Os Acordos Regionais Celebrados entre a Organização das Nações

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Os Acordos Regionais Celebrados entre a Organização das Nações
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA
CENTRO SÓCIO ECONÔMICO
DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS ECONÔMICAS E RELAÇÕES INTERNACIONAIS
GRADUAÇÃO EM RELAÇÕES INTERNACIONAIS
FELIPE KLOPPEL SILVA
Os Acordos Regionais Celebrados entre a Organização das Nações Unidas e
a União Europeia: Um Estudo sobre as Missões de Paz na República
Democrática do Congo
Florianópolis, 2013
FELIPE KLOPPEL SILVA
Os Acordos Regionais Celebrados entre a Organização das Nações Unidas e
a União Europeia: Um Estudo sobre as Missões de Paz na República
Democrática do Congo
Monografia submetida ao Curso de
Relações Internacionais da Universidade
Federal de Santa Catarina, como requisito
obrigatório para obtenção do grau de
Bacharelado.
Orientadora: Profa. Dra. Karine de Souza Silva
Florianópolis, 2013
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA
CENTRO SÓCIO ECONÔMICO
DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS ECONÔMICAS E RELAÇÕES INTERNACIONAIS
GRADUAÇÃO EM RELAÇÕES INTERNACIONAIS
A Banca Examinadora resolveu atribuir a nota DEZ ao acadêmico Felipe Kloppel
Silva na disciplina CNM 7280 – Monografia, pela apresentação do trabalho intitulado: Os
Acordos Regionais Celebrados entre a Organização das Nações Unidas e a União
Europeia: Um Estudo sobre as Missões de Paz na República Democrática do Congo.
Banca Examinadora:
-----------------------------------------------------------Profa. Dra. Karine de Souza Silva
-----------------------------------------------------------Prof. Dr. Rogério Santos da Costa
-----------------------------------------------------------Prof. Msc. Rafael de Miranda Santos
Florianópolis, 2013
Dedicado aos brasileiros que morreram enquanto participavam dos esforços da
comunidade internacional pela paz entre os povos.
AGRADECIMENTOS
Aos meus pais, Amilton e Maristela, pelo apoio incondicional e pela vida que me foi dada, o
meu amor e agradecimento eternos.
As minhas irmãs, Mikaéle e Mariane, pela torcida e pelo carinho.
A minha orientadora, Profa. Dra. Karine de Souza Silva, pela imprescindível contribuição
acadêmica, pela paciência e estímulo e pelos anos de tão agradável e especial convivência, o
meu profundo agradecimento e a minha mais sincera amizade.
Aos membros da banca avaliadora, professores Rogério Costa (UNISUL) e Rafael Miranda
(UFSC) pela atenção dispensada, meus sinceros agradecimentos.
Aos meus fiéis amigos, em especial, Edivaldo Dondossola, Felipe Oliveira e Rory Ribeiro,
pelo apoio, amizade, carinho e companheirismo.
A Universidade Federal de Santa Catarina, em especial, ao curso de graduação em Relações
Internacionais, seus professores e técnicos administrativos. Agradeço por todas as
oportunidades de conhecimento e aprendizagem dentro e fora das salas de aula.
Aos meus colegas e amigos do curso de graduação, dos Centros Acadêmicos, da Federação
Nacional de Estudantes de Relações Internacionais, da Empresa Júnior e da AIESEC pelo
companheirismo, por todos os momentos tristes e felizes. Nada na minha vida teria sentido se
não fosse pela presença e participação de todos vocês.
A todos que contribuíram direta ou indiretamente para a realização deste trabalho, o meu
sincero agradecimento.
A paz mundial não poderá ser salvaguardada sem esforços criativos que estejam à altura dos
perigos que a ameaçam.
Robert Schuman
RESUMO
SILVA, F. K. Os Acordos Regionais Celebrados entre a Organização das Nações Unidas
e a União Europeia: Um Estudo sobre as Missões de Paz na República Democrática do
Congo. 2013. 111f. Monografia – Departamento de Ciências Econômicas e Relações
Internacionais – Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2013.
As operações de paz da Organização das Nações Unidas (ONU) são a principal atividade da
organização no âmbito da segurança e da paz mundial. A ideia evoluiu desde a sua primeira
missão em 1948, adquirindo novos objetivo e complexidade, abrangendo atualmente não
apenas ações militares e policiais, mas também, ações multidimensionais. Dentre os
mecanismos institucionais presentes na Declaração de São Francisco que legitimam a
execução das operações de paz, encontram-se o que permite a Organização celebrar acordos
regionais com organizações internacionais em matéria de paz e segurança internacionais. Por
meio deste aparato, a ONU tem buscado agir de forma conjunta com organizações
internacionais, como a União Europeia (UE), em diversos campos de ação ao redor do globo,
fortalecendo seu papel de promotora da paz. A União Europeia também evoluiu ao longo dos
anos, desde sua formação em 1951, com a CECA, e desenvolveu seus próprios meios de
propagar a ordem e a paz no mundo, através das Missões de Petersberg. Desta forma, a UE
tem se consolidado como uma potência e como uma organização interessada em colaborar
com a ONU, no cumprimento de seus objetivos. Tal afirmação se consolidará com a presença
das duas instituições na República Democrática do Congo e com a assinatura da Declaração
Conjunta sobre Gestão de Crises, em 2003. O objetivo deste trabalho é analisar as
motivações, possibilidades e desafios dos arranjos regionais estabelecidas entre as Nações
Unidas e a União Europeia, com base no capítulo VIII da Carta de São Francisco, a partir do
estudo das missões de paz encetadas na República Democrática do Congo.
PALAVRAS-CHAVE: Nações Unidas, Arranjos Regionais, União Europeia, Operações de
Paz, República Democrática do Congo.
ABSTRACT
SILVA, F. K. The Regional Agreements Concluded between the United Nations and the
European Union: A Study of Peace Missions in the Democratic Republic of Congo. 2013.
111f. Monografia – Departamento de Ciências Econômicas e Relações Internacionais –
Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2013.
Peacekeeping operations of the United Nations (UN) is the main activity of the organization
in the context of security and world peace. The idea has evolved since its first mission in
1948, acquiring new order and complexity, currently covering not only military and police
actions, but also multidimensional activities. Among the institutional mechanisms in the
Declaration of San Francisco that legitimize the execution of peace operations, are allowing
Organization regional agreements with international organizations in the field of international
peace and security. By means of this apparatus, the UN has sought to act jointly with
international organizations such as the European Union (EU), in various fields of action
around the globe, strengthening its role as promoter of peace. The European Union has also
evolved over the years since its formation in 1951, the ECSC, and developed their own means
of spreading order and peace in the world through the Petersberg Missions. Thus, the EU has
been established as a power and as an organization keen to work with the UN in fulfilling its
objectives. Such a statement will be consolidated with the presence of the two institutions in
the Democratic Republic of Congo and the signing of the Joint Declaration on Crisis
Management in 2003. The objective of this work is to analyze the motivations, opportunities
and challenges of regional arrangements established between the United Nations and the
European Union, under Chapter VIII of the Charter of San Francisco, from the study of
peacekeeping missions undertaken in the Democratic Republic of Congo.
KEY-WORDS: United Nations, Regional Arrangements, European Union, Peace Operations,
the Democratic Republic of Congo.
LISTA DE FIGURAS E TABELAS
TABELA 1 - Operações de Manutenção da Paz – 1948/1988
27
TABELA 2 - Operações de Manutenção da Paz – 1989/1999
32
TABELA 3 - Operações de Manutenção da Paz – 2000/2013
35
TABELA 4 - Operações de Manutenção da Paz – Arranjos Regionais 1992/2013
41
TABELA 5 - As Missões Operacionais da União Europeia
65
GRÁFICO 1 – Principais Contribuintes para o Orçamento da ONU nas OMP
81
GRÁFICO 2 – Participação da União Europeia em Operações de Paz – 2012
82
LISTA DE ABREVIATURAS
A/RES
Indicativo de Resoluções da Assembleia-Geral
AGNU
Assembleia Geral das Nações Unidas
QUE
Ato Único Europeu
CECA
Comunidade Europeia do Carvão e do Aço
CED
Comunidade Europeia de Defesa
CEE
Comunidade Econômica Europeia
CEMA
Chefes de Estado Maior da Armada
CMUE
Comitê Militar da União Europeia
CSNU
Conselho de Segurança das Nações Unidas
COPS
Comitê Político e de Segurança
CPE
Comunidade Política Europeia
DPKO
Departamento de Operações de Manutenção da Paz
DOMREP
Missão do Representante do Secretário-Geral na República Dominicana
EMUE
Estado-Maior da União Europeia
ESS
Estratégia de Segurança Europeia
EUA
Estados Unidos da América
EUFOR
Força da União Europeia
EUPM
Missão Policial da União Europeia para a Bósnia-Herzegovina
EUPOL
Missão Policial da União Europeia no Afeganistão
EUPOL COPPS
Missão Policial da União Europeia na Palestina
EUSEC
Missão da União Europeia de Aconselhamento e Assistência em Matéria de
Reforma do Setor de Segurança na República Democrática do Congo
EU SSR
Missão da União Europeia de Aconselhamento e Assistência em Matéria de
Reforma do Setor de Segurança em Guiné-Bissau
FMEI
Força Multinacional de Emergência Interina na República Democrática do Congo
IESD
Identidade Europeia de Defesa
LDN
Liga das Nações
MINURSO
Missão das Nações Unidas para o Referendo do Saara Ocidental
MONUC
Missão das Nações Unidas na República Democrática do Congo
MONUSCO
Missão das Nações Unidas para a Estabilização na República Democrática do
Congo
OMP
Operações de Manutenção da Paz
ONU
Organização das Nações Unidas
ONUC
Missão das Nações Unidas na República do Congo
OUA
Organização da Unidade Africana
OTAN
Organização do Tratado do Atlântico Norte
PESC
Política Externa e de Segurança Comum
PESD
Política Externa de Segurança e Defesa
QPM
Quadro de Pessoal Militar
RDC
República Democrática do Congo
SGNU
Secretário-Geral das Nações Unidas
TUE
Tratado Único Europeu
UA
União Africana
U.E
União Europeia
UEO
União Europeia Ocidental
UNAMID
Missão Híbrida das Nações Unidas e da União Africana em Darfur
UNEF I
Primeira Força de Emergência das Nações Unidas
UNIPOM
Missão de Observação das Nações Unidas Índia Paquistão
UNIMOG
Missão de Observação Militar das Nações Unidas no Irã e Iraque
UNIKOM
Missão de Observação Militar das Nações Unidas no Kuwait e Iraque
UNMEE
Missão das Nações Unidas na Etiópia e Eritréia
UNMIBH
Missão das Nações Unidas na Bósnia-Herzegovina
UNPREDEP
Força de Desdobramento Preventivo das Nações Unidas
UNPROFOR
Força de Proteção das Nações Unidas
UNTSO
Organização das Nações Unidas para Supervisão da Trégua
URSS
União das Repúblicas Socialistas Soviéticas
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 13
1.
A ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS E OS ACORDOS REGIONAIS ........................ 17
1.1.
Considerações Preliminares .................................................................................................. 17
1.2. A Declaração de São Francisco e os Aparatos Institucionais para as Operações de
Manutenção da Paz ........................................................................................................................... 17
1.3.
2.
As Operações de Manutenção da Paz.................................................................................... 25
1.3.1.
A Inoperância durante a Guerra Fria ............................................................................. 25
1.3.2.
O Cenário Pós Guerra Fria ............................................................................................ 28
1.3.3.
O Capítulo VIII: Os Arranjos Internacionais ................................................................ 37
A UE E OS ACORDOS REGIONAIS COM A ONU EM MATÉRIA DE MISSÕES DE PAZ . 47
2.1.
Considerações Preliminares .................................................................................................. 47
2.2.
Os 40 anos iniciais: Um projeto chamado União Europeia ................................................... 48
2.3.
De 1990 a 2000: a União Europeia como Potência em Segurança e Defesa......................... 51
2.4.
Dos Anos 2000: Uma Década de Expansão .......................................................................... 61
3. A CONTRIBUIÇÃO EUROPEIA À ONU NAS OPERAÇÕES DE PAZ: A PARTICIPAÇÃO
NAS MISSÕES NO CONGO ............................................................................................................... 74
3.1.
Considerações Preliminares .................................................................................................. 74
3.2.
A Regionalização das Operações de Paz: As ações da UE e da ONU .................................. 74
3.2.1.
A Ambiguidade da Participação da UE nas operações de paz da ONU ........................ 80
3.3.
Intervenção Europeia na República Democrática do Congo ................................................. 84
3.4.
Desafios e Dilemas na cooperação UE-ONU para a promoção da paz ................................. 96
CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................................ 98
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................................ 101
13
INTRODUÇÃO
O embrião das operações de paz da ONU se encontra na Liga das Nações (LDN). Esta
organização, nas décadas de 1920 e 1930, já empreendia ações, ainda que sem denominação
específica, direcionadas à manutenção da paz e à prevenção de conflitos. Nessas missões eram
enviados observadores ou forças militares para zelar pela ordem, administrar territórios em
conflito e monitorar cessar-fogos. Contudo, muito antes da criação de organizações
multilaterais que visavam garantir a paz, existia a ideia de que as grandes potências eram
responsáveis por manter a paz e a segurança internacionais.
No âmbito da Organização das Nações Unidas (ONU), pode-se considerar que as
operações de paz surgiram como uma medida contingencial, para contornar as dificuldades de
se colocar em prática o sistema de segurança coletiva previsto nos artigos da Carta de São
Francisco, principalmente devido à falta de consenso entre os cinco membros permanentes do
Conselho de Segurança (CSNU), durante a Guerra Fria.
Frente aos conflitos localizados que emergiam no cenário internacional pós-Segunda
Guerra Mundial, a ONU passou a autorizar uma série de missões que objetivavam prevenir
controvérsias entre Estados ou estabilizar aqueles já em andamento, através do emprego de
operações multinacionais compostas por civis e/ou militares. Desta forma, as primeiras
operações de manutenção da paz da ONU surgiram concebidas, basicamente, como forças
militares de interposição, como ocorreram na Missão das Nações Unidas para Supervisão da
Trégua (UNTSO), em 1948.
As mudanças arquitetadas no contexto normativo internacional pós-Guerra Fria
forneceram as bases para o surgimento das missões de paz multidimensionais, voltadas para à
resolução de conflitos, através da implementação de acordos de paz entre as partes, com uma
multiplicidade de funções e componentes. A atuação dessas missões passou a englobar,
paulatinamente, a reconstrução institucional de Estados pós-conflitos.
Apesar de a Carta da ONU não fazer referência explícita a estas operações, o que as
tornam mecanismos ad hoc, o aparato que fundamenta juridicamente as missões de paz está
previsto em seus Capítulos VI e VII. O primeiro prescreve os meios pacíficos para a solução
de controvérsias, através da negociação, mediação, conciliação e/ou arbitragem. O segundo
abre a possibilidade do uso da força na aplicação de medidas para a resolução de conflitos que
se tornaram de fato uma ameaça à paz e segurança internacional.
Além disso, para atender as novas demandas em matéria de paz com as missões
14
multidimensionais, a ONU passou a recorrer também aos mecanismos institucionais presentes
no capítulo VIII, que versa sobre as possibilidades de arranjos regionais para a execução das
ações no campo da paz e segurança internacionais. Nestes acordos, são estabelecidas as
formas de cooperação, em matéria de paz, entre as Nações Unidas e outras organizações
internacionais, como a União Europeia (UE) e a Organização do Tratado do Atlântico Norte
(OTAN). Neste trabalho, centram-se as atenções na UE, que tem desenvolvido uma
importante parceria no que tange às atividades conjuntas e coordenadas com as Nações
Unidas, nas operações de paz, estando presente nos principais cenários de conflitos da
atualidade.
Ao longo dos anos, a União Europeia se desenvolveu como ator relevante no cenário
internacional, principalmente, após a institucionalização de sua Política de Segurança e
Defesa (PESD), presente no marco institucional do Tratado da União Europeia, assinado em
1992. A partir deste momento, assistiu-se à consolidação de uma organização internacional
preocupada em propagar a paz para além de seus limites fronteiriços, através de missões de
gestão de crises denominadas “Missões Petersberg”, que neste trabalho serão definidas como:
unidades militares e civis agindo sob o comando de uma autoridade, a UE, em ações
multidimensionais. Desta forma, a União Europeia pode atribuir a si os desígnios de ser uma
“potência” global, afirmando estar em condições de conduzir operações de gestão de crises de
forma cada vez mais autônoma e complexa, o que logo veio a se concretizar com substituição
das forças da ONU na Bósnia-Herzegovina e da OTAN na República da Macedônia, em
2003.
No que tange as Nações Unidas, as missões levadas a cabo pela UE complementariam
os esforços da ONU no campo da paz, pois, projetavam-se como missões de cunho
multidimensional, abrangendo as seguintes ações: missões humanitárias ou de evacuação dos
cidadãos nacionais; prevenção de conflitos, missões de manutenção da paz; forças de combate
para a gestão das crises, incluindo operações de restabelecimento da paz; ações conjuntas em
matéria de desarmamento; de aconselhamento e assistência em matéria militar.
Desta forma, não tardou para que as possibilidades de cooperação, entre estas duas
organizações, se transformassem em prática. Ainda no ano de 2003, a União Europeia passa a
integrar, pela primeira vez, uma operação da ONU, a Missão das Nações Unidas na República
Democrática do Congo (MONUC), através da Resolução 1484, aprovada pelo Conselho de
Segurança das Nações Unidas.
A missão denominada EUFOR Artemis, foi uma das cinco missões desenvolvidas pela
15
UE no país, objetivando contribuir, com as Nações Unidas, para a estabilização das condições
de segurança na região, com um efetivo de aproximadamente 1.800 colaboradores e
contribuições financeiras de cerca 7 milhões de euros. O êxito desta primeira operação abriu
espaço para que a UE, subsequentemente, pudesse levar a cabo outras operações na mesma
região, e a assinatura da Declaração Conjunta entre UE e ONU para Gestão de Crises, como
se observará adiante.
Tendo como base essa contextualização, o presente trabalho situa-se no campo
temático dos acordos regionais celebrados entre a ONU e a União Europeia, vislumbrada sob
a ótica das operações de manutenção da paz com ênfase na atuação empreendida na República
Democrática do Congo (RDC). A pergunta de pesquisa que motiva esta investigação é:
“Quais as motivações, possibilidades e desafios dos arranjos regionais estabelecidas entre as
Nações Unidas e a União Europeia, com base no capítulo VIII da Carta de São Francisco?”.
A investigação foi orientada sobre duas hipóteses de fatores relevantes que afetam a
celebração de acordos regionais: as motivações e interesses distintos, porém não excludentes;
e os desafios e aspectos positivos da cooperação na celebração dos acordos em âmbito interno
e externo.
O objetivo geral desta monografia é analisar as motivações, possibilidades e desafios
dos arranjos regionais estabelecidas entre as Nações Unidas e a União Europeia, com base no
capítulo VIII da Carta de São Francisco, a partir do estudo das missões de paz encetadas na
República Democrática do Congo.
Para alcançar os objetivos propostos, o trabalho está dimensionado em três capítulos.
O primeiro deles aborda, brevemente, a evolução histórica das operações de manutenção da
paz e os mecanismos institucionais da ONU para executá-las. Faz-se uma análise dos
capítulos VI, VII e VIII da supracitada declaração, destacando-se os aparatos jurídicos e
operacionais dos arranjos regionais, tema desta análise.
No segundo capítulo, analisa-se a evolução histórica do processo de integração
europeia, centrando-se nas evoluções institucionais em matéria de segurança e defesa, trazidas
à luz no Tratado da União Europeia de 1992 e suas imediatas revisões. Neste capítulo
objetiva-se, prioritariamente, entender as ações europeias no campo da paz, levadas a cabo
através das Missões Petersberg e o início do processo de cooperação com as Nações Unidas,
ancorado na intervenção o Congo e na assinatura da Declaração Conjunta em Matéria de
Gestão de Crises, ambas em 2003.
Por fim, em seu terceiro capítulo, este trabalho apresenta a colaboração efetiva entre a
16
ONU e a UE nas operações de paz, tendo-se como fundo as missões na República
Democrática do Congo. Ao evidenciar todos os aspectos institucionais e operacionais das
missões, busca-se entender os desafios e as oportunidades que as ações entre estas duas
organizações ensejam.
O método de pesquisa é o indutivo e a técnica de pesquisa é bibliográfica e
documental. Para a realização deste trabalho foram utilizadas obras de origem estrangeira cuja
tradução, em caráter não oficial, é de responsabilidade do autor.
Inserido-se no contexto das pesquisas da Graduação e da Pós-Graduação em Relações
Internacionais da UFSC, o trabalho - que foi desenvolvido no Grupo de Pesquisa “EIRENÈ:
Núcleo de Pesquisas sobre Integração Regional, Paz e Segurança Internacional -, procura
contribuir teoricamente sobre uma temática que desperta a atenção da academia há décadas e
que foi a principal motivadora para o surgimento da Disciplina das Relações Internacionais e
da Organização das Nações Unidas que é a busca do caminho que conduza a humanidade para
a convivência harmoniosa e pacífica.
O tema merece atenção privilegiada devido à sua atualidade e ineditismo. Com efeito,
em âmbito internacional, aprofunda-se o debate acerca do papel crucial das Organizações
Internacionais na manutenção da paz, das estratégias de colaboração entre a ONU e os atores
regionais em matéria de operações de manutenção da paz e das alternativas viáveis –
sustentadas pelas normativas de Direito Internacional Humanitário - para implementação e
manutenção da paz em situações de pós-conflito. A relevância desta pesquisa baseia-se,
principalmente, nas peculiaridades que rondam a temática. O assunto deste trabalho é pouco
explorado na academia brasileira, carente de estudos sobre os acordos regionais entre ONU e
UE e, tampouco há um despertar para as missões realizadas na África e especialmente no
Congo.
17
1. A ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS E OS ACORDOS REGIONAIS
1.1. Considerações Preliminares
Com as primeiras missões de observação desarmadas das Nações Unidas, surgiram
operações mais complexas e com diferentes objetivos, e hoje são um dos principais
instrumentos na promoção da paz, da segurança e do suporte necessários aos países
fragilizados por um conflito.
1
Desde a primeira missão em 1948, a ONU realizou 68
operações no campo da paz, contando, atualmente, com 18 em curso. 2
A Carta das Nações Unidas, contudo, não prevê o estabelecimento das operações de
manutenção da paz, mas estas são justificadas pelo artigo 40 da Carta, e ficam então
caracterizadas como “medidas provisórias” ao alcance do Conselho de Segurança para
cumprir o objetivo primordial da ONU, que é manter a paz e a segurança.
3
Frente às
constantes alterações no cenário internacional, a Organização, para atender as crescentes
demandas, precisa recorrer à colaboração de Estados e organizações regionais, e o faz através
do capítulo VIII da Declaração de São Francisco. 4
Diante disso, esse primeiro capítulo busca abordar, brevemente, a evolução histórica
das operações de manutenção da paz e seus aparatos institucionais utilizados no cumprimento
de seu objetivo. No entanto, apesar da abordagem cronológica das operações de paz, busca-se
entender, prioritariamente, as possibilidades de arranjos regionais para tal fim, dedicando-se
ao entendimento de sua conceituação e operacionalização, bem como das motivações e
interesses de tais acordos. Esta análise, ao final deste trabalho, servirá como base para o
entendimento do relacionamento da ONU e da União Europeia nos quadros de cooperação no
campo da paz, sobretudo, no caso das intervenções na República Democrática do Congo.
1.2. A Declaração de São Francisco e os Aparatos Institucionais para as Operações de
Manutenção da Paz
1
BETTATI, Mario. Le droit d’ingérence. Paris: Odile Jacob, 1996. 324p.
NATIONS, Dpko - United. Past Peacekeeping Operations. Disponível em: <http://www.un.org/en/peacekee
ping/operat ions/past.shtml>. Acesso em: 03 jun. 2013.
3
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (org). Carta das Nações Unidas. 1945. Disponível em:
http://unicrio.org.br/img/CartadaONU_VersoInternet.pdf. Acesso em: 05 jun.2013
4
EVANS, Gareth. Cooperating for peace. St. Leonards: Allen & Unwin, 2003.
2
18
A decisão tomada pelas grandes potências, ao final da Segunda Guerra Mundial, de
dotar o sistema internacional de um mecanismo de segurança coletiva5 que prevenisse novas
ameaças da mesma magnitude destruidora, teve papel estruturante no cenário mundial. A
criação das Nações Unidas objetivou dar concretude a essa decisão. Pelas razões que serão
discutidas adiante, porém, o mecanismo de segurança coletiva não se mostrou inteiramente
funcional, mas essa aparente falha explicitou uma importante qualidade da nova Organização
– a de adaptar-se aos novos desafios impostos pelas constantes mudanças no cenário
internacional. 6
A Carta de São Francisco, Tratado fundador da ONU, em seus 19 capítulos e 111
artigos descreve a estruturação da Organização das Nações Unidas. Ela é composta por seis
órgãos, dos quais, em matéria de paz e segurança internacionais, destacam-se dois de caráter
deliberativos e legislativos, e um de funções fiscalizadoras.
7
Inicialmente, com o dever de
legislar nos temas de paz, apresentam-se a Assembleia Geral (AGNU), um fórum multilateral
de discussões do qual participam todos os signatários da Carta; e o Conselho de Segurança
das Nações Unidas, órgão no qual as potências vencedoras da Segunda Guerra (Reino Unido,
Estados Unidos e Rússia) e suas convidadas, (França e China), reservaram para si as decisões
sobre a paz e a segurança internacionais.
8
Já como órgão com atribuições fiscalizadoras, o
Secretariado Geral, composto de um Secretário-Geral e seus funcionários, possui a
prerrogativa de monitorar criteriosamente as missões de paz e de segurança internacionais.
O Tratado fundado da ONU expressa já em seu artigo primeiro, que o principal
propósito da Organização é o de:
Manter a paz e a segurança internacionais e, para esse fim: tomar,
coletivamente, medidas efetivas para evitar ameaças à paz e reprimir
os atos de agressão ou outra qualquer ruptura da paz e chegar, por
meios pacíficos e de conformidade com os princípios de justiça e do
direito internacional, a um ajuste ou solução das controvérsias ou
5
“O sistema de segurança coletiva modifica as normas de intervenção, subordinando a decisão do Estado de usar
a força à autorização internacional, que um tratado multilateral delineará e uma organização internacional
interpretará. O direito de autodefesa é permitido, mas as demais decisões sobre o uso da força passam a ser
subordinadas ao compromisso internacional” HERZ, Monica e HOFFMANN, Andrea (2004). Organizações
Internacionais: história e prática. São Paulo: Elsevier editora.
6
Uziel, Eduardo.Conselho de segurança, as operações e manutenção da paz e a inserção do Brasil no mecanismo
de segurança coletiva das Nações Unidas / Eduardo Uziel.—Brasília : FUNAG, 2010. 244 p. : il.; color.
7
United Nations Structure and Organization. Disponível em: http://www.un.org/e n/members/ind ex.shtml.
Acessado em 02 de junho de 2013.
8
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (org). Carta das Nações Unidas. 1945. Disponível em:
http://unicrio.org.br/img/CartadaONU_VersoInternet.pdf. Acesso em: 05 jun.2013
19
situações que possam levar a uma perturbação da paz. 9
Para a realização de tal propósito, a Carta da ONU define uma série de artigos, em
diferentes capítulos que, em conjunto com outros propósitos presentes neste mesmo Tratado,
estabelecem um sistema de segurança coletiva. Dentre os principais mecanismos utilizados
pela ONU, com vistas à sustentação da ordem e do progresso, encontram-se as “operações de
paz”,10 que neste trabalho será definido com base no autor Eduardo Uziel, como:
Operações estabelecidas pelo CSNU ou pela Assembleia Geral das
Nações Unidas, de quem recebem mandatos e a quem se reportam
periodicamente, que são financiadas por contribuições de todos os
Estados-Membros das Nações Unidas e estão sob comando e controle
do Secretário-Geral e do Departamento de Operações de Manutenção
da Paz; englobam militares, policiais e civis e, no terreno visam a
controlar ou resolver conflitos, respeitando os princípios da
imparcialidade, consentimento das partes e uso da força somente em
legítima defesa. 11
Apesar de não previstas, expressamente, na Carta da Organização, as operações de
paz passaram a ser encaradas como instrumento capaz de contribuir efetivamente para a
pacificação dos conflitos, pois, embora a Declaração de São Francisco não mencione o termo
“operações de paz”, ela abriga em seus capítulos a necessidade de atuação da ONU na
resolução de controvérsias, deixando a cargo de o CSNU decidir quais serão os meios efetivos
de alcançar tais resultados.
9
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (org). Carta das Nações Unidas. 1945. Disponível em:
http://unicrio.org.br/img/CartadaONU_VersoInternet.pdf. Acesso em: 05 jun.2013
10
“A mais recente das controvérsias sobre a terminologia opõe o termo peaceoperations a peacekeeping
operations. Os defensores da primeira expressão argumentam que existe uma ampla gama de “operações de paz”,
empreendidas por muitos países e organismos internacionais, entre as quais estão as missões das Nações Unidas.
Nesse sentido, peace operations seria um termo mais amplo que englobaria peacekeeping operations e deveria
ser preferido nos documentos da Organização. Essa posição abriga várias posturas políticas. Para o Canadá e a
União Europeia, por exemplo, trata-se de legitimar as missões que levam a cabo por meio de seus arranjos
regionais e de defesa ou individualmente, que não contam com o reconhecimento de que desfrutam as Nações
Unidas. Para os EUA, por sua vez, peace operations contemplaria qualquer operação militar diferente de guerra
declarada, prescindiria do consentimento das partes e incluiria, por exemplo, a invasão e ocupação do Iraque em
2003. Essa posição conta com respaldo acadêmico. Alguns, como Kimberley Marten, defendem que as antigas
potências coloniais estão mais bem qualificadas para atuar em missões de paz por entenderem a dinâmica das
intervenções estrangeiras; outros, como Roland Paris, argumentam que a soberania e o consentimento das partes
não são realmente relevantes, podendo ser descartadas; Daniel e Caraher, ainda, consideram que não há
diferença real entre as operações das Nações Unidas e a presença dos EUA no Iraque.”. Uziel, Eduardo.Conselho
de segurança, as operações e manutenção da paz e a inserção do Brasil no mecanismo de segurança coletiva das
Nações Unidas / Eduardo Uziel.—Brasília : FUNAG, 2010. 244 p. : il.; color.
11
Idem.
20
Como bem ressalta Paulo Roberto da Fontoura,
[...] na prática das Nações Unidas, o estabelecimento de missões de
observação e forças de paz não se fundamentou explicitamente em
dispositivos da sua carta constitutiva. Tem-se partido do entendimento
de que não é absolutamente imprescindível buscar um dispositivo
específico na Carta das Nações Unidas para o emprego de
determinados meios que se destinam a realizar os propósitos da
Organização, desde que não haja qualquer dispositivo na Carta, ou
regra internacional geral, que impeça ou proíba a utilização dos meios
pretendidos. Trata-se da doutrina dos ‘poderes implícitos’, que deu
reconhecimento judicial na decisão da Corte Internacional de Justiça
de 1949 no caso das Reparações de Danos. 12
Ao encontro do que afirma Fontoura, percebe-se, na própria Declaração de São
Francisco, a existência de normas que possibilitam a efetivação das operações de paz, apesar
de não estarem mencionadas claramente em nenhum dos dispositivos dos capítulos VI, VII e
VIII. Entretanto, estas poucas e amplas normas formam todo o arcabouço jurídico da ONU,
nas questões relativas à paz e a segurança internacional, e sua falta de precisão potencializa o
papel do CSNU. 13
Inicialmente, o capítulo VI da Carta da ONU se refere à “Solução Pacífica de
Controvérsias”. Em seu artigo primeiro apresenta:
As partes em uma controvérsia, que possa vir a constituir uma ameaça
à paz e à segurança internacionais, procurarão, antes de tudo, chegar a
uma solução por negociação, inquérito, mediação, conciliação,
arbitragem, solução judicial, recurso a entidades ou acordos regionais,
ou a qualquer outro meio pacífico à sua escolha. O Conselho de
Segurança convidará, quando julgar necessário, as referidas partes a
resolver, por tais meios, suas controvérsias. 14
Denota-se que este capítulo prevê que disputas entre partes que possam constituir em
ameaças à paz e à segurança internacionais podem ser trazidas à consideração do CSNU que
possui mandato expresso para: 1) determinar aos litigantes que cessem as divergências por
12
FONTOURA, Paulo Roberto Campos Tarrisse da. O Brasil e as Operações de Manutenção da Paz das Nações
Unidas – Brasília, Fundação Alexandre Gusmão - FUNAG, 1999, p.70.
