Boletim 03

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Boletim 03
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foco
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• RESENHA
Administração da vida, redesenho de relacionamentos
(Reengenharia do tempo, de Rosiska Darcy de Oliveira)
Rosa Gens
• FICÇÃO
À espera...
Osmar Soares / MESTRANDO (TEORIA LITERÁRIA)
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Virginia Woolf preenchendo “As Horas”
Luiz Fernando Costa / ALUNO DA GRADUAÇÃO
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• INFORMATIVO
• NA CAIXA POSTAL
Últimos lançamentos literários de autoria feminina
Colaboração de alunos da Fac. de Letras
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• PERSONALIDADE EM FOCO
Entrevista com Ana Maria Machado
Por Ana Crélia Penha Dias dos Santos / MESTRE EM LIT. BRAS./UFRJ
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Angélica Soares / Elódia Xavier (COORDENADORAS DO NIELM)
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Esperamos poder contar, como neste número, com
nossos colaboradores para o próximo Nielm em Foco.
Agradecemos sua matéria e sugestões, na sala D-217, da
Faculdade de Letras da UFRJ, ou pelo endereço eletrônico
[email protected] .
Nesta Edição
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Este número homenageia, de forma especial, a escritora
Ana Maria Machado, recentemente empossada, na Academia
Brasileira de Letras e já reconhecida internacionalmente, pelo
prêmio Hans Christian Andersen em 2000.
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No empenho de levar adiante nosso projeto
de integrar, em um veículo de divulgação, a
participação de alunos e de professores,
DITORIAL
pesquisadores vinculados ao Núcleo Interdisciplinar de Estudos sobre Mulher na Literatura, lançamos o nosso
Boletim nº 2. Permanecemos antenados com temas relevantes e
acontecimentos recentes, de interesse para os que se dedicam às
questões literárias relacionadas à condição da mulher.
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Ano III • Nº 2
Faculdade de Letras/UFRJ
Rio de Janeiro
5 de abril de 2004
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NIELM
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BOLETIM INFORMATIVO
DO NÚCLEO
INTERDISCIPLINAR DE
ESTUDOS DA MULHER
NA LITERATURA – NIELM
• EM DESTAQUE
Mulheres na Academia Brasileira de Letras
Débora Carvalho Capella / ALUNA DE GRADUAÇÃO/FL
“COSTUREIRAS” / TARSILA DO AMARAL,S.D.
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Boletim Informativo do Núcleo Interdisciplinar de Estudos da Mulher na Literatura – NIELM
r e s e n h a
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Administração da vida, redesenho de relacionamentos
Rosa Gens / PROFESSORA DE LITERATURA BRASILEIRA - UFRJ
de Rosiska Darcy de Oliveira,
A obra
Reengenharia do tempo, perten-
cente à série “Idéias contemporâneas”, da
Editora Rocco, veio a público em julho de
2003, tendo sido recebida com textos
críticos, resenhas e comentários que levantavam questão sobre suas propostas.
É certo que o nome da autora desperta a
atenção quando na capa de uma obra.
Afinal, tem credibilidade, sustentada por
vasto currículo de participação e pensamento na esfera de reflexão sobre a mulher. Ex-presidente do Conselho Nacional
dos Direitos das Mulheres, participante de
inúmeras atividades que giram em torno
do assunto, ela é referência brasileira nos
debates sobre a condição feminina.
A presente obra já se prenunciava
na anterior, publicada em 2001, também
pela editora Rocco: Outono de ouro e sangue, reunião de crônicas que se marcava
pela valorização das pequenas coisas da
existência, de elementos aparentemente
banais que confluem para obter a felicidade, se devidamente valorizados. A senda
era muitas vezes ficcional; a reflexão
derivava-se de episódios, que funcionavam como deflagradores de um pensar
sobre determinados eixos. Em seu Reengenharia do tempo, prolonga-se tal atitude,
e a obra ganha em sedução para o leitor,
ao mesclar pesquisa e reflexão sobre a
atualidade através de um discurso em que
a literatura também ganha o seu lugar. O
livro apresenta-se dividido em sete capítulos, habilmente estruturados, introduzidos
por epígrafes certeiras, e o leitor pode-se
perguntar que espécie de livro é este, que
tangencia a auto-ajuda e transita entre a
filosofia e a sociologia.
O tempo é o vetor do texto, e, ao ser
articulado, faz com que muitos outros
elementos sejam capturados e pensados.
A autora parte da imagem “ganhar a vida”
para tentar redimensioná-la, a partir de
dados estatísticos, citações de autores,
pensares confluentes. O foco é lançado
sobre mudanças ocorridas, nas últimas
décadas, não só em relação ao comportamento das mulheres, mas à sociedade
como um todo. Ressalta que a vida privada, há cerca de três décadas, era o
domínio da mulher, cabendo ao homem
apenas sustentá-la, torná-la possível.E
chama atenção: se antes às mulheres não
era permitido trabalhar fora de casa, agora
a permissão guarda em seu bojo a idéia
de que a vida privada não deve resvalar
para a pública. A interferência do pessoal
não se permite, como se a vida familiar
não fizesse parte da vida em geral; pertencesse a um universo paralelo.
