Características Psicométricas dos Instrumentos que Avaliam a

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Características Psicométricas dos Instrumentos que Avaliam a
Referência:
Pedro, L., & Pais-Ribeiro,J. (2006). Revisão de instrumentos de qualidade de vida na
esclerose múltipla. In: I.Leal, J. Pais-Ribeiro & S.Neves, (Edts.). Actas do 6º
Congresso Nacional de Psicologia da Saúde (pp.121-126). Lisboa: ISPA
REVISÃO DE INSTRUMENTOS DE QUALIDADE DE VIDA NA
ESCLEROSE MÚLTIPLA
Luísa Pedro & J.Pais-Ribeiro
Faculdade de Psicologia e de Ciência da Educação- U.Porto
A esclerose múltipla é uma doença crónica do foro neurológico que tende a
aparecer em indivíduos entre os 15 e os 40 anos, do sexo feminino (relação de 3
mulheres para 2 homens). O maior número de casos diagnosticados desta doença
encontra-se nos países da Europa, América do Norte e Austrália, ou seja, nos países
temperados, em indivíduos de raça caucasiana.
Não existe evidência científica de um factor responsável por esta doença. Crê-se
cada vez mais, que a esclerose múltipla seja causada por uma combinação de factores,
entre factores hereditários que na presença de factores ambientais desconhecidos mas
facilitadores da doença e em situações emocionais adversas, favoreçam a activação do
sistema imunológico no sentido deste não reconhecer os seus próprios tecidos e activar
um processo inflamatório na substância branca do sistema nervoso central (reacção auto
imune), deste modo, iniciar o processo da esclerose múltipla (Moreira, Felipe, Mendes
& Tiibery, 2000).
Sintomatologicamente há grandes variações de sinais e sintomas desta doença,
consoante a zona cerebral que é mais afectada pela desmielinização. Alguns dos
sintomas encontrados com mais frequências nos portadores de esclerose múltipla são:
astenia e fadiga sem sinais objectivos, mais objectivamente aparece com grande
incidência, a inflamação do nervo óptico e perda de força muscular que pode ocorrer
não só em surtos temporários, mas também, nos surtos recorrentes ou num processo
gradual e progressivo. Posteriormente, é frequente aparecer fadiga intensa, rigidez dos
membros, espasticidade, distonia, acinesia paróxistica, tremor Parkinsónico, dismetria,
ataxia, desartria, dor, descontrole dos músculos da bexiga e intestinos, disfunções
sexuais, alterações do equilíbrio, alterações da coordenação, dificuldades cognitivas e
alterações de humor (Paty & Ebers, 1997).
A progressão da esclerose múltipla, depende da gravidade da inflamação e do
ritmo da desmielinização. Segundo Ebers, (2003) a multiplicidade de sintomas que
podem emergir como resultado da esclerose múltipla, significa que as consequências
físicas, cognitivas e psicossociais desta doença são, frequentemente, muito abrangentes,
variáveis e complexas.
No processo de reabilitação não basta restabelecer os danos causados pela
doença (através de medicação) ou submeter o indivíduo a um programa de manutenção
físico-funcional no sentido deste não perder determinadas capacidades funcionais. As
necessidades cognitivas e emocionais dos doentes e seus familiares são fundamentais no
processo de reabilitação, bem como, as suas preferências pessoais, os factores
relacionados com o seu estilo de vida, o seu trabalho, as relações familiares e a sua
participação no tecido social.
Leóni, Morales, Navarro e Mitchell (2003) defendem que para haver uma
avaliação correcta do estado de saúde dos doentes com esclerose múltipla, ela não
poderá reduzir-se somente a critérios de incapacidade e deficiência: existe uma forte
correlação entre saúde e qualidade de vida, que é necessário aprofundar.
O conceito de qualidade de vida começou a ser referido pelo President
Eisenhower´s Commission on National Goals referindo-se à qualidade de vida do povo
americano, como um construto multidimensional e abrangente, incluindo as variações
sociais e todos os seus factores envolventes, a educação, interesses individuais,
desenvolvimento económico, saúde e bem-estar, defesa e liberdade em todo o mundo. O
primeiro grande estudo realizado sob este tema é publicado em 1976 e focaliza as
experiências de vida enquanto mecanismo que pode contribuir para condicionar a vida
de um indivíduo (Ribeiro, 2004).
Segundo Ribeiro (2004) as características multidimensionais do conceito de
qualidade de vida, abrange várias dimensões, cujo número depende da natureza dos
conceitos teóricos e empíricos que estão associados ao tema a estudar. Deste modo os
instrumentos que avaliam a qualidade de vida específica para uma condição ou doença,
terão de conter, não só, os aspectos que caracterizam a doença como também, todos os
outros factores determinantes na qualidade de vida de qualquer indivíduo.
Segundo (Leóni, et al 2003) o interesse da qualidade de vida na esclerose múltipla é
recente. Durante muitos anos, a avaliação do impacto desta doença era limitado às
incapacidades e deficiências. Na revisão da literatura dos artigos disponíveis da Medline
database, realizada em Julho e 2005, utilizando as palavras chave “quality of life” mais
“multiple sclerosis”, apareceram 521 artigos, sendo o primeiro artigo publicado em
1978 e o último em Junho de 2005. Entre 1978 e 1992, existem poucos artigos, a partir
desta altura aparecem muitos artigos sobre o tema.
