progressivo jamais seriam
de detecção
diagnosticadas se não fosse
precoce.
pela oferta de alguns exames de
detecção precoce. Esses tumores jamais poderiam
produzir sintomas ou morte em seus portadores.
O termo “overdiagnosis”, cunhado recentemente,
representa o diagnóstico de tumores que crescem
muito lentamente ou tumores que não progridem
(e eventualmente regridem) no contexto da detecção precoce de alguns cânceres. Para que exista
“overdiagnosis” é preciso dois pré-requisitos: um
número considerável de cânceres subclínicos e
uma ação que leve à detecção precoce destes cânceres. As evidências destes dois pré-requisitos
vieram de estudos de autópsias, em indivíduos
que morreram de outras causas que não câncer,
e de estudos randomizados e observacionais de
programas de rastreamento, principalmente dos
cânceres de próstata e mama.
Embora seja difícil o cálculo da taxa de “overdiagnosis” em populações com câncer diagnosticado
em programa de rastreamento, os valores podem
chegar a aproximadamente 10%-30% no câncer de
mama e 70% no câncer de próstata. Pode ser difícil avaliar quando ocorreu “overdiagnosis” em um
indivíduo, mas é relativamente fácil identificar
sua ocorrência em populações. Rápidos aumentos
na taxas de incidência e de exames diagnósticos,
acompanhados de taxas de mortalidade estáveis,
são sugestivos de “overdiagnosis”. No caso do câncer de próstata e mama, a análise é mais complexa, pois as taxas de mortalidade caíram nos últimos 15 anos. De qualquer modo, é possível que os
avanços na biologia molecular permitam predizer
com mais precisão os diferentes comportamentos
biológicos no nível individual.
A questão (“overdiagnosis”) vem sendo debatida
com afinco na Europa e mais recentemente nos
EUA, entretanto, é muito pouco ou quase nada
discutida em nosso meio. Um dos problemas do
“overdiagnosis” é que, além dos indivíduos não se
beneficiarem do tratamento desnecessário (“overtreatment”), esses tratamentos podem causar danos (físicos e psicológicos). Diversos pontos estão
sendo levantados nesse debate e, muitos deles
podem mudar o modo como oferecemos os programas de detecção precoce. Duas constatações
aparecem bem fortes. A primeira é que não podemos mais utilizar recursos com diagnóstico e tratamento, se não contribuímos para o bem-estar
dos indivíduos. A segunda é que passamos a ter
a obrigação de educar pacientes e profissionais de
saúde para explicar mais e fazer menos, quando
apropriado. Para finalizar, uma dica de leitura.
Para quem gosta de esmiuçar os meandros da
prática médica nas sociedades ocidentais, recomendo o livro do professor Barron Lerner da Universidade de Columbia, nos EUA, sobre a história
da luta contra o câncer de mama nos EUA e as
polêmicas relacionadas ao rastreamento mamográfico e tratamento cirúrgico.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. Welch HG, Black WC. Overdiagnosis in Cancer. J Natl Cancer
Inst; 102:605-613, 2010.
2. Esserman L, Thompson I. Solving the Overdiagnosis Dilemma. J Natl Cancer Inst; 102:582-583, 2010.
3. Lerner BH. The Breast Cancer Wars: fear, hope, and the pursuit of a cure in twentieth-century America. New York: Oxford University Press, 2001.
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03 Prevenção e detecção precoce
“Overdiagnosis” em câncer
CONVIDADO DO MÊS
EVERARDO CANCELA BRAGA
Assessor de Gerenciamento da Saúde na COI – Clinícas Oncológicas Integradas
Ex-Secretário-Executivo Substituto e Gerente-Geral de Estrutura e Operação
dos Produtos da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS)
Mestrado em Saúde Pública pela ENSP
Especialista em Administração Hospitalar pela PUC
MBA em Regulação de Saúde Suplementar pela FGV
Cuidado oncológico colaborativo
04 Convidado do Mês
Tradicionalmente os programas de acompanhamento de doenças tinham foco nas doenças de
maior prevalência e custo como asma, diabetes e
cardiopatias. Posteriormente, passaram a ser utilizados para lombalgias, obesidade e doenças de
baixa prevalência e alto custo. Com o reconhecimento de que as comorbidades surgem em condições crônicas e necessitam
Dado ao crescente
cuidados adequados, esses
número de pessoas programas evoluíram para
vivendo com câncer utilizar os modelos de atencomo uma condição ção ao paciente altamente
médica crônica,
integrados e abrangentes.
um programa de
Os pacientes com múltiplas
acompanhamento
condições crônicas, na audo cuidado desta
sência de uma coordenação
doença é necessário do seu tratamento, podem
para abordar a
aumentar a ansiedade e a
sua prevenção,
complexidade do cuidado contínuo ao terem que
diagnóstico,
percorrer sozinhos o comtratamento e
plexo sistema de saúde, coimpacto na saúde.
ordenando seus cuidados e
transmitindo informação de um profissional de
saúde para o próximo.
Três quartos dos casos de câncer ocorrem em
pessoas com mais de 55 anos, e as pessoas acima de 65 anos têm mais de uma condição médica
crônica. Dado ao crescente número de pessoas
vivendo com câncer como uma condição médica
crônica, um programa de acompanhamento do
cuidado desta doença é necessário para abordar a
sua prevenção, diagnóstico, tratamento e impacto na saúde.
O cenário de recursos financeiros limitados e os
custos altos e crescentes reforçam a atualidade de
medidas deste tipo em organizações que valorizem medidas de efetividade clínica e qualidade
de vida. Um estudo do Medicaid nos EUA mostrou que o screening e a detecção precoce do câncer para os pacientes com mais de 50 anos só foi
recomendado em cerca de 50 a 60% das oportunidades. A realização efetiva do screening foi ainda
pior: somente cerca de 30% dos pacientes foram
avaliados para o câncer colorretal, fizeram uma
mamografia nos últimos 2 anos e um colpocitológico em 3 anos.
Portanto, o acompanhamento desse cuidado é
importante para muitas doenças que acometem
as pessoas mais idosas, notadamente o câncer.
As pessoas com maior probabilidade de desenvolver câncer devem receber um tipo de screening
diferenciado, mais precoce e com metodologia
própria, evitando-se diagnósticos em um estádio
mais avançado da doença, o que implica em um
custo mais elevado e menor chance de cura.
DEFINIÇÃO DE CUIDADO
ONCOLÓGICO COLABORATIVO
ESTRATÉGIAS PARA DESENVOLVIMENTO DO
CUIDADO ONCOLÓGICO COLABORATIVO
É um conjunto de ações para
acompanhamento do cuidado às pessoas
acometidas por câncer, abordado na sua
integralidade pela prevenção, diagnóstico,
tratamento e impactos no estado de saúde,
mediante medidas com comprovada
efetividade clínica e que resultem em melhor
qualidade de vida.
• Desenvolver ações integradas e protocolizadas
que possibilitem a adequada recuperação do
estado de saúde do paciente oncológico e consequente melhor efetividade clínica;
Periódico Científico • Instituto COI • Janeiro / Fevereiro de 2011 • Ano IV • Número 14
• Orientar o processo de tratamento do paciente
oncológico, não só no atendimento interdisciplinar, e sempre com foco na preservação da
sua qualidade de vida.
Os indivíduos com câncer tratável podem se beneficiar de um programa que coordene o cuidado
da doença. É importante pensar no câncer como
um contínuo, da prevenção ao diagnóstico e,
mesmo, ao tratamento no fim da vida.
A maioria dos programas de acompanhamento
para condições crônicas enfatiza a aderência do
paciente ao uso de mediA maioria dos
cação e aos hábitos de vida
programas de
saudável, como dieta equiliacompanhamento
brada e atividade física. Um
para condições
programa específico para
crônicas enfatiza
oncologia deve ir mais funa aderência do
do no cuidado do paciente.
paciente ao uso de
Um dos caminhos mais remedicação e aos
centes para qualificar o cuihábitos de vida
dado oncológico é envolver
saudável, como
os orientadores do paciente
dieta equilibrada
no estádio inicial do diage atividade física.
nóstico de um câncer. Além
disso, o programa deve abordar duas áreas temáticas: eventos adversos físicos do tratamento do
câncer e aspectos psicossociais deste cuidado.
Este acompanhamento do cuidado ao paciente
oncológico deve ter como objetivos:
ao paciente oncológico e seu orientador, suporte interdisciplinar, atendimento especializado e
fundamentos epidemiológicos.
Em um estudo realizado nos EUA por Kroenke e
cols., publicado no JAMA de 14 de julho de 2010,
foi demonstrado que a dor e a depressão foram
significativamente melhoradas
Um dos
nos pacientes com câncer que
caminhos
mais
receberam um acompanhamenrecentes para
to de seu cuidado por contatos
qualificar
telefônicos e monitoramento
o cuidado
domiciliar automatizado dos
oncológico é
sintomas (via webpage).
envolver os
O estabelecimento de um
orientadores
conjunto de ações para acomdo paciente no
panhamento do cuidado ao
estádio inicial
paciente oncológico por um
do
diagnóstico
serviço especializado deve ser
de um câncer.
fundamentado na experiência
acumulada e excelência desses
serviços, alinhado às melhores práticas e diretrizes clínicas disponíveis, bem como às legislações e normativos sobre Ética e Exercício Profissional vigentes.
• Realizar um acompanhamento individual sis-
Os princípios norteadores desse trabalho são:
• Estimulo à iniciativa e ao comprometimento (co-
-responsabilidade) do paciente e seu orientador
em relação ao seu processo de tratamento;
• Acolhimento;
• Unidade na conduta multidisciplinar.
Diversas atividades podem ser desenvolvidas ao
longo do trabalho, observando-se as seguintes
dimensões: acompanhamento individualizado
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. Cancer Disparities Research Partnership Program. Patient
navigator. Available at: http://www3.cancer.gov/rrp/
cdrp/navigator.html. Acesso em 22 de março de 2010.
2. Costich T, Lee FC. Improving cancer care in a Kentucky
managed care plan: A case study of cancer disease management. Dis Manag. 2003;6:9-20.
3. Fetterolf DE, Terry R. Oncology disease management. Dis
Manag. 2007;10:30-36.
4. Kash KM, Sharma S, Goldfarb N. Is disease management
right for oncology? Pop Health Manag. 2009; 12:337-343.
5. Kroenke K, Theobald D, Wu J et al. Effect of telecare man����
agement on pain and depression in patients with cancer.
JAMA 2010;304:163-171.
6. Lee FC. Employer-based disease management programs in
cancer. Dis Manag Health Outcomes. 2004;12:9-17.
7. Reagan M. Cancer and disease management: Indications for
action. Dis Manag Health Outcomes. 1999;6:203-211.
8. Teitelman DL, Lee FC. The Florida Blue´s experience in improving cancer management. Oncol News Intl. 2002:11:47-49.
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05 Convidado do Mês
temático;
• Garantir o mais avançado suporte multidisciplinar;
• Coordenar as medidas que viabilizem o atendimento nos diversos tipos de serviços e os profissionais de saúde envolvidos no tratamento,
facilitando-se a comunicação entre eles, e entre
estes e o paciente, bem como seu orientador.
