AS TORRES DE SÃO JOSÉ, Recife, março 2005
Transcrição
AS TORRES DE SÃO JOSÉ, Recife, março 2005
DAS TORRES DE SÃO JOSÉ Á TORRE EIFFEL (Publicado no DIÁRIO DE PERNAMBUCO de 30/03/2005) A cidade se envolve com nova polêmica, agora sobre as Torres no Bairro de São José, projetadas no terreno da antiga Mesbla Náutica. Vozes se opõem a um projeto de singular arquitetura, em vez de agradecerem pelo talento dos arquitetos da terra, que as conceberam para o Recife. As opiniões livres são sempre bem-vindas numa sociedade democrática, quando elas transmitem posições que somam aos esforços de promoção e desenvolvimento. Precisamos dessas vozes, assim, ecoando tão enfáticas, nos momentos mais nobres do pensar a cidade, para enriquecerem diretrizes, estabelecerem normas e incutirem germes de prosperidade à paisagem urbana. A querela ora lançada, se parece com a da passarela do Paço Alfândega, no Bairro do Recife, por exibir bases provincianas de intolerância e de supremo achismo, e por se conflitar com as normas vigentes e a opinião de renomados especialistas. Exalta um conservadorismo que parece lamentar que a cidade possa ter sua trajetória de crescimento, agregando culturas de suas épocas e consagrando identidades. A polêmica sinaliza um horizonte sombrio de restrições a um dos projetos mais esperados pela cidade: a operação urbana consorciada no setor do bairro de São José, entre a Rua Imperial e o Cais José Estelita. Área disponível, no centro, e paradoxalmente ociosa pela sua degradação. Essa operação urbana é a única forma de resgate para o bairro e para a sua centralidade, devido à presença de infra-estrutura e de um potencial incalculável para evitar a persistente fuga de funções do centro. Esta sim, é a paisagem do Recife que se perde, dolorosamente. É claro que estamos falando de uma área com história. Mas, lamentamos que a sociedade não tenha sido capaz de defender essa história, antes dela se tornar uma tão desagradável ruína social e urbana. O tão almejado Estatuto da Cidade concebe, para esses casos, na sua política urbana, o instrumento auspicioso das operações urbanas consorciadas, como um “conjunto de intervenções e medidas coordenadas pelo Poder Público Municipal, com a participação dos proprietários, moradores, usuários permanentes e investidores privados, com o objetivo de alcançar transformações urbanísticas estruturais, melhorias sociais e valorização ambiental”. Não ouvimos ainda vozes tão ciosas da tradição cultural do Recife e de Olinda, se rebelarem com o permanente adiamento da utilização desse instrumento de política urbana, preferindo deixar que setores importantes como este, de São José, e como o de Santo Amaro, entre a Rua da Aurora e as Avenidas Cruz Cabugá e Norte, entregues ao descalabro urbano, que vai da deterioração das suas estruturas arquitetônicas, ao covil de criminalidade. Antevemos, com horror, vozes ainda inaudíveis, que soarão, mais tarde, peremptoriamente, contra as novas estruturas que poderão emergir do descalabro urbano, para marcar uma nova trajetória de crescimento do Recife. Não é justo acusar de insensíveis instituições inatacáveis e com uma bela história como o IPHAN, sobretudo em Pernambuco, profissionais renomados da arquitetura pernambucana, empreendedores comprometidos com a trajetória da cidade e até a sociedade, que se deixou seduzir, sem preconceitos, pela oportunidade de morada sadia em São José, coroando uma luta antiga para estancar o esvaziamento do Centro. O Recife deve compreender que vozes precipitadas e intolerantes, via de regra são inconseqüentes como instrumento de persuasão de idéias. Imaginem se elas ecoassem em Paris, por exemplo: a humanidade estaria privada da pirâmide do Louvre; do Arco Quadrado de La Defense; da Biblioteca Nacional; e até, provavelmente, da própria Torre Eiffel. Jório Cruz – Arquiteto e Urbanista