Visualizar/Abrir - Portal Barcos do Brasil

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VIERAM
EM BUSCA
DA LIBERDADE
OS 150 ANOS DA IMIGRAÇÃO ALEMÃ NO BRASIL
GRÁFICA OL(MPICA EDITORA LTDA.- RIO
RUA DA REGENERAÇÃO, 475 • BONSUCESSO • RIO DE JANEIRO • GB.
A PROCURA DE UMA VIDA MELHOR
DESESPERO E ESPÍRITO DE AVENTURA TROUXERAM OS ALEMÃES
AO BRASIL
Diz a sabedoria popular que a infelicidade de um é
a felicidade de outro. No caso da colonização alemã no
Brasil verifica-se que tal assertiva não deixa de ter cabimento. As guerras constantes no centro do continente europeu originaram situações desesperadoras, mormente para os
habitantes das regiões economicamente mais pobres. Para
muitos deles a única alternativa que se oferecia era a emigração. A emigração significava deixar a pátria, na tentativa de não morrer de fome.
Para o Brasil, então terra longínqua e desconhecida,
foi uma felicidade, o infortúnio dos alemães em sua pátria.
Foi assim que passou a receber uma corrente migratória que
muito contribuiu para o seu desenvolvimento em todos os
setores das atividades humanas. Como na Alemanha há
muito que já se havia acabado com o analfabetismo e o
aprendizado de uma profissão já era obrigação, começaram
a pisar o solo brasileiro imigrantes que carregavam consigo a semente do saber. Inclusive professores eram integrantes dos grupos colonizadores e não tardaram a surgir escolas - alemãs, é evidente - , em meio às novas povoações
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que surgiam dentre o verde das matas virgens. Um levara
máquinas, outros ferramentas e logo foram surgindo fabri·
quetas, oficinas, cooperativas e associações, pois onde quatro ou cinco alemães se reunem nasce um clube ou comunidade de interesses.
Muitos jovens que viam os emigrantes se encaminhando para as cidades portuárias de Hamburgo ou de Bremen,
de onde partiam rumo ao Novo 'Mundo, à procura de uma
vida melhor, começavam a sentir saudade da distância. As
cartas que chegavam contando da amplidão, das praias infinitas, do sol, das estrelas, da flora, da fauna e dos perigos, emoções e alegrias faziam acender em muitos a chama
da aventura e o desejo de ir ver e sentir de perto aquelas
terras distantes, onde os rios e vales lembravam as plagas
teutas, mas eram ainda mais exuberantes. Botânicos, zoólogos, etnólogos, naturalistas e intelectuais seguiram o exemplo dos desesperados das regiões paupérrimas e foram
buscar novos conhecimentos, transportando para o Brasil
os que já possuíam. Levaram livros e instrumentos de pesquisas, começaram a catalogar pássaros, borboletas, árvores
e flores. Criaram jornais, conjuntos musicais e auxiliaram
as colônias a se transformar em cidades, com corpos de bombeiros voluntários, clubes de atiradores, que também serviam
ao preparo para a defesa contra o ataque de índios e de
animais selvagens, e outras instituições de interesse público.
No intuito de dar assistência espiritual aos alemães que
haviam emigrado para o Brasil, a congregação dos franciscanos começou a preparar frades missionários para enviar
às colônias alemãs em terras brasileiras. Estes não só foram
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pregar o cristianismo nas igrejas, mas também foram ensinar nas escolas e colégios, que eles próprios foram fundando. Excelentes professores, seus estabelecimentos de ensino se destacaram e adquiriram fama que se mantêm até
hoje.
Voltando, porém, ao velho ditado do início, a maior
infelicidade para a Alemanha e maior felicidade para o
Brasil foram as duas grandes guerras mundiais. Nelas é
que grandes contingentes de cientistas, médicos, engenheiros, técnicos, literatos e pessoas de elevado nível cultural
fugiram para o Brasil, o último fio de esperança e um dos
poucos que abriu os braços para acolher os fugitivos. Isto
acima de tudo pouco antes e durante a 11 Guerra Mundial.
Sabe-se que os judeus sempre foram um povo de gente culta
e, para escapar do crematório e das câmaras de gás nazistas,
como não eram aceitos em outros países europeus ou neles
continuavam em perigo, fugiram para o Brasil, que lhes
abriu as portas fraternalmente. Muitos intelectuais alemães,
arianos puros, não suportando a tirania ditatorial de Adolf
Hitler, fizeram a mesma coisa. A liberdade que o Brasil lhes
propiciou não foi retribuída apenas com a gratidão. Hoje
não se pode negar que esta corrente migratória procedente
da Alemanha foi das mais benéficas para a nação brasileira,
em seu caminho para o seu grande destino.
Em 1974 se comemora os 150 anos da colonização
alemã no Brasil. A contribuição alemã para o desenvolvimento do Brasil, contudo, teve início muito antes. Segundo
as palavras do Dr. Carlos H. Hunsche, "ele teve início no
dia em que o Brasil nasceu para a história". De fato, exa-
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minando bem a história brasileira, podemos observar que
na nau de Pedro Alvarez Cabral já havia alemães: o astrônomo Mestre João e os canoneiros. No navio em que Tomé
de Sousa, o primeiro governador geral, foi para o Brasil,
encontravam-se a bordo dois mercadores de Bremen. Os dois
primeiros livros escritos a respeito do Brasil foram de autoria de dois mercenários alemães. O primeiro, de autoria
de Hans Staden, foi publicado em 1557 e o segundo, de
autoria de Ulrich Schmiedel, foi dado a lume em 1567, em
Frankfurt-sobre-o-Meno. A Invasão Holandesa foi comandada por um príncipe alemão, Maurício de Nassau, que
teve o mérito de introduzir a imprensa no Brasil e de
haver levado para Pernambuco pintores, sábios, arquitetos,
médicos, poetas e escritores, deixando no Recife a semente
fecunda do interesse pelas artes. As duas esposas de Dom
Pedro I, Dona Leopoldina e Dona Amália, eram princesas
de sangue alemão e também colaboraram para o desenvolvimento cultural brasileiro. Dona Leolopldina também escreveu para Dom Pedro - tal qual José Bonifácio - dizendo que chegara a hora de declarar a independência. José
Bonifácio de Andrada e Silva, uma das figuras mais ilustres
da história brasileira, estudou na Alemanha. O alemão Rugendas legou-nos gravuras do Brasil colonial e imperial, de
valor cultural inestimável. O naturalista von Martius foi
outro alemão a deixar o seu nome ligado à História d(l
Brasil. A colonização alemã no Brasil teve início, porém,
em 1824, dois anos após o grito da independência.
É por isso que se comemora este ano o 150.0 aniversário da colonização alemã no Brasil. Para a história da
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humanidade 150 anos são um período muito curto. Os frutos
desta colonização, entretanto, são tantos e tão múltiplos que
vale a comemoração. Estes 150 anos ficarão gravados como
um capítulo imponente da história desta nação jovem, que
está registrando um progresso sem precedentes. Um progresso que tem na colonização alemã uma de suas vigas
mestras. Não é preciso argumentar, para se provar esta afirmação. Basta que se abra os olhos e veja a presença do
elemento em todos os setores de atividades da vida pública
brasileira. Os alemães foram para o Brasil em busca da
liberdade e à procura de uma vida melhor e auxiliaram a
criar as circunstâncias para que seus filhos - já brasileiros
- e os demais brasileiros de todas as descendências tenham
de fato uma vida melhor.
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DE ONDE VIERAM E PARA ONDE FORAM
DA SUÁBIA E DE HUNSRUCK PARA A REGIÃO SUL BRASILEIRA
Se quisessemos fazer um levantamento exato das cidades e regiões alemãs de onde partiram aqueles que emigraram para o Brasil, teríamos um trabalho de vários anos,
teríamos de ir também à Alemanha Oriental, à Polônia e à
Tcheco-Eslováquia. Com o material obtido poderíamos escrever um livro de centenas de páginas. De que parte da
Alemanha de outrora não há representantes no seio da população brasileira?
Por outro lado, se quisessemos precisar os locais brasileiros onde cidadãos de origem alemã se estabeleceram, teríamos de citar todos os estados, praticamente quase todas
as cidades e ainda acharíamos alemães em meio a tribos indígenas, alemães embrenhados no meio do mato, fazendo
garimpo ou até mesmo na favela. O povo alemão foi sempre
um povo guerreiro, talvez pelo fato de não querer recuar
um milímetro, quando se acha com a razão. Mas é um
povo desprendido e de arroubos de humanitarismo extraordinários. Quando se houve a notícia de que um médico
maluco resolveu largar tudo e ir tratar dos índios bolivianos
ou de leprosos paquistaneses, já se desconfia que o maluso
é um alemão abnegado. Junte-se a isto o espírito de aven-
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tura e a sede do saber. Foi organizado um grupo de alpi·
nistas para galgar uma montanha perigosa qualquer, pode-se
ter a certeza de que há alemão no meio. Não são poucos os
alemães e alemãs que vivem me perguntando se a Transamazônica já está pronta. Assim que esteja terminada, querem
alugar um "jeep" e corrê-la de ponta a ponta. Querem gastar
um período de férias, enfrentando os perigos do Inferno
Verde e maravilhando-se com a sua exuberância.
Os imigrantes alemães vieram de todos os pontos da
Alemanha. Isto já se observa através o nome de algumas
cidades que vieram a fundar em nosso solo. Hamburgo fica
no norte e Novo Hamburgo só pode ter sido fundada por
hamburgueses. Baden fica no sul e Badenfurt só pode ser
obra de gente de lá. A Pomerânia fica no leste, hoje pertence à Polônia. Foram imigrantes de lá que fundaram Po·
merode. Já tivemos Nova Berlim, que mudou de nome durante a última guerra mundial. Temos Rolândia, que foi
fundada por imigrantes oriundos de Bremen. Roland, sobrinho de Carlos Magno, tem uma estátua centenária na
praça principal de Bremen. Há Blumenau na Alemanha e
Blumenau no BrasiL Os nomes de muitos cinemas, hotéis e
restaurantes também revelam a procedência bávara, prussiana, frísia, renana, enfim alemã, de seus proprietários.
Mas se nos concentrarmos no ano de 1824, do início
oficial da colonização alemã no Brasil, e nos 30 que se
seguiram, podemos generalizar um pouco e dizer que os imigrantes vieram da Suábia e de Hunsrück. Chegaram ao Brasil
e foram para o sul, cujas características geográficas lembravam mais a sua pátria. Rio Grande do Sul e Santa Catarina
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foram os mais aquinhoados com o sangue germamco. A
maior parcela veio da região de Hunsrück, parte sudoeste
do maciço renano, entre os rios Saar, Mosela, Reno e Nahe.
Uma região belíssima, situada mais ou menos dentro do
quadrilátero formado pelas cidades de Trier (Trévis), a
mais antiga cidade alemã e outrora capital do setor oci·
dental do império romano, Koblenz ( Coblença), Bingen e
Saarbrücken.
As fisionomias e os nomes de família que se vê na re·
gião de Hunsrück são os mesmos que se vê na região sul
do Brasil. É interessante aqui o fato de que no Rio Grande
do Sul e em Santa Catarina fala-se ainda o velho dialeto
de Hunsrück. Um dialeto . que hoje muito poucos entendem
em seu lugar de origem. Hunsrück permanece sendo uma
das regiões mais pobres da Alemanha. Panorama maravi·
lhoso, as atividades se concentrando mais na agricultura, seu
ar é puro e salutar, o que não basta para prender o homem.
Sendo economicamente fraca, trata-se de uma região de
muita migração. Lá pelos idos de 1829 atravessou uma de
suas maiores crises e foi justamente nesta época que os
lerdos navios que se tinha à dsiposição zarparam lotados
de gente de Hunsrück, rumo às terras do sul.
Quase ia esquecendo de mencionar o meu estado, o
Paraná. Ele também foi integrado nos planos de colonização
alemã, se bem que em menor escala do que os seus vizinhos
mais ao sul. Os veleiros, depois de meses de odisséia pelas
águas tormentosas do oceano, chegavam apinhados de gente,
só se diferenciando dos navios negreiros pela cor da pele e
dos cabelos de seus ocupantes. O inicio da colonização, o
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início da vida na nova pátria também não foi fácil. O calor,
os insetos, as doenças tropicais, as dificuldades encontradas
fizeram desesperar muita gente e não foram poucos os que
se arrependeram. Houve reclamações e protestos. Foi por
isso, talvez, que surgiu em Hamburgo a "Sociedade de Pro·
teção ao Emigrante Alemão".