ATUALIZAÇÕES
GASTROINTESTINAL
[email protected]
FERNANDO METON
ANA PAULA VICTORINO
J Natl Cancer Inst. 2010;102(23):1760-70.
Risk of colorectal cancer in men on long-term androgen deprivation
therapy for prostate cancer
Gillessen S, Templeton A, Marra G, Kuo YF, Valtorta E, Shahinian VB
Introdução
Neste estudo retrospectivo foram identificados,
em uma base de dados americana, 107.859 homens
diagnosticados com câncer de próstata em 1993 e
2002. O objetivo principal foi a determinação de
câncer colorretal (CCR) como segundo tumor primário. A influência da privação androgênica (PA)
foi avaliada, ajustada para as características dos
pacientes e do câncer de próstata.
Resultados
Os homens submetidos à orquiectomia apresentaram maior taxa de incidência de CCR (6,3 por
1000 pessoas-ano, IC 95% 5,3-7,5), seguidos por
homens tratados com agonista GnRH (4,4 por
1000 pessoas-ano; IC 95%: 4,0- 4,9) e homens não
submetidos à PA (3,7 por 1000 pessoas-ano, IC
95%: 3,5-3,9). Após o ajuste para as características
dos pacientes e do câncer de próstata, houve um
aumento estatisticamente significativo do risco
de CCR associado com maior duração da PA. Em
comparação com a ausência de PA, houve um aumento do risco de CCR associado ao uso de terapia com agonista de GnRH por 25 meses ou mais
(HR=1,31; IC 95%: 1,12-1,53) ou com orquiectomia (HR=1,37; IC 95%: 1,14-1,66).
06 Atualizações
Comentários
Na maioria dos pacientes com câncer de próstata,
o tratamento com agonista GnRH ou orquiectomia
inibe a síntese de andrógenos, o que leva à redução
dos níveis de testosterona plasmática, com consequente redução de PSA e regressão tumoral. O
CCR não é considerado uma neoplasia hormônio-
-relacionada, embora existam evidências de que
os hormônios sexuais sejam relevantes para o seu
desenvolvimento. Os estudos epidemiológicos e
observacionais em mulheres têm demonstrado
que um aumento nos hormônios femininos está
associado a uma redução do risco de desenvolver
CCR. Pouco se sabe sobre a associação entre os
níveis de hormônio sexual e o risco de CCR em
homens. Gillessen e cols. apresentaram uma interessante avaliação da associação entre o tratamento com PA para pacientes de câncer de próstata e
o risco de desenvolvimento de CCR. Os pacientes
que receberam tratamento com agonista GnRH
ou orquiectomia apresentaram aumento de 30
a 40% no risco de desenvolver CCR em relação
àqueles que não foram submetidos a tais procedimentos. O aumento do risco esteve relacionado
com a duração superior da PA. A história médica,
o estilo de vida e fatores dietéticos, que estão relacionados ao desenvolvimento do câncer de cólon,
podem representar fatores de confundimento importantes e devem ser levados em conta quando
se avalia a relação entre PA e câncer de cólon. Por
exemplo, a obesidade e a hiperinsulinemia estão
relacionadas ao aumento do CCR. Observamos
que os homens obesos apresentam menores níveis
de testosterona e que o tratamento com PA leva
à redução da resistência à insulina. Os resultados
de Gillessen e cols. reforçam a necessidade de discussão dos riscos e benefícios ao início da terapia
de PA, a necessidade de exames de rotina para
CCR e a adoção de práticas saudáveis na tentativa
de combater algumas das desvantagens das terapias antiandrógeno.
Tabela: Características dos carcinomas colorretais em função da privação androgênica.
Privação
androgênica
Número de
Doença localizada inicial (%)
P
Tumores pouco diferenciados
ou indiferenciados (%)
P
Nenhuma
1.048
78
0,073
21,4
0,13
Agonista GnRH
849
51,8
18,6
Orquiectomia
138
41,5
30,6
pacientes
* Gráfico adaptado do artigo original.
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MAMA
J Clin Oncol. 2010;28(29):4410-4406.
Alcohol consumption and breast cancer recurrence and survival
among women with early-stage breast cancer: the life after cancer
epidemiology study
[email protected]
ALEXANDRE BOUKAI
Kwan ML, Kushi LH, Weltzien E, Tam EK, Castillo A, Sweeney C, Caan BJ
Introdução
Neste estudo, foram investigados os efeitos do álcool sobre o prognóstico e a sobrevida do câncer de
mama em 1.897 sobreviventes de câncer da mama em estádio inicial referentes ao estudo prospectivo
LACE. O consumo de álcool (por exemplo, vinho, cerveja e licor) foi avaliado na entrada da coorte através de um questionário de frequência alimentar.
Resultados
Após um seguimento médio de 7,4 anos, 293 recidivas do câncer de mama e 273 óbitos foram
observados. Novecentos e cinquenta e oito mulheres (51%) foram consideraEste é um dos
das alcoolistas (> 0,5g/dia de
maiores estudos
álcool) e a maioria consumiu
prospectivos com vinho (89%). Beber ≥ 6g/dia
sobreviventes
de álcool comparado com não
de câncer de
beber foi associado a um rismama onde
co aumentado de recorrência
foi explorado o
(HR 1,35; IC 95%: 1,00-1,83)
papel da ingestão e óbito por câncer de mama
(HR, 1,51; IC 95%: 1,00-2,29).
alcoólica no
O aumento do risco de reciprognóstico
diva pareceu ser maior nas
daquelas com
pacientes na pós-menopausa
doença em
(HR, 1,51; IC 95%: 1,05-2,19) e
estádio inicial.
com sobrepeso ou obesas (HR,
1,60; IC 95%: 1,08-2,38). Foi sugerido um efeito
cardioprotetor do álcool para o óbito não relacionado ao câncer de mama.
Comentários
Este é um dos maiores estudos prospectivos com
sobreviventes de câncer de mama onde foi explorado o papel da ingestão alcoólica no prognósti-
co daquelas com doença em estádio inicial. Foi
demonstrado um aumento do risco de recidiva
da neoplasia após 2 anos de diagnóstico em mulheres consumidoras de bebidas alcoólicas, principalmente na pós-menopausa e nas obesas, porém
não se evidenciou redução da sobrevida global.
Sabemos que o consumo de álcool também está
relacionado ao aumento da incidência de câncer
de mama na população geral, e uma hipótese é de
que o álcool eleve os níveis de estrogênio nas mulheres na pré e pós-menopausa. O estudo da relação entre a bebida alcoólica e a mortalidade das
mulheres com história prévia de câncer de mama
é bastante complexo, pois o álcool, apesar de aumentar a taxa de incidência e a recorrência de câncer de mama, pode reduzir a taxa de mortalidade
por doenças cardiovasculares no que diz respeito
ao consumo moderado da bebida. O efeito cardioprotetor do álcool pode ter sido o fator que contrabalançou seus efeitos deletérios não alterando,
portanto, a sobrevida global das pacientes. Neste
estudo, foi demonstrado que os fatores comportamentais, como a ingestão alcoólica, podem alterar
o prognóstico das pacientes com câncer de mama
e que, além das opções terapêuticas, é fundamental discutirmos no consultório a possibilidade de
mudanças no estilo de vida dessas pacientes.
RECORRÊNCIA DE CÂNCER DE MAMA
MORTES POR CÂNCER DE MAMA
Consumo de Álcool gm/d
Nº
Nº de Eventos
HR
95% CI
Nº de Eventos
HR
95% CI
Nenhum
939
126
referência
–
69
referência
–
< 6,0
480
68
1,05
0,78 a 1,42
36
1,13
0,74 a 1,70
≥ 6,0
478
74
1,35
1,00 a 2,29
39
1,51
1,00 a 2,29
P
0,04
0,05
* Tabela adaptada do artigo original.
Periódico Científico • Instituto COI • Janeiro / Fevereiro de 2011 • Ano IV • Número 14
07 Atualizações
Tabela: Consumo de álcool relacionado à recorrência e morte por câncer de mama no estudo LACE.
CABEÇA E PESCOÇO
[email protected]
LUIZ HENRIQUE ARAÚJO
Radiother Oncol. 2010;97(2):318-21.
Adjuvant chemotherapy prior to postoperative concurrent
chemoradiotherapy for locoregionally advanced head and neck cancer
Choe KS, Salama JK, Stenson KM, Blair EA, Witt ME, Cohen EEW, Haraf DJ, Vokes EE
08 Atualizações
Introdução
Neste estudo foi avaliado, de forma retrospectiva,
o benefício da quimioterapia adjuvante antes da
quimiorradioterapia (QRT) nos pacientes submetidos à cirurgia por tumores avançados de cabeça
e pescoço. Para esta análise, foram utilizados os
dados de pacientes tratados em protocolos de adjuvância em 3 ensaios clínicos de fase II, conduzidos em centros americanos. Os tratamentos utilizados incluíram QRT concomitante em 2 estudos,
enquanto em um estudo foi utilizada a estratégia
de quimioterapia isolada seguida de QRT. Foram
incluídos somente os pacientes submetidos à ressecção cirúrgica completa de toda doença, com o
diagnóstico de carcinoma de células escamosas
ou pouco diferenciado da região da cabeça e pescoço em estádios III ou IV.
Resultados
Foram avaliados 41 pacientes, sendo 25 tratados
com quimioterapia adjuvante seguida de QRT
(grupo da adjuvância) e 14 tratados exclusivamente com QRT adjuvante (grupo controle). A
idade mediana foi de 52 anos, 65% do sexo masculino e todos apresentavam performance status de
0 ou 1. A percentagem de tumores T3-4 foi de 12%
no grupo da adjuvância vs 25% no grupo controle
(P=0,13), enquanto os tumores N2b-N3 estavam
presentes em 40% no grupo da adjuvância vs 62%
no grupo controle (P=0,15). A quimioterapia adjuvante utilizada foi a carboplatina em combinação
com paclitaxel semanalmente, enquanto a QRT
que foi indicada em todos os pacientes continha
paclitaxel e fluorouracil, em concomitância com a
radioterapia. Durante a quimioterapia adjuvante,
10 pacientes apresentaram toxicidade graus 3 ou
4, porém sem atraso no início da QRT. Com um
tempo de seguimento mediano de 72 meses, não
foram encontradas recidivas no grupo tratado
com quimioterapia adjuvante, porém 4 pacientes
tiveram recidiva no grupo controle. O risco de recidiva em 5 anos foi de 0% e de 28,9% no grupo de
adjuvância e no grupo controle, respectivamente
(P=0,0074). No entanto, não houve diferença em
sobrevida (P=0,70).
Comentários
O tratamento adjuvante padrão para os pacientes
de alto risco, ou seja, com margens positivas ou
extravasamento capsular linfonodal, compreende
quimioterapia e radioterapia
No estudo em
concomitantes, com benefício
questão, foi
confirmado em 2 grandes esdemonstrado
tudos internacionais (RTOG
9501 e EORTC 22931). A vanta- que os pacientes
tratados com
gem desse tratamento está no
quimioterapia
melhor controle locorregional.