13
FONSECA JUNIOR, Gelson. A legitimidade e outras questões internacionais: poder e ética entre as nações.
São Paulo: Paz e Terra,1998. 374p.
14
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (org). Carta das Nações Unidas. 1945. Disponível em:
http://unicrio.org.br/img/CartadaONU_VersoInternet.pdf. Acesso em: 05 jun.2013
21
meios pacíficos: 2) recomendar métodos adequados de procedimentos ou de ajustamentos e,
além disso, 3) recomendar as condições para a cessação da disputa. 15 No contexto deste
capítulo, a ação do Conselho de Segurança é limitada a recomendações às partes envolvidas,
devendo estas conseguir o estabelecimento de um entendimento por elas mesmas, agindo de
forma voluntária no atendimento ao CSNU.
16
Entretanto, caso os meios de solução pacífica
de controvérsias, como estabelecidos acima, forem ineficazes, a ONU aplicará os princípios
estabelecidos em seu capítulo posterior.
Assim, no capítulo VII são estabelecidas as condições de atuação da Organização no
caso de “Ação Relativa às Ameaças à Paz, Ruptura da Paz e Atos de Agressão”. De acordo
com o artigo 39, a Declaração de São Francisco motiva que:
O Conselho de Segurança determinará a existência de qualquer
ameaça à paz, ruptura da paz ou ato de agressão, e fará recomendações
ou decidirá que medidas deverão ser tomadas de acordo com os
Artigos 41 e 42, a fim de manter ou restabelecer a paz e a segurança
internacionais. 17
Neste sentido, diz o Artigo 41:
O Conselho de Segurança decidirá sobre as medidas que, sem
envolver o emprego de forças armadas, deverão ser tomadas para
tornar efetivas suas decisões e poderá convidar os Membros das
Nações Unidas a aplicarem tais medidas. Estas poderão incluir a
interrupção completa ou parcial das relações econômicas, dos meios
de comunicação ferroviários, marítimos, aéreos, postais, telegráficos,
radiofônicos, ou de outra qualquer espécie e o rompimento das
18
relações diplomáticas.
O Artigo 42 estabelece que:
No caso de o Conselho de Segurança considerar que as medidas
15
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (org). Carta das Nações Unidas. 1945. Disponível em:
http://unicrio.org.br/img/CartadaONU_VersoInternet.pdf. Acesso em: 12 jun.2013
16
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (org). Carta das Nações Unidas. 1945. Disponível em:
http://unicrio.org.br/img/CartadaONU_VersoInternet.pdf. Acesso em: 12 jun.2013
17
Idem.
18
Idem.
22
previstas no Artigo 41 seriam ou demonstraram que são inadequadas,
poderá levar e efeito, por meio de forças aéreas, navais ou terrestres, a
ação que julgar necessária para manter ou restabelecer a paz e a
segurança internacionais. Tal ação poderá compreender
demonstrações, bloqueios e outras operações, por parte das forças
aéreas, navais ou terrestres dos Membros das Nações Unidas. 19
Assim, se comparados os capítulos VI e VII, percebe-se, claramente, que o segundo é
essencialmente coercitivo, porque prevê que quando os Estados-Membros do CSNU
considerarem a existência de qualquer ameaça à paz, ruptura de paz ou ato de agressão, farão
recomendações ou decidirão por medidas repressivas, incluindo o emprego de força armada,
com vistas à manutenção ou restabelecimento da paz e da segurança internacionais. Esse
caráter coercitivo do CSNU é corroborado com o que normatiza o artigo 24, capítulo V, da
Declaração, sobre as funções e atribuições do Conselho de Segurança. 20
A fim de assegurar pronta e eficaz ação por parte das Nações Unidas,
seus Membros conferem ao Conselho de Segurança a principal
responsabilidade na manutenção da paz e da segurança internacionais
e concordam em que no cumprimento dos deveres impostos por essa
responsabilidade o Conselho de Segurança aja em nome deles. 21
Ou seja, no cumprimento de seus deveres, o Conselho de Segurança agirá de acordo
com os propósitos e princípios da Declaração das Nações Unidas, sendo que todos os
Estados-Membros desta Organização deverão acatar as decisões e posições tomadas, sob pena
de serem excluídos da ONU, como menciona o parágrafo sexto, do artigo segundo. 22
É pertinente salientar, ainda, que o surgimento das operações de paz, que projetam a
ideia da ONU de desempenhar o papel de pacificador de conflitos, foi idealizado pelo ExSecretário Geral Dag Hammarskjold23 e por Lester Pearson, no Relatório Anual da ONU de
19
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (org). Carta das Nações Unidas. 1945. Disponível em:
http://unicrio.org.br/img/CartadaONU_VersoInternet.pdf. Acesso em: 12 jun.2013
20
Idem.
21
ARTIGO 5 - O Membro das Nações Unidas, contra o qual for levada a efeito ação preventiva ou coercitiva por
parte do Conselho de Segurança, poderá ser suspenso do exercício dos direitos e privilégios de Membro pela
Assembleia Geral, mediante recomendação do Conselho de Segurança. O exercício desses direitos e privilégios
poderá ser restabelecido pelo conselho de Segurança. ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (org). Carta
das Nações Unidas. 1945. Disponível em: http://unicrio.org.br/img/CartadaONU_VersoInternet.pdf. Acesso em:
18 jun.2013
22
O Membro das Nações Unidas que houver violado persistentemente os Princípios contidos na presente Carta,
poderá ser expulso da Organização pela Assembleia Geral mediante recomendação do Conselho de Segurança.
23
Foi Secretário- Geral das Nações Unidas (ONU) de Abril de 1953 até sua morte. Faleceu perto de Ndola,
23
1960.24 Segundo Jussi Hanhimaki,
25
ambos acreditaram que a ONU poderia desempenhar
uma função relevante na manutenção da paz e segurança internacionais, mesmo em um
cenário marcado pela rivalidade entre as superpotências, através de ações concretas de
estabelecimento da paz e de segurança, em territórios que se julgassem necessárias tais
intervenções. 26
Neste sentido, Pearson e Hammarskjold sugeriam a criação de uma força da ONU para
manter estabilidade e a paz nas regiões de fronteira, principais regiões de conflito, o que,
inicialmente, deu origem à Força de Emergência das Nações Unidas (UNEF I).
27
Esta
primeira força emergencial da ONU teve como objetivo o de “assegurar e supervisionar o
cessar de hostilidades, incluindo a retirada das tropas armadas da França, Israel e Reino Unido
e, mais além, servir como uma barreira entre as forças egípcias e israelenses fornecendo uma
supervisão imparcial do cessar-fogo”.
28
A importância desta atividade deve-se ao
estabelecimento dos princípios fundamentais que caracterizaram as operações de manutenção
da paz tradicionais: imparcialidade, consentimento das partes em conflito e uso da força
somente em legítima defesa.
No contexto da crise de Suez, 1956,
29
o pragmatismo de Hammarskjold superou o
idealismo da segurança coletiva a partir da proposta de que as operações de paz
corresponderiam a respostas ad hoc para problemas particulares e que, portanto, não seriam
guiadas por um projeto preconcebido de intervenção internacional. O Ex-Secretário Geral
situou as operações de paz em um imaginário “capítulo VI e meio”
30
da Carta da ONU, que
significa a conjugação do Capítulo VI (que prescreve os meios pacíficos para a solução de
Rodésia do Norte (hoje Zâmbia), numa controversa queda de avião, no desempenho do seu trabalho a serviço da
ONU. NATIONS, United. General Secretaries. Disponível em: <http://www.un.org/sg/>. Acesso em: 20 abr.
2013.
24
Bellamy, Alex e Williams, Paul. “Introduction: Thinking Anew about Peace Operations”. In. International
Peacekeeping, vol. 11, no. 1, 2004, pp. 1-15.
25
HANHIMÄKI, Jussi M.The United Nations: a very short introduction. New York: Oxford, 2008.
26
Idem.
27
UN, United Nations (org). First United Nations emergency force. Disponível em:http://www.un.org/en/peace
keep ing/missions/past/unef1mandate.html. Acesso em: 21 jun. 2013.
28
Força de Emergência das Nações Unidas. Disponível em:http://www.un.org/en/peacekeeping/missions/past/
unef1mandate.html>. Acesso em: 23 junho de 2013.
29
A Guerra do Suez, também conhecida como Segunda Guerra Israelo-Árabe ou Crise de Suez, teve início em 29
de outubro de 1956, quando Israel, com o apoio da França e Reino Unido, que utilizavam o canal para ter acesso
ao comércio oriental, declarou guerra ao Egito. O presidente do Egito, Gamal Abdel Nasser havia nacionalizado
o canal de Suez, cujo controle ainda pertencia à Inglaterra. Em consequência, o porto israelense de Eilat ficaria
bloqueado, assim como o acesso de Israel ao mar Vermelho, através do estreito de Tiran, no golfo de Aqaba.
LOPES, Dirceu. A Guerra de Suez. Disponível em: <http://cafehistoria.ning.com/photo/albums/a-guerra-desuez>. Acesso em: 05 jun. 2013.
30
SEITENFUS, Ricardo. Manual das Organizações Internacionais. Porto Alegre: Livraria do advogado, 2000.
24
controvérsias, através da negociação, mediação, conciliação e/ou arbitragem) com o Capítulo
VII (que delimita o uso da força para resolução de litígios). Ou seja, esse “capítulo VI e meio”
seria uma ponte entre a adoção de medidas voltadas para a solução pacífica de controvérsias e
a aplicação de medidas coercitivas. 31
Ainda dentro do marco institucional das operações de paz, no capítulo VIII, o artigo
52 permite a ONU estabelecer alianças com outras organizações regionais para a execução
das operações de paz e, por consequência, os objetivos propostos pela ONU.
O capítulo traz em seu texto:
Nada na presente Carta impede a existência de acordos ou de
entidades regionais, destinadas a tratar dos assuntos relativos à
manutenção da paz e da segurança internacionais que forem
suscetíveis de uma ação regional, desde que tais acordos ou entidades
regionais e suas atividades sejam compatíveis com os Propósitos e
Princípios das Nações Unidas. 32
Essas possíveis alianças, atualmente, caracterizam um importante papel, uma vez que
contribuem civil, militar e financeiramente para as operações de manutenção de paz da ONU.
Para tanto, as Nações Unidas possuem em sua estrutura o Departamento de Operações de
Manutenção da Paz (DPKO da sigla, em inglês), que é responsável por manter um estreito
contato com organizações governamentais e não governamentais (ONGs) no contexto das
operações de paz. O DPKO atua, ainda, mantendo ligação direta com o Conselho de
Segurança e com os países que contribuem com recursos humanos, materiais e financeiros em
prol da paz, trabalhando como organismo integrador dos esforços entre as agências da ONU e
entidades, governamentais ou não, no contexto dessas operações. 33
Nas próximas seções, busca-se entender as evoluções históricas das operações de paz e
analisar mais detalhadamente os acordos regionais.
31
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (org). Carta das Nações Unidas. 1945. Disponível em:
http://unicrio.org.br/img/CartadaONU_VersoInternet.pdf. Acesso em: 12 jun.2013
32
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (org). Carta das Nações Unidas. 1945. Disponível em:
http://unicrio.org.br/img/CartadaONU_VersoInternet.pdf. Acesso em: 12 jun.2013
33
Andersson, Andreas. “Democracies and UN Peacekeeping Operations, 1990-1996. In. International
peacekeeping, vol. 7, no. 2, 2000, pp. 1-22.
25
1.3. As Operações de Manutenção da Paz
1.3.1. A Inoperância durante a Guerra Fria
Com a criação das Nações Unidas, a comunidade internacional procurou não repetir os
erros que levaram ao fracasso da Liga das Nações.
34
Ao buscar, assim como a LDN, uma
ordem internacional mais estável e pacífica, a ONU criou as operações de manutenção da paz,
como visto na seção anterior. Contudo, com o fim da Segunda Guerra Mundial e o início da
Guerra Fria, as decisões sobre a paz e segurança internacionais acabaram restringindo a
atuação das Nações Unidas durante este período, principalmente nos quadros de arranjos
regionais.
O antagonismo entre os Estados Unidos (EUA) e a União das Repúblicas Socialistas
Soviéticas (URSS), que caracterizou as relações internacionais do período, foi também
transferido ao Conselho de Segurança e, consequentemente, impediu que tal órgão cumprisse
plenamente seus propósitos no âmbito das operações de paz e segurança. 35
O congelamento do CSNU durante a Guerra Fria torna-se ainda mais evidente se
considerado os diversos conflitos ocorridos no sistema internacional entre 1945 e o final da
década de 1980,
36
como as guerras anticoloniais, de libertação nacional, e revolucionárias
que, de certa forma, transferiram a rivalidade entre as superpotências.
37
Denota-se, também,
que a maioria dos conflitos envolvia essencialmente unidades soberanas, opondo dois ou mais
Estados dispostos a garantirem em seus objetivos nacionais e preservarem seu território contra
a agressão externa. Os aparatos militares eram bem definidos e a guerra poderia ser entendida
como um conflito entre forças armadas de dois ou mais Estados. O sistema internacional do
período em questão representava um momento de incertezas e de completa instabilidade,
principalmente no campo político e diplomático. O mundo estava separado em Leste-Oeste e
34
ALMEIDA, Renato. A Liga das Nações: constituição, estrutura e funcionamento. Rio de Janeiro: A. Noite,
1938. 342p.
35
BUZAN, Barry and WAEVER, Ole: Regions and Powers. The Structure of International Security, Cambridge
2003.
36
FERRO, Marc. História das colonizações: das conquistas às independências. São Paulo: Companhia das Letras,
1996.
37
“(...) muitos poucos Estados do Terceiro Mundo, de qualquer tamanho, atravessaram o período a partir de 1950
(ou da data de sua fundação) sem revolução; golpes militares para suprimir, impedir ou promover revoluções; ou
alguma outra forma de conflito armado interno. (...) Essa persistente instabilidade social e política do Terceiro
Mundo dava-lhe seu denominador comum”. HOBSBAWN, Eric. Era dos Extremos: O breve século xx, 19141991. In: HOBSBAWN, Eric. A era dos Extremos: O breve século xx, 1914-1991. São Paulo: Companhia Das
Letras., 1949. p. 89 - 120.
26
até tentativas de movimentos de não alinhamento eram vistos de forma negativa entre as
partes beligerantes – EUA e URSS. 38
Foi nesse contexto marcado pelo fim dos impérios coloniais e pela eclosão de diversos
conflitos que o CSNU muitas vezes se absteve de exercer suas funções nas operações de paz e
segurança, essencialmente porque seus dois principais membros estavam direta ou
indiretamente envolvidos em tais disputas. Mesmo quando o CSNU decidia se posicionar a
respeito de certas questões, geralmente o fazia pelo interesse de uma das superpotências em
legitimar suas ações. Na prática, tanto os Estados Unidos quanto a União Soviética exerciam
influência nos órgãos multilaterais de discussões dentro do Sistema das Nações Unidas. 39
Diante desta relação de causa e efeito, o CSNU só autorizou a primeira operação de
paz em 1948, denominada “Organização das Nações Unidas para a Supervisão da Trégua”
(UNTSO), com o objetivo de monitorar o cessar-fogo entre árabes e israelenses. A partir
desta, foram inauguradas o que se convencionou chamar de operações tradicionais,
classificação que abrange missões compostas por pessoal desarmado ou fracamente armado,
que visavam o monitoramento de cessar-fogo, tréguas, o patrulhamento de fronteiras e zonas
de exclusão militar, o apoio à retirada de tropas e o acompanhamento de negociações para a
assinatura de tratados de paz. 40
As operações mencionadas acima, denominadas tradicionais, vigoraram até o final da
década de 1990. Durante este período, foram colocadas em execução 15 missões, compostas
tanto por pessoal desarmado (forças de observação, por exemplo, a Missão do Representante
do Secretário-Geral na República Dominicana (DOMREP),
41
a Missão de Observação das
Nações Unidas Índia Paquistão (UNIPOM) e a Missão de Observação Militar das Nações
Unidas no Irã e Iraque (UNIMOG) como por tropas armadas (forças de paz, entre as quais, a
Missão de Observação Militar das Nações Unidas no Kuwait e Iraque (UNIKOM), a
Operação das Nações Unidas na Somália I e II (UNOSOM I e II), a Missão das Nações
Unidas para o Referendo do Saara Ocidental (MINURSO) e a Missão de Verificação das
38
FONTOURA, P. R. C. T. O Brasil e as Operações de Manutenção da Paz das Nações Unidas. Brasília: Instituto
Rio Branco.
39
FRANCO, A. Armed Nonstate Actors. MALONE, D. Decision-making in the UN Security Council:19451989. Nova Iorque: Oxford. P. 32 - 35
40
Idem.
41
O Secretário-Geral, na introdução de seu relatório anual sobre o trabalho da organização, abrangendo o período
a partir de 16 junho de 1964 a 15 de Junho 1965, a discussão dos problemas e do caráter do papel das Nações
Unidas na situação da República Dominicana. Ele descreveu a tarefa de seu representante lá como uma nova
missão das Nações Unidas na categoria de manutenção da paz. Organização das Nações Unidas – Relatório
Anual de 1965. Disponível em: http://www.un.org/en/peacekeeping/missions/past/domrepbackgr.html. Acessado
em 04 de julho de 2013.
27
Nações Unidas na Angola (UNAVEM II).42 O baixo número de missões operacionalizadas
neste período, longe de significar uma diminuição dos conflitos internacionais, reforça a
supracitada paralisia do Conselho de Segurança durante a Guerra Fria. 43
O quadro abaixo44 apresenta as missões de paz levadas a cabo pela ONU de 1948 até
1988, período de ocorrência da Guerra Fria.
Operações de Manutenção da Paz – 1948/1988
Local
UNTSO – Fronteira Árabe-israelense
UNMOGIP – Índia e Paquistão
UNEF I – Egito
UNOGIL – Líbano
ONUC – Congo
UNSF – Indonésia
UNYOM – Iêmen
UNFICYP – Chipre
DOMREP – República Dominicana
UNIPOM – Índia e Paquistão
UNEF II – Egito
UNDOF – Síria
UNIFIL – Líbano
UNGOMAP – Afeganistão e Paquistão
UNIMOG – Irã e Iraque
Duração
1948 – Atual
1949 – Atual
1956 – 1967
1958 – 1958
1960 – 1964
1962 – 1963
1963 – 1964
1964 – Atual
1965 – 1966
1965 – 1966
1973 – 1979
1974 – Atual
1978 – Atual
1988 – 1990
1988 – 1991
Objetivos
Monitorar cessar-fogo
Monitorar cessar-fogo
Supervisionar retirada de tropas
Prevenir a entrada de tropas e armamentos
Prevenir intervenção estrangeira
Monitorar cessar-fogo
Supervisionar o conflito
Prevenir o conflito
Monitorar o conflito
Monitorar cessar-fogo
Supervisionar a retirada de tropas
Monitorar cessar-fogo
Supervisionar retirada de tropas
Estabelecer a não interferência mútua
Monitorar cessar-fogo
Fonte: DKPO/ONU
Elaboração Própria
Conforme o quadro acima, no período da Guerra Fria, percebe-se a tímida atuação das
Nações Unidas em relação ao número de conflitos que suscitaram na época: foram apenas 15
operações em, aproximadamente, 40 anos. 45
O baixo desempenho também é perceptível no que tange os arranjos regionais, que
devem ser entendidos como tratados multilaterais nos quais os Estados-Membros e
Organizações concordam em canalizar suas diferenças por meio dos mecanismos previstos,
como se verá melhor adiante. As possibilidades de ações multilaterais militares coercitivas
autorizadas pela ONU no marco do seu sistema de segurança coletiva, através do Capítulo
42
CARDOSO, Afonso J. S. Reunião de Estudos: Operações de Paz. IV Reunião de Estudos: Operações de Paz.
Brasília: Gabinete de Segurança Institucional; Secretaria de Acompanhamento e Estudos Institucionais, 2005.
pp. 9-16.
43
FRANCO, A. Armed Nonstate Actors. MALONE, D. Decision-making in the UN Security Council:19451989. Nova Iorque: Oxford. P. 48 - 80
44
Bobrow, D. e Boyer, M. “Maintaining System Stability: Contributions to Peacekeeping Operations”. In. The
Journal of Conflict Resolution, vol. 41, no. 6, 1997, pp. 723-748.
45
Bobrow, D. e Boyer, M. “Maintaining System Stability: Contributions to Peacekeeping Operations”. In. The
Journal of Conflict Resolution, vol. 41, no. 6, 1997, pp. 723-748.
28
VIII, eram extremamente raras, podendo-se considerar três casos em que estes acordos
aconteceram. 46
Com efeito, durante esses cerca de 40 anos, os acordos militares de segurança
internacional emergiam mais no âmbito de alianças bilaterais ou regionais e menos centrados
na ONU.47 Destacadamente a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) e o Pacto
de Varsóvia acabaram por trabalhar contrariamente aos princípios preconizados pela ONU,
uma vez que cada uma delas preocupava-se com a segurança de sua própria região e a elas
faltavam o “espírito de solidariedade necessário para a efetividade do trabalho das Nações
Unidas”. 48
Com o final do conflito bipolar, inaugurou-se o período de maior atuação da ONU no
campo da manutenção da paz e segurança internacionais, foram instituídas 38, verificando-se
inclusive, avanços em ações nos quadros dos arranjos regionais em matéria de paz, a luz do
Capítulo VIII. 49
1.3.2. O Cenário Pós Guerra Fria
O fim da URSS e a reestruturação da ordem internacional proporcionaram uma nova
oportunidade para as Nações Unidas cumprirem seus propósitos como instituição promotora
da paz e segurança internacionais; uma oportunidade para fortalecer o sistema multilateral e
buscar uma ordem mundial mais estável, livre do antagonismo Leste-Oeste que dominou a
maioria de suas deliberações por mais de quarenta anos. Um dos principais debates sobre a
ideia de fortalecimento da ONU no pós-Guerra Fria dizia respeito à necessidade de revisão
dos instrumentos de defesa, de paz e de segurança, ou ao menos, uma atitude mais proativa
das nações para que os mecanismos já existentes fossem colocados em prática. 50
46
CARDONA LLORENS, J., “El mantenimiento de la paz y la seguridad internacionales”, en DÍEZ DE
VELASCO, M., Las organizaciones internacionales, Tecnos: Madrid, 11ª edición, 1999, pp.230- 273.
47
O Cap. VIII da Carta da ONU permite a existência de acordos ou de entidades regionais de segurança, mas
prevê um papel de supervisão geral pelo Conselho de Segurança em relação às ações coercitivas destes corpos.
Este último aspecto, entretanto, teve pouca repercussão, em termos concretos, durante a Guerra Fria (ROBERTS
e KINGSBURY, 1993, p. 31).
48
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. An Agenda for Peace.1992 Disponível em:http://www.un.org/D
ocs/SG/agpeace.html. Acessado em 01 de julho de 2013.
49
NATIONS, Dpko - United. Past Peacekeeping Operations. Disponível em: <http://www.un.org/en/peacekee
ping/operat ions/past.shtml>. Acesso em: 03 jun. 2013.
50
LOPEZ, Ernesto. “Nova problemática de segurança e “novas ameaças”. pp. 70-71. IN: MATHIAS, S. K.;
29
Não tardou para que a organização, na figura de seus principais dirigentes,51
percebesse que o cenário pós-1989 apresentava um panorama muito diferente daquele no qual
a ONU foi fundada.
52
Na ocasião da Conferência de São Francisco, em 1945, o conceito de
“segurança internacional”, baseado na proteção do Estado, era predominante e, por
consequência, refletiu-se na estrutura e nos propósitos do que viriam a ser as Nações Unidas,
uma instituição intergovernamental que busca, entre outras, zelar pela inviolabilidade das
fronteiras territoriais e, portanto, proíbe a ingerência externa nos assuntos internos dos
Estados soberanos.
53
Esse conceito foi instrumentalizado a partir do mecanismo de
“segurança coletiva”, que possui um enfoque basicamente militar por meio do qual os
Estados-Membros da Organização renunciam ao uso da força e se comprometem a defender
qualquer membro do grupo que sofra uma agressão. 54
Ainda no que tange os questionamentos em relação às Nações Unidas e as operações
de paz, em junho de 1992, o Secretário-Geral da ONU, Boutros Boutros-Ghali55 apresentou o
relatório intitulado “An Agenda for Peace: Preventive diplomacy, peacemaking and peacekeeping”. 56 Com este documento, Ghali buscava definir conceitualmente as diferentes formas
de ação nos campos da paz, através das operações de “peacekeeping, peacemaking e
peacebuilding”. Contudo, seu relatório ia além de simplesmente definir os estágios de um
conflito e as técnicas de monitoramento, prevenção e resolução de controvérsias que eram
empregadas pela organização. O secretário-geral buscava envolver a ONU, plenamente, com
as operações de seu início ao fim, desde as etapas mais recentes do conflito ao estágio de
SOARES, S. A. (orgs). Novas Ameaças: Dimensões e Perspectivas: desafios para a cooperação em defesa entre
Brasil e Argentina. São Paulo: Sicurezza, 2003. pp. 59-90.
51
Aqui se faz referência principalmente aos ex-Secretários-Geral Javier Perez de Cuellar (mandato entre 19821991) e Boutros Boutros-Ghali (mandato entre 1992-1996), que foram importantes nas discussões sobre o papel
da ONU no Pós-Guerra Fria. NATIONS, United. General Secretaries. Disponível em: <http://www.un.org/sg/>.
Acesso em: 20 abr. 2013.
52
HOLSTI, Kalevi J. The state, war, and the state of war. Cambridge: Cambridge University Press, 1996.
53
O Relatório da Comissão sobre Governança Global também discute o conceito de “segurança comum”.
(Comissão sobre Governança Global. Nossa comunidade global. Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getúlio
Vargas, 1996. p.59).
54
A/ 40/ 553, Estudios sobre los conceptos de seguridad, 1985. Apud LOPEZ, (2003), op. cit., p. 71.
55
Boutros-Ghali, Boutros (1992), An Agenda for Peace: Preventive Diplomacy, Peacemaking and Peacekeeping. Report of the Secretary-General pursuant to the statement adopted by the Summit Meeting of the
Security Council on 31 January 1992 (A/47/277 - S/24111, 17 de Junho de 1992). Acessado em 18 junho de
2013. http://www.un.org/docs/SG/agpeace.html.
56
A Agenda para a Paz de 1992 apresentava um esboço ousado para missões de manutenção e de imposição da
paz das Nações Unidas, e ajudou a orientar a racionalização do Departamento das Nações Unidas para
Operações de Manutenção da Paz. Além do mais, nos anos que se seguiram, o secretariado sofreu reformas para
se tornar mais eficiente e eficaz. Contudo, qualquer alteração que requeira consenso e compromisso por parte
dos Estados membros tem sido mais difícil de alcançar. Neves, Gilda Motta Santos. Comissão das Nações
Unidas para Consolidação da Paz: perspectiva brasileira / Gilda Motta Santos Neves. – Brasília : FUNAG, 2009.
236 p. il.; mapa
30
reconstrução do país e a instituição do novo Governo.
57
Boutros-Ghali também discutiu, em
seu relatório, os acordos regionais, previstos no capítulo VIII, para a execução das operações
de paz de forma conjunta e coordenada de acordo com os princípios e propósitos das Nações
Unidas. O relatório se referia, por exemplo, a indefinição do conceito de arranjos regionais e
organizações internacionais, como se analisará melhor adiante.
58
Devido ao seu pioneirismo, An Agenda for Peace tornou-se um dos principais
relatórios na área de paz e segurança, pois, preencheu um vazio conceitual que caracterizou as
atividades de manutenção de paz da ONU por mais de quarenta anos, uma vez que a Carta de
São Francisco não previa a utilização de mecanismos de solução de controvérsias baseados no
envio de tropas multinacionais que atuariam no terreno, por exemplo, pautando-se nos
princípios da imparcialidade, do consentimento das partes em conflito e do uso da força
somente em legítima defesa.59 Assim, o relatório apresentado por Ghali60 representou um
desenvolvimento importante no quadro nas operações da ONU em todos os seus sentidos.
Obviamente, o relatório não respondeu todas as perguntas. Porém, sem dúvida, apontou
direcionamentos, antes ausentes na Carta de São Francisco, às questões já levantadas durante
as missões humanitárias realizadas. A mudança da natureza dos conflitos internacionais e os
desafios que estes representaram à prática das operações da paz até então adotada pela ONU,
certamente impulsionaram a necessidade de se definir os parâmetros e os limites dessa
atuação. 61
O período pós-Guerra Fria permitiu, então, que a ONU revisasse o conceito de
57
Boutros-Ghali, Boutros (1992), An Agenda for Peace: Preventive Diplomacy, Peacemaking and Peacekeeping. Report of the Secretary-General pursuant to the statement adopted by the Summit Meeting of the
Security Council on 31 January 1992 (A/47/277 - S/24111, 17 de Junho de 1992). Acessado em 18 junho de
2013. http://www.un.org/docs/SG/agpeace.html.
58
Boutros-Ghali, Boutros (1992), An Agenda for Peace: Preventive Diplomacy, Peacemaking and Peacekeeping. Report of the Secretary-General pursuant to the statement adopted by the Summit Meeting of the
Security Council on 31 January 1992 (A/47/277 - S/24111, 17 de Junho de 1992). Acessado em 18 junho de
2013. http://www.un.org/docs/SG/agpeace.html.
59
Idem.
60
“O episódio da não reeleição de Boutros-Ghali foi emblemático. O ex-vice-premier egípcio não tinha uma
agenda muito diversa daquela pregada pelos Estados Unidos. Suas iniciativas, no plano estratégico, eram
perfeitamente compatíveis com a visão do governo Clinton sobre o que se chamava, então, de multilateralismo
afirmativo (assertive multilateralism). Prezava, porém, a autonomia de ação e não estava disposto a abdicar do
seu julgamento no plano tático. Algumas de suas atitudes desagradaram à única superpotência que restara. Sua
insistência na cautela e no papel da ONU na autorização do emprego da força em relação à antiga Iugoslávia e,
sobretudo, sua sinceridade ao responsabilizar as Forças de Segurança de Israel pelo bombardeio que atingiu o
escritório da ONU em Qana, no Líbano, levaram o governo norte-americano a retirar-lhe o apoio, sem o qual não
conseguiu ser reconduzido”. CELSO AMORIM: O SIGNIFICADO DAS NOVAS LIDERANÇAS MUNDIAIS.
Brasília: Carta Capital, 03 jul. 2011. Disponível em: <http://www.viomundo.com.br/voce-escreve/celso-amorimo-significado-das-novas-liderancas-mundiais.html>. Acesso em: 08 jul. 2013.
61
DURCH, William J. (Org.). The evolution of UN peacekeeping: case studies and comparative analysis. New
York: Henry L. Stimson Center/ St Martin’s Press, 1993. 477p.