Na verdade, a autora aponta para
uma espécie de armadilha em que as
mulheres teriam caído – ou pulado, ou
ainda mesmo, criado – ao buscarem um
espaço fora da casa. Estariam fadadas a
ocultarem a vida, para que pudessem
concretizar aspirações individuais. Seu
papel na esfera pública se modificou, mas
não foi acompanhado de reorganizações
relevantes. A autora propõe, continuamente, uma melhor articulação entre trabalho
e vida privada. Outras dinâmicas tornamse imperativas, para que a educação de
crianças e jovens, bem como a acolhida
de idosos, não sejam deixadas de lado. E
enfatiza a idéia de que a rede social reage
– aceita a mudança configurada pelas
mulheres desde que não mexa com o
tecido social como um todo.
O movimento de reorganizar pressupõe, antes de tudo, consciência, necessária à própria dinâmica de se apropriar
dos elementos a serem mexidos. A autora, ao insistir na mudança, em que todos
tenham direito ao trabalho, à vida privada
e ao convívio familiar, bate na tecla dos
elementos principais para obtê-la:ousadia
e criatividade. No fundo, investimento na
qualidade de vida, e dar-se ao luxo de ter
prazer com a vida e aproveitar o tempo da
melhor maneira possível. Rosiska par-te
de pesquisas, pinçando exemplos de
outras sociedades, para ilustrar a urgência
do redimensionamento do cotidiano de
homens e mulheres. A reorganização do
cotidiano é tarefa complexa, e deveria
envolver toda a sociedade, alinhada na
concepção de que o tempo é a matériaprima da vida e muito preciosa para ser
desperdiçada.
Resta a grande pergunta: como conseguir tal reengenharia? Não há uma única resposta, nem poderíamos cobrá-la da
autora, que começa por sugerir que às
mulheres caberia negociar o tempo à vida
privada e às empresas a criar condições;
que se deve andar na contramão do sistema de produção regular e fazer escolhas
sintonizadas com a liberdade. É preciso
arriscar-se, aventurar-se, para quebrar as
amarras das sociedades de mercado, que
minimizam o que não tem preço, quando
lhe deveriam dar valor máximo.
Reengenharia do tempo, além de dar
continuidade ao volume anterior da autora,
traz ecos de suas outras obras, em que a
questão do gênero, da estrutura social,da
liberdade, da criança e da escola são
recorrentes. Eivado de termos da cultura
empresarial, o livro caminha sem pressa,
como espelhando o seu conteúdo. Pensamento sobre pensamento, numa estratégia
de superposição, em que a “arte de viver”
é comentada e repensada.
Talvez o melhor da obra, com seu
discurso sedutor, resida na possibilidade
de levar a sociedade a pensar em temas
como tempo e vida, encaminhando uma
ruptura com a mentalidade produtivista.
Aqui, o efeito Rosiska: provocar pensares.
E, ao ler Reengenharia do tempo, talvez
possamos até acreditar em um redesenho de relacionamentos, da maneira
de usar a vida e aproveitar as horas, nessa
nossa época pós-utópica.
Rosiska Darcy de Oliveira, em entrevista recente.
NIELM EM FOCO – Nº 2
ficção
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i n f o r m a t i v o
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Virginia Woolf preenchendo
“As Horas”
Luiz Fernando Costa / GRADUANDO (PORTUGUÊS-INGLÊS)
deline Virginia Stephen, ou melhor, Virginia Woolf (após o casamento em
1912) nasceu em Londres, 1882. Teve uma vida amorosa conturbada,
A
visto que sofria abusos de seu meio-irmão de vinte anos, ainda com a tenra idade
“CORES DA MELODIA” / ADÉLIA SARRO,S.D.
A mulher que acabou de perder
A mulher do conto levou um.
A mulher do conto gemeu de dor e indignação.
A mulher do conto que Laura escreve levou um tapa
e outro tapa e um chute um soco. Ela está agora de
ponta-cabeça, está nas folhas da máquina de escrever
e ao colo, claro, à tarde quando o Gérson sai pra
trabalhar – ele não gosta do barulho e a mulher do conto
gerada como todas as mulheres, à tapa e Laura dará
forças à mulher uma metonímia de sangue pisado. Ela
está agora no chão, enquanto o algoz vai encontrar-se
com os companheiros no bar. Laura vai matar o algoz.
Espera-se que termine de escrever, antes que Gérson
chegue e se saiba o final do conto. E para terminar o
conto, Laura espera que o mundo mude. O sangue vai
continuar pisado e a dor daqui a pouco passa à pia ou
ao fogão: e o mundo vai mudar? A mulher do conto está
à espera. Laura está à espera. Laura, se terminar logo
de escrever não vai levar soco, nem tapa, ela ainda tem
tempo até as sete quando o Gérson chega. Mas tem a
comida, ele não quer mais comer comida de restaurante
Ela quer escrever e esperar o mundo mudar... Esperemos
ou o algoz virará anjo.
