A actividade educativa e de extensão cultural nos museus

Transcrição

A actividade educativa e de extensão cultural nos museus
FICHA TÉCNICA
Edição: Câmara Municipal de Caminha
Coordenação: Dr. Sérgio Cadilha
Capa: Dr. Sérgio Cadilha | BSdesign
Concepção Gráfica: BSdesign
Autores: Luís Raposo, Paulo Gama Mota, Suzana Faro e Sérgio Cadilha.
Tiragem: 250 exemplares
Data/Local da Edição: Caminha, Novembro de 2009
Depósito Legal: 302766/09
ISBN: 978-989-95920-3-2
ÍNDICE
NOTA DE ABERTURA
Presidente da Câmara Municipal de Caminha
Júlia Paula Pires Costa
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A ACTIVIDADE EDUCATIVA E DE EXTENSÃO
CULTURAL NOS MUSEUS.
O caso do Museu Nacional de Arqueologia
Luís Raposo
7
CIÊNCIA NA SOCIEDADE
O papel de um Museu de Ciência no séc. XXI
Paulo Gama Mota
21
MUSEUS AO ALCANCE DAS NOSSAS MÃOS
Suzana Faro
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A CRIAÇÃO DO NÚCLEO MUSEOLÓGICO DO
CENTRO HISTÓRICO DE CAMINHA
Sérgio Cadilha
45
3
Presidente da Câmara Municipal de Caminha
Júlia Paula Pires Costa
Um par de anos atrás, numa passagem por Madrid, visitei o
Museu Nacional Centro de Arte Rainha Sofia. É um ícone da
arte moderna e a sua obra majestática, talvez a mais famosa,
não deixou de prender a minha atenção.
Lá estava eu, maravilhada perante a obra-prima de Picasso,
quando a minha atenção foi desviada para um grupo de
crianças, umas vinte, em idade de jardim infantil. Orientadas
pelas educadoras, sentaram-se no chão, perante mais de 20
metros quadrados a preto e branco, pejados de figuras
arrepiantes. As educadoras lançaram então o desafio: descobrir
as figuras da tela. Seguiu-se uma longa e animada discussão.
Fiquei quieta, encantada perante um admirável tempo de
descoberta, diante do que terá sido o início de uma sólida ligação entre os ainda
pequenos cidadãos e o mundo maravilhoso das artes e da cultura, que os museus tão
preciosamente guardam.
Os horrores do bombardeamento de Guernica marcam a história e a pintura. Marcam
também a personalidade de homens e mulheres para quem o museu é um espaço
aberto à descoberta e à discussão, para quem o museu é parte da sociedade.
Conciliar ou (re)conciliar o museu com a sociedade tem sido a nossa política. As
conferências Museus e Sociedade são disso um exemplo. Por elas têm passado
dezenas de pessoas ligadas aos museus e à museologia, gente que traz o saber da
sua investigação e da sua própria experiência. Mestres, que nestes encontros trocam
vivências e nos apresentam formas de encarar a realidade maravilhosa dos museus.
A toda essa gente manifesto a minha estima. Uma boa parte do conhecimento que
ficou está nestas actas. Nestas comunicações, vindas de todo o país, há desafios, há
perspectivas diferenciadas, há caminhos para descobrir.
PRESIDENTE DA CÂMARA MUNICIPAL DE CAMINHA
Esta forma de educação para a cidadania informada, que tem nos museus fortes
aliados, é uma visão de que partilho, é a pedagogia no seu máximo expoente.
5
Aquelas crianças que conheci em Madrid certamente cresceram. Não tenho receio de
errar ao dizer que não se esqueceram de Guernica, nem acredito que tenham perdido
o contacto com as artes, ou que minimizem o papel da cultura. Ensinaram-lhes, no
tempo certo, que o museu é um espaço vivo e interactivo.
O museu é um local de aprendizagem para todas as idades, é parte de nós porque
guarda a nossa história, a nossa cultura ou, então, apresenta-nos outros mundos.
É assim que eu entendo o museu, é assim que eu entendo estas conferências, que
temos agora a oportunidade de revisitar nesta publicação. A todos os que o tornaram
possível, deixo o meu sincero reconhecimento.
6
A actividade
educativa e de extensão
cultural nos museus
Luís Raposo
7
A actividade educativa e de extensão cultural nos museus.