31
segurança até então adotado, que predominou em seus debates e ações durante quase meio
século. A noção de segurança internacional estratégico-militar, que se preocupava quase que
exclusivamente com os interesses dos Estados, foi ampliada para uma concepção que
abrangesse também as dimensões humana e social,
62
que passaram a representar a maior
parte dos problemas com os quais as Nações Unidas tiveram que lidar durante a década de
1990. 63
Simultaneamente às discussões sobre a multidimensionalidade64 da segurança, e
diretamente ligado a elas, o CSNU começou a superar a inoperância que o caracterizou
durante o período de divergências entre os Estados Unidos e a União Soviética. O imobilismo
do Conselho de Segurança devido ao uso do veto65 acabou por reduzir as operações de paz às
ações que desencorajassem o envolvimento das grandes potências em guerras civis e que
monitorassem as guerras de independência nos antigos impérios coloniais. 66
Desta forma, após o período da Guerra Fria, o sistema internacional assiste ao
“renascimento” das Nações Unidas. O cenário bélico que se impôs de forma contundente
neste contexto desafiou cada vez mais as práticas de manutenção da paz e resolução de
conflitos até então adotadas por esta organização. Deste cenário surgiram incertezas políticas,
62
United Nations Development Programme (UNDP). Human Development Report 1994. New York: Oxford
University Press, 1994. Disponível e <http://hdr.undp.org/en/reports/global/hdr1994/ chapters/> Acessado em 19
de maio de 2013.
63
CARDONA LLORENS, J., “El mantenimiento de la paz y la seguridad internacionales”, en DÍEZ DE
VELASCO, M., Las organizaciones internacionales, Tecnos: Madrid, 11ª edición, 1999, pp.230- 273.
64
De acordo com VILLA, a segurança global multidimensional “não se constitui só de conteúdo estratégicomilitar, mas também de outros conteúdos transnacionais como explosão demográfica, desequilíbrios ecológicos e
migrações internacionais, que fazem com que a segurança internacional seja encarada sob diferentes ângulos”
(VILLA, R. A. D. Da crise do realismo à segurança global multidimensional. São Paulo: Annablume, 1999. p.
170).
65
O Artigo 27 das Nações Unidas afirma: 1) Cada membro do Conselho de Segurança terá um voto.
2) Decisões do Conselho de Segurança sobre questões processuais, serão tomadas pelo voto afirmativo de nove
membros. 3) Decisões do Conselho de Segurança em todos os outros assuntos serão tomadas pelo voto
afirmativo de nove membros, incluindo os votos afirmativos dos membros permanentes, desde que, nas decisões
previstas no Capítulo VI, parágrafo 3 do Artigo 52, uma reunião deverá ser realizada pela abstenção do voto.
Embora o "poder de veto" não seja mencionado explicitamente na Carta da ONU, as decisões do Conselho de
Segurança exige "os votos dos membros permanentes", significa que qualquer um desses membros permanentes
podem impedir a adoção de qualquer assunto adicional sobre alguma resolução. Por essa razão, o "poder de
veto" também é um princípio unânime das grandes potências. ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (org).
Carta das Nações Unidas. 1945. Disponível em: http://unicrio.org.br/img/CartadaONU_VersoInternet.pdf.
Acesso em: 05 jun.2013
66
Do total de quinze operações de manutenção da paz conduzidas entre 1948 e 1988, apenas uma não se destinou
a atuar em conflitos surgidos da descolonização europeia. Todas essas operações foram conduzidas em países em
desenvolvimento, a maioria em países do Oriente Médio. Vale ressaltar que essas operações de manutenção da
paz tiveram sua atuação limitada tanto pelo caráter predominantemente militar do corpo de funcionários
engajado - poucos civis participaram dessas operações - quanto pelo número limitado de países que contribuíram
com o envio de tropas para a execução dos mandados. HAAS, Ernest B. The United Nations and collective
management of international conflict. New York: United Nations Institute for Training and Research (UNITAR),
1999.
32
jurídicas e morais que marcaram a atuação da ONU durante a década de 1990, confrontando
os princípios basilares sob os quais a instituição foi fundada: respeito à soberania, à
integridade territorial e à independência política dos Estados. 67
Durante esta mesma década, o CSNU autorizou 39 novas operações de paz, seguindo a
tendência de aumento da aprovação de novas missões, como apresenta a tabela abaixo. 68
Operações de Manutenção da Paz – 1989/1999
Local
UNAVEM I – Angola
UNTAG – Namíbia
ONUCA – Nicarágua
UNIKOM – Iraque e Kuwait
UNAVEM II – Angola
ONUSAL – El Salvador
MINURSO – Saara Ocidental
UNAMIC – Camboja
UNPROFOR e UNPREDEP – Croácia – Bósnia e Macedônia
UNTAC – Camboja
UNOSOM I – Somália
ONUMOZ – Moçambique
UNOSOM II – Somália
UNOMUR – Uganda e Ruanda
UNOMIG – Geórgia
UNOMIL – Libéria
UNMIH – Haiti
UNAMIR – Ruanda
UNASOG – Chade
UNMOT – Tadjiquistão
UNAVEM III – Angola
UNCRO – Croácia
UNPREDEP – Albânia
UNMIBH – Bósnia-Herzegovina
UNTAES – Croácia
UNMOP – Croácia
UNSMIH – Haiti
MINUGUA – Guatemala
MONUA – Angola
UNTMIH – Haiti
MIPONUH – Haiti
UNPSG – Croácia
67
Duração
1989 – 1991
1989 – 1991
1989 – 1992
1991 – 2003
1991 – 1995
1991 – 1995
1991 – Atual
1991 – 1992
1992 – 1995
1992 – 1993
1992 – 1993
1992 – 1994
1993 – 1995
1993 – 1994
1993 – 1997
1993 – 1996
1993 – 1996
1993 – 1996
1994 – 1994
1994 – 2000
1995 – 1997
1995 – 1997
1995 – 1996
1995 – 2002
1996 – 1998
1996 – 2002
1996 – 1997
1997 – 1997
1997 – 1999
1997 – 2000
1997 – 2000
1998 – 1998
Objetivos
Supervisionar a retirada de tropas
Supervisionar as eleições
Monitorar o cessar-fogo
Impor segurança na fronteira
Impor cessar-fogo
Impor cessar-fogo
Impor cessar foro
Preparar o terreno para atuação
Proteger a região
Assistência à reorganização
Assegurar o cessar-fogo
Monitorar o cessar-fogo
Estabilização
Assegurar o cessar-fogo
Impor o cessar-fogo
Monitorar o cessar-fogo
Estabilização
Monitorar o cessar-fogo
Monitorar a retirada de tropas
Monitorar o cessar-fogo
Monitorar o cessar-fogo
Implementar o cessar-fogo
Substituir a UNPROFOR
Monitorar os Direitos Humanos
Supervisionar a integração
Monitorar a desmilitarização
Modernização a polícia e o exército
Monitorar o cessar-fogo
Monitorar o cessar-fogo
Estabilização
Modernizar as forças policiais
Monitorar a polícia
ADEBAJO, A.; KEEN, D. Sierra Leone. p. 261. In: BERDAL, M.; ECONOMIDES, S. (eds.). United Nations
Interventionism 1991-2004. 2ª ed. Cambridge: Cambridge University Press, 2007. pp.246-273.
68
Bobrow, D. e Boyer, M. “Maintaining System Stability: Contributions to Peacekeeping Operations”. In. The
Journal of Conflict Resolution, vol. 41, no. 6, 1997, pp. 723-748.
33
MINURCA – República Centro Africana
UNOMSIL – Serra Leoa
UNMIK – Kosovo
UNAMSIL – Serra Leoa
UNTAET – Timor Leste
MONUC – República Democrática do Congo
1998 – 2000
1998 – 1999
1999 – Atual
1999 – Atual
1999 – 2002
1999 – Atual
Estabilização
Monitorar o desarmamento
Exercer autoridade administração
Estabilização
Transição para a independência
Monitorar o cessar-fogo
Fonte: DKPO/ONU
Elaboração Própria
As operações listadas acima representam os grandes esforços feitos pela ONU, nos
últimos anos, no campo da paz e da segurança internacionais. Ao comparar essas 39
intervenções realizadas nos últimos 10 anos, com o período da Guerra Fria, quando apenas 15
operações foram estabelecidas, denota-se o quanto a ONU tem atuado no fortalecimento da
paz.
69
Essa situação apenas reforça que a ONU consolidou-se como um espaço privilegiado
de diálogo entre os Estados-Membros e possibilitou a atuação dos mesmos para a
estabilização e a manutenção da paz nas zonas de conflito em todo o mundo. Destaca-se
também uma alteração da situação do CSNU, do sistema internacional e dos mecanismos da
ONU. 70
Após o conflito bipolar, uma mudança no quadro dos arranjos internacionais também
deve ser observada. Praticamente inexistentes, como visto, no período de Guerra Fria e da
consequente inoperância do CSNU, os acordos regionais, objeto desse estudo, a partir da
década de 1990, começam a se efetivar.
O já mencionado relatório do secretário-geral, An Agenda for Peace, classificou este
período, pós-guerra fria, como uma nova era de oportunidades para as ações conjuntas em
matéria de paz, como se destaca abaixo.
Neste sentido,
(...) nessa nova era de oportunidades, arranjos ou agências regionais
podem render grandes serviços se suas atividades são realizadas em
maneira consistente com os propósitos e princípios da Carta, e se seu
relacionamento com as Nações Unidas, e particularmente com o
Conselho de Segurança, é governado pelo capítulo VI. 71
69
Bobrow, D. e Boyer, M. “Maintaining System Stability: Contributions to Peacekeeping Operations”. In. The
Journal of Conflict Resolution, vol. 41, no. 6, 1997, pp. 723-748.
70
JAMES, Alan. Peacekeeping in international politics. London: MacMillan/International Institute for Stategic
Studies, 2005. 378p.
71
Do original: (...) in this new era of opportunity, regional arrangements or agencies can render great service if
their activities are undertaken in a manner consistent with the Purposes and Principles of the Charter, and if their
relationship with the United Nations, and particularly the Security Council, is governed by Chapter VIII.”
Boutros-Ghali, Boutros (1992), An Agenda for Peace: Preventive Diplomacy, Peacemaking and Peace-keeping.
Report of the Secretary-General pursuant to the statement adopted by the Summit Meeting of the Security
34
Tal constatação se confirma quando analisados alguns acordos realizados logo no
começo da década de 1990. No continente africano, por exemplo, três diferentes grupos
regionais, a Organização da Unidade Africana (OUA), a Liga dos Estados Árabes e a
Organização da Conferência Islâmica, uniram esforços com as Nações Unidas nas missões de
paz na Somália, em 1992. No contexto asiático, a Associação das Nações do Sudeste Asiático
e Estados individuais de várias regiões foram levados juntamente com as partes envolvidas no
conflito do Camboja, em uma conferência internacional em Paris, para trabalhar com a ONU,
também em 1992. 72
Esta mesma situação também se configurou nas Américas e na Europa. Em 1991, com
as missões em El Salvador, onde se formalizou um arranjo único, denominado "Os Amigos do
Secretário-Geral", que contribuiu para acordos alcançados através da mediação do SecretárioGeral no conflito. Na República da Nicarágua, se envolveu um esforço altamente complexo,
para o cessar-fogo em 1989, que foi iniciado por líderes da região e conduzido pelos Estados,
grupos de Estados e pela Organização dos Estados Americanos (OEA). Por fim, no velho
continente, os esforços empreendidos pela antiga Comunidade Europeia e os seus EstadosMembros, com o apoio dos países participantes na Conferência sobre Segurança e
Cooperação na Europa, têm sido de importância central para lidar com a crise nos Bálcãs e
áreas vizinhas, desde as ações conjuntas de 1992, com a Força de Proteção das Nações Unidas
(UNPROFOR) e a Força de Implementação Preventiva das Nações Unidas (UNPREDEP). 73
Neste contexto, ainda nas operações de paz, as tabelas apresentadas anteriormente
também ajudam a explicar a mudança drástica do contexto estratégico para as tropas de paz da
ONU, fazendo com que a Organização expandisse seu campo de atuação, das missões
“tradicionais”
74
, que em sua maioria tinha a finalidade de manter e/ou auxiliar na
implementação de acordos (incluindo um cessar-fogo) entre países que estavam anteriormente
em guerra, envolvendo somente tarefas militares; para as missões ditas complexas operações
Council on 31 January 1992 (A/47/277 - S/24111, 17 de Junho de 1992). Acessado em 18 junho de 2013.
http://www.un.org/docs/SG/agpeace.html.
72
Idem.
73
Boutros-Ghali, Boutros (1992), An Agenda for Peace: Preventive Diplomacy, Peacemaking and Peacekeeping. Report of the Secretary-General pursuant to the statement adopted by the Summit Meeting of the
Security Council on 31 January 1992 (A/47/277 - S/24111, 17 de Junho de 1992). Acessado em 18 junho de
2013. http://www.un.org/docs/SG/agpeace.html.
74
Bernal-Meza, Raul. “Multilateralismo e Unilateralismo na Política Mundial”. In. Revista Brasileira de Política
Internacional, vol. 48, no. 1, 2005, pp. 5-23.
35
“multidimensionais”,
75
que constituem em ações com componentes civis, incluindo o apoio
referente aos direitos humanos, eleições, desarmamento, desmobilização, remoção de minas e
assistência às instituições da administração civil, especialmente as forças policias, assim como
as operações humanitárias, conduzidas por uma variedade de organizações internacionais e
não governamentais que requerem proteção, criadas para assegurar a implementação de
acordos de paz abrangentes e ajudar a estabelecer as bases para uma paz sustentável.
Hoje, as operações realizam uma grande variedade de tarefas, desde ajudar a instituir
governos, monitorar o cumprimento dos direitos humanos, assegurar reformas setoriais, o
desarmamento, e a desmobilização e reintegração de ex-combatentes, como a Missão das
Nações Unidas de Apoio a transição do Timor-Leste para a independência e a Missão de
Administração Interina no Kosovo, ambas realizadas em 1999.
76
A natureza dos conflitos
também mudou ao longo dos anos. Originalmente desenvolvidas como uma maneira de lidar
com as desordens internacionais, as operações de paz têm atuado cada vez mais em conflitos
internos e guerras civis. Embora a força militar permaneça como o suporte principal da
maioria das operações, atualmente as missões contam com administradores e economistas,
policiais e peritos em legislação, especialistas em desminagem e observadores eleitorais,
monitores de direitos humanos e experts em governança e questões civis, trabalhadores
humanitários, técnicos em comunicação e informação pública, etc. 77
A tabela abaixo78 mostra o conjunto de missões de paz realizadas a partir dos anos
2000 e reforça a afirmação da multidimensionalidade das ações no pós-Guerra Fria se
observado os objetivos de cada uma das operações listadas.
Operações de Manutenção da Paz – 2000/2013
Local
UNMEE – Etiópia e Eritréia
UNMISET – Timor-Leste
UNMIL – Libéria
UNOCI – Costa do Marfim
MINUSTAH – Haiti
ONUB – Burundi
UNMIS – Sudão
75
Duração
2000 – 2008
2002 – 2005
2003 – Atual
2004 – Atual
2004 – Atual
2004 – 2006
2005 – 2011
Objetivos
Impor o cessar-fogo
Garantir a segurança e a estabilidade
Impor o cessar-fogo e treinar a polícia nacional
Facilitar a instauração de um processo de paz
Estabilizar o Haiti
Ajudar a implementar os acordos de Arusha
Apoiar um tratado de paz e assistência humanitária
Idem.
Bolton, John. “United States Policy on United Nations Peacekeeping”. In. World Affairs, vol. 163, no. 4, 2011,
pp. 129-147
77
United Nations, Report of the Panel on United Nations Peace Operations (...), op. cit., paragraphs 65-75.
78
Bobrow, D. e Boyer, M. “Maintaining System Stability: Contributions to Peacekeeping Operations”. In. The
Journal of Conflict Resolution, vol. 41, no. 6, 1997, pp. 723-748.
76
36
UNMIT – Timor-Leste
UNAMID – Darfur
MINURCAT – Chade
MONUSCO – Congo
UNISFA – Sudão
UNMISS – Sudão do Sul
UNSMIS – Síria
MINUSMA – Mali
2006 – Atual
2007 – Atual
2007 – 2010
2010 – Atual
2011 – Atual
2011 – Atual
2012 – 2012
2013 – Atual
Estabilizar o Timor-Leste
Proteção de Civis e assistência humanitária
Promover os direitos humanos e o Estado de Direito
Formar e Promover o Estado de Direito
Monitoramento de fronteiras
Consolidar a Paz
Monitorar o cessar-fogo
Apoiar o processo político e organização do Estado
Fonte: DPKO
Elaboração Própria
Diante desse quadro, destaca-se que as missões de paz das Nações Unidas continuam a
evoluir, tanto numericamente, como operacionalmente, para responder a novos desafios e
realidades políticas.79 Frente à crescente demanda por missões cada vez mais complexas e
multidimensionais, a ONU tem recorrido, como já visto, ao apoio de outras organizações
internacionais, com casos nos quatro cantos do mundo.
80
Juridicamente, a ONU se utiliza do
capítulo VIII, de sua Carta fundadora, que lhe permite criar arranjos regionais, que visem à
cooperação.
81
O estreitamento com instituições locais admite aos peacekeepers entender
melhor o contexto da situação e os anseios dos nacionais. 82
Abordagens eficazes de parceria nacional e local, não só reforçam a
legitimidade das operações e o apoio à implementação do seu
mandato, como também ajuda a garantir a sustentabilidade de
qualquer capacidade nacional assim que uma operação de paz tenha
sido retirada. 83
No continente africano, por exemplo, esses arranjos regionais se justificam pelo
conhecimento do locus, a facilidade de comunicação, a “legitimidade” de contar com uma
organização africana a frente das ações, no caso, a União Africana, buscando a agir em prol
do desenvolvimento da paz em seu continente, sem grandes pretensões geoestratégicas e
79
United Nations, Report of the Panel on United Nations Peace Operations (...), op. cit.,paragraphs 76-80.
Idem. Paragraphs 86-91.
81
FONSECA JUNIOR, Gelson. A legitimidade e outras questões internacionais: poder e ética entre as nações.
São Paulo: Paz e Terra, 2003.
82
Idem.
83
Do original: “Effective approaches to national and local ownership not only reinforce the perceived legitimacy
of the operation and support mandate implementation, they also help to ensure the sustainability of any national
capacity once the peacekeeping operation has been withdrawn.” RUGGIE, John G. The United Nations and the
collective use offorce: whither — or whether. New York: United Nations Association of the United States of
America, 2008. 17p.
80
37
geopolíticas. Além disso, os acordos possibilitam o incremento dos aparatos operacionais,
aumentando o número de funcionários em atuação, bem como, a redução dos custos
financeiros e humanos necessários para uma intervenção exitosa. 84
As ações conjuntas entre a ONU e outras organizações requerem uma compreensão
das possibilidades e limitações da atuação, assim como o desenvolvimento de princípios,
regras e procedimentos para governar a parceria entre as partes envolvidas. Serão essas as
questões que serão evidenciadas na seção subsequente, principalmente, de que modo são
estabelecidos os arranjos entre organizações internacionais e quais os mecanismos
institucionais para a realização destes.
1.3.3. O Capítulo VIII: Os Arranjos Internacionais
O fenômeno de divisão de tarefas entre a ONU e os organismos regionais, no que
tange as operações de paz e segurança, está se reforçando como uma constante nas relações
internacionais. 85 Esta cooperação entre as Nações Unidas e as entidades regionais, através de
arranjos, encontra-se disciplinada em diversos artigos presentes na Declaração de São
Francisco. 86
Inicialmente, o artigo 33 da supracitada Carta prevê o “recurso a entidades ou acordos
regionais” como um dos meios de solução pacífica de controvérsias. 87 Entretanto, mesmo que
um litígio seja tratado no âmbito regional, o CSNU poderá “recomendar procedimentos ou
métodos de solução apropriados”, de acordo com o artigo 36.
88
Além disso, caso as partes
não consigam chegar a uma solução nessa esfera, “deverão submeter à demanda ao Conselho
de Segurança”, como determina o artigo 37. 89 Desde modo, os Estados-Membros reconhecem
o CSNU como órgão máximo e de última instância para questões relativas à paz e à segurança
internacionais. Tal noção é extraída do capítulo VIII da Carta, que trata especificamente de
84
LIU, F. T. United Nations peacekeeping and the non-use of force. New York: International Peace Academy,
2006.
85
EVANS, Gareth. Cooperating for peace. St. Leonards: Allen & Unwin, 2003.
86
Malone, D e Wermester, Karin. “Boom or Bust? The Changing Nature of UN Peacekeeping”. In. International
Peacekeeping, vol. 7, no. 4, 2000, pp. 37-54.
87
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (org). Carta das Nações Unidas. 1945. Disponível em:
http://unicrio.org.br/img/CartadaONU_VersoInternet.pdf. Acesso em: 05 jun.2013
88
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (org). Carta das Nações Unidas. 1945. Disponível em:
http://unicrio.org.br/img/CartadaONU_VersoInternet.pdf. Acesso em: 05 jun.2013
89
Em tese, há ainda as exceções do art. 107 e do art. 53,§1 in fine sobre ações contra os “Estados Inimigos”.
Idem.
38
acordos e entidades regionais, como visto anteriormente. Fica claro, já em seu instrumento
inicial, o artigo 52, que se deveria recorrer aos organismos regionais, “antes de submeter às
controvérsias ao Conselho de Segurança”. Por sua vez, o artigo 53 proíbe que uma ação
coercitiva seja levada a efeito por esses acordos ou entidades regionais “sem a autorização do
Conselho”, salvo nos casos previstos no artigo 51, sobre legítima defesa individual ou
coletiva. 90
Por fim, o artigo 54 estabelece, ainda, que todas as ações dos organismos regionais
para a manutenção da paz e da segurança internacionais devem ser comunicadas ao CSNU. 91
Ainda que apenas o CSNU possa decidir sobre o emprego da força como último recurso para
manter ou restabelecer a paz, essas ações coercitivas poderão ser executadas pelos EstadosMembros da ONU “diretamente e, por seu intermédio, nos organismos internacionais
apropriados de que façam parte”, por determinação do próprio Conselho de Segurança,
segundo o prescrito no artigo 48.
92
Desta forma, entende-se que as tramitações sobre os acordos de paz devem respeitar a
lógica apresentada. Ou seja, inicialmente as organizações regionais devem buscar resolver as
controvérsias existentes em suas áreas de influências, não podendo utilizar, para isso, meios
coercitivos. Caso não haja uma resolução, o caso deve ser levado ao conhecimento do CSNU,
que a qualquer momento poderá determinar ações a serem aplicadas.
93
Fica, assim,
assegurado aos acordos e entidades regionais a ampla autonomia para promover a solução
pacífica de controvérsias, mas é limitada a sua liberdade de ação quanto à execução de
medidas coercitivas, sem o prévio consentimento do CSNU.
94
Essa foi a fórmula encontrada
para conciliar a responsabilidade prevista na Carta das Nações Unidas e a autonomia dos
acordos e entidades regionais. 95
Apesar da Declaração de São Francisco adotar as determinações em matérias de
acordos regionais para as operações de paz, como visto, ela não trata de definir
90
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (org). Carta das Nações Unidas. 1945. Disponível em:
http://unicrio.org.br/img/CartadaONU_VersoInternet.pdf. Acesso em: 05 jun.2013
91
Idem.
92
Idem.
93
DÍAZ BARRADO, C. M., VACAS FERNÁNDEZ, F., “Fundamentos jurídicos y condiciones para el ejercicio
de las operaciones de mantenimiento de la paz de naciones Unidas”, Anuario de Derecho Internacional, nº 21,
2005, pp.273- 316.
94
FUENTE COBO, I., “Operaciones de paz para el siglo XXI: Un concepto en evaluación”, Centro de Estudios y
Análisis de Seguridad. Universidad de Granada. Disponível em: http://www.ugr.es/~ceas/Misiones%20de%
20paz/Operaciones%20de%20paz%20para%20el%20siglo%20XXI.pdf. Acessado em 07 de julho de 2013.
95
EVANS, Gareth. Cooperating for peace. St. Leonards: Allen & Unwin. 2003
39
conceitualmente estas ações.
96
Essa imprecisão é recorrentemente criticada e objeto de
preocupação e análises, principalmente pela própria ONU.
97
Segundo Richard Gowan,
tradicionalmente, “a doutrina tem buscado extrair dos aparatos burocráticos e institucionais da
Carta, características gerais que permitam definir ou ao menos limitar o que se deve entender
por acordos regionais”.
98
Com efeito, o então Secretário-Geral da ONU, Boutros-Ghali, reafirmou, no capítulo
VII de seu relatório “An Agenda for Peace”,
99
que não existia uma definição precisa dos
termos “acordos e entidades” regionais.
O ex-secretário-geral afirmou,
A carta deliberadamente não fornece nenhuma definição precisa de
arranjos e agências regionais, permitindo assim com que haja uma
flexibilidade prática para o engajamento de um grupo de Estados na
negociação de assuntos de forma apropriada, contribuindo para a
manutenção da paz e segurança internacionais. Tais associações ou
entidades podem envolver organizações fundadas em tratados, sejam
elas criadas antes ou depois da fundação da ONU, organizações
regionais para a segurança e defesa mútuas, organizações para o
desenvolvimento regional generalizado ou para a cooperação em um
ponto econômico específico ou ainda em uma função e grupos criados
para tratar uma questão especifica política, econômica ou social de
preocupação atual. 100
Diante desta imprecisão conceitual, e para facilitar a compreensão e a metodologia
desta monografia, adota-se as definições presente na publicação intitulada “Manuel sur le
règlement pacifique des différends entre Etats” que descrevem os arranjos e as entidades
regionais como:
96
Bellamy, Alex e Williams, Paul (2004). “Conclusion: What Future for Peace Operations? Brahimi and
Beyond”, International Peacekeeping, 11(1): 183-212.
97
Doss, Alan (2008), “Eyewitness: Crisis, Contention and Coherence – Reflections from the Field”, International
Peacekeeping, 15(4): 570-581.
98
Gowan, Richard (2008), “The Strategic Context: Peacekeeping in Crisis (2006-08)”, International
Peacekeeping, 15(4): 453-469.
99
Boutros-Ghali, Boutros (1992), An Agenda for Peace: Preventive Diplomacy, Peacemaking and Peacekeeping. Report of the Secretary-General pursuant to the statement adopted by the Summit Meeting of the
Security Council on 31 January 1992 (A/47/277 - S/24111, 17 de Junho de 1992). Acessado em 18 junho de
2013. http://www.un.org/docs/SG/agpeace.html.
100
Boutros-Ghali, Boutros (1992), An Agenda for Peace: Preventive Diplomacy, Peacemaking and Peacekeeping. Report of the Secretary-General pursuant to the statement adopted by the Summit Meeting of the
Security Council on 31 January 1992 (A/47/277 - S/24111, 17 de Junho de 1992). Acessado em 18 junho de
2013. http://www.un.org/docs/SG/agpeace.html.
40
Os acordos regionais devem ser entendidos como se referindo a
tratados multilaterais nos quais os Estados Membros concordam em
canalizar suas diferenças por meio dos mecanismos previstos naqueles
instrumentos, sem, contudo, criarem instituições permanentes ou
organismos regionais dotados de personalidade jurídica própria. (...) Já
a expressão “entidades regionais” visaria, por sua vez, a abranger as
organizações regionais estabelecidas por tratados internacionais, de
natureza permanente, dotadas de personalidade jurídica própria e
destinadas a tratar de assuntos relativos à manutenção da paz e da
segurança internacionais. 101
Ainda no contexto dos acordos regionais e do relatório An Agenda for Peace, o exsecretário-geral definiu três princípios norteadores das relações entre a ONU e os arranjos
regionais.
102
O primeiro trata da primazia do Conselho de Segurança quanto ao
estabelecimento de missões de paz, sendo esse o órgão principal nas decisões em matéria de
operações de paz; o segundo acerca da isonomia de tratamento da ONU para com elas e, por
último, que não deveria existir uma divisão de trabalho entre as Nações Unidas e os demais
arranjos regionais, primando-se pelo princípio de complementaridade e não pelo de
substituição. 103
Apesar dos princípios e instrumentos estabelecidos por Ghali, o que se deve extrair do
capítulo VIII, ainda segundo o relatório apresentado pelo secretário-geral é que a ONU,
mesmo recorrendo ao estabelecimento de um sistema de segurança coletiva, não impede que
existam outros acordos ou organismos particulares em que os Estados cooperem em algum
âmbito com as Nações Unidas para a manutenção da paz e da segurança internacionais. 104,
Para além do documento An Agenda for Peace, nos anos 1990 também, os principais
órgãos das Nações Unidas reconheceram a necessidade de dinamizar as relações de
cooperação entre a Organização e as entidades regionais. 105 A AGNU aprovou, em dezembro
101
Nações Unidas, (1990), publicação intitulada Manuel sur le règlement pacifique des différends entre Etats, pp.
87-88 e 103-104.
102
Boutros-Ghali, Boutros (1992), An Agenda for Peace: Preventive Diplomacy, Peacemaking and Peacekeeping. Report of the Secretary-General pursuant to the statement adopted by the Summit Meeting of the
Security Council on 31 January 1992 (A/47/277 - S/24111, 17 de Junho de 1992). Acessado em 18 junho de
2013. http://www.un.org/docs/SG/agpeace.html.
103
Idem.
104
Boutros-Ghali, Boutros (1992), An Agenda for Peace: Preventive Diplomacy, Peacemaking and Peacekeeping. Report of the Secretary-General pursuant to the statement adopted by the Summit Meeting of the
Security Council on 31 January 1992 (A/47/277 - S/24111, 17 de Junho de 1992). Acessado em 18 junho de
2013. http://www.un.org/docs/SG/agpeace.html.
105
RATNER, Steven R. The new UN peacekeeping: building peace in land of conflict after the Cold War. New
York: St. Martin’s Press, 2005.
41
de 1991, a Resolução 46/58, 106 na qual o “Comitê Especial sobre a Carta das Nações Unidas
e sobre o Fortalecimento do Papel da Organização” foi instruído a examinar meios para
enriquecer a cooperação existente, ao mesmo tempo em que os Chefes de Estado e de
Governo reunidos no Conselho de Segurança, em janeiro de 1992, aprovavam a Declaração
Presidencial solicitando o Secretário-Geral a verificar a contribuição que os organismos
regionais poderiam aportar aos trabalhos do CSNU no contexto do Capítulo VIII da Carta das
Nações Unidas. 107
A adoção destas medidas de cunho político, mencionadas acima, bem como a criação
do Departamento de Operações de Manutenção da Paz (DPKO) impulsionaram o quadro de
colaboração nas operações de paz com as Nações Unidas. Os arranjos regionais passaram de
três, 108 no período da Guerra Fria até 1991, para vinte e um, a partir de 1992, como mostra a
tabela abaixo. 109
Operações de Manutenção da Paz – Arranjos Regionais - 1992/2013
Operação de Paz
UNPROFOR
UNOSOM I
ONUMOZ
UNOSOM II
ONOMUR
UNMIH
UNAMIR
UNMOT
UNMIBH
UNSMIH
MIPONUH
UNPSG
UNOMSIL
UNMIK
MONUC
UNMEE
UNAMSIL
UNAMIS
MINURCA – EUFOR
UNSMIS
106
Organização Internacional
Organização do Tratado do Atlântico Norte
Organização da Unidade Africana
Organização da Unidade Africana
Organização da Unidade Africana
Organização da Unidade Africana
Organização dos Estados Americanos
Organização da Unidade Africana
Organização para a Segurança e Cooperação na Europa
Organização do Tratado do Atlântico Norte
Organização da Unidade Africana
Organização dos Estados Americanos
União Europeia
Organização da Unidade Africana
Organização do Tratado do Atlântico Norte / União Europeia
União Europeia
Organização da Unidade Africana
Organização da Unidade Africana
União Africana
União Europeia
Liga Árabe
Resolução do CSNU
749/1992
751/1992
797/1992
814/1993
846/1993
867/1993
872/1993
968/1994
1035/1995
1063/1996
1141/1997
1145/1997
1181/1998
1244/1999
1921/2000
1398/2002
1620/2005
1959/2005
1778/2009
2043/2012
United Nations. Resolutions and decisions of the Security Council (1990). S/INF/46. New York: United
Nations, 1990.