Era preciso ver o que realmente estava acontecendo e
era preciso obter do governo imperial brasileiro o reconhe·
cimento da sociedade, a fim de que pudesse agir. Um jovem
chamado Hermann Bruno Otto Blumenau, recém formado
em filosofia e que há muito andava sonhando com a Brasil,
firmou contrato com a citada sociedade. tomando a si a
incumbência de elaborar um relatório sobre a situação do
emigrante alemão. Em 1846 partiu de Hamburgo e dois
meses depois estava no Brasil. Andou pelas colônias alemãs
no Rio Grande do Sul e em 1847 voltou ao Rio para enviar
o seu relatório à "Sociedade de Proteção ao Emigrante Ale·
mão". Nesta altura dos acontecimentos a situação não devia
ser tão ruim, pois ele próprio decidiu ficar. Em 1848 estava
negociando com o governo provincial. Seu plano de colonização apresentava algumas exigências, como direitos iguais
para os imigrantes e isenção de taxas na preparação con·
sular dos papéis dos que pretendiam emigrar para o Brasil
e das taxas portuárias para os navios que transportavam os
imigrantes alemães. Seu plano de colonização apresentava
também elementos interessantes, como a proibição da escra·
vatura nas terras que pretendia colonizar.
Seu plano de colonização nunca chegou a obter força
legal, mas ele cumpriu-o à risca, na colônia que fundou no
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Vale do ltajaí, em 1850, acompanhado de 17 imigrantes.
Desta colônia surgiu a cidade de Blumenau, uma das ci·
dades mais progressistas e dinâmicas do Brasil.
A respeito da colonização alemã no Rio Grande do Sul
existe um livro escrito pelo francês Jean Roche e intitulado
"La Colonisation Allemande et le Rio Grande do Sul". Nele
o autor afirma que os colonizadores alemães conseguiram
uma metamorfose, fazendo do Rio Grande do Sul outra coisa
do que era antes da sua chegada. Acontece que eles vieram
a constituir uma nova camada na população do Brasil lm·
pério. Os portuguêses e seus descendentes viam o trabalho
braçal como uma desonra. O trabalho braçal era coisa para
os escravos. O imigrante alemão, seja porque era contra a
escravidão ou porque não tinha dinheiro para comprar es·
cravos, agarrou a pá e a enxada e foi amanhar a terra. Do
suor do seu trabalho extraiu riquezas e da sua lida no solo
desenvolveu o amor pela terra, pelo país que se tornou a sua
segunda pátria e a pátria de seus filhos.
Seja lá de onde tenham vindo e para onde tenham ido,
o importante é que vieram. O importante é que tenham
vindo, apesar de um cidadão chamado João Jacó Sturtz, que
foi cônsul brasileiro na Prússia, tendo sido dispensado de
suas funções, ter se entregado a intensa propaganda, acon·
selhando a emigração para outros países que não o Brasil,
contra o qual passou a fazer violentas manifestações, e ape·
sar da portaria ministerial alemã, conhecida por "Von der
Heyd'sche Reskrip", que vigorou até 1895 e que prejudicou
profundamente a emigração para o Brasil, além de criar
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sérios embaraços às boas relações entre o Brasil e a Alemanha, como nos conta o historidor José Ferreira da Silva.
Seja lá de onde tenham saído, se do norte ou do sul,
do leste ou do oeste, o principal é que criaram logo um
fervoroso amor pela nova pátria. Um dos mais belos exemplos podemos buscar na história da Colônia do Dr. Blu·
menau. Fundada em 1850, por um punhado de bravos, 15
anos depois, em 1865, quando explodiu a guerra do Brasil
com o Paraguai, ofereceu um batalhão de 56 voluntários Voluntários da Pátria! Chefiado pelo engenheiro Emílio
Odebrecht, que fora oficial prussiano, o batalhão partiu
para os campos de batalha, disposto a derramar o seu san·
gue alemão pela pátria brasileira, que fora ultrajada pelo
ditador paraguaio, Francisco Solano Lopez. O batalhão de
Blumenau levava como estandarte uma bandeira com as
cores "preto, vermelho e amarelo ouro .. As mesmas que os
democratas alemães de 1848 usaram como símbolo do seu
movimento revolucionário, contra o despotismo feudal na
Alemanha, movimento que foi sufocado e que levou muitos
intelectuais a deixarem ~s terras teutas, por não suportarem
o cerceamento da sua liberdade de pensamento e de expres·
são, e buscaram refúgio no Brasil. As mesmas cores que se
vê hoje na bandeira alemã.
Este amor foi se aprofundando e foi transmitido de
pais para filhos. Assim nasceu o sentimento de brasilidade,
que passou por uma das suas provas mais duras durante
a 11 Guerra Mundial, quando o Brasil voltou a ser ultra·
jado, mas desta feita por um ditador alemão, Adolf Hitler.
Os alemães e descendentes de alemães no Brasil sofreram
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humilhações e deram provas de patriotismo verde-amarelo.
Tiveram bens confiscados, suas propriedades foram saquea·
das e suportaram tudo com atitude mais do que cristã e
sem espírito de vingança. Jamais esqueci um acontecimento
comovente que me foi narrado pelo Tenente Carlos Cotrim
e ocorrido numa pequena cidade do Rio Grande do Sul.
A turba foi quebrar e saquear a relojoaria de um alemão.
Munidos de paus e pedras, os populares invadiram o estabelecimento comercial e lá encontraram os proprietários, um
casal de velhinhos de cabelos brancos, abraçados e enrolados na bandeira brasileira. Não é preciso dizer que saíram
todos de cabeça baixa, envergonhados do ato que pretendiam
perpetrar. Prova mais cabal ainda é-nos dada pela relação
dos nomeS dos pracinhas brasileiros que tombaram lutando
contra a Alemanha de Hitler. Nomes como Max Wolff e
Harri Rauen constam entre os dos maiores heróis da Força
Expedicionária Brasileira. O Brasil reconheceu o fato e por
isso mesmo foi a primeira nação que esteve em guerra com
a Alemanha de Hitler a estabelecer relações diplomáticas
com a República Federal da Alemanha. Os alemães-brasileiros
e os brasileiros de sangue alemão, absortos em seu trabalho,
não tiveram tempo para mágoas e ressentimentos. Hoje, juntamente com os brasileiros de sangue negro, português, italiano, polonês, árabe, judeu, japonês e outros mais, estão
devotados à meta da integração nacional e da arrancada para
o grande futuro que já começou.
ENSINANDO E APRENDENDO
O DESENVOLVIMENTO DAS RELAÇÕES CULTURAIS
As relações culturais entre o Brasil e a República Federal da Alemanha são boas e estão deixando de ser uma
rua de mão única. Isto em parte porque não faz muito
tempo que o Brasil se libertou da influência de culturas
européias e criou a sua própria cultura, em parte porque
o atual Governo de Bonn decidiu reformular a sua política
cultural exterior e deu aos seus parceiros maiores possibilidades de intercâmbio. É evidente que uma nação velha e
experiente como a Alemanha tem maior acervo cultural do
que o Brasil, um país jovem e que se tornou independente
há apenas 152 anos. Além do mais, é mais do que lógico
que nas relações de uma nação industrializada com um país
ainda contado na faixa do Terceiro Mundo - dos países
em desenvolvimento - o volume maior no intercâmbio cultural cabe ao economicamente mais abastado e que possui
maiores chances de divulgação. O desenvolvimento das relações culturais teuto-brasileiras é positivo e faz jus ao crescimento da importância do Brasil no concerto das nações.
Falar de intercâmbio cultural no tempo do Brasil Colônia .é impossível. A cultura existente no Brasil eram os
padres jesuítas e mais tarde também alguns intelectuais que
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acompanharam a família real portuguêsa. Para a cultura
alemã o Brasil era menos conhecido do que a Lua. Com a
chegada de Dona Leopoldina e mais tarde com o início da
colonização alemã, em 1824, no Brasil Império, a cultura
alemã começou a ser exportada ou carregada para terras
brasileiras. Ela foi contribuir para que surgisse uma cultura
verdadeiramente brasileira, o que permite agora um verdadeiro intercâmbio.
Os colonizadores alemães trouxeram livros e o hábito
de ler. Entre eles havia homens eruditos, literatos, médicos,
engenheiros, filósofos, cientistas e pesquisadores. Fundaram
escolas e jornais e legaram-nos diários e descrições que são
autênticos documentos históricos e de enorme valor cultural.
O primeiro médico e diretor da Colônia de São Leopoldo,
no Rio Grande do Sul, Dr. Johann Daniel Hillebrand, deixou
gravado o seu nome na nossa história, tal qual o filósofo
Dr. Hermann Bruno Otto Blumenau, que fundou e dirigiu
a colônia, hoje cidade próspera, que perpetuou o seu nome.
Ambos prestaram contribuição inestimável para as relações
culturais teuto-brasileiras, já pelas cartas entusiasmadas e
divulgadoras das coisas brasileiras, que mandaram para sua
antiga pátria.
O Dr. Blumenau teve a capacidade de atrair para sua
colônia o sábio e naturalista Fritz Müller, a quem conhecera
na Alemanha. Sua amizade com Alexander von Humboldt
também serviu de semente para o fomento das relações culturais, acima de tudo pelo seu grande interesse pela botânica. Para acabar com as críti~as que eram feitas contra o
Brasil e que dificultavam a emigração de alemães para o
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nosso país, escreveu centenas de cartas, foi pessoalmente à
Europa manter contatos com as autoridades e com a imprensa e conseguiu a edição na Alemanha de duas publicações suas, uma das nossas primeiras tentativas de promoção lá fora. Outras repúblicas sul-americanas e os norteamericanos estavam interessados em atrair para suas terras
os emigrantes alemães e tratavam de criar uma imagem
negativa do Brasil, na Alemanha. No início de 1850 publicou sua obra "Sübbrasilien und seine Beziehungen zur deutschen Auswanderung und Kolonisation" (O Sul do Brasil
e suas relações com a emigração alemã e a colonização) .
Nela protestou contra as injustas e mentirosas afirmações
caluniosas que eram feitas a respeito do Brasil e forneceu
informações preciosas sobre a colonização alemã em São
Pedro d'Alcântara e Vargem Grande, em Santa Catarina,
e São Leopoldo e Três Forquilhas, no Rio Grande do Sul.
Em 1856 lançou na Alemanha a sua segunda publicação:
"Die deutsche Kolonie Blumenau in der Provinz Santa Catarina in Südbrasilien" (A colônia alemã de Blumenau, na
Província de Santa Catarina, no Sul do Brasil). Um livreto
de 60 páginas, contendo um mapa e dividido em oito capítulos repletos de dados estatísticos, apontando para as perspectivas futuras e defendendo o Brasil de acusações infames.
Os temas da sua publicação: A Colônia Blumenau, sua fundação e desenvolvimento; O Brasil e seus inimigos; O progresso do Brasil em seus primeiros anos; O interesse do
governo brasileiro pelos problemas da colonização; O contrato de colonização entre o governo brasileiro e o autor;
Conselhos práticos para aqueles que queiram emigrar para
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Blumenau. A intenção precípua do Dr. Blumenau era conquistar gente para sua empreitada, mas suas publicações e
seu trabalho neste sentido podem ser incluídos no intercâmbio cultural.
Os sistemas de transportes e de comunicações servem
à difusão da cultura de um povo. Imigrantes alemães e descendentes dos mesmos trabalharam ativamente neste sentido. O serviço de telegrafia foi uma iniciativa do Barão
de Capanema, cujo nome de batismo era Wilhelm Schuch.
O Capitão Konrad . von Niemeyer foi co-fundador do Ins·
tituto Histórico e Geográfico do Rio de Janeiro. A aeronavegação no Brasil foi iniciativa de Victor Konder e a VARIG,
empresa de aviação internacional de que muito nos orgu·
lhamos, foi obra de imigrantes alemães. Aqui poderíamos
nos estender por dezenas de páginas.
Com o advento da república, os brasileiros de sangue
alemão tiveram ainda mais chances de se destacar e de con·
tribuir para o intercâmbio cultural teuto-brasileiro. Quando
se fala em intercâmbio cultural tem-se que pensar sempre
em política exterior e no Ministério de Relações Exteriores,
ao qual estão afetos os consulados, embaixadas e instituições culturais no exterior. O Ministro do Exterior Lauro
Müller, como seu nome facilmente revela, prestou também
a sua contribuição para o desenvolvimento das relações culturais teuto-brasileiras.
