ano 9 • nº 21 • anual • 2008

Transcrição

ano 9 • nº 21 • anual • 2008
ano 9 • Nº 21 • anual • 2008
índice
ARTE
Festas de Papel, a arte efémera do
Alentejo. O caso do Redondo ..... 26
Festas do Povo de Campo Maior,
vistas com os olhos da alma ........ 30
Capa e contracapa: concelho de Avis
A Palavra ao Presidente da
Associação Joaquim Avó ......... ..... 3
MEMÓRIA
Como conheci o Alentejo ............ 40
Os Feirantes ................................. 41
À Escala Humana
Luis Maçarico ................................. 5
Saudades de passado já distante e
até de um sapato voador ............. 44
A GENTE E O SOCIAL
Outras Dinâmicas .......................... 7
HOMENAGEM
Rogério Ribeiro, uma força
viva incessante ............................. 48
LOCAIS
Arronches, a Terra onde as Pedras
falam .............................................. 9
Santana de Cambas,
uma Freguesia da margem
esquerda do Guadiana ................ 12
Concelho do Seixal ....................... 14
COISAS DE ANTEONTEM
As Minas de Manganês de
Castro Verde ................................ 16
Mineiro, aos mineiros de Aljustrel,
do Lousal, de S. Domingos e de todo
o mundo ...................................... 20
2
FOTOGRAFIA
Os segredos do olhar ................... 34
Ficha Técnica
Propriedade: Alma Alentejana, Associação para o Desenvolvimento,
Cooperação e Solidariedade Social
Sede: Av. Prof. Ruy Luís Gomes, 13 - R/c - Laranjeiro - 2810-274 Almada
Telefone / Fax: 212 551 296 Email: [email protected]
Redacção: Av. Prof. Ruy Luís Gomes, 13 - R/c - Laranjeiro - 2810-274
Almada
ENTREVISTA
Manuel Coelho, Presidente da
Câmara Municipal de Avis ............ 58
VII JOGOS FLORAIS DA ALMA
ALENTEJANA 2007 ....................... 50
DESENVOLVIMENTO
Fórum Alentejo 2015, por uma
Região da nova geração ............... 74
ACTIVIDADES DESENVOLVIDAS .. 77
ACTIVIDADES A DESENVOLVER ... 78
Director coordenador: Joaquim Avó
Director editorial: Luís Maçarico
Publicidade: Joaquim Avó
Colaborador Técnico: Hélio Heitor
Secretariado e Distribuição: Joaquim Avó e Hélio Heitor
Tiragem: 2000 exemplares
Fotolito, produção gráfica e paginação: A Triunfadora, Artes Gráficas, Lda.
A Alma Alentejana Revista Cultural, não se responsabiliza pelas opiniões expressas pelos seus colaboradores
A PALAVRA AO PRESIDENTE DA ASSOCIAÇÃO
Passado que foi um ano desde a última edição, aqui estou mais uma
vez dando-vos a conhecer o decorrer desta etapa que apesar de algumas dificuldades, estamos certos que com a
dedicação, compostura e querer destes órgãos sociais temos conseguido cumprir o que
havíamos proposto tanto de âmbito cultural
como social. Vamos continuar a apostar no
que está por realizar e temos fundadas esperanças de que a breve trecho e com o habitual
apoio de várias entidades, das quais destacamos a Câmara Municipal de Almada e de várias Freguesias do nosso Concelho, poderemos afirmar-nos como Instituição Particular
de Solidariedade Social virada para o futuro.
Começamos por agradecer ao Professor Joaquim Saial a sua colaboração na feitura desta
nossa revista cultural, pela grande qualidade
que introduziu tanto temática como gráfica,
mais elaborada, mais diversificada e qualitativa, que através do seu saber fez escola.
Queremos também agradecer a todos os colaboradores que nos enviaram os seus textos,
destacando um deles que, antes de ir apanhar
o avião se deslocou a esta associação para fazer a sua entrega e que tanto têm contribuído
para o enriquecimento desta nossa revista
que queremos cada vez mais cultural, informativa e afirmativa da
nossa identidade cultural, especialmente nas vertentes histórica,
recreativa e artística, literária, monumental, musical e etnográfica.
Agradecimento ainda a toda a equipa que assegurou a redacção, a fotografia, o grafismo e
a sua distribuição. Um especial agradecimento às entidades (públicas e privadas) que viabilizaram este projecto participando com espaços publicitários que, além de nos ajudarem
à edição de cada número, trouxeram o colorido da amizade com um abraço solidário que
muito nos motivou.
Realizou-se recentemente o 14º. Congresso
Alentejo XXI com o tema “Caminhos do Futuro” e que consideramos momento alto na vida
da sociedade alentejana e que esperamos
contribua efectivamente para que o Alentejo
seja uma região mais justa, mais desenvolvida
e que de modo decisivo seja peça importante
para o desenvolvimento do País. Apesar de
sermos uma região com imensas potencialidades (Barragem do Alqueva, Porto Intercontinental de Sines, Aeroporto de Beja, entre
outras), são projectos de grande relevo para o
presente e para o futuro de um Alentejo com
uma nova economia que ultrapasse finalmente o contexto económico latifundista e de ca-
3
Estimados leitores
pitalismo agrário primitivo, que há decénios
tem paralisado e impedido o seu progresso.
Verifica-se um acentuado envelhecimento e
desertificação entre meados de 1990 e 2007,
o que é uma contradição pois os citados projectos deveriam dar origem a muitos postos
de trabalho e que logicamente deveria atrair
mais alentejanos às suas terras de origem.
Debateu-se muito a Regionalização concluindo-se que será a única solução para esta província (um terço de Portugal), aliás como confirmação da consulta através do referendo
sobre a regionalização os Alentejanos na sua
grande maioria foram bem firmes respondendo “sim”. Conclui-se ainda que o Alentejo é
tão grande e com tantas potencialidades que
é chegado o momento da nossa completa
afirmação, mostrando que somos capazes de
contrariar o destino que nos querem impor e
de darmos um valioso contributo para o desenvolvimento do país e o caminho certo para
a estabilidade, a coesão e solidariedade no
Alentejo.
4
Não obstante os constrangimentos e tristezas
que esta crise global provoca no Alentejo, o
nosso povo nunca vira a cara à luta enfrentando essas dificuldades sempre com um sorriso,
cantando enquanto trabalha, património que
nunca poderemos perder, acreditando que o
dia de amanhã será sempre melhor que o de
hoje.
Despeço-me com um abraço amigo a todos os
colaboradores desta revista e a todos os que
contribuíram e contribuem para o reforço da
Alma Alentejana e consequentemente para o
engrandecimento do Alentejo.
À ESCALA HUMANA...
ra está nas mãos de grupos estrangeiros, que ocuparam posições anteriormente detidas por
latifundiários absentistas ou prepotentes.
Ao escrever estas linhas, pretendo
contribuir para que se reflicta sobre o futuro,
que todos os dias se vai esboçando nos passos, nos gestos, nas ideias que brotam dentro
do quotidiano das nossas cidades, vilas, aldeias, lugares. Na alma da nossa gente.
Uma das respostas incontornáveis é continuarmos a lutar por dias melhores, pois como
diz o povo, “a esperança é a última a morrer”.
Outra das saídas deste momento complicado
da Humanidade é “fazer das tripas coração” e
celebrar o privilégio de respirarmos, numa
terra de cantares únicos, de sítios ímpares, de
gente que não há assim em mais lugar nenhum.
A Festa surge pois em vários textos, encomendados a antropólogos, a poetas e pintores,
que com um olhar atento nos brindaram, derramando colorido e mensagens de encantamento, que se renovam em dias especiais, por
ruas e recantos, onde a música do pandeiro
ou o sorriso de uma idosa a recortar papel
mágico, enriquecem o texto.
É preciso resistir, com os prodígios da arte popular, com a sabedoria de pessoas que parecem saídas de livros clássicos, mas estão aí
5
Nesta edição da Revista de Cultura
da Alma Alentejana o novo
director editorial recebe o testemunho de um homem culto, fraterno e generoso, que conseguiu
levantar a fasquia do bom gosto e
da qualidade desta publicação, que já tinha
uma imagem de marca, até um nível que impõe responsabilidade redobrada, na abordagem e na apresentação dos assuntos, que não
foram escolhidos ao acaso.
A Festa e o Trabalho são o grande fio condutor
destas páginas, com colaborações novas, de
autores que se estreiam neste percurso e de
outros que regressam, todos com uma sabedoria partilhada, que nos lembra a necessidade de festejar a Vida e de salvaguardar memórias e conhecimentos ligados ao mundo
laboral dos campos e das minas.
Em tempos de dificuldades, nesta curva apertada do planeta, com carências várias (energéticas, alimentares, da falta de cumprimento
dos direitos humanos mais básicos, das consequências de inúmeros e fatais desastres naturais, que são em parte resultado da imposição de uma política ultraliberal, em que o
lucro é o supremo objectivo e a natureza só
serve para servir esses desígnios), no Alentejo, a crise também deixa mazelas.
A desertificação não parou, com a esperança
inicialmente gerada por Alqueva. A agricultu-
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todos os dias, são reais e admiráveis, dandonos uma tremenda força pelos seus exemplos
de tenacidade e criatividade.
Amar o Alentejo é também enaltecer o que
tem de bom, através das mãos fazedoras de
sonhos, que permanecem na paisagem, irradiando luz.
O sol não está só no campo de sedes, mas na
pegada e na fala.
Nesse sentido, saúdo os colaboradores deste
número da Revista de Cultura Alma Alentejana e todos os leitores, associados ou não, desta associação, bem como a figura carismática
do Presidente da Direcção, das mulheres Cantadeiras e do empreendedor Hélio Heitor,
pelo seu desempenho, em prol do Alentejo,
engrandecendo a representação desse sul mítico, com uma participação entusiasmada.
Também eles, encontrando no caminho quantas adversidades, enfrentando-as com o cante, a feira, a festa, o sorriso, souberam chegar
aqui.
Insistindo em serem seres humanos, com
sonhos, que não se vergam à sombra e conti-
nuam a caminhar, num território de brasas,
rumo ao sonho maior de ser livre como o vento. O vento da mudança que ninguém conseguirá parar.
a gente e o social
Paulo Mota
Outras Dinâmicas
No entanto, aquilo que se pretende com este
artigo não é falar de temas já sobejamente falados em anteriores ocasiões. Hoje, venho falar-vos de outras dinâmicas. Estas estão intimamente associadas a projectos que a Alma Alentejana pretende concretizar, que passam pela
criação de um espaço que albergue diversas
Respostas Sociais, como um Lar para Idosos,
uma Creche e um Jardim de Infância e que
tenha como espaço comum uma Quinta Pedagógica. Um outro projecto desta Instituição, é
um estudo sobre a implementação de um Serviço de Apoio Domiciliário na Freguesia do Pragal. Finalmente, e não menos importante irei
falar-vos do Projecto Gente com Alma.
Em primeiro lugar, a necessidade da criação
das Respostas Sociais de Lar de Idosos, Creche
e Jardim de Infância, resultam de múltiplos
factores. Por um lado, sabe-se que a população
concelhia está envelhecida e carente de apoios
que permitam a satisfação das suas necessidades, tentando preservar a sua autonomia e independência. Por outro lado, também sabemos que o número de instituições pertencentes à Rede de Solidariedade é diminuto, predominando os Particulares, que muitas vezes não
oferecem o mínimo de condições exigidas para
a manutenção da dignidade do idoso. Tem-se
também conhecimento que algumas Freguesias, como por exemplo a Charneca da Caparica, que foi a Freguesia que mais cresceu em
dez anos, não dispõe de nenhum equipamento
da Rede de Solidariedade para a Primeira Infância. Sabe-se também que de acordo com o
Diagnóstico Social do Concelho de Almada
(2002), duas linhas de intervenção para o Desenvolvimento Social, passavam pelo aumento
do número de estabelecimentos de apoio à
Primeira Infância, mas também pela criação de
estruturas de apoio à Terceira Idade. Tendo então estes indicadores como referências, está a
ser elaborado um projecto onde estas duas faixas etárias, possam estar em conjunto, partilhando experiências, que poderão ser de crescimento para uns, mas também de rejuvenescimento para outros, como são disso alguns
exemplos já existentes no nosso Concelho, mas
também aquilo que já se passa um pouco por
essa Europa fora.
7
Ao longo destes doze anos de existência a Alma
Alentejana tem sido um exemplo de empreendedorismo ao nível da intervenção social no
Concelho de Almada. Desde de 1996 que se
tem verificado um salto não só quantitativo,
mas também qualitativo dos serviços prestados por esta Instituição. Serviços esses que
além dos tradicionais apoios sociais, como são
disso exemplo o Serviço de Apoio Domiciliário
ou os dois Centros de Dia, há que referir os grupos de Cavaquinhos, de Danças Sevilhanas e
especialmente o coro feminino das Cantadeiras, que têm dado outra “alma” aos seus participantes, maioritariamente idosos.
De seguida, o projecto de criação de um Serviço de Apoio Domiciliário na Freguesia do Pragal, resulta da observação feita nesta Freguesia, onde julgamos existirem vários indivíduos,
sobretudo idosos, em situação de dependência. Para a justificação da criação deste serviço,
está a ser elaborado pela equipa técnica da
Alma Alentejana (Dr. Paulo Mota e Dr.ª Joana
Carvalho), um estudo sociológico que possa
comprovar aquilo que nós achamos ser indispensável na Freguesia do Pragal. Por outras
palavras, a implementação da Resposta Social
de Apoio Domiciliário no Pragal. Para tal, serão
efectuadas entrevistas semi-directivas às instituições inseridas no meio envolvente, mas
também serão aplicados inquéritos por questionário aos fregueses do Pragal.
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Por último resta-nos falar um pouco do
projecto Gente com Alma. Aqui o que pretendemos, é publicar histórias de vida de diversos
utentes da nossa Instituição, previamente autorizados por estes, sob a forma de texto, mas
também através da captação de imagens. Com
este projecto, pretendemos dar a conhecer ao
meio envolvente quem são as nossas gentes,
quais são os seus percursos de vida, o que sentem, o que desejam, o que ambicionam. Por
outras palavras, será um documento físico
transmissor de saberes e experiências. Para levarmos este projecto até bom porto, necessitamos do apoio de diversas instituições, que
possam financiar esta ideia, pois o grande objectivo é a edição de um livro, mas também a
criação de DVD’s, que documentem estas histórias.
Como o leitor poderá concluir, estas dinâmicas,
que sabemos ambiciosas, só poderão passar à
prática se existirem instituições que as “patrocinem”. Para tal estão a ser feitos os contactos
com as entidades competentes, mas fica sempre aberta a porta a novos contributos, para
que se passe do sonho à realidade.
Utentes do Centro de Dia do Laranjeiro
locais
Ana Isabel Carvalho
Arronches, a Terra onde as Pedras Falam
Aspecto actual da vila
- do Barroco século XVII, da ponte do Caia - século XV, e das suas fontes edificadas no século
XVIII – a fonte de Elvas e a fonte do Vassalo.
Acerca desta última costuma dizer-se, por
aquelas paragens, que visitante que beba água
do Vassalo estará “condenado” a retornar amiúde àquela vila.
A criação e a matança do porco preto são dois
dos seus usos mais seculares. As Festas de S.
João, onde se constroem altares para o Santo
Padroeiro e se enfeitam as ruas com flores de
papel, a gastronomia de onde se destacam o
lacão1 assado e a saborosa carpa com poejos
são bons exemplos da tradição de que os arronchenses se podem envaidecer. E as “saias”,
manifestação musical tão característica da
zona raiana do Alentejo Norte, têm, nesta terra, um singular acompanhamento musical.
“Nesta vila as pedras falam”2 - afirma um dos
elementos do Grupo de Pedrinhas de Arron-
9
Vigiando o vasto casario, claro e luminoso, rodeado de verde olival, a torre da igreja matriz
de Nossa Senhora da Assunção surge recortada no azul de fundo. É esta a imagem que guardamos quando nos está mais próxima a vila de
Arronches - um contraste de tons que parecem
vibrar à medida que o olhar se desdobra numa
múltipla dimensão que transmite serenidade e
luz.
Terra raiana, com cerca de 2100 habitantes,
entre Elvas e Portalegre, onde as planícies circundantes apresentam os relevos característicos do norte alentejano, Arronches encontra
nos seus monumentos, nas suas tradições e na
sua música a expressão das suas gentes.
Para além das duas igrejas – Nossa Senhora da
Assunção e do Convento de Nossa Senhora da
Luz, ambas datadas do século XVI, as populações podem orgulhar-se, também, das inúmeras moradas antigas com portais e janelas góticas e manuelinas, do Edifício da antiga Cadeia
Fonte do Vassalo
10
ches – com certeza um grupo que prima pela
originalidade dos seus instrumentos. Existindo
desde os anos oitenta, o Grupo de Tocadores
de Pedrinhas de Arronches tem vindo a renovar-se e, da sua formação original, já só se encontram dois elementos – são eles que têm
sabido transmitir o “engenho e a arte” de tocar
pedras.
É na ribeira que banha a vila, bela e altiva na
sua brancura, que procuram as pedras lisas e
alongadas, desenhadas pelas águas que afluem
do Rio Caia. Retomando uma antiga tradição
daquela região, fazem delas os seus instrumentos. Num movimento, veloz e sequenciado, os
dedos dos executantes batem nos seixos produzindo a sonoridade ímpar com que, habitualmente, acompanham a sua música tradicional.
“Eu tenho esta pedra desde que estou no Grupo das Pedrinhas e ainda não encontrei nenhuma que a substituísse - cada pedra tem o seu
som mas se juntarmos as três formam um som
único”3 – assegura um dos seus mais antigos
elementos. “O ti Carlos Maurício e o Fonseca
são pessoas que têm sabido ensinar os jovens
felizmente não estamos em vias de extinção –
temos sete jovens a aprender e a tocar”4.
Muitas são as vezes em que associam ao som
obtido das pedras o dos “guizos” que colocam
em volta do pulso, o do ferrinhos, o da harmónica ou mesmo o das castanholas, tornando
mais rica a composição e o acompanhamento
das alegres e típicas “saias”. É com o grupo folclórico da terra que tocam exprimindo um convite para a festa mais importante da vila:
Come sardinhas assadas/Bebe vinho e come
pão/Se pensares em vir a Arronches/
Visita-a p’lo S. João.