O caso do Museu Nacional de Arqueologia
Luís Raposo
Fig. 1
A ACTIVIDADE EDUCATIVA E DE EXTENSÃO CULTURAL NOS MUSEUS.
O actual Museu Nacional de Arqueologia, sucessivamente designado por Museu
Etnográfico Português, Museu Etnológico Português, Museu Etnológico do Doutor Leite
de Vasconcelos e Museu Nacional de Arqueologia e Etnologia, foi fundado em 1893
e encontra-se sediado na parte oitocentista do Mosteiro dos Jerónimos desde 1903
(fig. 1). Durante décadas foi o mais visitado museu português e constituiu um centro
de encontro da intelectualidade (investigadores e artistas), sendo conhecido simplesmente
por “Museu de Belém” (por ser único existe na zona) ou por “Museu do Doutro Leite
de Vasconcelos”, em lembrança e homenagem ao fundador. Existe hoje numerosa
bibliografia sobre a sua história (v. as referências contidas em Raposo 2008a) e a vida
e obra do seu fundador e primeiro director (v., por exemplo, as referências contidas em
Raposo 2008b, assim como a Fotobiografia do Doutor José Leite de Vasconcelos).
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Ao longo de mais de um século de existência, o MNA desenvolveu sempre, e mantém
actualmente, um forte pendor científico. Durante a maior parte da sua história, mais
exactamente entre 1913 e 1980, esteve ligado organicamente à Universidade de Lisboa.
Os seus primeiros directores realizaram centenas incursões e intervenções arqueológicas
em todo o País, de tal modo que reuniram no Museu aquela se pode chamar
figuradamente como “a maior estação arqueológica portuguesa”.
Do ponto de vista administrativo, o Museu conheceu diferentes modelos organizativos,
traduzidos alguns em diplomas legais ou regulamentares, dos quais o mais recente é
o “Regulamento Interno”, homologado superiormente em 2008. Este estatuto, procura
dar conta da realidade presente do Museu, apresentando o seguinte conjunto de
sectores técnicos especializados:
a) Colecções;
b) Conservação e Restauro;
c) Educativo e de Extensão Cultural;
d) Biblioteca e Arquivo Documental;
e) Recursos Informáticos e Multimédia
O Sector Educativo e de Extensão Cultural, que neste texto nos importa salientar, foi
criado em 1996 (v. Raposo e Almeida 2009) e possui uma centralidade que é expressa
pelo modelo incluído na fig. 2, o qual reproduz e actualiza o que já apresentáramos há
anos, num primeiro texto elaborado para expressar a nossas ideias quanto ao papel
dos museus (Raposo 1997).
Fig. 2
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Entendemos que o centro de atenção da actividade do Museu é o conceito de “utilizador”,
mas do que o de “visitante” (e, entre este, menos ainda do de “visitante ocasional”).
Com efeito, toda a estrutura do MNA assenta na tripla dimensão que o define: um
“museu”, de “arqueologia” e de âmbito “nacional”. Já nos referimos a esta tripla equação
noutro local (v. Raposo 2002). Dentro deste quadro conceptual, repetimos o significado
especial que atribuímos à função de divulgação dos museus, concretizada pelo sobredito
Sector Educativo e de Extensão Cultural, que criámos em 1996, quando inicialmente
tomámos posse da direcção do Museu. Tem este Sector as seguintes atribuições,
definidas regulamentarmente:
a) Conceber, propor e executar programas educativos direccionados para os diferentes
segmentos de público do MNA, nomeadamente, escolar, famílias, visitantes com
necessidades especiais, comunidades de imigrantes, grupos nacionais e estrangeiros,
promovendo a criação de hábitos de visita aos museus;
b) Conceber, propor e executar programas de extensão cultural intra e extra muros,
dando a divulgar o acervo e serviços do MNA e promovendo o gosto pela arqueologia;
c) Conceber, propor e executar programas comemorativos especiais, nomeadamente
os que tenham lugar em torno do Dia Internacional dos Museus;
e) Dinamizar os conteúdos expositivos e as colecções do MNA junto do público escolar
de forma a tornar o Museu um espaço aberto, ao serviço da comunidade;
f) Promover a constituição de uma consciência cívica de educação patrimonial, alertando
para a importância da preservação e divulgação do património arqueológico, impulsionando
a vivência da arqueologia através do sistema “aprender, fazendo”;
g) Criar conteúdos educativos, alicerçados no acervo do MNA, para uso presencial ou
destinados a divulgação multimédia, neste caso com o objectivo prioritário de desenvolver
uma plataforma de interface dinâmica entre o Museu e instituições educativas, usando
para o efeito a plataforma contida no sítio Internet do Museu;
A ACTIVIDADE EDUCATIVA E DE EXTENSÃO CULTURAL NOS MUSEUS.