107
United Nations. Statement by the President of the Security Council. S/ 23500. New York: United Nations, 31
Jan. 1992.
108
United Nations, Report of the Panel on United Nations Peace Operations (...), op. cit.,paragraphs 70-74
109
United Nations, Report of the Panel on United Nations Peace Operations (...), op. cit.,paragraphs 45-50
42
MINUSMA
União Europeia
2100/2013
Fonte: DKPO
Elaboração Própria
Os dados acima demonstram as iniciativas políticas110 e principalmente como o DKPO
tem possibilitado ações mais bem estruturadas e eficientes no âmbito das operações de paz, o
que em certa medida111 tem incrementado e ampliado às possibilidades de cooperação com
outros organismos regionais.
112
Neste sentido, a própria estrutura do DKPO vem sofrendo
constantes aperfeiçoamentos devido às evoluções das próprias operações de manutenção da
paz, como se tem observado nos relatos deste trabalho e, como bem ressalta o Relatório Anual
do Secretário Geral, em 1995. 113
[...] A cooperação entre as Nações Unidas e as organizações regionais
devem constantemente adaptar-se a um mundo em permanente
situação de mudança. A própria Carta antecipou essa necessidade de
flexibilidade por não dar uma definição precisa dos acordos e
organizações regionais, permitindo, assim, diversas organizações e
estruturas contribuir, em conjunto com as Nações Unidas, para a
manutenção da paz e da segurança [...]. 114
Esta afirmação de Ghali, agora em seu Relatório Anual, em 1995, vai ao encontro da
evolução das operações de paz nas últimas décadas, quando surgem as operações definidas,
pela ONU, como de natureza “multidimensional”. Esse novo tipo de operação inclui no seu
cerne, como já visto, além do tradicional contingente militar, outros de características
110
O CSNU aprovou, subsequentemente, outras declarações presidenciais sobre o assunto, tais como a de
28/5/93, em que expressa disposição de apoiar e facilitar os esforços empreendidos no campo das operações de
manutenção da paz pelas entidades regionais; a de 3/5/94, na qual é assinalado que um dos fatores a serem
levados em consideração, quando da criação de uma operação de manutenção da paz, é a existência de uma
organização regional ou sub-regional pronta e capaz de colaborar para a solução de conflitos; e a de 22/2/95, que
apoia a intenção do Secretário-Geral de ajudar as entidades regionais a desenvolverem suas capacidades de
atuação nas áreas de prevenção de conflitos, de promoção da paz e de mobilização de operações de manutenção
da paz. EVANS, Gareth. Cooperating for peace. St. Leonards: Allen & Unwin, 2003.
111
NAÇÕES UNIDAS, Departamento de Operações de Paz, Unidade de Práticas Recomendadas, Manual de
Operações de Paz Multidimensionais, Edição de dezembro de 2003, 205 pp 1-2. Acessado em: 28 de maio de
2013.
112
Idem.
113
NAÇÕES UNIDAS, Report of the Secretary-General on the Implementation of the Report of the Panel on the
United Nations Peace Operations. Nova York: Nações Unidas, 1995.
114
ORGANIZAÇÃO das Nações Unidas, Suplemento para uma agenda para a Paz de 25 de janeiro de 1995,
Relatório do Secretário Geral por ocasião do 50º aniversário da Organização, Disponível em:
http://www.un.org/Docs/SG/agsupp.html. Tradução do Autor. Acessado em: 01 de junho de 2013.
43
diversas. 115
Diante deste cenário desafiador, o DPKO tem buscado, mais do que nunca, manter um
estreito relacionamento com as organizações internacionais governamentais e as nãogovernamentais, no contexto das operações de paz. Diante da variedade de situações que a
ONU tem que enfrentar em diferentes regiões do globo, as organizações internacionais,
através do capítulo VIII, podem contribuir de forma sine qua non para a eficácia destas
operações, levando em conta aspectos como composição, mandato e alcance dos acordos. 116
Ou seja, as organizações regionais e os arranjos regionais podem alterar significativamente o
resultado de uma missão de paz, por sua influência geopolítica, geoestratégica, por sua
localização territorial, expertise operacional ou ainda por suas contribuições civis, militares e
financeiras.117 Como exemplo prático do que acaba de se afirmar, destaca-se a operação de
paz ocorrida na Etiópia e na Eritréia, no continente africano, que contou com o apoio militar
da Organização da Unidade Africana (OUA), inclusive determinando o presidente da
Comissão de Coordenação Militar. 118
O importante neste sentido é entender que existem dois lados a serem analisados, no
que tange os aspectos motivacionais nas operações de paz, e que ambos os se beneficiam.
Para a ONU, os acordos regionais tornaram-se uma alternativa para suas ações
sobrecarregadas, ao permitirem um aumento dos recursos humanos e materiais, para além do
limitado quadro orçamentário e de pessoal das Nações Unidas.
119
Somam-se a isso, as
questões relacionadas a uma maior legitimidade de ações, pois, concentra contribuição
humana característica da região, conhecimentos geoestratégicos, geopolíticos, territoriais,
culturais e linguísticos, como já mencionado.
120
Para a parte, a entidade parceira, a
cooperação com a ONU possibilita o treinamento das forças operacionais, como militares,
civis, experts, técnicos, consultores e outros, além de promover o intercâmbio de informações,
a celebração de consultas em todos os níveis, e a participação de ações da Organização, em
115
NAÇÕES UNIDAS, Departamento de Operações de Paz, Unidade de Práticas Recomendadas, Manual de
Operações de Paz Multidimensionais, Edição de dezembro de 2003, 205 pp 1-2. Acessado em: 28 de maio de
2013.
116
WEDGWOOG, Ruth. The evolution of United Nations Peacekeeping.Cornell International Law Journal, New
York, v. 28, p. 631-643, 1995. Disponível em:http://digitalcommons.law.yale.edu/cgi/viewcontent.cgi?articl
e=3278&context=fss_papers>. Acesso em: 05 de julho de 2013.
117
Choedon, Yeshi. “China’s Stand on UN Peacekeeping Operations: Changing Priorities of Foreign Policy”. In.
China Report, vol. 41, no. 1, 2005, pp. 39-57
118
LEWIS, William. Peacekeeping in the name of humanity. Institute for National Strategic Studies, National
Defense University, Washington, D.C. Disponível em http://www.ndu.edu/inss/McNair/mcnair26/m026ch
02.html. Acesso em 12 de junho de 2013.
119
EVANS, Gareth. Cooperating for peace. St. Leonards: Allen & Unwin, 2003.
120
Idem.
44
conformidade com os regulamentos e as práticas aplicáveis.
121
Dessa forma, os resultados
alcançados são melhores porque, normalmente, a organização regional conhece melhor o
terreno do que a ONU, confere maior legitimidade a missão e incrementa financeira e
operacionalmente as ações.
Reafirmou, na época, a importância dessas contribuições, a aprovação da Resolução
49/57, de 1994, que, com anexo a “Declaração sobre o Fortalecimento da Cooperação entre as
Nações Unidas e os Acordos ou Entidades Regionais voltados para a Manutenção da Paz e
Segurança Internacionais”, 122 estimularam os acordos e as entidades regionais a colaborarem
com a ONU, na promoção de atividades de paz e a treinarem contingentes militares e civis
para participar de missões de paz.
Nesta ocasião, a Resolução 49/57 afirmou que,
Os acordos regionais ou agências podem, em suas áreas de
competência e de acordo com a Carta, contribuir com a manutenção
da paz e segurança, entre outras coisas, conforme o caso, através da
solução pacífica de controvérsias, a diplomacia preventiva, o
estabelecimento da paz, a manutenção da paz e o pós o conflito. 123
No que concerne às formas de contribuição dos acordos regionais, segundo Bellamy e
Williams, as Nações Unidas, ao tentarem envolver cada vez mais os Estados-Membros e as
organizações regionais nas operações de paz, não só militarmente, apontaram cinco distintas
modalidades de cooperação através do relatório do secretário-geral, de 1995, intitulado
“Suplemento de Uma Agenda para a Paz”. 124
Dentre elas:
 a Consulta, que é praticada de forma regular e, em alguns casos,
pode ser regida por acordos formais;
 o Apoio Diplomático, aonde as organizações diplomáticas orientam
seus próprios esforços diplomáticos ao participar das atividades da
ONU;
 o Apoio Operacional, aonde a organização regional envolve-se em
121
Idem.
NAÇÕES UNIDAS, Documentos e Mapas, Assembleia Geral, Documentos, Resolução da Assembleia Geral
A/R/49/57 de 17 de fevereiro de 1995. Disponível em: http://www.un.org/ga/search/view_doc.asp?symbo
l=A%2FRES%2F49%2F57&Submit=- Tradução do Autor - Acessado em: 01 de junho de 2013.
123
Idem.
124
Bellamy, Alex et al. (2007), Understanding Peacekeeping. Cambridge: Polity.
122
45
apoio à ONU;
 a Co-implantação de missões de paz; e
 a possibilidade de implantação de Missões Conjuntas. 125
Nessas modalidades mencionadas acima, prega-se o princípio de liberdade de ação das
Nações Unidas, isso quer dizer que os Estados e organizações estão livres para cooperarem ou
não nos quadros de operações da ONU, inclusive, possuem autonomia para colaborar da
forma que entenderem ser a melhor. 126
O documento relembrava, entretanto que, apesar das diversas possibilidades de
cooperação, os princípios da Carta deveriam ser preservados. Ressaltava também que,
segundo o prescrito no artigo 34 daquele documento, como já mencionado, a responsabilidade
pela manutenção da paz continuava com o Conselho de Segurança e que as organizações
regionais, consoante o artigo 52, deveriam atuar de forma coerente com esse princípio e não
poderiam exercer atividades de caráter coercitivo sem a prévia autorização do CSNU. 127
Portanto, com o “Suplemento de uma Agenda para a Paz”, a ONU clarificava as
possibilidades de atuação, contudo, sempre se autorreafirmando como instituição com o
monopólio legítimo do uso da força nas relações internacionais. 128
Passada a década de 1990, o Secretário Geral das Nações Unidas na época, Kofi
Annan, nomeia um painel com o objetivo de identificar os pontos fracos das Nações Unidas e
avaliá-los, a fim de fornecer recomendações práticas para corrigir tais falhas. 129 The Panel on
United Nations Peace Operations, foi instaurado em março de 2000, presidido pelo ministro
das relações exteriores da Argélia, Lakhdar Brahimi e mais nove membros, militares, não
militares, e especialistas em operações de paz.
130
Apresentado oficialmente, em setembro de
2000 na Cúpula do Milênio, seu documento final ficou conhecido como “Relatório Brahimi”,
contendo diferentes recomendações para as operações de paz, como procedimentos de
implementação das missões, como se verá no terceiro capítulo, no caso da RDC,
131
até
sugestões para os acordos regionais.
125
United Nations. Supplement to an agenda for peace: position paper of the Secretary-General on the occasion
of the Fiftieth Anniversary of the United Nations. A/50/60-S/1995/1. New York: United Nations, 3 Jan. 1995.
126
KELSEN, H., “Collective security and collection self- defence under the charter of the United Nations”, AJIL,
Vol. 42, 1948, pp. 783- 806.
127
Bellamy, Alex et al. (2007), Understanding Peacekeeping. Cambridge: Polity
128
United Nations. Supplement to an agenda for peace: position paper of the Secretary-General on the occasion
of the Fiftieth Anniversary of the United Nations. A/50/60-S/1995/1. New York: United Nations, 3 Jan. 1995.
129
DURCH, William J. Et al. The Brahimi Report and the Future of UN Peace Operations. Washignton : Henry
L. Stimson Center, 2003.
130
Idem.
131
Idem.
46
Com relação aos acordos regionais, o Relatório apoiou uma maior cooperação entre a
ONU e as organizações nas operações de paz multinacionais, em consonância com a Carta de
São Francisco, de maneira a realizarem ações complementares, em especial nas áreas de
prevenção de conflitos, estabelecimento da paz, eleições, direitos humanos e assistência
humanitária.
132
O Estudo ainda enfatizou a importância do viés financeiro nos acordos,
afirmando ser necessário haver recursos destinados tanto para a reconstrução do sistema
político (em especial, o reestabelecimento das eleições), quanto para as ações de
desarmamento, desmobilização e reintegração dos ex-combatentes. 133
Finalmente, o que se constata é que o crescimento da cooperação internacional para as
missões de paz coincide com a própria história do envolvimento da ONU no campo da paz e
da segurança, e a evolução do DPKO. 134 Ressaltando-se que, apesar da positiva participação,
é necessário maior comprometimento dos Estados-Membros, que precisam chamar para si a
pesada responsabilidade da manutenção da paz internacional, conjuntamente com a ONU. 135
Entende-se que a ONU passou a oferecer um leque de possibilidades de cooperação,
como visto no Documento “Suplemento de uma Agenda para a Paz”, no campo da paz, que
não estão descritas na Declaração de São Francisco, deixando-se valer da inexistência de
qualquer dispositivo normativo para a inviabilização de possíveis ações. Ao criar o DPKO, a
ONU estabelece um órgão que tem capacidade técnica-regulatória da possibilidade de
arranjos regionais que serão submetidos expressamente ao Conselho de Segurança, cabendo a
este, autorizar ou não as diversas formas de atuação dos organismos internacionais. 136
Este capítulo dedicou-se a estabelecer um breve apanhado sobre as operações de
manutenção da Paz da ONU, bem como, seus dispositivos institucionais de cooperação com
diversas outras organizações internacionais. Diante disto, o próximo capítulo, apresentará um
breve panorama do desenvolvimento da União Europeia como um ator de segurança e defesa
internacionais, destacando a participação da UE nas atividades de paz da ONU.
132
Idem.
GAMA, Carlos Frederico Pereira da Silva. Mudanças institucionais nas atividadesrelativas às Operações de
Manutenção da Paz do “sistema ONU” do pós-Guerra Fria:“Adaptação” versus “Aprendizado”. Rio de Janeiro:
PUC-RJ, 2005.
134
GOMAA, M. M., “Non binding agreements in International Law”, en Liber Amicorum G. AbiSaab, 2011,
p.229.
135
EVANS, Gareth. Cooperating for peace. St. Leonards: Allen & Unwin, 2003.
136
EVANS, Gareth. Cooperating for peace. St. Leonards: Allen & Unwin, 2003.
133
47
2. A UE E OS ACORDOS REGIONAIS COM A ONU EM MATÉRIA DE MISSÕES
DE PAZ
2.1. Considerações Preliminares
O processo de integração europeu, tal qual é conhecido hoje, desenvolveu-se na
Europa muito recentemente, mais precisamente logo após a Primeira Guerra Mundial. A
Segunda Grande Guerra acentuou este cenário, perante o espetáculo de uma Europa
dilacerada e quase destruída, e consolidou-se com a evidência de que, em face da evolução
tecnológica, a segurança de territórios e populações, só seria possível no quadro de esquemas
de segurança coletiva. 137
Assim, na Europa Ocidental, após a Segunda Guerra, a convergência de fatores
estratégicos e econômico-sociais, consequentes dos traumas da guerra, originaram um forte
movimento de integração, visando à criação de uma nova entidade política, superadora do
Estado-Nação. Ao longo dos anos, o processo de integração europeu no domínio da segurança
e de defesa apresentou evoluções várias.
Como ponto de partida, considera-se a formação das Comunidades Europeias, a
Comunidade Europeia do Carvão e Aço (CECA), em 1951, e a Comunidade Econômica
Europeia (CEE), em 1958, como o marco institucional do processo de integração na UE,
seguido pelas evoluções históricas das décadas de 1960, 1970 e 1980. Nos anos posteriores,
destaca-se a assinatura do tratado que conferiu uma nova arquitetura institucional a UE, o
tratado de Maastricht, assinado em 1992, responsável por criar um novo arcabouço jurídico
institucional da UE e de sua consequente política de segurança e defesa. Na sequência,
salientam-se as revisões do Tratado da União Europeia (TUE), em 1999, com o Tratado de
Amsterdam, 2003, com o Tratado de Nice, finalizando com Lisboa, em 2009.
Esse espaço temporal de aproximadamente sessenta anos foi quando se produziram
novos arranjos institucionais deste complexo processo de integração regional. Além disso,
brevemente, destaca-se o quadro institucional atual da UE no que tange as ações no campo da
segurança e defesas internacionais, principalmente no que diz respeito ao relacionamento
137
A formulação jurídica primeira da ideia de segurança coletiva se exprime nos Artigos 10 e 16 do Pacto da
Liga das Nações, segundo os quais cada Estado-membro se compromete a respeitar e preservar a integridade
territorial e a independência política de todos os membros da Liga (Artigo 10), e o Estado que recorrer à guerra
será sujeito a sanções e poderá ser coagido militarmente por forças das partes contratantes (Artigo 16).
NOUSCHI, Marc- Em Busca da Europa: Construção Europeia e Legitimidade Nacional. Lisboa: Instituto Piaget,
1994. ISBN : 972- 8329-41-5
48
entre ONU e União Europeia no campo das operações de manutenção da Paz.
O presente capítulo objetiva, diante do exposto, apresentar a evolução histórica do
processo de integração da UE, com enfoque nas questões relacionadas aos temas de paz e
segurança internacionais, principalmente, nas que tange as Missões de Petersberg e no
desenvolvimento da cooperação com a União Europeia. Busca-se fazer uma reflexão a
respeito das possibilidades de atuação da UE no campo da paz e da segurança internacionais,
objetivando, no terceiro capítulo, compreender o relacionamento prático da UE e ONU na
República Democrática do Congo. Ao final deste capítulo, espera-se ter um entender melhor a
estrutura institucional de ação da União, bem como de seus limites, interesses e das
possibilidades de atuação com a ONU.
2.2. Os 40 anos iniciais: Um projeto chamado União Europeia
Ao longo das sucessivas etapas da construção europeia, os conceitos de união política,
de política externa comum ou ainda de defesa comum, foram regularmente incluídos nas
pautas de discussão, na sequência da apresentação de diferentes projetos políticos.
O processo de construção de uma defesa e segurança comuns, na Europa, começa com
a própria criação do que hoje se chama União Europeia. Em 1950, o velho continente era o
epicentro de uma crise sem proporções, a Guerra devastara a economia regional. A segurança
e a defesa dos países europeus estavam frágeis.138 A Europa precisava se reorganizar e o fez
através de um processo de integração com realizações ao mesmo tempo pragmáticas e
ambiciosas, buscou criar um órgão dotado de soberania estatal, sobre um ponto mais
específico, a indústria da guerra. 139
Segundo Jean Monnet,
O carvão e o aço eram ao mesmo tempo a chave da potência
econômica e a do arsenal onde se forjava as armas da guerra. Esse
duplo poder lhes dava então uma enorme significação simbólica que
esquecemos. Fundi-los acima das fronteiras seria retirar-lhes seu
138
MONNET, Jean. Memórias: A construção da unidade Europeia. Trad. De Ana Maria Falcão. Brasília: EdUnB,
1986. p. 93.
139
Idem. p.94
49
prestígio maléfico e os transformaria, ao contrário, em garantia de
paz.140
Deste modo, foram lançadas as bases para a criação da Comunidade Europeia do
Carvão e do Aço (CECA).
141
Na gestão conjunta desses dois elementos fundamentais para a
indústria da guerra foi estabelecida uma estrutura organizativa, formada por Estados europeus,
tal como, inicialmente, fizeram a França, a Alemanha, a Bélgica, os Países Baixos,
Luxemburgo e a Itália. 142
Após a ratificação da CECA, o governo francês apresentou o projeto de criação e
fortalecimento da defesa e segurança do velho continente, através de um exército europeu
integrado sob um comando comum, ligado às instituições políticas da Europa unida. Esta
preposição foi objeto de negociações entre os Estados-Membros da Comunidade Europeia do
Carvão e do Aço, que decorreram de 1950 a 1952 e conduziram à assinatura do Tratado que
institui a Comunidade Europeia da Defesa (CED). O objetivo da CED consistiria em um
projeto político que visava à criação de uma estrutura federal ou confederal: seria uma aliança
defensiva e tinha como um dos seus objetivos realizar a fusão das forças armadas postas à
disposição da Comunidade pelos Estados-Membros com vista à constituição de uma armada
comum.143 Tal processo não significaria, entretanto, no desaparecimento total dos exércitos
nacionais, que seriam responsáveis pela defesa nacional, bem como para a satisfação de
missões internacionais, em especial no quadro das Nações Unidas, que começavam a surgir
em 1948, com a primeira Missão das Nações Unidas para Supervisão de Trégua. 144
Apesar de assinado o Tratado que dava contornos a CED, este não foi, entretanto,
ratificado pelo próprio governo francês, o qual temia a transferência de uma parcela maior de
sua soberania neste domínio.
145
Logo em seguida, o projeto da CED fora substituído pela
vontade de formação de uma Comunidade Política Europeia (CPE), na qual se previa a
criação de uma Assembleia Parlamentar Bicameral, um Conselho Executivo Europeu, um
140
MONNET, Jean. Memórias: A construção da unidade Europeia. Trad. De Ana Maria Falcão. Brasília: EdUnB,
1986. p.95
141
NOUSCHI, Marc- Em Busca da Europa: Construção Europeia e Legitimidade Nacional. Lisboa: Instituto
Piaget, 1994. ISBN : 972- 8329-41-5
142
Idem.
143
MONNET, Jean. Memórias: A construção da unidade Europeia. Trad. De Ana Maria Falcão. Brasília: EdUnB,
1986p. 272.
144
Leitão, A. Rogério (2001) “A União Europeia e a sua emissão de estabilizador regional”, Temas de
Integração. 10/11. Coimbra: Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra.
145
MONNET, Jean. Memórias: A construção da unidade Europeia. Trad. De Ana Maria Falcão. Brasília: EdUnB,
1986 p. 276.
50
Conselho de Ministros e um Tribunal de Justiça. 146 As competências da Comunidade Política
seriam bastante vastas, prevendo-se que, em longo prazo, absorvesse os projetos da CECA e
da CED. Todavia, tal projeto também nunca chegaria a concretizar-se, dado que foi rejeitado
pela Assembleia Nacional francesa, em 30 de agosto de 1954. 147
No início dos anos de 1960, realizaram-se complexas negociações para por em prática
os planos Fouchet (1961 e 1962), sucessivamente apresentados pela França, que previam uma
cooperação política mais estreita, uma união de Estados e uma política externa de defesa
comum. O objetivo central dessas ações seria o de criar uma “Europa europeia”, independente
dos Estados Unidos e com influência em todo mundo. 148
O comitê, instituído a fim de apresentar propostas concretas destes planos, conseguiu
alcançar compromissos ambiciosos, tais como a criação de um secretariado independente ou a
perspectiva futura de votação por maioria qualificada em determinados domínios, como os de
ações no campo da segurança e defesa internacionais. Lamentavelmente, não foi possível
chegar a um acordo quanto às propostas do comitê Fouchet, tendo as negociações entre os
Estados-Membros sido interrompidas em 1962. 149
Na sequência de um pedido dos Chefes de Estado e de Governo de um estudo relativo
às possibilidades de progredir no plano político e militar, o “Relatório Davignon”
150
foi
apresentado em 1970, na Cimeira de Luxemburgo. Este relatório estava na origem da
Cooperação Política Europeia, relançada informalmente em 1970, que seria institucionalizada
através do Ato Único Europeu (AUE) mais tarde, em 1987. Até então, a segurança e a defesa
do bloco fora assumida, quase que exclusivamente, pela OTAN.
151
Com a invasão do Afeganistão pela União Soviética e a revolução islâmica no Irã, os
Estados-Membros tomaram consciência da impotência crescente da Comunidade Europeia a
nível internacional. Assim, determinados a reforçar a CPE, os Estados-Membros das
Comunidades adotaram o Relatório de Londres em 1981, que pautava a necessidade de
146
MONNET, Jean. Memórias: A construção da unidade Europeia. Trad. De Ana Maria Falcão. Brasília: EdUnB,
1986p. 283.
147
MAURY, Jean-Pierre- La Construction Européenne La sécurité et la Défense. Paris:Presses Universitaires de
France, 1996. ISBN : 2-13- 047763-1
148
Idem.
149
LEITÃO, Augusto Rogério- Organizações Europeias 2º Volume. Coimbra: Faculdade de Economia da
Universidade de Coimbra, 2009
150
Relatório de Davignon foi um documento com propostas na área da cooperação política entre os EstadosMembros, para uma futura na política estrangeira. O Documento recomendava que os Estados-Membro
devessem tentar, onde possível, falar com uma única voz. BRETHERTON, Charlotte; VOGLER, John - The
European Union as a Global Actor. 2ª ed. London: Routledge. 2006.
151
Idem.
51
consulta prévia, e de associar a Comissão Europeia, relativamente a qualquer questão de
política externa que dissesse respeito ao conjunto dos Estados-Membros. Em 1982, o mesmo
desejo de afirmar a posição da Comunidade a nível mundial esteve na origem da iniciativa
Genscher-Colombo relativa ao Ato Europeu. O Ato conduziu, em 1983, à Declaração Solene
de Estugarda sobre a União Europeia. 152
Já em 1985, o relatório do Comitê Dooge, que antecedeu o início da Conferência
Intergovernamental que levou, mais tarde, ao Ato Único Europeu, continha uma série de
propostas relativas à política externa, bem como a criação de um secretariado permanente.
Finalmente, as disposições introduzidas no Tratado pelo Ato Único Europeu ficaram aquém
das propostas do Comitê Dooge, permitindo, no entanto, institucionalizar a CPE, além de
criar um Secretariado colocado sob a responsabilidade direta da Presidência das
Comunidades. Deste modo, os objetivos da CPE foram estendidos a todas as questões de
política externa de interesse geral. 153
A Conferência Intergovernamental sobre a União Política levou à inclusão, no Tratado
da União Europeia, que entrou em vigor em 1993, de um título específico relativo a uma
Política Externa e de Segurança Comum (PESC). Assim, a PESC substituiu a CPE e se
transformou em um pilar intergovernamental distinto na estrutura comunitária, que exprime a
vontade da União de afirmar a sua identidade na cena internacional. 154
2.3. De 1990 a 2000: a União Europeia como Potência em Segurança e Defesa
Ao mesmo tempo em que manifestava o desejo de reforçar a potência econômica com
uma moeda comum, o euro, um memorando do Presidente francês, François Mitterrand e do
Chanceler alemão Helmut Kohl, em novembro de 1990,
155
vinha estimular a integração
europeia a caminhar no sentido de se afirmar como um ator político, econômico e militar. De
152
LEITÃO, Augusto Rogério- Organizações Europeias 2º Volume. Coimbra: Faculdade de Economia da
Universidade de Coimbra, 2009
153
Idem.
154
WEILER, J. H. H. - The Transformation of Europe. The Yale Law Journal. 100 (8), Symposium: International
Law, 2403-2483. 1991.
155
Este memorando definia as regiões com as quais se deveriam encetar relações prioritárias, estabelecendo, a
prazo, uma segurança e defesa comum na base de uma relação orgânica com a União da Europa Ocidental.
BRETHERTON, Charlotte; VOGLER, John - The European Union as a Global Actor. 2ª ed. London: Routledge.
2006.
52
fato, com a alteração do panorama geopolítico do continente europeu Pós-Guerra Fria, os
doze Estados-Membros,
156
da então Comunidade Econômica Europeia (CEE),
157
viram-se
compelidos a atuar em todas as dimensões da integração europeia para responder aos novos
desafios internacionais.
Diante dos acontecimentos recentes no quadro geoestratégico e geopolítico da Europa,
como a dissolução do Pacto de Varsóvia, a reunificação da Alemanha, o desmembramento da
União Soviética e o ressurgimento das tensões nacionalistas extremistas na Iugoslávia e
Albânia, acentuava-se a consciência de colocar as questões de política externa, segurança e
defesa nas dinâmicas de alargamento e aprofundamento da integração europeia. 158
Para responder a estes hiatos, o Tratado de Maastricht assinado em 7 de fevereiro de
1992, institucionaliza uma nova arquitetura superadora do Estado-Nação, a União Europeia,
que passa a desenvolver uma nova forma de cooperação política, abrangendo todos os
aspectos civis e militares da segurança e a serem implementadas no quadro institucional da
União, diferente de tudo já visto nas Comunidades europeias. 159
O novo tratado assinado assim estabelecia que:
A política externa e de segurança comum abrange todas as questões
relativas à segurança da União, incluindo a definição gradual de uma
política de defesa comum, nos termos do disposto no segundo
parágrafo, que poderá conduzir a uma defesa comum, se o Conselho
Europeu assim o decidir. Neste caso, o Conselho Europeu
recomendará aos Estados-Membros que adotem uma decisão nesse
sentido, nos termos das respectivas normas constitucionais. 160
Esta nova personagem, assim, configurada em termos de um “modelo de templo
grego”, introduz um segundo pilar dedicado exclusivamente à Política Externa e de Segurança
156
Aos seis países fundadores (Alemanha, Bélgica, França, Itália, Luxemburgo, Países Baixos), juntarse-iam, em
1973, a Dinamarca, Irlanda, Reino Unido, em 1981 a Grécia e, em 1986, Portugal e Espanha. LEITÃO, Augusto
Rogério- Organizações Europeias 2º Volume. Coimbra: Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra,
2009
157
Idem.
158
PFISTER, Stéphane - Les avantages comparatifs de l’Union européenne dans la gestion des crises et la sortie
des conflits. Institut européen de l’Université de Genève: Publications euryopa. 2004.
159
BRETHERTON, Charlotte; VOGLER, John - The European Union as a Global Actor. 2ª ed. London:
Routledge. 2006.
160
Tratado de Maastricht. Disponível em: http://eulex.europa.eu/pt/treaties/dat/11992M/htm/11992M.html.
Acessado em: 07 e junho de 2013.
53
Comum (PESC)
161
, que promovia a inclusão gradual de uma política de defesa em todo o
bloco, objetivando promover a paz, a segurança internacional e o progresso no mundo, como
ressalta o preâmbulo de Maastricht. 162
Os Chefes de Estado e de Governo dos países membros da UE
resolvem executar uma política externa e de segurança que inclua a
definição gradual de uma política de defesa comum que poderá
conduzir a uma defesa comum, de acordo com as disposições do
artigo 42o, fortalecendo assim a identidade europeia e a sua
independência, em ordem a promover a paz, a segurança e o progresso
na Europa e no mundo. 163
É diante das vontades manifestadas acima, que o pilar de cooperação
intergovernamental começa a delinear a afirmação da União como ator político comprometido
com as questões de segurança e defesa internacionais.
Os Estados-Membros da UE, também no texto de Maastricht, estabeleceram aqueles
que julgavam serem os objetivos dessa nova estrutura, chamada PESC. 164
Sendo eles:
 a salvaguarda dos valores comuns, dos interesses fundamentais e
da independência da União;
 o reforço da segurança da União e dos seus Estados-Membros, sob
todas as formas;
 a manutenção da paz e o reforço da segurança internacional, de
acordo com os princípios da Carta das Nações Unidas, da Ata
Final de Helsinque e com os objetivos da Carta de Paris;
 o fomento da cooperação internacional;
 o desenvolvimento e o reforço da democracia e do Estado de
direito, bem como o respeito dos direitos do Homem e das
165
liberdades fundamentais.
De fato, o reforço da segurança da União e dos seus Estados-Membros, sob todas as
161
Para além deste segundo pilar, Maastricht configurou ainda um primeiro pilar comunitário (fundamentado pela
Comunidade Europeia que passa, por sua vez, a estar assente numa União Econômica e Monetária) e um terceiro
pilar intergovernamental, a Cooperação policial e judiciária em matéria penal (CPJMP).
