TCC – Hamlet

Transcrição

TCC – Hamlet
CENTRO UNIVERSITÁRIO ADVENTISTA DE SÃO PAULO
CAMPUS ENGENHEIRO COELHO
HAMLET: UMA BREVE ANÁLISE DE TRADUÇÃO
FABRICIO RIBEIRO ARAUJO
ENGENHEIRO COELHO
2011
I
FABRICIO RIBEIRO ARAUJO
HAMLET: UMA BREVE ANÁLISE DE TRADUÇÃO
Monografia
Adventista
apresentada
de
Educação
à
Faculdade
do
Centro
Universitário Adventista de São Paulo, como
Trabalho de Conclusão do curso de Tradutor e
Intérprete, sob a orientação da Prof.ª Ms. Tânia
Soares de Siqueira.
ENGENHEIRO COELHO
2011
II
Trabalho de Conclusão de Curso do Centro Universitário Adventista de São Paulo, do curso
de Tradutor e Intérprete apresentado e aprovado em ____________________.
_______________________________________________
Orientadora: Prof.ª M.Sc. Tânia Soares de Siqueira
_______________________________________________
Prof.ª Drª. Ana Maria de Moura Schäffer (Segunda Leitora)
III
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus as incontáveis bênçãos a mim derramadas. Não foram
momentos fáceis, mas Ele sempre esteve me dando forças, mesmo em meio a
noites em claro.
Ao Centro Universitário Adventista de São Paulo – Campus EC, por propiciar
meios para que um sonho se transformasse em realidade.
A prof.ª Drª. Ana Maria de Moura Schäffer a paciência e atenção a mim
dispensadas.
A Prof.ª M. Sc. Tânia Soares de Siqueira, pela orientação nesse projeto.
Saiba que a admiro muito.
Ao Valmor e Miriam Andreani, pela grande oportunidade de cursar o curso de
inglês na Fisk.
Ao Francisco Granjeiro, por me proporcionar oportunidades de crescimento
no ramo profissional.
Aos meus familiares, que participaram de diferentes formas para que eu
estivesse aqui.
Ao Magno e Márcia Damasceno por todos os bons momentos que passamos
juntos nessa jornada.
Aos meus grandes amigos Douglas, Vanuci e Nielce, pelo incentivo contínuo.
IV
“O fácil faço agora, o difícil demora
um pouco, o impossível entrego nas
mãos de Deus, porque para Ele, tudo
é possível.”
(Autor desconhecido)
V
RESUMO
O presente trabalho tem como objetivo principal mostrar a possibilidade de
tradução de uma linguagem arcaica, muito rica e de escritas extravagantes, para um
português contemporâneo, bem mais simples, sem palavras difíceis, considerando
que traduzir não é tarefa fácil. Para isso, trabalharemos com fragmentos
selecionados da obra Hamlet, de Shakespeare e sua respectiva tradução para o
português, pelo tradutor Millôr Fernandes. O primeiro capítulo é a introdução. No
segundo capítulo, é apresentada uma breve biografia de William Shakespeare e de
Millôr Fernandes, bem como o contexto sociocultural de cada um deles, além de
tecer breves considerações sobre a obra “Hamlet: o príncipe da Dinamarca”. No
terceiro capítulo, será feita a análise comparativa entre alguns fragmentos
selecionados do texto original e a respectiva tradução, tentando encontrar
estratégias que o tradutor se valeu para transpor para o português, uma língua
considerada tão formal e específica para a época.
Palavras-chave: Tradução; Análise Contrastiva; Shakespeare; Millôr Fernandes.
VI
ABSTRACT
The following work has as main objective show the possibility of translation
from an old, very rich and with extravagant writings language, to a contemporary
Portuguese, much simpler, with no difficult words, considering that translating is not
an easy task. For this purpose, we will work with selected fragments of the production
Hamlet, from Shakespeare and its respective translation to the Portuguese, by Millôr
Fernandes. The first chapter is the introduction. In the second chapter is presented a
short biography of William Shakespeare and Millôr Fernandes, and also the
sociocultural context of each one of them, besides composing short considerations
about the work “Hamlet: the prince of Denmark.” In the third chapter, a comparative
analysis will be made between some selected fragments in the original work and the
peculiar translation, trying to find strategies that the translator used to transpose to
the Portuguese, a language that is considered so formal to that age.