Entretanto, a falha a distância
adjuvante
tem se mostrado a principal tiveram uma taxa
causa de recidivas em estudos menor de recidiva
recentes, especialmente para
em relação ao
os pacientes com extensa dogrupo controle.
ença nodal. Nesta situação, a
possibilidade de oferecer quimioterapia adjuvante, previamente à QRT, pode trazer novo alento.
No estudo em questão, foi demonstrado que os
pacientes tratados com quimioterapia adjuvante
tiveram uma taxa menor de recidiva em relação
ao grupo controle. Apesar de retrospectivos, estes
dados embasam a necessidade de ensaios clínicos
que elucidem esta questão. Fora de ensaios clínicos, há de se acreditar que os pacientes selecionados, com fatores de prognóstico ruim, possam se
beneficiar de estratégias agressivas que envolvam
terapia multimodal e, eventualmente, quimioterapia adjuvante prévia à QRT.
Tabela: Fatores associados à recorrência de câncer de cabeça e pescoço (análise univariada).
Variáveis
SLD - 5 anos (%)
P-valor
QT adjuvante (sim vs não)
100
71
0,007
Idade (≤52 vs > 52 anos)
100
78
0,037
Estádio T (T1-2 vs T3-4)
96
54
0,002
Estádio N (N0-2a vs N2b-3)
94
75
0,230
Abreviações: SLD, sobrevida livre de doença; QT, quimioterapia.
Periódico Científico • Instituto COI • Janeiro / Fevereiro de 2011 • Ano IV • Número 14
HEMATOLOGIA
Blood. 2011;117(8):2366-72.
A randomized comparison of 4 courses of standard-dose multiagent
chemotherapy versus 3 courses of high-dose cytarabine alone in
postremission therapy for acute myeloid leukemia in adults: the
JALSG AML201 Study
[email protected]
JULIANE MUSACCHIO
Miyawaki S, Ohtake S, Fujisawa S, Kiyoi H, Shinagawa K, Usui N, Sakura T, Miyamura K,
Nakaseko C, Miyazaki Y, Fujieda A, Nagai T, Yamane T, Taniwaki M, Takahashi M, Yagasaki F, Kimura Y, Asou N, Sakamaki H, Handa H, Honda S, Ohnishi K, Naoe T, Ohno R
Introdução
Este foi um estudo prospectivo e randomizado
para avaliar o melhor tratamento de consolidação
após a remissão completa em pacientes com leucemia mieloide aguda com menos que 65 anos de
idade. Um total de 781 pacientes foram randomizados para receberem tratamento de consolidação
com 3 cursos de alta dose de citarabina isolada
(HiDAC 2g/m2 duas vezes ao dia por 5 dias) ou 4
cursos da dose padrão convencional de quimioterapia com várias medicações, conforme o estudo
JALSG AML97. Neste protocolo, era administrada citarabina na dose de 200mg/m2 em 24h por 5
dias em todos os 4 cursos de quimioterapia, sendo
que a primeira combinação era com mitoxantrone
(7mg/m2 por 3 dias), o segundo curso com daunorrubicina (50mg/m2 por 3 dias), o terceiro com
aclaurorrubicina (20mg/m2 por 5 dias) e o quarto
e último curso com etoposide (100mg/m2 por 5
dias), vincristina (0,8mg/m2 no D8) e vindesina
(2mg/m2 no D10).
Resultados
A sobrevida livre de doença (SLD) em 5 anos foi
de 43% para o grupo que recebeu HiDAC e 39%
para o que recebeu vários tipos de quimioterápicos (P=0,724). A sobrevida global (SG) em 5 anos
foi de 58% e 56%, respectivamente (P=0,954). Dentre os pacientes do grupo de citogenética com risco favorável (n=218), a SLD em 5 anos foi de 57%
para o tratamento com HiDAC e 39% para aqueles tratados com várias medicações (P=0,050). Já a
SG em 5 anos foi de 75% e 66%, respectivamente
(P=0,174). No grupo tratado com HiDAC, o nadir
do número dos leucócitos foi menor, a duração
da contagem leucocitária com menos que 1.000/L
maior e a frequência de infecções documentadas
maior que aqueles tratados com múltiplos agentes quimioterápicos.
Comentários
Para se determinar o melhor tratamento após a
remissão, deveria haver vários estudos prospectivos e randomizados onde se fosse comparado
o tratamento quimioterápico com o transplante
de medula óssea (TMO). Embora haja limitações
para o TMO, como a idade do paciente e a disponibilidade de doadores, é demonstrado na maioria dos estudos randomizados que o TMO oferece
um prognóstico melhor e, no mínimo, não inferior
para os pacientes com leucemia mieloide aguda de
risco alto e intermediário. Atualmente, utiliza-se o
esquema com HiDAC em vários centros desde a
publicação do estudo CALGB-8525. No presente
estudo, demonstrou-se também uma SLD melhor
nos pacientes que o receberam e tinham citogenética de baixo risco quando se comparou àqueles
tratados com múltiplas medicações. Assim, verificamos que o tratamento de consolidação deve ser
selecionado com base nos fatores de prognóstico,
como a citogenética, e o esquema alternativo ao
HiDAC pode ser recomendado para os pacientes
com risco intermediário ou alto, devido à sua menor toxicidade e taxas de resposta semelhantes. Já
naqueles pacientes com citogenética favorável, a
escolha deve ser o esquema com HiDAC.
Gráficos: Sobrevida livre de doença (A) e sobrevida global (B) dos pacientes com leucemia mieloide aguda com citogenética favorável
tratados com HiDAC e com múltiplos agentes quimioterápicos na fase de consolidação.
HiDAC
0,8
Probabilidade
0,8
Probabilidade
1,0
HiDAC
0,6
0,4
Múltiplos agentes quimioterápicos
0,6
Múltiplos agentes quimioterápicos
0,4
0,2
0,2
P = 0,174
P = 0,050
0,0
0,0
0
10
20
30
40
Meses
50
60
70
80
0
10
20
30
40
Meses
50
60
70
80
Periódico Científico • Instituto COI • Janeiro / Fevereiro de 2011 • Ano IV • Número 14
09 Atualizações
(B)
1,0
* Gráficos adaptados do artigo original.
(A)
MÁRCIO REISNER
Adkison JB, Tomé W, Seo S, Richards GM, Robins HI, Rassmussen K, Welsh JS, Mahler
PA, Howard SP
10 Atualizações
Introdução
A radioterapia pulsada com baixa taxa de dose
(RPBT) é um tratamento que consiste na redução
da taxa de dose eficaz com aumento do tempo de
tratamento e que possibilita a ocorrência do reparo ao dano subletal concomitante à sua aplicação.
Cento e três pacientes com gliomas recidivados e
previamente irradiados foram submetidos à radiação com esquema de RPBT, utilizando-se pulsos de 0,2Gy com intervalos de 3 minutos e com
uma taxa de dose aparente de 0,0667Gy/min para
uma dose mediana de 50Gy com frações de 1,8 a
2Gy. O volume médio tratado foi de 403cm3, com
base na ressonância magnética com sequência T2
e 2cm de margem.
Resultados
Os pacientes submetidos à RPBT em até 14 meses
após o primeiro tratamento apresentaram sobrevida mediana de 21 semanas, ao contrário dos pacientes submetidos à reirradiação com intervalo
maior que 14 meses, cuja sobrevida mediana foi de
28 semanas. Estes resultados mostram-se superiores aos dados da literatura, já que apenas 16% dos
pacientes foram tratados após a primeira recidiva
(46% tratados após a segunda recidiva, 32% após
a terceira e 4% após a quarta ou quinta recidivas).
Os pacientes com gliomas de baixo grau obtiveram
sobrevida mediana de 11,4 meses, contados após a
reirradiação, enquanto valores de sobrevida mediana de 5,6 meses e 5,1 meses foram encontrados
para os gliomas graus 3 e 4, respectivamente.
O tratamento sistêmico prévio, como a utilização
ou não da temozolamida, não exerceu influência
sobre a toxicidade ou sobrevida do tratamento.
Uma análise multivariada identificou a idade ao
diagnóstico, o grau e escala de Karnofsky superior a 80 como fatores preditores de sobrevida
após a reirradiação.
Comentários
Poucas são as possibilidades de tratamento para
os pacientes com gliomas volumosos e previamente irradiados que apresentam recidivas e já
foram submetidos a vários esquemas de quimioterapia ou aos anticorpos monoclonais.
Periódico Científico • Instituto COI • Janeiro / Fevereiro de 2011 • Ano IV • Número 14
A dose mínima de radioterapia necessária para
controlar um glioma consiste em 50Gy, uma dose
difícil de ser alcançada com segurança quando se
trata de uma reirradiação. Este é o primeiro estudo que descreve uma técnica capaz de promover
a reirradiação de forma segura, com prescrição de
doses em torno de 50Gy. Para se ter uma comparação, a maior série descrita na literatura havia
sido publicada pela Universidade de Heidelberg,
que utilizou a dose de 36Gy com 2Gy/dia em tumores com volume mediano de 49,3cm (o volume
mediano neste estudo foi de 403,5cm3).
A estratégia de se utilizar radioterapia pulsada
com uma menor taxa de dose baseia-se em um fenômeno da radiobiologia denominado reparo ao
dano subletal. Este esquema de tratamento permite que este fenômeno ocorra já durante o momento da irradiação e não somente após a aplicação,
como ocorre nos fracionamentos convencionais.
Com isto, exploram-se ao máximo as diferenças
biológicas existentes entre a reparação do tecido
neuronal e da célula neoplásica, com diminuição
da toxicidade e maximização da probabilidade de
controle tumoral.
Com este estudo, a RPBT mostrou-se uma estratégia segura e eficaz na reirradiação de gliomas volumosos, inclusive com a prescrição de altas doses
com boa tolerância.
Gráfico: Sobrevida após início da radioterapia pulsada com baixa
taxa de dose, estratificada pelo grau histológico.
100
Baixo Grau
Grau 3 (E/N=31/34)
Grau 4 (E/N=45/46)
80
* Gráfico adaptado do artigo original.
[email protected]
Int J Radiat Oncol Biol Phys. 2011;79(3):835-41.
Reirradiation of large-volume recurrent glioma with pulsed reduceddose-rate radiotherapy
Probabilidade de sobrevida (%)
RADIOTERAPIA
60
P-valor: 0,002
40
20
0
0
12
24
36
Tempo de sobrevida (meses)
Abreviaturas: E/N, evento/número total.
48
60
TÓRAX
Lung Cancer. 2011;71(3):328-32.