Osmar Soares / MESTRANDO (TEORIA LITERÁRIA)
de seis; o que agüentou, silenciosamente, até os vinte e dois anos. Talvez isso
tenha despertado a sua atenção para o mesmo sexo.
Algumas vezes se apaixonou perdidamente por mulheres, mas os romances
ficavam num nível etéreo, uma não realização carnal. Porém, com 40 anos se
encantou por Vita Sackville-West, uma rica escritora lésbica de 30 anos, que
morava em um belo castelo. Foi a única vez em que concretizou fisicamente um
amor homossexual, que durou cinco anos.
Neste período, publicou seus melhores romances “Mrs. Dalloway”, “As
Ondas”, “O Farol” e “Orlando”, que curiosamente, se passa também em um castelo.
O próprio marido de Vita declarou que “Orlando” era “a mais comprida e charmosa
carta de amor da história”.
Mudou-se para o mesmo bairro londrino em que moravam T. S. Eliott,
Bertrand Russel entre outros. Com o marido Leonard Woolf, fundou a editora
Hogarth Press. A partir de 1915 começou a publicar suas obras, cuja principal
inovação era o uso de técnicas como monólogos interiores e relações entre o
tempo da consciência e a percepção do tempo real.
“Mrs. Dalloway” foi interpretada como autobiográfica pelo escritor Michael
Cunningham e serviu de fio condutor para o seu aclamado romance “As Horas”
de 1999. Este livro foi adaptado para o cinema o pelo diretor Stephen Daldry (de
“Billy Elliot”) e chega agora às locadoras em dvd e vídeo. O filme acompanha um
dia na vida de três mulheres em tempos e lugares diferentes. Em vinte e quatro
horas, gestos como preparar uma festa ou pôr flores num vaso podem dar a
significação de uma vida inteira.
Uma dessas mulheres em crise é a própria Virginia Woolf (Nicole Kidman)
que escreve os capítulos finais de “Mrs. Dalloway”. A outra é Laura Brown (Julianne
Moore) que vive a pseudo-esposa feliz de um casamento perfeito na Califórnia de
1951. A terceira é Clarisse Vaugh (Meryl Streep) que tem o nome da personagem
principal de “Mr. Dalloway” e o sobrenome de um antigo “affair” feminino de Virginia
na vida real. Das três, Clarissa é a única que compra ela mesma as flores para a
festa que prepara; o que mostra, sutilmente, que, por viver uma lésbica bem-sucedida
na Nova York de hoje, tem uma constituição mais livre. A estória se desenrola até o
ponto em que há uma interseção e um final diferente do usual.
No filme, assim como na vida, Virginia Woolf sofria de depressão severa. Em
1941, sentindo sua criatividade em decadência, deprimida pela guerra e aterrorizada com a recorrência de sua doença, suicidou-se nas águas do rio Ouse, próximo a
sua casa em Sussex,
em 28 de março, com
os bolsos cheios de pedras. Deste modo, parou de pulsar uma mente feminina brilhante,
que modificou o mundo
para sempre.
Cena do filme
“As horas”
AMARAL, Maria Adelaide. Estrela nua; amor e sedução. (Coleção Amores Extremos). RJ: Record, 203.
AVERBUCK, Clarah. Das coisas esquecidas atrás da estante. RJ: 7 Letras, 2003
.
NA
CAIXA
POSTAL
SEIXAS, Heloísa. Sete vidas – sete contos mínimos de gatos. SP: Cosac & Naify, 2003.
Infanto-Juvenil
CUNHA, Helena Parente. Marcelo e seus amigos
invisíveis. SP: Global, 2003.
_______________. Outros bichos. RJ: Scipione, 2003.
MARTINS, Georgina. Todos os Amores. RJ: DCL, 2003.
MIGUEZ, Fátima. Paisagens da infância. RJ: Zeus, 2003.
Escreva para o NIELM: [email protected] . Contamos com sua colaboração.
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Boletim Informativo do Núcleo Interdisciplinar de Estudos da Mulher na Literatura – NIELM
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BRASILEIRA /UFRJ
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LITERATURA
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MESTRE EM
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Entrevista
concedida a Ana
Crélia Penha
Dias dos Santos
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Ana Maria Machado
ESCRITORA
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PERSONALIDADE EM
FOCO
Nielm: Para começar, como representante estudante da Universidade
Federal do Rio de Janeiro, gostaria que você falasse um pouco da
sua experiência naquela casa e da sua carreira de um modo geral.