Palavras-chave: Translation; Constrative Analysis; Shakespeare; Millôr Fernandes.
VII
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ......................................................................................... 8
1.1SOBRE SHAKESPEARE E SUA TRADUÇÃO DE HAMLET ...........................10
1.2Biografia de Shakespeare ....................................................................................11
1.2.1 contexto sociocultural .......................................................................................11
1.3 Biografia de Millôr Fernandes .............................................................................13
1.3.1 Contexto sociocultural ......................................................................................14
2 CONSIDERAÇÕES BREVES SOBRE A HISTÓRIA POR TRÁS DE HAMLET 15
3 A TRADUÇÃO DE HAMLET PARA O PORTUGUÊS .........................................17
3.1 Jogo de palavras..................................................................................................17
3.2 Metáforas .............................................................................................................18
3.3 Inglês arcaico x português contemporâneo ........................................................18
3.4 Ideia adaptada .....................................................................................................18
3.5 Literalidade...........................................................................................................18
3.6 Português formal e português oral ......................................................................19
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................20
5 REFERÊNCIAS ................................................................................................... 211
8
1 INTRODUÇÃO
Muito se tem falado sobre a importância de manter um parâmetro no processo
tradutório. Quem traduz deve estar familiarizado tanto com a cultura fonte quanto
com a meta. No caso da temática escolhida para este trabalho, a ênfase recairá na
comparação entre o original Hamlet e a tradução para o português, feita por Millôr
Fernandes, que usa uma linguagem não convencional e não erudita, detendo-se a
manter a estrutura de poesia apenas em passagens importantes do texto.
Considerando-se a grande ênfase que pesquisadores, professores de
tradução têm atribuído à importância de se poder fazer ou não uma tradução
unificada, construímos a hipótese de que, como a língua muda com o passar dos
anos, a linguagem de tradução deve também acompanhar tais mudanças. No caso
de Hamlet, a obra teve sua linguagem muito bem adaptada pelo tradutor aos dias
atuais, possibilitando que o leitor pudesse “sentir” a história mais fielmente.
Ao fazer a tradução, o autor conseguiu manter a mesma coerência enfatizada
no texto de partida? Se não, a que se deve isso? É possível manter um vínculo entre
o texto original e o texto traduzido, mesmo usando uma linguagem diferente? Ao
longo da pesquisa esperamos responder a esses questionamentos.
Levando em consideração que Hamlet foi escrito na era sombria de
Shakespeare, e que caracteriza um momento culminante do teatro elisabetano, onde
o autor sofreu um golpe sentimental, pois seu amigo e protetor, o conde Essex foi
executado por ter conspirado contra a rainha, o autor entrou em profunda angústia,
vivendo uma fase caracterizada por meditações acerca da fragilidade da existência
humana. A peça em questão é uma de suas peças mais fascinantes, pois constitui
uma metáfora de sua própria vida.
Seguindo os passos dos dramaturgos de seu tempo, Shakespeare escreveu
os diálogos de Hamlet com métricas e sem rima, alternados com trechos em prosa
coloquial. A linguagem varia da mais poética à mais
banal, diferenciando os
personagens ou reforçando elementos trágicos e cômicos.
A pesquisa se propõe, assim, a mostrar a possibilidade da tradução de uma
linguagem arcaica para uma linguagem contemporânea, sem perder a natureza do
9
texto em si. A motivação para desenvolver esta pesquisa se deu pelo fato de
Shakespeare escrever de uma forma contagiante. Há muitos materiais disponíveis
para pesquisa, facilitando assim, além de dar novos rumos, o desenvolvimento deste
trabalho.
10
1.1 Sobre Shakespeare e sua tradução de Hamlet
Traduzir literatura não é um trabalho fácil. Para que a poética e poesia sejam
mantidas é necessário desverbalizar o texto original, adaptar para a língua alvo e
ainda, em alguns momentos, reescrevê-lo, para que possa chegar o mais próximo
possível do intento do autor. Levando em consideração a época em que o original foi
escrito e a tradução, que geralmente é feita tempos depois, as influências do meio
atingem direta ou indiretamente a forma pela qual o tradutor deve fazer a tradução.
