10 Anos CDES

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10 Anos CDES
Revista do Seminário Internacional
sobre Desenvolvimento
10 ANOS CDES
Revista do Seminário Internacional sobre Desenvolvimento – 10 anos CDES
ÍNDICE
EDITORIAL
Seminário marca 10 anos e debate desafios para o futuro ...................................... 5
MATÉRIAS
1. Dilma Rousseff: “O Brasil não quer voltar ao passado” ............................................ 7
2. O CDES e as transformações brasileiras ................................................................. 10
3. Marcelo Neri: “O Brasil está crescendo com qualidade” ......................................... 13
4. Para diretor da OMC, cenário mundial está mais complexo e menos acolhedor” ... 14
5. Ministros convocam CDES a participar de pacto pela Saúde ................................... 17
6. Rede de Conselhos Econômicos e Sociais da América Latina e Caribe lança
Carta de Brasília .................................................................................................... 20
7. O fortalecimento mundial dos conselhos ............................................................... 22
8. Moema Miranda: “Mobilizações nas ruas exigem nova política”............................ 24
9. Secretária da CEPAL: “O Brasil está melhor do que a imprensa diz” ....................... 25
ANÁLISES
1. Luiz Gonzaga Belluzzo: Brasil precisa superar enganos conjunturais
e fazer política macroeconômica ........................................................................... 26
2. Milko Matijascic: O processo de desenvolvimento do Brasil na hora da verdade ..... 30
3. Ladislau Dowbor: 10 anos de CDES, em busca de uma nova governança............... 33
4. Laurindo Leal Filho: Comunicação discreta............................................................. 36
5. Marco Aurélio Weissheimer: As contribuições do CDES para o debate
da Reforma Política ............................................................................................... 38
6. Flávio Aguiar: Desafios para o CDES no seu 10º aniversário ................................... 41
EDITORIAL
Revista do Seminário Internacional sobre Desenvolvimento – 10 anos CDES
Seminário marca dez anos e
debate desafios para o futuro
Dez anos após substituir uma lógica de
governo cujas diretrizes sociais e econômicas,
em geral, privilegiavam as orientações e
interesses do mercado financeiro internacional
em detrimento da distribuição da riqueza e da
geração de emprego e renda para a maioria
da população, o Brasil atravessa em 2013 um
importante período de avaliação dos acertos
e desafios dessa nova etapa de sua história.
Criado nesta última década, o Conselho de
Desenvolvimento Econômico e Social (CDES)
promoveu, dia 17 de julho, em Brasília, um
seminário para debater propostas e projetos
para o futuro do País.
O encontro contou com a participação
da presidenta da República, Dilma Rousseff;
do diretor geral eleito da Organização Mundial
do Comércio, embaixador Roberto Azevêdo;
do ministro da Secretaria de Assuntos
Estratégicos (SAE), Marcelo Neri; da secretária-executiva da CEPAL, Alicia Bárcena, além de
outros convidados de grande relevância.
O contexto político que embalou os
debates do Seminário Internacional sobre
Desenvolvimento em 2013 não poderia ser mais
rico. Além das novas oportunidades e desafios
à agenda de desenvolvimento colocadas
para o Brasil, também foi discutido o
dinâmico cenário global atual. Em relação
ao cenário interno, o seminário abordou os
desafios do modelo brasileiro rumo a um
desenvolvimento inclusivo e sustentável.
A discussão contemplou também mudanças
recentes vivenciadas pelo País e os impactos
das políticas públicas desenvolvidas ao longo
da última década em termos de inclusão
social, educação e trabalho.
Envolver parceiros nacionais e internacionais
em um debate conjunto sobre as condições e
as estratégias de desenvolvimento brasileiras
é um esforço que vem sendo feito ao longo
dos seminários internacionais realizados pelo
CDES em 2004, 2006 e 2009. Na abertura
do primeiro seminário, em agosto de 2004, a
exibição do vídeo de uma entrevista realizada
dias antes pelo então secretário especial do
CDES, Jaques Wagner, com o economista
Celso Furtado trouxe ensinamentos sobre a
importância da busca por um desenvolvimento
acompanhado por distribuição de renda que
fundamentaram os trabalhos do CDES nos anos
seguintes: “É preciso distinguir crescimento de
desenvolvimento. Crescer sem desenvolvimento
produz concentração de renda. E concentração
de renda é antissocial por definição”,
disse Furtado.
Outras palavras ditas pelo mestre da
economia em 2004 ecoam até hoje nos
trabalhos do CDES, como, por exemplo, a
crítica à orientação neoliberal: “Planejar o
presente e o futuro do País passou a ser coisa
do passado. Como você pode dirigir uma
sociedade sem saber para onde vai? O mercado
é que decide tudo. O País passou a ser visto
como uma empresa. A coisa mais importante
para o governo de um país são os homens que
você vai governar, é a massa da população,
não são abstrações. Portanto, é preciso colocar
o social à frente de tudo. Se não avançar
na criação de emprego e na distribuição de
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Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social
renda, estamos andando para trás”, disse.
Sobre a missão do CDES, Furtado destacou que
“o desenvolvimento é o resultado de um
desejo da sociedade, uma construção, fruto
da vontade coletiva de uma nação”, mas que
“é preciso que ela tenha vontade de fazê-lo”.
Crise global
Durante a 40ª Reunião Plenária do CDES,
a presidenta Dilma saudou os dez anos de atuação
do Conselho e disse que as recomendações
que dele saíram tiveram um “papel importante
em tudo o que foi construído” pelo governo
neste período: “Uma característica desse fórum
que eu acho importante é o fato de ele ser
plural, de ele ter essa capacidade de mostrar
diferentes opiniões, diferentes posições, buscar
um consenso, mas ao mesmo tempo ser capaz
de externá-las”, disse. A presidenta reafirmou no
pleno do CDES o compromisso do governo com o
aumento da competitividade e dos investimentos:
“Eu acredito que esse é um desafio do governo,
dos empresários, da agricultura, dos serviços,
do setor de educação e do setor de ciência e
tecnologia. E ele precisa de vontade política, de
diálogo franco e de parceria”.
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O Seminário Internacional de 2013 foi
um novo momento privilegiado de discussão
sobre os caminhos para o desenvolvimento do
Brasil e do papel que pode desempenhar na
nova geopolítica mundial. O contexto global
de tentativa de superação da crise econômica
e a dinâmica nacional pelo aprofundamento
das mudanças positivas no país desafiam mais
uma vez o CDES a cumprir o destino que
para ele foi imaginado quando criado há dez
anos: construir um novo consenso estratégico
nacional, de longa duração.
MATÉRIAS
Revista do Seminário Internacional sobre Desenvolvimento – 10 anos CDES
Dilma Rousseff: “O Brasil não
quer voltar ao passado”
No último Seminário Internacional sobre
Desenvolvimento, a presidenta Dilma Rousseff
traçou um panorama das conquistas obtidas
pelo Brasil nos últimos dez anos, desde que o
CDES foi criado, e incentivou seus integrantes
a darem continuidade à missão de debater
propostas oriundas dos diversos setores da
sociedade brasileira para o desenvolvimento do
País. A presidenta afirmou também que o atual
momento de reivindicações populares por mais
avanços sociais indica que os brasileiros não
desejam um retorno ao passado, mas sim o
aprofundamento de conquistas que somente
foram possíveis a partir da mudança de
paradigma do governo, que passou a encarar
o combate à desigualdade como prioridade.
“Quando nós promovemos a ascensão
social – e hoje estamos perto de eliminar
a pobreza extrema – sabíamos que isso
era só o começo para maiores exigências.
Quando criamos um grande contingente de
cidadãos com melhores condições de vida
e com maior acesso à informação, vimos
surgir um cidadão com novas vontades,
anseios, desejos, exigências e demandas.
Ninguém, neste último mês de várias
manifestações, pediu a volta ao passado.
Pediram, sim, o avanço para um futuro com mais
direitos e mais democracia. Exigiram avanços,
e tudo o que ocorreu floresceu justamente em
meio a um processo de mudança que estamos
fazendo no Brasil há uma década”, disse a
presidenta.
Dilma lembrou que entre 2003 e 2013
“ocorreu a maior redução da desigualdade dos
últimos 50 anos” no Brasil: “Foi nesta década
que criamos um sistema de proteção social que
vai nos permitir praticamente superar a extrema
pobreza. Em um mundo que desemprega,
criamos quase 20 milhões de empregos
com carteira assinada. Onde os países se
endividaram e o déficit público chegou a níveis
extraordinários, nós construímos o controle da
inflação”, enumerou.
Agora, segundo a presidenta, o Brasil
quer mais: “Fizemos nestes dez anos o mais
urgente e necessário para superar aquele
nosso momento histórico, mas agora fomos
cobrados a fazer mais. Queremos e devemos
fazer mais. Democracia gera o desejo de mais
democracia. Inclusão provoca cobranças por
mais inclusão. Qualidade de vida desperta o
anseio por mais qualidade de vida. Para nós,
o fim da miséria e todos os outros avanços
conquistados são só o começo. Todos nós
queremos mais”, disse.
A Presidenta afirmou querer “incorporar
empresários e trabalhadores cada vez mais
nesse processo” e saudou o papel cumprido
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Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social
pelo CDES neste novo momento vivido pelo
País na última década: “O CDES merece
calorosos cumprimentos pelos dez anos
de atividades. Tem sido um interlocutor
muito importante do governo, seja por sua
capacidade de análise e formulação, seja por
sua representatividade. O diálogo travado no
Conselho tem sido fundamental, e o Brasil
hoje não pode prescindir de canais desse tipo,
conectado como o Brasil real. Essa conexão
é estratégica para que de fato possamos
melhorar as questões de representatividade no
Brasil. Este Conselho demonstrou nestes dez
anos que, ao representar os segmentos mais
diferentes colocou os interesses do País acima
de interesses específicos”.
Ao assumir a luta contra a desigualdade
como prioridade para o País, o CDES, disse a
presidenta, ajudou a pavimentar o caminho hoje
trilhado pelo governo: “O maior obstáculo ao
desenvolvimento era a desigualdade. Ao colocar
isso no centro de suas discussões, o CDES deu
um passo à frente para que possamos reduzir
a desigualdade entre regiões, entre homens
e mulheres, entre negros e brancos, entre
empresas de diferentes tamanhos, entre setores
produtivos, ente cidadãos na base e no topo da
pirâmide social. Avançamos muito no combate,
mas o CDES nunca deixou de registrar que
ainda há um longo caminho a percorrer para
que o Brasil seja um país sustentável e justo.
Esse processo de avanço não deve, não pode
e não será interrompido. Ao contrário, está
sendo mantido e ampliado. Estamos vencendo
focando nos desafios que queremos superar”.
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Críticas infundadas
Dilma criticou o que qualificou como críticas
infundadas a atual situação do País: “Aproveito
para repelir as posturas pessimistas contra a
economia brasileira em um futuro próximo.
Os dados desmentem esse pessimismo, hoje
temos melhores condições do que tivemos
em anos passados. Não estou dizendo que
não temos que melhorar, mas temos a força
necessária para superar os desafios”, disse.
Ao falar das “parcerias e concessões que estão
atraindo investidores”, a presidenta citou
a 11ª rodada da ANP, que teve recorde de
participação com 39 empresas de doze países,
e da “expectativa positiva para outubro”, quando
será realizada a rodada de leilão do pré-sal.
Dilma citou ainda os dois leilões de energia
elétrica ocorridos em maio e junho e as novas
regras aprovadas para os portos brasileiros:
“O País precisa enfrentar seus custos e o desafio
de transformar o ambiente de negócios. Haverá
um anúncio público de 50 terminais de uso
privativo, o que indica que esse processo será
também bem-sucedido ao abrir a participação
de investimentos privados de nosso País”, disse,
antes de afirmar que novos investimentos serão
feitos entre agosto e dezembro nas rodovias,
ferrovias e aeroportos.
A presidenta garantiu aos conselheiros
do CDES que a inflação está sob controle:
“A inflação vem caindo de forma consistente
nos últimos meses e temos certeza de que
vamos fechar o ano com a inflação dentro da
meta. A solvência do Estado brasileiro está
garantida. Podemos ter a certeza de que o
Revista do Seminário Internacional sobre Desenvolvimento – 10 anos CDES
Brasil tem uma situação de solvência e robustez
fiscal. A dívida líquida é muito menor do que
há dez anos e o déficit da previdência está
em torno de 1% do PIB, um dos menores da
década, assim como as despesas do governo.