162
Tratado de Maastricht. Disponível em: http://eulex.europa.eu/pt/treaties/dat/11992M/htm/11992M.html.
Acessado em: 07 e junho de 2013.
163
Idem.
164
Idem.
165
Idem.
54
suas formas, é um dos objetivos da PESC presentes no Art. J-1, n.º 2, do TUE166, como se
denota acima. Nesse enunciado, a segurança internacional também aparece associada ao
objetivo maior do desenvolvimento e reforço da Democracia e do Estado de Direito, assim
como ao respeito dos direitos e liberdades fundamentais.
167
Assim, depreende-se que é com
Maastricht que são alicerçadas as bases da integração que se fundamenta no respeito à
Democracia, aos Direitos Humanos, a Boa Governança, bem como os princípios e propósitos
das Nações Unidas, como corolário da manutenção da paz e reforço da segurança
internacional à la UE.
Para o cumprimento dos objetivos apresentados acima, o Tratado fundador da UE
determina, segundo seu arcabouço jurídico, uma cooperação sistemática entre os EstadosMembros na condução de sua política, que adotarão ações comuns nos domínios em tenham
interesses coletivos importantes. Essas ações serão pautadas nas prerrogativas vinculantes,
presentes no parágrafo quarto, do artigo J-1 da PESC, que afirma que:
Os Estados-Membros apoiarão ativamente e sem reservas a política
externa e de segurança da União, num espírito de lealdade e de
solidariedade mútua. Abster-se-ão de empreender quaisquer ações
contrárias aos interesses da União ou suscetíveis de prejudicar a sua
eficácia como força coerente nas relações internacionais. 168
Diante do exposto, e como relembra Nivet, a PESC pretende assumir-se como um:
(...) processo de concertação e de cooperação intergovernamental (...)
destinado a permitir aos governos europeus assumir responsabilidades
políticas e diplomáticas na cena internacional, mas também, a
favorecer a aproximação dos seus posicionamentos internacionais, a
fim de evitar que os Estados-Membros não sigam posições demasiado
166
Art. J-1, n.º 2 TUE – “Os objetivos da política externa e de segurança comum são:- A salvaguarda dos valores
comuns, dos interesses fundamentais e da independência da União;- O reforço da segurança da União e dos seus
Estados-Membros, sob todas as formas;- A manutenção da paz e o reforço da segurança internacional, de acordo
com os princípios da Carta das Nações Unidas e da Ata Final de Helsinque e com os objetivos da Carta de Paris;O fomento da cooperação internacional;- O desenvolvimento e o reforço da democracia e do Estado de direito,
bem como o respeito dos direitos do Homem e das liberdades fundamentais. Tratado de Maastricht. Disponível
em: http://eulex.europa.eu/pt/treaties/dat/11992M/htm/11992M.html. Acessado em: 07 e junho de 2013.
167
United Nations Structure and Organization. Disponível em: http://www.un.org/e n/members/ind ex.shtml.
Acessado em 02 de junho de 2013.
168
Tratado de Maastricht. Disponível em: http://eulex.europa.eu/pt/treaties/dat/11992M/htm/11992M.html.
Acessado em: 07 e junho de 2013.
55
divergentes na sua adaptação ao novo ambiente estratégico. 169
Além disso, para a efetividade da PESC, Maastricht previa que os Estados-Membros
cooperassem sistematicamente na condução das suas políticas externas, através de ações de
informação mútua e de coordenação entre si.
170
Predizia, ainda, a coordenação e
harmonização de ações comuns, nos domínios em que os Estados-Membros tenham interesses
coletivos, desde logo, no contexto das organizações internacionais, como a ONU e a OTAN.
Entretanto, mesmo apesar destas importantes institucionalizações no seio do Tratado, quando
Maastricht entrou em vigor em 1° de novembro de 1993, a PESC parecia fadada ao insucesso,
mesmo antes de ter nascido oficialmente.
De fato, as expectativas criadas em torno do TUE para projetar um novo ator político,
comprometido com a segurança internacional, não podia ser alheio ao fato do próprio
panorama da segurança ter se alterado, o que resultou numa inação da PESC em relação à
realidade então vivida nos Bálcãs. Assim, a recém-formalizada União Europeia revelava o seu
defasamento perante as novas ameaças relacionadas à segurança e a defesa internacionais, que
resultam eminentemente de crises etno-políticas e intra-estatais, em muito influenciadas pela
globalização crescente171, mas, sobretudo pelo desmoronamento do império soviético e o
imediato pós-Guerra Fria.
Anos mais tarde, as disposições da PESC foram revistas pelo Tratado de Amsterdam,
sob a justificativa de que era necessário:
encontrar formas e meios para dotar a União de uma maior capacidade
de ação externa, num espírito de lealdade e de solidariedade mútua,
pois, os múltiplos desafios da nova situação internacional em matéria
de segurança mostram a necessidade de uma resposta europeia eficaz
e coerente, baseada num conceito global de segurança. 172
169
NIVET, Bastien - La défense: problématiques et dynamiques d’un chantier européen. La revue International et
stratégique - dossier Répenser la défense européenne. 48. Paris: PUF – Presses Universitaires de France. 2003.
170
Este instrumento e ações estão previstas nos Arts. J.1., n.º 3 TUE e J.2 mas a cooperação política na sua
dimensão externa, já tinha sido formalizada no Ato Único Europeu (assinado a 17 de Fevereiro de 1986 e em
vigor desde 1 de Janeiro de 1987), dando visibilidade à Cooperação Política Europeia (CPE) que vinha a ser
conduzida informalmente desde a década de 70 a partir do Relatório Davignon. Costa, Francisco Seixas da
(2002) Diplomacia Europeia – Instituições, alargamento e o futuro da União. Lisboa: Publicações Dom Quixote
171
Costa, Francisco Seixas da (2002) Diplomacia Europeia – Instituições, alargamento e o futuro da União.
Lisboa: Publicações Dom Quixote
172
Tratado de Amsterdam. Disponível em: http://eur-lex.europa.eu/pt/treaties/dat/11997D/htm/11997D.html.
Acessado em 23 de jun. 2013.
56
O reforço da capacidade de ação externa da União foi sublinhado também no terceiro
ponto abordado pelo Conselho Europeu de Turim, em 1996. O enunciado dirigia-se para
quatro metas a desenvolver:
1) identificar os princípios e os domínios da política externa comum;
2) definir as ações necessárias para defender os interesses da União
nesses domínios, em conformidade com tais princípios; 3) instaurar
processos e estruturas que permitam tomar decisões mais eficazes e
atentas, num espírito de lealdade e solidariedade mútuas; e 4) acordar
disposições orçamentárias adequadas. 173
Assim, foram delineadas as principais diretrizes para o novo Tratado, com o objetivo
de criar as condições políticos-institucionais necessárias para permitir à União enfrentar os
novos desafios internacionais em matéria de segurança e defesa.
No que tange à construção de um ator de segurança, segundo Rogério Leitão, o novo
Tratado de Amsterdam, assinado em 2 de Outubro de 1997, procurou reforçar e deixar claro o
acervo de Maastricht relativo à PESC. O novo Tratado manteve os objetivos já conhecidos em
um novo Artigo, o décimo primeiro,
jurídico-política,
nem
o
174
porém em sua essência, não alterou nem a natureza
dispositivo
institucional
da
PESC
e
o
seu
caráter
intergovernamental.175 Não obstante, há outras alterações de relevo, principalmente às
concernentes aos instrumentos, ao processo decisório e ao aparelho institucional. Estas se
registram fundamentalmente em dois níveis, o primeiro, na institucionalização de uma figura
que assiste a Presidência e representa a União no diálogo com países terceiros e organizações
173
Declaração de Conselho Europeu de Turim. Disponível em: http://www.consilium.europa.eu/ueDocs/cms_Dat
a/docs/pressData/pt/ec/ACF364.htm. Acessado em 03. de jun. 2013
174
“TÍTULO V – Disposições relativas à Política externa e de segurança comum - Artigo 11°:1. A União define
e executa uma política externa e de segurança comum extensiva a todos os domínios da política externa e de
segurança, que terá por objetivos: - A salvaguarda dos valores comuns, dos interesses fundamentais, da
independência e da integridade da União, de acordo com os princípios da Carta das Nações Unidas,— O reforço
da segurança da União, sob todas as formas, - A manutenção da paz e o reforço da segurança internacional, de
acordo com os princípios da Carta das Nações Unidas, com os princípios da Ata Final de Helsinque e com os
objetivos da Carta de Paris, incluindo os respeitantes às fronteiras externas, - O fomento da cooperação
internacional - O desenvolvimento e o reforço da democracia e do Estado de direito, bem como o respeito dos
direitos do Homem e das liberdades fundamentais.Acessado em 20 de abril de 2012, através do link:
http://www.eurotreaties.com/maastrichteu.pdf2. Os Estados-Membros apoiam ativamente e sem reservas a
política externa e de segurança da União, num espírito de lealdade e de solidariedade mútua.Os EstadosMembros atuam de forma concertada a fim de reforçar e desenvolver a solidariedade política mútua. Os EstadosMembros abstêm-se de empreender ações contrárias aos interesses da União ou susceptíveis de prejudicar a sua
eficácia como força coerente nas relações internacionais. O Conselho “assegura a observância destes
princípios.”. Acessado em 04 de maio de 2012, através do link: http://www.eurotreaties.com/maastrichteu.pdf
175
Idem.
57
internacionais, em nome do Conselho e se a Presidência assim o decidir – o Alto
Representante para a PESC e,
176
a segunda na criação de uma unidade de planejamento de
política e de alerta precoce. Esta unidade, conforme disposto na declaração n.º 6 anexa ao
Tratado, 177 pontua algumas das funções deste novo aparelho institucional, entre os quais, o de
acompanhar, analisar, fornecer informações e alertar de forma acertada para a evolução de
situações que possam ter implicações significativas na condução da PESC. 178
Por fim, representando uma profunda mudança da revisão de Amsterdam em matéria
de segurança, a União Europeia Ocidental (UEO)
179
é transformada em “braço armado” ao
serviço exclusivo da União Europeia para instrumentalizar toda a gama de Missões de
Petersberg, que também foram institucionalizadas na nova versão do Tratado da União
Europeia.
As Missões Petersberg foram originalmente definidas pela UEO, e são descritas como
“unidades militares e civis agindo sob o comando de uma autoridade, agora a UE, em matéria
de desarmamento, missões humanitárias e de evacuação, missões de aconselhamento e
assistência em matéria militar, missões de prevenção de conflitos, missões de forças de
combate para a gestão de crises, incluindo as missões de restabelecimento da paz e as
operações de estabilização nos termos do conflito.”. 180
Com relação a estas missões, a versão de Amsterdam do TUE afirmava ainda, que não
podendo a União, enquanto tal, posicionar-se como uma comunidade de defesa que dispõe de
176
Este cargo de representação da ação da União na cena internacional foi ocupado pelo Espanhol Javier Solana
desde Outubro de 1999 até à entrada em vigor do Tratado de Lisboa, a 1 de Dezembro de 2009. Acessado em 04
de maio de 2012, através do link: http://www.eurotreaties.com/maastrichteu.pdf
177
Declaração Anexa sobre a PESC no Tratado de Amsterdam. Disponível em:http://eurlex.europa.eu/p
t/treaties/d at/11997D/htm/11997D.html. Acessado em 23 de jun. 2013.
178
BRETHERTON, Charlotte; VOGLER, John - The European Union as a Global Actor. 2ª ed. London:
Routledge. 2006.
179
A União da Europa Ocidental (UEO) foi fundada em 1954, pelo Tratado de Bruxelas revisto, com o propósito
de se constituir como uma Organização de Cooperação para a Defesa e a Segurança a nível europeu. Entre
Estados-Membros, Membros associados (Hungria, Islândia, Noruega, Polônia, República Checa e Turquia),
observadores (Áustria, Dinamarca, Finlândia, Irlanda e Suécia) e parceiros associados (Bulgária, Estônia,
Letônia, Eslováquia, Eslovênia e Romênia), contam-se 28 países. Só com a crise dos euromísseis e a decisão, em
Conselho de Ministros da defesa e dos negócios estrangeiros, de Reagan, Miterrand e Kohl, em 1984, de criarem
forças multinacionais, é que a UEO é reanimada. É neste quadro que, em 1992, em Petersberg, se afirma estar
em condições da UEO ser uma organização de intervenção especialista em “missões de Petersberg”. Com o
Tratado de Amsterdam, afirma-se a UEO como parte integrante do desenvolvimento da capacidade operacional
da União no âmbito da PESD e da potencialização das próprias Missões de Petersberg com a UEO a ser o braço
armado da União, mesmo sem a participação de todos os Estados-Membros. No entanto, o Tratado de Nice
ditou, a partir de 1 de Janeiro de 2002, a relocação das suas capacidades operacionais para a própria União e a
defesa coletiva parte dos desígnios da OTAN. Archer, Clive. 2000. The European Union: Structure and Process.
3rd ed. London: Continuum
180
CONSEIL DE L'UNION DE L'EUROPE OCCIDENTALE . Déclaration de Petersberg. 19 jun. 1992.
Disponível em: www.franceurope.org/pdf/declaration_petersberg.pdf. Acessado em : 19 jul. 2013
58
uma estrutura militar própria, poderia solicitar à UEO que “prepare e execute as decisões de
ações da União que tenham repercussões no domínio de defesa e segurança internacionais”,
como consta no artigo J-4, parágrafo segundo, do Tratado. 181
A União da Europa Ocidental (UEO) faz parte integrante do
desenvolvimento da União proporcionando à União o acesso a
capacidade operacional, nomeadamente no âmbito do n.° 2. A UEO
apoia a União na definição dos aspectos da política externa e de
segurança comum relativos à defesa, tal como definidos no presente
artigo. Assim, a União incentivará o estabelecimento de relações
institucionais mais estreitas com a UEO, na perspectiva da
eventualidade de integração da UEO na União, se o Conselho Europeu
assim o decidir. Neste caso, o Conselho Europeu recomendará aos
Estados-Membros que adotem uma decisão nesse sentido, nos termos
das respectivas normas constitucionais. 182
Deste modo, como exposto acima, com o Tratado de Amsterdam, a União Europeia
ficou apta a decidir que, quando age no âmbito das Missões de Petersberg, poderá recorrer às
capacidades e meios da UEO, reforçando a cooperação institucional e se lançando em
atividades com outras organizações internacionais, tais quais, as missões de manutenção de
paz, das Nações Unidas. 183
É importante salientar ainda, que as conclusões da Cimeira da OTAN, de Berlim em
1996, apontavam para a europeização do elo transatlântico através de “uma parceria
estratégica no núcleo da OTAN alicerçado com a inclusão da Identidade Europeia de
Segurança e Defesa (IESD) e a UEO numa tríade de gestão de crises”.184 É assim
institucionalizado, com Berlim, o princípio de um “pilar europeu” da OTAN e a interligação
entre a União Europeia Ocidental e a OTAN com as Missões de Petersberg podendo assim
ser conduzidas sob a responsabilidade da UEO, com “meios coletivos” independentes da
OTAN.185
De acordo com Andreia Soares, esta dimensão de gestão de crises já tinha sido
181
Tratado de Amsterdam. Acessado em 13 de abril de 2012, através do link: http://www.eurotreaties.com
/maastrichteu.pdf
182
Tratado de Amsterdam. Acessado em 13 de abril de 2012, através do link: http://www.eurotreaties.com
/maastrichteu.pdf
183
LA FUENTE, Alberti A. Herrero de. La Participación de la Unión Europea en la Gestión Internacional de
Crisi. Revista de Estudios Europeos, Valladolid, v. 2009, n. 52, p.7-46, 2009.
184
Idem.
185
NATO - Manual da OTAN. Bruxelas: Office of information and Press, 2001
59
operacionalizada pela OTAN na Cimeira de Bruxelas de 1994, com a aprovação do conceito
de “forças operacionais conjuntas e combinadas” que, no mar, terra e ar, podem ser utilizadas
pela OTAN e pela UEO para o cumprimento de suas missões. É esta dimensão política de
europeização da OTAN e da condução de seus meios coletivos independentes da
responsabilidade da UEO, que o Tratado de Amsterdam consagra na declaração final de
1997.186
No ano seguinte, com a Cimeira de Saint-Malo, em 1998, realizou-se o encontro entre
os Chefes de Estado e de Governos do Reino Unido e da França com o objetivo de discutir as
questões relativas à segurança e a defesa na UE, mormente se esta deveria estar em condições
de desempenhar o seu papel na cena internacional, pondo em prática as decisões do Tratado
de Amsterdam.187 Nesta ocasião, ambos os líderes declararam a importância do
desenvolvimento de uma capacidade política e militar autônoma, bem como a legitimidade e a
urgência de desenvolver o pilar Europeu em termos de Segurança.
Como resultados, já em 1999, o Conselho Europeu de Colônia formaliza uma Política
Europeia de Segurança e Defesa (PESD) e definiu a gestão de crises, nomeadamente, as
Missões de Petersberg, como o seu objetivo central. Essa definição encontra-se exposta na
Declaração Final do Conselho sobre o reforço da PESC, como se observa abaixo. 188
Nós, membros do Conselho Europeu, estamos decididos a que a União
Europeia desempenhe integralmente o seu papel na cena internacional.
Para tal, pretendemos dotá-la dos necessários meios e capacidades que
lhe permitam assumir as suas responsabilidades relativamente a uma
política europeia comum de segurança e defesa. O trabalho realizado
por iniciativa da Presidência Alemã e a entrada em vigor do Tratado
de Amsterdam permitem-nos hoje dar um decisivo passo em frente.
Para atingirmos os nossos objetivos em matéria de política externa e
de segurança comum e o progressivo enquadramento de uma política
de defesa comum, é convicção nossa que o Conselho deve poder
tomar decisões sobre todos os tipos de missões em matéria de
prevenção de conflitos e gestão de crises definidas no Tratado da
União Europeia, as “missões de Petersberg”. Para esse efeito, a União
deve dispor de capacidade de ação autônoma, apoiada em forças
militares credíveis, de meios para decidir da sua utilização e de
vontade política de o fazer, a fim de dar resposta às crises
186
SOARES, Andreia Mendes- União Europeia: que modelo político?. Lisboa: Instituto Superior de Ciências
Sociais e Políticas, 2005. ISBN: 972-8726-55-4
187
XXIEME SOMMET FRANCOBRITANNIQUE DE SAINTMALO. Déclaration francobritannique sur la
défense européenne. SaintMalo, 4 dez.1998. Disponível em :http://www.france.diplomatie.fr/actua
l/evenements/stmalo2.html. Acessado em 24 de jun. 2013
188
Declaração Final do Conselho sobre a PESC. Disponível: http://www.europarl.europa.eu/summits/
kol2_pt.htm#an3. Acessado em 13 de jun. 2013
60
internacionais, sem prejuízo das ações a empreender pela OTAN. A
UE estará, assim, mais apta a contribuir para a paz e a segurança a
nível internacional, em conformidade com os princípios da Carta das
Nações Unidas. 189
Esta medida representou um importante passo à frente numa época em que a ameaça
de conflitos em grande escala diminuiu nitidamente (em relação ao período de Guerra Fria),
mas em que se assiste a uma retomada de conflitos locais que representam verdadeiras
ameaças à segurança europeia (o conflito na Iugoslávia, por exemplo). Neste contexto, as
"Missões de Petersberg" constituem, certamente, uma resposta adequada da União,
traduzindo a vontade comum dos Estados-Membros de garantir a segurança na Europa. 190
Ainda dentro dos aspectos que envolvem a operacionalização das missões da União
Europeia, a Cimeira de Helsinque, realizada em dezembro 1999, definiu o desígnio da UE de,
agindo em conjunto, ser capaz, através da fixação de um objetivo em matéria de capacidades
militares e civis de gestão de crises, de colocar até 2003, 60 mil pessoas em campo, num
prazo de 60 dias, e de mantê-las durante um ano. Assim, estas forças designadas de Forças de
Reação Rápida seriam capazes de conduzir as Missões Petersberg. 191
Entretanto, antes mesmo de definir as Forças de Reação Rápida, a Cimeira de
Helsinque vem prioritariamente reforçar a importância da cooperação com outras
organizações internacionais, como a ONU e a OTAN, de forma a evitar a duplicação de
esforços e agilizar recursos e capacidades para a prevenção de conflitos e gestão de crises. 192
O objetivo foi ter a disposição capacidades coletivas concertadas para dar continuidade a
todas as fases, desde a prevenção até a reconstrução de conflitos, decidindo sobre as
diferentes e melhores possibilidades a acionar no decurso de uma crise específica. 193
189
Declaração Final do Conselho sobre a PESC. Disponível: http://www.europarl.europa.eu/summits/
kol2_pt.htm#an3. Acessado em 13 de jun. 2013
190
Andrade, Luís (2002) A UE e os desafios da política internacional. Açores: Assembleia Legislativa Regional
dos Açores.
191
CONSEIL EUROPEEN D'HELSINKI . Conclusions de la présidence . Helsinki, 11 dez. 1999. Disponível em:
www.grip.org/bdg/pdf/g1806.pdf. Acessado em 24 de jun. 2013
192
Idem.
193
Algumas das medidas que Helsinque aciona para desenvolver objetivos das capacidades coletivas nos
domínios do comando e controlo ou inteligência, para a execução das missões de Petersberg passaram por:Elaboração de um inventário de recursos nacionais e coletivos;- Criação de base de dados para partilhar
informações sobre os recursos, capacidades e conhecimentos específicos;- Criação de um mecanismo de
coordenação, no seio do secretariado do Conselho, que funcione em estreita cooperação com os serviços da
Comissão e o desenvolvimento da capacidade de policiamento civil;- Criação de um mecanismo de
financiamento e de um fundo de reação rápida da Comissão para acelerar a disponibilização de fundos para
apoiar as atividades da UE, contribuir para operações conduzidas por outras Organizações Internacionais e
61
Não obstante, a importância do fomento de uma espécie de plataforma alargada de
concertação entre organizações governamentais e não-governamentais no domínio da gestão
de crises, o grande contributo de Helsinque atrela-se com o estabelecimento de um “objetivo
de capacidades”.194 Em termos práticos, trata-se da definição de um objetivo comum europeu
para assegurar capacidades militares, estrategicamente posicionáveis para desempenhar toda a
gama de Missões de Petersberg, no âmbito das quais outros atores (a ONU) não podem ou
não querem intervir. 195
Nos anos subsequentes, os debates e as evoluções das políticas de segurança e de
defesa da UE se intensificaram, consequência dos novos desafios impostos com os ataques
terroristas ocorridos em 2001. Estas questões trouxeram uma nova lógica na forma de
contribuição da União Europeia nas questões relativas à paz e a segurança internacionais,
coforme se verificará na sequência.
2.4. Dos Anos 2000: Uma Década de Expansão
Os anos 2000 se caracterizam por uma mudança de postura política na UE. Pela
primeira vez desde sua fundação, o Conselho Europeu atribuiu à União o desígnio de ser uma
“potência”, afirmando estar em condições de conduzir operações de gestão de crises à la
Petersberg de forma cada vez mais autônoma e complexa.196 A União buscava reforçar,
assim, as portas para testar as suas estruturas e procedimentos relativos aos aspectos civis e
militares das operações de gestão de crises, de modo a analisar, planejar, decidir e, nas áreas
em que a OTAN enquanto tal, não estiver comprometida, lançar e conduzir operações de
gestão de crises. Os interesses da UE em desenvolver essas missões centram-se nos conceitos
financiar as atividades das ONGs No fundo, o objetivo é assegurar a coerência inter-pilares, desenvolvendo um
plano de ação de gestão não militar de crises para coordenar e dar maior eficácia aos vários meios e recursos
civis e militares de que dispõem a União (doc. 11044/99) e os Estados-Membros (doc. 12303/99). Carta final de
Helsinque, acessado em: http://www.eurotreaties.com/documents.html em 20 de maio de 2013.
194
Citação do anexo IV dos relatórios da Presidência do Conselho Europeu de Helsinque sobre “Reforço da
política europeia comum de segurança e defesa” e “Aspectos não militares da gestão de crises na União
Europeia”, acessado através http://www.eurotreaties.com/documents.html em 20 de maio de 2013.
195
Telò, Mario (2009), “Introduction: the EU as a model, a global actor and an unprecedent power” in Telò,
Mario (ed.) The European Union and Global Governance. New York: Routledge
196
SOLANA, Javier, Estratégia Europeia em matéria de segurança. Uma Europa segura num mundo melhor.
2003. Documentos do Conselho Europeu. Disponível em:http://www.consilium.europa.eu/showPage.aspx?
id=266&lan g=pt. Acessado em 03 de junho de 2013.
62
de “diplomacia de oportunidades”, ou seja, aproveita sempre que possível as oportunidades
para marcar presença nos grandes palcos, e fazê-lo deixando obviamente uma marca positiva.
A União Europeia, neste sentido, não almeja apenas se firmar enquanto um ator relevante nos
temas de paz e segurança, e adquirir experiência operacional.197 A Organização tem
desenvolvido uma estratégia de progressiva afirmação e valorização de seu papel no plano
multilateral, contrariando uma postura mais reativa e defensiva da política externa, que pode
representar ganhos geopolíticos e geoestratégicos importantes para a União. 198
Além disso, os atentados de 11 de Setembro apresentaram uma nova dinâmica nos
debates a respeito dos temas de paz e segurança internacionais, e desafiaram o mundo
globalizado com novas formas, que não as tradicionais, de causar medo e terror no mundo. A
própria UE, após os ataques terroristas aos EUA, reagiu com medidas mais enérgicas, tais
como a aprovação de mandado de detenção, ações contra o financiamento do terrorismo e um
acordo de auxílio judiciário mútuo com os Estados Unidos. Buscou, ainda, traçar linhas
mestras para o enquadramento da organização no combate às ameaças internacionais –
terrorismo e proliferação de armas de destruição maciça–, quer no contexto das alianças e
parcerias com as demais organizações e o desenvolvimento da cooperação neste domínio e a
melhorar as suas defesas. 199
No quadro da sua política externa e de segurança comum, a UE, enquanto organização
regional e na busca de um posicionamento internacional de promotora da paz, como
estabelecido no preâmbulo de seu Tratado fundador, coloca em prática as suas primeiras
operações no campo da paz, inicialmente em 2003, com as intervenções na BósniaHerzegovina, na Macedônia e na República Democrática do Congo.
Primeiramente as ações de janeiro de 2003 a 2007, a UE lançou a Missão de Polícia
(EUPM), na Bósnia-Herzegovina, tendo como objetivos: ajudar na criação de uma força
policial profissional e multiétnica sustentável; auxiliar a polícia local no combate ao crime
organizado em grande escala; e ajudar com a reforma de todo o sistema de polícia. A missão
europeia substituiu a Força Internacional de Polícia das Nações Unidas e envolveu cerca de
470 efetivos policiais. 200
197
EVANS, Gareth. Cooperating for peace. St. Leonards: Allen & Unwin. 2003
EVANS, Gareth. Cooperating for peace. St. Leonards: Allen & Unwin. 2003
199
SOLANA, Javier - Relatório sobre a execução da estratégia europeia de segurança – garantir a segurança num
mundo em mudança. Bruxelas, 11 de Setembro de 2008. Disponível em: http://www.consilium.europa.eu
/uedocs/cms_Data/docs/pressdata/PT/Reports/ 104638.pdf. Acessado em 11 de junho de 2013.
200
Acção comum do Conselho, de 11 de Março de 2002, relativa à Missão de Polícia da União Europeia.
Disponível em:http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=CEL EX:32002E0210. Acessado em 06
198
63
Já no mês março, foi a vez da República da Macedônia ser o cenário de atuação da
União Europeia. Esta operação de paz, por sua vez, tinha como principal objetivo o de
continuar o trabalho de estabilização da situação no território iniciado pela OTAN, garantindo
as condições de segurança necessária à implementação do tratado de cessar-fogo201, assinado
em agosto de 2001. Estas ações inseriam-se num contexto de apoio prestado pela União
Europeia ao governo macedônio, que, além da componente militar, envolvia, igualmente,
apoio político e econômico.
Por fim, em junho de 2003, por decisão do Conselho da União Europeia, deu-se início
a operação de gestão de crises no nordeste da República Democrática do Congo (na cidade de
Bunia), denominada EUFOR Artemis. Esta operação teve o objetivo de contribuir com a
estabilização de segurança nos aeroportos e da população civil no breve período de três
meses, mesmo assim, esta missão pode ser considerada um marco nas ações da União
Europeia, pois, foi a primeira operação (militar ou civil) efetuada fora de seu continente.
Como outra característica a realçar, tem-se a coordenação muito próxima com a ONU, em
particular com a missão da ONU já presente no local (Missão das Nações Unidas na
República Democrática do Congo – MONUC).
202
Essa operação representou uma
aproximação importante no quadro de cooperação destas duas organizações, sendo inclusive a
primeira operação realizada por ambas, dando espaço para a assinatura da “Declaração
Conjunta entre União Europeia e ONU para a Gestão de Crises”, como se verá adiante.
Com as bem sucedidas ações de intervenção mencionadas acima, ainda em 2003, e no
quadro das operações de paz, Javier Solana, o Alto Representante para a PESC, decide
elaborar um documento que contivesse as linhas gerais de um conceito estratégico europeu no
campo da segurança e defesa internacionais.
203
O documento intitulado Estratégia Europeia
de Segurança – (ESS) definia os desafios globais e as principais ameaças que se colocam à
Europa no âmbito da segurança. O documento afirmava que a globalização a par de fatores
como a abertura das fronteiras, o aumento dos fluxos de comércio e investimento, e o
desenvolvimento tecnológico, trouxeram um grau de desenvolvimento à UE, como é sabido,
de julho de 2013.
201
CONSEIL DE L'UNION EUROPEENNE . Une Europe sûre dans un monde meilleur stratégie européenne de
Sécurité. Bruxelas, 12 dez. 2003. Disponível em :http://www.ueitalia2003.it/FR/LaPresidenzaInforma/Cale
ndario/12/12/doc_ev_12dicce_5.htm. Acessado em 19 de jun. 2013
202
RUGGIE, John G. The United Nations and the collective use of force: whither — or whether. New York:
United Nations Association of the United States of America, 2008
203
Idem.
64
entretanto, consequentemente, geraram certa dependência e vulnerabilidade.204 A dependência
energética, e a corrida no acesso a recursos naturais, por exemplo, são dois fatores de
preocupação para a Europa, pois são recursos estratégicos essenciais que podem causar
grandes turbulências, sendo os principais desafios globais que se impõem na Europa
atualmente. 205
Entretanto, para além das ameaças e desafios, Javier evidencia a União Europeia como
uma Comunidade produtora e promotora de normas e valores, e por isso, “a Europa deve estar
pronta para assumir a sua parte de responsabilidade na segunda global e na criação de um
mundo melhor”. 206
A ESS, neste sentido, parece assumir-se como uma espécie de manifesto para uma
União mais ativa, desenvolvendo uma “cultura estratégica que promova uma intervenção
precoce, rápida e, se necessário, enérgica”
207
; mais coerente, congregando os diferentes
instrumentos e capacidades, pois “a segurança é a condição primária do desenvolvimento” 208;
e mais capaz, desde logo assumindo que “o recurso sistematizado a meios partilhados e postos
em comum reduziria as duplicações, os custos e, em médio prazo, levaria a um aumento das
capacidades” 209.
A Estratégia exortou a União a contribuir para uma ordem multilateral mais efetiva em
todo o mundo. Desde 2003 que a UE tem intensificado as suas parcerias na execução deste
objetivo e com isso conseguiu ampliar sua atuação no campo das operações de paz em outros
territórios, diferentes daqueles que já atuara em 2003.