Assessment of lung-cancer mortality reduction from CT Screening
[email protected]
Introdução
Essa análise retrospectiva foi conduzida para
avaliação da redução de mortalidade por câncer
de pulmão através de um programa de triagem
com tomografia computadorizada (TC). Foram
utilizadas coortes de pacientes provenientes de
um ensaio clínico que envolveu a triagem com TC
[New York Early Lung Cancer Action Project (NY-ELCAP)] e duas coortes de pacientes não submetidos à TC de rotina. Estas coortes de controle
haviam sido acompanhadas nos estudos CPS-II
(Cancer Prevention Study-II) e
A redução da
CARET (Beta-Carotene and Remortalidade se tinol Efficacy Trial). A taxa de
tornou evidente mortalidade específica foi ajustada por idade, gênero, tabagisa partir do
mo e, então, comparada entre
quarto ano de
os pacientes.
seguimento,
Resultados
com maior
diferença entre Entre 7995 voluntários participantes do NY-ELCAP, foram
o sexto e
documentados 64 óbitos por
oitavo ano.
câncer de pulmão. Este número está abaixo da taxa de óbitos estimada a partir
da coorte do estudo CPS-II (redução de 36%) e do
CARET (redução de 64%). A redução da mortalidade se tornou evidente a partir do quarto ano de
seguimento, com maior diferença entre o sexto e
oitavo ano.
Gráfico: Taxa de mortalidade cumulativa de pacientes por câncer
de pulmão por 100.000 óbitos entre coortes dos
estudos NY-ELCAP e CARET.
Taxa de mortalidade por câncer de pulmão
por 100.000 óbitos
4500.0
Coorte NY-ELCAP
4000.0
Coorte CARET
3500.0
3000.0
2500.0
2000.0
1500.0
1000.0
500.0
0.0
1
2
3
4
5
6
7
Tempo de seguimento (anos)
* Gráfico adaptado do artigo original.
8
9
10
Comentários
Chegou finalmente o momento para indicarmos
a triagem de câncer de pulmão através de TC seriada? Atualmente, esta é uma pergunta em voga
em todo o mundo. Foi recentemente divulgado na
mídia o resultado do estudo NLST (National Lung
Screening Trial), conduzido pelo Instituto Nacional de Câncer americano. Diferentemente dos
estudos anteriores, esse foi um estudo randomizado, em que 53 mil voluntários tabagistas foram
acompanhados anualmente com TC ou radiografia de tórax para observação do surgimento de neoplasias pulmonares. Esse estuCom base
do demonstrou uma redução na
nesses
dados,
ordem de 20,3% na mortalidade
após 8 anos de seguimento me- começa a ficar
diano. Entretanto, a comunidade
claro que a
científica mundial aguarda ainda triagem pode
a publicação destes dados. Neste
realmente
contexto, o artigo aqui apresenimpactar na
tado novamente sugere um forte
mortalidade
impacto da utilização da triagem por câncer de
com TC seriada. Com base nesses
pulmão.
dados, começa a ficar claro que a
triagem pode realmente impactar na mortalidade por câncer de pulmão. Entretanto, algumas
questões ainda precisarão ser respondidas antes
que esta estratégia se torne realidade. Qual a real
magnitude da redução de mortalidade? Por quanto tempo deverá ser realizada e qual o momento
ideal para se iniciar a triagem? Qual a melhor conduta para pacientes com nódulos detectados pela
triagem? Como diferenciar nódulos agressivos de
indolentes? Em dois estudos europeus (NELSON
e MILD) estão sendo incluídos voluntários para
triagem em diferentes frequências de exames e
certamente adicionarão importantes informações.
Ademais, novos softwares estão em desenvolvimento para melhor esclarecer o significado dos
nódulos detectados, utilizando-se medidas de
volume, e assim direcionar a conduta do médico
assistente. Por fim, esses dados serão essenciais
para a realização de análises de custo-efetividade
e utilidade, especialmente em países de recursos
limitados como o Brasil.
Periódico Científico • Instituto COI • Janeiro / Fevereiro de 2011 • Ano IV • Número 14
11 Atualizações
Henschke C, Boffetta P, Gorlova O, Yip R, Delancey J, Foy M
LUIZ HENRIQUE ARAÚJO
CARLOS GIL FERREIRA
CLARISSA BALDOTTO
MAURO ZUKIN
DESTAQUES
San Antonio 2010
ASH
San Antonio 2010
ALINE COELHO GONÇALVES
12 Destaques | San Antonio, ASH
Entre os dias 8 a 12 de dezembro aconteceu em San Antonio, no Texas, o 33º Simpósio de Câncer de Mama.
Esse é um dos eventos mais esperados do ano e reúne cientistas e médicos do mundo todo para apresentar
e debater as novidades sobre câncer de mama.
Neoadjuvância
Neste ano foi dado um destaque importante ao
tratamento neoadjuvante com o uso de drogas
alvo. Para as pacientes com câncer de mama
HER2 positivo foram apresentados 3 grandes estudos com uso de anti-HER2: o GEPARQUINTO,
o NeoSphere e o NeoALTTO.
Untch apresentou os dados do estudo alemão
GEPARQUINTO, que comparou o uso de trastuzumabe vs lapatinibe associados à quimioterapia
no tratamento neo-adjuvante. Os resultados mostraram uma taxa de resposta patológica completa
(RPC) de 45% nas pacientes que usaram trastuzumabe e 29% nas que usaram lapatinibe. Com significância estatística, esses dados corroboraram os
dados do GEPARQUARTO, com efetividade do
uso de trastuzumabe na neo-adjuvância e, além
disso, mostraram a superioridade dessa medicação em relação ao lapatinibe neste cenário.
O NeoSphere foi apresentado por Gianni. O desenho desse estudo de fase II teve 4 braços de tratamento neoadjuvante: taxotere + herceptin (TH);
taxotere + herceptin + pertuzumabe (THP); herceptin + pertuzumabe (HP); taxotere + pertuzumabe (TP). Os resultados mostraram uma taxa de
RPC de 29% com TH, 45,8% com THP, 16,8% com
HP e 24% com TP. Também com significância estatística, esses dados demonstraram superioridade
da combinação de 2 agentes alvo e quimioterapia
no tratamento do câncer de mama HER2 positivo.
Baselga apresentou o NeoALTTO, um estudo de
fase III neoadjuvante, randomizado com 3 grupos:
paclitaxel + lapatinibe (PL); paclitaxel + herceptin
(PH); paclitaxel + herceptin + lapatinibe (PHL). A
taxa de RPC foi de 51,3% (PHL) comparada a 29,5%
(PH) e 24,7% (PL), com significado estatístico.
Se as estratégias descritas acima se consolidarem,
esse simpósio será lembrado para sempre como
um prenúncio do tratamento neoadjuvante do
câncer de mama HER2 positivo.
Os dados do GEPARQUINTO para as pacientes
com câncer de mama HER2 negativo foram aprePeriódico Científico • Instituto COI • Janeiro / Fevereiro de 2011 • Ano IV • Número 14
sentados por Minckwitz. Nesse estudo neoadjuvante, foi avaliado o uso de epirrubicina + ciclosfofamida (EC) seguido de docetaxel com ou sem
bevacizumabe. Os resultados desse estudo não
mostraram diferença significativa entre os grupos. Nos tumores triplos negativos, a taxa de RPC
tende a ser maior no grupo do bevacizumabe.
Adjuvância
O resultado do estudo finlandês FinXX foi exposto. Nesse estudo, cuja primeira análise já foi publicada em 2009 na Lancet Oncology, foi avaliado
no cenário adjuvante o uso de docetaxel seguido
de 5FU + epirrubicina+ ciclofosfamida (FEC) vs
docetaxel + xeloda seguido de ciclofosfamida +
epirrubicina + xeloda (CEX). Em 10 anos de seguimento, não houve diferença de sobrevida global (SG) e sobrevida livre de recidiva (SLR) entre
os grupos, porém na análise de subgrupos, as pacientes com tumor triplo negativo e as com mais
que 3 linfonodos positivos tiveram vantagem em
relação à SLR com uso do xeloda.
O'Shaughnessy expôs os primeiros dados de eficácia do estudo de fase III adjuvante que compara antraciclina + ciclofosfamida (AC) seguido de
docetaxel com ou sem xeloda em pacientes com
estádio precoce e de alto risco. Num total de 2.611
pacientes, após um acompanhamento mediano
de 5 anos, houve diferença estatística na SG (HR
0,68; P=0,011) a favor do xeloda, porém na SLR
não houve diferença até o momento. Uma análise
de subgrupo sugeriu um benefício do xeloda nos
tumores com Ki67 aumentado.
Outra apresentação relevante no cenário adjuvante foi a atualização dos 10 anos de acompanhamento do BICRG0001 que confirmou a superioridade na SLR e SG do uso adjuvante de docetaxel
+ antraciclina + ciclofosfamida (TAC) comparado
ao 5FU + antraciclina + ciclofosfamida (FAC) nas
pacientes operáveis com axila positiva. A taxa
de insuficiência cardíaca foi semelhante (3,5% vs
2,3%) e não houve toxicidade tardia. As diferenças
mais significantes em relação à toxicidade foram
Hormonioterapia
Em relação à hormonioterapia, alguns estudos
interessantes foram apresentados nos diversos
cenários neoadjuvante, adjuvante e metastático.
No estudo neoadjuvante ACOZOG Z1031, foi
comparado o uso dos inibidores de aromatase
(IA) anastrozol, letrozol e exemestano nas pacientes na pós-menopausa e não mostrou diferença significativa clínica nem biológica entre os
grupos. Esses resultados predizem que provavelmente não haverá diferença de eficácia entre
essas drogas nos estudos adjuvantes.
A análise final dos dados do estudo NCIC CTG
MA.27 foi apresentada por Goss. Nesse estudo
adjuvante, foi comparado pela primeira vez o
uso de 5 anos de anastrozol (IA não esteroidal) vs
exemestano (IA esteroidal) nas pacientes na pós-menopausa. Após 4 anos de acompanhamento,
os resultados não mostraram diferenças entre
os grupos, e o exemestano provavelmente será
aprovado como mais uma opção de hormonioterapia adjuvante por 5 anos.
O estudo FIRST, já publicado em outubro de
2010 no Journal of Clinical Oncology, também foi
apresentado. Neste estudo de fase II, randomizado, foi avaliado como tratamento em primeira
linha paliativa o uso de fulvestranto 500mg vs
anastrozol 1mg em mulheres na pós- menopausa
com câncer de mama metastático com receptor
hormonal positivo. Com um acompanhamento
mediano de 16 meses, os dados revelaram uma
redução do risco de progressão de 35% (P=0,01)
a favor do uso do fulvestranto.
Novas Combinações
No estudo BALI I, de fase II, randomizado, foi
avaliada a combinação de cisplatina e cetuximabe vs cisplatina isolada nas pacientes com tumor
triplo negativo metastático (primeira ou segunda
linha). A combinação de drogas é responsável por
redução do risco de progressão de 32,5% (P=0,032)
e sobrevida livre de progressão (SLP) mediana de
3,7 vs 1.,5 meses.
No estudo de fase II TAMRAD, foi analisada a
combinação de everolimus e tamoxifeno vs tamoxifeno nas pacientes com tumor metastático RH
positivo e HER2 negativo previamente tratadas
com IA. Em um total de 111 pacientes avaliadas,
a taxa de beneficio clínico foi de 42,1 vs 61,1% e o
tempo livre de progressão mediano foi de 4,5 vs
8,5 meses a favor da combinação.