Durante os cerca de vinte anos de existência,
os nove elementos têm percorrido o país e alguns lugares fora de portas como França, Espanha e Canadá em espectáculos de divulgação
da arte de que tanto se orgulham. “Só aprende
quem tem ouvido, isto não se aprende por mú1
Última parte da perna do porco, coberta com um tempero especial
e assada no forno.
2
Sic Noticias - Roteiro de Fim de Semana – Transmissão no
Jornal da Noite, 12.04.2008, disponível em http//sic.aeiou.pt/
online/noticias/programas/ir/Artigos
3
Sic Noticias - Roteiro de Fim de Semana – Transmissão no
Jornal da Noite, 12.04.2008, disponível em http//sic.aeiou.pt/
online/noticias/programas/ir/Artigos
4
Idem
sica – temos muito gosto, gosto muito de tocar
as pedras e sentimo-nos vaidosos – somos inéditos, ninguém mais toca pedras.”5
Inspirados, com certeza, no branco e preto dos
seus trajes e nas suas viagens cantam as suas
“saias” desta vez apenas ao som das pedras:
Avoa como andorinhas/Por terras de Portugal/
Este grupo das pedrinhas/Já não há quem o
iguale
As saias “modas só cantadas entre homens e
mulheres nas mondas, na ceifa, na sacha, na
apanha da azeitona; ou cantadas e bailadas
nos bailes das localidades (…) e ainda quando
os rapazes iam “às sortes” eram “modas de desafio acompanhadas de pandeiro e adufe”.
Hoje em dia podem ter acompanhamento de
harmónio, concertina, viola ou recoreco6, mas
quando, em Campo Maior, as festas do povo
nos embriagam com cor e som, nas noites ainda quentes de alguns Setembros, predominam,
tradicionalmente, os pandeiros (ou pandeiretas) enfeitados de borlas e fitas multicor.
Considera Armando Leça que “Embora estas
modas coreográficas se nos deparem do Sabugal a Évora, ou na região abrantina, é no Alto
Alentejo ao rimar do pandeiro que elas são
mais castiças (…) Como expressão músico
etnográfica, os corais são para o Baixo Alentejo
como as saias para o Alto Alentejo.”
Acerca do povo desta região e da sua música
Joana Munõz afiança “… vamos encontrar no
Alto Alentejo homens e mulheres a cantar …
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Leça, Armando (1942) Música Popular Portuguesa, Editorial Domingos Barreira, Porto.
Munõz, Joana (1998), Campo Maior – Memórias das minhas raízes, Edição de Autor.
RECURSOS DA WEB
www.rtsm.pt/cultural.htm
www.evora.net/associarte/tradicional_popular_popular.htm
cantoalentejano.com
www.cm-arronches.pt
sic.aeiou.pt/online/noticias/programas/ir/Artigos
AGRADECIMENTO
Emiíio Moitas
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Grupo de Tocadores de Pedrinhas
no gozo das diferenças (…) Povo bailadeiro, a
comprová-lo nas “saias”, como desafio e com
desafio, a deitar fora o que se quer esquecido
(…) As modas, uma festa de todas as horas e de
todas as bocas, desde que se aprendia a falar
(…) Homens e mulheres ensinando a mocidade
a inventar a esperança.”
“Quanto ao futuro o Grupo das Pedrinhas de
Arronches vai continuar a trabalhar de forma a
manter a tradição e a dignificar Arronches.”7
Para além da autenticidade e da originalidade
do som é, também, na forma sábia como este
grupo transmite aos seus jovens esta singular
arte de fazer música com pedras, que reside a
sua genialidade. Também eles ensinam os mais
novos “a inventar a esperança.”
Não sei se será pelas gentes, as tradições, o
som único do Grupo das Pedrinhas, as recordações das estadias, em épocas de aromas estivais, em que, de dia, apenas os banhos na ribeira suavizam a canícula e de noite, a frescura
é trazida numa cadeira de bunho encostada à
parede caiada, ou se será pela água “feiticeira”
do Vassalo – a verdade é que regresso sempre
àquela vila.
5
Ibidem
Texto publicado no Diário do Alentejo, de 11 de Maio de 2001, disponível em http://cantoalentejano.com/novidades
7
Texto escrito sobre o Grupo no site da Câmara Municipal de Arronches
6
locais
José Rodrigues
Santana de Cambas
Uma Freguesia da margem esquerda do Guadiana
a Mértola a outra metade a Serpa.
Das muitas apostas que a Freguesia tem para
fixar a população, e atrair visitantes, contam-se
entre outras, 3 pequenos museus em construção, apoiados pelo programa Leeder+ , e que
são: o museu do contrabando, a forja do ferreiro e o espaço museológico ao ar livre alusivo
ao caminho de ferro Mina /Pomarão, por onde
era transportado o minério das antigas minas
de S. Domingos, via Guadiana para Inglaterra e
outros países da Europa.
Verificamos ainda que a freguesia tem duas
IPSS, o Centro Social dos Montes Altos, que
conta com 27 camas, e o Centro de Apoio a
12
Numa das nossas visitas a Mértola, aproveitámos para dar um saltinho a Santana de Cambas, onde assistimos à apresentação de um livro editado pela Junta de Freguesia, e que tem
como titulo “ Memórias do Contrabando em
Santana de Cambas “ da autoria do antropólogo Luís Filipe Maçarico.
Em conversa com José Rodrigues, presidente
da Junta de Freguesia desde 1997, ficamos a
saber que a freguesia tem 174 Km2 e apenas
870 eleitores, faz fronteira com a vizinha Espanha através da ribeira do Chança e se estende
desde a bonita localidade do Pomarão até Vale
do Poço, povoação esta que pertence metade
Vista de Santana de Cambas
Horta Biológica
BTT, tendo a Junta para o efeito, 25 bicicletas
disponíveis para quem as queira utilizar, através dos trilhos do contrabando, ou do circuito
do minério, antigo trilho do comboio da Mina
ao Pomarão, ou até de barco, uma vez que a
Associação Defesa do Património de Mértola,
disponibiliza uma embarcação com 40 lugares
para passeios no rio.
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Idosos de Moreanes com um Lar em construção para 25 camas, cujas obras estão quase
concluídas, tendo esta ainda uma horta biológica com 2 hectares de regadio, cujas hortícolas e frutos se destinam ao consumo da instituição.
Na área dos equipamentos turísticos, conta
ainda a freguesia de Santana, com 3 equipamentos na área do turismo rural; são eles:
Monte do Guizo, Monte do Alhinho e Monte
da Bela-Vista com um total de oferta em cerca
de 35 camas.
Diz-nos ainda José Rodrigues, que tiveram inicio há poucos dias as obras de ligação da Freguesia a El Granado (Espanha), cuja ponte classifica de muito importante, que trará certamente uma mais valia ao concelho de Mértola,
pois a vila de El Granado fica a 10 km do Pomarão e Huelva a 60 km.
Por todas estas razões, insiste o nosso entrevistado, que vale a pena visitar a freguesia de
Santana de Cambas, em passeio pedonal, ou
locais
Anabela Pereira
Concelho do Seixal
Turismo Fluvial e
Náutica de Recreio
O concelho do Seixal detém uma extensão ribeirinha de aproximadamente 38 km nos quais a Baía
do Seixal, que atendendo à sua dimensão e configuração, proporciona um porto natural de abrigo
para barcos de recreio e actividades desportivas e
de lazer associadas à água, como a canoagem e
vela, entre outras dinamizadas pelas associações
náuticas existentes, com o apoio da autarquia.
A Baía do Seixal é já igualmente escolhida por
muitos nautas portugueses e estrangeiros para
ancorarem os seus barcos, aproveitando as facilidades naturais existentes e os serviços prestados
pelos estaleiros que ainda laboram nas imediações deste recurso fluvial.
Partindo desta riqueza natural e das suas potencialidades, o Município promove uma política de
Quinta da Fidalga
desenvolvimento sustentável do cluster “turismo
fluvial e náutica de recreio”. Assim, projecta-se a
instalação de equipamentos ambientalmente
sustentáveis e que preservem o ecossistema característico da área, nomeadamente ao nível de
fundeadouros, núcleos e portos de recreio, cais
de acostagem, serviços de apoio, entre outros
equipamentos e serviços privilegiando a recuperação e revitalização de estaleiros navais, núcleos
urbanos antigos e património edificado existente
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Passeios no Tejo e muita
animação no Seixal nos
próximos meses
Baía do Seixal
A Baía é também o cenário ideal para um passeio
no Tejo a bordo do Bote de Fragata Baía do Seixal,
a partir do qual se pode desfrutar da paisagem
que mostra o património do concelho ao longo
das suas margens.
O verão traz também ao Seixal o Festival de Ve-
Fórum e Jardim
rão, um conjunto de Festas Populares que acontecem pelas seis freguesias do concelho e que
apresentam muita animação, com música de vários estilos, bailes e animação de rua. A Mostra de
Artesanato do Seixal, que vai para a sua 15.ª edição acontece este ano de 20 a 29 de Junho, e conta com mais de 70 expositores.
15
As Quintas Senhoriais e o património são também motivo para visitar o Seixal. São exemplo a
Quinta da Fidalga, com os seus jardins, que convidam ao passeio e ao descanso, a antiga Fábrica
Mundet e o Núcleo Naval do Ecomuseu Municipal.
coisas de anteontem
Miguel Rego
As Minas de Manganês de Castro Verde
minas exploradas em toda a nossa região, em
particular as de manganês, e que serviram para
o acelerar das novas tecnologias do ferro e do
aço.
Desse período sobram ainda resquícios nebulosos na memória oral das nossas gentes, muitas delas ligadas ao funcionamento de algumas
dessas minas de manganês, que é imprescindível e urgente registar, o mais rápido possível,
antes que desapareçam. Em jeito de episódio,
refira-se a importância da mulher no funcionamento destas minas que, em alguns casos,
in: IGM - Beja, Doc. 3 A4
A febre do “ouro” que assolou toda a região do
Alentejo, a partir de meados do século XIX,
vem introduzir uma alteração extraordinariamente profunda na realidade cultural, social e
económica das terras transtaganas. A estrutura
quase medieval que sustenta o Alentejo agrícola e latifundiário trazido pelos novos ventos
do liberalismo, vê-se de repente acossada pelos novos ricos que desenvolvem processos de
exploração mineira em afloramentos metálicos
que se multiplicam como cogumelos, em especial, por toda a faixa em quarto de Lua que se
estende desde Alcácer do Sal até ao Chança,
entrando Andaluzia dentro.
Deste fenómeno espantoso que chega até aos
nossos dias, sobressaem três ou quatro grandes projectos, em particular, ligados à exploração do cobre, do enxofre, do zinco, do ferro e
de algum ouro. Mina de S. Domingos, Aljustrel,
Cercal, Canal Caveira e Lousal são, normalmente, as minas mais referidas. Pelo seu impacto
na região e no país. Pela sua longevidade. Pelo
papel social, cultural e económico que tiveram
nas regiões onde se desenvolveram.
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Estes grandes empreendimentos estiveram e
estão definitivamente ligados à revolução industrial a que se assiste na Europa de Norte.
Daqui saía o minério que enriquecia sociedades de capitais, não apenas estrangeiras (vejase o caso de Alonso Gomes) e que, escandalosamente, alimentavam a Europa calvinista.
Mas todo este fenómeno não está devidamente estudado. Em particular, no que concerne às
Ferragudo - Corta nº 2 - Balde despejando sôbre vagona
in: IGM - Beja, Doc. 3 A4
Ferragudo - Grupo de tromeis e quebrador Dodge
Esta longa introdução serve, apenas e só, para
chamar a atenção para esta realidade que poucos investigadores têm acautelado, na perspectiva de rapidamente se ir ao encontro dos
poucos resquícios que ainda restam vivos.
O concelho de Castro Verde de há muito que se
encontra ligado à exploração mineira. E não
apenas pelo funcionamento da Mina de NevesCorvo. Desde a pré-história. Mas com particular ênfase no período moderno. É essa realidade que aqui trazemos hoje. Uma fatia importante do património de Castro Verde, sintetizado na enumeração de todas aquelas ocorrências minerais de manganês que preencheram a
vida desta comunidade.
1. A Mina de Manganês do Ferragudo é, naturalmente, a mais conhecida, até porque o seu
funcionamento cessou há cerca de meia centena de anos. Propriedade dos Herdeiros de
Alonso Gomes, era particularmente rica em
psilomelana e pirolusite. Ali se produziam cerca de 110 toneladas. O transporte do minério
fazia-se, até Agosto de 1945, por carros de
tracção animal até à estação de Castro Verde
– Almodôvar, a 21 kms. O primeiro registo foi
efectuado a 5 de Maio de 1859, por José Diogo
e Felizberto José Colaço e foi publicada a portaria dos direitos dos descobridores legais a 10
de Março de 1864. A 20 de Junho de 1864 são
transferidos os direitos legais para Alonso Gomes. O Catálogo Descritivo da Secção de Minas, publicado em 1889, diz que esta é a mais
importante de todas as minas de manganês do
Baixo-Alentejo, tendo iniciado a lavra em
1875.
2. Mina do Cerrinho Alto. Situada junto ao geodésico do Ferragudo, é uma mina importante
e com altos teores de manganês. Em 1899, um
relatório de J.C.H. Pattinson, do Laboratory
17
eram mais de metade dos activos que laboravam nas pequenas minas de manganês.
registo, em nome de Armando Lopes de Aboim
Inglês, de 15/4/1941, na propriedade de João
Pereira Janeiro. Funcionaram em pleno entre
1941 e 1945, calculando-se que foram retiradas cerca de 200,000 toneladas de manganês,
em particular pelo método de rapina.
6 - Mina da Achada. Durante a II Guerra Mundial funcionou em regime de rapina.
7 - Mina do Cerro da Maré. A funcionar desde
meados do século XIX, tem o primeiro registo a
10/9/1873. Foi explorado posteriormente, já
no século XX, pela Sociedade de Minérios do
Sul de Portugal.
8 - Mina da Rocha. O reconhecimento desta
mina feito por João Batista Schiappa de Azevedo a 30/9/1869.
9 – Mina da Caçoeira. Funcionou pelo menos
desde 22/7/1871 até 1880.
10 – Mina dos Cerros Altos. A mina tem trabalhos desde meados do século XIX (1860?). A
26/9/1867 já se falava na exploração desta
mina. Requerimento para exploração a
18
in: IGM - Beja, Doc. 3 A4
New Castle on Tyne, refere o “carregamento de
1631 toneladas de carbonato de manganês,
com um teor de 50,41%”.
3. Mina de Manganês da Cova da Moura. Representa a continuação, para Nordeste, das
minas de Ferragudo e Filipeja. O registo foi
efectuado por António Lobo de Aboim Inglês, a
21 de Outubro de 1915, mas havia sido explorada em torno de 1868. Para além do minério
de manganês encontram-se cristais de pirite,
cubos de galena, alguns vestígios de malaquite, óxidos de ferro e barita. Os anos de maior
tonelagem na exploração são1933 – 25,500
ton.; 1934 – 110,300 ton.; 1942 – 72,223 ton.;
1943- 41,900 ton..
4 - Mina do Zambujeiro. Com trabalhos antigos
(anos 60 e 70 do século XIX), ainda funcionava
em 1947.
5 - Mina do Cerro do Lírio. A mina tem dois registos em duas áreas distintas. Em nome de
Eduardo José dos Santos, de 27/1/1941, no
terreno de Maria Romano Colaço e, um outro
Ferragudo - Lavaria (Grupo de gigos)
Localizações aproximadas
de 3/5/1869. Terminou a sua exploração à volta de 1880 e daqui foram retiradas pelo menos
3 toneladas de minério.
19 – Mina da Herdade das Cochilas. Registo a
6/1/1863 por António Madeira.
20 - Mina do Cerro do Curralinho. Requerimento a 4/3/1880 e portaria de concessão a
11/10/1880, a favor do descobridor legal, José
da Costa. A 18/10/1880 este faz cessão de direitos a Alonso Gomes. Deixou de funcionar
em volta de 1898/1899
21 – Mina da Herdade do Penedo. Requerimento a 29/5/1859, por António Silva. Os direitos passam para Alonso Gomes a
4/11/1860.
22 – Mina do Cerro da Vigia. Funcionava antes
de 1880. Plano de Lavra apresentado a
7/5/1881, por Rufino Basílio, obtendo a concessão a 21/3/1881
Acabo de escrever este apontamento pouco
depois da morte de Alfredo Saramago. Este
Alentejo perdeu uma das suas vozes memórias
mais ricas e lúcidas. Tinhas que ir a enterrar no
Cemitério dos Prazeres. Já sentimos a tua falta.
Até já.
19
21/10/1915 por A. Aboim Inglês. A 13/1/1942
Eduardo José dos Santos pede a concessão da
mina. Entre 1942 e 1944 tem uma lavra activa
e são retiradas 2.947,252 toneladas de minério. Tal quantidade justifica-se por uma política
de lavra de rapina.
11 - Mina de S. Pedro das Cabeças. Já a funcionar a 30/1/1866, tem auto de demarcação a
3/10/1866. Fraco em manganês, é mais rica
em ferro. Nos anos de 1942 e 1943 tem muitos
trabalhos em regime de rapina.
12 - Mina do Cerro Beturiano. Também identificada como Mina do Cerro do Seixo. Descobridor legal foi Diogo Gonçalves Lavrador, a
15/1/1883, que cede a exploração a Alonso
Gomes a 2/7/1885. A lavra é suspensa cerca de
1898/1899.
13 – Mina da Herdade do Canal. Mina explorada anteriormente a 1870. Foi apresentado um
plano de lavra a 26/9/1871.
14 - Mina da Herdade da Cachia. Afonso Lopes
Conde e Francisco António Afonso têm os direitos de descobrimento legal antes de
4/5/1889. A 16/6/1943 é feita a adjudicação
da concessão à Sociedade Mineira do Sul de
Portugal.
15 - Mina da Herdade da Misericórdia. Requerimento a 8/5/1920 para concessão de exploração de uma mina de chumbo, por António
Lobo Aboim Inglês. No período da II Guerra
Mundial saem daqui as seguintes quantidades
de minério: 1942 – 365,400 toneladas de Manganês (Mn) e 196,050 de Bário (Ba); 1943 –
11,400 ton. de Mn e 220,000 de Ba; 1944 –
172,500 ton. de Mn e 10,000 de Ba; 1945 – 0
Mn e 22,000 de Ba.
16 - Mina do Cerrinho Alto. Registo em 1887
por João Guerreiro, Francisco Peres e António
Contente. A 30/12/1888 é feito o pedido de
concessão. É abandonada em finais do século
XIX.