d) Conceber, propor e executar experiências educativas de extensão cultural inovadoras,
promovendo a cooperação e parcerias com outras entidades e museus, nomeadamente
no âmbito da Rede Portuguesa de Museus;
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h) Assegurar o enquadramento funcional de estagiários e voluntários, no âmbito das
iniciativas e programas patrocinados para o efeito pelo Museu.
As actividades realizadas neste âmbito poderiam ser organizadas em dois grandes
domínios, a saber: actividades dentro de portas e actividades fora de portas.
As primeiras (dentro de portas) incluem as iniciativas tais como:
a) Acção Junto de públicos escolares, organizadas em função dos diferentes níveis de
ensino e incluindo visitas orientadas, dramatizações, réplicas para manuseamento,
oficinas e ateliês, cursos de criatividade, etc.;
b) Acção junto de jovens em geral, incluindo aqui actividades promovidas pelo próprio
MNA ou por entidades terceiras com a adesão do Museu (caso dos programas “O
Museu e as Artes performativas” e “Famílias nos Museus, promovidos ambos directamente
pelo IMC.IP);
c) Acção junto de públicos com necessidades especiais, sob a forma de percursos de
visita a actividades de aprendizagem especialmente concebidas para visitantes e grupos
portadores de deficiência, para visitantes e grupos com especiais carências económicas
e da terceira idade;
As segundas (fora de portas) incluem acções direccionadas para públicos escolares,
implicando estas a deslocação às escolas por parte de equipas do Museu, com
actividades diversificadas: jogos e ateliês educativos (exemplo: “Tesouros antigos /
Jóias de hoje”), concursos de criatividade (especialmente direccionados para escolas
de formação em artes plásticas ou outras)ond esse faz apelo à utilizaram da componente
especifica da sua área de formação (artes visuais, artes performativas, música); ou a
cedência aos professores de material educativo, como é o caso da chamada “maleta
pedagógica”, onde se reúnem réplicas de peças para serem usadas em ambiente de
aula, nas escolas.
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Em texto recente (Raposo e Almeida, 2009), realizámos um inventário mais sistematizado
e exemplificado destas actividades, pelo que nos dispensamos aqui de desenvolvêlas.
A ACTIVIDADE EDUCATIVA E DE EXTENSÃO CULTURAL NOS MUSEUS.
Parece-nos todavia oportuno referir aqui, com maior detalhe e tirando partido de um
inquérito de públicos que se mantém inédito, uma outra frente da acção educativa, e
neste caso sobretudo de extensão cultural do MNA. Referimo-nos àquilo que poderíamos
designar por “programas especiais” e que no fundo visam ou assinalar datas
comemorativas (Dia da Primavera, Dia Internacional dos Museus, Dia da Criança, Dia
da Cultura Científica, etc.) ou promover programas culturais mais inclusivos (Feiras de
Réplicas e Material Didáctico de Arqueologia, Conferências, ciclos de cinema, lançamentos
de livros, etc., Actividades do Grupo de Amigos do MNA, Feira de Livro Antigo e Livro
Usado de Arqueologia, Programa Ciência Viva, nomeadamente o Ciência Viva nas
Férias, À Noite no Museu, Festas de Aniversário, etc.). Trata-se de uma dimensão de
actividade do Museu que tem vindo a adquirir crescente importância, permitindo dar
a divulgar aspectos que normalmente são menos conhecidos do público em geral, a
começar pelos visitantes comuns que raramente se apercebem deste “lado oculto” da
instituição-museu (v., por exemplo, um dos painéis usados durante a Feira de Réplica
a Material Didáctico de Arqueologia, fig. 3).