O primeiro produto da nossa cultura a firmar pé no
exterior foi a música popular, o samba. Combinamos o ritmo
africano com a melodia européia e demos ao mundo algo
puramente nosso. Na Alemanha, e não só nela, por muito
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tempo "Aquarela do Brasil", do nosso saudoso Ari Barroso,
foi a marca registrada do nosso país. Aí vieram as canções
praieiras de Dorival Caymi, depois os sucessos - via USA
- de Antônio Carlos Jobim e Vinicius de Morais e por fim
Chico Buarque de Hollanda e sua A Banda, bem como algumas criações de Jorge Ben. Mas a música, quando orquestrada, é internacional e, quando cantada em português, en·
tendida por poucos. De qualquer maneira o Brasil deixou
de apenas receber e passou também a fornecer cultura.
A falta de apoio às artes levou muitos brasileiros a to·
marem o rumo da Europa. Vários buscaram a República
Federal da Alemanha e, voluntária ou involuntariamente,
tornaram-se elos das relações culturais entre os dois países.
Marcia Haydée é primeira bailarina em Stuttgart, Maura
~
Moreira é meio-soprano em Colônia, Paulo Trein é dirigente
de orquestra em Mainz, Almir Mavignier ~professor de pintura em Hamburgo, Claudio Santoro é professor de música
em Mannheim.
Hoje a situação está mudando. O 'Ministro Jarbas Pas·
sarinho tem se desdobrado em esforços e dado auxílio inaudito às artes e ao esporte. Medida inteligente e acertadís·
sima, pois nenhum povo pode se tornar verdadeiramente
grande, se não tiver uma ampla e sólida base cultural. Os
teatros, os conservatórios de música e as escolas de belas
artes do Brasil estão recebendo um novo alento e as crianças estão sendo tornadas solo fertil para a semente da cultura. Fazendo uso de recursos próprios e das bolsas de
estudos distribuídas por várias fundações alemãs, número
enorme de jovens brasileiros estão estudando ou se aper·
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feiçoando na Alemanha, ensejando um verdadeiro intercâmbio cultural. Já não tem mais o desejo ou necessidade de
ficar e sim regressam, para explorar o imenso campo aberto
existente no Brasil. Um dos últimos a voltar foi o pianista
gaucho Carlos Feliciati, que concluiu o seu curso de aperfeiçoam~nto na Escola Superior de Música de Colônia com
a melhor nota que se pode obter (l) e cujos concertos receberam os maiores elogios da imprensa local.
A palavra escrita é, contudo, uma das melhores formas
de se difundir cultura. Quando escritores como João Guimarães Rosa, Jorge Amado e Érico Veríssimo, para citar
apenas os três mais conhecidos do público leitor alemão,
conseguiram em seu regionalismo apresentar literatura genuinamente verde-amarela, surgiu um instrumento verdadeiramente eficiente de intercâmbio.
As editoras alemãs se interessam e tradutores do quilate de Curt Mayer-Clason transcreveram para o idioma alemão as histórias e estórias mineiras, baianas e gauchas.
A partir de então não é mais só o brasileiro que tem a possibilidade de tomar contato com a cultura alemã, lendo
Goethe, Schiller, Grass e outros. O alemão também pode
tomar contato com a cultura brasileira, lendo nossos autores.
A cooperação no campo da televisão, agora iniciada
poderá se tornar excelente veículo de intercâmbio cultural.
Seria interessante se conseguíssemos produzir um curso de
português, para alemães, fornecendo pela TV uma noção da
nossa terra, dos nossos costumes, da nossa mentalidade e
das nossas coisas, da nossa tradição e da nossa cultura.
O idioma é fator importante, pois como diz o Chacrinha, em
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sua filosofia popular, quem não se comunica se estrombica.
O interesse por um idioma, todavia, só cresce quando
cresce a importância econômica do país em que é falado.
O Brasil está em plena expansão e suas rela~ões econômicas
que se ampliam a olhos vistos farão com que muitos estrangeiros se interessem ou tenham de se interessar pela língua
portuguêsa, tal qual ocorre conosco agora em relação ao
inglês e ao alemão. Principalmente os alemães terão de
dedicar atenção ao idioma falado no Brasil, pois somos o
maior parceiro econômico da Alemanha na América Latina
e os investimentos alemães em nosso país revelam uma extrema confiança e um desusado interesse.
Vale ressaltar que na Universidade de Heidelberg já
existe um curso de português e que atualmente 50 jovens
estão aprendendo a nossa língua. A biblioteca da referida
universidade tem uma seção dedicada aos autores brasileiros,
que é verdadeiramente imponente. Algumas outras universidades alemães e institutos de línguas também mantêm lentes
de língua portuguêsa, mas seus cursos não chegam a nível
tão elevado quanto o de Heidelberg, que prepara intérpretes e tradutores.
Seria uma injustiça não citar o Instituto Ibero-Americano, os clubes teuto-ibero-americanos e a Sociedade TeutoBrasileira, que tem feito tudo o que podem para que o intercâmbio cultural Brasil-Alemanha seja ainda melhor e funciOne nos dois sentidos.
Para encerrar, vale também mencionar que a nova
orientação dada à política cultural exterior alemã é propícia ao verdadeiro intercâmbio. Bonn não quer mais apenas
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"dar" ou "oferecer" cultura. No próprio interesse do povo
alemão, quer também "receber" cultura. O mundo chegou
a um ponto em que não pode haver sabedoria, nem cultura
onipotente. É preciso ensinar e aprender. Reconhecendo isto,
são ilimitadas as chances de desenvolvimento dos laços culturais q'ue unem o Brasil e a Alemanha.
PARTICIPANDO DO DESENVOLVIMENTO
O PAPEL DOS ALEMÃES NA EVOLUÇÃO ECONÔMICA BRASILEIRA
O ressurgimento imponente da economia alemã, a partir
das cinzas e do caos da li Guerra Mundial, ficou sendo
conhecido pelo nome de "milagre econômico alemão". Na
economia, porém, os milagres não existem. O que existe é
o produto do trabalho eficiente, do poder de iniciativa, da
soma de esforços, do espírito de sacrifício e do dinamismo
de um povo. Nãd se pode negar que o alemão possui estas
qualidades. Aqui, por sinal, tem-se de fazer justiça também
aos alemães orientais. Eles, embora com menos gente, com
um sistema econômico dirigido e que se evidencia cada vez
mais como falho, sem Plano Marshall e com os russos tendo
carregado as máquinas e planos de fabricação de sua indústria desmantelada, bem como seus técnicos e professores,
conseguiram crescer e situam-se, com sua República Democrática Alemã, entre as 10 nações mais industrializadas do
mundo.
O trabalho eficiente, a organização, o poder de iniciativa, o espírito de sacrifício e o dinamismo não são qualidades recentes do povo alemão, não nasceram apenas após
a última grande guerra. Os imigrantes chegados ao Brasil
em 1824 e os que se seguiram ao longo das décadas levaram
24
25
para o Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e outros
Estados para onde migraram, mais tarde ou logo depois, este
capital inestimável que é parcela notável do que hoje está
sendo chamado de "milagre econômico brasileiro".
Os primeiros colonos se dedicaram acima de tudo à
lavoura. Era a forma mais simples de garantir a subsistência. Os colonizadores, porém, já tinham planos industriais.
A industrialização inicial foi a dos produtos oferecidos pela
terra fertil. Moinhos, engenhos e alambiques começaram a
florir. Barracões rudimentares foram as primeiras fábricas.
Muitos destes barracões se transformaram em empresas de
grande vulto. O artesão habilidoso que fazia gaitas de boca
se transformou em proprietário de uma grande fábrica de
instrumentos de música. O ferreiro, que derramou o suor
do seu rosto sob o sol tropical, se tornou diretor de uma
indústria metalúrgica poderosa. O pequeno imigrante, que
levou ou montou um tear primitivo, conseguiu deixar para
seus filhos uma grande tecelagem. O imigrante alemão foi a
primeira injeção de vitamina para a economia brasileira.
Ele já sabia o valor das feiras e exposições. Não é de
se estranhar o fato de que na Exposição Mundial de Paris,
em 1900, havia colônias alemãs do Brasil mostrando os seus
produtos. O imigrante alemão já sabia da importância das
exportações, para o desenvolvimento econômico de um país.
A Colônia de Blumenau, por exemplo, chegou a exportar
apreciável volume de fumo em folha para a Áustria, Alemanha e outros países europeus. Nas demais colônias alemãs, em Dona Francisca, São Leopoldo e outras, também
já campeava a mentalidade de exportador, que só agora está
26
se impondo definitivamente em nosso país. Os colonizadores
procuravam fazer negócios com o estrangeiro, para arreca·
dar divisas, com as quais adquiriam máquinas e faziam investimentos.
Para garantir a abastança, os colonizadores alemães
fomentaram a policultura. As dificuldades de transporte e
distâncias forçaram a diversificação industrial das colônias,
coisa que mais tarde, infelizmente, foi abandonada e levou
algumas regiões a ficarem na dependência de um único ramo
industrial e assim muito suscetíveis a crises.
Talvez ainda mais importantes para a evolução econômica brasileira foram os laços que os imigrantes criaram
entre o nosso país e sua antiga pátria. As cartas escritas e
os relatos feitos aos amigos e aos parentes tiveram efeito
fermentador. Tiveram e continuam a ter. Na hora de exportar capital, na hora de fazer investimentos no exterior
para conquistar novos mercados e explorar outras possibilidades de crescimento, o homem não se decide pelo incógnito
e desconhecido. Aqui o imigrante alemão tem sido o elo
que funciona na cadeia da informação.
atrás, salvo poucas exceções, costuma nos diminuir e faz
até mesmo campanha contra o nosso país, oimigrante alemão
tem sido o elo que funciona na cadeia da informação.'
O imigrante alemão, que veio de navio a vela, trazendo tudo o que tinha (uns poucos pertences e uma grande
vontade de vencer), ao derrubar o mato e plantar cidades,
preparou o terreno para o porvir. O imigrante modesto de
1824 preparou o terreno para os gigantescos negócios de
mais de cem anos depois.
27
Se, contudo, deixarmos de lado o punhado de gente
que deu início ao desenvolvimento econômico do sul do
nosso país e aqueles imigrantes que deixaram as colônias
e foram para o Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais
e outras plagas exercer suas profissões de funileiro, marceneiro, ferreiro etc.; se não considerarmos as empresas hoje
autenticamente brasileiras, herdadas ou criadas por descendentes de imigrantes alemães; se passarmos uma borracha
no pretérito mais remoto, deixando apenas o passado mais
recente, os últimos 25 anos, ainda teremos ou aí é que teremos uma prova cabal da participação alemã na nossa
evolução econômica.
Um nome apenas seria suficiente: Volkswgen. A revolução industrial brasileira teve início na década de 50,
quando nossas autoridades governamentais decidiram dar a
largada para uma indústria automobilística nacional. O
Grupo Monteiro Aranha, do Rio de Janeiro, buscou entendimentos com a Volkswagen Alemã, que por seu turno estava
interessada em assentar pé no mercado com mais perpectivas
futuras na América Latina. Em 1953 nascia a Volkswagen
do Brasil com 80% de capital alemão e 20o/o de capital
brasileiro.
O crescimento desta empresa teuto-brasileira é algo sensacional. Um bom exemplo é o aumento da sua produção.
Enquanto de 1953 a 1957 produziu 2. 820 veículos, hoje
produz 1. 600 por dia e ainda este ano deverá alcançar a
casa dos 2. 000.
A nacionalização das peças e materiais também foi surpreendentemente rápida. A participação genuinamente bra-
28
sileira na primeira "Kombi" que deixou as esteiras da
Volkswagen do Brasil, em 1957, era de 50o/o. Em 1961 a
nacionalização já subira a 95% e hoje o fusca, fuscão e
demais carros da empresa são 100% brasileiros.