17 - Mina do Cerro Alto dos Penedões. Requerimento para exploração a 1/5/1868, por
Manuel Simão.
18 – Mina do Moinho da Samarra. É requerida
a sua exploração por Alonso Peres Conde antes
coisas de anteontem
Francisco Colaço
Mineiro
Aos mineiros de Aljustrel, do Lousal, de S. Domingos e de
todo o mundo
20
Ser mineiro é ser filho e neto de mineiro ao
longo de várias gerações, é ter nascido e crescido no meio do vaivém incessante das locomotivas a vapor e da poeira do minério.
É acostumar-se ao barulho ensurdecedor e cadenciado dos trituradores e ao som inconfundível das máquinas de extracção, simbiose da
musicalidade da vibração dos cabos e da rotação dos tambores e poleias, súbita e ciclicamente interrompida pelo estrondoso ruído da
queda do minério nas toldas, seguido dos toques do martelo sinalético.
É contemplar, nas manhãs geladas de Inverno,
o fumegar enigmático do poço, envolvendo o
imponente malacate com vapores sulfurosos,
que exalam o cheiro característico da contramina.
É ouvir as frequentes e assustadoras explosões
ocorridas na pedreira, ou sentir apenas, como
um verdadeiro abalo sísmico, o estremecimento do solo, provocado pelos rebentamentos no
fundo da mina.
É ter acompanhado a mãe até à boca do poço,
transportando a cesta de verga com a magra
refeição quente que o pai tomará lá no fundo e
de que repartirá as sobras com os seus companheiros roedores de clausura.
É viver rodeado por uma paisagem lunar formada por montanhas de escoriais cinzento-esverdeados salpicados pelos tanques e regatas
de água-forte, que, serpenteando pelas suas
vertentes, numa sinfonia de murmúrios, vai alimentar o labirinto de canais da cementação,
onde a sucata de ferro, como num gesto mági-
sonhando com os seus feitos heróicos, munidos que eram de gasómetros fabricados com
latas de conservas e alimentados com carboreto verdadeiro.
É manter registado na memória o trágico fim
de uma dessas aventuras, que teve como protagonistas dois filhos de mineiros, nascidos no
histórico bairro de Vale d’Oca, os quais, inconscientemente, ao descerem a um poço abandonado, à procura de ninhos, pereceram asfixiados com gás carbónico acumulado no fundo. É
todo o alvoroço angustiante sofrido por uma
população inteira traumatizada.
É ter vislumbrado ao fundo do túnel de acesso
ao poço de extracção silhuetas de mineiros,
marchando em fila indiana, perceptível na linha desenhada pelas luzes bruxuleantes dos
gasómetros, vultos que de repente se transformam, à luz do Sol, em corpos enlameados, de
rostos farruscos e prematuramente envelhecidos.
É habitar nos bairros construídos à porta da
mina pelos patrões estrangeiros com sobejos
da mais-valia extorquida ao suor das toupeiras
humanas, que escavam, dia a dia, ano após
ano, complexos labirintos de galerias e poços;
bairros humildes, constituindo por vezes verdadeiros guetos, formados por filas rectilíneas
de casas baixinhas e de ruas pavimentadas
21
co de alquimia, sofre a sua transformação
numa massa pastosa de cobre. É sentir-se solidário com os companheiros de infortúnio, que,
debaixo de um sol abrasador, como verdadeiros forçados, descalços, no meio dos canais de
água-forte, executam, à semelhança dos salineiros, a duríssima faina da remoção das natas.
É contemplar todo este cenário inóspito, onde
apenas carrasqueiros e troviscos crescem, mas
ao mesmo tempo admirável, que se estende
mais a jusante, onde a água-forte, depois de
despojada dos seus elementos mais ricos,
prosseguindo o seu curso, vai desembocar
numa bacia de retenção que reflecte uma tonalidade em constante mutação, que vai do
vermelho-acastanhado ao azul-esverdeado,
contrastando com o céu azul recortado pelo
esvoaçar sereno das cegonhas: estranha encenação que tem como pano de fundo a miragem de um castelo fantasmagórico representado por um emaranhado de estruturas metálicas de torres e planos inclinados, revestidos
por chapas onduladas de zinco enferrujadas,
de onde emerge uma densa nuvem de poeira
cinzenta, proveniente da trituração e crivagem
da pirite.
É ter brincado aos mineiros, num precoce desafio ao perigo, explorando poços e canhas de
minas abandonadas, percorrendo esconderijos de justiceiros como o mítico Zdoro Bruto e
22
com escória, onde a miséria e a solidariedade,
de mãos dadas, estão presentes sempre.
É habituar-se a ouvir, à noite, através do tabique dos quartos, o tossir aflitivo e cavernoso
do pai ou do avô minados pela fatídica silicose.
É viver cronometrado pelo silvo estridente do
búzio da central eléctrica, que assinala o final e
a retoma do trabalho, sobrepondo-se ao timbre das badaladas funéreas do relógio da torre
da Igreja Matriz.
É ter assistido, junto ao malacate, aos momentos dramáticos e penosos que antecediam a
subida da jaula transportando as equipas de
socorro e os acidentados do fundo da mina, no
meio dos gritos lancinantes de mulheres com
xailes negros à cabeça, seguidos de cortejos fúnebres dum povo inteiro, cabisbaixo, silencioso, resignado com a fatalidade, mas corajoso,
ao som de passos graves.
É também, como escape da miséria e da revolta recalcada, partilhar, com toda uma comunidade, a alegria de poder gritar livremente “mineiro ... mineiro!”, incitando os seus ídolos do
Sport Mineiro, em tardes solarengas de domingo, no velhinho campo de Vale d’Oca; ou, encostado ao balcão da venda com outros companheiros, afogando mágoas e tristezas da sua
miserável condição, entre copos de três, em
melodiosas modas do genuíno cante alentejano, exprimindo com natural espontaneidade
sentimentos de revolta e de luta.
É reviver os imemoriais festejos da Degolação
de São João Baptista, onde romeiros vindos de
todo o Alentejo procuravam, nas águas termais
das minas de S. João do Deserto, curas milagrosas para todos os seus achaques. Ou igualmente, imbuído de fé ou simplesmente por respeito, participar nas festas em honra de Santa
Bárbara, transportando o andor da sua padroeira até à boca da mina, no meio do estrelejar
de foguetes, morteiros e de acordes graves da
filarmónica. É ter presenciado a insólita descida da Santa até ao fundo da mina de Algares,
na esperança de que a sua bênção protegesse
aquele local dos perigos sempre iminentes.
É aprender a nadar e a mergulhar nas águas
lodosas da Represa em tardes escaldantes de
Estio e refrescar-se à sombra dos frondosos
plátanos, adormecendo ao som do coaxar das
rãs e do canto alegre e infatigável das cigarras,
inebriado pelo perfume do rosmaninho, da esteva e do poejo, sob o bailado estonteante de
gráceis libelinhas cor de cobre e de asas ígneas,
esvoaçando e poisando alternadamente nos
juncos, indiferentes aos gestos ritmados das
lavadeiras, debruçadas sobre as pedras polidas, alinhadas ao longo da borda de água, esfregando e torcendo sem cessar os míseros
trapos já puídos de tanto uso e de tantas lavagens.
É ainda preservar a consciência da sua condição de explorado, nunca se resignando perante a adversidade nem se curvando à arrogância
e à opressão. É ter orgulho de pertencer a uma
in Revista Alentejana n.º 23 da Casa do Alentejo,
Abril/Maio/Junho 2002
Velho mineiro
Há muitos anos ainda moço
Lhe negaram a escola e a oficina
Em Algares desceu no velho poço
Foi trabalhar para o fundo da mina
Foi pinche nos primeiros dias
Cubas de água carregava
Correndo por túneis e galerias
Sabe Deus como ele andava
Assim andou alguns meses do ano
E esse foi o primeiro
Depois o mandaram para o relhano
Ele com outro companheiro
Lá tomavam muitas empreitadas
Trabalhavam anos a fio
Retirando velhas portadas
Iam enchendo o vazio
E sempre, sempre trabalhando
Confiante e crente na fé divina
Aos poucos se foi habituando
Ao ambiente do fundo da mina
23
classe que ao longo de gerações deu sobejos
exemplos de coragem e de luta por melhores
condições de vida e pela liberdade, por vezes
até com o sacrifício da própria vida. É jamais
esquecer as imagens revoltantes da prisão de
camaradas à saída do poço de Algares, após
heróica greve estoicamente mantida, ao longo
de vários turnos, em condições desumanas, no
interior da mina, ou cenas de repressões sangrentas, à calada da noite, de manifestações
pacíficas nas ruas de Aljustrel.
É ser filho de mulheres corajosas que sempre
estiveram ao lado dos companheiros, no sofrimento, na dor, na luta, no afecto e na generosidade.
É sentir, enfim, o pulsar da mina e é iniciar, precocemente, como um destino inevitável, a
aprendizagem de mineiro.
E, com tudo isto, é fazer parte integrante do
imaginário e da identidade cultural de uma comunidade mineira ancestralmente martirizada, que obstinadamente teima continuar a
existir, lutando pela reabertura da mina, contra
os efeitos perniciosos da globalização.
Nas frentes na extracção do mineral
Avançando sempre de seguida
E nesse trabalho infernal
Viu companheiros perderem a vida
Enfrentando duras tormentas
Que executavam com esforço
Empurrando pesadas vagonetas
Colocando-as à boca do poço
Foi um tempo de vida dura
De tantos anos, tantos dias
Por lutar contra a ditadura
Lá foi preso para Caxias
Assim e por não dar jeito
Não queria ser safreiro
Não estava satisfeito
Ele queria ser mineiro
Foi uma greve muito falada
No País e em todo o mundo
Pelos mineiros bem organizada
Paralisou todo o turno lá no fundo
Trabalhou durante tantos anos
Adquirindo experiência e valor
Foi mestre de vias, mestre de canos
Por fim foi entivador
Quando voltou da prisão
Da empresa foi despedido
Por defender a razão
Continuou a ser perseguido
No piso cem foi arreateiro
Conduzindo mulas pelas arreatas
Lá no fundo ligou bombas, foi bombeiro
Nas galerias limpou regatas
Assim cumprindo sua sina
Suas ambições se perderam
E no fundo da velha mina
Os seus sonhos lá morreram
Trabalhou na arreação
Durante quase um ano inteiro
Depois foi com satisfação
Promovido a mineiro
Hoje velho e cansado
A saúde complicada e séria
Vive muito mal, está reformado
Tem uma pensão de miséria
24
Como eram diferenciados
Ele e outros companheiros
Foram depois intimados
Para trabalharem como safreiros
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IX Semana Cultural do Laranjeiro
5 a 12 de Julho 2008
5 de Julho - 21.30 horas na Praceta Diogo Couto
Espectáculo Musical “Canto da Terra”
6 de Julho - 16.00 horas no Salão de Festas do CIRL
Teatro de Revista “A Professora Sofre”
7 de Julho - 21.30 horas no Mercado Velho do Laranjeiro
Concerto Juvenil com os Picnoise
7 de Julho - 21.30 horas nas instalações da Junta de Freguesia
Inauguração da Exposição de Joalharia de Bruno Prekatado
8 de Julho -14.00 horas no Salão de Festas do CIRL
Baile “Vamos Dançar ...!!” com Ricardo Alcaide
9 de Julho - 21.30 horas nas instalações da Junta
Colóquio “A Dieta Mediterrânica”, com Prof. Manuel
Carrageta
10 de Julho - 21.30 horas na EB1 Nº2 do Laranjeiro
Recital de Poesia
11 de Julho - 21.30 horas naEB1 nº 2 do Laranjeiro
Espectáculo Musical “Grupos da Nossa Terra”
12 de Julho - 21.30 horas na Praceta Diogo Couto
Aproveitamos para saudar toda a comunidade Alentejana, desejandolhe no período de retemperamento que se aproxima, umas boas e
merecidas férias.
A Junta de Freguesia de Laranjeiro
25
Espectáculo de Folclore
arte
Luis Maçarico
Festas de Papel
A arte éfemera do Alentejo. O caso do Redondo
No Alentejo, em Campo Maior, como no Redondo, mas também em Santiago do Cacém,Cuba e
São Teotónio, permanecem, nos meses estivais,
de quatro em quatro, de dois em dois anos, ou
de doze em doze meses, festejos (Festas do
Povo, Ruas de Papel, Mastros) onde os enfeites
substantivos são essencialmente recortes de papel, cumprindo-se uma tradição, ancestral ou reinventada.
Segundo os testemunhos, quer no Redondo
(1838) como em Campo Maior (1893), a génese
destes eventos remonta ao século XIX.
Sendo a arte do papel recortado uma das mais
genuínas manifestações da Arte Efémera, presente até em festas da Beira Baixa, como as de
Santa Luzia, Eurico Gama assegura que esse
saber tem a sua raíz nos conventos onde a doçaria era acompanhada de belíssimos ornamentos
de papel recortado. Por seu turno, Eugénio Freitas afiança que essa arte nasceu “no decorrer de
todo o século XVIII e na primeira metade do XIX”
em toda a Europa.
26
Os inúmeros documentos recolhidos sobre a Festa do Redondo e a memória de algum trabalho
no terreno, guardado num diário de campo, em
Julho e Agosto de 1997, permitem revisitar
o evento, decorrida uma década sobre a observação participante então desenvolvida...
Os registos locais, citados na Internet e em jornais como o “Diário de Notícias”, apontam o
ano de 1838 como sendo o início das primeiras
ornamentações, o que afasta a ideia destas festividades se instituírem enquanto concorrência
às festas do Povo de Campo Maior. As ruas de pa-
pel recomeçaram, após um período de declínio,
conforme disse D. Marianita, para quem “foi em
1975, em Agosto, que se fez a primeira festa...
Aquilo que nós instintivamente tínhamos feito,
não era parecido com Campo Maior...Não é tirar
prestígio a Campo Maior mas nós fazemos com
temas!” (depoimento em Julho de 1997).
caprichos de papel vistoso, a sua rua. As fantasias que surgem da imaginação e do labor destas
artesãs espontâneas, alquimistas de um prazer
efémero, têm os seus segredos.
“Fomos mesmo a um quintal, onde havia uma
bananeira seca, e temos ido lá ver...e também vimos numa revista!, revela a líder do grupo, que é
costureira.
Para aquela senhora, a festa realizou-se pela primeira vez em 1979, organizada pelo Grupo dos
Amigos do Redondo.
A Dra. Lígia Calapez informou então que cada rua
tinha um tema, apenas conhecido pela Câmara
(que coordena, para não se repetirem).
Numa loja, guardam-se macacos, bananas, palmeiras, tudo executado em papel de seda.
“Desde Janeiro que a gente trabalha nisto”, diz
uma das moradoras, empenhada em florir com
Dona Marianita acrescenta que “primeiro era
uma Comissão de Festas e enfeitavam-se as
ruas principais...eram só homens! Mas casaram,
foram para Lisboa, Évora...outros enviuvaram e
deixaram de fazer as festas. Era em honra de
Nossa Senhora de ao pé da Cruz (Calvário)...até
que surge o Grupo Pró-Amigos, ainda só com
homens. No Grupo de Amigos do Redondo é que
já havia senhoras...Cada rua tem uma pessoa
responsável! Nos primeiros anos foi quase
27
Vinte anos depois, o evento reforçou a sua eficácia. Nos dias 19 e 20 de Julho e 3 de Agosto de
1997 apreciei a sensibilidade do povo redondense em festa, escutando vários protagonistas,
como Dona Jacinta, que justificou assim a essência dos festejos: “Como isto era muito morto, não
havia divertimento...fizeram esta festa, para dar
mais vida à vila!”
28
Respondendo aos que dizem que não têm jeito,
acrescenta: “Eu até tenho o hábito de dizer: “todos juntos é que sabemos tudo!”
E Dona Zezinha remata: “O que é que nos leva a
fazer isto? As pessoas que vêm, gabam e nós ficamos satisfeitos!”
O resultado deste esforço foi notável. Naquele
ano, o deslumbre de formas e cores cativou os
visitantes: uma artéria ostentava tulipas e moinhos
da Holanda, outra mostrava cisnes embelezando
a rua enramada, noutra ainda a exuberância de
uma selva acentuava através de riquíssimos pormenores onde se insinuava o exotismo da temática, havia ainda a rua da fábula do capuchinho vermelho e uma pista de desportos de Inverno, com
bonecos de neve e esquiadores, aproveitando
uma rampa, e uma adega com talhas enormes e
mesas de convivas, e ainda um largo a regorgitar
de salero com esbeltas sevilhanas...
Por todo o lado a criatividade imperava, exibindo
à saciedade a diferença (ou complementaridade)
com as ruas floridas de Campo Maior, que não
dispensam quadras de poetas populares e as
tradicionais saias, cantares tradicionais do Norte
Alentejano.
Para Leite de Vasconcellos, “As tradições populares manifestam o modo como o povo encara
actualmente a Natureza e como vive na Sociedade.”
Nesta pequena abordagem, pretendeu-se
demonstrar a riqueza da cultura popular, que
se evidencia nas nossas terras, durante o Estio,
época mais propícia a estas manifestações festivas, dependentes dos favores do clima e que
geralmente estão associadas a ritos ancestrais de
celebração das colheitas.
Na sua sabedoria, mesmo durante períodos de
constrangimentos, as populações souberam
sempre contornar tempos mais complicados,
respondendo à adversidade com a celebração da
alegria.
A identidade dos lugares robustece-se na evocação de tradições que são património colectivo.
O povo sabe resistir às crises, através da criatividade festiva, que constitui uma pausa na rotina e
uma superação de problemas.
Enfrentando as dificuldades, com o colorido das
ruas onde moram, garantem a continuidade e
repõem a genuinidade dos primórdios.
A festa confirma esse regresso às origens, como
diz Mircea Eliade, sendo também um contributo
para abarcar o presente.
A Comunidade repete o ritual, para conferir
sentido à sua caminhada, reforçando sociabilidades. A Festa é a expressão mais conseguida do
relacionamento entre vizinhos, projectando
para o exterior uma imagem de marca que atrai
visitantes e dinamiza o turismo, favorecendo o
desenvolvimento local.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Freitas, Eugénio da Cunha e “Arte do Papel”, in “A Arte Popular em Portugal”, Verbo, Vol. I, pp. 235-263.
Gama, Eurico (1966) “A Arte do Papel Recortado”, “Revista
de Etnografia”, vol. II, T2 Outubro 1966, pp. 339-354.