Fig. 3
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O Caso das comemorações do Dias Internacional de Museus, dando origem a um
conjunto variado de iniciativas que decorrem tipicamente num arco semanal e designamos
por “Festa dos Museus”, merece-nos uma referência especial. Este Festa dos Museus,
que inclui a celebração igualmente internacional da Noite dos Museus e uma Feira de
Saberes e Sabores de nossa iniciativa, inclui actividades tais como: abertura alargada
(até às 24 horas); visitas guiadas a exposições, dramatizações, ateliês, etc.; museu
portas abertas (visitas aos sectores internos), actividades de rua (concertos musicais,
representações teatrais, etc.), colóquios e conferências, projecção comentada de filmes,
etc, etc.
Desde 1999, primeiro ano em que comemorámos com programa especial o Dia
Internacional dos Museus, verificámos um crescendo constante na adesão a este tipo
de programas comemorativo. O gráfico que apresentamos na fig. 4 demonstra-o com
clareza, sublinhando ainda o aumento extraordinário de frequentadores desde 2006,
ou seja, quando começámos a promover a referida Festa dos Museus em toda a sua
extensão.
Fig. 4
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No âmbito desta Festa dos Museus, os espaços exteriores são amplamente ocupados
(v. esquema de distribuição de participantes em 2007, fig. 5) e realizam-se actividades
que atrai milhares de pessoas (v. fig. 6 e 7), de tal modo que esta iniciativa se instituiu
nos últimos anos como a principal a mais frequentada actividade dos museus nacionais
portugueses por ocasião do Dia Internacional dos Museus.
A ACTIVIDADE EDUCATIVA E DE EXTENSÃO CULTURAL NOS MUSEUS.
Fig. 5
Fig. 6
Fig. 7
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Confessamos que no início tínhamos algumas reservas quanto à adequação deste tipo
de iniciativas, as “Festas”, à actividade dos museus. A circunstância de as mesmas
poderem previsivelmente merecer grande adesão do público, como efectivamente
verificámos, não chegava, por si mesma, para nos convencer da sua bondade.
Consideramos os museus como espaços informais de ensino e de formação cidadã
e não como meros instrumentos de diversão social. Por isso seria para nós muito
importante proceder à análise dos públicos da Festa dos Museus – o que fizemos
informalmente logo em 2006 e de forma organizada em 2007.
As observações empíricas realizadas em 2006, e desde aí repetidas até ao presente,
faziam-nos ver que uma percentagem muito elevada dos frequentadores da Festa dos
Museus visitavam de facto os espaços expositivos, seguiam atentamente as visitas
guiada e outros programas educativos que tínhamos preparado, esgotando aliás
rapidamente a nossa capacidade de enquadramento. Realizámos intencionalmente
concertos de estilos musicais diferentes, embora sempre com o cuidado da selecção
de ambientes sonoros por nós considerados compatíveis com um museu em que se
celebra a cultura popular de todos os tempos, e pudemos constatar serem percentual
diminutos os casos de assistentes que apenas aproveitavam para assistir a um
determinado concerto gratuito, sem igualmente visitarem as exposições do Museu.
Animados por esta observação, promovemos em 2007 a realização de um estudo de
públicos, baseado em entrevista oral feita durante os dias da Festa dos Museus e em
questionário escrito distribuído aleatoriamente e garantindo uma amostragem
estatisticamente representativa. A entrevista era dividida em 2 secções: a primeira
relativa a questões gerais sobre o programa comemorativo em causa e a divulgação
e avaliação do mesmo; a segunda destinada a averiguar o perfil sócio-cultural do
visitante, abarcando por isso as perguntas relativas ao sexo, faixa etária, nacionalidade,
área de residência, área de formação e actividade profissional.
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Fig. 8
Fig. 9
Fig. 10
Fig. 11
-Mais de metade dos visitantes nunca tinham estado no Museu;
-São maioritariamente portugueses;
-Provêem maioritariamente da Grande Lisboa;
-Sentem-se satisfeitos e pretendem regressar;
-Atribuem a sua satisfação a:
-Gratuitidade,
-Alargamento do horário de abertura,
-Atmosfera de convívio social, dinamismo e de promoção cultural.
A ACTIVIDADE EDUCATIVA E DE EXTENSÃO CULTURAL NOS MUSEUS.