Obesidade e Câncer de Mama
Outro tema de destaque no simpósio foi a relação
entre obesidade e câncer de mama. Sparano mostrou dados do estudo em que foi avaliado o índice
de massa corporal com a SLR e a SG nas pacientes
que participaram dos estudos de adjuvância do
ECOG. Essa análise mostrou piora na SLR e SG
nas pacientes obesas e com receptores de hormônio positivos.
Em uma análise multivariada do estudo adjuvante
ADEBAR, mostrou-se que a obesidade é um fator
de pior prognóstico independentemente de outras variáveis. Esses estudos, dentre outros sobre
obesidade e câncer de mama, reforçam cada vez
mais a importância da orientação nutricional, da
realização de exercícios físicos e da perda de peso
como parte do tratamento do câncer de mama.
Linfonodo Sentinela
Julian apresentou os resultados do NSABP B-32.
Nesse estudo foram recrutadas pacientes com axila clinicamente negativa e randomizadas para a
biópsia do linfonodo sentinela (BLS) seguida de
dissecção axilar imediata ou BLS com dissecção
somente se linfonodo sentinela (LS) positivo. Em
um total de 5.611 pacientes, 1.390 tinham LS positivo (422 macrometástases, 312 micrometástases e
626 desconhecidos). Noventa e sete por cento das
pacientes com LS positivo receberam quimioterapia adjuvante. As pacientes com micrometástase e
com LS negativo tiveram SG e SLR semelhantes e
superiores àquelas com macrometástase.
Periódico Científico • Instituto COI • Janeiro / Fevereiro de 2011 • Ano IV • Número 14
13 Destaques | San Antonio, ASH
com neutropenia febril (25% TAC vs 3% FAC), astenia (32% TAC vs 24% FAC) e amenorréia (47%
TAC vs 30% FAC).
No AZURE Trial, foi avaliado o uso do ácido
zoledrônico associado ao tratamento adjuvante
padrão nas pacientes com câncer de mama em
estádio II e III. Os resultados não mostraram diferença na SG e SLR da população geral do estudo.
Na análise de subgrupo, as pacientes acima de 60
anos ou com mais de 5 anos pós-menopausa tiveram vantagem em SG e SLR. Esses resultados
foram diferentes dos resultados do ABCSG XII, e
para os que acreditavam no benefício dessa droga no cenário adjuvante, foram considerados “a
grande decepção de San Antonio”.
ASH
MARCIO HORI • JULIANE MUSACCHIO
O 52º Congresso da American Society of Hematology (ASH) foi realizado em Orlando, EUA, entre 10 e 13
de dezembro de 2011. Discutiremos aqui os principais trabalhos apresentados.
Trombocitopenia Imune Primária
Em um estudo de fase III foi comparado o tratamento dos pacientes adultos com trombocitopenia imune primária (PTI) com dexametasona em
alta dose ou prednisona, e foi verificado que não
houve diferença de eficácia entre os dois tratamentos. Foram apresentados estudos utilizando-se os análogos da trombopoietina: romiplostina
e eltrombopag. A romiplostina foi bem tolerada,
com reações adversas leves que não aumentaram
com o uso continuado da droga. A resposta e a
dose utilizada permaneceram constantes por um
tempo prolongado. Seu uso possibilitou a parada ou a redução de dose ≥ 25% em pacientes que
estavam em uso de outras medicações. Em outro
estudo (Gráfico 1), o eltrombopag se mostrou eficiente na manutenção de plaquetas ≥ 50.000/mm3
e na redução de sangramentos, com boa tolerabilidade mesmo após 3 anos de uso. Foi verificada a
inexistência de aumento na incidência de eventos
tromboembólicos a despeito do uso prolongado
de eltrombopag em outro trabalho.
200
150
Contagem de plaquetas
14 Destaques | San Antonio, ASH
Gráfico 1: Contagem mediana de plaquetas por semana com uso
de eltrombopag em pacientes com PTI
100
50
0
0
10 20 30 40 50 60 70 80 90 100 110 120 130 140 150 160
Semana
N
299 216 138 107 94
83
79 71
72
53
51 31 12
15
12 13
4
Periódico Científico • Instituto COI • Janeiro / Fevereiro de 2011 • Ano IV • Número 14
Síndromes Mielodisplásicas
Em um estudo no qual foi avaliada a presença
de mutações pontuais em pacientes com mielodisplasia (MDS), verificou-se que as mutações
nos genes RUNX1, TP53 e ASXL1 foram preditores independentes da sobrevida global reduzida. Em outro estudo com número pequeno
de pacientes, foi demonstrada uma redução
da sobrevida global também em pacientes com
mutações no gene DNMT3A, o que poderia ser
usado na estratificação de risco de pacientes com
mielodisplasia. Foi validado em um trabalho o
modelo de avaliação prognóstica de risco do MD
Anderson Cancer Center (MDAS): dos 520 pacientes classificados pelo IPSS como risco baixo ou
intermediário-1, 137 (26%) foram reestratificados
como pacientes de risco intermediário-2 ou alto
risco pelo MDAS. Em um estudo retrospectivo,
foi avaliada a sobrevida global em 3 anos de pacientes com MDS com mais que 60 anos de idade
tratados com 5-azacitidina ou transplante alogênico de medula óssea, cujos melhores resultados
ocorreram no segundo grupo.
Leucemia Mielóide Aguda
Foi demonstrada que a presença da mutação do
gene DNMT3A, presente em uma grande proporção de pacientes com leucemia mielóide aguda
(LMA) de novo com citogenética de risco intermediário, é independentemente associada à sobrevida global reduzida. Em dois estudos foram
evidenciados resultados conflitantes acerca do
efeito prognóstico das mutações do gene TET2.
Em relação ao tratamento, em um estudo de fase
II foi demonstrada atividade da combinação de
clofarabina à idarrubicina e citarabina no tratamento de pacientes com LMA refratária ou recaída. A adição de bortezomibe ao esquema “7+3”
em pacientes idosos (60 a 75 anos) foi tolerável e
apresentou uma taxa de remissão tão alta quanto
o esperado com o esquema 7+3. Em um estudo de
fase I/II, foi demonstrada que a adição de lenalidomida à quimioterapia intensa nos pacientes
Leucemia Linfóide Aguda
Em um estudo em crianças com leucemia linfoblástica aguda (LLA), verificou-se que a presença
da deleção IKZF1 é um fator prognóstico independente, que poderia ser utilizado em estudos
futuros para estratificação precoce de risco na
LLA pediátrica. Outro trabalho verificou que o
uso de PEG asparaginase resulta em uma menor
taxa de alterações hepáticas, assim como toxicidades grau 4, quando comparado ao uso de L-asparaginase. Foi observado que, independentemente
do tipo de preparação utilizada, a toxicidade foi
maior em pacientes mais velhos. Em um estudo
do grupo alemão, foi demonstrado que em pacientes adultos com LLA, o aumento da dose de
PEG asparaginase na indução e na consolidação
levou ao aumento de sobrevida global e do tempo
de remissão, às custas de maior toxicidade hepática, que poderia levar a atrasos na administração
de quimioterapia e a um pior prognóstico. Os resultados finais do estudo UKALLXII/ECOG2993
revelaram que o recebimento de imatinibe durante a indução aumenta significativamente as taxas
de remissão completa e a chance de realização de
transplante de medula óssea (TMO) alogênico, o
que implica em maior sobrevida livre de eventos,
sobrevida global e sobrevida livre de recaída. Os
melhores resultados neste estudo foram obtidos
com início mais precoce de imatinibe e com a realização de TMO alogênico. Foram demonstrados
resultados melhores com o início precoce e mais
prolongado do imatinibe em pacientes submetidos ao TMO alogênico, que permanece como
tratamento de escolha em pacientes que alcançam uma boa resposta molecular ao tratamento
inicial. Verificou-se que o uso de dasatinibe e
quimioterapia de baixa intensidade em pacientes
idosos com LLA Filadelfia positivo é altamente
eficaz, com taxa de remissão completa de 90% e
sobrevida livre de recaída de 22,1 meses, sendo a
maioria das recaídas associada à mutação T315I.
Neoplasias Mieloproliferativas e Leucemia
Mielóide Crônica
Nos estudos apresentados, foi demonstrada superioridade de nilotinibe e dasatinibe quando
comparados ao imatinibe nos pacientes recém-diagnosticados com leucemia mielóide crônica
(LMC). O ponatinibe demonstrou um bom perfil
de tolerabilidade em doses eficazes nos pacientes com LMC resistentes aos outros inibidores de
tirosina-quinases ou com a mutação T315I. Nos
trabalhos apresentados, foram verificados resultados preliminares promissores do uso de inibidores de JAK2 em pacientes com trombocitemia
essencial e policitemia vera. Um desses agentes
(CYT387) levou, em um estudo fase I/II, à melhora na anemia, esplenomegalia e sintomas constitucionais de pacientes com mielofibrose.
Mieloma múltiplo
Em um estudo, foram comparados os esquemas
dexametasona com talidomida ao com bortezomibe, dexametasona e talidomida como indução
e consolidação antes e após duplo TMO autólogo.
Foi observada uma sobrevida livre de progressão
mais prolongada no esquema com bortezomibe.
Outro trabalho para avaliação da associação de
bortezomibe à dexametasona, ciclofosfamida e
lenalidomida, nos pacientes com mieloma múltiplo não tratados, demonstrou uma toxicidade
hematológica levemente maior sem aumento
substancial da taxa de resposta em relação às
combinações de 3 das 4 drogas. A associação das
drogas carfilzomibe, lenalidomida e dexametasona parece ser promissora. Um estudo onde se
comparou o uso da combinação de lenalidomida
Periódico Científico • Instituto COI • Janeiro / Fevereiro de 2011 • Ano IV • Número 14
15 Destaques | San Antonio, ASH
com mielodisplasia de alto risco e LMA resultou
em uma maior taxa de remissão completa sem
maior toxicidade em relação à quimioterapia isolada. Em outro trabalho, foi mostrado que a realização de transplante de medula óssea autólogo em
paciente com LMA em primeira remissão resulta
em menor taxa de recaída, melhor sobrevida livre
de recaída e regeneração hematopoiética em relação àqueles tratados com quimioterapia de consolidação após o 2° ciclo, mas sem levar à alteração
na sobrevida global. Foi apresentado um modelo
de escore que utiliza critérios clínicos, citogenéticos e moleculares para estimar a taxa de remissão
completa e óbito precoce em pacientes idosos com
LMA a serem tratados de maneira intensiva, que
foi testada em uma população e validada em outra. Um estudo de uma única instituição avaliou
o uso de decitabina em pacientes com LMA de
novo ou secundária à mielodisplasia, atingindo a
remissão completa em 29% após uma mediana de
4 ciclos, com duração mediana da remissão de 393
dias e sem quaisquer infecções fúngicas invasivas.