Os números reais mostram que é incorreto falar
de descontrole da inflação ou das despesas
do governo. É desrespeito aos dados ou à
lógica, para dizer o mínimo. A exploração
parcial dos fatos confunde a opinião pública
e visa criar um ambiente de pessimismo.
Trata-se de um barulho muito maior do que o fato.
Temos problemas, sim, mas a situação é muito
melhor do que no passado”.
necessárias para dar respostas à nova
realidade brasileira, inclusive o ambiente
político criado pelas manifestações de junho.
Enfatizei que era necessário ouvir a voz das
ruas, interpretar e perceber que tinham um
norte bem diferente das manifestações que
vemos no mundo. Aqui, é uma questão de
mais direitos sociais, mais valores públicos,
éticos e de maior representatividade.
É meu dever traduzir essas demandas em
ações práticas do governo. Não devemos
nem podemos ficar indiferentes, mas ter a
humildade de reconhecer que lutar por mais
direitos é algo que só honra o nosso País”.
Pactos
Dilma apresentou oficialmente ao CDES os
cinco pontos do pacto que propôs à sociedade
brasileira após as recentes manifestações:
responsabilidade fiscal; reforma e planejamento
urbano; educação; saúde e reforma política.
Antes de serem apresentados ao CDES, os cinco
pontos foram discutidos pela presidenta com
lideranças do Congresso Nacional, do Supremo
Tribunal Federal (STF) e dos movimentos sociais.
“A reunião do CDES tem uma pauta
muito importante, que é discutir as ações
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Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social
O CDES e as novas transformações
brasileiras
Os conselheiros Clemente Ganz Lúcio
(DIEESE), Sérgio Haddad (ONG Ação Educativa),
Jackson Schneider (Embraer) e Nair Goulart
(Força Sindical) defenderam, no Seminário
Internacional sobre Desenvolvimento, o papel
do CDES como espaço de diálogo, envolvendo
diferentes atores, para apontar soluções
efetivas para problemas e para a realização das
transformações necessárias para o País.
“A mensagem vinda das ruas é a de que
o País precisa passar por uma nova onda
de transformações, que devem ter como
alvo o bem-estar social, a qualidade de vida,
o bem viver”, defendeu Clemente Ganz Lúcio,
diretor-técnico do Departamento Intersindical de
Estatística e Estudos Sócio-econômicos (DIEESE).
“É urgente revitalizar instituições da vida pública
capazes de revigorar o Estado brasileiro”,
pontuou o conselheiro que participou do
Seminário Internacional sobre Desenvolvimento.
Para que isso ocorra, ele defendeu que a reforma
política precisa ser a prioridade número um,
com mudanças no funcionamento dos partidos
e no sistema eleitoral, além de ampliação do
papel da sociedade nos processos propositivos
e reiterativos.
“A reforma política também requer o
fortalecimento das instituições criadas nos
últimos anos, como os conselhos, fóruns e
conferências, para a elaboração de políticas
públicas, controle e muitas vezes até gestão
das próprias políticas pública”, acrescentou
o diretor do DIEESE. Em sua intervenção,
Clemente ainda retomou momentos históricos
do Conselho. Lembrou que no início do órgão,
10
após pedido do então presidente Lula, foram
apresentadas pelos conselheiros 300 diretrizes
em prol do desenvolvimento do país, o que foi
depurado para pouco mais de duas dezenas.
Destacou também temas pelos quais o
Conselho se debruçou ao longo dos anos,
entre eles combate à desigualdade e reforma
tributária. E, diante da presidenta Dilma,
manifestou apoio aos pactos nacionais
propostos após as manifestações de junho,
como na saúde, educação e mobilidade urbana.
Plano Nacional de Educação
Coordenador de projetos estratégicos
da ONG Ação Educativa e Conselheiro do
CDES, Sérgio Haddad defendeu, no Seminário
Internacional sobre Desenvolvimento, a
aprovação do Plano Nacional de Educação
(PNE), enviado ao Congresso pelo governo
federal em dezembro de 2011 e que ainda
aguarda apreciação. O PNE apresenta dez
diretrizes objetivas e 20 metas, seguidas das
estratégias específicas de concretização até
2020. O projeto de lei determina também a
ampliação progressiva do investimento público
em educação a 10% ao final do período.
Haddad defendeu o uso dos royalties do
petróleo como forma de atingir essa meta.
Ao falar em nome do Conselho, Haddad
explicou que o tema da educação foi o primeiro
consenso obtido nas discussões do CDES. O tema
seria tratado não apenas como base para geração
de “mão de obra e crescimento econômico”,
mas também para o “desenvolvimento político,
social, cultural e ambiental”.
Revista do Seminário Internacional sobre Desenvolvimento – 10 anos CDES
O coordenador da Ação Educativa disse
ainda ser necessário uma “visão sistêmica da
educação”. Isso significa pensar nas relações
entre ensino infantil, fundamental, médio,
superior e técnico. Ou seja, o ensino superior
melhora a qualidade do ensino oferecida por
professores, assim como um maior grau de
escolaridade dos pais pode ajudar os filhos em
sua trajetória na escola.
Conselheiro Clemente Ganz Lúcio (DIEESE)
Mas há mais desafios pela frente, na visão
de Haddad. Um deles trata-se da desigualdade
regional, ainda apontada nos indicadores,
apesar dos “esforços recentes” do poder
público. “A educação não pode ser fator de
reprodução de desigualdade”, reforçou o
conselheiro.
Um segundo desafio diz respeito à
superação das dificuldades de coordenação
entre União, estados e municípios na
gestão da educação. Segundo Haddad,
há cidades com escolas geridas por um
desses atores, com regimes diferentes
para os alunos e também professores, em
termos de plano de carreira e salários.
“Temos de avançar na corresponsabilidade
entre todos”, defendeu.
Conselheiro Sérgio Haddad (ONG Ação Educativa)
Conselheiro Jackson Schneider (Embraer)
Desenvolvimento sustentável
O conselheiro Jackson Schneider, vice-presidente na Embraer, falou sobre o
crescimento econômico pela via do investimento,
defendendo um desenvolvimento sustentável,
com inserção social e disponibilidade de
serviços de alta qualidade: o aumento dos
investimentos produtivos deve se aliar à
Conselheira Nair Goulart (Força Sindical)
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Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social
melhoria de infraestrutura e ao investimento
em educação.
Urbanização e mobilidade
Schneider alertou para a interdependência
global, o quadro de crise internacional e
os frequentes fatores de instabilidade que
dificultam o propósito de o País aumentar
a taxa de investimento. O conselheiro citou
diversas medidas de longo prazo adotadas
pelo governo brasileiro – desoneração de
setores, ajuste de câmbio, queda de juros,
entre outras – que buscaram diminuir os custos
de produção das empresas, com o intuito de
desencadear um ciclo virtuoso de investimento
e aumento de produtividade. Apesar das
evoluções positivas, ele alertou para o fato de
o Brasil ainda ser um país caro para investir,
com um ambiente regulatório que desestimula
o empreendedorismo e os investimentos.
razão de a vida urbana ainda ser orientada
Para o conselheiro, a infraestrutura é
uma área em que muitos investimentos
podem ocorrer e que pode “destrancar” os
investimentos em outros setores. Ao encontro
de debates do CDES, as soluções passam
pelas medidas que o governo está tomando:
trabalho com o setor privado por meio de
concessões e PPPs. Ele também colocou a
qualificação de mão de obra e a simplificação
tributária como essenciais. Schneider destacou
ainda a necessidade de esforço efetivo entre
governo, legislativo e sociedade, para solução
dos problemas que são de todos.
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Já a conselheira Nair Goulart indagou a
pelos imperativos de interesses de poucos,
mesmo com a construção de tantos fóruns
de diálogo, avanços legais, nestas décadas
de redemocratização do Brasil: “não há como
deixar de lado o debate sobre a questão
urbana brasileira e as políticas públicas que
façam prevalecer o interesse da maioria”,
afirmou.
Nair Goulart observou que, ao longo do
século XX, o Brasil sofreu um rápido processo
de urbanização, que aliou a expulsão da
população rural à ocupação das grandes
cidades. Como pesada herança deste processo,
as desigualdades sociais ficaram ainda mais
evidentes nos grandes centros urbanos do
País. Frente a esse quadro, defendeu, é preciso
adotar estratégias locais, com investimento,
planejamento urbano, adoção de transportes
públicos de qualidade, com redes de drenagem
e saneamento, em ações articuladas entre
os vários entes federativos. Nair também
indicou a necessidade de adotar programas
de mobilidade urbana sustentável, no intuito
de favorecer o transporte coletivo de massa,
expandir ciclovias e estimular caminhadas, em
articulação com projetos de desenvolvimento
urbano e de uso do solo.
Revista do Seminário Internacional sobre Desenvolvimento – 10 anos CDES
Marcelo Neri: O Brasil está
crescendo com qualidade
anos o país não apenas cresceu, mas também
distribuiu melhor sua riqueza. De acordo com
ele, esse é um fator relevante porque reflete
a “impressão digital” desenvolvida pelo CDES
nos últimos anos.
É uma situação diferente daquela dos países
desenvolvidos afetados pela crise internacional.
Recém-chegado de um seminário na Grécia,
Neri relatou a dificuldade daquele país, onde o
Ao fazer sua intervenção no Seminário
salário real caiu 50% em cinco anos e a taxa de
Internacional sobre Desenvolvimento, realizado
desemprego atinge 27%. O Brasil, em direção
em Brasília, no dia 17 de julho, para celebrar
oposta, elevou seu rendimento médio em 40%
os dez anos do Conselho de Desenvolvimento
no mesmo período e o desemprego está na
Econômico
casa dos 5% - considerado pleno emprego.
e
Social
da
Presidência
da
República, o ministro Marcelo Neri (Secretaria
de Assuntos Estratégicos), que também é
secretário-executivo do Conselho, tratou de
analisar o crescimento econômico recente do País.
Não apenas sobre o quanto o Brasil tem crescido,
mas também que tipo de crescimento tem sido
esse e como ele reflete na vida das pessoas.
O secretário-executivo do CDES se referiu
também aos índices de felicidade, lembrando
que o Brasil segue entre os países mais felizes
– era o décimo-oitavo – entre 160 nações
pesquisadas. Ele destacou o fato de que
os brasileiros estão entre os mais otimistas
quanto ao futuro – “um traço de nossa
Neri mostrou que os setores mais pobres
personalidade”. No entanto, a nota dada
da sociedade brasileira estão mais próximos,
ao País costuma ser um pouco mais baixa,
em termos de renda recebida, dos setores mais
revelando certo descompasso entre esperança
ricos. Isso significa, portanto, que nos últimos
e realidade.
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Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social
Para diretor da OMC, cenário mundial
está mais complexo e menos acolhedor
Cinco anos depois da crise econômico-
Houve um início de redesenho da arquitetura de
-financeira internacional de 2008, o mundo
governança global com mudanças na estrutura
é
do Fundo Monetário Internacional (FMI), como
mais
complexo
e
menos
acolhedor.
a
a transferência de cotas dessa instituição para
emergência de novos atores globais não
países com economias emergentes dinâmicas
governamentais com capacidade de mobilização
como o Brasil. No entanto, ressaltou Eduardo
social e formação de opinião. Menos acolhedor
dos Santos, há ainda forte resistência às
porque a crise fez surgir formas mais sofisticadas
mudanças e permanece um forte déficit de
de protecionismo e novos países com poder
representação nestas instituições. Para ele,
decisório nas instâncias de governança global.
o maior risco hoje é a ameaça de esfacelamento
Essas foram as principais conclusões do painel
de autoridade do Conselho de Segurança
“Transformações no contexto global e os desafios
da Organização das Nações Unidas (ONU).
para a governança”, que abriu o Seminário
“A reforma desse conselho é inadiável e é
Internacional sobre Desenvolvimento de 2013.
uma condição para assegurar a possibilidade
Mais
complexo
porque
se
consolidou
O embaixador Eduardo dos Santos, ministro
de Relações Exteriores em exercício, destacou
o aumento de complexidade do cenário de
governança internacional, com o surgimento
de
novos
atores
não
governamentais.
Outra novidade importante nos últimos anos
foi a mudança no processo decisório mundial,
da qual a eleição do brasileiro Roberto Azevêdo
para a direção-geral da OMC é um exemplo.