Moniz, Manuel Carvalho (1997) “Os papéis recortados”, in
“Da Arte Popular Alentejana”, “Cadernos de Etnografia-3”
Câmara Municipal de Évora, pp. 49-61.
Ribeiro, Emanuel (1933) “A Arte do Papel Recortado em Portugal”, Imprensa da Universidade de Coimbra.
Vasconcellos, Leite “Tradições Populares de Portugal”,
INCM.
Agradecimentos:
Ana Isabel Carvalho, Jorge Cabral e Paula Guimarães
29
voluntário...As pessoas é que compravam o material! Depois, a Câmara dispôs-se a fornecer o
material. Pessoas envolvidas, ao todo, é incalculável. Há moradores que não pertencem à rua,
que também estão a trabalhar em casa...”
arte
Rosa Dias
Festas do Povo de Campo Maior
Vistas com os olhos da Alma...
Falar de Campo Maior é sempre um desafio, ao
qual eu me entrego de alma e coração.
Quando falo de minha terra as raízes vêm ao de
cimo, onde existe um orgulho que me impele a
falar. Se por um acaso a palavra me faltasse, eu
cantá-la-ia em minha poesia, como já aconteceu
muitas outras vezes.
Entre prosa e rimas, passo a descrever a bela Vila
raiana de Campo Maior.
Seus monumentos ali estão, como guardiães,
para que a história não deixe de se contar.
Suas casas apalaçadas ainda ostentam beleza e
altivez.
As casas mais modestas reclamam por justiça.
Nas frontarias o branco caiado, impera, e como
30
rei no Alentejo é carregado aos ombros, dos lindos rodapés pintados a rigor, onde por tradição
sobressai o azul Alentejo roubado ao céu, e o
amarelo oca, mais parecendo saias coloridas,
enfeitando as belas ruas da Vila.
Há ainda a realçar algumas portas pintadas, que
teimam em manter uma tradição que já vai longe.
As cortinas de riscas, mais parecem mantilhas cobrindo os ombros das portas mais antigas.
Os batentes e as aldrabas ainda se encontram
balho comunitário, e só desta forma o resultado
pode ser assim, belo e seguro.
O povo se alegra, o visitante pasma, os poetas
cantam.
Rainha Santa Isabel
Fez do pão Rosas sem fim
E nós com simples papel
Plantamos este jardim
As mulheres encarregam-se do trabalho mais
minucioso e delicado a confecção das flores, e a
decoração das ruas.
Os homens, esses têm o trabalho mais pesado.
Abrem buracos nas calçadas, colocam os paus,
amarram arame, esticam as cordas de metros e
metros, onde já foram coladas as franjas ou as
flores de papel recortadas ao gosto de cada um
e sempre sobre a orientação da cabeça de rua.
Cabeça de rua? Sim.
Assim se chama quem toma a dianteira sobre
31
aqui e ali; Assim como as belas sacadas em ferro
ferrujado, vestígios dum passado, nem sempre
valorizado.
O povo camponês comunga entre si, um jeito de
falar, muito característico das gentes raianas povo
simpático, e hospitaleiro.
Quando esta junção se dá, a alegria extravasa, e
aí, a festa acontece.
Festa centenária das flores de papel, que no jeito
e na arte, são únicas no nosso país.
O momento mais alto destas manifestações surge,
como que por magia em fins de Agosto princípios
de Setembro. E sempre, quando o povo quer.
Enfeitam-se as ruas das mais variadas e lindas
flores de papel colorido, dando assim a ideia dum
lindo jardim em flor.
A plantação deste, deve-se a este povo artista,
que durante meses a fio, trabalha com amor e
afinco para que o resultado seja de deslumbre
aos olhos do visitante.
As festas do povo de Campo Maior; são um tra-
Rua em Campo Maior
32
todo o trabalho de cada rua florida.
Ainda a cargo dos homens está todo o trabalho
de carpintaria e montagem, como por exemplo
as entradas das ruas, janelas, portões, a parte da
electrificação, tudo o que tenha a ver com o esqueleto, que irá suportar as belas flores de papel.
O trabalho dos idosos também é muito apreciado, pois são eles que com sua experiência supervisionam todas as etapas, vão aconselhando,
dando ideias, desde a dobra do papel, ao corte
e recorte, de cada pétala, de cada folha, que se
cola, se enrola, se torce, se ajeita até que o produto final nos mostra uma verdadeira obra prima.
As crianças são também, elementos
imprescindíveis deste trabalho.
Como? Bom, como na gíria se diz.
“O trabalho da criança é pouco, mas quem não o
aproveita é louco”.
Ainda que pouco, possam fazer, não podemos esquecer, que vão ser elas as transmissoras, deste
saber e arte, para as gerações vindouras, e só assim as Festas do Povo de Campo Maior não se
perderão no tempo.
E é com o trabalho de todos, que chega enfim o
momento mais esperado.
A noite da enramação, as mulheres continuam
correndo de um lado para o outro num azafame
que só visto, como quem anda arrumando a casa
para a chegada das visitas.
E com cravos e rosas, com flores aos montões
Se alindam janelas, se enfeitam portões.
As festas do querer, sem o cansaço sentir
Levam meses a fazer, e noites sem se dormir
E numa manhã de Setembro, a Vila acorda mais
bela
Com a camponesa sorrindo, debruçada
na janela.
E esta vila raiana é enfeitada a rigor
Com lindas flores de papel, e belos poemas de
amor
Vêm emigrantes, Espanhóis, Franceses e Ingleses
Gente de todas as raças, às festas dos
camponeses
E o forasteiro que entrar, neste recanto florido
Vai na certa relembrar, que o tempo não foi
perdido.
E depois de tanta briga, o jeito que este povo tem
de dizer que está feliz, é cantando e
‘ balhando’ bailando.
Mas a alegria é grande demais, não cabe nos
corações, não cabe nas casas, como tal vem para
a rua, e aí sim, ela se solta.
As mulheres em grupos fazem rodas, formam
bailes, cantam as saias; As cantigas; são simples
quadras feitas no joelho, bem ao gosto do povo,
as cantadeiras convidam com simpatia quem
queira entrar na roda, fazem-se acompanhar das
formosas pandeiretas enfeitadas de pequenos
guizos, e de fitas coloridas.
E
Com bates certeiros na palma da mão
Pandeireta segue o tom da canção
E um povo sem guerra
Assim canta a terra
Assim louva o pão
E o som que soar, outro vai chamar
O das castanholas em seu repenicar.
Que pode ir de quatro a cinco anos. Para depois
entrar no bulício ansiado e tão desejado.
Quem tiver ocasião de passar por Campo Maior,
durante a semana das Festas do Povo fica sem
dúvida deslumbrado com tanta beleza.
E já no rescaldo, o meu povo amado embora
cansado
Dá graças a Deus, de mais uma vez, cumprir o seu
fado
Fado de arte e jeito, com que foi prendado
Um Campo Maior por Deus abençoado.
33
E a Vila sai do pousio.
fotografia
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Os Segredos do Olhar
Foto Rosário Fernandes - Mértola
Rosário Fernandes
Rui Cunha
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Foto Rosário Fernandes - Aqueduto em Évora
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Foto Rosário Fernandes - Moínhos em Évora
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Fotos Rui Cunha-RCL banco de imagens© - Montemor
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Fotos Rui Cunha-RCL banco de imagens© - Elvas
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Fotos Rui Cunha-RCL banco de imagens© - Évora
memória
Maria Elisa Santos
Como Conheci o Alentejo
40
Sou beirã. Nasci e cresci nas faldas de uma serra,
tendo por horizonte os agrestes penhascos onde
a custo brotava alguma vegetação.
Na nossa linguagem comum, dizíamos que só se
viam barrocos. E era verdade.
As casas e ruas, à base de granito, faziam das
povoações lugares escuros e sombrios e as pessoas, por sua vez, não eram menos sombrias e
também duras, tal como a pedra.
Tudo era frio e cinzento a maior parte do tempo,
ou branco e gélido quando o céu desabava em
nevões que ainda mais nos ensimesmavam e nos
atormentavam a vida.
As marcas de se ter nascido e crescido num ambiente assim, persistirão para sempre.
Mas, não é sobre essa parte da minha existência
que me dispus a escrever.
Era ainda muito jovem quando, no final da década de 60, me mudei definitivamente para Lisboa.
Até essa altura, do Alentejo só conhecera episódios da reconquista, as manchas, alaranjada e
amarela, com que no mapa eram representados
o Alto e o Baixo Alentejo e uma simpática e alegre professora de Economia Doméstica, de que
se dizia ser de Évora. Digo “se dizia” porque, não
sendo ela a professora da minha turma, pouco
sabíamos da sua vida, a nós bastava-nos saber
que a cada intervalo, ela lá estava para nos fazer
girar a todas na grande roda formada no átrio
do primeiro andar das instalações provisórias da
Escola Comercial e Industrial, cantando as suas
canções, tão novas para nós! Porém, tamanha
alegria e vontade de viver não chegaram talvez
para vencer a agrura gelada da terra onde fora
parar e assim, sem mais nem menos, um dia “esbofeteou-nos” a todos com o seu suicídio.
Passaram mais de quarenta anos e a “bofetada”
ainda me dói.
Foi no meu primeiro emprego, em Lisboa, que
“cheguei” ao Alentejo pela mão de uma colega
de Moura.
O Alentejo era, afinal, muitíssimo mais do que
aquelas manchas no mapa. O Alentejo era
a planície a perder de vista, era o horizonte
aberto, era o campo imenso de espigas amarelas
e papoilas vermelhas, era o casario baixo e branco bordeado de azul nas portas e janelas, era o
sol, era o calor, era um outro modo de estar, de
cozinhar, de nomear, de falar... era um outro
mundo.
E eu gostei muito de começar a descobrir esse
outro mundo.
De Moura, a minha colega teve artes de me fazer
“ver” todos os seus recantos e de me encantar
com as histórias felizes e alegres da sua infância
e adolescência; muitas dessas histórias mais me
pareciam por vezes saídas da sua imaginação
fértil do que da sua vivência real, mas pude
constatar, em várias ocasiões, que não havia fantasia nelas.
Creio que se formou então na minha cabeça a
ideia de uma espécie de relação causa efeito: o
Alentejo como fonte geradora de bem-estar. Ideia
que mais se reforçou quando mais tarde conheci
de facto algumas terras alentejanas e fiz outras
amizades por lá. Amizades que hoje muito prezo.
Curiosamente, ou talvez não, ainda hoje não
conheço Moura. Quem sabe um dia!
Mas fecho os olhos e vejo Moura como quiseram
que eu a visse e … como gosto ainda que por lá
vejo!
memória
António Galvão
Os Feirantes
Assim, depois da abertura, quem entrasse no
arco da Porta Nova, vindo da Estação Ferroviária,
ou do outro lado, do jardim dos “Mal-encarados”,
iria fazer uma viagem fantástica, rodeado por
passadeiras laterais, de mantas multicores, cestos, capotes e de fragâncias aromáticas de pêros,
figos, alfarroba, pinhoada, água-mel e outras gulodices.
A rua do Fôjo era o canal maravilhoso que permitia o acesso ao coração da Feira e, no pavimento
de terra batida surgiam as barracas de brinquedos, artefactos e outras bijuterias que toda a
gente desejava comprar.
Ao fundo, apareciam então, como por encanto,
no reino dos sonhos, um, dois e às vezes até três
circos, que iriam fazer as delícias de meninos e
adultos.
Mais para o lado esquerdo erguiam-se os carrocéis, as respectivas pistas de automóveis, os
desejáveis “comes-e-bebes” ,as barraquinhas das
setas e tirinhos e para os mais ousados as meninas de engate. Do lado direito ficava a “curraleira”
A minha avó, costumava alugar, durante o tempo
em que os feirantes permaneciam em Moura, um
pequeno quarto com porta independente para a
rua da Esperança, e que mesmo não levando caro
lhe fazia um geitão nesses tempos de carências.
Por mim, sei que também rejubilava de alegria
sabendo que estavam ali ao meu lado alguns
artistas, lindas raparigas e às vezes até me ofereciam bilhetes para assistir aos espectáculos e para
dar umas voltinhas nos carrocéis e automóveis.
Ilustração deAntónio Galvão
Uma semana antes de abrir oficialmente ao público, chegavam de todos os lados personagens
ambulantes, com os mais diversos apetrechos de
montagens, fossem tendas, carrocéis, circos ou
quermesses.
do gado com os tradicionais negócios de ocasião
entre aldeões, vilões e ciganos.
41
Lembro-me, com aquela típica saudade dos
velhos tempos, já preenchidos de memórias
longínquas, da antiga Feira de Setembro em
Moura, minha terra natal, e da sua presença irresistivelmente mágica.
Porém, quando chegava o derradeiro momento
da partida e, depois das contas feitas, a minha
avó tinha que voltar a caiar as paredes do quarto, porque entretanto os hóspedes, em relação
a higiene e salubridade tinham pouco cuidado,
mas, mesmo assim, eu ficava ansioso à espera de
outra feira de Setembro, que me voltaria a trazer
a festa e o convívio com aquela gente que afinal
também eram bastardos da vida.
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O Mundo mudou, o recinto da feira é outro, mais
moderno , é certo, mas sem o toque da fantasia
da minha infância. Os feirantes são outros, porventura mais higiénicos, (a ASAE anda aí), mas
talvez mais predispostos a problemas de injustiças
sociais, violências, e, de qualquer modo, o quarto
da minha avó, assim como ela, desapareceu para
sempre.
Junta de Freguesia
da
Cova da Piedade
O executivo da Junta de Freguesia
de Cova da Piedade convida todos os
“fregueses” e aqueles que nos queiram visitar, para as Festas de Nossa
Senhora da Piedade que se realizam
em Setembro nos dias 12, 13 e 14.
Certos que nos encontraremos para
aquele abraço fraterno e solidário.
Seixal•20 a 29 de Junho
Arrentela•9 a 13 de Julho
Aldeia de Paio Pires•30 de Julho a 3 de Agosto
Amora•13 a 17 de Agosto
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Corroios•22 a 31 de Agosto
43
Fernão Ferro•19 a 27 de Julho
memória
Rosário Fernandes
Saudades de um passado já distante e
até de um sapato voador...
Um destes dias visitei a aldeia onde vivi os primeiros anos da minha infância. Aninhada na encosta
do maciço de S. Mamede, a freguesia de Carreiras (Concelho de Portalegre), continua a exibir o
seu belo casario branco, no meio dos sobreiros
de um verde escuro muito próprio. Nos vales,
embaixo, vêm-se extensos bosques de carvalhos,
vestígios vindos talvez de um passado celta, onde
esta árvore era sagrada. Marcas naturais que teimam em permanecer, apesar de já muito esquecidas pelas novas gerações. O interior da aldeia
mudou muito à semelhança do que aconteceu
a tantas outras localidades onde o poder local
democrático foi o motor de transformação da
paisagem e símbolo da modernidade, dotando
milhares de povoações rurais com infraestruturas
44
Há ainda um mundo muito rico, mas oculto em
cada recanto da nobre terra alentejana. Descobri-o logo em criança. Um mundo de saberes e de
poesia natural. De beleza que teima em subsistir
numa cada vez mais alterada paisagem, fruto das
inevitáveis transformações das sociedades e do
tempo. As memórias de uma criança alentejana
de há 30 anos são muito diferentes das de uma
criança da actualidade, é óbvio, mas há um certo
património material e imaterial que ainda se conserva, constituindo manancial para deleite de todos nós, tanto naturais como visitantes. Neste rol,
estão incluídas as recordações que guardamos
como um valioso tesouro, mas, por vezes, só mais
tarde nos apercebemos do seu significado.
Vista da freguesia de Carreiras
básicas, como sejam esgotos, água canalizada,
electricidade, arruamentos, entre outras melhorias.
O tempo é a medida de todas as coisas, já diziam
os gregos antigos na sua sabedoria milenar, acumulada ao longo de muitas e muitas gerações e
povos que com eles se cruzaram.Continua válida
essa fórmula nos nossos dias. Por isso, existe também a memória, como uma forma de resgatar
factos passados, uma tentativa de os cristalizar,
de não os deixar cair no esquecimento, no ocaso
final...
Também as nossas infâncias vão ficando cada vez
mais longínquas e brumosas, verifico agora com
este retorno às Carreiras, onde os lugares em que
vivi estão irreconhecíveis, fruto tanto do tempo,
que sem apelo nem agravo segue o seu percurso
de transformação, como da mão humana, sempre ansiosa por modificar, tornar mais aprazível
e confortável.
Aqui um saquinho de amendoins, acolá um gelado ou até uns rebuçados efervescentes que
faziam cócegas na língua e de que já não recordo
o nome. Traziam no seu interior como brinde
gravuras de animais, automóveis e aviões que eu
colecionava com esmero. Da padaria, onde uma
grande máquina redonda amassava a farinha de
forma enérgica e constante, saía cheiro a pão
quente e lá havia também as boleimas (bolo da
massa do pão, quadrado, com recheio de canela
ou maçãs e cobertura em açúcar caramelizado)
que eu tanto apreciava. E, na minha timidez natural, ao percorrer a aldeia, esforçava-me por saudar todos com o habitual: Bom dia vizinha Chica,
Boa tarde, ti’ Manel...
Filha única e miúda solitária, o meu fascínio maior
era contudo a natureza, mais do que as gentes
típicas de aldeia. Aí era o meu reino encantado
que percorria horas e horas, esquecida até do
lanche para preocupação de minha mãe que
me chamava (ela utilizava a expressão “brádar”),
vezes sem conta e eu nem me apercebia. Aflita,
ela procurava-me por toda a horta e no final ouvia
um raspanete. Por vezes voava mesmo um sapato
em minha direcção, do qual eu me escapava num
ápice. O bando de bichos, cães e gatos, a quem o
passeio sabia a entusiasmante brincadeira, nessas
alturas do sapato voador, procuravam também
de imediato abrigo na “socha”, a cabana de pedra
com cobertura de giestas, localizada junto à casa,
que outrora servira para guardar o rebanho de
45
Nesta freguesia eu iniciei o ensino básico. Atravessava-a diariamente até à escola, por entre ruas
estreitas cobertas de calçada irregular, cheias de
curvas e contracurvas, muros de pedra a separar
hortas e casas, ervas e plantas desordenadas que
teimavam em crescer e florir a cada Primavera.