Ana Maria Machado: Eu sou cria da UFRJ, da época em que ela
ainda se chamava Universidade do Brasil. Eu entrei em 1960, no
curso de Geografia, fiz um ano. Tinha escolhido um vestibular que
não tivesse Latim nem Matemática. Lá para outubro, eu não
agüentava mais estudar aquelas coisas; tranquei matrícula, tentei o
vestibular para fazer Letras Neolatinas e meu primeiro emprego foi
como professora de Latim, por ironia. Meu curso de Letras foi de 61 a
64. Comecei na Avenida Antônio Carlos. Depois viemos para o prédio
onde é o anexo da Academia hoje. Quando a Faculdade foi para a
Avenida Chile, já estava formada e fui para lá dando aula. Trabalhei
com Afrânio Coutinho na cadeira de Literatura Brasileira e com
Augusto Meyer na de Teoria Literária, em 68 e 69. Fiz especialização
em Literatura Espanhola com o Prof. José Carlos Lisboa, também na
UFRJ, em uma época em que estavam começando os cursos de
pós-graduação. Quando formada a pós-graduação, esse curso foi
considerado como Mestrado, porque nós tínhamos feito até
monografia. Então, eu fui aceita para fazer o doutorado com Afrânio
Coutinho. Comecei em 69, já tinha até escolhido o assunto, que era
Guimarães Rosa, mas, no comecinho de 70, fui para o exterior, por
problemas políticos; afinal, 69 foi um ano muito complicado. Quando
fui, já levei a obra do Guimarães Rosa toda fichada. Acabei terminando
em Paris, com Roland Barthes, já na cadeira de Lingüística, no Centro
de Comunicação da Escola Prática de Novos Estudos Sorbonne.
Enfim, para ser bem objetiva, essa é a minha formação.
N: Você já começou a falar de Roland Barthes. Que outras leituras
compuseram esse seu itinerário, os autores decisivos.
AM: A minha formação foi muito mais na área da Estilística; o
Estruturalismo entrou depois. O primeiro momento era Damaso
Alonso, Carlos Bousoño, Léo Spitzer; na Teoria Literária, o Wellek e
Warren. Quando começou o Estruturalismo, li os clássicos,
começando pelo Lèvi-Strauss, Todorov. Quando cheguei na França,
em janeiro, não sabia ainda onde me encaixar, porque estávamos no
meio do ano letivo que ia até junho; então, entrei como ouvinte nas
turmas de vários deles. Tinha muita vontade de estudar cinema, então
fiz o curso Christian Metz, que foi muito bom porque eu também
pintava e o Metz tinha uma percepção muito interessante da
linguagem visual. No ano seguinte, fiz minha inscrição no curso do
Barthes, para seguir um grande seminário que ele oferecia, que tinha
mais ou menos uns oitocentos alunos em um teatro grande, e desses
ele selecionava vinte pessoas para formar um núcleo de trabalho
que se encontrava duas vezes por semana e que trabalhava sobre a
tese. Fui selecionada e fiquei escrevendo sob a orientação dele.
N: Literatura para criança é o seu grande emblema... você acredita
que é ele ainda um gênero marginal ou não acredita nele como um
gênero específico?
AM: É difícil responder rápido a essa pergunta sem ser superficial.
Eu acho que existe um rótulo muito forte, mas não acho que ele tenha
intrinsecamente diferença. O substantivo é o mesmo: literatura. Agora,
é claro que tem especificidades. Falar nisso é tocar em muitas
sutilezas e não me arriscaria a responder tão rápido assim. Mas existe
uma diferença. O modo mais simples seria dizer que a literatura infantil
seria como a melodia assoviável e na literatura não-infantil, você tem
que entrar com a orquestra sinfônica inteira.
N: Falando sobre poder... tematizando o poder, até nas relações mais
arbitrárias, temos em suas obras o surgimento de algumas figuras,
algumas até femininas, que emergem com muita força. Uma figura
surpreendente é a Nita, de Bento que Bento é o frade, que questiona
todos aqueles discursos. Você acredita ainda na possibilidade de
força e resistência dessas figuras oprimidas, que podem ser a mulher,
a criança?
AM: Acredito, até porque escrevo isso, mas não é uma coisa prévia à
escrita. Quando se fala nesse assunto, eu reconheço, mas não é
algo em que eu tenha pensado antes. Acho que isso está muito mais
relacionado a uma trajetória autobiográfica do que especificamente
com um discurso preparado sobre isso.
N: É, e isso pode ser evidenciado em sua obra. As coisas acontecem
com mais espontaneidade em seu texto. Não parece haver articulação
para que alguns clichês tenham voz e vez. Isso acontece com a mulher,
a criança, tiririca, a cambaxirra. Eles parecem encenar questões muito
mais existenciais...
AM: Essa observação é boa, porque é aí que me reencontro. Por
exemplo, a educação da minha filha. Desde quando ela era muito
pequena, eu dizia: “Você tem que ter escolha. Não precisa fazer o que
todo mundo acha que você deve fazer; nem o que eu ou seu pai
achamos que você deve fazer.” Sempre acreditei na afirmação da
autonomia de cada um. Aí a gente volta ao Lobato. Eu sou
“Independência ou Morte”, independente de sermos meninos ou
meninas. Mas acho que só dá para ser autônomo quando há autonomia
financeira. Um dos maiores orgulhos de minha vida é que comecei a
trabalhar cedo e, desde então, sempre me mantive. Nunca dependi de
outra pessoa para pagar as minhas contas. Vivi período de intensa
dificuldade econômica, mas driblei sem a mesada ou o marido rico.