O número de empregos que criou também é expressivo,
assim como o de possibilidades de implantação de outros
ramos industriais ligados direta ou indiretamente à fabri·
cação de veículos. Quanto ao número de empregados o
aumento também correspondeu às necessidades desenvolvimentistas brasileiras, servindo pujantemente à evolução econômica. Em 1960 a Volkswagen do Brasil tinha 7. 9240
funcionários. Em 1972 já dava trabalho em suas dependências a 28. 045 pessoas. Acrescente-se agora o pessoal das
agências de vendas e das oficinas mecânicas espalhadas por
todo o Brasil, hem como os vendedores de acessórios e os
que trabalham para outras firmas fornecedoras exclusivas
da Volkswagen, mais os familiares e dependentes de todos
e chegar-se-á à conclusão de que cerca de um milhão de
pessoas vive do carro que tem mais de 50% de participação
no mercado automobilístico brasileiro.
Os salários pagos são elevados e a média é quase cinco
vezes superior ao salário mínimo de São Paulo. Trabalhar
na Volkswagen já representa um passo a frente e muitos
sonham poder trabalhar nela. Embora o meu objetivo aqui
seja analisar a contribuição alemã para a nossa evolução
econômica, desejo abrir um parêntesis, para fazer menção
à contribuição da Volkswagen à evolução social, ao hemestar social. Ela oferece transporte gratuito para seus empregados, possui 14 restaurantes-cantinas, que servem 25. 000
29
refeições diariamente, pelo preço de um cruzeiro por refeição, oferece assistência médico-hospitalar gratuita aos em·
pregados e familiares e no campo da educação profissional
tem programas pioneiros no Brasil.
O plano de investimentos da empresa é enorme, o que
significa ,que ela continuará prestando o seu tributo à evolução econômica brasileira, lançando-se agora no campo das
exportações.
Eu disse que bastaria citar o nome Volkswagen. Bastaria, mas seria uma injustiça para alguns outros grandes
nomes alemães da indústria brasileira. Ao se falar da participação alemã e da sua contribuição para o nosso desen·
volvimento econômico, não se pode deixar de mencionar a
AEG-Telefunken, que foi uma das primeiras a confiar no
nosso país, vindo para cá em 1913. Não se pode esquecer
a Siemens, um dos gigantes da indústria eletrônica, uma das
vigas mestras do nosso progresso no que concerne às telecomunicações. Tem-se até mesmo o dever de fazer referência à Mannesmann, que foi a primeira grande empresa ale·
mã a investir capital no Brasil após a 11 Guerra Mundial
e que hoje ocupa posição de destaque em nossa produção
de tubos de aços. É-se forçado a voltar ao automobilismo,
para falar da Mercedes-Benz. Os caminhões e ônibus que
ela produz transportam cargas e passageiros para todas as
direções, transportando riquezas, o que significa crescimento econômico, e transportando a integração nacional,
em forma de passageiros que viajam para outros pontos
do país, seja para fazer turismo, negócios ou para buscar
emprego. A Krupp também merece referência especial. O
30
primeiro pedido que a empresa alemã recebeu do além-mar,
em 1837, procedia do Brasil, provavelmente de alguns dos
primeiros imigrantes, que começava a se industrializar. 122
anos mais tarde a Krupp também se estabelecia no Brasil.
Foi ela que fabricou o primeiro virabrequim na América
Latina. Para fazer justiça também às empresas médias e
pequenas, pois elas também são de vital importância, teria
de gastar uma infinidade de folhas. Mas quero ainda fazer
alusão apenas a duas empresas químicas e uma metalúrgica
de grande envergadura, pedindo desculpas às que não foram mencionadas, embora participem decisivamente da nossa
evolução econômica. A metalúrgica é do setor das construções metálicas, para ser mais preciso. Trata-se da PohligEckel, que instalou o primeiro bondinho do Pão de Açúcar
e que decênios mais tarde também veio auxiliar o nosso
processo de industrialização, estabelecendo-se em Belo Ho·
rizonte. As duas empresas químicas são a BASF e a Bayer.
A BASF tem um amplo programa de fabricação no Brasil,
o qual abrange os corantes, styropor, dispersões, produtos
auxiliares, blocos, chapas e peças de isopor, adubos e tintas,
o.;om instalações fabris espalhadas pelo Brasil. A Bayer não
fica por menos. No setor da farmacologia seu papel é de
elevada importância e no da veterinária, dos adubos e da
proteção às plantas contra ervas e animais daninhos, representa uma garantia e uma esperança para o homem do campo
e para a evolução econômica da nossa agricultura. A! Bayer
inclui em seu programa ácidos, bicromatos, corantes, pro·
dutos para curtumes e mais recentemtnte os plásticos, aos
quais pertence o futuro, segundo a opinião de muitos. A
31
Agfa, que pertence à Bayer, tem em São Paulo um centro
Je fabricação de material. A Bayer só pelo fato de haver
inventado um insenticida que aniquila o percevejo transmissor da Doença de Chagas e de ter descoberto um medica·
mento que cura o paciente da insidiosa moléstia constatada
pela primeira vez pelo médico brasileiro Carlos Chagas, já
merece o nosso respeito e gratidão. Tratando e protegendo
a saúde do homem, presta contribuição ao desenvolvimento
econômico, pois apenas o homem sadio é que pode produzir o máximo das suas aptidões.
A participação dos alemães no nosso desenvolvimento
econômico é tão certa quanto 2
2 são 4. Ela começou
naqueles dias em que os imigrantes chegaram ao Brasil, nos
idos de 1824. A pergunta que resta para ser respondida é:
Se não tivessem sido os emigrantes que foram buscar a liberdade e melhores condições de vida no Brasil, os alemães
teriam investido tão maciçamente em nosso país, a ponto
de sermos a nação do Terceiro Mundo com o maior volume
de capital privado alemão?
+
IMPORTANDO E EXPORTANDO
O QUE O BRASIL COMPRA DA ALEMANHA
E O QUE VENDE PARA ELA
Se o volume do intercâmbio comercial pode ser tomado
como barômetro das relações entre dois países, Brasil · e
Alemanha tem laços que se estreitam cada vez mais e amizade que se torna sempre mais profunda. O maior parceiro
comercial do Brasil na Europa é a Alemanha e o maior
parceiro da Alemanha na América Latina é o Brasil. Este
fato justifica uma análise e pode derivar da colonização
alemã no Brasil.
Os alemães que emigraram para o nosso país ajudaram
a firmar em nosso mercado a marca "Made in Germany"<
que havia sido imposta pelos inglêses, os quais pretendiam
discriminar a metalurgia alemã. Os primeiros colonos auxiliaram a criar a fama dos produtos alemães. Uma fama que
continua persistindo, baseada na qualidade, é evidente. As
navalhas, tesouras e talheres de Solingen, que os imigrantes
trouxeram entre seus pertences, tornaram-se populares. Os
nobres já conheciam a qualidade do aço de Solingen, através
de suas espadas, sabres e adagas. As máquinas alemãs também se impuseram, a partir do início modesto das nossas
32
33
primeiras oficinas e fabriquetas. As compras brasileiras na
Alemanha faram crescendo sempre, de ano para ano.
Por outro lado, os imigrantes alemães contribuíram
para que alguns de nossos produtos naturais se tornassem
conhecidos na Alemanha e na Europa. Frutas, madeiras e
pedras que iam encontrando por aqui eram temas das cartas
e comentários para os parentes e amigos. Alguns poucos
exemplares chegaram a ser mandados para a Alemanha,
abrindo mercado ou tornando pelo menos conhecidos alguns
dos nossos produtos. Aqui pode ser citado o exemplo das
orquídeas. Grandes amantes das flores, os alemães ficaram
encantados com as orquídeas. Não é uma coincidência o
valor que se dá às orquídeas na Alemanha e o elevado número de orquidófilos nas cidades brasileiras de influência
germânica.
Os imigrantes alemães tinham formação profissional,
eram técnicos em alguma coisa. O termo técnico alemão
tornou-se válido, para a publicidade, como símbolo de ga·
rantia de bom serviço. Estes técnicos usavam e recomendavam ferramentas e máquinas que conheciam de sua antiga
pátria ou das publicações que recebiam de lá. Teve início
uma espécie de "o técnico alemão falou, tá falado! ". As
melhores máquinas eram as alemães. Na hora de escolher
entre uma tesoura ou faca nacional ou alemã, o brasileiro
também se decidia pela estrangeira.
Mas este técnico alemão não só fez propaganda dos
produtos alemães. Ele também aplicou a sua técnica, o que
hoje chamamos em português castiço de "know-how". Seus
filhos e os que trabalharam com ele aprenderam e assim o
34
brasileiro foi se tornando capacitado a enfrentar a concor·
rência, até mesmo do alemão. Lembro-me da surpresa qÚe
teve o Dr. Manuel Eduardo Pinheiro Campos, diretor dos
Diários Associados do Ceará, quando quis comprar uma
tesourinha alemã, na cidade de Colônia. No Karstadt, uma
das maiores cadeias de lojas de departamentos da República
Federal da Alemanha, pediu o objeto que desejava e recebeu uma tesourinha de marca brasileira.
O imigrante alemão popularizou as máquinas alemães
e com isto facilitou os investimentos e a implantação de
indústrias alemãs no Brasil. A existência de um mercado
receptivo incentivou ou motivou a decisão de tais empresas.
Hoje a própria imprensa alemã reconhece, por exemplo,
que o Volkswagen mais bonito do mundo é fabricado no
Brasil. Ainda há técnicos alemães metidos na empreitada,
mas é inegável e até predominante a existência dos técnicos
brasileiros.
Confesso que não sou muito amigo de estatísticas, mas
na hora de se falar em exportações e importações e de seu
incremento, os dados estatísticos são inevitáveis. Busquei
as cifras do Departamento Federal de Estatísticas Alemão,
em Wiesbaden, pois elas espelham mais fielmente o volume
dos negócios entre o Brasil e a República Federal da Alemanha. Acontece que nas estatísticas brasileiras toma-se
como país comprador aquele em cujo porto deu entrada um
produto exportado pelo Brasil. Assim é que o grande número de importações alemãs de produtos brasileiros que
entram pelo porto de Roterdã surge nas estatísticas verdeamarelas como exportações para a Holanda. Desta maneira,
35
em nossas estatísticas a Holanda aparece quase em pé de
igualdade com a República Federal da Alemanha, como parceiro comercial do Brasil, o que não é verdade.
Claro está que não pretendo apresentar uma retrospectiva das nossas importações e exportações a partir do ano
de 1824,, ano de início da colonização alemã. Acho que são
suficientes os resultados obtidos nos últimos três anos,
mesmo porque a mentalidade de exportação só ultimamente
é que conseguiu se impor no Brasil, mormente em 1973
que foi declarado o ano da exportação e no qual se conseguiu levar à Europa, à Brasil Export em Bruxelas, 480
empresas dispostas a vender para o exterior e não só dispostas, mas também em condições de fazer negócio com os
europeus.
Para facilitar os números, o Departamento Federal de
Estatísticas de Wiesbaden apresenta as cifras em milhões de
dólares.
EXPORTAÇÕES DO BRASIL PARA
IMPORTAÇÕES DO BRASIL
A RFA
DA RFA
1971319,510
1972446,359
1973 até setembro 556,573
419,654
573,976
551,289
Verifica-se uma expansão das exportações brasileiras,
sendo que apenas nos nove prímeiros meses do ano passado
as nossas exportações já haviam superado em mais de
llO milhões de dólares os nossos negócios de exportação
com a República Federal da Alemanha em 1972.
36
Por outro lado, conseguíamos fugir do deficit constante em nossa balança comercial com os alemães ocidentais.
As nossas importações eram um pouco n1enores do que no
ano anterior, mas devem ter batido novamente o recorde,
até o fim do ano. Isto porque em pleno processo de industrialização continuamos importando grande quantidade de
máquinas.
.
Chegamos aqui ao núcleo da questão: o que o Brasil
compra da Alemanha e o que vende para ela?
Dos 551,289 milhões de dólares de importações brasileiras procedentes da República Federal da Alemanha, nos
primeiros nove meses do ano passado, 504,636 recaíram
sobre os manufaturados. Destes, 222 milhões, em números
redondos, se prenderam à importação de máquinas, 62,3 de
eletrotécnicos e 50 milhões de produtos químicos. As máquinas perfazem, portanto, quase que lJletade das nossas
importações da Alemanha Ocidental.