O embaixador citou ainda a consolidação do
G-20 como fórum de líderes, após a crise de
2007-2008. “Esse grupo assumiu escopo e
significado mais amplo a partir de 2002, com
o reconhecimento da insuficiência do G7 e do
G8 para lidar com a crise”.
governança
diplomata brasileiro.
O retorno do protecionismo
O diretor-geral da OMC, Roberto Azevêdo,
apresentou alguns elementos para justificar a
tese de que o mundo se tornou um lugar menos
acolhedor. Ele tomou o ano de 2008, que
marca o início da crise econômico-financeira
internacional, como a referência central dessa
análise. Segundo Azevêdo, os cinco anos de lá
para cá são importantíssimos pelos efeitos que
apresentaram. Em primeiro lugar, destacou,
o protecionismo voltou de maneira mais
de subsídio à exportação, de cotas restritivas
internacional
ou outras medidas facilmente identificáveis.
incluíram países em desenvolvimento, como
Hoje o protecionismo é mais sofisticado,
o Brasil, nas mesas de tomadas de decisões.
como as políticas estatais de apoio a setores
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na
representatividade do Conselho”, defendeu o
sofisticada. “Não é o protecionismo tradicional,
De um ponto de vista concreto, as
mudanças
do multilateralismo e diminuir o déficit de
Revista do Seminário Internacional sobre Desenvolvimento – 10 anos CDES
fragilizados (setor financeiro, setor automotivo,
tudo isso aumenta o quadro de incerteza no
por exemplo) e outros tipos de subsídios
cenário mundial.
domésticos. Os países que têm mais recursos
para apoiar suas empresas e seus empregos,
estão agindo nesta direção. O protecionismo
tradicional não é o único que existe”.
Esses países emergentes, lembrou ainda
Roberto Azevêdo, foram muito resistentes
no momento da crise. “Foram as economias
que conseguiram crescer. São os países que
Segundo efeito apontado pelo diretor-
até hoje têm taxas de desenvolvimento mais
-geral da OMC: com as novas tecnologias,
altas. As moedas desses países são valorizadas.
o volume de capital que atravessa as fronteiras
Há um impacto negativo dessa valorização
é muito maior. Apesar da crise de 2008, admitiu
sobre as exportações, mas é um dado novo
Azevêdo, pouco se mudou em termos de
com importantes repercussões na capacidade
governança financeira. “O mundo financeiro
de investimento dessas nações. A China
hoje segue tão pouco regulado quanto era em
tem hoje um estoque de investimentos de
2008. Pouco ou nada mudou”.
1,2 trilhões de dólares. Hoje, uma em cada
Em terceiro lugar, os países desenvolvidos
estão crescendo mais devagar. A superação da
quatro grandes transnacionais estão sediadas
em países do Sul”, exemplificou.
crise de 2008 vai demorar e, em muitos casos,
Mas esse aumento de influência e
se dará em um quadro de desemprego alto,
poder tem uma contrapartida no plano
o que exacerba muito a sensibilidade política dos
da
países onde isso ocorre. A crise orçamentária
“Países como o Brasil não são mais vistos
na zona do euro, as crises políticas em várias
como
regiões e o surgimento dos países emergentes,
precisam de ajuda. Nas mesas de negociações,
responsabilidade,
países
em
ressaltou
Azevêdo.
desenvolvimento
que
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Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social
também,
cenário de grande incerteza onde os chamados
abrindo novos mercados, comprando mais,
países emergentes têm um papel muito maior.
compartilhando responsabilidades nos fóruns
“O espaço de negociação se tornou muito
de governança global”. Essa nova realidade
mais estreito. Nós temos mais voz, mas agora
traz
estamos negociando entre pares, para ganhar
são
chamados
algumas
a
contribuir
interrogações,
acrescentou.
“Esse mundo emergente está se agregando
ao mundo desenvolvido ou está se erguendo
como um contraponto a esses países?”
A pergunta ainda está em aberto, assinalou.
A conclusão disso tudo, enfatizou o
diretor-geral da OMC, é que se trata de um
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algo tem que ceder algo. O mundo é hoje
um lugar menos acolhedor para questões de
desenvolvimento. Isso significa que o trabalho
de fóruns como este do CDES é fundamental
para enquadrar o debate do desenvolvimento
em um âmbito mais humano e social, e não só
na dimensão econômica”, disse Azevêdo.
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Ministros convocam CDES a
participar de pacto pela Saúde
Os ministros da Saúde, Alexandre
Padilha, e da Educação, Aloizio Mercadante,
convocaram os integrantes do Conselho de
Desenvolvimento Econômico e Social (CDES) a
auxiliarem o governo no debate e formulação
das políticas públicas que visam o aumento do
número de médicos no Brasil e a ampliação
do atendimento em todas as regiões e para
todas as camadas sociais do País. Ao lado da
presidenta Dilma Rousseff, que defendeu um
pacto social pela saúde, Padilha e Mercadante
participaram do Seminário Internacional sobre
Desenvolvimento. Ambos defenderam junto
aos conselheiros e às conselheiras as mudanças
recentemente anunciadas para o setor.
Padilha afirmou que a área de saúde
representa hoje 30% dos investimentos em
inovação tecnológica realizados pelo país,
e que o governo tem investido no aumento
dos serviços e no aprimoramento da gestão:
“Nos últimos cinco anos, aumentamos em
70% os serviços e em 45% os equipamentos
que dependem exclusivamente de médicos.
Aumentamos em 17% o número de leitos
e em apenas 14% o número de médicos”,
disse. O ministro apresentou outro dado que,
segundo ele, revela a necessidade que o Brasil
tem de mais médicos: “Nos últimos dez anos,
geramos 143 mil primeiros empregos de
carteira assinada para médicos e formamos
93 mil médicos. Geramos, portanto, 50 mil
postos a mais do que nossa capacidade atual
de formação”.
Nos últimos dez anos, segundo
Padilha, o Brasil multiplicou por quatro
seu investimento per capita em saúde.
Apesar disso, diz o ministro, “a oferta de
médicos no País é crítica” e muitos hospitais
brasileiros funcionam sem número suficiente
de médicos: “O Brasil tem poucos médicos e
eles são mal distribuídos. Vinte e dois estados
brasileiros estão abaixo da média nacional de
1,2 médicos para cada mil habitantes, que
já é baixa. Cinco estados se encontram em
situação de alta escassez, com menos de um
médico para cada mil habitantes, e mesmo
dentro dos estados a situação é desigual.
No passado não formamos os especialistas
de que precisávamos”.
O aumento do número de médicos
formados, segundo Padilha, terá um “enorme
impacto social” em todo o país: “Precisamos
dar oportunidade ao jovem negro, da
periferia, do interior, da classe média baixa.
Dar oportunidade ao médico que quiser se
especializar. Precisamos também mudar a
formação médica, por isso é importante a
adoção do segundo ciclo de formação com o
atendimento no Sistema Único de Saúde (SUS)”,
disse. O ministro afirmou ser fundamental a
participação dos diversos setores da sociedade
no debate sobre o pacto pela saúde: “O CDES
é um espaço privilegiado para essa discussão,
que deve ser movida pelo interesse nacional e
não por interesses corporativos”.
Novos médicos
O ministro Aloizio Mercadante falou sobre
a necessidade de aumentar o ingresso de novos
médicos no mercado de trabalho brasileiro
17
Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social
Ministro Alexandre Padilha
Ministro Aloizio Mercadante
a partir do aumento do número de vagas
sendo debatido no Ministério da Educação
e no Conselho Nacional de Educação,
com provável aplicação a partir de 2015:
“Esse ciclo será feito em forma de serviços
que serão prestados no SUS. Não é uma
iniciativa inédita nem, absolutamente, uma
coisa específica do Brasil, pois é praticada
em pelo menos 13 outros países, inclusive
em alguns que são referências em serviços
de saúde”, disse. Mercadante anunciou
que, enquanto estiverem prestando serviços
ao SUS, os médicos em segundo ciclo de
formação receberão bolsa de auxílio financeiro
e supervisão acadêmica. Além disso, serão
obrigatoriamente alocados em unidades
próximas à sua região e terão sua prestação
de serviço vinculada à residência médica.
nas faculdades de medicina em todo o Brasil.
Nos últimos dez anos dobrou o ingresso
de
estudantes
de
que
formou
14.634
assim,
sob
qualquer
medicina
no
médicos:
parâmetro
País,
“Ainda
que
a
gente analise, faltam médicos no Brasil.
Temos que ter uma política pública para uma
melhor distribuição dos médicos no Brasil, pois
eles estão muito concentrados”, disse.
Mercadante afirmou que “existem dois
caminhos para melhorar a oferta de médicos” no
Brasil: “Um deles é o Revalida, que é uma prova
que todo médico faz e todo médico estrangeiro
que quiser trabalhar aqui terá de fazer, que não
é nem mais nem menos do que é exigido do
estudante de medicina no Brasil. O outro é o
programa Mais Médicos, que trará mais médicos
para trabalhar no Brasil, nas condições que o
Ministério da Saúde está desenvolvendo”.
O ministro falou também sobre a adoção
do segundo ciclo de formação, que está
18
Políticas afirmativas
A polêmica criada em torno das propostas
do governo para o aumento do número de
médicos foi comentada por Mercadante:
“O debate sobre esses dois anos de formação
Revista do Seminário Internacional sobre Desenvolvimento – 10 anos CDES
complementar
dos
médicos
é
intenso.
Da mesma forma que o debate sobre o
ProUni, quando sofremos grande resistência,
inclusive uma ação de inconstitucionalidade no
Supremo Tribunal Federal (STF), sob a alegação
de que iríamos comprometer a qualidade
do ensino. Hoje, os alunos do ProUni têm
desempenho muito próximo dos demais alunos.
Também sofremos resistência quando fizemos
o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) ou
defendemos a adoção da política de cotas nas
universidades”.
As políticas afirmativas do governo na
área de educação, segundo Mercadante,
sempre foram alvo das críticas das elites.
Como resposta, ele citou os 24 mil estudantes
de medicina que atualmente recebem bolsas
do Fundo de Financiamento Estudantil (FIES):
“Os alunos pobres e carentes do FIES só têm
condições de concluir seu curso de medicina
com a bolsa que recebem. Depois, para pagar
esse financiamento, precisarão de oito anos
de serviços no SUS. Mas, para isso não houve
crítica. Sabem por quê? Porque são pobres”,
encerrou o ministro.
19
Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social
Rede de Conselhos Econômicos e Sociais
da América Latina e Caribe lança Carta
de Brasília
Realizada no dia 18 de julho, em Brasília,
na sequência do Seminário Internacional
sobre Desenvolvimento, a Oficina da Rede de
Conselhos Econômicos e Sociais da América
Latina e Caribe (CESALC) reuniu representantes
de nove países da região, além de convidados
europeus, em mais uma rodada de
aproximação global entre os conselhos sociais
e instituições similares. Ao fim da Oficina, seus
participantes aprovaram a Carta de Brasília,
documento que se compromete a “fortalecer
a CESALC como um instrumento de diálogo e
de troca de saberes, possibilitando a difusão
das experiências existentes e estabelecendo
uma agenda de temas de interesse comum de
debates”.
Assinada por representantes dos conselhos
econômicos e sociais do Brasil, Argentina, México,
Honduras, Panamá, República Dominicana,
Guatemala, El Salvador e Curaçao, a Carta
20
reitera o compromisso com o fortalecimento de
cada membro da CESALC, “compreendendo
as peculiaridades de cada um e os desafios
comuns e buscando promover processos de
aperfeiçoamento e de inovação do instrumento
e a difusão dos impactos dos resultados do
diálogo”.
Os presentes à Oficina também se
comprometeram a “participar da administração
da CESALC, contribuindo para a sua
consolidação e estabelecendo um modelo de
gestão compartilhada, bem como uma agenda
anual de atividades organizadas conjuntamente
ou por um determinado membro da Rede” e a
“contribuir para a divulgação das experiências
dos conselhos econômicos e sociais, suas
propostas e resultados no Portal da CESALC,
instrumento
a
ser
permanentemente
fomentado por todos os membros da Rede e
que visa facilitar e o fluxo das informações”.
Revista do Seminário Internacional sobre Desenvolvimento – 10 anos CDES
A Carta de Brasília traz ainda três
recomendações que devem nortear as ações da
CESALC nos próximos anos: i) o fortalecimento
do modelo de governança participativa e dos
conselhos, garantindo seu funcionamento e
representatividade; ii) o fortalecimento dos
atores e organizações da sociedade, garantindo
protagonismo nos processos de participação; e
iii) a criação de novos conselhos econômicos
e sociais e instituições similares em países
latino-americanos e caribenhos.
e a capacidade de definir de forma participativa
os grandes rumos do desenvolvimento”.