Dado que esta doença afecta a integridade psicológica e funcional de muitas
áreas incluindo as funções neurológicas, psicológicos, sociais e outras (mobilidade e
fadiga), em pessoas muito jovens; e porque existe uma sensação de insegurança face ao
futuro, por esta doença não ter cura e ter um prognóstico reservado quanto à
probabilidade de grandes limitações a médio prazo; medir a qualidade de vida implica
que as características do instrumento consiga abranger todos os aspectos que a doença
comporta, bem como, do impacto destes aspectos no dia a dia da pessoa (Nortvedt &
Riise, 2003).
Gruenewald, Higginson, Vivat, Edmonds e Burman (2004) numa revisão
realizada aos instrumentos de qualidade de vida na esclerose múltipla, no sentido de
encontrar qual seria aquele que melhor avaliava os construtos pretendidos, definiram 15
domínios importantes nas pessoas com esta doença, são eles (saúde mental, papel das
limitações, vida familiar, alterações das funções sociais, intimidade, sintomas de
esclerose múltipla, funções físicas, curso da doença, controlo/ autonomia, suporte dado
pelos outros, perda de dignidade, desejo de ficar na própria casa, acomodação e
aceitação, importância da actividade diária, necessidade de acesso aos cuidados). Neste
estudo os autores concluíram que o Functional Assessment Multiple Sclerosis (FAMS),
o Multiple Sclerosis Quality of Life-54 (MSQol-54) e o Multiple Sclerosis Quality of
Life Inventory (MSQLI) são os instrumentos que medem de uma forma mais
abrangente a qualidade de vida na esclerose múltipla.
Numa avaliação realizada na Medline e em outras bases de dados, concluiu-se
que os instrumentos mais utilizados pelos investigadores e cujos critérios de validação
são mais aceitáveis são: FAMS, Hamburg Quality of Life Questionnaire in Multile
Sclerosis (HAQUAMS), MSQol-54, MSQLI e o RAYS Scale.
No quadro 1 exibem-se os instrumentos, domínios e a duração da sua aplicação, e no
quadro 2 a sua validação e fidelidade.
Quadro 1- Instrumentos Específicos de Qualidade De Vida na Esclerose Múltipla
Nome do instrumento
N.º itens Domínios existentes Tempo
Aplicação
Functional Assessment Multiple Sclerosis
(FAMS)
Hamburg Quality of Life Questionnaire in
Multile Sclerosis
(HAQUAMS)
Multiple Sclerosis Quality of Life-54
(MSQol-54)
Multiple Sclerosis Quality of Life
Inventory
(MSQLI)
RAYS Scale
59
38
54
81
50
Todos os domínios
referidos acima
20m.
Todos os domínios
referidos acima
25m
Todos os domínios
referidos acima
15m
Todos os Domínios,
expt a comunicação 45m.
Todos os domínios 30m.
referidos acima
.
Quadro 2- Validação e Fidelidade dos instrumentos
Nome do Instrumento
Functional
Assessment
Multiple Sclerosis
(FAMS)
Hamburg Quality of Life
Questionnaire in Multile
Sclerosis
(HAQUAMS)
Multiple Sclerosis Quality
of Life-54
(MSQol-54)
Validação
Validação de conteúdo,
construto e critério. Tem
correlação com o MSIS-29
e o SF-36.
É construído base o FAMS
e o SF-36. Tem correlação
com o EDSS, HADS,
MSFC e FAMS.
É constituído SF-36 + 18
itens específicos para a
doença, incluindo uma
subescala de função sexual.
Validação de conteúdo,
construto e critério.
Fidelidade
Alfa (0,82 e 0,96) expt na
mobilidade (0,78 e 0,39)
O teste-retest (0,85 e 0,91)
Alfas (0,85 e 0,92) expt na
função social (0,68)
O teste-retest (0,75 e 0,94)
Alfas (0,75 e 0,96) expecto
na função social (0,68)
O teste-retest acima de 0,70,
expto percepção saúde (0,69
Alfas (0,67 e 0,97)
O teste-reteste (0,75 e 0,94)
Multiple Sclerosis Quality
of Life Inventory
(MSQLI)
RAYS Scale
Validação de conteúdo, Alfas (0,84 e 0,89) nas três
construto e critério.
subescalas.
REFERÊCIAS
Ebers, G. (2003). Blue Books of Pratical Neurology Multiple Sclerosis-2. W.
McDonald and J. Noseworthy (Ed.), Natural History of Multiple Sclerosis (pp. 2132). Butterworth-Heinemann (USA).
Gruenewald, D., Higginson, I., Vivat, B., Edmonds, P. & Burman, R. (2004).
Quality of life measures for the palliative care of people severely affected by
multiple eclerosis: a systematic review. Multiple Sclerosis, 10, 690-704.
León, J., Morales, J., Navarro,J. & Mitchell, A. (2003). A review about the impact
of multiple sclerosis on health-related quality of life. Disability and Rehabilitation,
25 (23), 1291-1303.
Moreira, M., Felipe, E., Mendes, M., & Tilbery, C. (2000). Esclerose Multipla.
Estudo descritivo de suas formas clínicas em 302 casos. Arquivos de NeuroPsiquiatria, 58, 300-303.
Nortvedt, M., & Riise, T. (2003). The use of quality of life measures in multiple
sclerosis resaerch. Multiple Sclerosis, 9, 63-72.
Paty, D., & Ebers, G. (1997). Multiple Sclerosis. Philadelphia: Davis Company
Ribeiro, J. (2004). Quality of Life is a primary end-point in clinical settings. Clinical
Nutrition, 23 (1), 121-130.