Registamos nas figs. 8 a 11 as respostas a algumas das principais perguntas feitas aos
frequentadores da nossa Festa dos Museus (fig 8: Já conhecia este Museu antes de
aqui vir para esta Festa dos Museus?; fig. 9: pensamos que os gráficos são suficientemente
elucidativos para dispensarem comentário adicional, senão o do recuso da situação
que expressam, a saber:
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Estes dados fazem-nos reflectir e reconsiderar sobre o papel das comemorações
festivas nos museus. Usados com bom-senso, com programas vinculados à natureza
específica de cada Museu, com carácter de excepção e envolvido por programas
culturais que promovam a maior divulgação dos acervos e da retaguarda institucional
(o “lado oculto” da instituição, normalmente inacessível ao visitante comum, no dia-adia), podem cumprir um papel positivo e até contribuir para o alargamento dos públicos.
Daqui que pensemos ser esta uma estratégia de extensão cultural a prosseguir no
futuro, conjugando-a com novas iniciativas em domínios tais como: maior uso da
Internet, realização de exposições virtuais, disponibilização em linha de conteúdos
educativos não directamente vinculados a exposições, intercâmbio de experiências
(por exemplo fotos de visitas e ateliês), desenvolvimento do blogue educativo já existente,
promoção de Clubes de Arqueologia nas escolas.
Tantas sugestões, como avenidas novas de reinvenção do Museu.
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Bibliografia citada
Fotobiografia de José Leite de Vasconcelos (2008). Ed. Do Museu Nacional de Arqueologia, Lisboa.
Raposo, L. (1997) – “Arqueologia em Diálogo: o papel dos museus”, Arkeos, nº 1, pp. 73-90, Tomar.
Raposo, L. (2002) – “A acção do Museu Nacional de Arqueologia no estabelecimento de parcerias e sistemas cooperativos
em rede”, Actas do Fórum Internacional Redes de Museus, ed. da Rede Portuguesa de Museus, pp. 91-108, Lisboa.
Raposo, L. (2008a) – “Museu Nacional de Arqueologia, Instituição Centenária da Cultura Portuguesa”, Annualia 2007-2008,
pp. 121-139, Ed. Verbo, Lisboa.
Raposo, L. (2008b) – José Leite de Vasconcelos”, Annualia 2007-2008, pp. 179-183, Ed. Verbo, Lisboa.
Raposo, L. e Almeida, M. J. (2009) – “Dentro e Fora de Portas: Actividades Educativas e de Extensão Cultural do Museu
Nacional de Arqueologia”, Actas das 15 Jornadas Estatales de Departamentos de Educación y Accíon Cultural, pp. 101-
A ACTIVIDADE EDUCATIVA E DE EXTENSÃO CULTURAL NOS MUSEUS.
113. Ed do Museo de Belas Artes da Coruña, Coruña.
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Ciência na Sociedade
Paulo Gama Mota
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Ciência na Sociedade
O papel de um Museu de Ciência no séc. XXI
Paulo Gama Mota
O papel dos museus científicos tem vindo a mudar, como a própria inserção da ciência
na sociedade e nas suas relações com a actividade económica e social. A ciência é
uma actividade com enorme impacto social, alvo de imensa cobertura na comunicação
social e que necessita de se tornar acessível. Ao mesmo tempo, o conhecimento
científico é cada vez mais complexo e abstracto, com conceitos de transmissão difícil.
Neste contexto, um museu da ciência para o Séc. XXI deve ser um museu aberto à
sociedade, um espaço de difusão da ciência que auxilie os jovens a descobrir a ciência,
um espaço de convívio que permita a partilha de conhecimentos e de experiências
entre pais e filhos, avós e netos, local de encontro entre a sociedade e a ciência e os
próprios cientistas.
O Museu da Ciência nasceu como um projecto de divulgação da ciência e de criação
de cultura científica e, ao mesmo tempo, de divulgação do património científico da
Universidade de Coimbra. Iniciou a sua actividade a 5 de Dezembro de 2006 e tem
desenvolvido, desde então, um conjunto elevado e diversificado de iniciativas, como
exposições temporárias, conferências, colóquios, semanas da ciência, iniciativas para
os mais jovens como ateliers, sábados no Museu ou ciência em família, ciclos de
cinema, representações de teatro, entre outras.
CIÊNCIA NA SOCIEDADE
Premissas
A Universidade de Coimbra é detentora de um importante e, em alguns casos, único
património científico, que foi acumulando ao longo dos séculos. Assumem particular
relevância mundial as colecções de instrumentos científicos e de objectos de história
natural do séc. XVIII, que documentam, de forma exemplar, o empreendimento iluminista
de conhecer, descrever e compreender o mundo natural, que envolveu os espíritos
mais cultos e empreendedores da Europa da época.