Diálogo
Além dos representantes dos conselhos
econômicos e sociais dos nove países da
região, também participaram da oficina da
CESALC o Programa EUROsociAL da Comissão
Europeia; o Conselho Econômico e Social da
Espanha; o Banco Mundial; a Câmara Cívica da
Federação Russa; a Associação Internacional
de Conselhos Econômicos e Sociais e
Instituições Similares (AICESIS); o Conselho
Nacional de Economia e Trabalho (CNEL) da
Itália; e o Centro Nacional de Planejamento
Estratégico do Peru (CEPLAN).
A Oficina da CESALC foi dividida em três
mesas de diálogo, realizadas ao longo do dia
com os temas: potencial e oportunidades,
eixos de atuação e governança e gestão.
As mais importantes considerações feitas
pelos representantes dos países da América
Latina e do Caribe durante as mesas de diálogo
referem-se à afirmação de que a criação de
conselhos econômicos e sociais e instituições
similares na região “tem contribuído para ampliar
a interlocução entre os governos e a sociedade
O documento afirma que “as contribuições
dos conselhos econômicos e sociais devem
favorecer a qualidade das ações dos governos
e produzir resultados concretos nas políticas
públicas”, e que “a pluralidade da composição
dos conselhos econômicos e sociais e
instituições similares permite que o diálogo
seja enriquecido pela diversidade das visões e
perspectivas e gere pactos”.
21
Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social
O fortalecimento mundial dos
Conselhos Econômicos e Sociais
Desde sua criação há dez anos, um
dos principais objetivos do Conselho de
Desenvolvimento Econômico e Social (CDES)
é promover o debate internacional sobre as
questões ligadas ao desenvolvimento a partir
de uma ótica de cooperação e entendimento
entre os diversos países que buscam o caminho
da sustentabilidade e da inclusão social.
Um balanço sobre o avanço dessa cooperação
foi realizado por alguns representantes
estrangeiros que participaram em Brasília do
Seminário Internacional sobre Desenvolvimento
organizado pelo CDES.
Secretário geral da Associação Internacional
de Conselhos Econômicos e Sociais e Instituições
Similares (AICESIS), o francês Patrick Venturini
revelou sua “grande satisfação” com o fato de o
CDES estar completando dez anos de atividades
e afirmou que o exemplo dado pelo Brasil ao
instituir esse espaço privilegiado de diálogo
entre os diversos setores representativos da
sociedade serviu como “importante estímulo”
para que outros países buscassem experiência
semelhante: “Em 1999, tínhamos 25 países na
mesa de negociações da AICESIS. Atualmente,
temos 71 países, sendo dezenas de países da
América Latina e com cada vez mais países da
Ásia. Cada país tem buscado mobilizar suas
forças sociais e temos conseguido realizar trocas
de experiências muito boas”, disse.
Representante residente do Programa das
Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD)
no Brasil, o argentino Jorge Chediek afirmou
que o fortalecimento de conselhos econômicos
e sociais nos países da América Latina contribuiu
22
Patrick Venturini (AICESIS)
Jorge Chediek (PNUD)
Julián Ariza (Conselho Econômico e Social da Espanha)
Gustavo Porras (Conselho Econômico e Social da Guatemala)
Revista do Seminário Internacional sobre Desenvolvimento – 10 anos CDES
para o surgimento de políticas econômicas
e macroeconômicas inovadoras na região:
“Estamos criando novas formas de fazer política
e desenvolvimento, e muitas dessas políticas não
serão implementadas pelos tradicionais marcos
do Estado. Por isso, achamos que o processo
desenvolvido no Brasil, tanto de realização das
conferências setoriais quanto da atuação do
CDES é tão importante, por romper com as
estruturas da política clássica”.
Chediek anunciou que na próxima semana
serão apresentados os resultados de um
estudo, realizado em parceria entre o PNUD
e o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
(Ipea),
com
índices
de
desenvolvimento
humano das cidades brasileiras: “Para cada
prefeitura,
foram
analisados
130
dados
diferentes. Este será mais um instrumento de
apoio ao desenvolvimento e à implementação
das políticas sociais no Brasil”, disse.
Representante do Conselho Econômico
e Social da Espanha, Julián Ariza fez uma
comparação entre as situações de seu país,
mergulhado em crise econômica desde 2008,
e o Brasil, que vem enfrentando os efeitos
da mesma crise com políticas de estímulo ao
consumo e ao desenvolvimento: “O presidente
do Banco Central europeu disse recentemente
que o estado de bem estar social na Europa
está morto. Está acontecendo uma mudança
do modelo social na Europa. Ao objetivo de
correção do déficit, se atrelaram todos os
demais, inclusive o emprego. Na Espanha,
vivemos uma nova distribuição do emprego
e das riquezas, com enorme desigualdade”,
disse. Ariza, no entanto, afirmou que o
Conselho espanhol continua seu trabalho:
“Seguimos tendo confiança nesse diálogo
institucionalizado e no futuro de nosso País”,
disse.
Um exemplo de avanço social ocorrido nos
últimos anos foi relatado por Gustavo Porras,
presidente do Conselho Econômico e Social da
Guatemala. Entre as conquistas guatemaltecas
citadas por Porras, estão o aumento da
participação dos indígenas e das mulheres
nos processos políticos e sociais, a profunda
mudança de paradigma na educação, com
98% das crianças matriculadas na escola e
o aumento da organização de base local:
“Estes capitais sociais fazem da Guatemala
cada vez menos uma sociedade oligárquica”,
disse.
23
Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social
Moema Miranda: “Mobilizações
nas ruas exigem nova política”
A sociedade que emerge dos protestos
em todo o mundo – Primavera Árabe, Occupy
Espanha, Occupy Wall Street – e a recente onda de
manifestações no Brasil exige uma nova política,
capaz de trabalhar com representações plurais e
superar a divisão de classes. Essa é a avaliação de
Moema Miranda, diretora do Instituto Brasileiro
de Análises Sociais e Econômicas (Ibase), que
participou da Oficina da Rede de Conselhos
Econômicos e Sociais da América Latina e Caribe,
em Brasília, no dia 18 de julho.
“Não muito tempo atrás nós pensávamos
que as pessoas que tomaram o poder
representavam o trabalhador ou o empresário,
exclusivamente. Mas hoje em dia há
trabalhadores e mulheres, ou negros, ou
índios, e nós temos de encontrar um diálogo
e interesses comuns a todos esses perfis”,
afirmou ela.
Outra novidade dos tempos recentes
apontada por Miranda trata-se da crescente
importância da variável ambiental nos temas
relacionados ao desenvolvimento e à luta
por justiça social. Nesta equação, não é mais
suficiente crescer a economia e distribuir a
riqueza para que um país ou uma região sejam
mais iguais, mas, sim, é necessário sempre
considerar o impacto do desenvolvimento
sobre o meio ambiente.
“Tivemos muitos avanços no Brasil, mas
continuamos a ser um país extremamente
injusto. Há muita pobreza e é preciso criar
oportunidades para todos. Mas temos que
reduzir os efeitos sobre a nossa ‘mãe gentil’,
como diz nosso hino nacional”, disse ela.
24
Além disso, sua avaliação é a de que as
instituições precisam desenvolver ferramentas
para estimular o diálogo entre diferentes
interesses. Mas, infelizmente, não existe uma
fórmula que garanta o sucesso. Seria necessário
inovar no formato e nas metodologias.
“Se há alguma coisa nova sobre a qual
refletir, não podemos ter medo de cometer
erros, precisamos experimentar, nos permitir
não ter certezas”, provocou Miranda,
diante dos participantes da oficina que
buscavam justamente ampliar suas conexões.
Nessa lógica, o diálogo torna-se imperativo,
“porque é o espaço em que nós colocamos
nossas convicções diante do outro para que se
transformem em dúvida”, defendeu.
Na última década, o Brasil passou por um
processo de redução da desigualdade, crescimento
do nível de emprego e aumento de renda das
famílias. Mesmo assim, o mês de junho de 2013
foi marcado por uma série de manifestações
populares nas ruas de diversas cidades brasileiras,
tendo como alvo o poder público e os políticos.
Diante desse cenário, Moema Miranda defendeu
a necessidade de adotar uma postura aberta e
ousada diante dos problemas sociais expostos
pelas manifestações para conseguir criar novas
institucionalidades e práticas políticas capazes de
dialogar com essas demandas.
Revista do Seminário Internacional sobre Desenvolvimento – 10 anos CDES
Secretária da CEPAL: “O Brasil está
melhor do que a imprensa diz”
Apesar da deterioração da expectativa
de economistas e empresários sobre o Brasil,
a mexicana Alicia Bárcena Ibarra, secretária-executiva da Comissão Econômica para a América
Latina e o Caribe (CEPAL), avalia que a saúde
econômica do País é boa. Segundo ela, diversos
indicadores brasileiros seguem superiores aos de
outros países latino-americanos e aos das nações
desenvolvidas. Bárcena participou do Seminário
Internacional sobre Desenvolvimento, em Brasília,
que celebrou os dez anos de existência do CDES,
no dia 17 de julho.
A
secretária-executiva
da
CEPAL
afirmou que, diante da persistência da crise
internacional, com recessão na Europa, baixa
expansão nos EUA e desaceleração da China,
o Brasil está menos exposto do que outras
nações latino-americanas. Isso porque seu PIB
depende menos de exportações, ingressos de
turismo e remessas de nativos no exterior.
Em 2013, a CEPAL estima uma expansão
para o Brasil de 2,5%, pouco abaixo da média da
América Latina, na casa dos 3%. O país da região
que mais deverá crescer será o Paraguai, com
12,5%, puxado por uma extraordinária colheita
de soja. O sinal de que há exagero negativo na
análise sobre a economia brasileira também
vem dos estrangeiros: o Brasil lidera com folga
o recebimento de investimentos estrangeiros
diretos em 2012, com US$ 65 bilhões.
Na sequência estão Chile, Colômbia e México.
“Os dados provam que o Brasil segue muito
atrativo para os investimentos. Fizemos uma
análise para entender em que setores são aplicados
esses recursos e descobrimos que boa parte segue
para o ramo manufatureiro, não extrativo, o que
é muito positivo”, explicou Bárcena. “O Brasil está
melhor do que a imprensa diz”, resumiu ela.
Ao analisar a crise internacional, a
economista mexicana criticou a política de
austeridade na Europa e elogiou os governos
latino-americanos por não terem optado por
esse caminho. Para ela, essa escolha é fruto de
mobilizações sociais que permitiram a quebra
do paradigma de décadas anteriores, em que
a “consolidação fiscal” era a base do processo.
“Promover a igualdade implica reconhecer
direitos e romper com um paradigma
econômico que elevou a desigualdade”,
afirmou. Bárcena reforçou que milhões saíram
da pobreza na região, a maior parte no Brasil,
onde 40 milhões deixaram essa condição.
Hoje, segundo ela, a América Latina é mais
resistente às crises do que o mundo desenvolvido.
Para que a região avance ainda mais,
Bárcena
defendeu
mais
crescimento
econômico, desde que baseado na
sustentabilidade ambiental, e a recusa
da consolidação fiscal como uma política
absoluta. Além disso, enfatizou a necessidade
de investir ainda mais em proteção social
universal à população e uma estrutura com
melhor distribuição dos fatores produtivos.
25
Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social
ANÁLISES
Belluzzo: Brasil precisa superar
enganos conjunturais e fazer política
macroeconômica
Maria Inês Nassif (*)
O Brasil saiu-se “muito bem” da crise
financeira mundial de 2008, mas ainda tem
que enfrentar sérios problemas, como “a
relação perversa entre juros e câmbio”, a saída
do País de sua estrutura de fornecimento e a
precariedade de sua infraestrutura. É o que
pensa o economista Luiz Gonzaga Belluzzo,
para quem a presidenta Dilma Rousseff tem
uma visão clara do que deseja para o País a longo
prazo, mas terá de enfrentar fortes obstáculos
para concretizar um projeto de futuro.
Um deles é a dificuldade dos agentes
econômicos
de
privilegiar
as
decisões
conjunturais às de caráter macroeconômico.