Como curiosidade, vale mencionar que apesar do elevado grau de desenvolvímento da nossa indústria automobilística, da beleza, luxo e qualidade dos nossos melhores
modelos, ainda gastamos 21 milhões de dólares na importação de carros alemães, até fins de setembro do ano
passado. São os carros Porsche, BMW e Mercedes-Benz que
ainda continuam sendo cobiçados no Brasil, no ano em que
0 Puma começa a ser cobiçado e negociado na Alemanha.
No que tange à pauta das exportações brasileiras para
terras teutas observa-se algumas modificações importantís·
simas. O minério de ferro continua liderando a lista das
nossas exportações. Como a República Federal da Alemanha
37
depende de 94% de importação desta matéria prima, para
cobrir suas necessidades, o nosso minério de ferro tem um
futuro garantido. O segundo lugar não cabe mais ao café
e sim aos óleos vegetais e tortas oleaginosas. Não que o
alemão tenha deixado de tomar café, pois no consumo per
capita ch\lga aos 145 litros anu.ais. bebendo tanto café
quanto cerveja, situando-se em terceiro lugar no consumo
global, depois dos Estados Unidos e do Brasil. (Apenas a
título de ilustração, o maior consumidor "per capita" de
café é o sueco, que consome treze quilos de café por ano.)
Voltando ao nosso tema, não foi o café que caiu e sim a
soja que subiu de importância, levando os óleos vegetais e
as tortas oleaginosas para o segundo lugar, passando o café
para o terceiro.
!Entre os semi-manufaturados são os fios de algodão,
os compensados e placas de madeira que ocupam o primeiro
lugar das nossas exportações para a Alemanha Ocidental.
Quanto aos manufaturados, as roupas de algodão, artigos de madeira, máquinas e peças e componentes para automóveis são os nossos principais cavalos de batalha nos negócios com os alemães. Aqui vale a pena apontar novamente
para as estatísticas, pois elas revelam um avanço extraordinário. Convém ressaltar também que quanto aos manufaturados as estatísticas alemães apresentam cifras menores para
as nossas exportações destinadas à República Federal da
Alemanha, pois a classificação alemã dos manufaturados é
mais restrita, não considerando manufaturados os sucos de
frutas e conservas em lata, por exemplo.
38
Aqui estão os dados estatísticos alemães sobre as nossas
exportações de manufaturados para a República Federal da
Alemanha:
Em 1971Em 1972Até setembro de 1973 -
32,841 milhões de dólares
58,265
"
"
"
"
72,395
É mais do que expressivo o fato de havermos mais do
que dobrado as nossas exportações de manufaturados para
a Alemanha Ocidental. Os alemães, apesar do ou graças ao
Mercado Comum Europeu, o que é matéria discutível e con·
troversa, ouviram os justos reclamos e aspirações da indústria manufatureira do Brasil. O elemento germânico em
meio ao nosso povo deve ter contribuido para que o nosso
grito de "vamos exportar! " tenha encontrado ressonância
ua Alemanha.
A casualidade de justamente no ano comemorativo do
sesquicentenário da colonização alemã no Brasil ter sido
eleito presidente do país um descendente de imigrantes alemães, o General Ernesto Geisel, aumentará ainda mais o
interesse dos alemães pelo Brasil, aumentará a sua confiança
em nossos bons propósitos e facilitará ainda mais o inter·
câmbio comercial e em todos os demais setores.
A eleição do Presidente Geisel pode ser vista como
uma homenagem ao colonizador alemão, que com o suor
do seu rosto e seu espírito de organização e sacrifício ajudou a abrir o caminho para a grande arrancada do Brasil,
e como uma prova de que o imigrante alemão encontrou
39
a liberdade que procurava e acima de tudo uma nova e
verdadeira pátria para seus filhos e netos.
A semente plantada em 1824 vingou e ainda haverá
de dar muitos frutos, mormente no campo econômico, cujo
progresso é a base sólida para todo e qualquer desenvolvimento.
FRIEDENREICH, ALEMÃO BOM DE BOLA
NA ORGANIZAÇÃO DO ESPORTE OS ALEMÃES TIVERAM
PARTICIPAÇÃO DECISIVA
Quem foi que introduziu o futebol no Brasil?
Não pretendo afirmar que tenham sido os imigrantes
alemães. Provavelmente ninguém pode dizer com exatidão
quem foi que fez a nossa primeira bola de meia e disputou
a nossa primeira pelada. Não é de se duvidar, porém, que
alguns dos imigrantes tenham trazido consigo, em meio aos
poucos pertences, bolas de futebol e de outros jogos. Quanto
ao bolão e o tiro ao alvo, não resta dúvida que foram os
alemães que introduziram no Brasil, tal qual os clubes de
ginástica e associações de canto coral, hem como o "skat"
(jogo de baralho popularíssimo na Alemanha) e os bailes
públicos, com torneios de dança, eminentemente democráticos, congraçando patrões e empregados.
Do futebol, o que se pode dizer com certeza é que o
primeiro jogo internacional disputado no !Estado de Santa
Catarina foi o efetivado em 1910 entre as equipes do
"Turnverein Blumenau" (Associação de Ginástica de Blumenau) e do vaso de guerra alemão "Von der Tann'. O
que se pode dizer com certeza é que os alemães criaram
clubes, hoje tradicionais, de excelente organização e que
40
41
já forneceram excelentes craques ao futebol brasileiro. Para
exeplificar basta citar apenas dois nomes: o Coritiba Futbol Clube e Grêmio Porto-olegrense. O Coritiba é conhecido pelo apelido de "time coxa branca", por ter sido o
time dos alemães, e de "decano', por ser o clube mais antigo
do futebol ,paranaense. Agremiação tradicional é a que mais
títulos conquistou no Paraná. O Grêmio também é chamado
no Rio Grande do Sul de time dos alemães, embora hoje
seja tão eclético no que tange a raças e cores, quanto a
própria população gaucha. Dos alemães o Grêmio herdou
o amor pelo atletismo, tendo se sagrado várias vezes campeão brasileiro de atletismo.
Povo muito organizado, não faltou o dedo dos alemães
na organização do nosso esporte, seja fundando clubes, j o·
gando ou prestando apoio financeiro. Na hora de criar
ligas e federações, as iniciativas partiram ou contaram com
o auxílio maciço do elemento alemão. O senso de organi·
zação já está em seu sangue.
O fato de o esporte mais popular na Alemanha ser
também o mais popular do Brasil não deve ser apenas uma
mera coincidência. O torcedor alemão é tão fanático quanto
o brasileiro e é capaz de maiores sacrifícios, para auxiliar
o clube do seu coração, do que nós. Basta ver que não são
poucas as partidas de futebol jogadas sobre a neve, com
temperaturas abaixo de zero, e os paredros e a torcida lá
estão de cobertor sobre as pernas, nos estádios gelados,
gritando a todos os pulmões. Sabemos perfeitamente que o
alemão, na alegria da vitória, mete a mão no bolso e não
economiza ao premiar. Na hora da derrota, sofre mas não
42
esmorece e na hora de trabalhar, arregaça as mangas e só
para quando vê pronta a tarefa. Por isso é que se tem tantos
descendentes de alemães dirigindo organizações e clubes
esportivos brasileiros. Quando vi em Porto Alegre o "Gigante da Beira Rio fiquei estupefato. O estádio é propriedade do Internacional, o time do povo. E o povo nunca
tem dinheiro. Como é que o Colorado conseguiu realizar
esta obra?, perguntei a um amigo. "Foi fácil", disse-me
ele. "Elegemos um alemão para a presidência do clube."
O sonho do Internacional, de sair do Estádio dos Euca·
liptos e construir um novo maior do que o do Grêmio (o
time dos alemães), era velho. Um alemão, entretanto, conseguiu fazer com que o time do povo passasse o time dos
alemães para trás. Quem me disse isto foi um brasileiro
nacionalista, rôxo, digo colorado, pelo Internacional, que
deixa de comer para trabalhar por ele, chamado Júlio Trein.
Eu não havia nascido, por isso nunca vi jogar um tal
de Friedenreich. O nome é tipicamente alemão. A seu respeito chegaram a surgir lendas. Muito bom de bola, foi
centro-avante do Flamengo do Rio de Janeiro. - Jogador
do tempo do futebol amador, em que não havia televisão,
nem rádio nos campos de futebol, por melhor que fôsse não
chegava a ser um ídolo nacional, muito menos internacional.
Não se pode fazer comparações entre jogadores de épocas
diferentes. É impossível apontar qual o melhor goleiro que
o Brasil já teve. Pelé, evidentemente, é um caso a parte, é
um fenômeno. É o maior gênio que o futebol já teve. Mas
não se pode dizer que V avá tenha sido melhor do que
Leonidas ou que Rivelino tenha chute mais forte que Frie-
43
denreich. E aqui volto ao já lendário goleador da equipe
do Flamengo. - A respeito dele existe uma história ou
estória, não sei, pois não presenciei e já ouvi duas versões,
com início igual e epílogo diferente. A narrativa parece
drama de Nelson Rodrigues.
Decisão de campeonato, marcador de zero a zero, um
a um ou dois a dois, tanto faz, pois o importante é que o
seu time precisava ganhar, para se sagrar campeão. Um
minuto para terminar o encontro e penalidade máxima a
favor da sua equipe. Alguém bobeou e pegou a bola com
a mão, dentro da área, ainda que não estivesse jogando
no gol, ou agarrou um atacante contrário pela camisa ou
pelo calção, que naquela época ia até os joelhos. Não foi
dito à posteridade se o penalti existiu de fato, talvez porque
o Mário Viana ainda não era comentarista, e se a torcida
vaiou a decisão do árbitro e invadiu o campo. O que se
sabe é que Friedenreich, alemão bom de bola, foi encarregado de cobrar. O seu chute era mais forte do que canhão
da Krupp. Entra aqui a diferença das duas versões. Numa
o goleiro adversário era irmão do artilheiro, na outra não.
Fiquemos com a segunda que é mais aceitável. O guardaredes era um portenho e havia fechado o gol. O loirão foi
lá, ajeitou a redonda (duvido que fôsse redonda, pois só
havia daquelas bolas sem válvula e de tento) e admoestou
o "keeper": "É melhor você sair do arco, pois vou encher
o pé! " O rapaz não quis ouvir o conselho e ficou prepa·
rado como um felino, para o bote. Friedenreich mandou o
seu torpedo no canto, o goleiro voou, agarru firme no peito
e caiu. Dali não levantou mais, pois caiu morto. A violência
44
do tiro foi tamanha que matou o arqueiro. O Flamengo
perdeu o campeonato, o outro time, parece que era o Bangu,
perdeu seu goleiro, e o craque perdeu o primeiro e único
penal ti em sua carreira, na qual marcou l. 329 gols.
Lenda ou não, o sangue germânico levado pelos colonizadores para São Leopoldo, Três Forquilhas, São Pedro
de Alcântara, Vargem Grande, Blumenau e outras colônias,
disseminou-se pelo Brasil a fora e corre hoje nas veias do
nosso esporte. E é alvissareiro e motivo de orgulho para nós
brasileiros o fato de que hoje o Grêmio de Porto Alegee
(o time dos alemães) tem mais pretos em sua equipe do
que o Internacional (o time dos brasileiros) . Nos clubes
esportivos temos talvez o melhor exemplo da integração das
raças no Brasil. No Paraná, quando o "time coxa branca"
levanta um campeonato, já é tradição um autêntico carnaval e um préstito pela Rua 15 de Novembro, no qual brasileiros brancos, negros e amarelos carregam os craques alvinegros na cor da pele e das camisas até a Schaeffer, onde o
"chopp" aumenta a alegria da festa.
Poderia me alongar, falando de outros esportes, como
o tênis, o iatismo, o remo, o basquetebol, o vôlei etc., pois
em todos vamos encontrar nomes expressivos e que revelam
descendência germânica. São os ases do esporte brasileiro,
cujos pais ou avós deixaram a Alemanha em busca da liberdade e de uma vida melhor.
45
O TURISMO É PARA MATAR A SAUDADE?
O QUE LEVA HOJE O TURISTA ALEMÃO AO BRASIL?
É evidente que aquele punhado de gente que iniciou
a colonização alemã no Brasil não deu início a uma cor·
rente turística. Em 1824 a palavra turismo ainda estava
para ser inventada. O turismo em massa só surgiu depois
que algumas nações ocidentais se industrializaram e alcan·
çaram um padrão de vida que possibilitou aos seus habitantes o luxo de poderem viajar para o exterior e para lugares mais distantes, a cada ano que passa. O colonizador
alemão não tinha condições financeiras para fazer turismo,
o mesmo podendo-se dizer a respeito dos seus parentes que
ficaram. O muito que o emigrado da Alemanha podia fazer
era atrair novos emigrantes. De qualquer maneira, ele se
tornou uma semente que germinou lentamente e que agora
começa a florescer.