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As colecções da Universidade de Coimbra são ricas em objectos que testemunham
uma ciência feita por homens, que contribuíram para o nosso conceito contemporâneo
de biodiversidade, descobrindo e inventariando as riquezas naturais da América do Sul,
de África, ou do Oriente. Os arquivos, mapas e instrumentos de observação ilustram
bem a vontade de cartografar o planeta e o espaço celeste. Os objectos etnográficos
constituem testemunhos admiráveis de inúmeras culturas, algumas das quais hoje
desaparecidas. De igual modo, os instrumentos de física e de química ilustram as
grandes etapas da descoberta científica, possuindo ainda uma rara beleza.
As qualidades do conjunto Colégio de Jesus - Laboratorio Chimico, a sua localização,
volumetria e valor arquitectónico, permitiram considerar como extremamente válida e
interessante a possibilidade de aí vir a reagrupar as colecções e, ao mesmo tempo,
criar novas ofertas culturais, constituídas por exposições temporárias, loja científica,
espaços de comunicação de ciência e outros. Sublinha-se ainda a localização privilegiada
do conjunto Colégio de Jesus - Laboratorio Chimico, na alta universitária de Coimbra,
bem como a sua arquitectura, com os seus anfiteatros e galerias de exposição, que
constituem testemunhos de uma organização da ciência de que convirá conservar
elementos para os visitantes futuros, preservando o que poderemos designar por
‘espírito do lugar’.
Desde 1994 que se desenvolveram iniciativas tendentes à reorganização dos vários
museus disciplinares existentes, a maioria sem recursos e pessoal suficiente para a sua
manutenção em condições adequadas, conforme o código do ICOM. Para tal, promoveuse uma reflexão interna e a consulta a especialistas mundiais, dos museus de história
natural de Londres, Paris e Nova Iorque. Em 1999 foi constituída uma Comissão para
a elaboração de um programa para o Museu da Ciência, com objectivos e plano de
concretização. O programa, apresentado em 2000, serviu de base para a constituição
do Museu, que inaugurou a 5 de Dezembro de 2006.
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O programa proposto para o museu assentava em um conjunto de princípios:
1. o Museu da Ciência devia agrupar o conjunto de colecções da Universidade de
Coimbra, bem como todos os instrumentos científicos de valor museológico, numa
única instituição, criando as condições para a sua preservação e tornando-as acessíveis
para estudo;
2. pretendia-se criar um pólo nacional de difusão das ciências aberto à sociedade,
apoiando-se no conhecimento dos especialistas da Universidade de Coimbra e nas
relações existentes com a comunidade científica nacional e internacional;
3. em termos museológicos, o programa destinava-se a criar um espaço de difusão
das ciências para um vasto público, incluindo as crianças, tanto em viagens de estudo
como em visitas familiares, e não restrito a um público de especialistas;
4. deveria ter a ambição de difundir os conhecimentos científicos à sociedade, contribuindo
para que os visitantes tomem consciência das relações entre os diversos ramos da
ciência, bem como entre a ciência e a sociedade.
CIÊNCIA NA SOCIEDADE
Assim, o Museu da Ciência a criar deveria ter um carácter interdisciplinar, em termos
da sua filosofia expositiva, não se restringindo a uma área disciplinar; deveria possuir
uma vertente de investigação e uma vertente de actividade pública, de divulgação da
ciência muito forte; deveria promover o diálogo entre a sociedade e a ciência
contemporânea, acolhendo e incentivando a discussão sobre problemas socialmente
relevantes, como a preservação da biodiversidade, o aquecimento global, ou a poluição
e a utilização dos recursos energéticos. Naturalmente, que alguns destes objectivos
colidiram com perspectivas diferentes sobre a natureza organização e função de um
museu de ciência, entre membros da UC. Procurou-se através do diálogo e da construção
desta primeira fase do projecto, tornar evidentes as vantagens do programa proposto
e obter um apoio generalizado.
