1 Capítulo 16 Há uma concordância geral de que o capítulo 16

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1 Capítulo 16 Há uma concordância geral de que o capítulo 16
1 Samuel – 16
Capítulo 16
Há uma concordância geral de que o capítulo 16 inicia uma nova peça de
literatura sobre o surgimento de David e a sua caminhada até ser rei. A narrativa começa
com a história da unção de David, o qual é um desconhecido e insignificante pastor de
ovelhas que vai adquirindo cada vez mais preeminência até se tornar o “pastor de Israel”
(2 Sam. 5:2). E este conjunto de narrativas, que vai até 2 Samuel 5:10, é
harmoniosamente ligado pelo historiador deuteronomista para formar uma unidade
teológica fundamental para os leitores modernos, mas principalmente para o povo de
Israel. A história humana da caminhada de David até ao trono está cheia de tácticas,
intrigas e poder. No entanto, a forma como o historiador deuteronomista junta as
diversas e até diferentes narrativas tem como objectivo dizer que “o caminho está
autorizado pela vontade de Iavé de que David seja rei… A questão interpretativa mais
interessante é a maneira em que o propósito oculto de Iavé é trabalhado através de
eventos incómodos e rudes da interacção histórica”1. Principalmente o início da
narrativa, a perícope de 16:1-13, demonstra logo à partida que David se tornou rei
porque Deus assim decidiu e o escolheu. A chegada de David ao trono não se prende
apenas com factos históricos e humanos (2 Samuel 2:4; 5:3), mas com o plano de Deus,
uma vez que Saul foi rejeitado devido à sua desobediência a Deus.
Versículo 1
Este versículo faz a ligação com a narrativa do capítulo anterior, onde se
menciona que Samuel teve dó de Saul e que o Senhor se arrependeu de ter colocado
Saul como rei de Israel. Agora, porém, o escritor mostra que Deus não gosta da atitude
de Samuel e confronta-o em relação ao seu desânimo por Saul.
Embora no texto português não apareça o pronome pessoal “tu” (hT;a)" , no texto
hebraico ele aparece porque o objectivo do autor é dar ênfase à pessoa de Samuel – “até
quando tu terás dó…”. A palavra para “dó” em hebraico (lb"a); significa “lamentar”.
Normalmente é usada para o lamento em caso de morte de um ente querido. O lamento
bíblico envolve a emoção e normalmente expressava-se de forma audível e visível.
Provavelmente Samuel gemia e inclinava a sua cabeça em desalento.
Deus reprova esta atitude, a qual é inapropriada porque Iavé já o havia rejeitado.
Note-se também a presença do pronome enfático “eu” (ynia)} concernente a Iavé. O
tempo de lamento passou, e agora era altura de passar à acção. Os dois pronomes fazem
um contraste: “tu e eu”. “Tu continuas abatido e deprimido, enquanto eu tenho um
objectivo para o futuro.” Quando alguém não faz a vontade de Deus e não deseja voltar
atrás, então Deus já preparou alguém que vai fazer esse trabalho. Portanto, só perde
quem não quer fazer a vontade de Deus para a sua vida.
A primeira acção ordenada por Deus para Samuel é que encha o seu vaso.
Literalmente a palavra “vaso” significa “chifre” (ˆr,q), . Apesar de ser um utensílio para
transportar qualquer líquido, ele “denota força, orgulho e élan vitale. L. Schmidt
afirmou correctamente: ‘No antigo Testamento, o chifre não é apenas uma expressão de
poder físico numa acção profética simbólica (2 Rs 22:11) ou numa descrição visionária
do poderoso que espalhou Israel (Zac. 2:1-4); é um termo directo para poder’ (TWNT,
III, p. 669)”2. Aqui podemos ver o símbolo de um homem que está revestido de poder
para exercer a função que Deus lhe mandou. A própria ordem para “encher” o vaso
1
Walter Brueggemann, First and Second Samuel, John Knox Press, 1990, 119.
Leonard J. Coppes, “ˆr,q”, , Theological Wordbook of the Old Testament, vol. II, Moody Press, 1980,
816.
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Virgílio Barros
demonstra que naquele momento Samuel precisava mesmo de ser revestido. O seu vaso
precisava de estar cheio.
Com o verbo “enviar” (jl"v); temos a comissão dada por Deus ao seu servo.