N: Você disse que sua formação foi em Estilística. Seus textos são ricos
em estruturas mnemônicas, jogos de palavras, uma sonoridade que
agrada às crianças. De que forma sua formação contribuiu para isso?
Ou é uma influência da tradição oral?
AM: A influência é direta e exclusiva da tradição oral. Não tem nada a
ver com Estilística. A Estilística entrou em minha vida porque era o que
estava em moda na Faculdade naquele momento, como depois foi o
Estruturalismo. Esse traço de minha obra não é um enfoque teórico. É
algo da minha história. Eu convivi em um ambiente em que havia uma
presença muito forte da literatura oral. A minha família contava histórias,
lendo ou oralmente. Eu não tinha idéia de que isso fosse fora do comum.
Eu achava que todas as famílias eram assim. Só muito depois, descobri
que isso não acontecia em toda casa. Contava-se história em minha
casa quase que diariamente, em diferentes contextos, com diferentes
contadores. Eu sei o estilo de cada contador e lembro histórias que
foram contadas por minha avó, por meu avô, por minha mãe, por minha
tia. Enfim, nós tínhamos muito forte o hábito de contar histórias, em
grande parte oralmente. A minha avó foi analfabeta até muito tarde.
Ela casou tarde, foi a segunda esposa do meu avô. Quando ela casou,
ele já tinha ficado viúvo e já tinha três filhos do primeiro casamento.
Casou já com 24 anos, o que já era tarde naquela época. Aprendeu a
ler com meu avô e eu ainda guardo os cadernos em que ela aprendeu.
Ela conseguiu, no máximo, escrever o nome, escrever uma receita.
Mas a aproximação dela com o mundo não se fazia por intermédio da
palavra escrita. No entanto, era uma pessoa sábia. Foi criada na roça,
tinha um repertório de histórias, de parlendas, de receitas, de
medicamentos caseiros, sabia fazer bordados, crochê, lingüiças,
receitas variadas; enfim, era uma pessoa que sabia fazer muita coisa.
Era um saber que não era o valorizado nas paredes cheias de livros,
mas que dentro de casa era. E ela exercia um certo poder por isso. Há
uma história que eu resgato para um de meus livros: ela tinha uma
saúde muito delicada, era diabética (descobriu isso muito cedo), e era
uma época em que eram recomendados os banhos de mar como
tratamento das doenças. Meu avô vivia procurando um lugar aonde
pudesse levar a vovó para tomar banho de mar. Ele era engenheiro e
estava abrindo a estrada de ferro Vitória-Minas, no Espírito Santo e
estava procurando um lugar para fazer um porto ao longo do litoral,
onde ele pudesse fazer a estrada de ferro desaguar para o porto. Ele
acabou escolhendo o lugar em que hoje é o Porto de Tubarão. Ele foi
de canoa pelo litoral para escolher esse local e acabou descobrindo
um lugarzinho de pescadores em 1922, que não servia para o porto,
mas que servia para ela tomar banho de mar. Alugou uma casa e foi
buscar a família em Vitória. Passaram dois meses lá. Ela gostou tanto
de lá, se sentiu tão à vontade com as mulheres dos pescadores, que
descobriu que havia uma casa à venda e ela achou que era alguma
coisa viável de ser comprada, não naquele ano, mas no seguinte, e ele
disse que era impossível, porque não havia dinheiro suficiente. Ela,
sabendo que era aquilo que ela queria, durante um ano, começou a
NIELM EM FOCO – Nº 2
fazer doces (cocada, pé-de-moleque, etc.) para meus
tios venderem quando o trem chegava na estação. Eles
entregavam a ela o dinheiro, que era guardado
literalmente em uma meia. No final de um ano, ela
entregou a meia cheia de dinheiro ao meu avô, dizendo
que era para comprar a casa. Quer dizer, alguém que
não tinha uma profissão, quis fazer alguma coisa e
resolveu que ia fazer. Essa foi sempre a maneira de
ela ser: uma atitude oral, prática, sem nenhum
intelectualismo, mas absolutamente forte nas atitudes.
Isso me influenciou muito.
festa para comemorar o fim da ditadura. Então a coisa
veio de trás para adiante. Não foi uma atitude deliberada de dizer, embora reflita minhas preocupações na
ocasião ou agora. Mesmo depois que a ditadura
acabou, eu discutia essas questões. Em Praga de
unicórnio, por exemplo, eu discuto o poder do síndico
no prédio, afinal ele é um grande ditador. Isso acontece
em várias de minhas obras, mas nunca por um projeto
engajado prévio.
N: E, falando nisso, podemos nos remeter à própria
Nita, de Bento que Bento é o Frade, que questiona o
discurso pronto, preestabelecido, reproduzido sem que
haja questionamentos. Ela transpassa os mundos, dos
Prequetés e do mutirão, até descobrir que a situação
inversa, o “tudo pode”, também não funciona. Sônia
Salomão Khede, num texto sobre o gênero Literatura
Infantil, diz que na década de 80 emergem textos em
que a criança rouba a cena, traz uma palavra de ordem.