Nas poucas tabernas existentes, juntavam-se os
homens, enquanto as mulheres preferiam as lojas. Eu, criança adorava passear-me entre os dois
mundos, ora pela mão do meu pai, ora da minha
mãe. Sempre sabendo que haveria algo delicioso
para mim nalgum destes sítios.
46
cabras pertença dos meus avós. Só regressavam
ao páteo após acalmar a ira da minha mãe.
Hoje esse sapato, que na altura tanto me
afligia, já não voa, muito menos percorre
caminhos e nunca imaginei que um dia o
recordaria com nostalgia. Tudo se esfumou,
inexorável,no tempo. Até a famosa Farinha 33
da caixa verde e branca!! Nem mesmo a amoreira junto ao quarto da minha avó já subsiste e
semelhante fim teve também a bela cerejeira
grande, onde eu subia e me deliciava com frutos redondos, vermelhinhos e sumarentos. O
poste de telefone de madeira, onde eu adorava
encostar a cabeça para ouvir uma amálgama de
sons esquisitos e por vezes até vozes, foi substituído por um novo. Mais adiante, a frondosa
figueira que segurava o meu balouço apodreceu
e dela não restam quaisquer vestígios.
Desapareceu inclusive a esguia e alta nespereira
que por ocasiões de Primavera perfumava tudo
ao seu redor, onde gerações de aves fizeram os
seus ninhos. A primeira vez que descobri um,
tinha ovos quentes que eu tirei cuidadosamente
para mostrar ao meu pai. Logo fui instada a devolvê-los de imediato à procedência com o aviso
expresso de nunca mais tentar tal proeza. Devolvidos ao ninho, qual não foi o meu espanto quando
daí a algum tempo testemunhei a aparição de
uns quantos biquinhos amarelos no seu interior.
Fui espreitar, sem tocar em nada e vi uns quantos
recém-nascidos depenados e de olhos grandes,
de início fitando-me com receio, mas depois com
as boquitas abertas solicitando comida.
Deixei-os e fui contar a novidade aos meus pais
que me explicaram o ciclo da vida daquelas
criaturas e aconselharam a não visitá-los com
frequência para os pais não os abandonarem em
definitivo com medo da minha presença. Cumpri
à letra e foi com alegria que mais tarde os contemplei voando, ainda que de início desajeitada-
Com a minha avó e também com a minha mãe,
aprendi a conhecer muitas plantas, cada uma delas com sua utilidade própria, ora ornamental, ora
comestível, ora inclusive medicinal. As Borragens,
por exemplo, eram fritas em farinha e ovo, depois
comidas às refeições. A Erva de S. João, a Erva-dosCavalinhos e os Rabos-de-Raposa destinavam-se
a chás. Os Poejos utilizavam-se na açorda, mas
era de evitar as Catarinas-Queimadas que provocavam a morte aos coelhos, e também as Figueiras-do-Inferno, que tinham fama de ser venenosas em conjunto com as Cebolas-Albarrãs.
Eu gostava particularmente das Madressilvas
cheirosas, das Malvas-Reais e das Centaúreas
azuis que utilizava nas minhas brincadeiras para
“barbear” os bonecos, pois as suas pequenas
pétalas agudas picavam ligeiramente ao serem
encostadas ao rosto. Deliciava-me também com
os Figos da Índia, madurinhos, redondos como
porquinhos alentejanos em tempo de engorda.
Era preciso cuidado com os espinhos e tinha de
se saber o ritual próprio para descascá-los, que
começava cortando-se a parte superior e seguindo-se um golpe ao longo do fruto para separar
em duas metades a casca.
Ah, poderia estar horas aqui recordando, como
todos nós, episódios que marcaram de forma
positiva a minha infância, a minha alma alentejana. Até estórias de fantasmas, bruxas e
mouras encantadas que aprendi com os idosos da
freguesia, mas o meu texto já vai bastante longo.
Deixo-vos portanto encarregues de uma tarefa:
no silêncio das vossas casas evocarem também
vós as memórias que ainda guardam de outrora
e saborearem emoções há muito escondidas nas
profundezas das vossas mentes. Vale bem a pena,
acreditem!!
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mente, pela horta.
Mas, os domínios da minha curiosidade tinham
à sua frente um vasto reino para descobertas:
a horta e os campos adjacentes, com sua vasta
gama de animais, plantas, odores, árvores e rochas. Um manancial verdadeiramente encantador, entremeado pelo melodioso canto de um
conjunto de exímios músicos que enchiam os
ares de alegria. Eram melros, rouxinóis, pintassilgos, gaios, cucos, mejengras, cotovias, chapins,
picanços, pica-paus (ai o que eles adoravam debicar a madeira do poste do telefone!!), e mesmo
os inevitáveis pardais, rivalizando todos eles com
o som do acordeão que meu pai tinha por hobby
tocar.
homenagem
Rui Pereira
Rogério Ribeiro
Uma força viva incessante
em ambos os casos, como um apelo natural do
pensamento que fica assim registado espontaneamente.
No conjunto das obras expostas, Rogério Ribeiro,
dá-nos a conhecer cenas do real, da vida das pessoas, dos homens, das mulheres mostrando-nos,
também, o sonho, o imaginário da narrativa e da
fábula. Facilmente encontramos sinais de optimismo, de esperança e de ser possível o sonho
de infância – brincar descalço e liberto de vestes,
máscaras que irrompem, sorrisos e olhares que
nos transportam numa viagem ao universo puro,
mais transparente. O desenho, o traço com uma
intensidade singular, surge como um sustentáculo indispensável na forma de articular e expressar
o acto do criador livre. E que belos desenhos, por
exemplo, as ilustrações fantásticas, a tinta-da-china, realizadas em 1983 para o álbum “Revolução
de 1383-1385”! A representação fabulosa dos
momentos da revolta popular…. Onde as formas
das figuras são como um prenúncio da própria
existência humana - a vida e a morte; a resistência ou a capitulação; a luta pela emancipação ou
a resignação; o povo e os senhores mandantes;
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Um percurso individual de uma enorme profundidade, que se destaca no panorama artístico
contemporâneo. Rogério Ribeiro deixa-nos uma
obra extraordinária e infindável, com o seu cunho
aberto e sincero de quem abre a sua imaginação
ao mundo que o instiga a agir, a actuar, a querer
interagir com ele. Como refere Ana Isabel Ribeiro,
no catálogo da exposição de desenho e pintura
em Beja, “…pode falar-se, a propósito da obra de
Rogério Ribeiro, de um forte sentido humanista,
presente desde o início da sua actividade. É uma
pintura de incessante questionamento sobre o
Homem, o seu lugar no Mundo, numa constante
gestão de tensões polarizadas, simbolicamente,
no Amor e na Morte mas que, afinal, traduz um
prazer imenso que o pintor tem no seu trabalho,
nele encontrando uma forma de cumprir-se na
Vida.”
A exposição de pintura e desenho de Rogério
Ribeiro, que decorreu no ano de 2002, no Museu
Jorge Vieira e na Galeria dos Escudeiros, será sempre um acontecimento com significado histórico,
uma honra para o Museu e para o Município de
Beja. Nesta grande exposição o autor apresentou
trabalhos dos anos noventa e do início do novo
século. No Museu Jorge Vieira o desenho a tintada-china e na Galeria dos Escudeiros grandes telas
de pintura em acrílico e óleo tornaram os espaços
deslumbrantes e grandiosos com a colossal obra.
O desenho exposto na galeria do Museu representará sempre um reencontro simbólico de
dois amigos: o pintor Rogério Ribeiro e o escultor
Jorge Vieira, com percursos próprios de grande
profundidade e com uma obra do desenhado
constante. O desenho está patente, directa ou
indirectamente, na construção de qualquer obra
dos dois mestres. A linha riscada no papel surge,
Desenho no Livro Revolução 1383 - 1385
as barreiras e os limites do medo e da injustiça!
O Ícaro de Rogério Ribeiro é, sem dúvida, a luta
contra a indiferença perante o mundo que nos rodeia – voar para compreender e conhecer novos
Ícaro
49
os explorados e oprimidos e os exploradores: são
os temas fundamentais da obra. Poder-se-á dizer
que o desenho, nesta obra, é um exemplo excelso que exprime bem a intensidade dramática
tangível: o poder e a força das mãos que agarram os instrumentos do trabalho - a foice e o
ancinho, e que se convertem em armas da revolta retratada nos rostos da multidão. O autor
ao figurar, ao longo desta obra, grandes planos,
aproximações e afastamentos de cena, parece
tudo ter feito para que possamos “presenciar” e
“viver” os acontecimentos históricos! Na dimensão, sem paralelo, da sua obra podemos também
encontrar pontes claras relacionadas com as
ideias de reportagem, de cinema ou de teatro…
O seu desenho também entra pela expressão da
acção temporal e espacial, criando imagens diversas num conjunto cénico e dinâmico. A entrega
à representação, através do desenho, atinge contornos palpáveis de grande força sensorial que se
transforma, inevitavelmente, em apelo genuíno
à existência plena - pintar e riscar com o impulso
rebelde dum Ícaro que quer voar, ultrapassando
Quadros parauma exposição
inimaginável. É uma referência única para muitos dos que se reviam na sua acção constante
-. um homem de causas nobres, um lutador
insubmisso, mas solidário. Ao escrever estas palavras, restringi-me a um pressuposto - o Rogério
Ribeiro passou e marcou a minha vida... Mas
passou também por terras do Alentejo, em especial por Beja, onde deixou uma obra pública que
emana a sua gigantesca humanidade! Rogério
Ribeiro está a passar por aqui…E permanecerá no
tempo presente e futuro!
O Lugar da água
museu arqueológico da
rua do sembrano, beja
No espaço museológico da rua do Sembrano,
num ”Lugar da Água”, banhos romanos, nasceu
uma bela peça plástica, um mural de azulejos que
vai buscar o sentido da fonte, como elemento da
génese, da pureza e transparência: a nascente da
água e da mulher como o gérmen que brota a
vida; onde se vêem também os homens peixe na
festa dos banhos, do mergulho e do nadar, onde
muitas mãos se tocam e penetram na dádiva azul.
As cores de grande leveza, dos azuis aos ocres, e
os rosas, salientam alegria serena descrita na sua
narrativa. A pincelada livre, como uma queda de
água, expressa a ideia de liberdade. Com esta
obra – O Lugar da Água – assinala uma presença
plástica extraordinária que valorizou, consequentemente, o património artístico da Cidade de
Beja.
50
lugares, novas mentalidades, novas atitudes. O
Mestre e a constatação sublime da transmissão
da intensidade do gesto da pincelada, ou do risco
a carvão! Os contornos das figuras surgem, ora
mais, ora menos, salientes e carregadas e, muitas
vezes, a cor emerge com grande luminosidade,
acentuando frequentemente o dramatismo
cénico nas suas telas, ou simplesmente no papel. Em “Quadros para uma exposição” o artista
é o protagonista: o cerne da própria tela. Nesta
obra deparamo-nos com o mundo do Mestre: o
atelier, os materiais e a matéria que se entranha
no suporte pintado; a presença dos pincéis, das
espátulas, das paletas de cor, da tela que espera
pela intervenção do autor. Desta obra emana algo
de mágico: o refúgio do artista povoado pelo seu
imaginário vivo – os seus modelos, os seus personagens reais, míticos, imaginados ou recriados;
no espaço do artista os modelos de representação passeiam-se fora da tela, fora do mundo,
mas dentro da mente do Mestre; são seres que
se movimentam para fora do limite dos contornos da própria obra e que parecem co-habitar,
lado a lado, com o criador; vemos anjos, homens,
mulheres que por aqui passam… Alguns espreitam o artista? E nós? Estaremos nesta tela? Tudo
gira em redor de um centro, um universo plástico
ilimitado!
Na verdade é muito difícil, impossível mesmo,
expressar por palavras a dimensão da sua obra,
mas também do homem e da sua trajectória individual de uma riqueza incomensurável. Rogério
Ribeiro é a configuração do Mestre, do pensador, do pedagogo, do ideólogo, do construtor do
Painel no Museu do Sembrano
memorial à mulher
alentejana,
parque da cidade de beja
Rogério Ribeiro nasceu em Estremoz a 31 de
Março de 1930. Viveu a sua infância em terras
alentejanas. No início dos anos 40 deslocou-se
para Lisboa com a família. Fez o ensino básico
na escola primária do Bairro das Colónias e frequentou o Liceu Gil Vicente, na Graça, para onde
se deslocava utilizando o “eléctrico operário”.
É liberto das acções da Mocidade Portuguesa
por influência do pai e a colaboração do médico
do liceu, que alegou questões de saúde. Iniciou
nesta altura as suas actividades no movimento
estudantil. Em 1946, para não perder o ano lectivo, mudou-se para uma escola particular em
Xabregas (D. Balbina) próximo de casa, e que
foi determinante na formação da sua individualidade. Foi aqui que conheceu o professor Germano Soromenho Neves, de quem passou a
ser um amigo. Passou a apoiar a instalação de
bibliotecas e a organização de actividades em
diferentes sociedades recreativas. Foi o seu primeiro contacto com o MUD Juvenil. Findo o 5º
ano do Liceu, matriculou-se por vontade de seu
pai, no Instituto Comercial de Lisboa, no Curso de
Económicas e Financeiras. Aqui conheceu outro
professor, José Júlio de Andrade Santos, que
desempenhou um papel fulcral nas suas opções
futuras. Com ele, foi dispensado dos exercícios e
ficava na sua mesa a apreciar belos álbuns, então
inacessíveis do cidadão comum: impressionistas
como Degas, Cézanne e muitos outros. Nesta altura, 1948, o seu pai foi colocado na Cidade da
Horta (Faial) tendo Rogério Ribeiro permanecido
em Lisboa. Esta nova realidade gerou, de alguma
forma, o ampliar do seu espaço de liberdade:
passou a ir ao Chiado, diariamente, travando
contacto com algumas tertúlias; e participou em
diversas acções contra o regime (distribuição de
panfletos, jornadas de luta…). Traçou aqui a mudança do seu destino, pedindo transferência para
a Escola de Artes Decorativas de António Arroio,
onde foi aluno de Abel Manta. Com a ajuda do
escultor José Dias Coelho, que o preparou para a
51
A última obra de arte pública executada por
Rogério Ribeiro, foi edificada em terras do Alentejo - Memorial à mulher Alentejana -, um obelisco
em prisma triangular, cujas faces estão revestidas
a azulejo, tendo cada um deles um rosto e um
nome no feminino. Nomes que se somam a os
outros nomes e que se somam ao nome de Catarina, no centro visual da obra, também ela representada num azulejo a azul e a cor amarelo seara,
a recortarem a sua silhueta. Esta obra, que se encontra no Parque da Cidade de Beja, é a memória
da luta de um povo que um dia aspirou a viver
num lugar mais justo e fraterno. A pertença da
nossa terra é de todos, e a terra a quem a trabalha é o mote desta luta, em que as mulheres
revelaram a sua força, coragem e vontade de
transformar o mundo da seara – o latifúndio. Este
é um trabalho que representa a força da união, o
somatório de parcelas de azulejos/mulheres que
constroem uma escultura mural sólida que é um
todo humano colectivo!
alguns momentos
significativos duma
vida preenchida
Memorial à Mulher Alentejana
52
trabalhos no âmbito do design gráfico e arquitectura de interiores e, mais tarde, funda a Sociedade “Protótipo” que idealizava objectos de
equipamento. Mantém a sua participação em
exposições colectivas, nacionais e internacionais,
de gravura, tapeçaria, e cerâmica.
Na década de 70, no período da “Primavera
Marcelista”, ingressou como assistente da cadeira
de pintura da Escola Superior de Belas-Artes de
Lisboa (1971). Deu continuidade ao trabalho
desenvolvido no campo do design de interiores.
Esta é uma década que alterou o rumo do seu
trabalho, com a Revolução de Abril a gerar movimentos de intervenção artística e cívica de vanguarda. Foi membro fundador do Movimento
Democrático dos Artistas Plásticos. Na escola
Superior de Belas Artes assumiu a coordenação
do grupo que impulsionou a criação do Curso de
Design Industrial e de Equipamento; foi representante do seu Conselho Científico e Membro do
Conselho Directivo. Realizou, por esta altura, as
cerca de 50 ilustrações do livro
“Até Amanhã,
Camaradas” de
Manuel Tiago:
trabalho
que
constituiu um
marco significativo no seu percurso individual
- num tempo
em que o país
respirava uma
atmosfera
de
liberdade plena
na busca do seu
caminho - onde
o artista se confronta, também
ele, com a necessidade de participarnaconstrução
da mudança...
53
admissão e ofereceu apenas, em troca, uma amizade que se sustentaria para sempre, ingressou
na Escola Superior de Belas-Artes de Lisboa, onde
fez a sua formação académica em pintura.
Em 1949, fez a sua primeira viagem a Paris onde
conheceu Cipriano Dourado, com quem colaborou em pinturas para o Pavilhão Português
na Festa de L’Humanité.
Na década de 50, no atelier de Júlio Pomar,
conheceu Alice Jorge, Vasco da Conceição, Maria Barreira, e Lima de Freitas. Foi convidado a
participar na 5ª Exposição Geral de Artes Plásticas
(Lisboa, Sociedade Nacional de Belas Artes - 1950)
sendo esta, a sua primeira participação numa
exposição colectiva.
Forma o seu primeiro atelier com
Cipriano Dourado. Cumpre o serviço militar na
Póvoa do Varzim onde nos tempos livres desenha
intensamente esboços que retratam o mundo
laboral das mulheres desta região: base inspiradora dos seus trabalhos de pintura e gravura.
Neste período o convívio e participação em tertúlias com escritores e artistas, grande parte dos
quais neo-realistas, possibilitaram-lhe amplos
conhecimentos, imprescindíveis na sua definição
plástica mais figurativa; neste enquadramento,
realizou ilustrações para autores como Fernando
Namora e Alves Redol, e participou activamente
na vida cultural da SNBA. No final dos anos 50,
terminou a licenciatura em pintura, na Escola de
Belas-Artes de Lisboa e foi sócio fundador da Sociedade Cooperativa de Gravadores Portugueses
– GRAVURA (1958). Dedicou-se intensamente à
gravura, realizando então múltiplas exposições
individuais e colectivas - Madrid, Lisboa, Paris,
Roma e Göteborg. Realizou ainda nesta etapa dois
painéis cerâmicos: um para a Fábrica de Fermentos Holandeses (Porto) e outro para a Estação da
Avenida do Metropolitano de Lisboa.