Samuel não vai por sua vontade própria, mas porque Deus o envia. O seu destino era a
cidade de Belém, porque Jessé (yv"y)i , nome que deve significar “homem de Iavé”, vivia
ali e é identificado como “o belemita”. Belém pertence ao território de Judá.
A escolha de um novo rei era um acto da graça divina. Jessé era o neto de Boaz
e Rute (Rute 4:17). Esta mulher era moabita, os inimigos de Israel naquela altura (1
Sam. 14:47). Boaz, por sua vez era filho de Salmon e Raabe, a prostituta de Jericó (Mat.
1:5). Portanto, a nova dinastia incluía duas mulheres estrangeiras, uma das quais teve
um passado imoral, nos seus ancestrais. Na genealogia de David ainda podemos recuar
mais seis gerações e encontrar Perez, que era filho de Judá e Tamar (1 Crón. 2:3-12;
Rute 4:17-22). Isto só mostra que Deus na sua infinita graça e misericórdia perdoa e
reabilita.
Iavé tem provido um rei dentre os filhos de Jessé. A palavra hebraica traduzida
por “prover” é ha;r; (ra’ah) que significa “ver”. Deus na Sua omnisciência vê tudo o
que se passa e encaminha todas as coisas para si. É interessante notar o pronome “me”
que literalmente significa “para mim” (yli).
Versículo 2
A tarefa de Samuel era simples, pois só tinha de ungir um novo rei. No entanto,
a sua reacção demonstra algum receio. A tarefa comportava algum risco porque a
palavra que se usa para “matar” (gr"h); é o termo apropriado para se matar legalmente.
Embora o profeta tivesse autoridade divina, o rei tinha a vontade política e a força do
exército para agir se soubesse que Samuel estava a querer substituí-lo.
O que impressiona é que Iavé arranja uma outra tarefa para encobrir a principal
acção. Alguns intérpretes viram isto como um subterfúgio, enquanto outros parecem ver
nisto um meio de Samuel autenticar as suas intenções sacrificiais no caso de Saul notar
alguma coisa3. A realidade é que Deus antecipa as coisas mas não as pressiona, pelo
contrário, vai deixar que os acontecimentos tenham o seu curso natural. Para Ele,
porém, o verdadeiro rei de Israel é aquele que Ele já viu. O historiador ao dar o seu
cunho à narrativa procura mostrar que o papel de Samuel é religioso e não político.
Aquilo que pode parecer uma táctica estratégica de rebelião era precisamente o oposto.
Na antiguidade em Israel, o rei era o representante de Deus, pelo que a sua nomeação
era sagrada e não secular.
É importante realçar que na última frase o primeiro verbo é “sacrificar” (hb"z);
que se encontra no Infinitivo constructo, seguido da preposição “a” ou “para”. Isto é que
é importante que se diga. O acto em si implica a consagração de algo ou alguém a Deus.
Versículo 3
A palavra portuguesa “convidar” parece suave demais para o uso do verbo
hebraico que significa “chamar” ou “convocar” (ar;q); . Esta palavra muitas vezes tinha
a ideia de “proclamar” ou “ler” como se fosse um édito da parte do rei. Neste caso há
uma convocação de Deus para que Jessé venha ao sacrifício.
Temos novamente o pronome enfático “eu” para destacar quem pratica a acção,
ou melhor quem é o que causa, provoca a acção. O verbo “saber” ([d"y); encontra-se no
grau causativo (Hiphil) transmitindo a ideia de “fazer saber” ou “dar a conhecer”.
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Klein, 1 Samuel, Thomas Nelson Publisher, 1983, 160.
1 Samuel – 16
O verbo “ungir” corresponde à palavra hebraica (jv"m); de onde vem a palavra
“Messias”. Mas é importante notar que mais uma vez Deus faz com que tudo se
concentre nele. Por outras palavras, Iavé estava a dizer a Samuel: “Tu vais ungir uma
pessoa para mim (yli)”.
A expectativa mantém-se, pois Deus não menciona o nome da pessoa que vai ser
ungida. Como já podemos verificar o ponto crucial é que Deus, e o historiador assim o
narra, quer fazer incidir todas as coisas em si.
Versículo 4
A obediência de Samuel é notória, depois de ter demonstrado algum receio
inicial. Ele faz conforme a palavra de Iavé. Por conseguinte, ele vai a Belém (µj,l;
tyBe), literalmente “casa do pão”, que ficava a cerca de 16 km de Ramá e a 10 km de
Jerusalém para sudoeste.