Assim, além das três operações já descritas anteriormente, a UE realizou outras 16
missões, algumas das quais ainda continuam em andamento, conforme ilustrado no quadro210
abaixo:
204
CONSEIL DE L'UNION EUROPEENNE . Une Europe sûre dans un monde meilleur stratégie européenne de
Sécurité. Bruxelas, 12 dez. 2003. Disponível em :http://www.ueitalia2003.it/FR/LaPresidenzaInforma/Cale
ndario/12/12/doc_ev_12dicce_5.htm. Acessado em 19 de jun. 2013
205
SOLANA, Javier - Relatório sobre a execução da estratégia europeia de segurança – garantir a segurança num
mundo em mudança. Bruxelas, 11 de Setembro de 2008. Disponível em: http://www.consilium.europa.eu
/uedocs/cms_Data/docs/pressdata/PT/Reports/ 104638.pdf. Acessado em 11 de junho de 2013.
206
SOLANA, Javier - Relatório sobre a execução da estratégia europeia de segurança – garantir a segurança num
mundo em mudança. Bruxelas, 11 de Setembro de 2008. Disponível em:http://www.consilium.europa.eu/uedocs/
cms_Data/docs/pressdata/PT/Reports/104638.pdf>. Acessado em 13 de 2013.
207
Idem.
208
Idem.
209
SOLANA, Javier - Relatório sobre a execução da estratégia europeia de segurança – garantir a segurança num
mundo em mudança. Bruxelas, 11 de Setembro de 2008. Disponível em:http://www.consilium.europa.eu/ued
ocs/cms_Data/docs/press data/PT/Reports/ 104638.pdf. Acessado em: 06 de junho de 2013.
210
Bobrow, D. e Boyer, M. “Maintaining System Stability: Contributions to Peacekeeping Operations”. In. The
Journal of Conflict Resolution, vol. 41, no. 6, 1997, pp. 723-748.
65
As Missões Operacionais da União Europeia
Designação
EUFOR/ALTHEA
Local
BósniaHerzegovina
Duração
2004/Atual
Objetivos
Operação Militar
Base Jurídica
2004/570/PESC – 2004
Geórgia
2004/2005
Reforço do Estado de
Direito
004/523/ PESC – 2004
Macedônia
2005/2006
2005/826/ PESC – 2005
Moldávia
2005/2009
Reforço das capacidades
locais
Operação Policial
Kosovo
2008/Atual
Estado de Direito
2008/124/ PESC – 2008
EUPOL / KINSHASA
RD Congo
2005/2007
2004/847/ PESC – 2003
EUSEC Congo
RD Congo
2005/2009
EUPOL Congo
Congo
2006
Darfur
Chade
Guiné
Bissau
Territórios
Palestinos
Iraque
2007/2009
2005/2007
2008/Atual
Territórios
Palestinos
Achém
Afeganistão
2005/2008
Reforço das capacidades
policiais locais
Reforma do setor de
segurança
Reforço das capacidades
policiais locais
Operação Civil e Militar
Operação Militar
Reforma do setor de
segurança
Reforço das capacidades
policiais locais
Reforço do Estado de
Direito
Operação Policial
EUJUST THEMIS
EUPAT
Missão Fronteiriça
EULEX
Missão Apoio UE/AMIS (UA)
EUFOR Tchad
EU SSR Guiné Bissau
EUPOL COPPS
EUJUST LEX
MAF EU RAFA
Missão de Vigilância
EUPOL
2005/Atual
2005/2009
2005/2006
2007/2010
Estado de Direito
Reforço das capacidades
policiais locais
Fonte: Serviço de Segurança Externa - União Europeia
MoU entre UE e Moldávia
2006/319/ PESC – 2006
2007/405/PESC – 2007
Ação Comum do Conselho
Ação Comum do Conselho
Ação Comum do Conselho
2005/797/ PESC – 2005
2005/190/ PESC – 2005
2005/889/ PESC – 2005
2005/643/ PESC – 2005
2007/369/ PESC – 2007
Elaboração Própria
No que concerne à atuação da União Europeia nas missões desenhadas acima,
entende-se que tudo o que a UE tem feito no domínio da paz e segurança internacionais tem
estado associado aos princípios e propósitos da ONU. Esta afirmação é corroborada se visto a
presença europeia nos grandes teatros de ação, (Kosovo, Afeganistão, República Democrática
do Congo, Sudão/Darfur, Chade, entre outros) e no fortalecimento dos laços institucionais, em
conformidade com a declaração conjunta UE-ONU de 2007.
Desta forma,
As Nações Unidas e a União Europeia partilham do princípio de que a
responsabilidade pela manutenção da paz e da segurança
internacionais cabe, em primeiro lugar, ao Conselho de Segurança das
Nações Unidas, de acordo com a Carta das Nações Unidas. Neste
66
contexto, a União Europeia reitera o seu empenho em contribuir para
os objetivos das Nações Unidas em matéria de gestão de crises. 211
Ambas as organizações reconheceram ainda, na Declaração, os progressos feitos no
campo da paz, afirmando que:
As Nações Unidas e a União Europeia reconhecem que no ano
anterior se realizaram grandes progressos no estabelecimento de uma
cooperação concreta entre ambas em matéria de gestão de crises,
especificamente no que se refere à transferência das responsabilidades
da Força Internacional de Polícia das Nações Unidas para a Missão de
Polícia da União Europeia na Bósnia-Herzegovina, à rápida projeção,
a pedido do Conselho de Segurança, da Operação Militar da União
Europeia na República Democrática do Congo (Operação Artemis) e à
ponderação ativa, por parte da União Europeia, de formas de
assistência à criação de uma Unidade Integrada de Polícia em
Kinshasa, com o objetivo de proporcionar segurança ao Governo e às
instituições de transição. 212
Ainda dentro do quadro político da ESS, ONU e União Europeia assinaram
conjuntamente, em 2004, o documento intitulado “Cooperação UE-ONU em operações
militares de gestão de crises – Elementos para a implementação da declaração conjunta UEONU”
213
. Este documento serve como base sólida para o desenvolvimento de uma
cooperação concreta e eficaz nas questões relacionadas à segurança e a paz internacionais,
dando continuidade às manifestações da Declaração Conjunta assinada no ano anterior.
Nesta linha,
A assinatura de uma "Declaração conjunta sobre a cooperação entre a
UE e as Nações Unidas em matéria de gestão de crises" em Setembro
de 2003, tirando partido do êxito da Operação Artemis, identificou
vias para implementar o compromisso, há muito assumido pela UE, de
apoiar a ONU na gestão de crises. Foi instituído, no nível de grupo de
trabalho, um mecanismo de consulta conjunto (o chamado "Comitê
211
Declaração Conjunta União Europeia e Nações Unidas sobre a Gestão de Crises. Disponível em: http://Europa
eu/rapid/press-rele ase_PRES-03-266_pt.htm?locale=en. Acessado em 12 de junho de 2013.
212
Declaração Conjunta União Europeia e Nações Unidas sobre a Gestão de Crises. Disponível em: http://Europa
eu/rapid/press-rele ase_PRES-03-266_pt.htm?locale=en. Acessado em 12 de junho de 2013
213
Cooperação UE-ONU em operações militares de gestão de crises – Elementos para a implementação da
declaração conjunta UE-ONU. Disponível em: http://register.consilium.europa.eu/pdf/pt/04/st09/st09638re01.pt04.pdf. Acessado em 11 de junho de 2013.
67
Diretor"), tendo-se realizado reuniões periódicas entre membros do
pessoal de ambas as organizações. 214
O documento em questão sublinha duas principais possibilidades de cooperação de
capacidades e o desenvolvimento da UE enquanto ator de segurança e defesa. A primeira está
na atuação da União Europeia enquanto intermediador entre seus Estados-Membros para que
colaborem de forma mais efetiva com as Nações Unidas.
Neste sentido,
Poder-se-ia encarar a hipótese de atribuir à UE um papel
complementar, sob a forma de "processo de intermediação" entre os
Estados-Membros; este processo proporcionaria um enquadramento
graças ao qual, os Estados-Membros poderiam proceder ao
intercâmbio voluntário de informações sobre os respectivos
contributos para operações específicas da ONU e, se assim o
decidissem, coordenar esses seus contributos nacionais. Tal assumiria
especial relevância no âmbito daquilo que a ONU designa por
"capacidades de habilitação”. 215
Já a segunda possibilidade está na criação e a manutenção de uma operação da UE de
apoio à ONU, sob o controle da primeira. Neste caso, a União pode conduzir operações no
âmbito de um mandato da ONU, quer enquanto operações autônomas, quer assumindo a
responsabilidade por uma componente específica dentro da estrutura de uma missão da ONU.
Desta forma,
A outra grande opção é o lançamento e condução de uma operação da
UE de apoio à ONU, sob o controlo político e a direção estratégica da
UE. Poderiam considerar-se diversas modalidades. A UE poderia
conduzir operações no âmbito de um mandato da ONU, quer enquanto
operações autônomas, como seria o caso da Bósnia-Herzegovina, quer
assumindo a responsabilidade por uma componente específica dentro
da estrutura de uma missão da ONU (a chamada "abordagem
modular"). Neste caso, uma componente da UE operaria sob o
controlo político e a orientação estratégica da UE. Estes modelos terão
de ser avaliados na perspectiva da UE, à luz das experiências
presentes e do passado. 216
214
Cooperação UE-ONU em operações militares de gestão de crises – Elementos para a implementação da
declaração conjunta UE-ONU. Disponível em: http://register.consilium.europa.eu/pdf/pt/04/st09/st09638re01.pt04.pdf. Acessado em 11 de junho de 2013.
215
Idem.
216
Idem.
68
Entretanto, mesmo a ONU buscando estreitar um relacionamento com a UE,
oferecendo-lhe um grau de autonomia elevado, possibilitando-lhe a criar e operacionalizar
suas próprias missões em apoio a ONU, como visto, as declarações conjuntas firmadas entre
as mesmas, sempre buscaram deixar claro, que a UE é um importante “coadjuvante” nestas
atividades, ou seja, a ONU sempre reservou à si própria a responsabilidade de intervenção, o
monopólio do uso da força.
A Estratégia Europeia de Segurança sublinhou a importância das
Nações Unidas nas relações internacionais e recordou que cabe ao
Conselho de Segurança das Nações Unidas a responsabilidade
primordial pela manutenção da paz e da segurança internacionais.
Sublinhou igualmente que "reforçar a Organização das Nações
Unidas, dotando-a dos meios necessários para que possa cumprir as
suas missões e atuar de forma eficaz, deve ser uma das prioridades da
Europa". Este compromisso deverá ser consentâneo com as demais
prioridades definidas na Estratégia Europeia de Segurança. 217
Diante do apresentado, percebe-se um forte progresso no relacionamento nos últimos
anos, destacando-se uma ambivalência de situações: do lado da ONU, as novas exigências em
matéria de operações de paz colocam a organização nos limites operacionais e levam-na a
procurar cada vez mais apoio entre os atores regionais. De acordo com John Ruggie, por
exemplo, as operações da ONU foram mais bem-sucedidas quando efetivamente
“patrocinadas” por membros do Conselho de Segurança ou por organizações regionais
dispostos a enviar unilateralmente recursos em seu apoio.
218
O orçamento da ONU para as
operações, de junho de 2012 a julho de 2013, corresponde a aproximadamente 5 bilhões de
dólares, sendo que atualmente são utilizados cerca de 7 bilhões para o financiamento das
ações. 219
Deste modo, a presença militar do Reino Unido em Serra Leoa, as atividades militares
da França na Costa do Marfim, o sólido apoio dos Estados Unidos à operação da ONU na
Libéria, a presença da União Africana em Darfur e da União Europeia no Congo parecem ter
217
Cooperação UE-ONU em operações militares de gestão de crises – Elementos para a implementação da
declaração conjunta UE-ONU. Disponível em: http://register.consilium.europa.eu/pdf/pt/04/st09/st09638re01.pt04.pdf. Acessado em 11 de junho de 2013.
218
RUGGIE, John G. The United Nations and the collective use of force: whither — or whether. New York:
United Nations Association of the United States of America, 2008
219
NATIONS, Dpko - United. Past Peacekeeping Operations. Disponível em: <http://www.un.org/en/peacekee
ping/operat ions/past.shtml>. Acesso em: 03 jun. 2013.
69
contribuído para criar um ambiente operacional mais tolerante para as forças internacionais de
manutenção da paz. 220 Operacionalmente as missões de paz da ONU trabalham em seu limite
máximo na África e no resto do mundo, já que cerca de 90 mil pessoas estão hoje
comprometidas em 18 operações de manutenção da paz da ONU em todo o globo.
Aproximadamente 70 % desse pessoal participam de oito operações no continente africano, de
116 países diferentes.
221
Do lado europeu, o desenvolvimento da Política Europeia de
Segurança e Defesa (PESD), o seu interesse geopolítico e geoestratégico direto em diversas
regiões, e a ênfase na sua autonomia tem levado a União a equacionar o seu envolvimento nas
operações da ONU. 222
Ou seja, de um lado, como visto a UE se lança como um ator global, capaz de criar e
gerir missões complexas e multidimensionais com certo grau de autonomia, entretanto,
atuando com respeito aos princípios e propósitos das Nações Unidas, reconhecendo a
primazia da mesma nas missões de paz. 223 Do outro, a ONU busca contar com as capacidades
materiais e operacionais da UE, entretanto, não permitindo que a mesma se sobreponha ao seu
direito de intervenção através do CSNU. 224
A convergência destes dois movimentos promoveu uma genuína aproximação
interinstitucional, como visto. Todavia, este processo desenvolve-se por entre as diferenças de
agenda, vocação ou membership respectivos das duas organizações.
225
Em geral, é mais a
União que fixa a agenda e define os termos de um relacionamento, caracterizado,
essencialmente, pelo que a ONU quer e aquilo que a UE está disposta a oferecer.
226
Deste
modo, entende-se que a União Europeia é levada a agir com seus interesses em primeiro
lugar, no relacionamento com as Nações Unidas. 227
Como via de regra, a ONU, por meio do CSNU, ou através da AGNU, adota
Resoluções a respeito de diferentes controvérsias, nos mais variados lugares do globo,
analisando ou não a necessidade de uma ação interventora. Nos casos em que julga
220
RUGGIE, John G. The United Nations and the collective use of force: whither — or whether. New York:
United Nations Association of the United States of America, 2008.
221
NATIONS, Dpko - United. Past Peacekeeping Operations. Disponível em: <http://www.un.org/en/peacekee
ping/operat ions/past.shtml>. Acesso em: 03 jun. 2013.
222
RUGGIE, John G. The United Nations and the collective use of force: whither — or whether. New York:
United Nations Association of the United States of America, 2008.
223
SUTTERLIN, James S. The United Nations and the maintenance of international security. Westport: Praeger,
2007.
224
Idem.
225
Idem.
226
Idem;
227
RUGGIE, John G. The United Nations and the collective use of force: whither — or whether. New York:
United Nations Association of the United States of America, 2008.
70
estabelecer uma missão de paz, a Organização clama a comunidade internacional a participar
das operações, com contribuições materiais ou operacionais. Neste momento é que os
Estados-Membros e as organizações internacionais decidem colaborar ou não, ou seja, é nessa
ocasião que a União Europeia coloca o que julga serem os prós e os contras de sua
participação. 228
Assim, as relações UE-ONU na promoção da paz são caracterizadas como
multifacetadas, pois resultam da junção de perspectivas de diferentes atores estatais em
relação a uma atividade, operações de paz, complexa e multidimensional por natureza, com
aproximações necessariamente distintas consoante o local onde se desenrole (Europa, África
ou outro), por intermédio de que quadro (ONU, organizações regionais, coligações) e com
que propósito e nível de envolvimento (mandato, comando, força requerida, etc.).
229
Em
última análise, a ONU e a UE fazem aquilo que os seus membros entendem que se pode e
deve fazer.
No que concerne às questões de ordem institucionais, em 2000, o Conselho Europeu
de Santa Maria da Feira orientou para uma institucionalização, no âmbito do Conselho, de
novos órgãos e estruturas político-militares que assegurassem a orientação política e direção
estratégica das operações de Petersberg.
230
O primeiro, um Comitê Político e de Segurança
que, na sequência da entrada em vigor do Tratado de Amsterdam, foi aceito no Conselho
Europeu de Helsinque e que adquiriu forma de princípio permanente com o Conselho
Europeu de Nice. Constituído por Altos Representantes nacionais, entre os responsáveis
políticos dos Ministérios dos Negócios Estrangeiros, este órgão intergovernamental tem como
missão acompanhar a evolução da situação internacional no âmbito da PESC, contribuir para
a definição das políticas e controlar a execução das decisões do Conselho. 231
O segundo é o Comitê Militar da União Europeia (CMUE) que, constituído pelos
Chefes de Estado-Maior da Armada (CEMA) dos Estados-Membros, aconselha e faz
recomendações militares ao Comitê Político e de Segurança (COPS) de todas as operações
militares da UE.
228
232
O CMUE fornece ainda orientações militares ao Quadro de Pessoal
RUGGIE, John G. The United Nations and the collective use of force: whither — or whether. New York:
United Nations Association of the United States of America, 2008.
229
Barceló. Maria J. Tesis Doctoral presentada para el Programa de Doctorado Interdisciplinario Internacional
sobre la Sociedad de la Información y del Conocimiento. Barcelona 2012.
230
Bauer, Michael W. 2009. “Reforming the European Commission – A (Missed?) Academic Opportunity”.
European Integration Online Papers, Vol. 6 (2002), nº 8 Disponível em: http://eiop.or.at/eiop/texte/2000008a.htm. Acessado em 06 de julho de 2013.
231
Idem.
232
Conselho Europeu de Santa Maria de Feira. Disponível em: http://www.europarl.e uropa.eu/su
71
Militar (QPM) e assume a direção militar ou fornece as instruções ao Estado-Maior da União
Europeia (EMUE) que desempenha essencialmente funções de alerta precoce, avaliação da
situação e planejamento estratégico e conduz as operações militares de gestão de crises
liderada pela União. 233
Desta forma, já no Conselho Europeu de Nice, os Chefes de Estado e de Governo
assinaram o novo Tratado de Nice, que veio legitimar todo o aparato dos Conselhos Europeus
posteriores à entrada em vigor de Amsterdam.234 Desde logo, é formalmente consagrado em
Nice toda estrutura em torno do COPS “que poderá ser autorizado pelo Conselho, para efeitos
de uma operação de gestão de crises e enquanto ela durar, a tomar as decisões adequadas, no
âmbito do II Pilar, para assegurar o controle político e a direção estratégica das operações”. 235
Além disso, o Tratado de Nice adormece estrategicamente a UEO (embora sem extinguir o
Tratado de Bruxelas) e incorpora as funções de gestão de crises, tradicionalmente
desempenhadas pela Organização, na própria missão da União Europeia. 236
Já no final da década, em 13 de dezembro de 2007, sob a égide da Presidência
Portuguesa do Conselho da UE, os 27 chefes de Estado e de Governo dos países da União
Europeia concluíram e assinaram em Lisboa, após meses de negociações numa Conferência
Intergovernamental, o novo Tratado da União Europeia237, que introduz alterações no Tratado
da União Europeia e no Tratado que instituiu a Comunidade Europeia. 238
Com o Tratado de Lisboa pretendeu-se dar maior coerência à ação externa da União e
agilizar o processo de decisão para esse fim. A governança da UE parece, em Lisboa, estar se
aproximando de um figurino mais Estadista239, centralizados politicamente em Bruxelas,
consagrados através de novas dimensões já previstas, inclusive no projeto de Tratado
Constitucional.
240
Em Lisboa também, a defesa e segurança encontram-se disponíveis para
uma cooperação reforçada. Contudo, no que se refere às operações de manutenção da paz, o
novo texto não apresenta atualizações que alterem de forma relevante o já instituído pelos
mmits/fei1_pt.htm. Acessado em 13 de jun. 2013.
233
Conselho Europeu de Santa Maria de Feira. Disponível em: http://www.europarl.e uropa.eu/su
mmits/fei1_pt.htm. Acessado em 13 de jun. 2013.
234
Tratado de Nice. Disponível em: http://eur-lex.europa.eu/pt/treaties/dat/12001C/htm/12001C.html. Acessado
em 18 de jun. de 2013.
235
Idem.
236
Idem.
237
Tratado de Lisboa. Disponível em: http://eur-lex.europa.eu/JOHtml.do?uri=OJ:C:2007:306:SOM:PT:HTML .
Acessado em 12 de jun. 2013
238
Idem.
239
Ginsberg, Roy H. (1999) ‘Conceptualizing the European Union as an International Actor: Narrowing the
Theoretical Capability-expectations Gap’, Journal of Common Market Studies.
240
Idem.
72
Tratados de 1992 e 1997. 241
O Tratado de Lisboa assim,
Reconhece que, num contexto global turbulento e em plena crise
econômica e financeira, a União Europeia é chamada a reforçar a sua
autonomia estratégica para preservar os seus valores, perseguir os seus
interesses e proteger os seus cidadãos desenvolvendo uma visão
comum dos principais desafios e ameaças e reunindo as suas
capacidades e recursos para lhes dar resposta adequada, contribuindo
deste modo para preservar a paz internacional e a estabilidade global,
nomeadamente aplicando um multilateralismo efetivo. 242
Diante da citação acima, são perceptíveis os avanços feitos no quadro de segurança e
defesa da UE, principalmente, nos últimos vinte anos, com os Tratados fundadores da UE.
Nos Tratados foi possível observar o intuito da União Europeia de tornar-se um ator relevante,
conjuntamente com as Nações Unidas, no campo de paz e segurança internacionais.
243
A
União Europeia conseguiu, através de modelo de integração, criar uma personagem política
de peso nos debates a respeito de paz, consolidando-se como um vetor de progresso em todo o
mundo. 244
O ponto de partida deste capítulo foram os debates sobre a inclusão de uma dimensão
de segurança no seio da UE, questão sempre presente no processo de integração europeia –
apesar de a maior parte dos esforços diplomáticos terem focalizado questões de integração
econômica e política. De fato, o começo das negociações sobre esquemas comuns de
segurança começaram após negociações sobre questões econômicas e comercias, mas os
objetivos que promoveram estas negociações estiveram fundamentalmente relacionados com
a segurança dos Estados da Europa Ocidental. 245
No entanto, este processo revelou-se demorado, complexo e não sem retrocessos.
Após, praticamente, meio século de negociações e debates, finalmente fora incluída a
241
Preâmbulo e artigo 42.º do Tratado da União Europeia. Disponível em: http://eur-lex.europa.eu
/pt/treaties/dat/11992M /htm/119 92M .html. Acessado em 12 de maio de 2013.
242
Desenvolvimento da Política Comum de Segurança e Defesa na sequência da entrada em vigor do Tratado de
Lisboa – 2009. Disponível em: http://eurlex.europa .eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ: C:2012:377E:
0051:0065:PT :PDF. Acessado em 13 de jun de 2013
243
RUGGIE, John G. The United Nations and the collective use of force: whither — or whether. New York:
United Nations Association of the United States of America, 2008.
244
Bomberg, Elizabeth, and Alexander Stubb. 2010. The European Union: How does it Work? Oxford: Oxford
University Press.
245
Idem.
73
dimensão de política externa e de segurança comum num esquema de integração regional, que
eventualmente levou à incorporação da dimensão mais específica de segurança e de defesa
europeias. Com a consolidação de uma política externa de defesa e segurança comuns, a
União Europeia passou a reforçar suas ações no cenário internacional, como um vetor de
progresso e paz.
246
Deste modo, a União buscou atuar por meio das missões de Pertersbeg,
originalmente parte integrante da UEO e mais tarde institucionalizada pelo TUE, em diversos
cenários de conflito.
247
Dado o sucesso de suas ações de caráter multidimensional, ONU e
UE passaram a acreditar em uma cooperação mais próxima no campo das operações de paz,
neste sentido, em 2003, a UE participa da missão das Nações Unidas na RDC, como se verá
na sequência, abrindo espaço para a posterior assinatura de uma declaração conjunta para
gestão de crises, conforme observado neste capítulo.
Uma vez analisados a evolução e os quadros institucionais da ONU e da UE, o
próximo capítulo apresentará com mais afinco como funcionam a cooperação entre ONU e a
União Europeia, no campo de ação, mais especificamente na República Democrática do
Congo. Destaca-se também, de que forma institucionalizou-se o acordo de cooperação,
previsto no capítulo VIII, bem como os trâmites legais, os problemas e desafios da
intervenção, além, claro, da análise do conflito em questão.
246
SOLANA, Javier, Estratégia Europeia em matéria de segurança. Uma Europa segura num mundo melhor.
2003. Documentos do Conselho Europeu. Disponível em:http://www.consilium.europa.eu/showPage.aspx?
id=266&lan g=pt. Acessado em 03 de junho de 2013.
247
Bomberg, Elizabeth, and Alexander Stubb. 2010. The European Union: How does it Work? Oxford: Oxford
University Press.
74
3. A CONTRIBUIÇÃO EUROPEIA À ONU NAS OPERAÇÕES DE PAZ: A
PARTICIPAÇÃO NAS MISSÕES NO CONGO
3.1. Considerações Preliminares
Ao longo dos dois últimos capítulos, analisou-se o desenvolvimento e o
funcionamento dos quadros institucionais de ações no campo da paz, tanto da Organização
das Nações Unidas, quanto da União Europeia. Salientaram-se as evoluções das operações de
paz, como ferramenta da ONU para realizar seu objetivo primordial e, principalmente os
dispositivos legais de atuação de forma cooperada entre organizações. Esses capítulos
também avaliaram os desejos e as motivações de ambas promoverem a paz, a segurança e o
progresso em todo o mundo, e finalmente, as possibilidades de fazerem isso através de ações
conjuntas.
Nesse terceiro capítulo, por sua vez, se abordará o relacionamento entre a ONU e a
UE, no tocante às operações de paz, através da análise de um exemplo prático, que são as
intervenções na República Democráticas do Congo, na tentativa de elucidar os interesses e
desafios dos processos de cooperação. Esse capítulo também busca explicar de que maneira a
União Europeia leva a cabo suas próprias operações de paz, as chamadas missões de
Petersberg, como visto no segundo capítulo, uma vez que a UE reconhece as Nações Unidas
como organização dotada do monopólio legítimo do uso das forças nas relações
internacionais. A partir destas análises, busca-se alcançar o objetivo proposta por esta
pesquisa, que é analisar as motivações, possibilidades e desafios dos arranjos regionais
estabelecidas entre as Nações Unidas e a União Europeia, com base no capítulo VIII da Carta
de São Francisco, a partir do estudo das missões de paz na República Democrática do Congo.
3.2.
A Regionalização das Operações de Paz: As ações da UE e da ONU
O desenvolvimento, pelas instituições regionais, de mecanismos e capacidades para
atuar na manutenção da paz tem se mostrado uma das tendências mais marcantes no que diz
75
respeito a operações de paz desde a década passada.
248
Após os ocorridos nas missões na
Somália (1992-1993), e em Ruanda (1993-1996), onde a ONU foi incapaz de conter o
genocídio, como visto, criou-se, especialmente, entre os países desenvolvidos, uma crise de
confiança em relação às operações de paz conduzidas pela ONU. As organizações regionais
parecem ter sido, então, a forma eleita por estes países para sua atuação direta, de modo que
as nações desenvolvidas têm disponibilizado recursos de forma crescente para as organizações
regionais a que pertencem. 249
A regionalização, no entanto, não significa necessariamente que as missões sejam
direcionadas apenas para determinadas regiões, mas, antes, que as missões sejam constituídas
a nível regional. De acordo com Fulvio Attinà, 250 este processo veio reforçar a possibilidade
de estes atores estabelecerem missões de manutenção da paz exclusivamente com base nos
seus próprios contributos, para além de criarem as condições para missões híbridas. Estas
últimas referem-se às missões das Nações Unidas em colaboração direta251 com outras
organizações ou atores regionais, como exemplo, a missão em Darfur (UNAMID), realizada
em cooperação com a União Africana. 252
Neste sentido, a União Europeia surge como resposta dos países desenvolvidos da
Europa, aos crescentes desafios impostos pelo contexto atual, a partir das missões de
Petersberg, como visto no segundo capítulo. Ao longo dos anos, a UE adquiriu competência
para realizar uma gama limitada de ações militares. Segundo o Tratado de Lisboa, artigo 42,
as ações levadas a cabo em nome da União Europeia, abrangem agora:
As missões humanitárias ou de evacuação dos cidadãos nacionais; as
missões de prevenção de conflitos e as missões de manutenção da paz;
as missões de forças de combate para a gestão das crises, incluindo
operações de restabelecimento da paz; as ações conjuntas em matéria
de desarmamento; as missões de aconselhamento e assistência em
matéria militar; e as operações de estabilização no termo dos
conflitos.253
248
Attinà, Fulvio (2011), “Multilateralism and the Emergence of ‘Minilateralism’ in EU Peace Operations”,
Romanian Journal of European Affairs,Editora Novos Rumos vol. 9. 3° edição. São Paulo
249
Pugh, Michael (2011), “Peace Operations” in Paul Williams (ed.), Security Studies: An Introduction. Londres:
Routledge, 367-399
250
Attinà, Fulvio (2011), “Multilateralism and the Emergence of ‘Minilateralism’ in EU Peace Operations”,
Romanian Journal of European Affairs,Editora Novos Rumos vol. 9. 3° edição. São Paulo
251
Idem
252
Idem.
253
Tratado de Lisboa. Disponível em: http://eur-lex.europa.eu/JOHtml.do?uri=OJ:C:2007:306:SOM:PT:HTML .
Acessado em 12 de jun. 2013
76
Essa evolução da capacidade operacional, como bem salientado por Javier Solana,
254
permitiu a União Europeia fortalecer sua posição de ator relevante no cenário internacional, e
projetar-se como um polo de estabilidade também fora da Europa255, como se destaca abaixo.
A União Europeia continua a ser um polo de estabilidade. Graças ao
alargamento, a democracia e a prosperidade estendem-se a todo o
continente. (...) A política de vizinhança que praticamos criou um
quadro robusto em que se inserem as relações com os nossos parceiros
a sul e a leste, e que assume agora na União para o Mediterrâneo e na
Parceria Oriental uma nova dimensão. Desde 2003, a União Europeia
passou a exercer uma influência crescente na Resolução de crises e
conflitos em todo o mundo, principalmente, em países como o
Afeganistão ou Geórgia. 256
Deste modo, a União Europeia parece assumir, do exposto acima, o papel de uma
organização internacional, embora não seja seu objetivo primordial, capaz de contribuir com a
ONU e outras organizações através de uma aliança objetivando a paz e o progresso. 257
Neste aspecto, Javier Solana afirma, ainda, que o apoio à cooperação multilateral
constitui um princípio basilar na política externa da União Europeia. 258 A Estratégia de
Segurança, criada pelo Alto Comissário, ressalta as diversas ações da UE, que demonstram
seu interesse em incentivar o desenvolvimento e a melhoria dos meios de ação de governança
global, principalmente no quadro das ações de manutenção da paz, das Nações Unidas.
Segundo a ESS:
As Nações Unidas ocupam a posição cimeira do sistema internacional.
Tudo o que a União Europeia tem feito no domínio da segurança tem
estado associado aos objetivos da ONU. A União Europeia desenvolve
uma estreita colaboração nos grandes teatros de ação (Kosovo,
Afeganistão, República Democrática do Congo, Sudão/Darfur, Chade,
Somália, entre outros) e tem vindo a reforçar os laços institucionais,
254
Leitão, A. Rogério (2003a) “A política Europeia de Segurança e Defesa – que futuro?”, Estratégia – Revista
de Estudos Internacionais. 18/19 (1.º/2.º)
255
SOLANA, Javier - Relatório sobre a execução da estratégia europeia de segurança – garantir a segurança num
mundo em mudança. Bruxelas, 11 de Setembro de 2008. Disponível em: http://www.consilium.europa.eu
/uedocs/cms_Data/docs/pressdata/PT/Reports/ 104638.pdf. Acessado em 11 de junho de 2013.
256
Idem.