Um engano dessa visão conjuntural, por
exemplo, é tomar a desindustrialização do
País como uma transição para uma “economia
de serviços”. “Isto é uma fuga da realidade”,
adverte o professor. Estados Unidos e Europa,
que viveram desse engano nas últimas décadas,
hoje se empenham em se reindustrializar,
tentando levar, de volta, as empresas que
saíram de seus países para o mundo, atrás de
maiores vantagens para produção.
O Brasil precisa não apenas retomar sua
industrialização, mas fazer sua reintegração
produtiva
no
mundo,
diz
Belluzzo.
Nessa reacomodação interna e externa,
deve inclusive rever questões como o
protecionismo. Não é nada fora de propósito,
por exemplo, a presidenta querer exigir das
empresas que vão explorar o Pré-Sal um alto
grau de conteúdo nacional.
Os planos para o futuro, todavia, não
podem prescindir de uma atenção especial
à educação – não propriamente a educação
técnica, mas a educação humanista, aquela
que dê elementos para o cidadão entender
e julgar. “É preciso formar cidadãos, para
que não se forme o especialista idiotizado”,
diz.
Belluzzo
considera
importante
a
consolidação de uma cultura democrática
de debate em espaços de “controvérsia
e discussão”, a exemplo do Conselho de
Desenvolvimento Econômico e Social – e
para que eles funcionem, o fundamental é a
diversidade de formação e de pontos de vista.
Espaços de mediação
Para Belluzzo, a democracia não pode se
resumir exclusivamente ao voto. Os espaços
de controvérsia e discussão fazem parte do
processo democrático. “A cidadania é o
exercício permanente de participação”, afirma.
No Brasil, todavia, instâncias intermediárias,
destinadas a aproximar o escolhido pelo
voto e o cidadão, não são levadas muito em
conta. “Essas práticas foram construídas
pelos governos do PT e num período ainda
mais recente nos descuramos um pouquinho
da importância dessas práticas”, afirmou o
economista. Exemplos positivos dessas práticas
são o Orçamento Participativo e os conselhos.
“Os conselhos têm representação do
todo, portanto são fundamentais para a
construção da vida democrática”, diz Belluzzo.
(*) Jornalista e professora de comunicação na Faculdade Cásper Líbero/SP.
26
Revista do Seminário Internacional sobre Desenvolvimento – 10 anos CDES
E são particularmente importantes num Estado
que ganha complexidade, e onde a burocracia
tende a se tornar autônoma.
grave, se ocorre a desvalorização cambial; e
uma infraestrutura atrasada que onera muito
fortemente a exportação do País.
Para que o Conselho de Desenvolvimento
Econômico e Social (CDES) funcione, o
fundamental é a “diversidade de pontos de
vista e de formação”, opina.
Para Belluzzo, o Brasil se comportou
“razoavelmente bem” no pós-crise de 2008
– “aliás, acho que muito bem”, retifica – e a
presidenta Dilma tem feito um grande esforço
para quebrar essa “relação perversa” entre
juros e câmbio, que é um “convite para que
as empresas tomem empréstimos em moeda
estrangeira”. “Nós já assistimos esse filme
várias vezes, provavelmente desta vez não
vamos sofrer tanto, porque temos US$ 375
bilhões de reservas”, ressalva. De qualquer
forma, é uma equação que traz um alto grau
de instabilidade.
Papel de coordenação do Estado
“A tentativa de separar o Estado e o
mercado é uma dicotomia falsa”, afirma
Belluzzo. “Como dizia Fernand Braudel,
não há capitalismo sem Estado.” E a agenda
do Estado, segundo ele, tem de ser a de
coordenar um mercado que não tem tendência
a gerar bons resultados do ponto de vista da
equidade; não tem tendência à estabilidade;
nem permite projetar uma economia de longo
prazo. O Estado deve restabelecer suas três
funções: de “corretor de desigualdades”;
de “evitar o excesso de instabilidade
econômica”; e de planejar a longo prazo.
Reformas estruturantes
Belluzzo, Delfim Netto e o ministro
Guido Mantega se reúnem regularmente
para debater a economia. As preocupações
se concentram em três questões, segundo
Belluzzo: “a relação perversa que o Brasil
tinha entre a taxa de juros e o câmbio, com
câmbio muito valorizado e taxas de juros muito
altas”; em decorrência, a saída da “estrutura
de fornecimento” do País (o fornecimento
interno passa a ser feito pelo exterior), que
tem um efeito inflacionário potencialmente
A infraestrutura brasileira estagnou na
década de 1970, na crise da dívida externa
brasileira, e hoje exibe enormes gargalos. É um
enorme ônus para as exportações brasileiras,
afirma o economista.
A presidenta Dilma “tem clara a
questão de longo prazo”, diz Belluzzo,
mas enfrenta uma série de dificuldades,
inclusive a de governar em um momento
em que a conjuntura “tapeia”, ou seja,
obscurece, a questão mais importante
que é macroeconômica. Um dos enganos
colocados pela conjuntura, exemplificados
por Belluzzo, é a falsa ideia de que a economia
brasileira vai se tornar uma economia de
serviços. “Esta é uma fuga da realidade”,
afirma. “Os americanos e os europeus,
neste momento, estão desesperados para
se reindustrializar”.
27
Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social
“Durante 30 anos marcamos passo na questão
da industrialização”, afirmou. Nessas décadas, a
indústria mundial mudou completamente e hoje
está concentrada na Ásia e na China. As cadeias
produtivas foram internacionalizadas. “E o Brasil
ficou à margem do processo de internacionalização
produtiva”, afirma.
Para Belluzzo, a reintegração produtiva do
País recoloca, neste momento, a questão do
protecionismo. Dilma defende, por exemplo,
que a exploração do petróleo na camada de Pré-Sal seja condicionada a uma forte demanda de
conteúdo nacional. “Aí os conservadores dizem:
não, isso é coisa atrasada. Não é atrasada: eles
que são atrasados, pois na verdade, para manter
e desenvolver e até atrair o capital estrangeiro
(...) você precisa desse tipo de política”, afirma.
E o fato é que, desde os anos 1970, o Brasil vive
um declínio sistemático da indústria.
A questão a ser resolvida num processo
de desenvolvimento, para Belluzzo, é a
educação – não necessariamente a educação
técnica, mas fundamentalmente a educação
cidadã. “É preciso a formação de cidadãos,
para que não se forme o especialista
idiotizado”, diz. “Você não pode ter um país
desenvolvido sem ter um cidadão capaz de
compreender”.
“O meu maior medo”, diz Belluzzo, “é que
o Brasil vire um país rico, próspero, mas com
uma população insuficientemente formada e
com baixo nível cultural”. Isto, segundo ele,
não é defender uma ilustração das pessoas,
mas “a capacidade de compreensão e de
julgamento”.
28
Estado de Bem-Estar foi derrotado
“O neoliberalismo não é um produto de
[Ronald] Reagan ou [Margareth] Thatcher,
é produto da derrota da luta social. Foi essa
derrota que permitiu a ascensão de Reagan e
de Thatcher”, afirma o professor. Ele aponta
que, em no final dos anos 1960, meados
dos anos 1970, “começou a haver um certo
incômodo (...) com o poder dos sindicatos,
com a interferência do Estado, ou seja, as
classes dominantes e dirigentes começaram
a se sentir incomodados dentro do espartilho
que o Estado lhes colocava, com o poder do
sindicato de reivindicar etc.”
A primeira coisa que Reagan e Thatcher
fizeram, o pontapé inicial para a retomada
do liberalismo, foi derrotar os sindicatos.
“Esse foi o fator fundamental e aí começaram
as liberações, começaram a flexibilizar o
mercado de trabalho, fizeram a liberação
financeira etc.”
Pior que 1929
A crise de 2008 repôs um problema
tratado há 70 anos: a coordenação do
sistema monetário internacional. Descortinou
um sistema onde a coordenação torna-se
impossível, na medida em que os Estados
Unidos, país gestor da moeda de reserva, não
assume responsabilidades globais e os países
que não têm moeda conversível pagam pelo
choque de qualquer mudança na política
econômica norte-americana.
“Não é possível que os Estados Unidos,
que são os gestores da moeda de reserva e,
Revista do Seminário Internacional sobre Desenvolvimento – 10 anos CDES
portanto,
têm
responsabilidades
globais,
tomem decisões em função de seus interesses
que desorganizam a economia de todo o
mundo”, diz Belluzzo. “Você não faz nada de
errado, mas você leva o choque de qualquer
mudança na política americana”.
Para o economista, a crise atual remete à
mesma discussão sobre o sistema monetário
que se repete há 70 anos, sem que nada
importante tenha efetivamente acontecido.
Como as instituições multilaterais não cumprem
o papel regulador, “cada um toma a atitude
que acha conveniente”. “Não aconteceu nada
em relação aos desequilíbrios internacionais,
nem à questão da regulamentação ou do
controle do sistema financeiro”, conclui.
A grande crise do Século XXI também traz
como desvantagem o fato de não ter produzido
nada de novo, ao contrário da crise de 1929,
que
resultou
em
reformas
importantes.
“Os governos [apenas] protegeram seus
sistemas bancários, impediram o que seria
catastrófico, uma brutal desvalorização (...),
mas não fizeram mais nada. Deixaram tudo
como está.”
Uma religião chamada economia
“A economia é uma forma de
conhecimento que, hoje em dia, se aproxima
muito da religião, porque transformou certas
coisas em dogmas”, afirma Belluzzo. E esses
dogmas dominam as cabeças da maioria dos
economistas formados nas melhores escolas
americanas e europeias. O domínio ideológico
da escola econômica neoliberal tem o poder
de impedir grandes mudanças, segundo o
professor. “Hoje se pode fazer pouca coisa para
avançar, mas não se pode vencer o que está
encastelado nas finanças e nas universidades
que servem às finanças”, diz Belluzzo.
Essa
predominância
constitui
um
verdadeiro “bloqueio ideológico” que,
somado a debilidades do Estado atual de fazer
mudanças, produzem uma grande dificuldade
de governos de fazer política.
“Você não tem mais um Estado capaz
de fazer política”, diz Belluzzo. “O Estado
americano, por exemplo, não passa de um
comitê de empresas”, afirma. A exceção fica
por conta do Estado chinês: “Ali se pode ganhar
dinheiro à vontade, só que nas políticas de longo
prazo do governo chinês ninguém mexe”.
29
Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social
O processo de desenvolvimento
do Brasil na hora da verdade
Milko Matijascic (*)
O
Seminário
Internacional
sobre
Desenvolvimento promovido pelo Conselho
de Desenvolvimento Econômico e Social
em comemoração aos seus dez anos de
funcionamento discutiu temas da maior
relevância com convidados de grande
qualidade analítica. O evento foi pautado
pela preocupação com o processo de
desenvolvimento e as apresentações refletiram
inequivocamente o impacto das manifestações
ocorridas desde junho de 2013 por todo o
Brasil. A dicotomia entre a formulação de
estratégias de longo prazo e reivindicações
populares reflete a atmosfera das discussões e
marca os dilemas que pautam a formulação de
políticas públicas hoje.
A dicotomia entre a conjuntura e o longo
prazo permearam o seminário e o esforço
que se faz necessário visa compreender essas
interações sem gerar dualidades que pouco
ajudam a lidar com os fatos. Em diversas
falas ficou claro que as opções adotadas
pelo Brasil, ou seja, elevar o valor do salário
mínimo e distribuir renda para as famílias
mais carentes, além de ter apresentado um
importante resultado social, com a redução
da pobreza e reforço do mercado consumidor,
coroado pela redução da informalidade e pelos
baixos patamares de desemprego, também
foi decisiva para enfrentar com sucesso a crise
desencadeada em 2008. Ao recusar os ditames
da austeridade como um fim em si e estimular a
renda familiar, foi possível incentivar a demanda
efetiva e reforçar a influência econômica do
Brasil.
Decorre daí que o Brasil, ao contrário
da Europa e da América do Norte, não
apresentou recessão, elevação do desemprego
e precarização do mercado de trabalho.
A rota foi oposta. Apesar de serem duramente
criticadas, as medidas para reduzir a incidência
de tributos e o estímulo ao crédito evitaram
que o “tsunami financeiro” deteriorasse a
economia brasileira. Assim, se é possível falar
em estratégias de desenvolvimento e, mais
importante, na busca de bem-estar social em
condições sustentáveis para o meio ambiente,
que são os seus predicados indissociáveis,
isso se deve ao papel que o social exerceu
para não destruir o arcabouço econômico.