Os anciãos da cidade vêm ter ao seu encontro a tremer. Alguns comentaristas
dizem que não se entende muito bem o que fazem os anciãos na narrativa. No entanto, é
claro o toque do deuteronomista ao colocar o verbo “tremer” (dr"j); logo no início. O
temor faz parte da reverência e do respeito perante Deus, e Samuel vinha com o símbolo
de poder (o chifre) à cidade e, ao mesmo tempo, era o profeta de Deus. Eles tinham
medo que Samuel não trouxesse boas notícias.
Outras sugestões para o medo dos anciões são: 1. Medo de que a aparição de
Samuel tivesse a ver com algum homicídio, uma vez que ele trazia uma vaca (cf. Dt
21:1-9); 2. Talvez a presença de Samuel estivesse relacionado com algum problema
político, quer ele estivesse ao lado de Saul ou na oposição4; 3. Medo de que Samuel
estivesse descontente com eles e viesse para os punir5.
A palavra “paz” (µlov); denota muito mais do que apenas a paz política. Tem a
ver com todo o relacionamento primeiramente com Deus e depois com o próximo.
Primeiro, eles estavam preocupados com algo que Samuel dissesse da parte de Deus.
Depois, talvez estivessem preocupados com as questões políticas.
Versículo 5
Samuel confirma que vem em paz (shalom). Literalmente teríamos: “Paz, para
sacrificar a Iavé eu vim”. Esta é a ordem das palavras, o que significa que mais uma vez
a atenção é posta no acto de sacrificar, mas para o Senhor.
Para que se pudesse fazer um sacrifício condigno era necessário a santificação
das pessoas. Por isso, Samuel dá uma ordem: “Santificai-vos”. O verbo “santificar”
(vd"q); encontra-se no Hiphil que, no dizer de McComiskey, “conota o acto pelo qual a
distinção é efectuada”6. Portanto, Samuel apela ao acto da santificação e não ao estado
da mesma. Isto significa que as pessoas devem submeter-se ao ritual de Deus para
serem santificados. Por outro lado, Samuel desafia os anciãos a acompanharem-no no
sacrifício.
A narrativa, porém, dá uma outra volta. Nada mais sabemos dos anciãos,
desaparecendo do horizonte sem qualquer indicação se participaram ou não no
sacrifício. Aqui não há desafio nem ordem. O relato pura e simplesmente informa que
Samuel santificou Jessé e os seus filhos e convocou-os para o sacrifício. A atitude de
convite foi feito aos anciãos, mas para Jessé e os seus filhos há logo uma acção.
4
Brueggemann, 1990, 121
J. Maucheline, 1 and 2 Samuel, New Century Bible, Londres, Oliphants, 1971.
6
T. E. McComiskey, “vdq”, Theological Wordbook of the Old Testament, vol. II, 786.
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Versículo 6
A partir daqui parece que estamos a lidar com outro excerto da narrativa. Não
vai haver qualquer menção ao sacrifício, apenas a preparação para a unção. Klein terá
certa razão ao dizer que não se compreende muito bem que relação existe entre o
sacrifício e a unção7. A sequência, porém, é muito clara. Não pode haver unção sem
sacrifício e não pode haver sacrifício sem santificação. É necessário ficar-se puro para
participar numa entrega sacrificial a Deus e depois ser escolhido por Deus para realizar
uma determinada tarefa.
Samuel não sabia a quem Deus tinha escolhido. Por isso, começou a tentar
adivinhar qual seria a pessoa. Talvez o nome do jovem tenha servido para a precipitação
de Samuel. O nome Eliabe (ba;ylia],) significará “Meu Deus é pai”. Samuel pensou que
este nome teria implicações na escolha de Deus. E pensou que ele seria o “ungido” de
Iavé. O termo “ungido” (jy"vim]) aparece 34 vezes usado para uma pessoa real, mas
aparece sempre com o nome Iavé ou um pronome possessivo referido a Deus, como é o
caso neste versículo. A pessoa é referida como ungido por virtude daquele que o ungiu,
Iavé, e não por ser ungido pelos anciãos ou pelo povo.