O momento em que Shakespeare viveu era de uma realidade completamente
diferente do de Millôr Fernandes. O autor usa construções semânticas bem
abrangentes, ricas e delicadas, tornando Hamlet, a caracterização da interioridade
humana. Um texto traduzido precisa cumprir a função para a qual a tradução foi
comissionada. Markus Johannes Weininger, doutor em Linguística pela Universidade
Federal de Santa Catarina (UFSC), em uma entrevista ao Diário Catarinense, afirma
que:
O tradutor precisa ser, em primeiro lugar, um exímio leitor, para não
lhe escapar nenhuma interpretação possível do texto original, dentro
do contexto original, na cultura de origem. Ao traduzir este texto, é
praticamente impossível reproduzir todas as interpretações. O
tradutor precisa tomar decisões, quais aspectos são os mais
importantes, imprescindíveis, na situação concreta, para o público do
texto traduzido. É importante que tome essas decisões de forma
consciente e consistente.
(Correio Catarinense, 30/09/2005)
11
1.2 Biografia de Shakespeare
William Shakespeare nasceu e Stratford-upon-Avon, em 23 de abril de 1564 e
morreu no mesmo local e na mesma data de seu nascimento, em 1616. Foi
considerado como o maior escritor da língua inglesa e o mais influente dramaturgo
do mundo. De suas obras restaram 38 peças e 154 sonetos e diversos outros
poemas, sendo traduzidos para os principais idiomas do mundo, e encenados mais
do que as peças de qualquer outro dramaturgo. Entre suas obras mais conhecidas
estão Romeu e Julieta, que se tornou a história de amor por excelência, e Hamlet,
que possui uma das mais conhecidas frases da língua inglesa: to be or not to be,
that’s the question (ser ou não ser, eis a questão). Suas primeiras peças eram
principalmente comédias e obras baseadas em eventos e personagens históricos.
Mas por volta de 1608, passou a escrever apenas tragédias, incluindo Hamlet,
considerada uma das obras mais importantes da língua inglesa. Na sua última fase,
escreveu um conjunto de peças classificadas como tragicomédias ou romances. Os
vitorianos idolatravam Shakespeare como um herói, e o aclamavam como um gênio.
1.2.1 Contexto sociocultural
William Shakespeare viveu durante o reinado da rainha Elisabeth I da
Inglaterra, filha de Henry VIII e de Ana Bolena, que subiu ao trono no ano de 1558,
seis anos antes do nascimento de Shakespeare. Foi nessa época em que a
Inglaterra deixou de ser uma nação com uma pequena população, pobre e obscura,
para se tornar uma grande potência, com uma moeda forte e confiável. A mudança
maior veio com a tradução da Bíblia para o inglês, causando um crescente interesse
de artesãos, comerciantes e agricultores pela leitura. Assim sendo, a educação
deixou de ser um benefício exclusivo da corte. O teatro da época baseava-se
principalmente
nos
mistérios
e
moralidades
medievais,
forças
naturais
personificadas, com características renascentistas. As obras de Shakespeare foram
influenciadas por dramaturgos com dinâmica de teatro épico e sem proibições. Os
teatros eram plataformas com mínima decoração, consistida de alguns acessórios
ou painéis. Após a morte da rainha Elizabeth I, o teatro se tornou escuro e sinistro e
com a eclosão da guerra civil em 1642, o Parlamento que era controlado por
puritanos, fechou todos os teatros. Quando a monarquia foi restaurada, as peças
12
foram apresentadas apenas para a elite. Mas os teatros tiveram uma influência dos
modelos franceses e italianos. Pela primeira vez desde a Idade Média, as mulheres
foram permitidas entrar nos palcos. Shakespeare usa um vocabulário cheio de
trocadilhos e metáforas:
HAMLET: Se você se casar, leva esta praga como dote: Embora
casta como o gelo, e pura como a neve, não escaparás á calúnia.