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Desafios
Colocaram-se vários desafios à equipa museológica para responder aos objectivos
definidos pela Comissão para o programa. Construir um museu de ciência moderno,
capaz de relacionar os objectos históricos com a ciência modernamente produzida e
de cativar o interesse de todos os públicos. Conseguir expor e tornar acessíveis conceitos
científicos, de forma clara, sem ceder a uma excessiva simplificação e infantilização de
conteúdos. Compatibilizar a apresentação dos objectos museológicos com as novas
formas de comunicação: recorrendo ao multimédia e à realização de experiências
interactivas pelos visitantes. Harmonizar uma cenografia moderna com um edifício
histórico com um carácter tão marcante, como este primeiro laboratório português e,
hoje, o mais antigo edifício-laboratório de química existente, com o seu anfiteatro, as
suas nove ‘hottes’ e uma escala surpreendente de 10 metros de pé direito.
Edifício
O diálogo muito próximo e profícuo mantido com a equipa de arquitectura, constituída
pelos Arq. João Mendes Ribeiro, Carlos Antunes e Desirée Pedro, foi determinante para
a resolução da maior parte dos problemas que foram surgindo durante o projecto. Mas,
naturalmente que a grande sensibilidade daquela equipa para as características deste
projecto, envolvendo a recuperação de um importante equipamento histórico e, ao
mesmo tempo, introduzindo importantes marcas de modernidade, sem desvirtuar o
passado, foram extremamente importantes. A intervenção arqueológica veio revelar
que o antigo refeitório jesuíta do séc. XVI fora incorporado na construção do Laboratório
do Séc.XVIII, tendo sido mantidas, embora tapadas, a estrutura do telhado, algumas
janelas e um púlpito. A necessidade de integrar esses componentes na lógica do edifício,
implicou um redesenho de parte do projecto e profundas alterações no programa, que
hoje consideramos terem claramente beneficiado o projecto e contribuído para clarificar
a própria história do edifício. Era claro, desde o início, que não e tratava aqui de fazer
uma reconstituição histórica de um dado momento inicial do edifício, mas de deixar
evidentes as marcas qualificadas das transformações que sofreu, que é também parte
da história da ciência e da química em Portugal. O resultado final consegue um grande
equilíbrio, respeitando o objectivo, pelo que foi contemplado com prémios nacionais
e internacionais de arquitectura.
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Conteúdos
Para o desenvolvimento do programa científico, procurou-se um pequeno grupo de
cientistas da Universidade de Coimbra para a elaboração do guião e conteúdos científicos
da exposição permanente, designada “Segredos da Luz e da Matéria”. A exposição
permanente apresenta um carácter interdisciplinar, combinando conhecimentos e
objectos de várias áreas, mas de modo a construir um discurso coerente e cientificamente
consistente. A exposição desenvolve-se em cinco áreas, vários aspectos da interacção
entre a luz e a matéria: as propriedades da luz, a interacção entre a luz e a matéria, a
luz do Sol, a luz e a visão dos animais, as cores.
Equipas
O sucesso de um projecto museológico desta natureza depende da qualidade do
trabalho de inúmeras equipas. Operando dentro dos condicionalismos de projectos
públicos, procurámos assegurar, em cada caso, as empresas que nos garantissem a
melhor qualidade dentro de custos razoáveis, através da definição criteriosa dos
objectivos e dos critérios de selecção. Na verdade, o projecto, mesmo com as alterações
introduzidas, pôde ser mantido dentro dos valores inicialmente previstos de 3 milhões
de euros.
CIÊNCIA NA SOCIEDADE
Equipa do Museu
O Museu possui uma equipa reduzida de pessoas qualificadas e altamente motivadas,
que foi constituída no processo de implementação do Museu e nos primeiros tempos
de actividade. É graças ao enorme profissionalismo e espírito de entreajuda e de
compreensão de que o objectivo colectivo, de prestar o melhor serviço aos nossos
visitantes, é um componente central dos objectivos de cada um, que o Museu tem
conseguido consolidar a sua actividade e projectar uma imagem de grande dinamismo.
A distribuição de responsabilidades e a avaliação regular do trabalho colectivo são
também componentes decisivas de uma actividade intensa, coordenada e responsável.
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Museologia
A museologia desenvolvida para o Museu baseou-se em experiências recentes – em
particular a Grande Galeria de Evolução do Museu de História Natural de Paris, e a
Cosmocaixa, de Barcelona –, combinando objectos, experiências e elementos interactivos,
com multimédia, numa forma multimodal de apresentação do conhecimento científico.