Na década que se segue, iniciou a carreira de
docente como professor de pintura e tecnologia
(1961), a convite do professor Lino António, na Escola de Artes Decorativas António Arroio (Lisboa)
do qual será afastado posteriormente devido às
suas opções políticas.
Em 1964 desenvolveu os seus primeiros
Ilustração do Livro “Até Amanhã Camaradas”
54
Ilustração do Livro “Até Amanhã Camaradas”
mensões, tanto para o Pais (Almada e Lisboa)
como para o estrangeiro (Chile e Japão). Neste
período participou em múltiplas e diversas exposições colectivas e individuais, nacionais e internacionais; e ilustrou, neste mesmo período, a
Praça da Canção, de Manuel Alegre. Foi também
consultor do Gabinete de reabilitação Urbana da
Câmara Municipal de Lisboa (Projecto – a Cor de
Lisboa); e iniciou o Projecto Museológico da Casa
da Cerca – Centro Contemporâneo (Almada).
Na entrada do novo milénio passou a professor
associado da Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa (2000) – Ano das Comemorações dos 25 anos dos Cursos de Design.
Integrou a Exposição O Azulejo em Portugal no
Século XX (Rio de Janeiro). O ano de 2000, de
entre outros acontecimentos, ficou marcado
por uma grande exposição – Ícaro (Lisboa e Porto), que incorporou novos elementos plásticos,
apresentados em dois grandes grupos – “Ensaiar
voar” e “Ousar a viagem” e ainda um terceiro –
“Labirinto”, que invoca o Minotauro.
Em 2001 apresentou trabalhos preparatórios
para o painel Cerâmico do Cine-teatro Lagoense
Francisco d’Amaral Almeida (S. Miguel). Construiu
ainda – As Asas de Ícaro, no Laranjeiro (uma das
onze esculturas para as onze Freguesias do Concelho de Almada, nas Comemorações dos 25
anos do Poder Local, organização da Câmara Municipal de Almada).
Em 2002 expôs desenho e pintura no Museu
Jorge Vieira e na Galeria dos Escudeiros – Beja.
No ano seguinte iniciou a preparação de um painel de azulejo de grandes dimensões, encomendado no âmbito do Viver Beja – Pograma Pólis,
intitulado O Lugar da Água – no Museu Arqueológico da Rua do Sembrano. No mesmo ano e
nos subsequentes ilustra diversas obras, entre as
quais, A Flor da Utopia (2003), de Urbano Tavares
Rodrigues; Triunfo do Amor Português de Mário
Cláudio (2004); Youkali (2005) e Crónicas de
Fernão Lopes (2007) de António Borges Coelho;
e O Ano de 1993 de José Saramago (2007). Em
2008 Rogério Ribeiro cria a sua última obra pública: “Memorial à Mulher Alentejana” – edificada
no Parque da Cidade de Beja
55
Este conjunto de ilustrações foi exposto pela primeira vez, em 1977, na Festa do “Avante” – FIL.
Foi também o autor do projecto original do actual
espaço da Festa do Avante, que ainda hoje perdura com grande impacto cultural e democrático
no país. Realizou exposições individuais de pintura, que dão visibilidade à sua breve trajectória
pela arte abstracta e prenunciam um retorno
ao figurativo; participou em diversas exposições
colectivas, no país e no estrangeiro, maioritariamente de gravura e tapeçaria. A década de oitenta
traduziu-se na participação num vasto conjunto
de exposições individuais e colectivas. Produziu
as ilustrações para o livro da Revolução de 138385, a partir dos textos do cronista Fernão Lopes
e de António Borges Coelho, onde são patentes,
uma vez mais, as preocupações com as temáticas
de índole social. Foi professor de iniciação à pintura no Ar.Co (1981-1984) e Presidente do Conselho
Científico da ESBAL. Entre 1981-1985 é membro
da Direcção da SNBA.
Iniciou uma colaboração regular com a Galeria
Nasoni - Porto, que manteve até inicio dos anos
90. Prosseguiu o seu trabalho na área da Museologia, coordenando projectos dos Museus Nacional de Arte Antiga, Fortaleza de Peniche e do
Museu do Neo-realismo de Vila Franca de Xira.
Foi responsável pelo projecto da Galeria Municipal de Arte de Almada, tendo desempenhado as
funções de Director Técnico e Artístico.
Os primeiros anos da década de noventa ficaram
marcados por trabalhos de pintura e desenho que,
embora tenham tido um carácter celebrativo,
estão manchados de tristeza: período de ponderação e de reflexão sobre o passado histórico
recente – olhar o presente com a necessidade de
repensar o futuro à luz dos acontecimentos políticos internacionais. Por esta altura realizou uma
visita a Cabo Verde, integrada num Projecto de
Reaproveitamento do Campo de Concentração
do Tarrafal, com o fim de transforma-lo em Memorial – este projecto devolveu ao seu trabalho
a reconciliação com a cor e presenteou-o com a
dimensão lúdica da pintura.
Em 1996 retomou um intenso trabalho na azulejaria, em obras públicas - painéis de grandes di-
56
Capa e Contraca
apa do seu Livro
57
entrevista
Manuel Coelho
Presidente da Câmara Municipal de Avis
tempos pela situação de grave crise que afecta o
País.
No plano económico, o sector primário ainda
ocupa uma percentagem considerável da população e nos sectores secundário e terciário dominam as micro e pequenas empresas. É importante salientar o investimento que tem vindo a
ser registado no Concelho nas áreas da vitivinicultura, da olivicultura e do turismo.
A este nível, entre outros investimentos, destacam-se os cerca de 7,5 milhões de Euros que a Herdade Fonte Paredes (HFP) efectuou no Concelho
ao longo dos últimos anos, através da aquisição
de 400 hectares para plantação de vinha, de que
resultam 10 marcas que se encontram no mercado, tendo sido algumas delas galardoadas em
certames nacionais e internacionais e exporta-
58
AA - O Concelho de Avis assume um papel de
relevo no Alentejo, como também no País. Em
linhas gerais, como caracteriza este Concelho do
ponto de vista social, cultural e económico?
MC - O Concelho de Avis situa-se no Distrito de
Portalegre, tem uma área de 606 Km2 e, de acordo com os Censos 2001, tem 5.197 habitantes
que se distribuem pelas 8 Freguesias (Alcórrego,
Aldeia Velha, Avis, Benavila, Ervedal, Figueira e
Barros, Maranhão e Valongo).
Do ponto de vista social, à semelhança do que
sucede no Distrito de Portalegre, no Alentejo e
em todo o Interior do País, o Concelho de Avis é
afectado pelos fenómenos do envelhecimento e
da diminuição populacional e, devido à forte diminuição do peso do sector primário, viu crescer
a sua taxa de desemprego, agravada nos últimos
Vista aérea de Avis
AA - Considerando que o Concelho de Avis é o
menos populoso, em comparação com os Concelhos limítrofes, que medidas estão previstas
para inverter esta situação, de forma a combater
o despovoamento?
MC - A afirmação de que o Concelho de Avis é
menos populoso que os Concelhos limítrofes não
corresponde inteiramente à verdade. O Concelho
faz fronteira com os Municípios de Ponte de Sôr,
Mora, Sousel, Alter do Chão e Fronteira. É claramente menos populoso que o Município de Ponte de Sôr mas tem um número de habitantes não
muito diferente dos Concelhos de Mora e Sousel
e maior do que Fronteira e Alter do Chão.
Não deixa, no entanto, de ser verdade que, tal
como sucede com a maioria dos Concelhos do
interior do País, o Concelho de Avis é afectado
pelo despovoamento, tendo por isso adoptado medidas em várias áreas para promover a
fixação da população, sobretudo as camadas mais
jovens. Entre as medidas implementadas pela
autarquia, destacam-se, na área da habitação, a
realização de loteamentos municipais em todas
as Freguesias, em que são vendidos lotes para
auto-construção, em zonas devidamente infrasestruturadas, a preços simbólicos, adoptando-se
critérios de atribuição que procuram favorecer a
atribuição a pessoas mais jovens e com menor
poder económico.
A pensar nos jovens, com idades compreendidas entre os 12 e os 30 anos, o Município de Avis
criou o “Cartão do Jovem Munícipe”. Trata-se de
um cartão de acesso gratuito, destinado a jovens
residentes e recenseados no Concelho (quando
maiores de 18 anos) e que confere benefícios no
acesso a bens e serviços: desconto de 20% nas
taxas relativas à construção, reconstrução, reabilitação, alteração, ampliação ou demolição de
imóveis, com excepção das taxas devidas pelas
operações de loteamentos e obras de urbanização; desconto de 20% na aquisição de lotes nos
loteamentos municipais para habitação própria
59
das para mais de 15 países. Em Maio passado,
foi inaugurada a Adega da HFP, dotada das mais
modernas tecnologias e equipamentos, onde se
pretende produzir vinho com práticas inovadoras
mas baseadas em técnicas ancestrais.
A olivicultura, aproveitando a excelente qualidade
dos solos e condições climatéricas, é também
uma área que tem conhecido um importante
crescimento, baseado, sobretudo, na qualidade
dos produtos, oriundos de terras de excelência,
sendo que alguns dos azeites produzidos no Concelho possuem a Denominação de Origem Protegida (DOP) de “Azeites do Norte Alentejano”, o
que constitui um reconhecimento das suas características únicas e da sua elevada qualidade.
Em Avis estão a surgir também alguns importantes investimentos na área do turismo.
A nível cultural, o Concelho de Avis possui traços
de uma cultura popular muito marcada que se
manifesta activamente através do folclore, da
música e da poesia popular, da gastronomia e de
diversos outros elementos que o Município de
Avis e o tecido associativo local, em parceria, tentam manter vivos através de projectos e eventos
que procuram assegurar uma oferta cultural variada para a população local e para os visitantes, ao
longo do ano.
Feira Medieval
60
e permanente; desconto de 75% na aquisição de
lotes para a instalação de actividades económicas; desconto de 20% nos bilhetes de cinema no
Auditório Municipal “Ary dos Santos”; desconto
de 20% nos bilhetes de entrada nas Piscinas
Municipais; desconto até 50% no acesso a actividades promovidas pela Autarquia; descontos em
estabelecimentos comerciais e outras entidades
aderentes.
A autarquia tem vindo a desenvolver um importante trabalho no domínio social, nomeadamente, no apoio à infância, por exemplo através
da criação de uma rede de Ludotecas Municipais,
de frequência gratuita, que oferece às crianças das
8 Freguesias do Concelho, com idades compreendidas entre os 3 e os 12 anos de idade, espaços
lúdico-pedagógicos onde podem ocupar os seus
tempos livres com actividades que promovem
a convivência com outras crianças e contribuem
para o seu desenvolvimento social e intelectual.
Todas as Ludotecas, à excepção da que se situa
na sede de Concelho, foram criadas ao longo dos
últimos 4 anos e pretendem ser também pólos
dinamizadores das Freguesias, envolvendo a
comunidade local nas suas actividades e participando activamente em iniciativas promovidas
pelo Município de Avis, como as Marchas Populares ou a Feira Franca. As Ludotecas Municipais
funcionam ao longo de todo o ano, sendo que
durante o período escolar estão abertas ao seu
jovem público entre as 14:00 e as 19:00 e, durante os períodos de férias escolares, vêem o seu
horário de funcionamento alargado, de forma a
corresponder melhor às necessidades dos seus
frequentadores de palmo e meio.
Os jovens são, sem dúvida, um alvo prioritário das
políticas de fixação de população, por isso têm
vindo a ser desenvolvidos projectos que os envolvem de forma a olharem para o Concelho com
outros olhos, valorizando mais as suas diversas
potencialidades. Um desses projectos é o “Jovens
em Movimento”, destinado aos jovens do Concelho com idades compreendidas entre os 16 e
os 25 anos, que vai já na sua quarta edição e que
familiar seja igual ou inferior a 75% da Retribuição
Mensal Mínima Garantida. Os portadores do
Passe Social têm direito a: desconto de 50% na
factura relativa ao consumo de água para fins
domésticos até ao limite de 3 m3 por beneficiário,
bem como em todas as tarifas indexadas ao consumo de água; desconto de 50% nos bilhetes de
cinema no Auditório Municipal “Ary dos Santos”;
desconto de 50% nos bilhetes de entrada nas Piscinas Municipais; desconto até 50% no acesso a
actividades promovidas pela Autarquia; apoio à
melhoria das condições habitacionais básicas nos
termos e condições do Regulamento de Apoio à
Recuperação da Habitação no Município de Avis,
com as necessárias adaptações; apoio à melhoria
das acessibilidades na residência do beneficiário,
com base num relatório dos serviços municipais
competentes que avaliará a pertinência, a viabilidade técnica da execução e o valor da obra; e
comparticipação, na parte não apoiada pelo Estado, nas despesas com a aquisição de medicamentos ou deslocações para exames, consultas,
61
promove a ocupação saudável das férias de Verão,
ao mesmo tempo que pretende desenvolver o
espírito de cidadania e de participação cívica dos
jovens na comunidade, bem como contribuir
para a manutenção, recuperação e divulgação do
Património do Concelho de Avis, nas suas várias
acepções. O projecto decorre de Junho a Setembro, contemplando três períodos de actividades
em que os jovens podem optar por uma das 7
áreas temáticas: Ambiente e Protecção Civil, Arqueologia, Cultura Popular, Desporto e Tempos
Livres, Património Histórico e Museologia, SócioEducativa e Turismo. As actividades realizam-se
em períodos de 5 horas diárias e os participantes
terão direito a seguro de acidentes pessoais, da
responsabilidade da autarquia; a transporte,
quando necessário, e a uma bolsa horária.
O “Avis é Cool” é um outro projecto do Município
destinado aos jovens do Concelho e que decorre
ao longo do Verão. Este projecto é constituído
por um conjunto de workshops e muitas outras
actividades, integradas em temáticas como:
desporto, dramaturgia, energias renováveis,
informática, arqueologia, museologia e literatura. Através do envolvimento dos jovens nestas
actividades pretende-se levá-los a olhar para o
Concelho numa outra perspectiva, valorizando-o.
De forma a assegurar a dignificação e a melhoria da qualidade de vida dos estratos sociais mais
carenciados do Concelho de Avis, a autarquia criou
o “Passe Social”: um instrumento de intervenção
social baseado no princípio da discriminação
positiva que procura colmatar a inadequação
das respostas sociais nacionais às necessidades
manifestadas pela população local, promovendo
a erradicação da pobreza e da exclusão social e,
simultaneamente, contribuindo para o desenvolvimento económico, social e cultural da população local. Podem beneficiar do Passe Social os
interessados que apresentem o respectivo requerimento, que residam e sejam recenseados
no Concelho há, pelo menos, um ano, que sejam
pensionistas, reformados ou portadores de um
grau de deficiência igual ou superior a 60%, e
cujo rendimento mensal per capita do agregado
Igreja do Convento
Pelourinho
62
tratamentos ou outros similares em ambulâncias,
carreiras públicas ou táxis oriundos do Concelho.
O Município de Avis tem procurado também
manter uma política de constante apoio às associações, colectividades e IPSS’s do Concelho, uma
vez que, por estarem inseridas no contexto das
comunidades locais, estas possuem uma visão
mais precisa das necessidades das população e
uma capacidade de intervenção mais eficaz. O
apoio a estas entidades ocorre sob diversas formas, quer através de subsídios e outros apoios a
iniciativas e projectos próprios, quer através da
comparticipação em investimentos relevantes.
Uma vez que o desporto é também uma importante forma de reforço dos laços entre a população, ao promover a troca de experiências entre
pessoas de todas as idades, pode considerar-se
que o “Viva o Desporto – Jogos Concelhios” é
também uma iniciativa que, ano após ano, ao
longo de vários meses, proporciona ocasiões de
convívio entre a população, envolvendo, em média, entre 15 a 20% dos habitantes.
Numa perspectiva genérica, ao longo do ano
realizam-se no Concelho um alargado conjunto
de incitavas de carácter cultural que procuram
promover o envolvimento e a animação da
população local mas também captar a atenção
de turistas e despertar neles a vontade de aqui
se fixarem.
A nível económico, tem-se procurado contribuir
para a fixação de população e de investimento,
quer por parte de potenciais investidores locais, quer por parte de investidores externos, de
forma a valorizar a economia local e contribuir
para a criação de postos de trabalho. Este apoio
concretiza-se através de um conjunto de medidas
que passam pela criação de pequenas zonas de
actividades económicas em todas as Freguesias,
com especial destaque para a sede de Concelho,
para onde está a ser preparada uma nova fase
de expansão da Zona Industrial, sendo que os
terrenos nestas áreas têm preços simbólicos e o
Município de Avis prescindiu de aplicar valores
máximos de IMI e de Derrama, como forma de
incentivo à fixação de investimento.
Para garantir condições de habitabilidade para a
população mais carenciada foi criado o Regulamento de Apoio à Recuperação de Habitação no
Concelho a que podem recorrer os candidatos
inseridos em agregados familiares com rendimentos per capita não superiores a 60% da Retribuição Mínima Mensal Garantida, que residam
no Concelho de Avis há pelos menos 3 anos. Os
beneficiários deste programa podem usufruir
de apoio técnico na elaboração de projectos e
acompanhamento das obras, fornecimento de
materiais e isenção de taxas, de forma a conferir
às suas casas melhores condições de habitabilidade.
De uma forma geral, áreas como a cultura, o
desporto e a qualidade ambiental merecem também uma especial preocupação por parte da
autarquia, uma vez que constituem condições indispensáveis para assegurar um nível de vida com
qualidade para a população, o que é um factor
muito importante para a fixação da mesma.
63
AA - Numa perspectiva económica, quais os
principais projectos para o futuro?
MC - No ano em que se assinalam 50 anos da
inauguração da Barragem do Maranhão, a Albufeira do Maranhão assume-se, cada vez mais,
como um elemento central da estratégia de
desenvolvimento económico traçada para um
futuro próximo, quer por parte da autarquia quer
por parte da iniciativa privada, tendo sempre
presente a necessidade de apostar numa estratégia de desenvolvimento sustentável, capaz de
valorizar as mais valias locais e, simultaneamente,
manter o respeito pelo seu equilíbrio, sobretudo
a nível ambiental.