Lá pelos idos de 1824 faltava até mesmo a infra-estru·
tura dos transportes e sair da Europa para ir a um país
como o Brasil, inteiramente desconhecido, só por extrema
necessidade ou por indomável espírito de aventura. Mas os
imigrantes alemães auxiliaram, involuntariamente, a criar a
infra-estrutura dos transportes, imprescindível para o desenvolvimento e acima de tudo para o início do turismo.
46
Suas cartas, suas encomendas precisavam ser transportadas
regularmente. Assim surgiu a idéia das linhas marítimas
regulares, entre os portos alemães e os brasileiros.
O balão dirigível inventado pelo Conde Ferdinand von
Zeppelin esteve no Brasil e foi recebido apoteoticamente. Sua
viagem talvez possa ser vista como a primeira tentativa de
levar grupos de turistas para terras de além-mar, através
dos ares. O sucesso foi tamanho que o balão dirigível ficou
sendo conhecido no Brasil pelo nome de zepelim.
Mais tarde era o hidroavião construido por Claudius
Dornier que ia fazer furor, estabelecendo uma linha aérea
que levava ao Brasil. A população do Recife exultava quando
o Do-24 pousava trazendo cartas e novidades do Velho
Mundo.
Depois da última guerra mundial, quando a Lufthansa
começou a ensaiar os seus primeiros vôos internacionais, a
rota Frankfurt-Rio foi logo incluída.
A existência de colônias alemãs e dos descendentes de
alemães no Brasil deve ter influído decisivamente para que
tal acontecesse. Veleiros, vapores, navios com motores diesel;
balão dirigível, hidroaviões e aviões a jato. A infra-estrutura
do transporte estava criada. O milagre econômico alemão
deu ao povo teuto a possibilidade de fazer turismo. Emigrantes que retornaram, filhos e netos de emigrantes que
retornaram e parentes dos que foram e se radicaram, começaram a sentir o desejo de ver o Brasil, sua gente, seu
folclore, suas frutas, seus rios e suas matas.
O preço das passagens, contudo, ainda eram elevados,
nos aviões das linhas regulares. Por outro lado, a infra-
47
estrutura turística brasileira deixava muito a desejar. Faltavam hotéis, faltavam guias, faltavam programas e acima
de tudo faltava a divulgação das atrações turísticas, além
da beleza natural. Quando se falava em turismo no Brasil,
era exclusivamente do turismo no Rio de Janeiro. Para
arrecadar divisas, porém, a cidade maravilhosa só tinha o
Cassino da Urca. O resto era tudo de graça: Sol, mar e
montanhas. Aí foi fechado o cassino, com a proibição dos
jogos de azar, e já se foi uma grande fonte de rendas.
Os vôos fretados surgiram, reduzindo os preços. O turista hoje pode ir e voltar pela mesma importância anteriormente paga apenas pela ida. Além disso já tem incluído
no preço da viagem o hotel e o café da manhã. Uma das
pioneiras neste campo foi a Schwaben Internacional, uma
sociedade que foi criada inicialmente para estabelecer um
contato entre a Alemanha e os emigrantes da Suábia e que
hoje serve aos alemães e aos seus amigos no mundo, conforme o seu "slogan".
O impulso proporcionado pelos vôos fretados foi complementado pelo incentivo do governo brasileiro às promo-ções turísticas e à criação de uma infra-estrutura turística
capaz de atender aos anseios e reclamos do turista estrangeiro, mormente do europeu e particularmente do alemão.
O Brasil criou as condições indispensáveis para a exploração de outras áreas.
Desde a descrição das belezas amazônicas feitas por
Alexander von Humboldt, que por sinal não esteve no Brasil, a idéia de ver de perto o Inferno Verde está muito
disseminada em terras germânicas. A construção de Tran-
48
samazomca provocou muitas críticas e discussões, filmes
documentários, reportagens fotográficas e comentários, reavivando um velho interesse. Uma jovem alemã perguntoume outro dia quando é que se poderá transitar pela Transamazônica, de ponta a ponta. Quando a estrada estiver
inteiramente pronta, ela quer viajar para o Brasil, alugar
um "jeep" e correr a estrada do futuro. E ela não é a única.
Salvador, a primeira capital do Brasil e a última cidade genuinamente brasileira, também é uma alegria para
os olhos e o coração dos alemães. Salvador e a Bahia! O
t;hefe da seção brasileira da Deutsche W elle, Werner Franke,
revelou-me que, no dia em que aposentar, deixará Colônia
e tomará o rumo de Ilhéus, por cuja paisagem se apaixonou.
P ernambuco está mais próximo da Alemanha do que
Santa Catarina e o Rio Grande do Sul. Pernambuco tem
aquilo que os alemães adoram e na Europa só encontram
em parte: Sol ardente e praias ermas e tranquilas.
Amazônia, Pernambuco e Bahia entram este ano na
agenda de viagens de uma empresa de turismo alemã, da
Terramar. No ano em que se comemora o sesquicentenário
da colonização alemã no sul do Brasil, os alemães vão
descobrir o nordeste. De duas em duas semanas a Terramar
vai mandar um avião da Varig lotado de turistas, de Frankfurt para o Recife. Da nossa Veneza, os aviões da Cruzeiro
do Sul oferecerão o transporte para Manaus e Salvador. Estiradas para outras capitais também serão possíveis.
Conversando com o diretor-gerente da Terramar, Sr. Peter Runge; em Frankfurt, este me disse que, segundo os
49
cálculos da empresa, dentro de mais um ano haverá infraestrutura para vôos fretados semanais, na temporada de férias. Aí poderá ser dobrado o número de turistas que ela
levará ao nordeste e que será de 2. 000 este ano.
A Neckermann, empresa de vendas por catálogo e uma
das maiores organizações de viagens do mundo, também
está trazendo turistas ao Brasil, num sistema combinado
avião-navio. O cavalo de batalha da Neckermann é o Carnaval no Rio e as Cataratas do Iguaçu. O número de interessados cresce de ano para ano.
Outras grandes empresas, como a Scharnow, a Touropa
e outras, também vem contribuindo para o incremento do
turismo alemão no Brasil. No início elas faziam concorrência entre si e tinham dificuldades em manter todos os vôos
programados. Aí resolveram fazer um "pool", vendendo
todas passagens para os mesmos vôos e o bom resultado
não se fez esperar.
A Schwaben Internacional, que normalmente voa para
o Rio e São Paulo, este ano programou uma viagem a Porto
Alegre, para os festejos dos 150 anos da colonização alemã.
Além de turistas ela pretende levar bandas de música e corais, a fim de ajudar a aumentar o brilhantismo da festa.
Em entrevista que me concedeu em Stuttgart, o presidente
da entidade, Herbert Dorr, declarou que a maior publicidade turística do Brasil na Alemanha é o próprio turista.
Cada um que vai arrigementa mais dois ou três, pois volta
fascinado com a beleza do país, maravilhado com a hospitalidade do povo e encantado com o rápido e vertiginoso
desenvolvimento brasileiro.
50
O turismo serve ao entendimento entre os povos. Como
alemães e brasileiros sempre se entenderam bem, é de se
esperar que o turismo em massa em direção ao Brasil aprofunde ainda mais a amizade já existente e iniciada há 150
anos atrás, quando o Brasil se tornou a nova pátria dos
primeiros imigrante alemães.
51
A ALEMANHA TA'MBÉM CRESCEU
AS CIDADES DE IDAR-OBERSTEIN, BRAUNSCHWEIG, HAMBURGO
E BREMEN COMO ERAM ONTEM E COMO SÃO HOJE
O título parece descabido, pois sugere a idéia de uma
importância secundária para a nação alemã. Talvez o título "as cidades alemães também cresceram" fosse mais
apropriado. Entretanto não se deve esquecer que a industrialização teve início na Alemanha a partir de 1860. Com
a industrialização a Alemanha cresceu verdadeiramente. Par11
encerrar este trabalho sobre a colonização alemã no Brasil
Jecidi retratar quatro cidades que tem laços especiais com
o nosso país. Quero transmitir uma idéia do que eram lá
pelos idos de 1824, quando seus filhos começaram a emigrar para o Brasil, e do que são hoje. Vou começar por
Idar-Oberstein.
Idar-Oberstein
Até 1933 eram duas cidades: Idar e Oberstein. Entre
ambas existia uma rivalidade, a qual não se extinguiu com
a união forçada. Incrustada num verde vale da região de
Hunsrück, a cidade das pedras preciosas tem raízes profundas no Brasil. Quando as primeiras levas de colonos ale-
52
mães partiram para o Brasil, Idar e Oberstein não passavam
de aldeias. A primeira tinha cerca de 900 habitantes e a
segunda I. 000. O começo da lapidação de pedras ficou perdido na poeira do tempo. Há lendas e há até os que afirmam
que foram os romanos que introduziram a arte na localidade. O forte da economia era a agricultura. A lapidação
de pedras era ocupação de inverno. Na relação dos primeiros alemães que tomaram o rumo do Brasil já se encontra
lapidadores de pedras. Não resta a menor dúvida, filhos de
ldar ou de Oberstein. As minas de ágata do Rio Grande do
Sul foram descobertas por imigrantes oriundos de IdarOberstein. Quase todos os seus moradores tem parentes no
Brasil e é enorme a quantidade de pedras brasileiras lapidadas na cidade alemã, que se intitula o centro europeu das
pedras preciosas. Alguns que retornaram à Alemanha levaram consigo o prazer pelo churrasco. O costume se propagou e hoje Idar-Oberstein é a única cidade alemã onde se
pode comer um churrasco à moda brasileira. Há a Churrascaria do Augusto, que tem cartões postais e fama tradicional, as famílias costumam fazer piqueniques e comer
churrasco no espeto, ter uma grelha, uma churrasqueira no
quintal é algo obrigatório e não se pode imaginar uma festa
de igreja ou um festival sem um bom churrasco. O prato
"nacional'' de Idar-Oberstein também é fruto da colonização alemã no Brasil.
Hoje a cidade tem 40.400 habitantes. A agricultura
passou para o plano secundário e a lapidação de pedras
tornou-se a atividade principal. Um de cada quatro habitantes vive da lapidação de pedras. Das antigas lapidaçõel'
53
com roda d'água só é conservada uma em funcionamento,
como atração turística. O primeiro arranha-céu foi cons·
truido para abrigar a primeira bolsa de pedras preciosas do
mundo. Inauguração oficial desta bolsa no dia 20 de março
de 1974. Esta bolsa de pedras preciosas não só {de grande
importânciá para ldar-Oberstein e para suas relações com
o Brasil. No museu de pedras preciosas e semi-preciosas de
ldar-Oberstein, o nome do nosso país é o que mais desponta. A pedra mais pesada é uma água-marinha, "verde·
amarela", de 112 quilos.
Meu cicerone em ldar-Oberstein foi o Sr. Gerhard
Becker, um homem que conhece todo mundo na cidade e
que conhece muito bem o Brasil. É lapidador por tradição
de família. Desde 1599 os Becker tem sido ininterrupta·
mente lapidadores. Uns parentes emigaram para o Rio
Grande do Sul. Gerhard Becker mostrou-me a sua coleção
de pedras raras, um tesouro para a gemologia, e as recor·
dações de viagens pelo Brasil, inclusive um chapéu de couro,
velho e amassado, que fez questão de contar que arrematou
da cabeça do "caboclo".
Como cidade das pedras preciosas, ldar-Oberstein tor·
110u-se atração turística para gente bem. Os grupos de ame·
ricanos são enormes e diários. Da Europ~ Ocidental os maio·
res amigos da cidade são os holandeses. Agora, em virtude
do preço da gasolina, ldar-Oberstein espera atrair também
os turistas alemães, que já não terão mais tanta vontade
de ir ao encontro do Sol, na Espanha e Itália. Sua propa·
ganda: ar puro, rio não poluído no qual se pode pescar,
54
p1scma, quadras de tênis, aero-clube, equitação, ambiente
romântico e boa comida.