Romper com a dualidade entre econômico e
social e compreender o seu caráter simbiótico
foi a contribuição brasileira mais importante da
contemporaneidade e largamente reconhecida
por parceiros internacionais e pela esfera
multilateral.
Entretanto, o sucesso gerou problemas,
como é bem sabido. Uma economia dotada
de um nível de atividade tão elevado e que
teve pouco investimento em bens e serviços
destinados às populações com menor renda
até a virada do milênio criou gargalos sérios
(*) Doutor e Mestre em Economia pela Unicamp, onde atuou como pesquisador (1995–2003). Foi chefe da Assessoria
da Presidência do IPEA (20082011) e assessor especial do ministro da Previdência (2004 – 2005). Atua como diretor
de Pesquisa sobre a política social nos BRICS para a AISS, onde integra o Comitê Editorial da Revista Internacional de
Seguridade Social desde 2008 (conceito A2 no Qualis CAPES).
30
Revista do Seminário Internacional sobre Desenvolvimento – 10 anos CDES
e por isso mesmo, insatisfação popular. Daí o
foco apresentado pelos ministros da Saúde,
Alexandre Padilha, e da Educação, Aloizio
Mercadante para propor medidas concretas e
reverter as dificuldades atuais.
A precariedade no atendimento à saúde
e o sofrível desempenho da educação, tão
questionados pelas manifestações populares,
ensejaram o foco em medidas de curto prazo
para contratar e aperfeiçoar a formação dos
médicos e a destinar recursos do pré-sal para
melhorar a educação no Brasil. Os ditames de
curto prazo também não foram negligenciados
pela presidenta Dilma Rousseff ao colocar entre
os cinco pactos nacionais, as áreas de saúde,
mobilidade urbana, educação, responsabilidade
fiscal e controle da inflação que representam
também, é bom dizer, desafios para o
desenvolvimento brasileiro.
Obviamente, ao mesclar ações imediatas
e de prazo maior é dado o reconhecimento
que não é possível atingir metas de longo
prazo sem que existam controle e condições
de governança no curto prazo. Esse é o falso
tipo de dualismo que os meios de comunicação
reproduzem à exaustão, cujo mote é afetar o
estado de confiança de quem pretende investir.
Apesar disso, o sucesso das políticas de
reforço à renda tem limites. A preferência
pela transferência de renda não garante o
atendimento das necessidades familiares dos
trabalhadores. É preciso haver recursos para
investir e prover serviços, pois as carências de
infraestrutura econômica e social são gritantes.
Transferir renda para que o indivíduo possa
adquirir os bens e serviços, é incompatível
com o nível de renda per capita e sua evolução
projetada para médio e longo prazo. Imaginar
que a iniciativa privada, com uma estrutura de
preços e as margens de lucro como praticadas
no Brasil, associada ao perfil de distribuição de
renda vigente possa atender a todos é uma
utopia nada realista. Pior, ela pode gerar novas
formas de exclusão e colocar em risco uma
democracia baseada no atendimento universal
e na igualdade de oportunidades.
A iniciativa privada não consegue atender
as populações mais humildes para adquiri planos
de saúde ou vagas em escolas particulares, por
exemplo. Essa situação afeta mais de dois terços
da população brasileira e não será revertida tão
cedo, mesmo considerando uma aceleração
da velocidade de crescimento econômico
com rápida melhoria na distribuição de renda.
Ou seja, o Estado precisa garantir a provisão
de bens e serviços num contexto pautado pela
solidariedade e pela universalidade, conforme
prevê a Constituição Federal. Além disso, essa
necessidade é especialmente premente, porque
se os serviços públicos estão sob severa crítica,
os serviços da iniciativa privada também não
atingem os níveis de excelência necessários, e,
para melhorar, precisam se tornar ainda mais
caros.
Esse tipo de preocupação permeou as
apresentações de Alicia Bárcena, secretária-executiva da CEPAL e, com um foco mais
financeiro e menos estrutural, de Rogério
Studart - diretor executivo do Banco Mundial
para Brasil. Embora os autores sejam favoráveis
31
Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social
à evolução da economia brasileira, não
esconderam que as carências de infraestrutura
representam um entrave para elevar níveis de
produtividade e assegurar a competitividade
que, em última instancia, são essenciais para
gerar bem-estar. A melhoria da situação
social ainda não se traduziu numa inserção
internacional de maior qualidade e coloca em
risco a viabilidade de um desenvolvimento
sustentável, sustentado e equânime.
Para complicar a situação, isso se coloca
num momento em que o cenário internacional
está se modificando, porque os termos de
troca do Brasil já não atingem uma situação tão
favorável quanto a de anos atrás e os potenciais
frutos do pré-sal e dos demais investimentos na
economia ainda não começaram a apresentar
os seus efeitos positivos. Além disso, conforme
apontou
embaixador
Roberto
Azevêdo,
diretor geral eleito da Organização Mundial
do Comércio, o Brasil não é mais considerado
um país em desenvolvimento e sim um país
emergente. Isso modifica o seu grau de
responsabilidade na cena internacional, mas,
por outro lado, ainda não incorporou o País
nos espaços de decisão e liderança como o
Conselho de Segurança das Nações Unidas ou
o G-8, que congrega as economias que mais
influenciam a governança internacional.
32
Para poder gerar um processo de
desenvolvimento efetivo será preciso enfrentar
entraves estruturais que, em última instância,
requerem o rompimento das estruturas arcaicas
engendradas pela modernização conservadora
desde os anos 1960. Será necessário redistribuir
renda com uma tributação progressiva, que
desestimule a especulação e valorize a produção
e, ao mesmo tempo, privilegie o gasto público
destinando-o de forma prioritária a programas
universais de qualidade. Somente com esse círculo
virtuoso será possível elevar a competitividade e
gerar condições de bem-estar e romper o círculo
vicioso da modernização conservadora que
reforça a heterogeneidade estrutural.
A persistência do ideário da modernização
conservadora reforça as desigualdades e
inviabiliza uma maior harmonia entre famílias,
mercado e Estado que, segundo o historiador
Fernand Braudel, foi o que possibilitou o
progresso da civilização. Se o Brasil puder
romper com essas dificuldades, o que exige
maturidade e disposição para enfrentar os
beneficiários da velha ordem patrimonialista,
será possível consolidar a democracia e atuar
de forma mais efetiva e desenvolta na cena
internacional para apoiar e estimular os
parceiros em sua própria luta para construir
o desenvolvimento segundo a sua própria
dinâmica histórica.
Revista do Seminário Internacional sobre Desenvolvimento – 10 anos CDES
Dez anos de CDES: a busca de
uma nova governança
Ladislau Dowbor (*)
O
Conselho
de
Desenvolvimento
Econômico e Social (CDES), faz todo sentido
em termos institucionais. Por mais que
tenhamos diversos segmentos representados
no Congresso, nada substitui o contato
direto
entre
sindicalistas,
empresários,
administradores públicos, movimentos sociais
– na construção de pactos, na elaboração
de propostas. De certa forma, trata-se de
desintermediar o Estado, permitindo que os
atores interessados se escutem e se acertem
sem os profissionais da intermediação. E uma
vez que se chega a um acordo, as propostas
podem seguir para o Congresso, cujo papel
é justamente legislar, com a diferença que as
leis assim enraizadas no consenso entre quem
as vai aplicar, “pegam”, no melhor sentido.
Hoje já temos numerosos CDES em estados
e municípios, construindo gradualmente uma
governança mais participativa.
Comemorar 10 anos do primeiro
Conselho, fazer um balanço dos avanços e
das dificuldades nesta ampla reunião dos
conselheiros, e com presença da Presidenta,
do vice-presidente e de numerosos ministros,
é no mínimo estimulante. Trocar experiências
com outros conselhos semelhantes que já se
constituíram em numerosos países da América
Latina também ajuda. Mas mais interessante
ainda é constatar, nas diversas intervenções,
inclusive
a da presidenta Dilma, em que ponto
1
estamos todos enfrentando a necessidade de
repensar a política.
De forma mais ou menos explícita,
sentimos todos que o “esquemão” herdado,
com Estados fragilizados em termos poder e
atrasados em termos de gestão; um mundo
corporativo transnacional, em particular na
área financeira, que adquiriu dentes políticos
poderosos e se movimenta praticamente sem
controles, pois não há governo mundial; um
sistema multilateral ultrapassado, que leva
inclusive a reuniões de precária formalidade
dos sete, dos oito ou dos 20; e de movimentos
sociais que buscam tapar os buracos mais
trágicos nas áreas sociais – este esquemão
simplesmente não atende aos desafios. O
desafio não está na falta de recursos, e sim no
próprio processo decisório sobre o seu uso.
A questão da governança está colocada
por toda parte. Na União Europeia que penaliza
as populações para premiar especuladores
financeiros. Nos Estados Unidos onde desde
2010 é legal as corporações comprarem os
políticos – temos o melhor Congresso que
o dinheiro pode comprar, resume Hazel
Henderson, e onde a espionagem das
populações é generalizada ainda que ilegal.
E o que falar das economias mais frágeis onde
fazer a política corresponder ao que são as
necessidades das populações está cada vez
mais difícil? Por toda parte está se discutindo
como financiar as campanhas eleitorais, como
regular o mundo financeiro, como controlar os
paraísos fiscais, como democratizar a mídia,
como repensar o papel das mídias sociais e da
(*)1Professor titular no Departamento de Pós-Graduação da PUC/SP nas áreas de economia e de administração, e da
Universidade Metodista de São Paulo, e consultor para agências das Nações Unidas, governos e municípios.
33
Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social
conectividade. Claramente, quando se fala em
reforma política, já não falamos em muletas,
e sim numa visão sistemicamente diferente.
Democracia de verdade, transparência,
prestação de contas dos grupos corporativos,
informação livre e plural e assim por diante.
Herdamos no Brasil, como em outros
países, máquinas públicas estruturadas para
administrar privilégios, mais do que para prestar
serviços e assegurar os equilíbrios políticos,
sociais e econômicos indispensáveis para uma
vida civilizada. Nesse processo, estão ausentes
os pobres, que representam a ampla maioria.
Estão ausentes as futuras gerações, que
herdarão os nossos desmandos, em particular
com a mudança climática, contaminação e
outros dramas. E está ausente a natureza,
espoliada e silenciosa.
No confronto entre a política formal e a
voz das ruas, desenha-se o hiato crescente.
De certa forma, o conjunto de grandes avanços
que se constatou em uma década, com
redução da pobreza, quase pleno emprego,
apoio ao pequeno e médio produtor e assim
por diante, gera pelo seu próprio sucesso a
necessidade de enfrentamentos estruturais:
sistema tributário regressivo, processo eleitoral
deformado, judiciário opaco e travado,
sistemas de gestão ultrapassados, relações
público-privadas que deformam o processo,
as organizações da sociedade civil que ainda
esperam o seu marco regulatório. As reformas
eternamente adiadas estão chegando à
maturidade. Os movimentos sociais poderão,
eventualmente, ajudar no parto.
34
As diversas intervenções nesta reunião do
CDES refletem a meu ver este pano de fundo.
O embaixador Eduardo dos Santos (ministro em
exercício das Relações Exteriores) constata que
geramos uma globalização econômica mas não
geramos a governança global correspondente.
Marcelo Neri (ministro interino da Secretaria
de Assuntos Estratégicos e secretário executivo
do CDES) se refere à necessária combinação
do crescimento econômico e da redução das
desigualdades. Roberto Azevêdo (diretor geral
da OMC) se refere à crise mundial que continua
a ser a referência central, e ao fato que o
sistema que a gerou continua tão desregulado
como antes. Aloizio Mercadante (ministro da
Educação), com base na questão de formação
de médicos, mostra em números a necessidade
de tomar agora medidas com visão no longo
prazo, e por tanto de resgatar o papel do
planejamento. Alexandre Padilha (ministro
da Saúde) aponta a importância crescente
da saúde, e a necessidade de ultrapassar os
interesses corporativos frente às necessidades
do país. Sérgio Haddad, conselheiro do CDES,
explicita os desafios da educação, que não
podem constituir um fator de reprodução das
desigualdades, e apresenta como desafio a
articulação entre os sistemas federal, estadual
e municipal. Nair Goulart, conselheira do
CDES, apresenta a necessidade de se investir
no planejamento urbano e o papel particular
das cidades médias onde a lição dos impasses
gerados nas metrópoles pode gerar uma
outra política. Jackson Schneider, conselheiro
do CDES, falando sobre o crescimento pelo
investimento, apresenta as necessidades de
Revista do Seminário Internacional sobre Desenvolvimento – 10 anos CDES
outra governança nas relações com o mundo
interesses encastelados. Quanto à desigualdade,
empresarial.