16 Destaques | San Antonio, ASH
e dexametasona no tratamento de indução seguido por TMO autólogo precoce ou uso contínuo
de lenalidomida demonstrou benefícios em sobrevida global do emprego de TMO precoce após
a indução. Em pacientes que não são candidatos
ao TMO, o tratamento com a combinação de melfalan, prednisona com lenalidomida, seguida de
lenalidomida contínua resultou em maior taxa
de resposta global, com respostas mais rápidas
e de melhor qualidade, com grande redução do
risco de progressão. Um estudo do grupo italiano
demonstrou que o uso de esquema bortezomibe,
melfalan, prednisona e talidomida seguido de
manutenção com bortezomibe e talidomida (VT)
resultou em um aumento de sobrevida livre de
progressão nos pacientes idosos, além de evidenciar que a manutenção com VT tem um bom perfil de segurança e que a infusão semanal de bortezomibe reduziu os efeitos adversos sem afetar
sua atividade. Vários estudos com avaliação dos
efeitos do tratamento de manutenção revelaram
melhora na sobrevida livre de progressão, mas
não na sobrevida global. Outros estudos com novos agentes no tratamento do mieloma múltiplo,
tais como pomalidomida e carfilzomibe, introduzem, portanto, novas possibilidades promissoras
no tratamento dessa doença.
Leucemia Linfóide Crônica
Em um estudo com avaliação de pacientes com
linfocitose monoclonal de células B, foi observada uma sobrevida global inferior à população geral ajustada por sexo e idade, principalmente se
houver positividade para CD38. Foi apresentado
um trabalho de fase II onde se comparou o uso
de clorambucil com ou sem rituximabe em uma
população com mediana de idade de 70 anos com
leucemia linfóide crônica (LLC) sem tratamento
prévio. Verificou-se que a associação das drogas
levou a uma maior taxa de resposta global que
o uso isolado do clorambucil, com perfil de tolerabilidade aceitável, mas com taxas de remissões não tão boas quanto com o esquema FCR. Os
resultados de um estudo de fase II com alentuzumabe subcutâneo no tratamento de pacientes
com LLC refratária à fludarabina demonstraram
uma taxa de resposta de 49%, com benefícios em
sobrevida global e sobrevida livre de progressão,
principalmente naqueles que conseguiram obter
uma remissão molecular. A análise final do esPeriódico Científico • Instituto COI • Janeiro / Fevereiro de 2011 • Ano IV • Número 14
tudo que avaliou o impacto do tratamento com
ofatumumabe isolado nos pacientes com LLC refratários à fludarabina e alentuzumabe (FA ref) e
refratários à fludarabina com doença “bulky” (BF
ref) mostrou uma taxa de resposta global de 51%
para o grupo FA ref e 44% para o grupo BA ref.
Finalmente, foram divulgados os dados de estudos de fase I com duas medicações que interferem na via de sinalização do receptor da célula
B e que demonstraram atividade antitumoral e
perfis de tolerabilidade favoráveis: CAL-101, um
inibidor seletivo da fosfatidilinositol 3-quinase
P110, e PCI-32765, um inibidor da tirosina-quinase de Bruton.
Linfomas Hodgkin
O grupo alemão (GHSG- estudo HD10) já havia
definido 2 ciclos de ABVD seguido de radioterapia de campo envolvido na dose de 20 Gy como o
tratamento padrão para pacientes com linfoma de
Hodgkin em estádio inicial favorável sem fatores
de risco. Em outro estudo do mesmo grupo, com
pacientes com linfoma de Hodgkin em estádio
inicial desfavorável, foi comparado o tratamento
com 2 ciclos de BEACOPP escalonado seguido de
2 ciclos de ABVD e radioterapia de campo envolvido na dose de 30 Gy (esquema “2+2”) ou com
4 ciclos de ABVD seguidos de radioterapia de
campo envolvido na dose de 30 Gy. Houve maior
toxicidade aguda, mas não em longo prazo, com
o uso esquema “2+2” que levou a uma melhor
taxa de ausência de falência de tratamento e sobrevida livre de progressão, apesar de não haver
diferença na sobrevida global até o momento. Em
outro estudo foi demonstrado que os pacientes
com estádio IIB ou IIA com doença “bulky” têm
uma taxa de recaída muito maior que os pacientes com doença em estádio I ou IIA sem doença
“bulky”, devendo os primeiros ser incluídos em
estudo de doença avançada, de modo a não prejudicar a análise de resultados no outro grupo. Em
um estudo cooperativo de fase III foi comparado
o tratamento de pacientes com doença localizada
“bulky” ou avançada utilizando-se o protocolo
Stanford V ou 6 ciclos de ABVD seguido de radioterapia 36Gy (nos pacientes com “bulky” mediastinal). Não houve diferença significativa nas taxas
de resposta, sobrevida livre de falha, sobrevida
global ou toxicidade após 5 anos, com maior incidência de linfopenia grau 3 e neuropatia graus 3
Linfomas não-Hodgkin
Foi visto que o uso de rituximabe nos pacientes
assintomáticos com linfoma folicular resulta em
melhores resultados no tempo para novo tratamento e na sobrevida livre de progressão (Gráfico 2), mas sem vantagens em sobrevida global
em comparação com a observação (“watch and
wait”). Em um estudo randomizado (Gráfico 3),
foram analisados os efeitos da adição de rituximabe ao clorambucil nos pacientes com linfoma
MALT com resultado de aumento de sobrevida
livre de eventos com o tratamento combinado.
Em outro estudo multicêntrico randomizado, foi
comparado o tratamento dos pacientes com linfoma da zona do manto com 6 ciclos de R-CHOP
seguido de radioquimioterapia mieloablativa e
transplante autólogo de medula óssea ou, então,
ciclos alternados de 3 x R-CHOP e 3 x R-DHAP
seguido de condicionamento mieloablativo com
Gráfico 2: Sobrevida livre de eventos dos pacientes com
linfoma MALT em uso de clorambucil vs clorambucil
associado a rituximabe.
citarabina em alta dose e transplante autólogo.
Houve maior taxa de resposta completa e maior
tempo para falha de tratamento no segundo grupo, sem aumento significativo de toxicidade. No
entanto, é necessário um tempo de seguimento
maior para se avaliar os benefícios na sobrevida.
Em um estudo de fase I com PCI-32765, um inibidor oral da tirosina-quinase de Bruton (BTK),
para o tratamento de pacientes com linfomas B
refratários ou recaídos, foram evidenciadas respostas objetivas duradouras, com perfil de toxicidade favorável e ausência de toxicidade hematológica cumulativa, criando perspectivas para o
seu uso em novos estudos. Em outro estudo utilizando uma nova medicação, foi avaliado o impacto do uso isolado de romidepsina nos pacientes com linfoma T periférico em progressão ou
recidiva. Foram observadas respostas completas
e duradouras, tornando-a uma candidata forte à
inclusão em novos tratamentos para essa doença.
O uso de brentuximabe vedotina nos pacientes
com linfoma de células grandes anaplásico (um
subtipo CD30+ de linfoma T periférico) refratário ou recaído demonstrou uma taxa de resposta
de 86%, com 53% de remissão completa tanto em
paciente ALK positivos quanto ALK negativos.
Em um estudo, foram mostradas altas taxas de
resposta com o uso de pralatrexate nos pacientes
com linfoma T cutâneo recaído ou refratário.
Gráfico 3: Sobrevida livre de progressão de pacientes com
linfoma folicular tratados no braço A (watch and
wait), braço B (rituximabe x 4) e braço C (rituximabe
x 4 + manutenção com rituximabe).
1,0
0,9
0,8
75
0,7
Clorambucil + Rituximabe
Proporção
Sobrevida livre de eventos
100
Clorambucil
50
25
Log rank test, P=0,0024
0
0,6
0,5
0,4
0,3
0,2
0
1
2
3
4
5
6
Braço A
Braço B
Braço C
7
0,1
Anos
PACIENTES EM RISCO
0,0
CLORAMBUCIL
113
87
74
62
43
29
10
2
CLORAMBUCIL
+ RITUXIMABE
114
99
91
80
67
42
13
0
0
6
12
18
24
30
36
42
48
Meses da Randomização
Periódico Científico • Instituto COI • Janeiro / Fevereiro de 2011 • Ano IV • Número 14
17 Destaques | San Antonio, ASH
e 4 no grupo tratado com o protocolo Stanford V.
No estudo HD15 do grupo alemão, foi analisado
o valor do PET negativo após o tratamento com
BEACOPP, encontrando-se um valor preditivo
negativo de 95%, o que sugere que aqueles que
apresentem doença residual após o tratamento
podem ser poupados de radioterapia adicional.
Finalmente, nos estudos de fase utilizando-se
brentuximabe vedotina (SGN-35) e panobinostate
oral nos pacientes refratários ou recaídos previamente tratados de forma intensa, foi demonstrada
atividade antitumoral encorajadora.
ANALISANDO OS NÚMEROS DOS ARTIGOS
JULIANE MUSACCHIO
Gerente de Hematologia da COI – Clínicas Oncológicas Integradas
Mestre em Hematologia pela UFRJ
Doutora em Medicina pela UFRJ
18 Analisando os Números dos Artigos
Tamanho amostral: há um número mágico?
Uma das perguntas mais comumente feita pelos médicos pesquisadores aos estatísticos é: “de
quantos pacientes eu preciso para obter um resultado significativo no meu estudo?” É o número
mágico! Na indústria manufatureira, é permitido
testar centenas de componentes para se chegar a
um resultado conclusivo, mas na pesquisa médica, o tamanho amostral deve ser grande o suficiente para fornecer uma resposta adequada para
a pergunta elaborada.
Se a amostra for muito pequena, será uma perda
de tempo fazer o estudo, pois os resultados serão
inconclusivos. E, se a amostra for muito grande,
vários indivíduos podem receber um tratamento
que talvez já fosse ineficaz em uma amostra com
um tamanho menor.
Uma outra razão de se estimar o tamanho amostral, além da justificativa científica para se fazer
um estudo, é calcular os seus custos que determinarão a factibilidade do mesmo, conforme o seu
orçamento. O conhecido (até então desconhecido)
número mágico ajudará o pesquisador a avaliar a
duração do estudo.
Por exemplo, se o tamanho amostral calculado for
de 30 indivíduos, um número manejável, mas a
expectativa de inclusão for de 5 pacientes ao ano,
admitindo-se que todos assinariam o termo de
consentimento, tal estudo levaria 6 anos para ser
completado. Nesta situação, o desenvolvimento
de um estudo multicêntrico deve ser encorajado.
Em um estudo científico, a hipótese nula deve ser
rejeitada. Isto já vem de um argumento filosófico onde é mais fácil provar que uma afirmativa
é falsa que verdadeira. Como ilustração, se dizemos que todas as cadeiras têm quatro pernas e
se virmos uma com três pernas, a hipótese inicial
é desqualificada.
Desta forma, se estamos interessados em comparar dois tipos de tratamento, a hipótese nula será
que não há diferença entre eles vs a hipótese alternativa que será que há sim diferença. Ainda
sob o aspecto filosófico, se não formos capazes de
Periódico Científico • Instituto COI • Janeiro / Fevereiro de 2011 • Ano IV • Número 14
rejeitar a hipótese nula, isso não quer dizer que
ela seja verdadeira: somente não temos evidências
suficientes para rejeitá-la.