A autora questiona até que ponto esse domínio levado
ao extremo não é também a inversão da tirania.
AM: Mas quando escrevi esse livro, já tinha havia a
anistia, já estávamos a caminho da distensão. O que
estava mais forte para mim naquele momento era a
ditadura chilena, porque a brasileira já estava se
esvaindo. No Chile, ela foi muito marcante: teve toque
de recolher, que nó não tivemos.
AM: Claro, sair de um extremo para o outro. Há
crianças muito tirânicas, que acham mesmo que “tudo
pode”. A questão de o direito de cada um acabar onde
começa o do outro, está muito introjetado em mim. Eu
sou a mais velha de onze irmãos. Nós dividíamos tudo,
até armário, gaveta. Então nós tínhamos de saber muito
bem até onde ir. Então eu acho que nós não devemos
cair no risco da tirania contrária. Para mim, criança não
é uma coisa abstrata. Não lido com abstrações infantis,
nunca dei aulas para crianças, nunca estudei
Psicologia infantil ou Pedagogia. Chego até elas pela
linguagem. Tenho um fascínio muito grande pela
linguagem oral. A grande questão da literatura brasileira
é a “língua brasileira”; em que o nosso português é do
Brasil, em que ele é diferente, em que continua, até
onde a gente deve obedecer ao padrão que vem de
fora. A questão maior que o Modernismo legou para
nós não é só a questão do pronome; foi a forma como
a gente fala. Continuaremos com o pronome átono?
Como vamos usar isso? Vamos eliminá-lo da língua?
Como lidar com essas questões fundamentais?
N: E Nita também questiona isso... “Por que tenho que
dizer ‘faremos todos’, se sempre dissemos ‘fazeremos
todos’. Só porque a professora ensinou?”
AM: É, mas a Nita esbarra num problema também,
porque se ela vai falar uma língua que só ela entende,
ninguém mais a entenderá. É um movimento libertário,
mas ao mesmo tempo, a liberdade se dá no reconhecimento de uma moldura que é social, que é cultural, se
não há o isolamento. Esse pêndulo é a nossa questão.
N: Era uma vez um tirano foge um pouco a essa estrutura. É uma obra mais engajada, a começar pela caracterização do herói, que era um “déspota ou um tirano”,
enfim, alguém que retirou do país toda a cor e revestiu
tudo de cinza; e só ele tinha umas fitinhas coloridas no
peito. Essa obra tinha a intenção de figurar a ditadura?
AM: Eu estava escrevendo durante a ditadura e falava
muito sobre isso. Acho que De olho nas penas é até
muito mais forte do que Era uma vez um tirano. Nesse
momento, a Ruth Rocha já tinha escrito três dos livros
que viriam a compor a tetralogia dos reis: O reizinho
mandão, O que os olhos não vêem e O rei que não
sabia de nada. Já era aceito que falássemos de reis
como figuras autoritárias. Eu resolvi testar, chamando
de tirano. Mas a história não parte de uma atitude de
denúncia. Comecei querendo escrever a história de
um fabricante de estrelas, porque eu sempre fui
fascinada por festas de São João. Eu queria falar de
fogos, dessa coisa da pólvora, do paradoxo de poder
criar beleza ou matar, que é um tema a que eu volto
em O canto da praça. Em Era uma vez um tirano, eu
queria falar um pouco do fabricante de estrelas. Aí eu
pensei em uma festa, uma grande festa. Uma grande
N: Em seu livro Texturas, você afirma que a literatura
infantil ficou um pouco distante dos olhos do censor...
N: Há muitos outros textos seus que trabalham essa
temática do poder: Ah, cambaxirra, se eu pudesse...,
Passarinho me contou, até o próprio Bento que Bento
é o frade. Passarinho me contou trabalha a impotência
de um rei que não consegue enxergar os problemas
do reino, porque fora acostumado a reconhecer seu
lugar pelo viés do olhar do outro. Você reconstrói os
clichês tradicionais: Caminha, Gonçalves Dias,
desconstruindo essa imagem clicherizada de Brasil,
até chegar ao ponto de, como em A roupa nova do
imperador, é alguém que não está totalmente
envolvido, que tem o distanciamento, que vai enxergar
que a estrutura não é aquela pintada, emoldurada.
Não é este rei um tirano; é a figura de alguém
impotente. Vale ressaltar aí sua qualidade para tratar
o poder, que não é encarado aqui naquele sentido
nietzschiano de vontade de poder, mas no sentido de
rede, como dizia Michel Foucault, de vontade de
potência, segundo o próprio Nietzsche. É um poder
que acontece nas mínimas relações: de criança para
criança, de criança para adulto... o que fica latente em
sua obra é a resistência. Você acredita na literatura
como forma de resistência?
AM: Acredito, acho que literatura é resistência, porque
você mexe com palavra, pensamento. Isso é uma
afirmação do humano. Ao afirmar o humano, há uma
resistência contra toda deturpação. Livro meu em que
conscientemente trabalhei a questão do poder é um livro
para adulto: O mar nunca transborda. Toda a questão
dentro daquela redação de jornal passa pelo poder pífio,
das pessoas que fazem de tudo para ascender.