é caracterizada como “impeditivo estrutural do
eixos
desenvolvimento”. Figurou em praticamente
permearam todas as discussões: a governança,
todas as intervenções, como eixo básico de
e a igualdade. O Conselheiro Clemente Ganz
orientação das políticas, e em particular na fala
Lúcio aponta claramente a reforma política
de Alícia Bárcena, da CEPAL, que explicitou
como “a mãe de todas as reformas”, pois é
o conceito de uma “mudança estrutural pela
a que permite que se resgate a orientação
igualdade”. Governança mais democrática,
geral na mudança do processo decisório, no
transparente e participativa, buscando a
uso mais racional dos recursos, na articulação
construção de um país menos desigual. Para
mais equilibrada dos agentes sociais. É ela
este que foi um seminário internacional sobre
que permitirá as outras reformas, travadas por
o desenvolvimento, trata-se de uma boa visão.
Denominador
comum?
Dois
35
Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social
Comunicação discreta
Laurindo Leal Filho (*)
A presidenta Dilma Roussef falou durante
uma hora, no dia 17 de julho, para um auditório
repleto no Itamaraty, formado por integrantes
do Conselho de Desenvolvimento Econômico
e Social (CDES) da Presidência da República, o
“Conselhão”, criado pelo ex-presidente Lula,
que comemorava dez anos de existência.
Defendeu com bons argumentos os cinco
pontos apresentados por ela como resposta
às manifestações de junho, ocupando com
isso a maior parte do seu pronunciamento.
Quase “en passant” tocou numa das questões
mais delicadas do seu governo e pouco
comentadas, tanto por ela como pelo próprio
Conselho: a comunicação.
Disse a presidenta: “a informação parcial,
da forma como é explorada, confunde a
opinião” e, em seguida “a informação parcial
visa criar um ambiente de pessimismo” (por
coincidência na noite anterior um gráfico
enorme exibindo a palavra “pessimismo”
ilustrava mais uma análise pessimista de um
comentarista da GloboNews).
Na oportunidade, comentei o fato para a
TV Carta Maior. Lembrei que ao Conselhão,
nesses dez anos, pouco temas escaparam
ao debate. Assuntos importantes, sensíveis
à vida do País, estiveram sempre nas pautas
de discussão, sendo a comunicação uma
exceção significativa. Ressaltei que de pouco
adiantavam as análises, as sugestões e mesmo
as propostas feitas pelos conselheiros se, para
chegarem à sociedade, são obrigadas a passar
pelo filtro da mídia conservadora, avessa às
políticas econômicas e sociais implantadas nas
gestões Lula-Dilma.
As frases da presidenta, antes mencionadas,
deveriam servir de alerta, não só aos integrantes
do Conselhão, mas principalmente a alguns
membros do próprio governo. Quando ela fala
em “informação parcial” que “confunde a
opinião” torna-se necessário revelar os sujeitos
dessas ações, o que – convenhamos – não é
tarefa difícil. Basta abrir os jornalões, ouvir
alguns comentaristas de rádio ou assistir a um
noticiário de TV para encontrá-los.
O alerta da presidenta não pode cair no
vazio. A começar do CDES que pelo pouco que
vi precisa receber dois empurrões para entrar
nesse debate: o primeiro de esclarecimento
sobre o papel da mídia. Ao que tudo indica
o órgão reproduz a vaga ideologia liberal do
século 19, entendendo que a mídia paira sobre
os conflitos sociais e de classe, daí ser chamada
equivocadamente de quarto poder, quando
na verdade é um poder tão ou mais poderoso
que os poderes da República. E depois dos
esclarecimentos, o empurrão político capaz
de tirar da frente os temores de enfrentar
o baronato midiático. Não tenho ilusões de
que esse segundo empurrão terá de ser dado
forçosamente pelos sindicalistas e integrantes
de movimentos sociais com assento no
Conselho. Essa convicção se consolidou quando
vi que, ao final do primeiro dia de reuniões,
(*) Sociólogo e jornalista, é professor de Jornalismo da ECA-USP. É autor, entre outros, de “A TV sob controle –
A resposta da sociedade ao poder da televisão” (Summus Editorial).
36
Revista do Seminário Internacional sobre Desenvolvimento – 10 anos CDES
quando a palavra foi aberta aos conselheiros,
só três se inscreveram, não por coincidência os
três representando os setores mencionados.
Estava presente à reunião um número
significativo de ministros das mais importantes
pastas. Dois deles, Mercadante, da Educação
e Padilha, da Saúde, apresentaram dados
importantes em defesa dos projetos para o ensino
e a prática da medicina lançados pelo governo.
Dados que são mostrados de maneira “parcial”
ou visivelmente manipulados pela mídia.
Será que o alerta da presidenta não motivará todos
os ministros a se preocuparem com a distorção ou
a invisibilidade de que são vítimas seus projetos e
ações? E a articular com os responsáveis diretos
pela comunicação do governo a revisão de tudo
o que tem sido feito até aqui nessa área?
Voltando
ao
Conselhão,
o
melhor
presente que ele poderia dar à sociedade
na comemoração dos seus dez anos de
existência seria a formulação da proposta
de uma política nacional de comunicação,
envolvendo
amplos
setores
do
governo,
capaz de aproximar o governo da sociedade,
dispensando intermediários que tornam as
informações parciais, criando um “ambiente
de pessimismo” no País.
37
Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social
As contribuições do CDES para o
debate da Reforma Política
Marco Aurélio Weissheimer (*)
Os recentes protestos e manifestações
que levaram milhares de pessoas – em sua
maioria, jovens – às ruas do Brasil no mês
de junho evidenciaram, entre outras coisas,
a necessidade de uma Reforma Política
abrangente e profunda no Brasil. As críticas ao
atual modelo de representação política no País
apontaram para um conjunto de problemas
históricos ainda não resolvidos. Amplamente
discutido no Conselho de Desenvolvimento
Econômico e Social (CDES), o tema Reforma
Política mereceu especial destaque entre 2006
e 2007, com a realização de diversas reuniões
do grupo de trabalho criado para aprofundar
o tema e um grande seminário que reuniu
lideranças do Congresso Nacional, intelectuais
e representantes de diferentes setores da
sociedade.
Esse encontro resultou em um parecer
do CDES sobre a reforma política que foi
encaminhado ao presidente da República
em julho de 2007. No documento, os
conselheiros reconheceram que as decisões
centrais envolvendo a reforma política são uma
atribuição do Congresso, mas defenderam a
participação do conjunto da sociedade neste
processo. Também se manifestaram pela
urgência e prioridade de aprovar mudanças
que fortalecessem os partidos políticos,
aumentassem o grau de representatividade
dos mandatos e assegurasse a soberania dos
cidadãos e cidadãs no sistema democrático
brasileiro.
A contribuição do CDES para o debate
sobre a Reforma Política se organizou em torno
de três eixos: o aperfeiçoamento da democracia
representativa, o fortalecimento da democracia
direta e da democracia participativa e a reforma
do processo orçamentário. Alguns consensos
foram obtidos: normas para coibir as trocas
de partido no Parlamento e incentivos para a
disciplina e a fidelidade partidária; regras para
o uso da imunidade e do foro privilegiado dos
parlamentares; regulamentar os princípios
constitucionais que preveem a realização de
plebiscitos, referendos e iniciativas populares;
possibilidade de revogação de mandato
mediante consulta popular (o chamado
“recall”) e definição de novas regras para a
escolha dos suplentes de senadores.
Além destes, outros dois pontos foram
objeto de uma forte convergência entre os
conselheiros: a defesa do financiamento público
das campanhas e da adoção do voto em lista
fechada ou em lista flexível, na qual o eleitor
pode alterar a ordem proposta pelo partido.
Apontado como essencial para combater o
personalismo e para fortalecer os partidos,
o voto em lista recebeu uma qualificação
para evitar distorções, a saber, a adoção
de processos internos mais democráticos
nos partidos e redução da interferência das
estruturas hierárquicas superiores na formação
das listas. No parecer entregue à Presidência da
República, o CDES defende que “um processo
de reforma política contribui estruturalmente
(*) Jornalista, bacharel e mestre em Filosofia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
38
Revista do Seminário Internacional sobre Desenvolvimento – 10 anos CDES
para o desenvolvimento do País e para o
aperfeiçoamento de nossa democracia”.
O tema da Reforma Política, destaca ainda
o parecer, é um caminho para aperfeiçoar as
relações entre Estado e Sociedade e solucionar
os problemas enfrentados pelos poderes
constituídos. Esse tema, acrescenta o documento,
diz respeito ao conjunto da sociedade e aos
poderes constituídos, cabendo, portanto,
também ao governo e ao presidente da República
em particular, a iniciativa em relação a ele. Entre os
problemas a serem enfrentados por uma reforma
desta natureza, o CDES destacou a corrupção
política e a desigualdade de oportunidades entre
partidos e candidatos, em função das diferenças
de poder econômico, de gênero e etnia.
O parecer aponta também a necessidade de
regulamentar mecanismos inscritos do artigo
14º da Constituição Federal, como plebiscito,
referendo, iniciativa popular e consulta popular
para revogação de mandato.
“Quem tem o poder de exercer o poder?”
O debate no Seminário Internacional sobre
Desenvolvimento deixou claro que a agenda
da reforma política não se resume à esfera
eleitoral. José Antonio Moroni, membro do
colegiado de gestão do Instituto de Estudos
Socioeconômicos (INESC) e conselheiro do
CDES, defendeu que a sociedade precisa
avançar na concepção do que seja a reforma
política. É importante pensar, frisou, no
fortalecimento dos processos democráticos,
onde a democracia direta e a democracia
participativa têm papeis fundamentais.
Moroni elencou um conjunto de questões que
apontam para essa direção: “na verdade, quando
estamos abordando a reforma política estamos
discutindo o poder. Quem exerce o poder?
Em nome de quem se exerce o poder? Quais
são os mecanismos que se tem do controle do
poder? Quem tem o poder de exercer o poder”.
Na mesma direção, o conselheiro Artur
Henrique da Silva Santos, da Central Única
dos Trabalhadores (CUT), defendeu que o
movimento sindical e os movimentos sociais
não podem abordar a reforma política
apenas sob a ótica da política eleitoral, sendo
necessário também incorporar o debate sobre
a introdução de mecanismos de participação
popular e de democracia direta. O sindicalista
também apontou a definição dos orçamentos
públicos como elemento estratégico na agenda
da Reforma Política: “Não basta fazermos um
amplo debate sobre a questão da participação
popular se nós não tivermos mecanismos e
instrumentos de controle social eficazes para
que as decisões a respeito dos principais
investimentos no orçamento público passem
por uma deliberação por parte da população.
O orçamento não deve ser visto apenas como
uma peça que visa à definição dos gastos,
mas como uma instância de definição das
prioridades de gastos no orçamento federal,
estaduais e municipais. Isso, sim, é democratizar
o poder”.
Resumo das propostas do CDES
As contribuições desse conjunto de
debates promovidos pelo CDES em torno do
39
Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social
tema da Reforma Política podem, assim, ser
divididas em três grandes blocos:
1. Aperfeiçoar o sistema partidário e os
processos eleitorais, combatendo a
desigualdade de oportunidades entre
partidos e candidatos, em função
das diferenças de poder econômico,
de gênero e etnia; contemplando a
democratização dos processos internos
aos partidos para seleção de lideranças
e candidatos; as regras sobre formação
de coligações, migração partidária,
eleição de suplência, imunidades e
foro privilegiado; cláusula de barreira,
e financiamento de campanha.
Existe convergência no CDES sobre a
necessidade do financiamento público
das campanhas.
2. Envolver a regulamentação dos
mecanismos inscritos no artigo
14º da Constituição Federal, como
plebiscito, referendo, iniciativa popular
e consulta popular para revogação de
mandatos. De acordo com os debates
realizados pelo CDES e as informações
40
aportadas, ainda há muito espaço para
a ampliação da participação popular
na democracia brasileira.