Os oficiais do exército alemão conhecem ldar-Obers·
tein muito bem. A escola de oficiais está sediada na cidade
tj todos tem de passar por ela. Aliás, devo corrigir, todo!~
os oficiais de artilharia. Trata-se da Escola de Artilharia do
Exército. Mas não é só a farda do exército alemão que se
vê em ldar-Oberstein. As tropas norte-americanas acantonadas na Alemanha tem na cidade o seu maior depósito de
reabastecimento. Não devem ser poucos os lapidadores que
acabam se tornando sogros de militares. E por falar em
casamentos, contaram-me que a rivalidade entre ldar e
Oberstein, até a I Guerra Mundial, era tamanha que muito
dificilmente um rapaz de I dar casava com uma jovem de
Oberstein e vice-versa.
A indústria local não se restringiu às jóias finas. Hoje
fabrica também jóias fantasia e outras com os restos, muitas
vezes colados, de pedras de valor. Um ramo muito próspero
é 0 da lapidação de diamantes para fins industriais e as
agulhas para toca-discos são enviadas para o mundo inteiro.
Idar-Oberstein é uma cidade da Renânia-Palatinado.
Ela se encontra na garganta de um vale, pelo qual passa
a Estrada Federal41, que leva de Mainz (Mogúncia) a Trier
(Trévis) e Saarbrücken. Sua posição geográfica, por sinal,
é 0 seu maior problema. A cidade é pequena mas não con·
segue escapar dos engarraf amentos nas. h oras de " rush" e
nos dias ensolarados de fim de semana, quando o trânsito
se agiganta.
55
O município é governado por um Supremo-Burgomestre e três Burgomestres. O sistema administrativo é bem
diferente do nosso. Na Alemanha a administração municipal varia de cidade para cidade, de região para região. Em
conversa com os homens de mando de ldar-Oberstein, estes
me informaram que a cidade mineira de Teófilo Otoni, que
também foi colonizada por alemães, tem buscado contato
com ldar-Oberstein. Eles apreciariam muito mais, porém,
tllla parceria com uma cidade do sul, que tenha realmente
uma ligação direta com a sua comuna. Manifestaram também o desejo de participar dos festejos comemorativos do
sesquicentenário da colonização alemã no Brasil.
Braunschweig
Na língua portuguêsa conhecemos a cidade de Braunschweig com o nome de Brunsvique. Até a Idade Média ela
tinha de fato este nome. Foi um erro em documento oficial,
como os que ocorrem nos registros de nascimento, que
mudou o nome da cidade. Por que a escolhi? Qual o elo
que a liga ao Brasil? A minha escolha foi motivada pelo
fato de haver nascido e morrido nela um colonizador alemão e fundador de uma cidade que trago em meu coração,
o Dr. Blumenau. Braunschweig tinha 32.945 habitantes, no
recenseamento de 1822, dois anos antes da chegada dos primeiros colonizadores às terras gauchas. No ano de 1849,
um ano antes da fundação de Blumenau, Braunschweig
tinha 39. 011 habitantes. Ac idade era fortificada e seu so·
berano era o Duque Carlos 11, quando começou a corrente
56
migratória para o Brasil. Em 1830 ocorreu uma revolução
e 0 duque fugiu para a Suíça, levando todo o seu tesouro.
Morreu em Genebra, fazendo da cidade sua herdeira, pelo
que recebeu um monumento equestre, sobre uma cúpula.
O teatro já era uma atração, tendo sido construido em 1690.
Nele foi feita a apresentação estréia de Fausto, de Goethe,
no dia 19 de janeiro de 1829. O Colégio Carolina, fundado
em 1745, já tinha tradição. A Feira de Braunsc}lweig era
um acontecimento, em pé de igutldade com Frankfurt e
Leipzig. A primeira estrada de ferro alemã foi construída
em 1838, a partir de Braunschweig, até o Harz. Em 1824
Braunschweig já era uma cidade.
Paulatinamente Braunschweig foi sendo superada por
Hanôver. Hoje já. não pode mais competir com ela, apesar
de ser também uma cidade industrial importante, com
250. 000 habitantes. A 11 Guerra Mundial foi um golpe violento e que mais do que sustou a marcha do desenvolvimento da cidade. O seu centro foi praticamente destruido
(90 % arrasados). A população de Braunschweig caiu de
214.000 habitantes em 1939 para 136.000 em 1945. A cidade está situada a apenas 35 quilômetros da linha de
demarcação entre as duas partes da Alemanha. Seu cognome
de ilha da tradição é bastante justo. As maiores atrações
da Braunschweig hodierna são legados históricos e tradicionais. A maior parte remonta ao tempo de Henrique o
Leão, que residia na cidade e tem sua sepultura na catedral, a qual fez construir de 1173 a 1195. O Leão de
Braunschweig é considerado a mais antiga obra plástica ao
ar livre, do Ocidente. Foi fundido em bronze, em 1166 e
57
tinha por fim mostrar o poder e justiça do rei famoso e
lendário. A Igreja de Santa Catarina, construída por volta
do ano 1200, é outra obra de arte. O prédio da antiga
prefeitura é um dos mais belos monumentos medievais. O
púlpito de alabastro da lgrej a de São Martinho, criado em
1621, também merece menção. Os cinco museus da cidade
também estão ligados ao seu cognome de ilha da tradição,
tal qual a biblioteca e o arquivo municipal.
Lessing viveu em Braunschweig e sua peça "Emília
Galotti" foi estreiada em 1772, no teatro já mencionado.
Em 1853 foi colocada em praça pública uma estátua do
grande dramaturgo e que também é ponto de visita obri·
gatória dos turistas interessados pela cultura.
Da Braunschweig moderna pode-se citar o Pavilhão
Municipal, centro de congressos, conferências, concertos e
exposições especializadas e o Instituto de Pesquisas Aéreas
e Espaciais, órgão mantido pelo governo federal alemão.
No campo do ensino Braunschweig abriga a Universidade Técnica, uma Escola Superior de Pedagogia, uma Escola Superior de Artes Plásticas, um Instituto Federal de
Biologia para a Agricultura e Florestamento e um instituto
de Pesquisa da Agricultura.
A indústria local é bastante diversificada, destacandose a produção de veículos pesados, moinhos, fábricas de
açúcar, computadores eletrônicos, técnica de teletipagem e
sinais ferroviários, aparelhos opticos, instalações para lojas,
extintores de incêndio, pianos, meios de embalagem de toda
espécie, equipamentos esportivos e máquinas para a conserva
de frutas e legumes.
58
É grande o número de hotéis e restaurantes, alguns
destes instalados em casas mais antigas do que o Brasil.
O visitante que pretende comer algo típico e delicioso de
Braunschweig deve experimentar os aspargos.
Uma das ruas da cidade tem o nome do seu filho que
fundou uma cidade num outro continente: Dr. Hermann
Bruno Otto Blumenau. Ele passou a infância e a velhice em
Braunschweig, tendo sido sepultado no cemitério central da
mesma. Agora, 75 anos após a sua morte, a cidade que
fundou pretende transladar para o seu solo os restos mortais
do colonizador.
Hamburgo
A grande metrópole portuária alemã teria forçosamente
que entrar na história da colonização germânica em terra~
tupiniquins. Para a maior parte dos alemães que emigraram
para o Brasil, Hamburgo foi o último pedaço de chão da
terra em que nasceram, no qual tiveram a alegria e a tristeza de assentar os pés.
Hamburgo em 1824 já era uma cidade grande. No recenseamento feito em 1846 foram contados em Hamburgo
145.100 habitantes, 119.200 dos quais no quadro urbano.
Exatamente na primavera européia de 1824 foi inaugurado
o serviço de carruagem inglêsa entre Hamburgo e Altona.
Neste mesmo ano era editado em Altona o livro "O Brasil
como Império Independente no sentido histórico, mercantilista e político". 464 páginas de elogio ao Brasil. Seu
autor 0 Major Georg Anton von Schaffer, uma figura con-
59
troversa e que está sendo objeto de pesquisas do historiador
Carlos Oberacker Jr. Filho de um fabricante de bebidas
alemão, esteve na Rússia desempenhando as funções de mé·
clico da polícia em Moscou e correu o mundo a bordo do
navio "Suwaroff", com o qual chegou ao Brasil no dia 3
de maio de 1814. Permaneceu 4 semanas em terras brasi·
!eiras. Em abril de 1818 regressava ao Rio a bordo do navio
Luconia, um navio português. Na oportunidade conheceu a
Princesa Leopoldina. Sua terceira viagem ao Brasil foi em
1821. Dona Leopoldina engajou·o para seus serviços particulares. Dom João VI doou·lhe um pedaço de terra na
Bahia. Viajou um ano pelo Brasil. Voltou ao Rio em meados de 1822 e o Príncipe Regente nomeou-o major da !:lUa
guarda de honra e concedeu.Ihe o título de Cavaleiro da
Ordem de Cristo. No dia 1. 0 de setembro de 1822 6 dias
antes do Grito do Ipiranga, partiu para a Europa 'a bordo
do navio francês Etienne. 95 dias depois aportou em Le
Havre, levando a missão de ir saudar o soaro de Dom Pedro
o
'
') Imperador Francisco I da Áustria, e de promover a vinda
de imigrantes. Em dezembro de 1823 o Major von Schãffer
se estabeleceu em Hamburgo. Ele foi o primeiro representante oficiahnente credenciado de um país latino-americano,
na Liga Hanseática. Livros, documentos e cartas da época
criticam severamente o major "brasileiro", pelo fato de fazer
promessas fabulosas e de ter recrutado soldados para o ba.
talhão estrangeiro de Dom Pedro I, contrariando as leis
prussianas que proibiam a emigração para fins militares.
A verdade, porém, é que ele conseguiu canalizar para o
Brasil a corrente migratória alemã. O pai espiritual da co-
60
Ionização alemã no Brasil foi o seu amigo e protetor, o
Barão Georg von Langsdorff, médico e botânico alemão
que foi cônsul geral russo no Rio de Janeiro e que publicou
em 1821, em Heidelberg, o primeiro livro sobre o Brasil,
para os alemães que buscavam a emigração: "Observações
sobre o Brasil".
O primeiro grupo de colonizadores era destinado à
Bahia, para as terras do Major von Schãffer. Nelas fora
criada a Colônia Frankental (mais tarde Colônia Leopol·
dina), colonizada por escravos e dirigida por um outro
alemão, sócio do Major. Talvez por causa do clima, este
grupo foi levado para Nova Friburgo, onde chegou a
3-5-1824. Foi um grupo de 342 imigrantes. Nova Friburgo
nasceu de um acordo do Governo do Rei Dom João VI
com a Suíça (2-5-1818).
Em 1824, dos 250 navios transatlânticos da Liga Hanseática (Hamburgo, Bremen e Lübeck) apenas 15 veleiros
tocaram o porto do Rio de Janeiro. Navios ingleses foram
243, norte-americanos 120, escandinavos 49, franceses 32,
holandeses 20, portuguêses lO e de outros países 12.
Foi pelo porto de Hamburgo que saiu o maior número
de alemães que emigraram para o Brasil. No arquivo da
cidade-estado encontra-se o recorte de uma carta publicada
por um j ornai hamburguês e escrita no dia 6 de setembro
de 1857. Seu autor um imigrante de nome Friedrich Müller.
A carta foi escrita na Colônia de Blumenau. O seu texto:
"Eu vivo aqui livre e contente e tenho apenas um único
J esej o, que meus irmãos e irmãs queiram verdadeiramente
logo me seguir; aqui eu sou um homem livre, aí era um
61
criado e escravo, que tinha de se arrebentar por outras pessoas." O testemunho de um dos que encontrou a liberdade.
Hamburgo hoje é uma metrópole moderna e ainda mais
cosmopolita. Na República Federal da Alemanha é a urbe
que tem a presença brasileira de forma mais acentuada.
Basta dizer que temos em Hamburgo um consulado geral,
uma filial do Banco do Brasil, o escritório do Instituto Brasileiro do Café e uma agência do Lloyd Brasileiro.
Com seus 1,8 milhão de habitantes, Hamburgo é a segunda cidade da Alemanha. Com seu transbordo anual de 46
milhões de toneladas de mercadorias é o maior porto alemão. Quanto à importiincia como cidade industrial, Hamburgo também só é superada por Berlim Ocidental.
'Ela possui 500 hotéis e pensões, tendo mais de 16. 000
leitos à disposição dos turistas e homens de negócios que
a visitam. Sua maior atração turística é por certo o bairro
boêmio de St. Pauli, com a famosa Reeperbahn.