A Albufeira do Maranhão, a riqueza do património
natural, as paisagens, o vasto património edificado, a herança cultural e a inexcedível capacidade
de acolhimento da população do Concelho de
Avis fazem com que o turismo seja uma das suas
maiores potencialidades, tanto mais viável quanto se regista uma tendência para uma procura
crescente de destinos de férias alternativos à habitual oferta de “sol e praia” e que estejam disponíveis ao longo de todo o ano. Neste sentido,
Avis é uma boa opção, quer para quem procura
desfrutar de uns dias de repouso num local que
une o património edificado, uma oferta cultural
diversificada, uma boa gastronomia e a tranquilidade de um recanto moldado pela natureza, quer
para quem procure umas férias mais activas, uma
vez que a Albufeira do Maranhão e o Concelho
em geral apresentam excelentes condições para a
prática de modalidades como o remo, o windsurf,
a canoagem, a pesca, o BTT, o TT, etc. A localização
geográfica de Avis pode também ser considerada
uma vantagem, já que numa zona relativamente
central no país, a menos de 2 horas de viagem de
Lisboa, ou seja, suficientemente perto para uma
Edifício da Câmara Municipal de Avis
64
escapadinha mas ao mesmo tempo, suficientemente longe da rotina do dia-a-dia.
Tem existido um grande investimento municipal
em projectos que visam a criação de uma maior
atractividade em relação à Albufeira do Maranhão e ao seu aproveitamento a nível turístico, na
sequência do Plano de Ordenamento da Albufeira
do Maranhão, que a autarquia elaborou em devido tempo. Fruto deste investimento, o Complexo
do Clube Náutico de Avis constitui hoje um dos
principais pólos de lazer da região. A intervenção
realizada neste espaço passou pela requalificação
da praia fluvial e da respectiva envolvente, bem
como pela profunda requalificação do Parque de
Campismo da Albufeira do Maranhão que, depois da remodelação da rede de abastecimento
de águas e esgotos, da construção da central
elevatória, dos edifícios de apoio (recepção, posto médico, bar e sala de convívio), bem como do
parque infantil, de um novo bloco de balneários
que inclui sanitários/balneários adaptados a pessoas com deficiências motoras, e de 10 apartamentos (5 T0 e 5 T1), abriu as portas em Agosto
de 2006 como um dos melhores do País.
Neste momento o Complexo do Clube Náutico
constitui um dos melhores cartões de visita do
Concelho, uma vez que reúne um conjunto de
infraestruturas que oferecem aos visitantes condições para uma estadia inesquecível: praia fluvial, parque infantil, solário, restaurante, piscinas,
parque de merendas, parque de campismo e
Clube Naútico
hangar náutico.
Apesar do Complexo do Clube Náutico se situar
a apenas 1 Km da Vila de Avis, existe também
uma aposta na criação de uma relação de maior
proximidade face a este espaço tão emblemático,
nomeadamente através das diversas actividades
que ali são desenvolvidas e da criação de uma
ciclovia, já existente na Vila, mas que em breve se
irá estender até ao Clube Náutico.
Além dos projectos municipais enquadrados
numa estratégia sustentável de valorização da
Albufeira do Maranhão, a autarquia tem procurado apoiar algumas intenções de investimento já
manifestadas, bem como aquelas que venham
a surgir. A este nível, é inevitável a referência ao
Avizaqcua Team Center, um projecto privado que
teve início em 2004 com o objectivo de criar um
centro de estágios de remo, adaptado às necessidades de atletas e equipas de alta competição.
Deste projecto vai nascer um hotel de 4 estrelas,
com capacidade para 60 hóspedes, situado numa
herdade com 47 hectares e com acesso directo
ao plano de água, que irá abrir ao público no
segundo trimestre de 2009. Apesar de o Herdade
da Cortesia Hotel não estar ainda em funcionamento, através do Avizaqcua Team Center, ao longo dos últimos anos passaram por Avis centenas
de atletas e equipas de elite do remo a nível mundial, como as selecções olímpicas da Noruega, da
Suécia ou da Dinamarca ou campeões olímpicos
como o sueco Lassi Karonen, o norueguês Olaf
Tufte ou o neozelandês Mahe Drysdale. Ano após
ano atletas e equipas regressam a Avis para realizar os seus estágios de Inverno, registando-se
uma afluência cada vez maior naquele que é
apontado por técnicos e atletas como um dos
melhores locais da Europa e mesmo do Mundo
para a prática de remo.
Na decisão de apoiar este projecto, além do contributo importante para a dinamização da prática
desta modalidade na Albufeira do Maranhão e
da projecção internacional das suas potencialidades, o Município de Avis teve em consideração
que se trata de um importante investimento no
Concelho que, directa e indirectamente, irá criar
postos de trabalho e que, apesar do aspecto ar-
Barragem do Maranhão
tempos registaram-se, a este nível, importantes
investimentos na vitivinicultura e na olivicultura,
existindo uma forte aposta por parte dos investidores numa presença cada vez mais marcante
nos respectivos mercados.
Em suma, temos como objectivo a criação da
marca Avis. Face à realidade cada vez mais
dinâmica e global, torna-se premente implementar uma estratégia forte de marketing territorial
capaz de promover o Concelho de Avis, de forma
integrada, nas suas diversas vertentes.
AA - Têm vindo a ser criadas novas infra-estruturas para as áreas sociais, culturais e desportivas.
Que equipamento e serviços se encontram disponíveis?
MC - A criação, manutenção e melhoramento das infraestruturas para as áreas sociais,
culturais e desportivas são indispensáveis para
garantir o bem-estar da população, por isso
existe, por parte do Município de Avis, uma forte
sensibilidade que se traduz numa preocupação
constante a este nível.
Como já foi referido, além dos projectos de apoio
social a jovens e idosos, foi criada uma rede de
65
rojado dos edifícios em construção, se encontra
perfeitamente enquadrado na paisagem e em
simbiose com o ambiente envolvente.
O potencial da Albufeira do Maranhão para a
prática de desportos náuticos e em particular
de remo é também evidenciado pelo facto de
diversas equipas nacionais a escolherem para a
realização de estágios e de provas, organizadas
em parceria com a autarquia, como é o caso do
Troféu de Remo Mestre de Avis, prova inter-associações, que vai já na segunda edição. A própria
Federação Portuguesa de Remo já manifestou
interesse em colocar Avis no calendário nacional
da modalidade.
Noutras perspectivas, o desenvolvimento
económico do Concelho de Avis passa também
pelo usufruto das excelentes condições naturais,
pela variedade da fauna e da flora, associadas
ao clima, influenciado pela proximidade da Albufeira do Maranhão, que propicia a prática da
agricultura e uma aposta crescente na produção
e comercialização de produtos locais, concebidos
à base de produtos naturais e seguindo receitas
tradicionais, como é o caso do mel, das compotas
e dos licores. Tal como já foi referido, nos últimos
66
sete Ludotecas Municipais que oferecem às crianças do Concelho um serviço gratuito onde
desenvolvem actividades lúdicas e pedagógicas
que contribuem para o seu desenvolvimento intelectual e social.
As Escolas do Primeiro Ciclo do Ensino Básico
de Avis, Benavila e Ervedal foram recentemente
alvo de obras de melhoramento que procuraram
dotar estes espaços de melhores condições para
acolher um número cada vez maior de alunos
devido ao encerramento de algumas das escolas
do Concelho.
Entre as principais infraestruturas de natureza
cultural do Concelho de Avis encontram-se o
Auditório Municipal “Ary dos Santos”, que além
de sala de cinema constitui um equipamento
polivalente que acolhe iniciativas culturais diversas e o Museu Municipal de Avis | Etnografia e
Arqueologia, situado na Sala do Capítulo do Convento de S. Bento de Avis, o qual tem promovido
exposições temáticas temporárias e desenvolve
um importante trabalho de recolha, conservação
e divulgação do património etnográfico do Concelho.
A par do Espaço Internet de Avis, a funcionar
desde 2005 e do projecto que se encontra em
desenvolvimento para a construção da nova
Biblioteca Municipal em Avis, foi inaugurado no
mês de Abril o Pólo da Biblioteca Municipal e
Espaço Internet de Benavila, que permite uma
descentralização no acesso à Cultura e às novas
tecnologias da informação e da comunicação
junto da população que não reside na sede de
Concelho.
Na área desportiva, tal como referido, existe
uma grande aposta na promoção dos desportos
náuticos, pelo que a profunda intervenção no
Complexo do Clube Náutico foi o maior investimento realizado pela autarquia a este nível,
bem como a também já mencionada Ciclovia
que em breve se irá estender até este espaço de
lazer. A população e os visitantes podem também
usufruir de espaços como as Piscinas Municipais
ou o Pavilhão Gimnodesportivo Municipal. Neste
momento está a ser preparada a requalificação
dos diversos espaços desportivos do Concelho,
Clube Naútico
que se estendem por todas as Freguesias, de
modo a criar melhores condições para acolher as
diversas iniciativas através das quais se pretende
promover a actividade física entre a população.
De referir que existem, em 7 das 8 Freguesias do
Concelho, Piscinas/Tanques de Aprendizagem de
Natação, destinados a crianças e jovens que aí
têm possibilidade de aprender e aperfeiçoar-se na
prática desta modalidade bem como divertir-se e
refrescar-se durante os quentes dias de Verão.
Uma vez que algumas das 8 Freguesias do Concelho distam da sede de Concelho quase 20 Km e
a rede de transportes públicos é nitidamente insuficiente para assegurar a mobilidade da população, pretende iniciar-se em breve um plano que
permita colmatar esta lacuna.
AA - Ainda em matéria cultural qual o trabalho
desenvolvido pela autarquia e a sua consequente relação com os diferentes agentes culturais existentes no Concelho?
MC - A autarquia desenvolve um trabalho muito
alargado em matéria cultural, quer através da
preservação do património histórico e cultural,
quer através da organização de iniciativas que
procuram manter vivas as tradições herdadas, estabelecendo uma ligação entre passado, presente
e futuro, que espelha e consolida a identidade
local. Neste contexto enquadra-se o trabalho
desenvolvido, por exemplo, pelo Museu Municipal, que se dedica à recolha, tratamento e divul-
AA - Avis tem um importante património
histórico. Dada a sua importância referencial
pelos diferentes aspectos histórico-culturais e
gastronómicos que os mesmos representam,
qual o papel da autarquia na sua preservação e
divulgação?
MC - Avis, pelo papel de destaque que teve
na História de Portugal possui uma elevada diversidade a nível patrimonial, com diversos
monumentos classificados como monumentos
nacionais ou de interesse público, muitos dos
quais são propriedade do Estado ou da Igreja e em
relação a esses o nosso papel tem, no fundamental, procurado ser um papel de sensibilização para
a importância da sua recuperação, preservação e
disponibilização de meios próprios de apoio.
Na área de competência do Município de Avis têm
Muralha e Torre
vindo a ser levadas a cabo diversas intervenções
de requalificação do espaço público, nomeadamente das áreas circundantes a esse património,
situado no Centro Histórico, onde se destaca as
obras já realizadas na envolvente da Muralha, no
Largo Dr. Manuel Lopes Varela ou no Largo Dr.
Sérgio de Castro e aquelas que deverão ter início
nos próximos dias no Jardim Passeio do Mestre e
no Largo do Convento. Não sendo possível intervir no processo de restauro dos monumentos, o
Município de Avis procura contribuir para a sua
valorização através destas intervenções, devidamente enquadradas no Plano de Pormenor de
Salvaguarda e Valorização do Centro Histórico,
que entrou em vigor em Março do presente ano,
e que visa requalificar e revitalizar esta zona da
Vila, nomeadamente pelo incentivo à reutilização de imóveis degradados e devolutos; manter o equilíbrio estético do conjunto edificado,
através da definição de regras que condicionam
as obras a realizar e os materiais a utilizar por
parte dos particulares nos edifícios e no espaço
público; promover a fixação de novos habitantes
e reordenar a circulação viária e o estacionamento, de forma a eliminar as barreiras arquitectónicas e permitir uma maior fruição dos espaços.
Não obstante a importância da regulamentação
e das obras realizadas e projectadas para o Cen-
67
gação de elementos da etnografia local, através
de mostras temáticas temporárias que além de
pretenderem envolver a população local através
da evocação de personalidades e de temas com
que se identifiquem, bem como dar a conhecer
aos visitantes a cultura do Concelho.
A autarquia não pode deixar de reconhecer que
os diversos agentes culturais existentes no Concelho desempenham um papel de extrema importância na dinamização da cultura local. Neste
sentido, e de forma a incentivar o trabalho que
desenvolvem, a autarquia criou um Regulamento
de Apoio ao Associativismo a que as associações
e colectividades locais podem candidatar-se,
através da apresentação do respectivo plano de
actividades anual, de forma a poderem receber
os necessários apoios financeiros e de outra natureza, que permitam concretizar as suas iniciativas
e projectos próprios.
O reconhecimento do importante papel desempenhado pelas associações e colectividades no
Concelho reflecte-se também na estreita colaboração existente entre estas e o Município de
Avis e que se traduz na integração daquelas nas
iniciativas organizadas por este ou mesmo na coorganização de outras, como é o caso da Feira
Medieval, da Feira Franca, do “Viva o Desporto –
Jogos Concelhios”, entre muitas outras.
tro Histórico, a revitalização deste espaço passa
também, em grande parte, por fazer desta zona
uma área de vivência quotidiana de habitantes e
visitantes. Para o efeito, o Município tem procurado desenvolver um alargado conjunto de manifestações de natureza cultural e desportiva que
têm como palco o cenário histórico de Avis, como
é o caso da Feira Medieval ou das provas integradas no calendário da Taça de Portugal de BTT.
A autarquia tem vindo também a adquirir alguns
imóveis que pela sua envergadura e valor simbólico que encerram em si mesmos são merecedores de projectos de recuperação, de forma a
que, mantendo a sua traça original, possam ser
revitalizados através da instalação de comércio,
serviços ou equipamentos de uso público.
Avis irá dispor de uma oferta cultural ainda mais
enriquecida com a criação do Centro de Estudos
Arqueológicos e do Centro Interpretativo da Ordem de S. Bento de Avis, que irão dedicar-se ao
aprofundamento dos estudos dos respectivos
elementos históricos, bem como o Fórum Cultural, que se prevê avançar ao longo do actual
Quadro de Referência Estratégica Nacional, no
âmbito do qual foram já apresentadas diversas
candidaturas, no plano imaterial, em conjunto
com outros agentes e entidades europeias.
68
AA - De que forma é que o património natural
do Concelho de Avis é importante e qual o papel
da autarquia na sua preservação?
BTT em Avis
MC - O Concelho de Avis tem o privilégio
de dispor de um património natural único,
caracterizado pela diversidade da fauna e da
flora, existindo um grande empenho na sua
preservação. Existem mesmo algumas áreas que,
pelas suas características, se encontram integradas na Rede Natura 2000.
A autarquia tem, sem dúvida, um papel muito
importante na preservação deste património,
não só através de intervenções directas e regulamentares mas também através de acções de sensibilização junto da comunidade e das entidades
locais, de forma a fazer delas agentes conscientes
da necessidade de protecção de algo que é de
todos.
O empenho na preservação ambiental valeu,
já este ano, ao Município de Avis a atribuição
do Galardão “ECO XXI” pela Fundação para a
Educação Ambiental em Portugal - Associação
Bandeira Azul da Europa, que traduz o nível de
reconhecimento das preocupações ambientais
e iniciativas desenvolvidas pelos municípios em
prol das boas práticas relativas às políticas de
sustentabilidade local, com especial ênfase para
a vertente da educação, no âmbito da implementação da Agenda 21 Local. O Município de Avis
foi o único Município do Distrito de Portalegre e
um dos dois da região do Alentejo a serem distinguidos, graças à avaliação do seu desempenho,
através de um conjunto de 23 indicadores de sustentabilidade, designadamente em áreas como a
Promoção da Educação Ambiental, a Participação
e Agenda Local 21, o Ordenamento do Território
e Ambiente Urbano, a Qualidade da Água para
Consumo Humano, População Servida por Sistemas de Abastecimento de Água, População
Servida por Sistemas de Drenagem e Tratamento de Águas Residuais, Valorização do Papel
da Eficiência Energética na Gestão Municipal e
Agricultura e Turismo em Espaços Rurais, entre
outros, com base na validação criteriosa da informação enviada àquela Associação, e constitui o
ponto de partida para o fortalecimento de acções
continuadas que visam a elevação da sua qualidade ambiental.
A preservação do património natural pressupõe
também a sensibilização para o seu valor, nomeadamente através do estreitamento dos laços
com o mesmo. Neste sentido, pode considerarse que os esforços desenvolvidos pelo Município de Avis no sentido de proporcionar uma
maior dinamização da Albufeira do Maranhão,
designadamente através da criação de infraestruturas de lazer e de apoio aos desportos náuticos
nas suas margens e da promoção de actividades
ao ar livre que beneficiam das características
locais para a sua realização, como é o caso de
provas BTT, constituem também medidas de salvaguarda desta imensa riqueza com que a natureza dotou Avis.
69
AA - Dada a situação estratégica, quais são as
perspectivas do Concelho a nível turístico, num
futuro próximo?
MC - Conforme tivemos oportunidade de afirmar
anteriormente, o turismo é, sem dúvida, uma das
maiores potencialidades do Concelho e uma das
áreas que merecerá um maior investimento num
futuro próximo, quer através de iniciativas públicas como privadas, sendo que o Município de Avis
continuará a tentar captar e apoiar novos investimentos privados nesta área, desde que baseados
em princípios de desenvolvimento sustentável.
O património histórico, a riqueza e beleza naturais, as actividades culturais, a gastronomia e os
desportos são alguns dos elementos que cativam
os turistas que não ficam também indiferentes às
infraestruturas criadas para que possam usufruir
em pleno daquilo que o Concelho de Avis tem
para lhes oferecer.
Ao longo dos últimos anos, em resultado da estratégia de promoção desenvolvida à escala das
possibilidades da autarquia e à constante melhoria da oferta, tanto em termos de infraestruturas
como a nível de alojamento, temos assistido ao
crescimento do número de turistas que visitam e
escolhem Avis como destino de férias.
Espera-se que a curto-médio prazo, a oferta
turística do Concelho, aliada ao aumento da capacidade de alojamento e à continuação de uma
estratégia concertada de promoção, contribuam
para um maior aumento da procura mas sobretudo para o reconhecimento da qualidade da
oferta. Não se pretende apostar no desenvolvimento de um turismo de massas mas sim num
turismo de qualidade, adaptado à capacidade de
alojamento do Concelho, mas que seja capaz de
garantir uma taxa de ocupação elevado ao longo
de todo o ano, tendo como principal objectivo
a satisfação dos turistas, para que regressem e
partilhem a sua experiência positiva com outras
pessoas, pois essa é a melhor forma de divulgar
aquilo que temos para oferecer.