Versículo 7
Deus desfaz rapidamente o equívoco de Samuel. Ele não deve “olhar” (fb"n); ,
isto é, pensar ou prestar atenção à aparência (ha,r]m"), palavra que está associada ao
verbo “ver” e à visão, isto é, aquilo que os olhos podem ver, nem para a “estatura”
(hm;/q), principalmente quando ela é alta (H"boG); . Samuel fica impressionado com o que
vê na superfície e com o que é medível. Mas há coisas que não se vêem nem se podem
medir com fita métrica. Iavé que conhece o insondável pela visão humana já tinha
rejeitado Eliabe. A palavra para “rejeitar” (sa"m); aparece 73 vezes no antigo
Testamento e o seu uso revela que os homens desprezam o Senhor que está no meio
deles e por isso merecem que Deus os rejeite (Os 4:6)8. Esta palavra foi usada para
descrever a atitude do povo em rejeitar o Senhor pedindo um rei (1 Sam. 8:7; 10:19) e
por conseguinte também é usada para descrever a acção de Deus em relação a Saul.
A declaração de Deus é o ponto crucial desta passagem. Deus não vê como o
homem (µd;a); , palavra hebraica ’adam, que expressa a sua condição de “pó da terra”. O
importante não é o que o homem vê, mas o que Iavé vê.
A última frase parece-se mais como um comentário do historiador
deuteronomista explicando o contraste entre o que o homem vê e o que Deus vê.
Embora o texto hebraico não tenha a expressão “o que está…”, ela faz muito sentido
neste caso. A preposição l] está ligada ao substantivo “olhos” (µyin"[)e e pode significar
“em relação a” ou “com respeito a”. Portanto o ser humano vê o que diz respeito aos
seus olhos, aquilo que os olhos vêem. No que concerne a Deus, Ele vê o que diz
respeito ao coração. O termo hebraico (bb;l)e aponta para o interior do ser humano, para
a mente, para a vontade. Refere-se especificamente às inclinações, resoluções e
determinações da vontade. Deus é completamente diferente do ser humano (Is 55:8-9).
Os Seus pensamentos e caminhos são totalmente diferentes dos pensamentos e
caminhos do homem. Os seus métodos não podem ser compreendidos pelas mentes
mortais. As pessoas normalmente baseiam as suas decisões nas percepções visíveis,
7
8
4
Klein, 1983, 159.
Walter C. Kaiser, “sam”, TWOT, vol. I, 1980, 488.
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enquanto as acções de Deus são baseadas na informação inacessível ao ser humano.
Deus conhece e compreende a volição humana.
Versículo 8
Parece que Samuel aprendeu a lição. Desta vez não se deixou levar pelo que é
visível nem pelas suas próprias percepções. O segundo filho de Jessé poderia transmitir
também algo nobre só com o seu nome. Abinadade (bd;n;ybia’) significa “meu Pai é
nobre”. Mas Samuel foi categórico: Iavé não escolheu a este. A palavra “escolher”
(rj"B); é predominantemente usada para a escolha divina. A raiz hebraica significa
“uma escolha cuidadosa ocasionada pelas necessidades reais e, por isso, é uma escolha
muito consciente e que pode ser examinada à luz de certos critérios”9. Portanto, Iavé
tem critérios muito especiais para a sua escolha, principalmente o estado do coração de
cada um.
Versículo 9
O historiador só menciona o nome dos três primeiros filhos de Jessé. E
certamente este deixa-nos intrigados, porque o nome “Samá” (hM;v") vem de uma raiz
que significa “desolação, desperdício, terror”. O que se terá passado na vida de Jessé ou
no nascimento deste filho que o tenha levado a dar tal nome a um filho? De qualquer
forma, ao terminar com este nome, sendo o terceiro, o historiador já demonstra a sua
intenção de rejeição destes filhos de Jessé. Não valia a pena insistir numa coisa que
Deus já tinha decidido. Por outro lado, ele continua a referir apenas estes três porque
eles estão associados a Saul e são os únicos prontos para a guerra (1 Sam. 17:12-14).
Versículo 10
A apresentação do número sete afigura-se-nos como algo completo, perfeito,
mas a realidade é que nenhum destes tinha sido escolhido por Iavé. Os sete filhos de
Jessé não formavam o quadro perfeito, e não menção dos nomes dos restantes quatro
denota que seriam insignificantes, porque a desolação continuaria a ser uma realidade
diante dos olhos de Samuel, que agora estava habilitado por Deus a escolher a pessoa
certa.
