Editado por: Coiote Flores Textos: colaborações involuntárias Capa

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Editado por: Coiote Flores Textos: colaborações involuntárias Capa
Editado por: Coiote Flores Textos: colaborações involuntárias
Capa e tradução (onde houver): Coiote Flores
A SAPAMÁ nasceu do nosso amor pela música, da necessidade de se fazer ouvir nossa voz, expressar nossos gritos,
indignações,paixões etc.. denunciando e questionando o
sistema patriarcal através de letras políticas; Bi, Barata e
Nina misturam suas influências musicais num som forte,
contestador e muitas vezes irónico que visa também a
desconstrução de género.
Reconhecemos a importância do desapego desse sistema
que não nos representa.
Como disse Clarice, “Liberdade é pouco, o que eu
quero ainda não tem nome”.
N Y H V.
Aline Vignoli (Nyh V.), nasceu em Rio Grande/RS em 1988. Autodidata, toca e compõe desde seus 14 anos. Em 2010, resolveu deixar
a terrinha, e subir até a Capital afim de dar mais visibiidade à suas
músicas. Em Porto Alegre, formou a banda Electric Mind, com a qual
se apresentou em diversas casas de shows, como o Garagem Hermética, Beco e Abbey Road/NH. A banda também se destacou com
sua passagem por São Paulo, onde dividiu o palco com Dominatrix,
num festival de rock feminino. No mesmo ano, se apresentaram em
Buenos Aires/AR, o que resultou em muitas criticas positivas em sites
conceituados, como o Rock ‘n’ Beats, da MTV e Trama Virtual, onde
apareceram como capa. Electric Mind encerrou suas atividades no final
de 2011, com o single Sick & Contr’addiction disponível para download
em um de seus canais virtuais.
Atualmente, Nyh foca-se em seu projeto solo, dando início a gravações de canções acústicas. Com incontestável influência de folk e indierock, pretende trazer novas idéias, conceitos, contradições e
percepções da vida através da música.
female videogame
Tava conversando com meu novo colega que fez a tese dele de pós sobre cinema e video game,
falando sobre jogos e consoles e documentários sobre o tem. Então, como não poderia deixar
de ser, coloquei em pauta meu assunto predileto no momento: e as mulheres dentro dessa
indústria? O que é o jogo de videogame? É uma atividade lúdica, onde criamos avatares pra
circular por um universo fantástico que nos permite ser, por algumas horas (pra alguns são dias
ou semanas, mas aí vai da falta do que fazer de cada ser né), assassinos, heróis, pilotos, atletas,
deuses, gorilas, comedores de cogumelo e assim por diante. E quem são esses personagens?
Em alguns jogos, até da pra customizar teu avatar, em outros ele é o que é, às vezes até rola
uma menina (princesa?. E a maioria é o quê? Homens! Masculinos! Ípsilones!
Lembro quando chegou às minhas mãos o primeiro Tomb Raider. Nossa, aquilo foi incrível!
Ao invés de eu jogar sendo um cara, eu projetei minha imaginação num jogo onde eu era uma
MINA! E UMA MINA FUCKING GOSTOSA! E FODONA!
Não, eu não estou defendendo a necessidade de GOSTOSAS como personagens principais de
jogos, eu estou levantando a seguinte questão: por que não tem tantos jogos destinados para o
cromossomo X? Nós também gostamos de dar tiros, descobrir caminhos, de correr de carro, de
mitologia e etc. E também gostamos de outras coisas, e também não gostamos dessas citadas
coisas…Como qualquer ser humano, de qualquer sexo. Mas o negócio é o seguinte, baseada na
minha experiência, como o exemplo da Tomb Raider, acho importante que as meninas também
tenham a possibilidade de entrar num mundo lúdico e se divirtam e projetem a sua fantasia em
personagens com as quais elas se identifiquem. Porque não é divertido ser a Bat Girl, é divertido ser o Batman! Não quero ser a ajudante do herói, quero ser a heroína. Gosto bastante de
X-Men por causa da Jean Grey. Ela é simplesmente o mutante mais fodão de todos os tempos,
e ela é uma mulher! Não é feminismo, é fantasia! Acho que está faltando heroína nesse mundo
dos videogames, embora não falte na vida real…
Pra ilustrar, pensei num exemplo exagerado, minha ideia pra um jogo BEM feminino…
As historinhas que dão o start no jogo podem envolver:
“Depois de ser subestimada e receber menos que os colegas homens, fulanA resolve se vingar…”
“Depois de ser corneada 14 vezes, e aí cornear, e por isso ser xingada e largada, fulanA resolve
fazer justiça”
“Fulana mandou 400 vídeos para o youtube, foi na delegacia da mulher 10 vezes, até que resolveu lutar contra a violência doméstica com suas próprias mãos” (esse podia ser tipo GTA e
ela vira uma fodona mafiosa e tal…nossa que legal, quero jogar meu jogo!)”