Além disso, ao rejeitar a hipótese nula, nós podemos cometer o erro tipo I, ou seja, rejeitar a hipótese nula quando ela for verdadeira. Nunca devemos
escrever que os nossos resultados são corretos,
mas quanto de erro podemos ter cometido.
Se eu verifico, após a condução de um estudo
em uma população onde anteriormente não havia qualquer diferença entre dois tipos de tratamento, uma diferença significativa entre as duas
modalidades terapêuticas através de um valor de
P<0,05, há somente duas explicações para isso,
considerando-se que há um controle adequado
dos possíveis vieses.
A primeira é que efetivamente não há diferença, e
que isto ocorreu ao acaso. Se o valor de P for 0,02, a
diferença significativa devido ao acaso é de 2%. Se
o valor de P for muito pequeno (P<0,0001), então
a chance de isto ocorrer ao acaso é ainda menor
e, provavelmente, deve haver diferença entre os
tipos de tratamento, ainda que haja uma possibilidade muito pequena de o resultado estar errado.
A segunda explicação é não sermos capazes de
rejeitar a hipótese nula quando ela é realmente
falsa, o chamado erro tipo II. Como já foi dito, o
objetivo principal de um estudo clínico é rejeitar
a hipótese nula, e ele pode ser atingido controlando-se o erro tipo II. Isto é dado pela força do
estudo (1- erro tipo II), que é a probabilidade de
rejeitar a hipótese nula quando ela é falsa. Quanto maior a força do estudo, maior deve ser o tamanho da amostra requerida.
Assim, para a estimativa do tamanho amostral, algumas informações devem estar disponíveis:
(1) tipo de comparação: estudos de superioridade, de
equivalência ou de não inferioridade (vide Periódico
Científico volume 13 ano 4 em www.coinet.com.br);
(2) tipo de configuração: desenho paralelo ou de crossover;
(3) erro tipo I que deve ser geralmente 5% com valor
de P bicaudal;
O tamanho do efeito do tratamento deve especificar a diferença clínica aceita entre os dois tipos
de tratamento que o pesquisador deseja observar
no estudo. Existem três formas de saber o seu tamanho: (a) através do levantamento da literatura
existente sobre o assunto, (b) se não há estudos
disponíveis, deve-se fazer um pequeno estudo
piloto para determiná-lo, e (c) expectativa clínica.
Por fim, e não menos importante, para se calcular o
tamanho da amostra, deve-se definir o desfecho primário. Vamos então colocá-lo como a 6ª informação:
(6) definição do desfecho primário.
Primeiramente, devemos definir se o desfecho
primário de interesse é uma variável dicotômica
(sim/não, sucesso/falência) ou contínua. Para ilustrar, vamos a um exemplo de desfecho dicotômico.
Por exemplo, 25% dos pacientes submetidos a um
tratamento padrão têm uma boa evolução, mas somente um incremento absoluto de 40% (tamanho
do efeito) é de relevância clínica, isto é, 65% dos
pacientes devem ter um desfecho com sucesso. A
pergunta é: de quantos pacientes precisamos para
observar uma diferença significativa?
Assim, para este estudo com a utilização de um
teste bicaudal de 5%, a amostra estimada é de
20,49 x 2, ou seja, 42 indivíduos.
No entanto, nem sempre é preciso fazer cálculos por si só. Atualmente, há muitos programas
de computador disponíveis na internet para isto.
Somente para citar alguns destes programas,
temos hoje o STATA (www.stata.com), SPSS
(www.spss.com) e Power and Precision (www.poweranalysis.com).
O objetivo principal, no entanto, é entender as ordens dadas ao computador. Ao se entrar com os
dados para o cálculo do tamanho amostral em um
programa, ao menos que uma mensagem de erro
seja dada pelo computador, o número mágico é
gerado e prontamente aceito pelo usuário.
Porém, para que este número seja correto, a fórmula certa deve ser utilizada para o tipo certo de
desenho e desfecho primário.
Agora, se a intenção é realizar um estudo de equivalência ou não inferioridade ou com análise de
sobrevida, é recomendável consultar um estatístico para se obter o tal “número mágico”.
Em caso de dúvidas, entre em contato:
[email protected].
Caímos na velha pergunta sobre o tamanho amostral, mas que pode ser resolvida com uma fórmula
muito simples:
N = 7,9 x Y1 (1 – Y1) + Y2 (1-Y2)
(Y1-Y2) 2
onde 7,9 é uma variável contínua para uma
força de 80%, enquanto que 10,5 seria para
uma força de 90%.
No nosso exemplo, temos que Y1 é 25% ou 0,25 e Y2
é 65% ou 0,65, e a fórmula fica da seguinte forma:
N = 7,9 x [0,25 (1-0,25) + 0,65 (1-0,65)] = 20,49
(0,25-0,65) 2
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
1. Fayers PM, Machin D. Sample size: how many subjects patients are necessary? Brit J Cancer. 1995;72:1-9.
2. Muller KE, Benignus VA. Increasing scientific power with statistical power. Neurotoxicol Teratol. 1992;14:211-219.
3. Chan YH. Study design considerations – study configurations, introduction to clinical trials, editores Karlberg J e
Tsang K. 1998; pp: 249-257.
4. Chan YH. Randomized controlled trials – sample size. Sing
Med. 2003;44:172-174.
Periódico Científico • Instituto COI • Janeiro / Fevereiro de 2011 • Ano IV • Número 14
19 Analisando os Números dos Artigos
(4) força do estudo com valor de 80% a 90%;
(5) tamanho do efeito do tratamento.
FARMACOLOGIA
FERNANDO METON1,2
JULIANE MUSACCHIO1,3
1- Médicos da COI – Clínicas Oncológicas Integradas
2- Médico Oncologista da Coordenação de Pesquisa Clínica do INCA
3- Médica Hematologista da Coordenação de Pesquisa Clínica do INCA
20 Farmacologia
Inibidores de osteólise
As alterações ósseas nos pacientes com câncer
incluem a perda da massa óssea relacionada ao
tratamento e às metástases ósseas, sendo o osso
um local comum de recidiva para muitos tipos de
tumores sólidos, especialmente pulmão, mama e
próstata. Os bifosfonados e outros agentes sistêmicos podem prevenir, reduzir e retardar estas
complicações, através da diminuição da incidência de fraturas, instabilidade esquelética, perda
da integridade óssea, compressão da medula espinhal, necessidade de cirurgia e radioterapia das
metástases ósseas sintomáticas e hipercalcemia.
São análogos do pirofosfato, com um carbono
no local do oxigênio central. As cadeias laterais
ao carbono central fornecem a afinidade à hidroxiapatita, o principal mineral ósseo, e a sua potência. Desta forma, os bifosfonados diminuem a
reabsorção óssea e aumentam a mineralização por
inibir a atividade osteoclástica.
Os bifosfonados têm um efeito apoptótico direto nos osteoclastos, afetam a sua diferenciação
e maturação, e atuam, portanto, como potentes
inibidores da reabsorção óssea. Em modelos pré-clínicos, têm influência nos macrófagos, células
T gama delta, osteoblastos e células tumorais. Podem ter um efeito antitumoral e antiangiogênico,
mas isto é controverso.
Há duas classes de bifosfonados: com nitrogênio
(pamidronato, alendronato, ibandronato, risedronato e ácido zolendrônico) e sem nitrogênio
(etidronato, clodronato e tiludronato). Os que
contêm nitrogênio são os mais potentes inibidores de osteólise.
O tratamento é geralmente bem tolerado. As complicações mais comuns são reação de fase aguda
com febre, calafrios, mialgia e artralgia que ocorre
tipicamente nas primeiras 48 horas de infusão em
até 50% dos pacientes, inflamação ocular, insuficiência renal, distúrbio hidroeletrolítico e osteonecrose de mandíbula.
A nefrotoxicidade é dose e tempo de infusão dependente e a função renal deve ser monitorada
nos pacientes que fazem uso desta medicação. A
toxicidade renal pode ser reduzida observando-se
Periódico Científico • Instituto COI • Janeiro / Fevereiro de 2011 • Ano IV • Número 14
o tempo de infusão recomendado, otimizando-se
a hidratação antes da infusão e evitando-se as medicações nefrotóxicas. Ademais, monitorações periódicas de cálcio, magnésio e fosfato devem ser
feitas durante o tratamento.
A osteonecrose de mandíbula foi descrita pela
primeira vez em 2003 com o uso dos bifosfonados
de alta potência. A causa é desconhecida e a sua
frequência na prática clínica é incerta, mas parece
ser maior o risco com o ácido zolendrônico do que
com o pamidronato.
Se não houver contraindicações, os pacientes devem receber suplementação com cálcio e vitamina D, pois isto diminui o risco de hipocalcemia
induzida pelo bifosfonado e mantém a saúde óssea. Um estudo demonstrou que 50% das pacientes com câncer de mama em uso de bifosfonado
apresentavam deficiência de vitamina D e cálcio.
Nos pacientes com mieloma múltiplo, o tratamento com bifosfonado venoso é recomendado nos
casos de destruição óssea ou fratura com compressão de medula espinhal, osteopenia isolada
na densitometria óssea, dor devido à osteólise, e
adjuvante à radioterapia, analgesia ou intervenção cirúrgica para a estabilização de fraturas.
O denosumabe é uma outra classe de inibidor de
osteólise que atua no ligante do receptor de ativação do NFkB (RANKL). A expressão de RANKL
no osso parece contribuir para o desenvolvimento de metástases por se ligar ao seu receptor na
superfície das células tumorais. Essa medicação é
um anticorpo monoclonal anti-RANKL que tem
demonstrado eficácia no manejo da osteoporose
na pós-menopausa e em pacientes com câncer de
mama e próstata devido ao uso de terapia endócrina com inibidores da aromatase ou privação
androgênica, mas não para pacientes com mieloma múltiplo. A dose recomendada do denosumabe é 120mg por via subcutânea a cada 4 semanas.
Outras medicações têm sido investigadas para
tratamento das alterações ósseas nos pacientes
com câncer metastático e incluem o dasatinibe,
um inibidor da tiroquinase Src e inibidores da
catepsina K.
SEÇÃO MULTIDISCIPLINAR
PSICOLOGIA
VANESSA ANTUNES1,2
LAURA CAMPOS1,3,4
1- Psicóloga da COI – Clínicas Oncológicas Integradas
2- Especialista em Psico-Oncologia pelo Instituto Nacional de Câncer – INCA
3- Especialista em Psico-Oncologia pelo Hospital do Câncer – AC. Camargo
4- Mestre em Ciências da Oncologia pelo Hospital do Câncer – AC. Camargo
Depressão e transtorno de ajustamento
De acordo com a classificação
Existe uma
pelo CID-10, o episódio decrença
pressivo (CID F32) possui três
equivocada
categorias conforme o grau de
de que todo
intensidade leve, moderado e
sintoma
grave. Os principais sintomas
depressivo ou
são o humor deprimido, a peralteração de
da de interesse e prazer, com
humor está
energia e atividade diminuíinvariavelmente das. Outros sintomas também
ligado a um
podem estar presentes, tais
quadro de
como concentração e atenção
depressão.
reduzidas, baixas auto-estima
e autoconfiança, ideias de culpa e inutilidade,
visões desoladas e pessimistas do futuro, ideias
ou atos autolesivos ou de suicídio, sono perturbado e alterações do apetite. Para chegarmos a
tal diagnóstico é necessário que a duração destes sintomas seja de, no mínimo, duas semanas
e que sejam apresentados pelo menos quatro
destes sintomas no período. É importante investigar, também, um possível histórico depressivo,
pois este fato aumenta a possibilidade de uma
recorrência do quadro.