Versículo 11
Samuel fica como que espantado que não surjam mais filhos, pois sabia que
Deus o tinha mandado ali par ungir um dos filhos de Jessé como rei. A sua pergunta não
é descabida: “Acabaram-se os jovens?”. A resposta surge imediata: “Ainda falta o
menor”. Klein argumenta que “deveria ver-se na palavra ˆf;Qh
; " a conotação de “mais
pequeno, assim como de mais jovem. A sua pequenez pode oferecer um contraste com a
altura de Saul”10. De facto, podemos verificar que este é um dos motivos no Antigo
Testamento, Deus escolhe sempre o mais fraco, o mais novo para perpetuar a sua
aliança, como foi o caso de Jacó e de Efraim. Nesta perspectiva, Deus está sempre do
lado dos mais fracos. Outra característica deste jovem “insignificante” é que ele
apascenta ovelhas. Ao contrário de Saul, que só procurava as jumentas de seu pai,
David está a apascentar (h[;r); as ovelhas. É interessante saber que a raiz da palavra
“apascentar” está associada a um substantivo assírio que tem o significado de
“governante”. Por isso, não é de estranhar que esta menção feita sobre a actividade de
9
Seebass, “rj"B”; , TDOT, vol. II, 1975, 74.
Klein, 1983, 161.
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David já esteja a prenunciar as suas características de líder. Jack Vancil informa no seu
artigo sobre pastores que no Antigo Testamento os líderes de Israel eram considerados
muitas vezes como pastores, embora o rei israelita nunca tenha sido chamado
directamente com o título “pastor”11. Klein diz que “a lida de David com o rebanho
pode simbolizar, metaforicamente, o seu grande futuro”12. O cuidado que era necessário
ter com as ovelhas, certamente ajudou na preparação de David para governar Israel.
Deus desejava que o rei cuidasse do povo com a mesma compaixão que um pastor tinha
com o seu rebanho.
A forma como Jessé fala do seu filho mais novo dá a ideia de que ele nunca
pensaria que David pudesse ser o escolhido. Mas Samuel não continuaria o ritual se
David não estivesse presente. O texto em português fala sobre sentar-se à mesa,
certamente influenciado pelo texto da Septuaginta que tem a palavra grega kataklivnw
(kataklínô), que significa “sentar” (para comer). Mas o verbo hebraico encontra-se na 1ª
pessoa do plural do Imperfeito Qal13 (bb"s); significa “andar à volta” ou “rodear”. Por
esta razão alguns intérpretes consideram que Samuel estava a falar de uma procissão à
volta do altar. Realmente é estranho que agora se fale em sentar à mesa, quando o
convite foi feito para ir ao sacrifício. Como a palavra “altar” não aparece no texto,
talvez Samuel quisesse dizer que não iria andar ali às voltas, ou a repetir o processo
todo, enquanto David não chegasse, por que poderia dar-se o caso de ser ele o escolhido
e então não teria de voltar a olhar para os sete filhos de Jessé.
Versículo 12
Jessé não teve outro remédio senão mandar buscar David. Afinal a aparência
física contou para David. Ao contrário do que se esperava, talvez um jovem rude, sujo e
pestilento, encontramos um jovem ruivo (yni/md]a"), que pode referir-se à cor do seu
cabelo ou à da sua pele. A expressão “formoso de semblante” em hebraico lê-se
literalmente “com olhos bonitos” (µyin"y[e hpey]Aµ[i). A sintaxe nesta frase é complicada
e inusitada. Mais uma característica física se apresenta quando o texto diz que tinha
“boa presença”. A palavra para “presença” está associada ao verbo “ver”.
“Levanta-te e unge-o” são dois Imperativos que terminam com a espera. Já
dissemos que a palavra hebraica “ungir” (jv"m); está associada ao nome “Messias”
(j"yvim;), que significa “ungido”. Literalmente, Deus disse: “… porque este é ele”.
Versículo 13.
Samuel tomou o símbolo de poder para o transmitir a outro, neste caso a David.
Através da unção, Deus estava a dizer que estaria sempre com a pessoa capacitando
para realizar as tarefas para que tinha sido escolhido.
Depois disto, o relato do historiador é significativo ao dizer que daquele dia em
diante. O termo “em diante” (hl;[]m;) está associado à ideia de “para cima”.
11
Jack W. Vancil, “Sheep, Shepherd”, The anchor Bible Dictionary, vol. 5, 1992, 1189.
Klein, 1983, 161.
13
Cf. Gesenius’ Hebrew Grammar, Oxford, Clarendon Press, 198515, pg. 518.
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