Vai pro teu convento, vai. Ou, se precisa mesmo casar, casa com um
imbecil. Os espertos sabem muito bem em que monstros vocês os
transformam. Vai prum conventilho, um bordel: vai – vai depressa!
Adeus. (SHAKESPEARE, 1603, p.53).
A Obra de Hamlet ocorre em tempo cronológico. Também são usados
monólogos e diálogos.
Tempo cronológico:
Por isso, não desconsiderando vossos melhores conselhos, que nos
foram livremente transmitidos esse tempo todo, tomamos por
esposa nossa antes irmã, atual rainha, partícipe imperial deste
Estado guerreiro. (SHAKESPEARE, 1603, p.9).
Monólogo:
HAMLET: Ser ou não ser – eis a questão.
Será mais nobre sofrer na alma
Pedradas e flechadas do destino feroz
Ou pegar em armas contra o mar de angústias –
E, combatendo-o, dar-lhe fim? Morrer; dormir;
Só isso. (SHAKESPEARE, 1603, p.51).
Diálogo:
RAINHA: Ele os recebeu bem?
ROSENCRANTZ: Um perfeito cavalheiro!
GUILDENSTERN: Mas forçando visivelmente a própria disposição.
(SHAKESPEARE, 1603, p.51).
13
1.3 Biografia de Millôr Fernandes
Há divergências sobre a data exata de nascimento de Milton Fernandes
(Millôr), mas em sua carteira de identidade está registrada como sendo 24 de maio
de 1924. E era essa a considerada por ele. Nasceu em Méier, Rio de Janeiro.
Devido a um registro de caligrafia duvidosa, passou a ser chamado Millôr. Devido a
morte prematura de seu pai, com apenas 36 anos de idade, a mãe de Millôr teve
que sustentar seus quatro filhos, costurando dia e noite para colocar algo para
comer dentro de casa. Apesar da pobreza, Millôr lembra que passou uma infância
muito feliz. Estudou numa escola pública, Escola Ennes de Souza, entre 1931 a
1935. É cartunista, desenhista, humorista, dramaturgo, escritor e tradutor brasileiro.
Aos dez anos de idade, vendeu seu primeiro livro para a publicação O Jornal do Rio
de Janeiro. Em 1942, torna-se um tradutor autodidata após a tradução do livro de
Pearl S. Buck "Dragon Seed" e o adapta para "A Estirpe do Dragão". Em 1968,
começa a escrever uma coluna semanal para a revista Veja. Tem trabalhos expostos
em várias galerias de arte do Rio de Janeiro e no Museu de Arte Moderna do Rio de
Janeiro - MAM/RJ. Faz roteiros de filmes, programas de televisão, shows e musicais
e é um dos mais solicitados tradutores de teatro do país. Irônico, polêmico, com seus
textos (aforismos, epigramas, ironia, duplos sentidos e trocadilhos) e seus desenhos
constrói a crônica dos costumes brasileiros dos últimos sessenta anos. Traduziu do
inglês e do francês, várias obras, principalmente peças de teatro, entre estas,
clássicos de Sófocles, Shakespeare, Molière, Brecht e Tennessee Williams. Depois
de colaborar com os principais jornais brasileiros, retornou à Veja em setembro de
2004, deixando a revista em 2009.
14
1.3.1 Contexto sociocultural
Millôr Fernandes, ao traduzir Hamlet, por volta 1984, usou uma linguagem de
sua época, e não a mesma usada por Shakespeare no original. Nesse período, o
Brasil passava por alguns acontecimentos, entre eles, o Movimento das Diretas Já
(que pedia a volta das eleições diretas para o presidente do Brasil). Foi também uma
década de mudanças significativas e de ordenamentos no quadro político de nossa
sociedade. Mas mesmo com tantas mudanças, o país passava por crises
econômicas, convivendo com grandes contrastes sociais, como saúde, educação e
saneamento básico. E é nesse contexto que surgem novos partidos políticos e
organizações não governamentais que começam a desenvolver ações que não eram
assumidas pelo Estado. Tais acontecimentos influenciaram indiretamente na
tradução do clássico de William Shakespeare, feita por Millôr Fernandes, dadas a
realidade e o público a ser atingido nas diferentes épocas. O tradutor usa um
português moderno, mais coloquial, apresentando um vocabulário do cotidiano.