N: Menos na questão de poder governo e mais uma
vez como uma forma de poder que se manifesta nas
relações interpessoais e mais uma vez nós
esbarramos em uma visão existencial. Falando nisso,
Clarice Lispector foi uma escritora lida por você?
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5
AM: Clarice nunca foi uma das minhas autoras
queridas. Sempre foi uma autora muito admirada por
mim. Paulo Mendes Campos faz essa distinção:
“autores por quem tenho paixão e autor que eu admiro
muito”. Eu nunca tive paixão por Clarice Lispector. É
uma pessoa muito distante de mim em temperamento.
A Clarice contista me toca muito; a romancista, muito
menos. Não a li muito; fui ler Clarice depois de adulta,
na revista Senhor; mas ler mesmo, foi só na década
de 70, quando eu já escrevia. Por Machado de Assis,
eu tenho paixão. É completamente diferente. Eu vesti
Machado: li, reli, reli... releio pedacinhos. É um voltar
permanente. Eu não tenho esse impulso com a Clarice.
N: Se não Clarice, que outras autoras, se é que houve
autoras, influenciaram seu percurso?
AM: As inglesas. Li muito as irmãs Brönte. Depois teve
um momento, entrando na Faculdade de Letras, que
eu li Collette, a francesa. Li também alguns infantis,
meio bobos, como Mulherzinhas e Pollyanna. Mas o
grande modelo da infância foi Emília, que era escrita
por um homem. Eu acho que eu não tinha consciência
de que era uma questão feminina. Até final dos anos
60, era uma questão antiautoritária, libertária em geral.
Foi só realmente com a eclosão do feminismo vindo
de todo canto que eu percebi isso. Não foi uma escritora
incrível que me mostrou tudo isso; o que surgiu foi a
pílula. De repente, descobriu-se que era possível
transar sem engravidar e aí não havia pai que
segurasse a situação. A estrutura do mundo é muito
mais abalada por essa descoberta científica do que
pelo fato de haver uma mulher escrevendo.
N: Você se considera ou já se considerou em algum
momento de sua carreira uma escritora feminista?
AM: Uma escritora feminista, não; uma mulher
feminista, sim. Hoje esse rótulo já está gasto, é um
termo obsoleto. Fui uma jornalista feminista, mas
escritora ficcional, não. Não me considero uma
escritora com nenhum adjetivo, nem o infantil. Sou
uma escritora brasileira.
N: Aqui terminamos, agradecendo mais uma vez a
sua atenção, e parabenizando o trabalho eficiente e
carinhoso do seu site, especialmente do Rodrigo,
afirmando que endossamos essa sua fala no sentido
de que você realmente é uma escritora sem rótulo.
Parabenizamos também pelo título da Academia,
merecido pela qualidade e seriedade de seu trabalho.
Ana Maria Machado em Manguinhos/1986
(Reprodução/ www.anamariamachado.com)
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Boletim Informativo do Núcleo Interdisciplinar de Estudos da Mulher na Literatura – NIELM
em destaque
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Mulheres na Academia Brasileira de Letras
Débora Carvalho Capella / GRADUANDA (PORTUGUÊS-INGLÊS)
A
firmar que a mulher continua
buscando, cada vez mais, sua
emancipação perante a sociedade não é
novidade. Afinal, ela não quer ser reduzida
às tarefas domésticas; pelo contrário, luta
para crescer no mercado de trabalho, antes
somente ocupado pelo homem. Nessa busca,
a mulher passou também a exercer ofícios
antes conhecidos como redutos
exclusivamente masculinos, como na
política e, por que não dizer, no mundo
literário. Apesar de ainda em número
reduzido, a força feminina na literatura vem
crescendo e conquistando respeito e
admiração.
Durante quase 80 anos, a presença de
mulheres foi proibida na ABL; no entanto,
desde 1976 tal proibição deixou de existir e,
atualmente, a ABL conta com cinco delas
integrando suas cadeiras. A primeira a
ingressar foi Rachel de Queiroz, eleita em
1977. Autora de 23 livros individuais e 4
em parceria, nasceu em 1910, no Ceará. Em
1930, estreou com o romance O Quinze, com
inesperada repercussão no Rio de Janeiro.
Em 1992, foi publicada sua obra-prima,
Memorial de Maria Moura, romance que
lhe deu o troféu Juca Pato, concedido aos
ganhadores do prêmio “Intelectual do Ano”.
A segunda mulher a ocupar uma das
40 cadeiras da ABL foi Dinah Silveira de
Queiroz, eleita em 1980. Nascida em São
Paulo em 1911, foi romancista, cronista e
contista. Seu grande sucesso foi Floradas
na Serra (1939), contemplado com o
Prêmio Antônio de Alcântara Machado
(1940). A Academia Brasileira de Letras lhe
conferiu o Prêmio Machado de Assis, pelo
conjunto de sua obra. Sua eleição foi
considerada como a consagração de uma
escritora vinda de uma das famílias
brasileiras mais voltadas às letras. Mas,
infelizmente, faleceu em 1982.