3. Abranger o aperfeiçoamento da relação
entre o Poder Executivo e o Poder
Legislativo no que se refere ao processo
de elaboração e execução do orçamento
para aumentar a transparência e
reduzir as vulnerabilidades que
levam a distorções na aplicação dos
recursos públicos que são, em última
instância, arrecadados da própria
sociedade. Para isso, é necessário
aperfeiçoar as regras de elaboração,
de processamento legislativo, e de
execução do Orçamento, de modo
a promover a democratização no
uso dos recursos fiscais e parafiscais; a criação de mecanismos de
participação e de controle social,
com amplo acesso às informações
em todo o ciclo orçamentário na
União, estados e municípios, e nas
regras para apresentação de emendas
parlamentares.
Revista do Seminário Internacional sobre Desenvolvimento – 10 anos CDES
Desafios para o CDES no seu 10º
aniversário
Flávio Aguiar (*)
Olhando-se a linha do tempo exposta no
site do CDES1, tem-se uma ideia da extensão
e da intensidade da pauta do Conselho.
Ao longo de sua existência o CDES abordou
uma gama impressionante de temas ligados
às conjunturas nacional e internacional.
Seus temas abrangem o mundo do trabalho,
a busca da equidade social, a educação, as
condições e busca de investimentos necessários
ao Brasil, apoio à micro e média-empresa,
aumento da representatividade do Conselho
Monetário Nacional, reforma política, reforma
tributária, bioenergia, habitação, agricultura,
aviação civil, Código Florestal. Pode-se dizer
que não houve área da vida brasileira, dentro
do contexto político, social e econômico
mundial, que ficasse fora das sucessivas pautas
do Conselho.
Pautando-se sempre pelo auxílio à
construção da governança brasileira, os debates
do conselho frequentemente implicaram a
adoção – em parte ou no todo de suas sugestões
– de políticas de Estado no nosso País.
Agora, marcando os seus dez anos de
existência, o Conselho realiza seu “Seminário
Internacional sobre Desenvolvimento – 10 anos
CDES”. Duas são as linhas mestras de sua pauta:
I.
Desafios da Governança Global:
tema dividido em três subtemas:
a) O contexto internacional que
emerge no pós-crise; b) a governança
e instituições para o desenvolvimento;
c) a exportação de tecnologias sociais
brasileiras;
II. Desenvolvimento
inclusivo
e
sustentável: desafios do modelo
brasileiro, tema subdivido em dois:
a) mudanças recentes - os avanços
sociais, os cenários econômicos e
os desafios da sustentabilidade;
b) impactos de políticas públicas inclusão, educação, trabalho.
Na primeira linha mestra, destaca-se
a questão da crise econômico-financeira
mundial. Será que já estamos vivendo uma
situação internacional “pós-crise”?
Há sérios indicadores de que não é este o
caso. Segundo indicações do World Economic
Situation and Prospects (WESP 2013), da
ONU, o fim da crise não está próximo.
A União Europeia continua vivendo em
situação de insolvência parcial, mas duradoura,
sem visão de luz no fim do túnel. A recessão
da maioria das economias do continente
contribui para uma instabilidade econômica
mundial, inclusive no Brasil. Os Estados Unidos
tardaram em encetar uma tímida (diante do
seu gigantismo) recuperação de empregos e
da economia. Mas seus movimentos de saída
da crise recessiva também podem contribuir
para a desestabilização econômica e do fluxo
de capitais em relação aos países emergentes.
Neste cenário, os BRICS e o Brasil (neste grupo
(*) Correspondente internacional da Carta Maior e de outras publicações em Berlim. Tradutor e escritor, é autor e
organizador de dezenas de livros. Foi professor de Literatura Brasileira na Universidade de São Paulo (USP).
1 <www.cdes.gov.br>
41
Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social
em destaque), ganham importância. Ou seja, o
cenário pós-crise ainda está sendo construído,
é um verdadeiro “work in progress”, e o
conselho terá de considerar este desafio. Isto
nos leva a um segundo item.
A situação política global exige visões
estratégicas de longo prazo em lugar de
uma governança exercida numa espécie de
estabelecimento de micro prazos destinados
a aliviar as cargas de adrenalina que as
sucessivas oscilações financeiras despejam
cotidianamente nos mercados, nos países e
nos cidadãos. O cenário político internacional é
o de aprofundamento de velhas e novas crises,
com os conflitos do Oriente Médio arriscando
uma regionalização de efeitos imponderáveis.
Em que medida poderá o CDES tornar-se um
vetor do estabelecimento de visões macroestratégicas de longo prazo para a sociedade,
o governo e o Estado brasileiro, levando em
conta a crescente visibilidade e importância do
nosso país no contexto global?
Neste contexto, o conselho deve se manter
atento ao cenário global e àquilo que possa
resultar em constrangimentos para estratégias
da economia e da política brasileiras.
Os cenários externos implicam em discussões
que busquem um novo modelo de governança
a partir das instituições criadas em Breton
Woods e para além dessas. A recente crise
reafirmou a percepção de que estas instituições
estão em xeque. Esta situação de incerteza
afeta nossas pretensões em relação a novos
espaços que o Brasil vem ocupando, e os novos
modelos que possam ser mobilizados a partir
42
de instituições como BRICS, OMC, FAO, BID,
BIRD, FMI, OEA, e/ou outras que compõem o
arcabouço da geopolítica internacional.
O Brasil é reconhecido por diferentes
organismos internacionais como produtor e
praticante de tecnologias sociais de ponta, com
seus programas de redução da pobreza e da
miséria, por exemplo. Poderá tal capacitação
tornar-se o vetor de um fluxo internacional
que ajude a formular políticas globais que vão
da produção de alimentos à inclusão digital?
Com que redes poderá o Brasil contar, ou
quais construir, para ultimar tais objetivos e
aperfeiçoar a presença proativa do nosso país
no cenário internacional?
O Brasil tem feito pressões no sentido
de amparar um novo modelo de governança
global, mudando regras existentes, prioridades
de funcionamento, ou cotas de poder de
voto, como no caso do FMI, criando novos
padrões de conduta na política internacional
e aprofundando vetores de articulação,
como no caso das negociações multilaterais
e bilaterais. Estes são sem dúvida eixos de
fortalecimento de nossa presença externa
e que paralelamente representam espaços
para a replicação de experiências nacionais
exitosas. Essas mudanças são acompanhadas
de novos desafios internos como, por exemplo,
os desafios postos à Agência Brasileira de
Cooperação (ABC) - que ao longo dos últimos
dez anos vem trabalhando em consonância
com ministérios, empresas e fundações
públicas brasileiras, como o MDS, a FIOCRUZ, a
EMBRAPA, o INPE etc. Não há dúvida que ainda
Revista do Seminário Internacional sobre Desenvolvimento – 10 anos CDES
estejamos no início de uma nova fase para as
relações internacionais brasileiras, mas este
caminho vem ganhando fôlego, e o conselho
deverá estar atento a esta nova configuração.
Estes itens ajudam a informar sobre o debate
do segundo tema-chave e de seus subtemas.
Ao considerarmos a presente situação brasileira,
nos deparamos com duas ilusões dilemáticas.
A primeira diz que “nada mudou” no nosso
País. A segunda, que “tudo mudou” completa
e radicalmente. A primeira leva ao desânimo ou
à contestação linear de “tudo o que aí está”:
política, políticos, partidos, instituições de
governos e de Estado, etc. E pode até servir de
caldo de cultura que justifique uma negação
da instabilidade institucional necessária ao
desenvolvimento social, econômico, político,
cultural e democrático do País, justificando
desde a descrença niilista até o vandalismo nas
ruas. A segunda (o “tudo mudou”) torna-se a (in)
formadora de uma cegueira para a permanência
de problemas, mazelas, insuficiências que
atravancam o desenvolvimento da cultura
cidadã
igualmente
necessária
àqueles
objetivos de desenvolvimento nas cinco frentes
anteriormente citadas. Há muito o que fazer
no País, há muito o que melhorar em todas as
frentes da vida brasileira, inclusive, é claro, nos
três quesitos destacados pela pauta: inclusão,
educação, trabalho.
Nos seus dez anos de existência, o CDES
entendeu que não se pode tratar a situação
brasileira com maniqueísmos. Há um processo
de mudança em curso – com algumas
conquistas realizadas e outras tantas ainda
por realizar. Contudo, algumas conquistas são
emblemáticas – como a eliminação da pobreza
extrema, a diminuição das desigualdades,
e outras tantas análises que possamos vir a
fazer e que espelham um amadurecimento
da sociedade brasileira. Nesta leitura, destacar
alguns dados é importante:
•
o indicador de pobreza multidimensional
que mede a situação do Brasil caiu para
2.7% (ONU – RDH 2013).
•
a pobreza caiu 57%, entre 2003
-2011, considerando como referência
US$ 2 por pessoa/dia ajustado pela
paridade poder de compra PPP2.
As conquistas recentes de combate
à pobreza nos últimos 10 anos
espelham o crescimento da renda de
48% da população mais pobre e uma
consequente queda na desigualdade
da ordem de 52%. A redução da
pobreza pode ser explicada pela
combinação do crescimento da renda
e queda da desigualdade.
•
a redução das desigualdades medida
pelo GINI de renda (Y) no Brasil (0,594
em 2001 e 0,527 em 2011), na década
passada, pode ser decomposta, pela
PNAD, da seguinte forma: trabalho,
58%; previdência, 19%; Bolsa Família,
13%; BPC (Benefício de Prestação
Continuada) 4%; outras ,6%.
2 <http://www.cps.fgv.br/ibrecps/queda_da_miseria/Apendice_fim.pdf>
43
Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social
•
a renda média do trabalho cresceu
5,1%, em 2012.
Apesar da trajetória positiva dos últimos
10 anos, persistem grandes desafios coletivos
em nosso País, cujo atendimento exige uma
combinação de ações imediatas com visões de
longo prazo e sustentabilidade atentas para:
as desigualdades territoriais, as sociais, entre
outras; a criminalidade; a melhoria no acesso
aos bens e aos serviços públicos – com especial
atenção à educação, ao sistema público
unificado de saúde e à mobilidade urbana.
Na frente externa, o Brasil não pode se descuidar
em relação a seu papel e responsabilidade de proa
em relação a seus vizinhos: é do nosso interesse
desenvolver o nosso país de forma compartilhada
com o espaço geopolítico próximo.
Na equação do desenvolvimento os
diversos setores da economia devem ser
vistos como fortes aliados. No presente,
a preocupação com o papel da indústria
44
nacional e a competitividade ganha força, e
tem encontrado espaço de forma permanente
nas reuniões do CDES. Merece atenção
especial por ser alvo de uma preocupação
transversal – sendo estratégico tanto ao
modelo de desenvolvimento interno, como na
busca do fortalecimento da economia nacional
através da conquista de novos mercados.
O conselho vem debatendo e vai continuar
a debater o nível e a direção dos investimentos
e os resultados do crescimento da economia,
que resultem em aumento de produtividade
e na restruturação de cadeias produtivas que
possam gerar bens de maior valor agregado.
Na opinião do conselho, o debate do modelo
de desenvolvimento, os novos impulsos aos
investimentos e os resultados da economia
devem sustentar e fortalecer as conquistas
sociais dos últimos anos.
Caberá, portanto ao conselho avaliar-se
como vetor proativo de tais desafios. A ele,
portanto, a palavra.
Revista do Seminário Internacional sobre Desenvolvimento – 10 anos CDES
Promoção, Organização e Realização
Secretaria do Conselho de Desenvolvimento
Econômico e Social (SEDES)
EXPEDIENTE
Publicação de responsabilidade da Secretaria do
Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social
(SEDES) da Secretaria de Assuntos Estratégicos
(SAE) da Presidência da República.
Novembro de 2013
Presidenta da República
Dilma Rousseff
Ministro da Secretaria de Assuntos
Estratégicos
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Secretário da SEDES
Ronaldo Küfner
Secretária Adjunta da SEDES
Maria Luiza Falcão
Diretores
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José Aparecido Ribeiro
Gerentes e Assessores
Alexandre Dantas e Sousa
Cristina Ribeiro Fernandes Quadra Rocha
Eduardo de Almeida
Gabriela Guedes Ferreira Prates
Gustavo Henrique Concentino Ramos
Hilta Figueiredo de Moraes
Maria França e Leite Velloso
Raquel de Albuquerque Ramos
Endereço para correspondência
Anexo I – Ala “B”, sala: 202 – (61) 3411.2199 /
3393
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Agradecimento a todos os parceiros e
colaboradores na realização das atividades.
Conselho de Desenvolvimento
econômico e social
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Assuntos Estratégicos