E os personagens podem ser tanto uma gostosa, quanto uma gordinha ou uma magrela sem
peito, ou uma magrela com peito… E nos jogos em que é possível customizar o avatar, que
tenha vários tipos de minas, assim como nos jogos comuns tem vários tipos de caras…
Enfim, pensei numas bobagens rapidamente pra deixar claro que: dá pra fazer! Tem muito
tema bobo, e tem muito tema massa. Porque mulher pode ser boba e pode ser massa. Nem
todas as mulheres são bobas, e nem todas são massa, assim como a humanidade inteira…
Porque videogame é legal, porque nem todo mundo é bonito, porque nem todo mundo quer
ser bonito, porque todo mundo curte fantasiar e brincar, porque nem todo mundo é gay, porque
nem todo mundo é hetero, porque nem todo mundo gosta de sexo, porque temos 2 sexos e
muita diversidade, porque temos DOIS SEXOS E MUITA DIVERSIDADE, PORQUE TEMOS DDDOOOIIIISSSS SEXOS, e muita diversidade.
Luiza Só
LUGAR DE MULHER É NA COZINHA...
O Miojo® é a representação culinária de uma transição importante na vida. Ele é a refeição
símbolo do desprendimento do vínculo familiar, o alimento que expõe a inabilidade recémdescoberta de lidar com o mundo.
O Miojo® é a nossa companhia quando saímos da casa dos pais e passamos a morar sozinhos. Nos primeiros momentos, não conseguimos nos ver, num futuro próximo, saboreando
algo sofisticado como resultado dos nossos próprios esforços. E o Miojo® está lá, pré-cozido e
carinhoso, pronto para abraçar nossas papilas gustativas sem pedir nada em troca. Descobrimos que comer é o melhor relacionamento unilateral que existe.
Por diversas vezes sentimos saudade da interação dos ingredientes da casa dos pais. Quando
os visitamos e comemos aquela macarronada caseira, é quase como fazer amor. Mas é o
pacotinho de carboidratos de gosto homogêneo que está ao alcance das nossas mãos todas
as noites. Não é a melhor opção, é a que temos disponível. O Miojo® é a masturbação das
massas.
Essa transição não dura para sempre. Além disso, nosso organismo não se satisfaz com os
poucos nutrientes que o Miojo® contém. No entanto, reacionários preguiçosos que somos,
dispensamos a nutrição em favor da praticidade, usando a falta de tempo como desculpa, e
passamos apenas a incrementar o molho.
Traímos o movimento libertário que o Miojo® representa. Rejeitamos sua essência prática e
provisória perdendo o tempo ganho com o pré-cozimento na preparação do molho. Na verdade não queremos admitir, mas não adianta fazer um molho elaborado, a essência do Miojo®
continua sendo a mesma. É como rebuscar um argumento ruim.
Assim, prolongamos nossa dependência em vez de buscar novas experiências para o nosso
paladar. Mas uma hora teremos que devolver ao Miojo® essa sua essência provisória, coisa
que deveríamos ter feito em três minutos.
É nessa hora que pediremos uma pizza.
Djessica D., a @djex
... SENTADA, FUMANDO UM CIGARRINHO OU
LENDO UM LIVRO ENQUANTO EU PREPARO O ALMOÇO.
ISSO NÃO É LEGAL, CARA...
escrito por Stoya
traduzido por Coiote Flores
Consigo me lembrar de cada vez que alguém em uma convenção ou mostra me
tocou inapropriadamente. No meu primeiro ano na Venus Fair em Berlim, teve um
cara que enfiou dois de seus dedos em minha vagina – coberta com calcinha. Foi
muito rápido, como se em um segundo ele estivesse parado lá e no seguinte eu estivesse tentando entender como um pedaço de minha roupa íntima foi parar dentro
de minha vulva. Teve um cara no Texas que apertou meu traseiro um tanto violentamente quando estávamos tirando uma foto e depois riu de como eu ‘guinchei como
um porquinho’. Sério. Fico um pouco desapontado com o quão estereotipado ele
era. No AVEN esse ano, um cara agarrou meu antebraço enquanto eu saía do elevador para a cabine da Digital Playground. Ele soltou quando eu soquei sua região
testicular. Há uma média de três pessoas por convenção que tentam o método mais
sutil de deslizar sua mão um pouco demais pelas minhas costas quando estou ao
lado delas para tirar uma foto. Cada uma delas pede desculpas quando eu gentilmente coloco sua mão de volta ao lugar certo e peço para que lembrem que não sou
uma boneca inflável.