Outra imortal é Lygia Fagundes Telles,
eleita em 1985. Advogada, romancista e
contista, tem seu livro Ciranda de Pedra,
publicado em 1954, apontado por muitos
estudiosos como o marco de sua maturidade.
Seu trabalho mais conhecido, porém, é o
romance As Meninas, de 1973. Entre outras
coisas, escreveu, em parceria com Paulo
Emílio Salles Gomes, Capitu, adaptação
livre do romance de Machado de Assis, Dom
Casmurro. Além disso, muitos foram os
prêmios que recebeu por suas obras.
Já em 1989, foi a vez de Nélida Piñon,
ingressar na ABL. Jornalista, romancista,
contista e professora, foi responsável pela
inauguração da cadeira de Criação Literária
na Faculdade de Letras da UFRJ. Deu cursos
em universidades estrangeiras como na
Colômbia University e na John Hopkis
University, por exemplo. Foi a primeira
mulher, em 100 anos de existência da ABL,
a integrar a Diretoria e ocupar a presidência
da Casa de Machado de Assis, no ano do
seu Centenário. Quanto às suas obras,
estreou com o romance Guia-mapa de
Gabriel Arcanjo, publicado em 1961. Desde
o início, a escritora filiou-se ao movimento
que, depois de Guimarães Rosa, se orienta
pela renovação formal da linguagem.
Anos depois, em 2001, Zélia Gattai foi
eleita para ocupar a cadeira de número 23.
Romancista, memorialista e fotógrafa,
nasceu em São Paulo, em 1916. Em seu
primeiro livro de memórias, Anarquistas
Graças a Deus (1979), narra a história de
seus pais, a realidade dos imigrantes
italianos no Brasil e sua infância em São
Paulo. No mundo da ficção, estréia com o
livro infantil Pipistrelo das Mil Cores, 1989.
Retorna às memórias em 1992, com Chão
dos Meninos, no qual retrata o retorno do
exílio, no período de 1952 a 1963, e é
dedicado ao marido, Jorge Amado, em
comemoração aos seus oitenta anos. Em
2001, fica viúva de Jorge Amado. Publica
Códigos de Família, livro de memórias. Seu
livro mais recente é Jorge Amado, um Baiano
Sensual e Romântico, lançado em 2002.
Desde 1980, recebeu diversos prêmios, entre
eles: Medalha do Mérito Castro Alves, da
Secretaria da Educação e Cultura do Estado
da Bahia (1987) e Comenda das Artes e das
Letras concedida pela ministra da França,
Catarine Traurmann (1998).
Por último, foi a vez de Ana Maria
Machado, eleita em 24 de abril deste ano.
Carioca, com 33 anos de carreira, possui
mais de 100 livros publicados no Brasil e
em mais de 17 países, somando quase catorze
NIELM em foco
Publicação do Núcleo Interdisciplinar de
Estudos da Mulher na Literatura
Correio eletrônico: [email protected]
Ana Maria Machado / Posse na ABL
(Reprodução/ www.anamariamachado.com)
milhões de exemplares vendidos. Trabalhou
como professora em colégios e faculdades,
escreveu artigos para a revista Realidade e
traduziu textos até que, em 1969, partiu para
o exílio. Na Europa, trabalhou como
jornalista na revista Elle em Paris e na BBC
de Londres, além de se tornar professora em
Sorbonne. Mesmo ocupada, Ana não parou
de escrever as histórias infantis que vendia
para a Editora Abril. Escondida por um
pseudônimo, ganhou o prêmio João de Barro
por ter escrito o livro História Meio ao
Contrário, em 1977. O sucesso foi imenso,
gerando muitos livros e prêmios em seguida.
Em 1993, ela se tornou hors-concours dos
prêmios da fundação Nacional do Livro
Infantil e Juvenil (FNLIJ). Em 2000, Ana
ganhou o prêmio Hans Christian Andersen,
considerado o prêmio Nobel da literatura
infantil mundial. E em 2001, a Academia
Brasileira de Letras lhe deu o maior prêmio
literário nacional, o Machado de Assis, pelo
conjunto da obra.
Retratos de mulheres como essas mostram todo o potencial feminino e também,
como a mulher está conseguindo, ainda que
aos poucos, conquistar o espaço a que tem
direito. Embora em número reduzido em
relação aos homens (ocupam 5 das 40
cadeiras existentes), elas estão presentes na
Academia Brasileira de Letras e, de alguma
forma, contribuem para o aumento do
respeito com relação às mulheres em geral.
FACULDADE DE LETRAS / UFRJ: Diretora: Edione Azevedo
Coordenação do NIELM: Angélica Soares / Elódia Xavier
Bolsista: Sheila da Silva
Editoração / Prog.Visual / Copydesk: Antonio Galletti / Ione Nascimento (SERVIÇO DE PUBLICAÇÕES/FL)
OS ARTIGOS ASSINADOS NÃO REPRESENTAM NECESSARIAMENTE A OPINIÃO DO JORNAL .

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