15
2 CONSIDERAÇÕES BREVES SOBRE A HISTÓRIA POR TRÁS DE
HAMLET
Alguns séculos atrás, sobre as ameias do castelo de Elsinor, na Dinamarca,
os guardas reais viram o fantasma do rei Hamlet, que tinha sido morto poucos
meses antes. O rei Hamlet, depois de ter vencido em duelo Fortimbrás, rei da
Noruega, se tornou senhor de alguns territórios que pertenciam ao monarca
norueguês. Agora o jovem Fortimbrás, filho do velho rei vencido, andava pelos
Fiordes da Noruega reunindo homens e navios para poder recuperar essas terras.
Os guardas resolveram pôr o príncipe Hamlet, filho do falecido rei Hamlet, a
par da situação. O infante decidiu então ficar de vigília com os soldados para ver o
fantasma do seu pai. Ao chegar ao local, o fantasma do rei apareceu e revelou que
não tinha sido morto por uma serpente venenosa, mas sim pelo veneno que o seu
irmão Claudius, que agora se sentava no trono da Dinamarca, lhe tinha colocado na
cavidade do ouvido, enquanto ele dormia no jardim. O motivo do crime era claro:
permitia a Claudius casar com a mulher do rei e subir ao trono. O príncipe Hamlet
promete ao pai punir o seu tio Claudius pelo assassinato.
Hamlet decide simular que está louco, como estratégia para descobrir se, de
fato, seu tio Claudius assassinou o velho rei. Todos pensam que o príncipe tinha
enlouquecido: a sua mãe, o tio, Ofélia (a jovem que ele ama) e o pai desta, Polônio.
Hamlet comporta-se como um louco na corte da Dinamarca. A certa altura, Hamlet
mata Polônio, confundindo-o com um rato, porque o pai de Ofélia estava a espiar o
príncipe, a mando do rei. A morte de Polônio chegou aos ouvidos de Claudius, e
este, indignado com o sucedido, decide mandar o príncipe para Inglaterra. O rei
escreveu uma carta para o rei da Inglaterra pedindo que este matasse Hamlet mal
este chegasse. Mas o príncipe descobriu a missiva e resolveu alterá-la. No terceiro
dia de viagem, o barco em que ia foi atacado por um navio de piratas. Hamlet
ofereceu dez mil coroas para os piratas o levarem de volta a Elsinor.
Entretanto, o filho de Polônio, Laertes, regressou à Dinamarca com a intenção
de se vingar do homem que matou seu pai. Quando lá chegou teve a notícia de que
sua irmã tinha morrido ao tentar subir um ramo para pendurar grinaldas de flores. O
ramo partiu-se, e Ofélia morreu afogada. Com a chegada de Hamlet ao castelo, o rei
mobilizou Laertes para matar o príncipe. Organizou, então, um torneio de esgrima,
16
preparando o momento para Laertes matar Hamlet. Durante o combate, Hamlet é
ferido pela espada envenenada do seu adversário enquanto sua mãe bebe uma taça
de vinho com veneno, que lhe era destinada. A rainha, que estava prestes a morrer,
grita para seu filho que o copo estava envenenado, e morre. Em seguida, o filho do
rei Hamlet fere mortalmente Laertes. Este confessa que sua espada estava
envenenada e que Hamlet também iria acabar por morrer. Além disso, diz que tinha
sido o rei quem planejara tudo para poder matar o príncipe. Hamlet avança contra
Claudius e trespassa-o com sua espada envenenada.
Quando Horácio, um grande amigo do príncipe, foi ter com o filho do rei
Hamlet, para lhe anunciar que o jovem Fortimbrás tinha chegado ao castelo, reparou
que Hamlet estava prestes a morrer. Foi então que o príncipe decidiu que quem iria
subir ao trono era o jovem Fortimbrás, e logo em seguida morre. Por fim é o jovem
Fortimbrás que sobe ao trono e são disparadas salvas de artilharia pelo filho do rei
Hamlet.