O parágrafo acima não é absolutamente nada, NADA, comparado com o que acontece com uma garota ou mulher caminhando em público em plena luz do dia. Com o
cabelo sujo em um rabo-de-cavalo ou coque, sem maquiagem e com roupas largas.
Com fones no ouvido, sentada em uma cafeteria ou no metrô com a cara enfiada
num livro ou falando no telefone.
Homens já me seguiram rua abaixo me cutucando em uma forma que só posso
presumir sendo uma tentativa de ganhar minha atenção. Homens agarraram os fios
de meus fones e os arrancaram de minhas orelhas. Várias vezes. Homens agarraram
parte de meu corpo, ou meu casaco ou alça da bolsa. Duas vezes, carregando minha
Lyra (o aparato circense metálico de um metro do meu trabalho aerial), agarraram
o aro e se recusaram a largar até eu ameaçar chutá-los. Me bloquearam em cantos
em vagões de trem quase vazios, me seguiram por quadras e e depois pararam do
lado de fora de qualquer loja na qual eu me abrigasse por tempos absurdos. Eles
param seus carros no meio da passarela para olhar e gritar pela janela. Anos atrás,
na Filadélfia, um homem andou pela minha vizinhança perguntando às pessoas se
sabiam onde morava essa garota branca de cabelos azuis porque ele queria devolver
seu telefone. Felizmente, meus vizinhos eram espertos demais para esse truque.
Eles dizem que tenho um belo traseiro, seios legais, um vestido muito lindo. Falam
que sou sua futura esposa, ou como eu ficaria bonita com seu pênis em minha boca.
Eles tentam (e provavelmente são bem-sucedidos, às vezes) tirar fotos por dentro
de minha camiseta. Perguntam se podem ter meu telefone, perguntam onde moro,
por que nãa estou sorrindo, por que meu namorado me deixar caminhar sozinha
por aí. Então perguntam porque eu sou tão vaca, se minha buceta é feita de gelo.
Eles dizem que nunca fazem isso, como se eu de alguma forma os tivesse levado ao
comportamento inapropriado e mereço isso. Eles dizem que estão só se divertindo,
que queriam fazer um elogio. COm muita frequência, ficam irritados, indo para um
berrante mantra a la tourettes de cadela-puta-escrota-vadia.
Antes que você diga que isso é porque eu tiro minhas roupas como meio de vida,
deixe-me dizer que isso começou antes de eu fazer 18.
Deixe-me te dizer que toda e qualquer mulher que eu conheço tem pelo menos uma
história realmente terrível de assédio na rua e um monte de outras histórias que
são meramente insultantes ou irritantes. Deixe-me te lembrar que em um salão de
fãs de pornografia, que já me viram de fato com um pau em minha boca e podem
comprar uma réplica de minha vagina em uma lata ou caixa, sou tratada com muito
mais respeito do que descendo a rua.
Me parece que mulheres tem compartilhado suas experiências com assédio sexual
em vários lugares nas últimas semanas. Isso é o que me motivou a partilhar a minha.
Como Jen Bennett disse no twitter, há claramente alguma coisa no ar. Tem que
haver algo no ar. Falar é a única forma de ajudar as pessoas a entenderem que algo
é um problema. Compartilhar é como permitimos umas as outras saberem que não
estamos sozinhas. A discussão aberta aumenta a ciência de coisas como http://
www.slutwalktoronto.com/ e http://www.slutwalktoronto.com/
Assédio de rua não é uma ocorrência rara ou isolada. Não acontece só na América.
Não acontece só a mulheres jovens ou tradicionalmente consideradas bonitas. Não
acontece apenas em vias públicas ou áreas de baixa renda.
Não deveríamos ter que andar com um cachorro grande e brabo chamado Funster
para nos proteger. Não devemos ter que carregar um spray ou faca esperando que
consigamos usá-los propriamente se necessário ou investindo horas de nossas vidas
em aulas de defesa pessoal (algo que muitas mulheres não tem nem o dinheiro nem
o orçamento disponível para fazer). Não deveríamos ter que viajar em grupos pra
nos sentirmos seguras (outra vez, algo que não é realmente praticável).
Homens tem respondido dizendo que querem se separar de seu gênero. Que não
percebiam, até começarmos a compartilhar nossas histórias massivamente, como
é ser uma mulher. Que eles desejam que pudessem fazer algo. Que sentem pela
forma que outros homens tratam as pessoas. Homens não deveriam ter que sentir
a necessidade de se desculpar em nome de seu gênero, ou se envergonhar de ser
homem. A não ser que sejam aqueles cometendo assédio, não acho que devam.