Igreja Matriz
vii jogos florais da alma alentejana - 2007
MODALIDADE QUADRA
1.º prémio
Gabriel Raminhos
(concorreu sob o pseudónimo Realista)
Há quem do pouco que almeja
Partilhe sempre o que tem...
Mas, muitos, do que sobeja,
Nunca dão nada a ninguém!
Modalidade POEMA
1º. prémio
José da Silva Máximo
(concorreu sob o pseudónimo Saudoso)
O Meu Lápis
Tenho um lápis com que faço
Dos meus versos um borrão;
É um grande amigalhaço
Em qualquer ocasião.
Tenho pena de gastá-lo
Por ser tão meu amiguinho;
Sempre que vou afiá-lo
Perco dele um bocadinho.
70
Os golpes que já lhe dei,
Sen queixas foi suportado;
Nada me diz, mas eu sei
Que aos poucos o vou matando...
De cada vez que o seu bico
Se desfaz na minha mão,
Eu confesso, bem que fico
Sofrendo por compaixão.
Era esbelto, era fino,
Escrevia com perfeição;
Agora é tão pequenino
Que nem o acho na mão.
Sempre que nele pegava
Fazia quadras bem feitas;
Era ele quem me ajudava
A fazer rimas direitas.
Tenho de o abandonar
Tão reduzido ele está!
Já deu o que tinha a dar,
Já deu tudo, mais não dá!
Deu o seu todo escrevendo;
- Muitos versos escreveu!
Pouco a pouco foi morrendo,
Foi p´ra isso que nasceu!
É o fim que tudo tem
Desde que no Mundo entre;
Qualquer dia vou também
Atrás do lápis p`ra sempre!
Quando isso acontecer,
Após chegar o meu fim,
Fiquem os versos p`ra ler,
Feitos por ele e por mim!
MODALIDADE CONTO
1.º prémio
José António Claro Nunes
(concorreu sob o pseudónimo Arlindo Fragoso)
Variações em Ré Menor
Ouça, caro amigo jornalista, eu percebo bem
a sua crucial função e sempre a favor da liberdade de imprensa, mas far-me-á o obséquio
de pedir ao distintíssimo fotógrafo que o
acompanha para não desgastar a máquina á
Animação nos VII Jogos Florais
(a rapariga ucraniana que ele colocou a aviar
ao balcão, uma amazona com os seios em forma de pêra, sob o chamariz de mais dois dedos de conversa, induz qualquer mortal a
reincidir naquela mistela).
Na verdade, vendo poucos diários desportivos, agora, no meu modesto quiosque, derivado quer ás edições electrónicas, quer ás
exibições apagadas da equipa do Benfica, e o
preço do tabaco parece acompanhar a cadência galopante do barril do petróleo, vá-se lá
estabelecer uma qualquer conexão macroeconómica, motivo pelo qual o que me vai
ainda valendo são as peripécias da vida amorosa da senhorita Elsa Raposo, Deus a conserve por muitos e bons anos, estampada nas
revistas cor-de-rosa.
(o repórter caríssimo ponha-se a pau,
que se o seu estimado periódico começar a
ganhar a vidinha, na TV Sete Dias, a escrever
manchetes, para gáudio dos leitores, sobre a
saúde dos canídeos de alguma vedeta do jet
quatro).
Ao final da tarde, o enredo imutável de ver a
Suzete – com uma reformazita que só dá tropeçar em tudo quanto é cadeira e a não conseguir escamar um barbo sem pôr em risco o
reduto precário das falanges.
- Vale bem a pena andar a fazer o tratamento
de laser!
Deixe-me, enfim, retirar uma senha, dá para
perceber que há outras dezenas de colegas de
infortúnio, quiçá médicos, engenheiros, advogados, muita gente da alta, isto de modo a enviar que algum deles dê um golpe nesta fila
para o atendimento, onde é que eu ia no meu
raciocínio? ah, sim, não temos filho algum que
nos possa valer, uma vez que a nossa Ana Paula faleceu nos idos de 1985, num acidente rodoviário.
71
conta deste meu rosto engelhado.
(até um quase septuagenário tem
ainda uma pontinha de vergonha, mesmo
nestes tempos de crise).
porque não julgue que se toma uma resolução destas como quem emborca um traçado
na tasca do Olegário, está longe de ser semelhante coisa.
tura da malha e a permitir um aumento do
escoamento do humor aquoso.
E eu, amigo jornalista, ciente que a sobrinha
da Clotilde, que vive na Rua dos Remédios,
havia recuperado quarenta por cento da
visão, num hospital de Havana, quando aqui,
neste rectângulo á beira-mar encalhado, consideravam que o caso estava perdido, ponhase no meu lugar, a fzer aritméticas de elástico
repuxado para prolongar o dinheiro do dia-adia, sabendo também que se não ligasse o número da Cofidis nenhuma outra instituição da
praça me emprestava um cêntimo para a viagem, compreende, e a precisar de mais algum
pecúlio extra, por causa das despesas de estadia em Cuba.
(pouco outro temos de nosso e de
que nos possamos desfazer).
Já a entrar em desespero, virei-me para as
duas guitarras que o meu saudoso tio Fernando me deixou em legado, omnipresentes na
72
(foi nessa altura que a Suzete, na sequência de um período de depressão nervosa, descobriu, ao afectuar uma bateria de exames, que era diabética)
o glaucoma a apoderar-se de ambas as vistas
da Suzete, a princípio de uma forma sibilina
- Já não vejo bem para conduzir de noite...
para a frente, vá que não vá... Mas de lado...
para, ultimamente , em guerra declarada, lhe
estreitar cada vez mais o campo visual, sem
condescendências, de tal sorte que a reputada especialista do Hospital de Santa Maria,
verificando que a pressão intra-ocular continua a aumentar de forma inexorável,
Afiançou, tano quanto se pode descodificar a
partir do hamurabi do vocabulário médico,
que a perda visual causada pelo glaucoma
será irreversível e está por dias a cegueira dos
dois olhos
- Receio, dona Suzete, que a trabeculectomia
laser não esteja a conseguir estimular a aber-
Entrega de prémios
vez, a confiar ao prestamista as guitarras.
(o qual, estou certo, nem quererá saber do facto de estar a avaliar as cúmplices da
voz timbrada da Baté, que era como o meu tio
carinhosamente tratava a senhora dona Maria
Teresa).
Raios me empisquem se alguma vez consegui
distinguir o bordão de primas do bordão de
toeiras, há quem chame terceiras ás toeiras,
são demasiadas cordas, os tornozelos da Suzete a embirrem com a mesinha do hall de entrada, numa profusão de cacos e vidros, depois com a porta do frigorífico, e eu, cheio de
vergonha, comprieende, embora caixas dos
instrumentos, a rezar a Santa Bárbara para
não topar com nenhum cliente do quiosque e
a aguardar pela minha vez, nesta fila.
(já só tenho cinco companheiros á
minha frente)
Apenas lhe peço, caríssimo, que respeite o
meu anonimato na reportagem a publicar e
que solicite ao amigo fotógrafo que se desinteresse da minha carantonha, posso até, quem
sabe, retribuir o favor, apresentando-lhes a rapariga ucraniana da tasca do Olegário, com
outro vagar, com outra esperança, com outros
modos, na volta de Cuba.
73
prateleira da sala com o seu ar patusco de fidalguia, algo que jamais pensara alienar e que
teria dado ainda em vida, á Ana Paula, se ela
se encontrasse entre nós
- Tu não ponhas as guitarras no prego por
minha casa, Armindo!...
em bom rigor, nunca consegui distinguir o
bordão de primas do bordão de toeiras, nem
afiná-las convenientemente, estavam sem uso
adequado, mas estas guitarras que ora
carrego, caríssimo jornalista, acompanharam
em tempos a senhora dona Maria Teresa de
Noronha, quando ela actuava, na Emissora
Nacional, no programa apresentado por D.
João da Câmara, emagine só o meu tio, com
um ar concentrado e a careca luzidia, a dedilhar as notas do `Nossa Fado` ou do `pombalinho`, suponho que conheça esses temas.
(verifico que o prezado fotógrafo que
o acompanha, pela sua t-shirt, é mais fã dos
Xutos e Pontapés).
A Suzete a tropeçar em cada degrau da Escadinha dos Remédios, a chocar toda patareca
contra um agente da PSP, que por sorte a conhecia dos tempos das limpezas, em pleno
Campo das Cebolas, e eu, que quando posso
deixo o filho da vizinha a tomar conta do
quiosque, sem outra solução senão a de lhe
dar a mão como um imberbe assolapadamente enamorado, aquilo em que nos tornamos,
não é verdade? , mas já decidido, decidido de
Desenvolvimento
Fernando Santos
Carlos Sezões
Fórum Alentejo 2015
Por uma Região da nova geração
O Fórum Alentejo 2015 é um movimento informal
de cidadãos, de carácter geracional, que procura
mobilizar jovens Alentejanos para os desafios do
desenvolvimento sustentável do Alentejo, nas
suas diversas vertentes económicas, sociais, ambientais e culturais.
a nossa missão
O Fórum Alentejo 2015 pretende promover a
informação, o debate e a discussão sobre os
problemas estruturantes, estratégias de desenvolvimento e iniciativas concretas para esta
Região, na consciência de que este é um momento determinante para o sucesso das actuais
e futuras gerações.
74
Visão estratégica
Pretendemos contribuir para o desenvolvimento
de uma visão estratégica a 10 anos, pensando
sempre no longo prazo e não em perspectivas
efémeras, imediatistas e tradicionalistas. Este
fórum será o catalizador desta visão, contribuindo com Conhecimento, Inovação, Competências
e capacidade de Comunicação e Mobilização de
vontades e esforços.
objectivos do fórum alentejo 2015
- Promover o debate e o conhecimento das
questões estratégicas do desenvolvimento junto
da população do Alentejo;
- Facilitar consensos e influenciar decisores sobre
as opções estruturantes da região;
- Formar futuros quadros dirigentes e gestores
que possam, com as competências adquiridas,
contribuir para um melhor aproveitamento das
nossas vantagens competitivas.
organização de eventos
conferências temáticas já
realizadas
“O Alentejo na Europa – 20 anos depois”
“Empreendedorismo no Alentejo: criar e inovar!”
“Por um Turismo de Excelência no Alentejo”
“Tecnologias e Teletrabalho – uma nova oportunidade de desenvolvimento!”
“Desafios e Oportunidades do Alentejo Cultural”
Conferência organizada em Évora sobre 20 anos do Alentejo na Europa
o que nos preocupa
- Passados 20 anos sobre a adesão de Portugal
à CEE, decorridos 3 Quadros Comunitários de
Apoio, investidos muitos milhões de Euros, a
região Alentejo continua longe do nível de vida
das regiões mais desenvolvidas da União Europeia.
- O Alentejo está em perda demográfica desde
meados do século passado, tem uma população
cada vez mais envelhecida e o mais preocupante
é que não consegue reter a população mais jovem
e mais qualificada, hipotecando o seu futuro.
- A história e a geografia não podem continuar a
ser desculpas …
- Num contexto global em que as regiões com-
petem e/ou cooperam umas com as outras, que
assumem as suas próprias estratégias de desenvolvimento adaptadas às suas necessidades e
potencialidades, que reforçam a sua autonomia e
capacidade de intervenção, o Alentejo continua a
ter dificuldades em definir o seu rumo.
que desafios se colocam ao modelo
de desenvolvimento regional
- Ter UM PROJECTO DE DESENVOLVIMENTO DO
ALENTEJO, em vez de ter muitos projectos de
desenvolvimento dispersos pelo Alentejo.
- Integrar as dimensões de sustentabilidade e inovação no modelo de desenvolvimento.
- Dar prioridade ao capital humano e capital social
em relação ao capital físico.
- Assumir uma governação regional mais autónoma, mais capacitada e mais articulada.
75
a sua existência, missão e
objectivos baseiam-se nas
seguintes premissas
- Forte preocupação sobre o futuro da região e
sobre a necessidade de caminhar para um novo
modelo de desenvolvimento.
- Vontade de contribuir de forma activa para um
debate aberto, construtivo e participado sobre os
desafios que se colocam à região.
que alentejo queremos em 2015
- Queremos um Alentejo com um território mais
atractivo, com sectores de actividade mais competitivos, com recursos humanos mais qualificados, com populações com melhor qualidade de
vida.
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- Queremos um Alentejo com mais emprego,
melhor para investir, que aposte na inovação e
na criatividade, que seja um mosaico de destinos
turísticos de qualidade, que se adapte a mundo
global que premeia a capacidade de planear e
agir com audácia e irreverência.
- Queremos ter um novo regionalismo activo
no Alentejo, que defenda os interesses e necessidades da Região, que valorize a identidade e a
cultura como factores de mobilização, que permita criar vozes e lideranças para uma Região que
quer um melhor rumo para o seu futuro.
- Queremos um modelo de desenvolvimento
regional sustentável que permita ao Alentejo
caminhar para um futuro mais próspero, com
mais oportunidades para os seus cidadãos e que
possa atingir o rumo da convergência europeia
em matéria de qualidade de vida.
- Queremos um Alentejo que se afirme enquanto
região de excelência, que valorize os seus recursos, os seus territórios, as suas identidades, as
suas dinâmicas económicas, os seus agentes e as
suas populações.
- Queremos uma região Alentejo que contribua
para o desenvolvimento de Portugal, que produza riqueza, que crie empregos, que se afirme num
todo nacional em que a união das diversas realidades regionais e metropolitanas, traga mais coesão, melhor competitividade e maior sustentabilidade.
actividades desenvolvidas
MARÇO
18 e 19 – apresentação da Peça “Alentejanos
de Todo o Mundo”, no salão da Cooperativa
Piedense
24 a 27 – Fim de Semana Alentejano no Centro
Cultutal e Recreativo do Alto do Moinho, com exposição e venda de produtos alentejanos e actuação do Grupo de Cavaquinhos e de Cantadeiras
da Alma Alentejana
8 e 16 – Integrado nas comemorações do “Dia
Internacional da Mulher” actuação do Grupo de
Cavaquinhos e das Cantadeiras da Alma Alentejana e exposição de trabalhos dos utentes desta
associação
31 -Apresentação do 25.º Boletim informativo da
Alma Alentejana
28/29/30 – Fim de Semana Alentejano na Junta
de Freguesia da Charneca da Caparica, com exposição e venda de produtos Alentejanos, animação cultural com Grupos Musicais, de Musica
Popular Portuguesa e actuação das Cantadeiras e
de Cavaquinhos da Alma Alentejana
77
JANEIRO
FEVEREIRO
24 – Integrado nas comemorações do 80º. Aniversário da Junta de Freguesia da Cova da Piedade actuação do Grupo de Cantadeiras e de
Cavaquinhos da Alma Alentejana.
ABRIL
6 – Visita cultural a Avis e actuação do Grupo das
Cantadeiras e de Cavaquinhos da Alma Alentejana
das Barreto”
31 DE MAIO e 1 DE JUNHO – Fim de Semana no
Clube Desportivo de Vale Flores, com exposição
e venda de produtos alentejanos e actuação do
Grupo de Cantadeiras e de Cavaquinhos da Alma
Alentejana
JUNHO
20 – Visita cultural a Castro Verde com actuação
do Grupo de Cavaquinhos e de Cantadeiras da
Alma Alentejana na Aldeia de Sete e Almeirim
27 – Visita cultural a Almodovar com actuação
do Grupo de Cantadeiras na Igreja Matriz e de
Cavaquinhos da Alma Alentejana
MAIO
78
1 – Participação na “Festa da Maia” a convite
da Junta de Freguesia da Cova da Piedade, com
decoração do Coreto e confecção de doçaria alusiva a esta festa
5 A 12 – Férias de um grupo de utentes da Alma
Alentejana na Fundação Bissaya Barreto na Torreira – Ovar
6 – Participação da Alma Alentejana no concurso
de doçaria da ARPILF – Assoc. Reformados Pensionista e Idosos do Laranjeiro e Feijó
25 – Visita cultural a Alqueva
30 – Lançamento do livro “Horizontes da Poesia”
de Euclides Cavaco e Noite de Fados no Centro de
Dia do Pragal
31 – Preparação dos VIII JOGOS FLORAIS da Alma
Alentejana, este ano tendo como Patrono “Kali-
21 – Integrado no 21º. Encontro de Cantares
Alentejanos promovido pelo Clube Recreativo
do Feijó, actuação do Grupo das Cantadeiras da
Alma Alentejana
27 a 6 – 10ª. Feira Alma Alentejana, na Escola
D.António da Costa em Almada, com exposição
e venda de produtos alentejanos e animação cultural diária de Grupos Corais e Musicais do Alentejo e alguns da Margem Sul
actividades a desenvolver
JULHO
SETEMBRO
9 – Integrado na Semana Cultural do Laranjeiro
realização de colóquio com Prof.Dr. Manuel Carrageta sobre saúde e dieta mediterrânica.
9 – Visita à VI Feira Agropecuária Transfronteiriça
de Vale do Poço – Mértola
26 – Concerto de Musica Lirica no Centro de Dia
do Pragal, a partir das 21, 30 horas
12, 13 e 14 – Participação nas Festas em honra de
Nossa Senhora da Piedade, a convite da Junta de
Freguesia, com exposição e venda de produtos
alentejanos e actuação do Grupo de Cantadeiras
e de Cavaquinhos da Alma Alentejana
JULHO
– Em data a definir lançamento da 21ª. Revista
Cultural da Alma Alentejana em Avis.
19 – Espectáculo do Orfeão Universitário do Porto, na Sociedade Musical Trafariense a partir das
21,30 horas e a actuação do Grupo das Cantadeiras da Alma Alentejana
19 – Participação na Festa Amarela promovida
pela Câmara Municipal de Almada, com fornecimento de refeições, exposição e venda de produtos alentejanos e actuação do Grupo das Cantadeiras e de Cavaquinhos da Alma Alentejana
20 – Visita cultural a Almodôvar com actuação do
Grupo das Cantadeiras e de Cavquinhos da Alma
Alentejana
OUTUBRO
12 – Encerramento dos VIII Jogos Florais com cerimónia de entrega de prémios e animação cultural na Sala Pablo Neruda do Forum Municipal
Romeu Correia, em Almada
17 – Colóquio sobre saúde no Centro de Dia do
Laranjeiro cujo tema será a diabetes
31 – Lançamento do Boletim Informativo da Alma
Alentejana nº. 26.

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