17
3 A TRADUÇÃO DE HAMLET PARA O PORTUGUÊS
Millôr Fernandes usa formas diferentes para fazer a tradução, não deixando
de fazer com que a tradução cumpra a missão para a qual foi comissionada. Dentre
as várias categorias possíveis de análise, cinco foram escolhidas e dissertadas a
seguir. São elas: jogo de palavras; metáforas; inglês arcaico versus português
contemporâneo; adaptação de ideias; literalidade; português formal e oral.
Um fato interessante que deve ser citado é com relação aos nomes dos
personagens. Millôr decidiu traduzir boa parte deles, a fim de dar uma roupagem
bem brasileira à tradução. Alguns nomes, porém, não foram traduzidos, pois não
julgou necessário.
CLAUDIUS - King of Denmark.
CLÁUDIO – Rei da Dinamarca
HAMLET - Son to the former,
HAMLET – Filho do falecido rei,
and nephew to the present King.
sobrinho do atual rei
POLONIUS- Lord Chamberlain.
POLÔNIO – Lord camarista
HORATIO - Friend to Hamlet.
HORÁCIO – Amigo de Hamlet
LAERTES - Son to Polonius.
LAERTES – Filho de Polônio
VOLTIMAND - Courtier.
VOLTIMANDO – Cortesão
CORNELIUS - Courtier.
CORNÉLIO – Cortesão
ROSENCRANTZ - Courtier.
ROSENCRANTZ – Cortesão
3.1 Jogo de palavras
“A little more than kin, and less than kind!” (SHAKESPEARE, 1603)
“Me perfilha como primo, pois não primo como filho.” (FERNANDES, 1984)
Nessa citação, vemos que o autor usou um jogo de palavras para obter o
efeito desejado e que estivesse em acordo com o contexto, pois se a tradução literal
fosse aplicada nesse momento, haveria uma falta de compreensão por parte do
leitor. Nota-se que a palavra primo, não é usada como substantivo, mas como
18
conjugação do verbo “primar”, que significa “v.t. Ser o primeiro; ter a primazia. /
Esmerar-se; distinguir-se”. (Dicionário Aurélio, 2005).
3.2 Metáforas
“Thyself do grace to them, and bring them in” (II.ii.53) (SHAKESPEARE, 1603).
“então você também deve servir a entrada”; (FERNANDES, 1984).
Notamos a criatividade do autor ao usar uma metáfora em português onde
não havia em inglês, facilitando a comunicação.
3.3 Inglês arcaico x português contemporâneo
“He hath, my lord, wrung from me my slow leave” (SHAKESPEARE, 1603).
“Ele conseguiu essa licença, senhor, foi arrancada de mim por incansáveis
pedidos...” (FERNANDES, 1984).
A palavra hath é equivalente ao have, has usado hoje. Como a língua se
modifica ao longo dos tempos, algumas palavras sofrem alterações. O tradutor se
valeu do português contemporâneo para exprimir o que o autor queria dizer.
3.4 Adaptação de ideias
“If I had play’d desk or table-book” (SHAKESPEARE, 1603).
“Se eu tivesse assumido o papel do leva-e-trás” (FERNANDES, 1984).
Não temos tal expressão em português com a mesma equivalência de
sentido, cabendo então, ao tradutor usar uma adaptação e encontrar algo que
tivesse o mesmo efeito.
3.5 Literalidade
HAMLET: To be, or not to be,--that is the question:--Whether 'tis
nobler in the mind to suffer the slings and arrows of outrageous
fortune or to take arms against a sea of troubles, and by opposing
19
end them?--To die,--to sleep, -- No more; and by a sleep to say we
end the heartache, and the thousand natural shocks that flesh is heir
to,--'tis a consummation devoutly to be wish'd. To die,--to sleep;--To
sleep! perchance to dream:--ay, there's the rub; (SHAKESPEARE,
1603).