257
Leitão, A. Rogério (2003a) “A política Europeia de Segurança e Defesa – que futuro?”, Estratégia – Revista
de Estudos Internacionais. 18/19 (1.º/2.º)
258
SOLANA, Javier - Relatório sobre a execução da estratégia europeia de segurança – garantir a segurança num
mundo em mudança. Bruxelas, 11 de Setembro de 2008. Disponível em: http://www.consilium.europa.eu
/uedocs/cms_Data/docs/pressdata/PT/Reports/ 104638.pdf. Acessado em 11 de junho de 2013.
77
em conformidade com a declaração conjunta UE-ONU de 2007.
Apoiamos todas as operações de manutenção da paz em curso (18
operações) sob a liderança das Nações Unidas. 259
Do exposto, ressaltam-se as ações da União Europeia em regiões de conflitos latentes,
em áreas remotas, onde o papel da UE foi fundamental para os objetivos das Nações Unidas.
A UE, nesses casos, desempenhou atividades multifacetadas e multidimensionais, de cunho
civil, humanitário, político e até militar. As operações no Congo, por exemplo, evidenciaram
a excelência da atuação da União no cumprimento de seu objetivo no país africano. 260
Com relação às ações das Nações Unidas e o relacionamento da União Europeia em
relação a ela, a ESS reconhece, claramente, que é a ONU, a instituição que tem
obrigatoriamente o direito de legitimar todas as intervenções armadas no contexto das
operações de paz. Neste sentido, a União Europeia reforça o seu reconhecimento à Declaração
de São Francisco e a ONU, como instituição central de promoção e manutenção da paz e da
segurança internacionais, garantindo-lhe o monopólio legítimo do uso da força.
Desta forma,
O enquadramento fundamental das relações internacionais é a Carta
das Nações Unidas, cabendo ao Conselho de Segurança das Nações
Unidas a responsabilidade primária da manutenção da paz e da
segurança internacionais. A UE busca reforçar as Nações Unidas e
dotá-la dos meios necessários para que possa cumprir as suas missões
e atuar de forma eficaz é uma das prioridades da Europa. 261
Do exposto acima, além do reconhecimento da ONU, a União Europeia ainda se
coloca à disposição para auxiliar a Organização no cumprimento de seus objetivos
primordiais. Para tanto, a ESS assinala que a União deve continuar se firmando como um ator
global, e desenvolver-se como uma organização capaz de propagar a paz e o progresso, como
se pode evidenciar abaixo.
259
SOLANA, Javier - Relatório sobre a execução da estratégia europeia de segurança – garantir a segurança num
mundo em mudança. Bruxelas, 11 de Setembro de 2008. Disponível em: http://www.consilium.europa.eu
/uedocs/cms_Data/docs/pressdata/PT/Reports/ 104638.pdf. Acessado em 11 de junho de 2013.
260
Attinà, Fulvio (2011), “Multilateralism and the Emergence of ‘Minilateralism’ in EU Peace Operations”,
Romanian Journal of European Affairs,Editora Novos Rumos vol. 9. 3° edição. São Paulo
261
SOLANA, Javier - Relatório sobre a execução da estratégia europeia de segurança – garantir a segurança num
mundo em mudança. Bruxelas, 11 de Setembro de 2008. Disponível em: http://www.consilium.europa.eu
/uedocs/cms_Data/docs/pressdata/PT/Reports/ 104638.pdf. Acessado em 11 de junho de 2013.
78
(...) a Estratégia propôs a visão da União Europeia como uma força
atuante em prol de um mundo mais justo, mais seguro e mais unido.
Demos já grandes passos nesse sentido. Mas o mundo à nossa volta
está a mudar muito rapidamente, com novas ameaças e um equilíbrio
de forças em transformação. Para construir uma Europa segura num
mundo melhor, temos que influenciar de forma mais ativa a evolução
dos acontecimentos. E devemos fazê-lo já. 262
Do ponto de vista da ONU, as missões de manutenção da paz realizadas com auxílio
das organizações regionais, tornaram-se uma alternativa para suas atividades sobrecarregadas,
pois, permitem um aumento dos recursos humanos e materiais para além do limitado quadro
orçamentário e de pessoal das Nações Unidas.
263
Como responsável primária pela
manutenção da paz e da segurança internacional, as Nações Unidas têm permanecido “a peça
central do sistema internacional de manutenção da paz, fornecendo 50% de todo o pessoal das
missões no terreno”
264
e mantendo, desde 1992, uma média de 15 missões ativas de
manutenção da paz por ano, sendo que atualmente são 18 com a procura de recursos humanos
para reforçar as mesmas.
265
A União Europeia, neste sentido, surge como uma organização
que contribui com a pacificação em seu território e em suas extremidades próximas.
A ONU entende também, que a regionalização das operações de manutenção da paz
pode ser conduzida por organizações regionais; por coligações ad hoc; por Estados
proeminentes da região que assumam a liderança política e militar das operações das Nações
Unidas (por exemplo, o Brasil no Haiti); e pelos principais poderes regionais que assumam
este encargo nas regiões em que se inserem (como a Austrália no Pacífico Sul). 266
Ademais, as ações regionalizadas de manutenção da paz “normalmente defendem os
objetivos e princípios contidos na Carta das Nações Unidas.” 267 Isto sugere o reconhecimento
de um número crescente de atores diferenciados envolvidos na condução das missões, desde
as operações tradicionais lideradas pelas Nações Unidas, às ações capitaneadas por Estados
262
Bellamy, Alex e Williams, Paul (2005), “Who’s Keeping the Peace? Regionalization and Contemporary Peace
Operations”, International Security, 29(4): 157-195.
263
Idem
264
CIC (2011), “Annual Review of Global Peace Operations 2011”, Briefing Paper. Nova Iorque: Center on
International Cooperation at New York University.
265
Pelz, Timo e Lehmann, Volker (2007), “The Evolution of UN Peacekeeping (1): Hybrid Missions”, Fact Sheet
Dialogue on Globalization. Nova Iorque: Friedrich Ebert Stiftung, Novembro.
266
Cottey, Andrew (2008), “Beyond Humanitarian Intervention: The New Politics of Peacekeeping and
Intervention”, Contemporary Politics, 14(4): 429-446.
267
Ramsbotham, Oliver et al. (2005), Contemporary Conflict Resolution, 2.ª ed. Cambridge: Polity. UNDP
(1994), Human Development Report 1994. Oxford: United Nations Development Programme, Oxford
University Press.
79
individuais, organizações regionais, coligações e mesmo organizações não governamentais,
sendo que algumas destas missões não têm necessidade de autorização prévia do Conselho de
Segurança, com a condição de que não se recorra ao uso da força. 268
Apesar destes desenvolvimentos positivos, a regionalização também tem o potencial
de distorcer os princípios e objetivos das Nações Unidas para os quais a manutenção da paz
foi inicialmente criada. 269 Segundo Hédi Annabi, a regionalização pode facilmente contribuir
para a solidez militar pretendida, mas também pode implicar a instrumentalização das forças
de manutenção da paz, enfraquecendo a legitimidade das Nações Unidas. Essa
instrumentalização pode abalar a coerência acima mencionada, dando lugar à apropriação
regional e/ou nacional da linguagem e da prática da manutenção da paz das Nações Unidas,
de modo a prosseguir interesses mais limitados e próprios, como a intervenção para
exploração de recursos naturais.
270
Deste modo, apesar de extremamente positivos e
encorajados, como faz o Relatório Brahimi,
271
os acordos regionais podem se tornar uma
arma letal para a reestruturação da região em questão, até impossibilitando que ocorra um
processo de pacificação novamente. 272
Outra questão com potencial para enfraquecer a legitimidade da manutenção da paz
das Nações Unidas é o fato de, com frequência, a regionalização das missões de paz pode
estar associada a capacidades existentes em cada região, dando oportunidade a uma
distribuição desigual destas missões. Isto pode traduzir-se numa menor atenção em relação a
zonas do mundo menos favorecidas, ou ainda, em regiões em que a ONU, por várias razões,
não tenha podido auxiliar. Em termos globais, tal como nas Nações Unidas é essencial à boa
vontade política dos Estados, também o mesmo se aplica a nível regional, o que certamente a
ONU tem encontrado na União Europeia. 273
268
Woodhouse, Tom e Ramsbotham, Oliver (2005), “Cosmopolitan Peacekeeping and the Globalization of
Security”, International Peacekeeping, 12(2): 139-156.
269
Idem
270
Annabi, Hédi (1995), “The Recent Evolution and Future of UN Peacekeeping” in Don M. Snider e, Stuart J.
D. Schwartzstein, The United Nations at Fifty: Sovereignty, Peacekeeping, and Human Rights. Washington,
D.C.: CSIS e Chicago: The Robert R. McCormick Tribune Foundation, 39-44
271
Relatório apoia uma maior cooperação entre a ONU, organizações regionais e organizações nãogovernamentais nas operações de paz multinacionais, em consonância com a Carta de São Francisco, de maneira
a realizarem ações complementares, em especial nas áreas de prevenção de conflitos, estabelecimento da paz,
eleições, direitos humanos e assistência humanitária, DURCH, William J. Et al. The Brahimi Report and the
Future of UN Peace Operations.
Washignton : Henry L. Stimson Center, 2003.
272
DURCH, William J. Et al. The Brahimi Report and the Future of UN Peace Operations. Washignton : Henry
L. Stimson Center, 2003.
273
Gowan, Richard (2008), “The Strategic Context: Peacekeeping in Crisis (2006-08)”, International
Peacekeeping, 15(4): 453-469.
80
Ao longo dos anos, a cooperação entre estas duas organizações passou por uma série
de mudanças importantes, essencialmente devido à necessidade de ambas se adaptarem as
suas respectivas estruturas e capacidades operacionais para o ambiente de segurança
internacional contemporâneo.
274
A União Europeia tem se firmado, como se pode observar,
como uma organização com vontade e capacidade de agir nas operações de paz, nas áreas
mais remotas do mundo, atendendo aos seus interesses próprios, como já visto.
Conjuntamente a ela, a ONU vem, desde sua criação, ampliando o caráter conceitual de suas
estruturas e o modo de reagir às novas ameaças causadas pelo mundo globalizado. Assim,
uma aproximação concreta entre estas duas organizações mostra que superar os novos
desafios, pode-se tornar menos difícil do que se parece. 275
Nas próximas seções deste trabalho, busca-se entender como estas duas organizações
interagem conjuntamente nas operações da paz, ressaltando-se as posições adotadas, o caso de
intervenção no Congo e os desafios que ambas terão que enfrentar.
3.2.1. A Ambiguidade da Participação da UE nas operações de paz da ONU
O relacionamento entre a União Europeia e as Nações Unidas no campo da promoção
e manutenção da paz é multifacetado, pois, resultam da junção de perspectivas de diferentes
atores estatais em relação a uma atividade complexa e multidimensional por natureza, com
aproximações necessariamente distintas consoante o local onde se desenrole (Europa, África
ou outro), por intermédio de que quadro (ONU, organizações regionais, coligações) e com
que propósito e nível de envolvimento (mandato, comando, força requerida, etc.).
276
Desta
forma, torna-se importante para o cumprimento do proposto por este trabalho, entender o
posicionamento destas organizações na cooperação aqui apresentada. 277
De fato, a União e os seus Estados-Membros mostram que existem duas motivações
nesses arranjos de cooperação. Por um lado, são claros apoiadores do reforço das Nações
Unidas e proclamam a centralidade da organização no conceito de “efetivo multilateralismo”;
274
Bellamy, Alex e Williams, Paul (2005), “Who’s Keeping the Peace? Regionalization and Contemporary Peace
Operations”, International Security, 29(4): 157-195.
275
Idem.
276
Idem.
277
Attinà, Fulvio (2011), “Multilateralism and the Emergence of ‘Minilateralism’ in EU Peace Operations”,
Romanian Journal of European Affairs,Editora Novos Rumos vol. 9. 3° edição. São Paulo
81
por outro, o forte empenho que a UE coloca na sua autonomia leva-a a um certo
distanciamento das operações da ONU.
278
Por exemplo, obter o consentimento expresso e
legal das Nações Unidas para as operações de intervenção no quadro da PESC parece não ser
um requisito para a UE, bastando o consentimento do Estado visado e que sejam de natureza
não coerciva ou civil.
279
No continente europeu, exemplos disso são: a operação policial da
UE na Bósnia-Herzegovina (MPUE) e as operações Concórdia e Próxima na Macedônia, que
não foram propriamente criadas por qualquer Resolução do CSNU; as três operações civis na
Geórgia (EUjust Themis), Kinshasa (Eupol Kinshasa) e Iraque (EUjust Lex) também ilustram
esta afirmação. 280
Outra característica do envolvimento da UE nas operações de paz da ONU é o enorme
diferencial entre o seu contributo financeiro e a disponibilidade de meios civis e militares.
281
Coletivamente, os 28 Estados-Membros contribuíram com aproximadamente 40% do
orçamento das operações de paz da ONU, no ano de 2012, conforme gráfico abaixo. 282
Fonte: Serviço de Ação Externa - UE
Elaboração Própria
Contudo, operacionalmente, com meios civis e militares, os Estados-Membros da
União Europeia representavam apenas cerca de 7% das tropas, polícias e observadores ao
278
M. Sánchez, La potestad coercitiva de las organizaciones regionales para el mantenimiento de la paz. Medidas
que no implican el uso de la fuerza armada, Bosch Editor: Barcelona, 2005, pp. 71-139. Igualmente visto em
Ferrer Lloret, el CS ha calificado en varias ocasiones a la UE como organismo regional en el sentido del capítulo
VIII de la Carta.
279
Doss, Alan (2008), “Eyewitness: Crisis, Contention and Coherence – Reflections from the Field”,
International Peacekeeping, 15(4): 570-581.
280
Attinà, Fulvio (2011), “Multilateralism and the Emergence of ‘Minilateralism’ in EU Peace Operations”,
Romanian Journal of European Affairs,Editora Novos Rumos vol. 9. 3° edição. São Paulo
281
Idem.
282
Relatório Estatísticos Anual de 2012 do Departamento de Operações de Manutenção da Paz. Disponível em:
http://www.un.org/en/peacekeeping/resources/statistics/. Acessado em 21 de junho de 2013.
82
serviço das Nações Unidas. Esta porcentagem que diminui, ainda, para 3% nas ações da ONU
no continente africano, onde as operações de paz são claramente mais necessárias. Neste
sentido, por razões diversas, os Estados europeus têm-se mostrado relutantes em participar
nas intervenções lideradas pelas Nações Unidas, privilegiando as organizações regionais (UE
e OTAN) ou as coligações de Estados, das quais também fazem parte. 283
Na realidade, o desenvolvimento da PESC e o lançamento de operações UE, desde
2003, parecem ter como efeito a diminuição da colaboração dos Estados-Membros nas
operações de paz da ONU. O gráfico abaixo284 faz uma comparação da participação dos 28
integrantes da UE, no que concerne o fornecimento de efetivos em operações levadas a cabo
pela ONU, simultaneamente, ou não, as missões realizadas pela União no ano de 2012.
Participação da União Europeia em Operações de Paz
2012
100,00%
80,00%
60,00%
40,00%
20,00%
0,00%
13,40%
6,50%
Sem Operações da U.E
Com Operações da U.E
Fonte: Serviço de Ação Externa - UE
Elaboração Própria
É evidente, diante dos dados acima, que a contribuição de efetivos civis e militares da
União Europeia cai vertiginosamente, quando há operações, tanto da ONU quanto da UE, em
andamento. Contudo, positivamente, destaca-se que todas as ações, sendo elas em cooperação
com a ONU ou não, de uma maneira geral, contribuem para reforçar o objetivo de promoção
da paz. Todavia, os números também demonstram um certo grau de flexibilidade e de
autonomia da UE na relação com as Nações Unidas. Ou seja, os Estados-Membros da UE
283
BARIAGABER, A. United Nations Peace Operations: a Cookie-Cutter Approach?Journal of Third World
Studies, Fall, 2012.
284
Relatórios Estatísticos do Departamento de Operações de Manutenção da Paz. Disponível em:
http://www.un.org/en/peacekeeping/resources/statistics/. Acessado em 21 de junho de 2013.
83
colaboraram relevantemente no quadro da ONU, caso não haja interesse da União de
desempenhar suas próprias missões. 285
No centro da PESC está à autonomia na decisão e ação da União, o que torna mais
complexa a subordinação à ONU. A ideia de que as capacidades dos Estados-Membros
possam ser parte de uma operação UE e, em simultâneo, colocadas sob o comando das
Nações Unidas choca com a filosofia de autonomia da União Europeia. 286
Por outro lado, como já se referiu, a relativa ausência dos Estados europeus nas
missões lideradas pela ONU é contrastante com a sua presença nas operações por ela
solicitadas. Tal contribuição é, com efeito, bastante elevada, desde os Bálcãs ao Afeganistão –
mas com a OTAN e a UE a assumirem o papel proeminente. Isto coloca a questão de saber
quais os canais mais efetivos para servir o grande objetivo da Declaração de São Francisco de
manter a paz e a segurança internacionais. 287
Segundo Bellamy e Williams, para os Estados europeus, parece evidente que o seu
envolvimento em desenvolver suas próprias operações de paz é complementar aos esforços
das Nações Unidas, entretanto, salvaguardando a autonomia das operações lideradas pela
União, num quadro mais geral de relacionamento UE-ONU. Já para as Nações Unidas, as
contribuições nacionais ou regionais são encorajadas, mas não devem ser impeditivas de
contribuições diretas para as operações lideradas pela organização, primando pelo princípio
de complementaridade e não o de substituição.
Uma das grandes preocupações das Nações Unidas é de que se desenvolvam
operações a duas velocidades: umas lideradas pelas Nações, relativamente pobres, mal
equipadas e com pouco apoio político; e outras lideradas por Estados ou organizações
regionais, como a OTAN ou a UE, operacional, política e militarmente melhor equipadas e
apoiadas. 288
Para entender-se como melhor funciona a dinâmica de cooperação das organizações,
no quadro dos arranjos regionais, analisam-se, na próxima seção, as missões de intervenção
na República Democrática do Congo.
285
BARIAGABER, A. United Nations Peace Operations: a Cookie-Cutter Approach?Journal of Third World
Studies, Fall, 2012.
286
Attinà, Fulvio (2011), “Multilateralism and the Emergence of ‘Minilateralism’ in EU Peace Operations”,
Romanian Journal of European Affairs,Editora Novos Rumos vol. 9. 3° edição. São Paulo.
287
Idem.
288
Bellamy, Alex e Williams, Paul (2004). “Conclusion: What Future for Peace Operations? Brahimi and
Beyond”, International Peacekeeping, 11(1): 183-212.
84
3.3. Intervenção Europeia na República Democrática do Congo
A República Democrática do Congo (RDC) também conhecida por muitos como
Congo-Kinshasa é um país africano que está localizado na região dos Grandes Lagos,
possuidor de uma extensão territorial superior a 2,3 milhões de Km2.
289
Sua localização
geográfica o leva a fazer fronteira com nove outros países da África, sendo eles: Uganda,
Ruanda, Burundi, Tanzânia, Congo Brazzaville ou República do Congo, Zâmbia, Angola,
República Centro-Africana e o Sudão. 290
Além da dimensão territorial, outras características evidenciam a República
Democrática do Congo, como o legado multiétnico, as riquezas naturais, como a água e as
florestas, e a grande diversidade de minérios, contando com enormes jazidas de cobalto, de
cobre, de petróleo, de diamantes, de ouro e de prata. 291
O território que atualmente responde por República Democrática do Congo foi
desbravado pelo português Diego Cão, em 1482, ainda no período das grandes descobertas.
Nesse mesmo momento, o português também encontrou a bacia do rio Nzadi, que se tornou
mais tarde o rio Congo, chamado também rio Zaire durante o regime do ditador Mobutu.
292
Durante os séculos XVI e XVII, os comerciantes europeus se dedicaram explorar
comercialmente a região, sobretudo com a venda de escravos por meio de intermediários
congoleses. Entretanto, só a sinais de colonização a partir de 1870, quando se configurou a
iniciativa, tomada pelo rei belga Leopoldo II, de colonizar o Congo. 293
Aproximadamente 100 anos mais tarde, iniciou-se o processo inverso, o de
descolonização, com a visita do rei Balduíno I da Bélgica. A presença do monarca motivou no
país, uma explosão de nacionalismo na população congolesa, demarcando o início, de fato, do
processo de independência, em 1960, alterando novamente seu nome para República do
Congo.
294
Autores como Kabengele Munanga afirmam que o processo de independência da
RDC foi uma estratégia utilizada pelas elites belgas com o intuito de “outorgar-lhes a
independência no justo momento que eles não saberiam como e o que fazer com ela, pois não
289
Parlamento Europeu. Sessão plenária: Estrasburgo, 20-23 Setembro 2010. Disponível em: http://www.eur
oparl.europa.eu/pdfs/news/public/focus/20100910FCS81938/20100910FCS81938_pt.pdf Acessado em: 05 de
julho de 2013.
290
Idem.
291
Idem.
292
FORBATH, Peter (1991). The River Congo: The Discovery, Exploration, and Exploitation of the World’s
Most Dramatic River. Bosto: Houghton Miffin Harcourt Publishing.
293
GONDOLA, Ch. Didier (2002). The History of Congo. Westport: Greenwood Press.
294
Idem.
85
havia nenhum quadro administrativo africano experiente e competente instaurado”. 295
Diante desta realidade, em 12 de julho de 1960 o presidente da República e o
Primeiro-Ministro realizaram uma petição ao Secretário-Geral das Nações Unidas, solicitando
com urgência ajuda militar, para proteger o território nacional contra ingerências externas. 296
Assim, a RDC tornou-se o primeiro Estado independente africano a solicitar e a receber
assistência massiva das Nações Unidas no período da Guerra Fria. 297
A Organização das Nações Unidas no Congo (ONUC), desta forma, foi estabelecida
em julho de 1960 com base na Resolução 143, perdurando até 1964.
298
Coube, portanto, ao
Conselho de Segurança adotar as ações indispensáveis para o fornecimento de assistência
militar ao governo do Congo. Desta forma, o mandato da ONUC consistiu em garantir a
retirada das forças belgas, prestar assistência técnica e ajudar o governo a manter a ordem
pública.
299
Além disso, as operações de caráter multidimensionais também começam a fazer
parte das tarefas desempenhadas pela ONUC, com o objetivo de lograr maiores sucessos.
Diante disso e com o histórico turbulento desse período, pode-se afirmar, preliminarmente,
que a ONU passou a desempenhar funções do Estado. 300
Ao final da missão, quatro anos depois, o que se verificou foi uma situação ainda
difícil de lidar, em todos os aspectos. A própria ONU reconheceu que a “ONUC envolveu-se
pela força das circunstâncias, em uma situação caótica interna de extrema complexidade e
teve que assumir certas responsabilidades que iam além dos deveres normais estabelecidos na
manutenção da paz”.
301
As ações da ONU, neste sentido, não foram capazes de trazer
estabilidade para a região. 302 Ocorrendo a primeira Guerra na RDC, no pós Guerra-Fria, entre
295
MUNANGA, Kabengele. A República Democrática do Congo – RDC. p. 3. Disponívelem:http://www.casa
dasafricas.org.br/img/upload/327492.pdf.Acessado em 06 de julho de 2013.
296
“Foros Universitarios Cascos para la Paz: una visión desde la Academia Colombiana”. Organizaciónde las
Naciones Unidas. Colombia, Dezembro, 2008. Disponível em:http://www.nacionesunidas.org.co/img_upload/29
e3d3aa1b87e476b58e75187297599e/Cascos_Para_la_Paz_Publicacion.pdf. Acesso em 210911. Acessado em 07
de julho de 2013.
297
GAMBINO, Anthony W. Congo Securing Peace, Sustaining Progress. Council Special Report. n. 40, Outubro,
2008, p. 10. Disponível em:i.cfr.org/content/publications/attachments/Congo_CSR40.pdf Acessado em: 06 de
julho de 2013.
298
United Nations. Resolução 143 de 1960, Disponível em: http://www.un.org/ga/search/view_doc.asp?symb
ol=S/RES/143(1960). Acessado em 07 de julho de 2013.
299
United Nations. Mandato da ONUC na República do Congo. Disponível em:http://www.un.org/Depts/DPK
O/Missions/onucM.htm Acesso em: 27/09/2011
300
HALBULOUT, Chiristian (2008). “La Guerre Du Coltan em RDC: Repositioner le jeu des acteurs dans le
paradigme des sratégies de puissances”. École de Guerre Économique, Novembre.
301
“ONUC became embroiled by the force of circumstances in a chaotic internal situation of extreme complexity
and had to assume certain responsibilities which went beyond normal peacekeeping duties.” [tradução livre]
Disponível em: http://www.un.org/Depts/DPKO/Missions/onucB.htm. Acessado em 06 de julho de 2013.
302
HALBULOUT, Chiristian (2008). “La Guerre Du Coltan em RDC: Repositioner le jeu des acteurs dans le
86
1996 e 1997, motivada principalmente, após a chegada de refugiados ruandeses na RDC,
sobretudo os ruandeses de etnia Hutu, que desencadearam uma rebelião dos Tutsis e de outros
grupos étnicos na região leste do Zaire.
Os estopins da revolta estavam ancorados, primeiro, na disputa de uma região ocupada
pelos tutsis e que não queria dividir ou deixar o território para os hutus, que sempre foram
seus inimigos históricos. Segundo, porque o Presidente congolês Mobuto não só foi
negligente com relação a essa ocupação, como também deu apoio ao genocídio praticado
pelos hutus contra os tutsis em Ruanda. 303 Além disso, agravava-se a situação com a chegada
de um exército rebelde composto por tutsis de origem congolesa, os banyamulengues, que
eram apoiados por um governo estrangeiro de Ruanda, e a entrada de tropas ugandesas,
também de origem tutsi, que adentraram o território congolês como apoio e reforço contra os
hutus, suficientes para tornar as relações ainda mais hostis. 304
Devido à insatisfação dos banyamulengues com o governo, eles resolveram se vincular
a outros grupos de oposição e se rebelaram contra o regime Mobuto. Desta forma, em 1997
Mobutu Sese Seko resolve abandonar o poder, que logo em seguida é ocupado por Laurente
Kabila, um revolucionário veterano que liderava a rebelião. 305
De acordo com Montserrat Sala, 306 Laurent Kabila recebeu apoio de diferentes grupos
étnicos rebeldes, como também dos governos de Ruanda, Uganda, Angola e inclusive Estados
Unidos, e de maneira especial, do grupo ao qual foi um dos organizadores, ou seja, da Aliança
Democrática para a Libertação do Congo (AFDL). A partir de então, o país passou a se
chamar República Democrática do Congo.
307
Após tomar posse, as decisões adotadas por
Kabila foram desaprovadas pelos ruandeses e ugandeses, pois, esses esperavam que a
corrupção e a má gestão do período Mobuto acabariam. Interna e internacionalmente foi
gerado um mal estar com relação ao novo governo que tenderia a ser intensificado. Conforme
atenta Janete Cravino.
paradigme des sratégies de puissances”. École de Guerre Économique, Novembre.
303
MELO, Raquel B. C. L. Direitos Humanos e as Operações de Paz Multidimensionais: Um Estudo de Caso da
MONUC. Carta Internacional. 2010, v. 5, n. 1, pp. 78-96. ISSN 1413-0904.
304
Idem.
305
Idem.
306
SALA, Montserrat. Papel del virus de la inmunodeficiencia humana (VIH-SIDA) en los conflictos bélicos.
Estudio de caso: República Democrática del Congo. Fundació Món - Observatori Solidaritat, Barcelona. Julho,
2007. Disponível em: http://www.observatori.org/documents/rdc_sida.pdf. Acessado em 07 de julho de 2013.
307
BECERRA, María J.; PIATTI, Claudio. La guerra en la RDC, ?Problema africano o condición para el
desarrollo capitalista?. In: Contra Relatos desde el Sur. Apuntes sobre Africa y Medio Oriente, A? CEA, Centro
de Estudios Avanzados, Universidad Nacional de Córdoba: Argentina. Dezembro, 2005, p. 19. Disponível em:
http://www.cea.unc.edu.ar/africaorientemedio/contrapdfs/01 /4%20Becerra%20Piatti.pdf Acessado em 05 de
julho de 2013.
87
A guerra civil tornou-se rapidamente numa guerra regional, dividindo
opiniões e reorganizando alianças num vasto espaço do continente
africano. Do lado dos rebeldes estiveram desde o princípio o Ruanda e
o Uganda, dois dos cinco países que constituíam em 1997 um “bloco
geopolítico” em formação (Uganda, Ruanda, Burundi e Etiópia e
Eritréia). As motivações de Ruanda relacionavam-se com as opções
políticas de Kabila e com a sua incapacidade de defender as fronteiras
do Congo com o Ruanda. [...] Em relação ao Uganda, as autoridades
acreditavam que Kabila não conseguiria travar as operações antigovernamentais de movimentos de guerrilha como a Aliança das
Forças Democráticas, revelando-se, portanto incapaz de colaborar na
regeneração da economia regional e de devolver ao Congo a
prosperidade agrícola e mineira. 308
O período de 1997 a 2003 compreende o momento da Segunda Guerra do Congo, que
pode ser considerada uma das maiores, se não a maior guerra, ocorrida na África.
309
O
conflito se situou principalmente na região leste do Congo e teve a participação direta e
indireta de outras nações africanas, tais como: Uganda, Ruanda, Burundi, Zimbábue, Chade,
Angola e Namíbia. Desde então, a guerra conseguiu afetar a vida de milhões de congoleses e
vitimar cerca de 3,8 milhões de pessoas em todo o país, a maioria dessas mortes por fome e
doenças resultantes da guerra e não de uma luta real. 310
Deste contexto, fez-se necessária uma nova intervenção das Nações Unidas, através da
Missão das Nações Unidas para a República Democrática do Congo (MONUC), aprovada
pela Resolução 1279, do CSNU.
311
Esta nova intervenção teve como principais objetivos, o
de diminuir as hostilidades entre as forças opostas do governo que provocavam ainda mais
conflitos e violações aos direitos humanos e Direito Internacional Humanitário, além do
auxílio ao acordo de Cessar-Fogo de Lusaka312 e o de conter a violência que vitimava
principalmente a população civil. 313
Mais tarde, o CSNU ampliou o mandato da MONUC, através da Resolução 1291,314
308
CRAVINO, Janete S. O Processo Eleitoral na República Democrática do Congo: Retrospectiva e Prospectiva.
Working Paper 25. Fevereiro, 2007. Disponível em:http://www.ipri.pt/publicacoes/working_paper/pdf/WP
25_JSCravino.pdf. Acessado em 07 de julho de 2013.
309
Idem.
310
Idem.
311
Resolução 1279 do Conselho de Segurança das Nações Unidas. Disponível em: http://www.un.org/ga/search/v
iew_d oc.asp?symbol=S/RES/1279(1999). Acessado em 12 de junho de 2013.
312
Para maiores informações ver: Democratic Republic of Congo: Lusaka Agreement. Disponivel
em:http://www.iss.co.za/af/profiles/drcongo/cdreader/bin/2lusaka.pdf Acessado em 06 de julho de 2013.
313
Idem
314
Resolução 1291 do Conselho de Segurança das Nações Unidas. Disponível em: http://www.un.org/ga/search/v
iew_d oc.asp?symbol=S/RES/1291(2000). Acessado em 15 de junho de 2013.
88
de 2000, para a supervisão da implementação do acordo de cessar-fogo e a realização de
várias tarefas adicionais relacionadas, entre as quais, a de facilitar a assistência humanitária e
o monitoramento dos direitos humanos, com atenção especial aos grupos vulneráveis,
incluindo mulheres, crianças e crianças-soldados que foram desmobilizados. 315
A par dos acontecimentos no Congo, relatados acima, a União Europeia, em 2003,
expressou seu apoio à situação através da Resolução 2003/319/PESC, aprovada pelo
Conselho da UE, informando ainda, estar disponível para colaborar nas intervenções.