Depois da última grande guerra a cidade livre e hanseática se tornou o centro da imprensa alemã. São de 8 a
9 milhões de exemplares de jornais diários e semanais e
28 milhões de exemplares de revistas. A NDR, estação de
rádio e televisão, conta com os estúdios mais modernos e
o noticiário da televisão alemã é transmitido de Hamburgo.
A Feira de Hamburgo tem 13 grandes pavilhões, com
uma área coberta de 52. 500 metros quadrados. O seu novo
Centro de Congressos oferece espaço e técnica para todo e
qualquer tipo de promoção. A maior de suas 17 salas pode
abrigar até 3. 000 pessoas.
62
Hamburgo tem 15 teatros, com o que pode se considerar uma cidade de elevado nível cultural. Em sua universidade estão matriculados 25. 000 estudantes e não são
poucos os institutos de ensino e de pesquisas nela sediados.
Um dos mais importantes é o instituto de pesquisas das
doenças tropicais.
Museus há de todas as espécies. São exatamente 20,
destacando-se o museu histórico, o de etnologia e o do correio. Nas 80 galerias de artes da cidade pode-se encontrar
obras de todas as escolas, estilos e preços.
O jardim zoológico de Hamburgo - Hagenbeck comemorou 125 anos de existência, em 1973. O zoo é propriedade particular, sendo dirigido pelo bisneto de Carl
Hagenbeck, o criador. O sensacional deste jardim zoológico
é que os animais vivem à solta. Não há grades e sim apenas
valas, que separam os visitantes dos animais selvagens.
Cerca de 2. 500 animais vivem nos 25 hectares, entre árvores
frondosas, lagos artificiais e campos gramados.
Para os automobilistas, Hamburgo não apresenta o problema da falta de locais para estacionamento. Apenas no
centro da cidade já há garagens com espaço para cerca de
8. 000 veículos. Dois edifícios construidos especialmente para
este fim oferecem lugar para 1. 000 carros, cada um.
Graças à remodelação do seu estádio municipal, Hamburgo tornou-se sede de jogos da Copa do Mundo de 74
e o privilégio de presenciar o primeiro encontro das duas
seleções de futebol alemãs. Para os apreciadores do hipismo e do turfe, Hamburgo é um nome que está sempre
na agenda. O Derby Alemão é uma corrida renomada e o
63
Grande Prêmio Hípico de Hamburgo é um acontecimento
de vulto.
Em matéria de restaurantes, Hamburgo pode competir
internacionalmente, com sua cozinha internacional. Seja co·
rnida francesa, italiana, chinesa, iugoslava ou indonésia,
Hambu:r:go tem. Não falta nem mesmo um restaurante brasileiro. No Restaurante Brasília, em Poseldorf, o bairro chie
e snob de Hamburgo, a gente se sente em casa, até a hora
em que se recebe a conta. Uma caipirinha custa 4 marcos
(uns lO cruzeiros) e uma feijoada completa para 4 pessoas
custa 82 marcos (é melhor nem fazer a conversão) .
O que o Cristo do Corcovado é para o Rio de Janeiro
é a Igreja de São Miguel para Hamburgo. Foi construída
de 1751 a 1762, em estilo barroco, e sua torre de 132 metros
de altura domina o panorama.
Hamburgo faz jus ao seu "slogan": a porta para o
mundo!
Bremen
Bremen também foi lugar de adeus à pátria para muitos
alemães que vieram para o Brasil. No princípio a emigração era canalizada quase que exclusivamente para os Estados Unidos, até que em 1826 surgiu em Bremen o discutido
Major von Schaffer. Ele nomeou o comerciante Ludwig
Friedrich Kalkmann vice-cônsul do Brasil e encarregou-o
de abrir um escritório de emigração, pagando melhores fretes
aos armadores. Assim é que no dia 1. 0 de junho de 1826
zarpava de Bremen o primeiro navio a sair daquele porto
64
com colonizadores alemães, rumo ao Brasil. O que era
Bremen naquela época?
Bremen é uma cidade antiquíssima, já tendo sido citada pelo geógrafo Cláudio Ptolomeu. Carlos Margno elevou-a a bispado no ano de 788. Sua catedral foi construída
em 1043. Em 1044 foi colocada na praça central da cidade
a estátua gigante de Rolando, sobrinho de Carlos Magno,
cavaleiro destemido, como símbolo da independência de
Bremen. A prefeitura foi construída em 1405. Em 1823 foi
feito um recenseamento. Bremen tinha 40. 647 habitantes.
A iluminação à gás nas ruas foi introduzida na parte velha
da cidade em 1794/94. Em 1812 foi estendida ao resto da
cidade. Durante 10 meses as ruas eram iluminadas. Em
junho e julho, meses de verão, nos quais o sol não se opõe
antes das 22 horas, os lampiões permaneciam apagados.
Nos anos de 1826 a 1828 de 3 a 4.000 alemães devem ter
imigrado para o Brasil, através de Bremen. No arquivo da
cidade encontra-se um exemplar de um livro sobre Bremen,
escrito por um Dr. Heineken e editado em 1836. A publicação é interessante e retrata a Bremen de então. Em fins
de 1835, por exemplo. tinha 31 médicos, 5 farmácias, 1 hos·
pital, 1 orfanato, 1 casa para as viúvas e 1 casa para os
homens velhos e sós. O mencionado autor contou 5. 798
casas e 1. 832 ruas e b.ecos em Bremen, no ano de 1836.
Já era, portanto, uma cidade bastante organizada.
Interessante é que Bremen queria fomentar a emigração para 0 Brasil, pois via nela uma base para o aumento
do comércio. Os colonizadores iriam querer comprar coisas
65
l
da Alemanha e incrementariam os negócios. Bremen impor·
tava mais do que exportava para o Brasil. Como se sucediam
as críticas e queixas contra o Major von Schiiffer, que provocara em algumas regiões uma verdadeira febre da emigração, Bremen propôs ao Hesse, Baden e Württemberg
negociações para a obtenção de um Tratado de Colonização
com o Brasil. Mas na corte brasileira ganhou força o partido contrário à imigração e o Major von Schiiffer caiu
em más graças, pelo que só se chegou a um Acordo Comercial e de Navegação, em 1827.
des, uma a 70 quilômetros da outra. Bremerhaven é o maior
porto pesqueiro do continente europeu e um dos mais modernos no que tange às instalações para o carregamento e
descarregamento de "containers ". Anualmente são cerca de
12. 000 navios que lançam âncoras em Bremen e Bremerhaven, muitos dos quais com a bandeira brasileira. Em fins
de janeiro encontrei lá o navio Copacabana, da Aliança.
Aproveitei a oportunidade para bater um papo com o ComanQ.ante Hofmann e para comer a bordo feijão paulista
com carne seca dentro.
O desejo de fomentar a emigração para o Brasil se baseava no depoimento de J. H. W. Smidt, que esteve averiguando a situação dos colonos e ao regressar a Bremen
declarou: "Um homem de verdade, que viva regularmente,
que economize o seu dinheiro e trabalhe infatigavelmente,
Mencionando-se os principais produtos importados
através de Bremen, pode-se observar a sua importância para
nós brasileiros. Os principais produtos que entram na Alemanha pelos portos bremenses são: algodão, lã, fumo, café,
madeiras, papel, cereais, frutas cítricas e vinho. A Bolsa do
tem para si e seus filhos melhores perspectivas no Brasil
do que aqui, mas isto não nos primeiros anos."
Algodão é de enorme significado para as exportações de
algodão brasileiras.
Bremen hoje é uma cidade com 591.000 habitantes.
Trata-se de uma cidade-estado com um fato curioso. Bremen
A Bremen pode-se chegar por terra, mar e ar. Bremen
está ligada à excelente rêde rodoviária alemã e por estrada
de ferro pode ser alcançada diretamente a partir de 32 cidades alemães. O aeroporto dista apenas lO minutos de automóvel. Cerca de 600 mil passageiros passaram pelo Aeroporto de Bremen no ano passado.
é porto marítimo mas não se encontra na costa e sim às
margens do Rio Weser. Prevendo que um dia os navios iriam
crescer e não poderiam chegar até Bremen, a administração
da cidade livre e hanseática comprou do Reino de Hanôver,
em 1827, um pedaço de terra e construiu nele Bremerhaven.
A tradução literal do nome é Porto de Bremen. Bremerhaven, todavia, também cresceu e é hoje uma cidade de 145. 000
habitantes. E assim o Estado de Bremen, o menor da República Federal da Alemanha, é formando por- duas cida-
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. Bremen tem universidade, escola superior de pedagogia,
escola técnica superior, escola náutica superior, conservatório de música, escola superior de somática, escola superior
de economia e escola superior de pedagogia e economia
social.
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Um dos produtos mais conhecidos de Bremen é a cer·
veja Beck's Bier, que leva o brasão da cidade aos quatro
cantos do mundo. Os filhos mais conhecidos de Bremen
são por certo os músicos cantores de Bremen. Qualquer
criança conhece a história dos quatro amigos que resolveram ganhar a vida cantando: o burro, o cão, o gato e o galo.
Os quatro estão perpetuados em bronze, ao lado da prefei·
tura e são fotografados centenas e até milhares de vezes
por dia.
O restaurante debaixo da prefeitura, o Ratskeller, já
era louvado em 1653 como "o fundamento delicioso". Ele
e outros prédios venerandos espelham o esplendor da an·
tiga Hansa. Vendo-se a riqueza do centro da cidade, que já
estava ali quando os colonizadores partiram, pode-se calcular que tenham deixado a pátria com o coração partido
e os olhos vermelhos de lágrimas. Mas em Bremen não po·
diam ficar. Ou embarcavam para o desconhecido ou retor·
navam para suas cidades, as quais não tinham a opulência
das cidades livres e hanseáticas. Assim partiram levando
consigo os poucos pertences e a grande esperança de, quem
sabe, erguer no outro lado do Atlântico cidades livres e ricas
como as hanseáticas, em que pudessem ficar. Houve as decepções, muitos foram iludidos ou se iludiram, muitos não
chegaram a pisar terras brasileiras, morrendo em meio às
intermináveis viagens nos veleiros. Em 1826 foi publicado
em Braunschweig o livro escrito por P. H. Schumacher, co·
mandante de um navio que partiu de Hamburgo em junho
de 1824, transportando emigrantes para o Brasil. Ao todo
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SOl pessoas a bordo. 475 deixando a Alemanha para se
radicar no Brasil. 399 homens, 32 mulheres e 44 crianças.
Ele narra:
Dia 31 de agosto morreu um emigrante, deixando mulher e filhos a bordo. No dia 1° de setembro morreu outro.
Dia 14 morreu mais um. Dia 18 a esposa de um militar deu
à luz um menino que recebeu o nome do navio: Georg Friedrich. Dia 21 mais um morto, um jovem de 21 anos, que
emigrava juntamente com um irmão. Dia 26 faleceu um
emigrante de 61 anos. No mesmo dia cruzaram o equador.
Dia 28 mais um morto. No dia 5 de outubro cruzaram com
um navio americano que viajava de Montevideu para a Filadélfia. No dia 8 avistaram a costa brasileira. Temporal e
desespero. Na noite do dia 9 estavam na altura do Rio de
Janeiro. A escuridão e a falta de vento impediu a entrada
na baía. No dia seguinte névoa e chuva. Finalmente no dia
ll de outubro entraram no porto. Foi içada a bandeira
brasileira e gritou-se três vezes "Hurra!".
Tendo soltado as amarras em Altona no dia 27 de
junho de 1844 e tendo aportado no dia l l de outubro do
mesmo ano, o navio levou 106 dias para chegar. Uma odisséia repleta de dramas e alegrias. Mais dramas do que alegrias. Os três hurras poderiam ser um "happy end." Mas
não foram. A jornada não terminava ali no Rio de Janeiro.
Dali para a frente eram outros problemas e perigos. A falta
de recursos, a saudade, as doenças tropicais e os ataques
dos bugres. O colono enfrentou tudo isto, mas aí está o
Brasil, aí estão os estados sulinos, aí estão Novo Hamburgo,
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Joinville, São Leopoldo, Blumenau, Rolândia, Nova Friburgo, Teófilo Otoni e tantas outras cidades que são tão
livres e ricas quanto Bremen. A velha tradição que nos falta
compensamos com o nosso arrojo e entusiasmo. A Catedral
de Bremen é 457 anos mais velha que o Brasil, mas a nossa
fé é idêntica e esperamos que a distância que nos separa
diminua sempre mais, para que possamos diariamente renovar a amizade sincera que une Brasileiros e Alemães!
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