HAMLET: Ser ou não ser – eis a questão. Será mais nobre sofrer na
alma pedradas e flechadas do destino feroz ou pegar em armas
contra o mar de angústias – e, combatendo-o, dar-lhe fim? Morrer;
dormir; só isso. E com o sono – dizem – extinguir dores do coração e
as mil mazelas naturais a que a carne é sujeita; eis uma consumação
ardentemente desejável. Morrer – dormir – Dormir! Talvez sonhar. Aí
está o obstáculo! (FERNANDES, 1984).
Aqui é possível ver a preocupação do tradutor em manter a mesma
formalidade, trazendo à língua alvo as mesmas características do original, sem
deixar de mostrar sua presença, com algumas desverbalizações para que esteja de
acordo com a linguagem usada em sua época, atingindo assim, o público alvo.
3.6 Português formal e português oral
“Pra que se divirta um pouco com vocês, e pra que descubram, surgindo a
ocasião,...” (FERNANDES, 1984).
O léxico contemporâneo e linguagem oral são utilizados em alguns trechos da
obra traduzida, alternando entre “para” e “pra”, indicando uma estratégia
modernizadora. Chama-se de comportamento não-normativo.
20
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao longo da pesquisa, pudemos notar que o tradutor tem a liberdade de
interpretar o texto, usar uma linguagem acessível ao público alvo, adaptar ideias,
fazer jogo de palavras para melhor identificar o texto e construir metáforas.
Conforme proposto, confirmamos que é possível ao tradutor manter um vínculo entre
o texto original e o texto traduzido. E Millôr Fernandes assumiu o compromisso de
manter a fidelidade ao texto.
Um bom tradutor deve ter um conhecimento da língua para a qual se está
traduzindo, bem como saber um pouco da cultura do país, domínio do idioma do
qual se traduz para o idioma a ser traduzido além de ter uma familiaridade com o
texto fonte.
Neste trabalho, pudemos perceber o quanto é difícil para um tradutor traduzir
uma obra, especialmente obra literária. Cada língua tem suas palavras com suas
respectivas cargas semânticas e peculiaridades. A prolixidade da língua-alvo, no
caso a Língua Portuguesa, é bem maior, sendo necessário usar mais palavras para
expressar o mesmo que é dito na língua-fonte. Se o texto for traduzido palavra por
palavra, tem-se a sensação de que há alguma coisa errada, pois as palavras
geralmente não fazem o verdadeiro sentido. É aí que entra o tradutor, com todo seu
conhecimento na área, para modificar as palavras de uma forma tal que o texto
continue um texto rico, abrangente e que alcance o objetivo inicial, mas mantendo
sempre a essência. E o trabalho do tradutor vai muito além de traduzir palavras, mas
ele traduz culturas, reescreve o texto, dando ao texto traduzido uma nova
característica.
Perante todos os aspectos analisados, concluímos que o tradutor deve
construir uma visão insubjertiva do passado a partir de sua inserção no presente,
tornando a tradução bem plausível. Entendemos também que a função do tradutor
seja a de manter a essência da mensagem, aproximando ao máximo do texto
original, mesmo sabendo que, como diz uma frase italiana, “traduttore, traditore"
(tradutor, traidor), manter a fidelidade total é praticamente impossível. O público-alvo
deseja ler um romance ou uma obra literária, sentindo a mesma emoção que sentiria
se estivesse lendo o original. E esse é um trabalho do tradutor.
21
REFERÊNCIAS
FERNANDES, Millôr (trad.), Hamlet, 1984. Pocket Editora.
HAMLET,
tradução
de
Millôr
Fernandes.
Disponível
em:
<http://www.hiperweb.com.br/caderno/2001/09/hamlet-willian-shakespeare-tradmillor-fernandes/>. Acesso em: 08 out 2011.
MABILLARD, Amanda. Introduction to Hamlet. Shakespeare Online. 20/08/ 2000.
Disponível em:
http://www.shakespeareonline.com/plays/hamlet/hamletcharacter.html > Acesso em:
11 out 2011.
MOUTINHO, Nogueira [s/d] “Shakespeare no Brasil”. Folha de S. Paul
SHAKESPEARE, W. Hamlet, tradução de Millôr Fernandes. São Paulo, Editora
Peixoto Neto, 2004.

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