Desta forma,
A União Europeia apoiará a ação conduzida pelas Nações Unidas e
pela União Africana em apoio da aplicação do acordo de cessar-fogo
de Lusaca e do Acordo de Pretória (julho de 2002), do Acordo de
Luanda (setembro de 2002), dos acordos de Pretória no contexto do
diálogo Intracongolês (dezembro de 2002 e março de 2003,
respectivamente) e das resoluções pertinentes do Conselho de
Segurança, e cooperará estreitamente com estas organizações e com
outros intervenientes da comunidade internacional, no âmbito da
execução da presente posição comum. 316
Diante da manifesta intenção de apoio, também em 2003, e por decisão do Conselho, a
UE resolve solicitar as Nações Unidas, através de seu Secretário-Geral, um estudo de
viabilidade, objetivando-se empreender uma operação militar da União Europeia na República
Democrática do Congo. Através da Resolução 1484,
317
do CSNU, é concedida a permissão
para a intervenção europeia. Desta forma, deu-se início à missão de Operação de Gestão de
Crise no nordeste do Congo, na cidade de Bunia, denominada EUFOR Artemis, através da
Resolução 2003/423/PESC, que determinou:
315
Idem.
Posição Comum 2003/319/PESC do Conselho, de 8 de Maio de 2003, relativa ao apoio da União Europeia à
aplicação do acordo de cessar-fogo de Lusaca e ao processo de paz na República Democrática do Congo (RDC)
e que revoga a Posição Comum 2002/203/PESC. Disponível em :http://eurlex.europa.eu/Notice.do?val=284
880:cs&lang=pt&list=284880:cs,284056:cs,&pos=1&page=1&n l=2&pgs=10&hwords=. Acessado em 20 de
junho de 2013.
317
“O secretário-geral das Nações Unidas solicita aos Estados-Membros das Nações Unidas o fornecimento de
uma força temporária de estabilização na região de Ituri, em aplicação do mandato passado pela Resolução 1484
(2003), de 30 de Maio de 2003 do Conselho de Segurança das Nações Unidas.” - Resolução 1484 do Conselho
de Segurança das Nações Unidas. Disponível em: http://www.un.org/ga/search/v iew_doc.asp?symbol=S/R
ES/1484(2003). Acessado em 11 de junho de 2013.
316
89
A União Europeia conduzirá uma operação militar da União Europeia
na República Democrática do Congo, denominada "Artemis" em
conformidade com mandato da Resolução 1484 (2003) do Conselho
de Segurança das Nações Unidas. 318
Abre-se aqui um parêntese, para uma breve análise da presença da União Europeia e
não a da União Africana na presente missão. Entende-se que a Estratégia de Segurança
Europeia exorta uma União atuante no continente africano, principalmente por ser uma região
estratégica para o bloco.
319
A África é rica em recursos naturais e é responsável por parte do
abastecimento europeu de petróleo e gás, além de recursos hídricos e minerais, como ferro,
ouro e o cobre.
320
Além disso, o continente tem sido alvo de duras investidas de outras
nações, como China e Estados Unidos, o que tem dado sinais de alerta para a União não
perder sua influência na região. Desta forma, reforçar a presença da União como responsável
pelo processo de estabilização do continente, lhe confere vantagens em relação às preferências
comerciais e políticas da África. Neste sentido, entende-se a ligação direta entre o interesse da
UE e sua solicitação ao CSNU, para integrar as missões da ONU na região.
321
No que concerne à missão Artemis ainda, o envolvimento da União Europeia, em
cumprimento com a Resolução apresentada acima, teve a breve duração de três meses,
entretanto, representou a primeira atuação europeia em missões de paz realizadas fora de seu
próprio continente; e também a primeira missão militar da União Europeia sem recursos e
meios da OTAN.
No que concerne à atuação operacional e estratégica, segundo a Resolução, o controle
político e a direção estratégica ficaram a cargo do Comitê Político e de Segurança (COPS),
cabendo ao Comitê Militar da UE (EUMC) o monitoramento da execução da operação
militar.
322
A forma escolhida para a condução desta operação ao nível operacional foi de
utilização de um quartel-general de um dos Estados-Membros da União, com a França a servir
318
Ação Comum 2003/423/PESC do Conselho, de 5 de Junho de 2003, sobre a operação militar da União
Europeia na República Democrática do Congo. Disponível em: http://eurlex.europa.eu/Notice.do?val
=285203:cs&lang=pt&list=285203:cs,284236:cs,&pos=1&page=1&nbl=2&pgs=10&hwords=. Acessado em 14
de julho de 2013.
319
BARIAGABER, A. United Nations Peace Operations: a Cookie-Cutter Approach?Journal of Third World
Studies, Fall, 2012.
320
Parlamento Europeu. Sessão plenária: Estrasburgo, 20-23 Setembro 2010. Disponível em: http://www.eur
oparl.europa.eu/pdfs/news/public/focus/20100910FCS81938/20100910FCS81938_pt.pdf Acessado em: 05 de
julho de 2013.
321
Idem.
322
Ginsberg, Roy H. (1999) ‘Conceptualizing the European Union as an International Actor: Narrowing the
Theoretical Capability-expectations Gap’, Journal of Common Market Studies.
90
de “Nação-Quadro” (Framework Nation) e, o quartel-general para esta operação a ficar
situado em Paris (Centre de planification et de conduite des opérations).323 Taticamente, o
Comandante da Força teve sob o seu comando cerca de 1800 efetivos, sendo a maioria dos
recursos humanos e materiais provenientes da própria França. Além disso, de acordo com a
Resolução do Conselho da UE, foram investidos montante financeiro de 7 milhões de euros
para a execução das atividades no Congo. 324
De acordo com a Resolução 1484, de 30 de maio de 2003, do Conselho de Segurança
das Nações Unidas, 325 tendo-lhe sido fornecido um mandato autorizando a intervenção da UE
teria como o objetivo inicial o de:
contribuir para a estabilização das condições de segurança do
aeroporto, das pessoas deslocadas internamente nos campos de Bunia
e, se a situação assim o exigir, para contribuir para a segurança da
população civil, o pessoal das Nações Unidas e da presença
humanitária na cidade. 326
Após o cumprimento do que lhe fora proposto e exposto acima, a União Europeia
passa a operar, convidada pelo governo do Congo, portanto, não mais cumprindo mandato da
ONU, em abril de 2005, desta vez em Kinshasa, a missão de polícia, denominada de EUPOL
Kinshasa, com mandatos presente até os dias de hoje, assim como as Nações Unidas. 327
Assim, em nova Resolução, 2004/847/PESC, 328 o Conselho da UE determinou que:
323
Ginsberg, Roy H. (1999) ‘Conceptualizing the European Union as an International Actor: Narrowing the
Theoretical Capability-expectations Gap’, Journal of Common Market Studies.
324
Ação Comum 2003/423/PESC do Conselho, de 5 de Junho de 2003, sobre a operação militar da União
Europeia na República Democrática do Congo. Disponível em: http://eurlex.europa.eu/Notice.do?val
=285203:cs&lang=pt&list=285203:cs,284236:cs,&pos=1&page=1&nbl=2&pgs=10&hwords=. Acessado em 14
de junho de 2013.
325
Resolução 1484 do Conselho de Segurança das Nações Unidas. Disponível em: http://www.un.org/ga/search/v
iew_d oc.asp?symbol=S/RES/1484(2003). Acessado em 11 de junho de 2013.
326
Posição Comum 2003/319/PESC do Conselho, de 8 de Maio de 2003, relativa ao apoio da União Europeia à
aplicação do acordo de cessar-fogo de Lusaca e ao processo de paz na República Democrática do Congo (RDC)
e que revoga a Posição Comum 2002/203/PESC Disponível em:
http://eurlex.europa.eu/LexUriSer
v/LexUriServ.do?uri=CELEX:32003E0319:PT:HTML. Acessado em 22 de junho de 2013.
327
Idem.
328
Ação Comum 2004/847/PESC do Conselho, de 9 de Dezembro de 2004, sobre a Missão de Polícia da União
Europeia em Kinshasa (RDC) no que respeita ` Unidade Integrada de Polícia (EUPOL «Kinshasa»). Disponível
em: http://eurlex.europa.eu/Notice.do?val=392640:cs&lang=pt&list=453619:cs,392640:cs,387312:cs,387311:cs
,&pos=2&page=1&nbl=4&pgs=10&hwords=Acessado em 25 de junho de 2013.
91
A União Europeia estabeleça pela presente ação comum, uma Missão
de Polícia da União Europeia (EUPOL - KINSHASA) a fim de dar
sequência ao projeto do FED referido na Ação Comum
2004/494/PESC no contexto da criação de uma Unidade Integrada de
Polícia (UIP) em Kinshasa (RDC) a partir do início de Janeiro de
2005. Antes desta data, a fim de preparar a Missão de Polícia, será
criado até 1 de Dezembro de 2004 um Grupo de Planejamento que se
manterá em funções até ao arranque da missão. 329
A EUPOL Kinshasa envolveu 30 efetivos e teve como objetivo, ajudar na criação de
uma unidade de polícia local que servirá para assegurar a proteção das instituições do Estado.
Os custos de execução da presente ação comum foram fixados num montante máximo de
aproximadamente 4 milhões de euros, destinados a custear as despesas. 330
Simultaneamente, a EUPOL Kinshasa, União Europeia lançou uma missão, através da
aprovação da Ação Comum 2005/355/PESC, 331 para a reforma do setor segurança do Congo.
Tendo duração de um ano e sendo formada por oito especialistas em segurança, a operação
recebeu o nome de “Missão de Aconselhamento e Assistência em matéria de Reforma do
Setor da Segurança - EUSEC RD Congo”.
Esta Resolução do Conselho da União Europeia estabeleceu que:
A União Europeia crie, pela presente ação comum, uma missão de
aconselhamento e assistência em matéria de reforma do sector da
segurança na República Democrática do Congo (RDC), denominada
EUSEC RD Congo, a fim de contribuir para o êxito da integração do
exército na RDC. A missão deve prestar aconselhamento e assistência
às autoridades congolesas competentes em matéria de segurança,
velando por promover políticas compatíveis com os direitos humanos
e o direito internacional humanitário, as normas democráticas e os
princípios de boa gestão dos assuntos públicos, de transparência e de
respeito do Estado de direito. 332
329
Ação Comum 2004/847/PESC do Conselho, de 9 de Dezembro de 2004, sobre a Missão de Polícia da União
Europeia em Kinshasa (RDC) no que respeita ` Unidade Integrada de Polícia (EUPOL «Kinshasa»). Disponível
em: http://eurlex.europa.eu/Notice.do?val=392640:cs&lang=pt&list=453619:cs,392640:cs,387312:cs,387311:cs
,&pos=2&page=1&nbl=4&pgs=10&hwords=Acessado em 25 de junho de 2013.
330
Idem.
331
Ação Comum 2005/355/PESC do Conselho, de 2 de Maio de 2005, relativa à missão de aconselhamento e
assistência da União Europeia em matéria de reforma do sector da segurança na República Democrática do
Congo (RDC). Disponível em: http://eur-lex.europa.eu/Notice.do?val=398840:cs&lang=pt&list=428514:cs,4
21471:cs,398840:cs,395762:cs,&pos=3&page=1&nbl=4&pgs=10&hwords=Acessado em 23 de junho de 2013.
332
Idem
92
A ação teve por objetivo, atuando em estreita cooperação e coordenação com os
demais intervenientes da comunidade internacional, em particular as Nações Unidas e a
MONUSCO, prestar apoio concreto no domínio de reforma do setor de segurança, criando as
condições necessárias à concretização, a curto e médio prazo, das atividades e projetos
baseados nas orientações consignadas pelas autoridades congolesas no plano de reforma das
forças armadas e retomadas no programa de ação da Missão, nomeadamente:
 Manutenção do apoio a nível estratégico;
 Apoio à consolidação da administração e à implantação de um sistema
de gestão dos recursos humanos com base nos trabalhos em curso;
 Apoio à modernização da logística;
 Apoio ao relançamento do sistema de formação, nomeadamente dos
quadros, e, entre outros, ao projeto de Escola de Administração e de
Academia Militar em Kananga e aos estudos com vista à Escola de
Logística em Kinshasa. 333
Devido à necessidade do Estado do Congo e as dificuldades encontradas na região, o
Conselho da União Europeia decidiu manter a missão EUSEC RD Congo, e que atualmente
está em seu sétimo mandato, ajudando a pavimentar o caminho para a implementação das
diretrizes adotadas no plano de reforma das forças armadas e para a implementação da lei de
defesa.
Deste modo, a missão EUSEC RD Congo, em todos os seus mandatos, reflete o
compromisso contínuo da UE para o povo congolês em termos de reforma do seu exército.
Além disso, reforça uma presença importante da União Europeia na região, criando e
fortalecimento laços comuns entre os povos europeus e africanos. 334
As principais atividades deste mandato continuam sendo para apoiar ao nível
estratégico do Ministério da Defesa congolês e os militares em geral, incluindo o apoio à
inspeção-geral, para modernizar e consolidar a administração e gestão dos recursos humanos,
e para vivificar o sistema de formação através de apoio ao comando geral em escolas e no
desenvolvimento de uma política abrangente de treinamento militar. Além disso, a missão de
333
Ação Comum 2005/355/PESC do Conselho, de 2 de Maio de 2005, relativa à missão de aconselhamento e
assistência da União Europeia em matéria de reforma do sector da segurança na República Democrática do
Congo (RDC). Disponível em: http://eur-lex.europa.eu/Notice.do?val=398840:cs&lang=pt&list=428514:cs,4
21471:cs,398840:cs,395762:cs,&pos=3&page=1&nbl=4&pgs=10&hwords=Acessado em 23 de junho de 2013.
334
Attinà, Fulvio (2011), “Multilateralism and the Emergence of ‘Minilateralism’ in EU Peace Operations”,
Romanian Journal of European Affairs,Editora Novos Rumos vol. 9. 3° edição. São Paulo.
93
ajuda ao Congo com o desenvolvimento das capacidades logísticas e realiza atividades para
combater a impunidade em relação às violações dos direitos humanos, incluindo a violência
sexual. Restauração da governança em geral e reforma da defesa, em particular permanece
central na criação de condições duradouras para a estabilidade na RDC. 335
Para contribuir com esse objetivo, EUSEC coopera estreitamente com a EUPOL RD
Congo e da Delegação da UE na República Democrática do Congo, coordena seu trabalho
com as atividades financiadas pela Comissão Europeia e os Estados Unidos, e trabalha em
conjunto com as autoridades nacionais relevantes das Nações Unidas e outros atores
internacionais. 336
No ano de 2006, a República Democrática do Congo tornou-se novamente palco para
mais uma frente das Operações de Gestão de Crises da União Europeia, agora com o objetivo
de apoiar a missão MONUC das Nações Unidas durante o processo eleitoral.
337
Esta
operação militar, com o nome de EUFOR RD Congo, contou com o total acordo das
autoridades da República Democrática do Congo, estando sob a égide da Resolução 1671338
do Conselho de Segurança da ONU, desta forma, pela segunda vez, no mesmo território, a UE
é chamada pela ONU para unir-se as ações de paz no continente africano.
339
Convém referir
que esta Resolução estabelecia como condições especiais que a operação estaria finalizada em
até quatro meses após o primeiro período de eleições e não poderia exceder o tempo definido
para a missão MONUC da ONU.
A missão da UE teve as seguintes tarefas especiais:
 Auxiliar a MONUC A estabilizar a situação, caso esta enfrente sérias
dificuldades em cumprir o seu mandato face às suas capacidades;
 Contribuir para a proteção de civis, sob iminente ameaça de violência
física, nas suas zonas de destacamento;
 Contribuir para a proteção do aeroporto de Kinshasa;
 Garantir a segurança e a liberdade de movimentos dos funcionários e a
proteção das instalações da EUFOR R.D. Congo;
335
Attinà, Fulvio (2011), “Multilateralism and the Emergence of ‘Minilateralism’ in EU Peace Operations”,
Romanian Journal of European Affairs,Editora Novos Rumos vol. 9. 3° edição. São Paulo.
336
Idem.
337
DAHRENDORF, Nicola. “MONUC and the Relevance of Coherent Mandates: The Case of the DRC.” In:
Security Sector Reform and UN Integrated Missions: Experience from Burundi, the Democratic Republic of
Congo, Haiti, and Kosovo, ed. Heiner Hänggi and Vincenza Scherrer.
Berlin: Verlag, 2008, 67-112.
338
Resolução 1671 do Conselho de Segurança das Nações Unidas. Disponível em: http://www.un.org/ga/search/v
iew_d oc.asp?symbol=S/RES/1671(2006). Acessado em 11 de junho de 2013.
339
Idem.
94
 Executar operações excepcionais de resgate de indivíduos em
340
perigo.
O suporte legal da União Europeia para esta operação é a Ação Conjunta do Conselho
2006/319/PESC147, 341 relativa à operação militar da UE de apoio à missão da ONU na RDC
durante o processo de eleições.
A estrutura do Comando obedece ao mesmo esquema adotado para a operação
EUFOR Artemis, agora com a Alemanha a servir de “nação-quadro” e estando o QuartelGeneral para esta operação localizado no Comando de Operações das Forças Armadas
Alemãs em Potsdam.
Das intervenções analisadas aqui, depreende-se uma série de reflexões importantes
para a construção dos objetivos deste trabalho. Inicialmente é importante destacar os aspectos
jurídicos relacionados à legalidade de intervenção. Como visto, a primeira intervenção da
União Europeia na região acontece através de Resolução adotada pela CSNU, concedendo
autorização para as ações no Congo, especificamente na missão EUFOR Artemis e na
EUFOR RD. Diante disso, reforçar-se o reconhecimento internacional dado a ONU, de
legitimadora das ações de cunho coercitivo no cenário internacional. Contudo, a UE interveio
ainda, em três outras operações no Congo, a EUPOL RD, EUPOL Kinshasa e EUSEC RD
Congo, onde não houve qualquer aprovação adota pela ONU ou qualquer pedido da UE para
que isso ocorresse. 342
Neste caso, verificam-se duas questões interessantes, a primeira delas está na Carta das
Nações Unidas, que permite, não expressamente, o uso de ações não coercitivas ou civis, o
que de fato acontece nas três missões mencionadas, nenhuma delas utiliza a força. A segunda
questão está relacionada ao consentimento do Estado receptor da ação de intervenção, sendo a
UE inclusive convidada pela República Democrática do Congo a agir na região. Desta forma,
a busca por autonomia da União Europeia, como visto no segundo capítulo, através das
340
Resolução 1671 do Conselho de Segurança das Nações Unidas. Disponível em: http://www.un.org/ga/search/v
iew_d oc.asp?symbol=S/RES/1671(2006). Acessado em 11 de junho de 2013.
341
Ação Comum 2006/319/PESC do Conselho, de 27 de Abril de 2006 , relativa à operação militar da União
Europeia de apoio à missão da Organização das Nações Unidas na República Democrática do Congo (MONUC)
durante o processo eleitoral. Disponível em: http://eur-lex.europa.eu/Notice.do?val=425788:cs&lang=pt&li
st=491297:cs,478369:cs,432010:cs,425788:cs,422709:cs,&pos=4&page=1&nbl=5&pgs=10&hwords=Acessado
em 5 de junho de 2013
342
Barceló. Maria J. Tesis Doctoral presentada para el Programa de Doctorado Interdisciplinario Internacional
sobre la Sociedad de la Información y del Conocimiento. Barcelona 2012.
95
Missões de Petersberg não configura nenhuma infração as normas internacionais e da
ONU.343
Ainda na operacionalização das intervenções, destacam-se os dois modos de
celebração dos acordos, presentes neste caso. O primeiro deles ocorre através de um convite
das Nações Unidas para a composição da missão, desta forma, o CSNU ou a AGNU fazem as
análises das situações de da controvérsia e faz recomendações a respeito de quais medidas
devem ser adotadas. Optando por uma solução através de ações de intervenções, o CSNU ou a
AGNU podem, dentro do que determina a Carta da ONU e as resoluções já aprovadas,
convidar Estados-Membros e organizações internacionais a fazerem parte da operação, como
aconteceu na operação denominada EUFOR RD.
344
A segunda forma de celebração
manifesta o interesse da organização ou do Estado-Membro na participação da ação. No caso
da operação EUFOR Artemis, a UE solicita sua adesão à operação de manutenção da paz em
funcionamento na região, complementando os esforços da ONU no conflito. 345
Por fim, faz-se importante, uma última reflexão com relação às motivações que
levaram a União Europeia e as Nações Unidas a cooperarem. Como já é sabido, as motivações
que induzem as Nações Unidas estão no cerne de sua capacidade operacional, como visto
atualmente a ONU está envolvida em 18 missões de operações de paz, com o efetivo, em sua
capacidade máxima, em torno de 70 mil colaboradores. 346 Entretanto, como também já visto,
as ações conjuntas conferem um grau maior de legitimidade nas ações, além apresentarem
vantagens comparativas com relação aos conhecidos geoestratégicos e geopolíticos da região.
Contudo, o que nos interessa aqui, principalmente, é entender melhor as motivações das
organizações regionais. Na participação europeia no Congo ficam evidentes os interesses da
UE, por trás das ações. Como visto neste capítulo, a RDC é um país que rico em recursos
hídricos e minerais, além de possuir uma posição geográfica interessante no continente,
fazendo divisa com nove países. Desta forma, para a UE é muito importante exercer uma
influência positiva na região, sobretudo por necessitar de abastecimento de recursos
provenientes destas regiões. Soma-se a isso, a União buscar equilibrar o tabuleiro de
influências que vem se formando na África, com presenças mais marcantes dos países
343
Barceló. Maria J. Tesis Doctoral presentada para el Programa de Doctorado Interdisciplinario Internacional
sobre la Sociedad de la Información y del Conocimiento. Barcelona 2012.
344
Idem.
345
Idem.
346
Attinà, Fulvio (2011), “Multilateralism and the Emergence of ‘Minilateralism’ in EU Peace Operations”,
Romanian Journal of European Affairs,Editora Novos Rumos vol. 9. 3° edição. São Paulo.
96
asiáticos e americanos na região.
3.4. Desafios e Dilemas na cooperação UE-ONU para a promoção da paz
Diante do exposto neste trabalho e, sobretudo após o caso de intervenção na República
Democrática do Congo, percebe-se que as Nações Unidas têm tentado envolver a União
Europeia nas suas atividades de promoção e manutenção da paz, bem como na prevenção de
conflitos e gestão de crises, utilizando-se do capítulo VIII da Carta de São Francisco e suas
declarações conjuntas, como mecanismos institucionais.
347
Neste sentido, a ONU tem advogando uma estreita parceria que não se confine a uma
espécie de subcontratação ou qualquer tipo de assistência, mas que implique também a
contribuição direta da UE para operações lideradas pela ONU. Fazendo isto, as Nações
Unidas têm sempre insistido no princípio da complementaridade e não no da substituição. Ou
seja, para a ONU é muito mais contar com as contribuições europeias, do que propriamente
com o resultado de suas ações.
348
Por seu lado, a aproximação da UE também se baseia na
complementaridade, mas reflete outras preocupações, reconhecendo a necessidade de
cooperar em diferentes níveis, favorece uma postura mais flexível, analisada caso a caso, em
que a autonomia de decisão e de ação da União prevaleça, e sem garantias de que as
necessidades da ONU serão cobertas. 349
O empenho da União Europeia na cooperação multilateral e da ONU como elemento
central do sistema multilateral permitirá determinar ao longo dos próximos anos se e de que
forma uma instituição que foi criada nos anos subsequentes à Segunda Guerra Mundial pode
continuar a constituir a pedra basilar do sistema internacional. Por conseguinte, a escolha de
uma via diferente da do "sistema das Nações Unidas" teria consequências imprevisíveis não
apenas para a paz e a segurança internacional. 350
Concluísse, portanto, que existe uma demanda, cada vez maior, por operações de
manutenção da paz ou intervenções de cunho humanitário da ONU nos mais diversos países e
347
Bolton, John. “United States Policy on United Nations Peacekeeping”. In. World Affairs, vol. 163, no. 4,
2011, pp. 129-147
348
Attinà, Fulvio (2011), “Multilateralism and the Emergence of ‘Minilateralism’ in EU Peace Operations”,
Romanian Journal of European Affairs,Editora Novos Rumos vol. 9. 3° edição. São Paulo.
349
Idem.
350
BRETHERTON, Charlotte; VOGLER, John - The European Union as a Global Actor. 4ª ed. London:
Routledge. 2012.
97
continentes ao redor do mundo, e que esta organização internacional carece de um amplo
apoio da comunidade internacional para levar a cabo com êxito essas atividades. Nesse
sentido, a União Europeia, como toda sua estrutura complexa de integração, representa uma
oportunidade de parceria jamais vista antes e que tem contribuindo de forma sine qua non
para a realização dessas e de outras atividades das Nações Unidas. 351
Por fim, destaca-se que esta parceria se constitui como ações complexas e que
contemplam processos de cooperação em esferas diversas e distintas, como os campos
militares e normativos e que neste sentido há muito que evoluir. O que se espera é que haja
bom senso entre essas organizações e que tanto a ONU quanto a UE possam garantir um
mundo mais pacífico e seguro.
Neste contexto, bastante permanece por ser explorado no relacionamento UE-ONU
para a promoção da paz. Muito depende das evoluções das reformas em curso nas duas
organizações, mas a forma como a UE e a ONU encarem e desenvolvam as suas atividades
em África pode revelar-se um teste decisivo.
351
BRETHERTON, Charlotte; VOGLER, John - The European Union as a Global Actor. 4ª ed. London:
Routledge. 2012.
98
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Inicialmente, no primeiro capítulo foram apresentadas as evoluções das operações de
manutenção da paz no seio das Nações Unidas, principalmente a expansão de sua atuação,
abrangência no período durante e depois da Guerra Fria, e a concretização das possibilidades
de realização dessas operações, através dos acordos regionais, entendidos como tratados
multilaterais nos quais os Estados-Membros e as organizações concordam em canalizar suas
diferenças por meio dos mecanismos previstos. No que tange esses arranjos ainda, analisou-se
as motivações, os aspectos operacionais e legais de ação conjunta e a primazia da ONU na
solução de controvérsias, com ou sem a necessidade de ações de cunho coercitivo.
Finalmente, este capítulo apresentou as possibilidades de ação conjunta nas operações de
manutenção da paz com a União Europeia, dando espaço para o estudo dessa organização no
segundo capítulo.
Desta forma, a seção subsequente deste trabalho apresentou o desenvolvimento e a
consolidação do modelo de integração regional mais complexo existente na atualidade. A UE,
tal qual conhecemos hoje, teve seu início com a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço,
em 1951. De lá pra cá, houve evoluções várias, significativamente nos temas relacionados à
paz e a segurança internacionais, com a criação e institucionalização da Política Externa de
Segurança Comum. Dentro deste quadro institucional, a UE desenvolveu as suas próprias
operações de paz, imagem e semelhança daquelas organizadas pela ONU, as missões
Petesrbeg. Através dessas ações, a UE pode consolidar-se como um vetor regional de
promoção da paz e da segurança e permitiu uma aproximação sem igual, com as Nações
Unidas. Desta forma, ONU e União Europeia puderam trabalhar conjuntamente nas missões
de paz na Republica Democrática do Congo, superando duas divergências operacionais e
políticas, agindo em prol de objetivos complementares, principalmente no de pacificar uma
região tomada por conflitos.
Por fim, em se terceiro capítulo, este trabalho apresentou o histórico de conflitos
eclodidos no Congo, nomeadamente os proeminentes do processo de descolonização belga.
Diante da gravidade da situação, as Nações Unidas realizaram sua primeira intervenção na
região, em 1960, garantindo a retirada das forças estrangeiras e auxiliando na reconstrução e
consolidação do Estado de Direito. Contudo, anos mais tarde, em 1999, houve a necessidade
de uma nova intervenção. Quatro anos depois, em 2003, a União Europeia prestou-se a
colaborar com as ações no Congo, contribuindo com os esforços nas operações de paz da
99
ONU. Neste sentido, deu-se início a primeira intervenção conjunta entre ONU e União
Europeia, que abriu espaço, no mesmo ano, para a assinatura da Declaração Conjunta sobre a
Gestão de Crises.
No presente trabalho, através do método indutivo e da técnica bibliográfica e
documental, comprovaram-se as duas hipóteses levantadas, inicialmente, a respeito dos
fatores que afetam a celebração de acordos regionais: as motivações e interesses distintos,
porém não excludentes; e os desafios e aspectos positivos da cooperação na celebração dos
acordos em âmbito interno e externo.
Portanto, concluiu-se que a colaboração entre ONU e UE na promoção da paz é de
índole multifacetada, pois é fruto da junção de perspectivas de distintos atores em relação a
uma determinada atividade – peacekeeping – de natureza complexa e multidimensional com
uma política de aproximação necessariamente diferenciada em função: a) do locus da atuação
(Europa, África ou outro continente); b) do framework em que está inserida (ONU,
organizações regionais, coligações); c) dos fins e da intensidade de envolvimento (mandato,
comando, força requerida, etc.).
Desta forma, a UE e a ONU figuram, incontestavelmente, em posições distintas em
matéria de manutenção da paz. As Nações Unidas são a organização internacional com a
maior capacidade operacional do mundo para atuação nas missões de paz, uma vez que
arregimentam mais componentes civis e militares do que todas as organizações regionais e
sub-regionais juntas. Entretanto, a complexidade e as exigências das missões sofreram um
acréscimo, significativamente, nas últimas décadas. Tal situação expõe os limites da
capacidade operacional da ONU e justifica a busca incessante de formas alternativas de
resolver as novas demandas através do pedido de auxílio a Estados e às organizações
regionais para que lhe ofereçam os meios possíveis para a promoção da paz em um ambiente
de crescente complexidade. Neste contexto, a ONU, além de contingentes militares e policias,
necessita articular a sua capacidade de pronta resposta, a de incrementar unidades médicas e
logísticas e a de contar com serviços de inteligência conectados com a magnitude dos
desafios.
Desta forma, a ONU, através de seu Secretário-Geral, tem reclamado da UE uma
participação mais efetiva e direta nas operações, tanto na prevenção de conflitos como na
gestão de crises, não se limitando a uma espécie de subcontratação ou uma assistência
simplificada. Por seu turno, UE também se defronta com preocupações semelhantes na
operacionalização das suas próprias missões de paz, chanceladas ou não pela ONU, e com os
100
diferenciados desafios internos que vão desde as formas e intensidades de cooperação até a
luta por convergência de opiniões entre os vinte oito Estados-Membros que possuem
interesses, por vezes, discrepantes no cenário internacional.
Esta situação evidencia os limites da cooperação da UE com as Nações Unidas. Por
um lado, há um manifesto desejo de apoiar, operacionalmente, as ações da ONU de modo a
reforçar o multilateralismo nas Relações Internacionais; por outro, a notada ênfase que os
Estados-Membros põem na autonomia de decisão de ação da UE conduzem-na a um
afastamento das operações da ONU, já que não se lhe oferecem garantias de que as demandas
serão respondidas.
Finalmente, este trabalho concluiu que as Nações Unidas têm tentado envolver a
União Europeia nas suas atividades de promoção e manutenção da paz, bem como na
prevenção de conflitos e gestão de crises, advogando uma estreita parceria que não se confine
a uma espécie de subcontratação ou qualquer tipo de assistência, mas que implique também a
contribuição direta da UE para operações lideradas pela ONU. Fazendo isto, as Nações
Unidas têm sempre insistido no princípio da complementaridade e não no da substituição. Por
seu lado, a aproximação da UE também se baseia na complementaridade, mas reflete outras
preocupações: reconhecendo a necessidade de cooperar em diferentes níveis, favorece uma
postura mais flexível, analisada caso a caso, em que a autonomia de decisão e de ação da
União prevaleça, e sem garantias de que as necessidades da ONU serão cobertas. Neste
contexto, bastante permanece por ser explorado no relacionamento UE-ONU para a promoção
da paz.
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