O transtorno de ajustamento (CID F43.2), por sua
vez, é definido como estados de angústia subjetiva e perturbação emocional, que usualmente
interfere no funcionamento e no desempenho
sociais, e que surgem em um período de adaptação a uma mudança significativa de vida ou em
consequência de um evento de vida estressante,
incluindo-se a presença ou a possibilidade de
doença física. A predisposição e a vulnerabilidade individual desempenham um papel impor-
tante no risco de ocorrência deste quadro. Cabe
salientar que o transtorno não teria surgido ou
se desenvolvido sem a presença do agente estressor, como, por exemplo, um diagnóstico de
câncer. As manifestações clínicas desse transtorno incluem humor deprimido, ansiedade,
preocupação, sentimento de incapacidade de
adaptação, de planejar o futuro ou de continuar
a situação atual, e algum grau de incompetência
no desempenho da rotina diária. O início é costumeiramente dentro de um mês da ocorrência
do evento estressante ou mudança de vida, e a
duração dos sintomas, geralmente, não excede a
seis meses.
Vale ressaltar que muitos dos sintomas ou queixas somáticas dos pacientes com câncer podem
ser originários da própria doença e dos eventos
adversos dos tratamentos vigentes. Portanto,
para fazer um diagnóstico psicológico preciso,
além do conhecimento técnico, é imprescindível
considerar estas questões e contextualizar o momento vivido pelo paciente.
A maior implicação em diferenciar estes dois
importantes diagnósticos psicológicos, tão presentes na vida dos pacientes com doença oncológica, é a escolha correta da estratégia terapêutica. Neste sentido, além do acompanhamento
psicológico ao paciente, é fundamental avaliar
a necessidade da introdução ou não de psicofármacos aliados à psicoterapia. Por isso, ao escolher um agente farmacológico, o clínico deve
levar em consideração o prognóstico e a duração
do tratamento. Assim, a equipe multidisciplinar
alcança o que tanto almeja: uma assistência integrada e global, com vistas à melhor qualidade de
vida dos pacientes.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. Breitbart, W, Dickerman, BA. Final da Vida: Atualizacão em
Depressão. Cuidados Paliativos, São Paulo 2009. p.8-15.
2. Classificacão de Transtornos Mentais e de Comportamento
da CID-10: Descricões Clinicas e Diretrizes Diagnosticas - Coord. Organiz. Mund. da Saude; trad. Dorgival Caetano. Porto
Alegre: Armed, 1993.
Periódico Científico • Instituto COI • Janeiro / Fevereiro de 2011 • Ano IV • Número 14
21 Seção Multidisciplinar
A depressão, seus sinais e sintomas são, muitas
vezes, mal compreendidos, apesar deste ser um
diagnóstico de saúde mental cada vez mais frequente. Existe uma crença equivocada de que todo
sintoma depressivo ou alteração de humor está invariavelmente ligado a um quadro de depressão.
Por esta razão, tentaremos aqui definir e diferenciar dois diagnósticos psicológicos muito comuns
no contexto de tratamento dos pacientes com câncer: a depressão e o transtorno de ajustamento.
CASO CLÍNICO
CLARISSA BALDOTTO
1- Oncologista Clínica da COI – Membro do Núcleo de Oncologia Torácica
2- Oncologista Clínica do INCA
3- Médica Pesquisadora e Mestranda do INCA
Câncer de pulmão metastático de longa evolução: relato
de caso e revisão da literatura
Caso Clínico
22 Caso Clínico
Paciente do sexo masculino, 51 anos, músico,
sem comorbidades, tabagista (Carga Tabágica:
35 maços/ano). Em maio de 2006 iniciou quadro
de dor no quadril, à direita. No início tratava-se
de dor leve, que foi piorando progressivamente.
Em janeiro de 2007 passou a limitar as atividades
do paciente, levando-o a procurar atendimento
médico. Ressonância Nuclear Magnética (RNM)
de quadril, realizada em março de 2007, mostrava um processo expansivo na cabeça e colo do
fêmur direito. Nesta ocasião, o paciente apresentava-se com PS1, em excelente estado geral. Negava emagrecimento ou qualquer outro sintoma.
Sua única queixa era a dor persistente. Optou-se
por realizar biópsia óssea, que foi inconclusiva.
Nas tomografias de estadiamento foi evidenciada massa com densidade de partes moles,
medindo aproximadamente 5cm, localizada no
segmento posterior do lobo superior do pulmão
direito, além de linfonodomegalias nas cadeias
Figura: Imagens da colonoscopia realizada pelo paciente
com lesão estenosante em reto médio, sugestiva
de tumor primário do reto.
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hilar, paratraqueal superior e inferior à direita. A
cintilografia óssea também evidenciava imagens
compatíveis com implantes secundários no 5o
arco costal direto, L3, fêmur direito e esquerdo.
Em abril de 2007, através de uma biópsia brônquica, obteve-se o diagnóstico de adenocarcinoma grau 2 de origem pulmonar.
Como o paciente apresentava dor intensa, foi inicialmente submetido a radioterapia paliativa em
hemipelve direita. Após o término do tratamento
radioterápico, foi incluído em um estudo clínico
randomizado, com o uso de carboplatina, paclitaxel e um novo agente antiangiogênico. Obteve
resposta parcial após 6 ciclos de quimioterapia.
Permaneceu em tratamento de manutenção, com
a droga em estudo, de outubro de 2007 até fevereiro de 2009, com excelente qualidade de vida.
Neste momento foi detectada progressão de doença em adrenal e em linfonodo supraclavicular
direito. Em março de 2009, o paciente aceitou ser
incluído em outro protocolo clínico randomizado, com o uso de docetaxel combinado a novo
agente antiangiogênico/placebo. Após 6 ciclos
de tratamento, com doença estável, o paciente
apresentou quadro de dor torácica e dispnéia.
Uma angiotomografia de tórax revelou quadro
de tromboembolismo pulmonar. Por este motivo, precisou ser excluído do protocolo, interrompendo o tratamento. Como havia sido detectada,
logo em seguida, progressão de doença óssea, foi
iniciada quimioterapia paliativa com carboplatina e etoposide, em dezembro de 2009. A opção
foi feita com base no tempo livre de progressão
apresentado após a primeira linha de tratamento. Neste momento, o paciente permanecia com
bom PS, mas apresentava dor óssea intensa, necessitando de altas doses de opióide. Desde o
início do tratamento, o paciente queixava-se de
constipação associada ao uso de opióides. Entretanto, após janeiro de 2010, houve piora progressiva, associada à necessidade de doses crescentes
de morfina. Em fevereiro de 2010, o paciente foi
internado com quadro de suboclusão intestinal.
Foi submetido a colonoscopia, que evidenciou
Revisão da Literatura
Metástases abdominais de câncer de pulmão são
raras e clinicamente silenciosas, na maior parte
dos casos. A maior série já reportada, investigando metástases gastrintestinais de câncer de pulmão, em autópsias, mostrou uma incidência de
12% (1). Considerando os tipos histológicos, o carcinoma de grandes células é o que possui maior
risco de desenvolvimento de metástases gastrintestinais (2). Na verdade, metástases intra-abdominais sintomáticas de câncer de pulmão são
extremamente incomuns. Quanto aos sintomas, a
perfuração é muito rara, ocorrendo mais frequentemente no jejuno (53%), seguido do íleo (28%).
A idade mediana ao diagnóstico é de 64,5 anos e
parece haver uma predominância no sexo masculino. Em alguns casos, melena é o primeiro sintoma (3). Obstrução intestinal, como ocorreu neste
caso, também é um sintoma descrito. Mosier et al.
descreveram, após uma revisão da literatura, 34
casos. A maioria tinha uma história de dor abdominal (86%), melena (23%) ou náuseas e vômitos
(26%). Cerca de 16% dos pacientes também relatavam perda de peso e dois pacientes procuraram
o hospital com quadro de perfuração intestinal ou
peritonite. Esta série incluiu nove casos em que o
tumor primário ainda não havia sido diagnosticado, no momento da complicação intra-abdominal
(4). Há uma descrição de que metástases peritoneais e intestinais ocorrem com uma mediana que
varia de 5 meses a 24 meses após o diagnóstico
inicial. Descreve-se uma média de 4 a 8 sítios metastáticos concomitantes. A sobrevida descrita é
curta e raramente ultrapassa 16 semanas, após a
detecção das metástases intra-abdominais (5).
O caso em questão traz, além da raridade da
evolução, dois pontos importantes. O primeiro
diz respeito à confusão de sintomas. O paciente
fazia uso crônico de opióides, que sempre causaram constipação. O agravamento do quadro
foi incialmente confundido com o aumento da
dose da medicação, protelando a investigação
adequada e a tomada de medidas necessárias. O
segundo ponto se refere à longa evolução clínica
de um paciente com câncer de pulmão e doença
metastática. Com o aparecimento de novas drogas, principalmente a partir do uso selecionado
de drogas com alvo molecular, temos observado
reais e significativos incrementos de sobrevida.
Em conversas informais, vários colegas já relatam
uma observação pessoal do aumento de comprometimento de sítios antes incomuns, em câncer
de pulmão, como leptomeninge, pele e peritôneo.
Todas as séries descritas precedem esta evolução
do tratamento. Será interessante, nos próximos
anos, avaliarmos se realmente estamos diante de
uma mudança no comportamento da doença. No
momento, devemos ficar atentos e não deixar de
desconfiar e investigar, mesmo diante de uma
evolução atípica e improvável.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. Yoshimoto A, Kasahara K, Kawashima A. Gastrintestinal
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Cancer 2006; 42: 3157-3160.
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Garwood RA, Sawyer MD, Ledesma EJ, et al. A case and review of bowel perforation secondary to metastatic lung cancer. American Surgeon 2005; 71: 110-116.
4. Mosier DM, Bloch RS, Cunningham PL et al. Small bowel
metastases from primary lung carcinoma: a rarity waiting to
be found? American Surgeon 1992; 58 (11): 677-682
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from primary carcinoma of the lung: clinical findings and
outcome. American Journal of Gastroenterology 1999; 94 (7):
1884-1887.
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23 Caso Clínico
lesão estenosante em reto médio (Figura 1). Foi
submetido a laparotomia exploradora com realização de colostomia. O relato cirúrgico foi de
aspecto compatível com lesão primária de reto
e implantes peritoneais. O laudo histopatológico foi de carcinoma grau 3, infiltrando parede
colônica. Foi solicitada imunohistoquímica, que
revelou positividade para CK7 e TTF1 e negatividade para CK20, favorecendo origem pulmonar.
Em maio de 2010 o paciente evoluiu para óbito,
cerca de 4 anos após o início dos sintomas.
Periódico
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