Há coisas que podem ser feitas. Quando alguém que você conhece inicia um ato
inapropriado ou de assédio contra uma mulher, faço o saber que fizeram algo nada
legal. Diga “Na verdade, aquela mulher tinha o direito de ficar irritada quando você
a seguiu rua abaixo. Ela foi totalmente precisa quando chamou isso de assustador.”
ou “Ei, essa história que você me contou sobre colocar seu pau no rosto de uma
desconhecida bêbada em uma festa quando ela obviamente não o queria lá mas
estava sonolenta[2] demais pra te afastar, isso não foi nada legal de fazer com teu
pau, cara.”. Ensinar cada homem[1] moldável (entenda irmãos, amigos, filhos) que
tratar mulheres (seres humanos) com respeito é o certo a fazer. Não faça sexo com
babacas. Não os chupe, não bata punheta pra eles, não dê a eles seu telefone. Se
você ouvir uma mulher pedindo pra deixá-la em paz ou chamando atenção para o
fato de ele estar se masturbando na estação de trem, adicione sua voz à dela. Diga
“Isso não está certo. Isso não é legal. Nós vemos o que você está fazendo e é inaceitável.”.
(1) Estou me focando nos homens aqui porque nunca experimentei ou ouvi de casos
de assédio ameaçador nas ruas feito por uma mulher. Posso estar mal informada.
Pode ser. Possivelmente.
(2) Por “sonolenta” eu quero dizer “incapacitada por estar possivelmente drogada
ou apenas ter um noção insuficiente de sua tolerância ao álcool.”
Pra quem AINDA não entendeu
(e já ouvi muita gente dizendo que “hoje só engravida quem quer” e outras falácias
lindas da ignorância acerca da ignorância vindas de quem quer porque quer tirar
o direito de escolha entre o aborto e a gestação - e sim, o direito está lá, ou deveria
estar, e ele foi tirado; não é um privilégio que deva ser dado),
ANTICONCEPCCIONAIS
pra não engravidar
EDUCAÇÃO SEXUAL
pra prevenir e decidir
ABORTO LEGAL
pra não morrer
via INSURRECTAS (mujeres x la liberacion)
logo hoje fui esbarrar de novo nesse texto.
o movimento se chama ‘faça amor, não faça pornô’ e para mim já começa
meio equivocado por aí, essa conexão de amor com sexo nunca fez sentido
para mim. sexo é atração física. amor é um sentimento (até o amor que
tu sente por uma namorada ou um marido ultrapassa dessa idealização
romântica de VELAS, JAZZ SUAVE e PENETRAÇÃO OLHANDO NO OLHO). logo,
acho muito besta essas sugestões de pornografia com ‘atmosfera de paixão’
e outras besteiras, como se sexo mais agressivo e violento significasse
algum tipo de desrespeito pela mulher. deveria ofender a mulher também:
uma mulher precisa se sentir submissa só porque curte um pau inteiro na
boca dela? ou ter o rosto lavado de porra? ou assistir alguém com duas picas
no cu? uma mulher precisa gostar de pornografia sutil e delicada sempre?
eu apoio completamente a ideia de que ninguém deve se sentir obrigado
a fazer nada e imagino que realmente tenha uma pressão masculina, mas
esse discurso cria essa ideia de que há algo de errado em uma mulher
gostar de determinadas práticas sexuais, é uma ideia castrante para a
sexualidade feminina. me parece estar mais ocupado em julgar do que em
ajudar as mulheres a terem um vida sexual saudável.
não estou falando que homens devam emular adoidado tudo que assistem em filmes pornô, mas que deixem nas mãos das pessoas trepando pra decidir o que é violento, agressivo ou submisso.
(Chini S.)
Eu realmente preciso escrever um editorial? Esse é o mês
do copy&paste. Como se pode perceber, não escrevi nada
do que está aqui. Por dois motivos: um deles é que quis
colocar textos de amigas, mulheres ou homens. o outro é
que meu bloco de notas, onde haviam alguns rascunhos do
que incluiria de autoria própria nesse zine, está desaparecido. ISSO MESMO: MEU BLOCO DE NOTAS SUMIU. Se você
ver ele, guarde com carinho e me avise. Pode ganhar até
um abraço. Ou lhe repasso as bebidas com as quais meus
acólitos insistem em me presentear. Esse ThoraZine não
fo impresso, e talvez não seja. De fato, nem sei se vou
fazer mais. Ninguém parece ter gostado de brincar com
isso, exceto, é claro, eu mesmo.
Coiote Flores, março de 2013.
Arte: Ná (Lili)

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