Pretendia-se criar uma exposição envolvente, permitindo uma interacção fecunda entre
a ciência e as questões que afectam a sociedade de um modo mais directo. A exposição
é apenas uma viagem por uma pequena fracção do conhecimento científico. Mas,
pretendia-se que fosse uma viagem impressiva, que interessasse os visitantes pela
ciência.
Cada núcleo temático possui um conjunto de objectos ou instrumentos científicos
históricos que contextualizam as experiências ou fenómenos que se procuram explicar,
através de módulos interactivos de diversos tipos, de representações e de multimédia.
Um dos princípios por que nos guiámos era o de que todos os fenómenos e experiências
teriam que ser realistas. Para manter a sua necessária espectacularmente, foi necessário,
em alguns casos, proceder a modificações já na fase de teste e utilização. Tivemos,
para isso, o importante apoio de vários colegas cientistas da UC para o aperfeiçoamento
de módulos científicos, até que estes atingissem os resultados pretendidos, em termos
de eficácia museográfica.
A atribuição ao Museu da Ciência do Prémio Micheletti 2008, para o mais inovador e
promissor museu de ciência, técnica e indústria da Europa foi motivo de grande satisfação
pelo que significa de reconhecimento de que um museu universitário no sul da Europa
pode realizar um trabalho qualificado, profissional, visualmente apelativo e
museologicamente eficaz e ver esse trabalho reconhecido por um dos mais exigentes
júris.
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O Júri do Prémio considerou particularmente interessantes e bem conseguidos: a
sensibilidade do restauro de um edifício de grande valor histórico; a opção por uma
temática interdisciplinar; a integração entre o moderno e o antigo, sem rupturas e
choques, antes tirando partido da interacção resultante; a qualidade dos interactivos
e, em particular, o facto de os conteúdos multimédia não serem demasiado infantis; o
programa de actividades e a preocupação de trabalhar com públicos com necessidades
especiais; a qualidade das publicações.
Um Museu de ciência para o Século XXI
Ao longo dos últimos três anos a actividade do Museu da Ciência tem crescido sempre
de forma sustentada e exponencial. O número e diversidade de actividades e iniciativas,
o número de visitantes, a participação de colaboradores e as colaborações que foram
sendo solicitadas ao Museu, todas cresceram de forma acentuada.
Alguns programas criados, como os sábados no museu – ateliers de experimentação
dedicados a um tema em cada sessão, com públicos entre os 5 e os 12 anos -, a
ciência em família, destinada a uma exploração de um tema em ambiente familiar, com
pais e filhos, avós e netos, ou as férias no chimico, tiveram um enorme sucesso desde
a sua criação e são hoje parte integrante do que representa o Museu da Ciência para
uma parte significativa do seu público.
Os museus podem e devem ser locais privilegiados para o necessário diálogo entre a
ciência e a sociedade. Mas, para que tal aconteça, é vital que as questões difíceis e
os problemas que afectam a sociedade não sejam colocados à distância, ou de
quarentena, mas sejam directamente abordados nos museus. Muitas destas questões
possuem lados económicos e políticos que estão para lá do âmbito da ciência. Mas,
mesmo nesses casos, o conhecimento científico pode contribuir decisivamente para
a construção de uma opinião informada sobre os problemas.
CIÊNCIA NA SOCIEDADE
O Museu tem sido procurado também pela comunidade universitária para a realização
de actividades públicas, como congressos, conferências, lançamento de livros, ou a
realização de ciclos de cinema. Essa missão de mediador por excelência, entre os
cientistas e académicos, em geral, e o público, foi sempre assumida como vital para
o projecto de um Museu da ciência moderno e interventivo.
29
Darei um exemplo concreto da forma como um tema socialmente importante foi
abordado no Museu e como foi possível desdobrá-lo em várias actividades, cada uma
dirigida a um público específico, com uma linguagem e um formato adequado ao público
alvo.
Uma exposição sobre a biodiversidade, a partir das comemorações dos 300 anos de
Lineu, serviu de mote para várias iniciativas em torno do tema. Realizaram-se discussões
científicas sobre estes temas, actividades dirigidas a um público mais generalista, como
um ciclo de cinema sobre o ambiente com comentários dos filmes, ou o acolhimento
do Festcine Amazónia. Foram ainda realizadas actividades para os mais jovens, como
atelieres, ou férias no chimico com o título ‘SOS Terra’, entre outras.
O projecto educativo
A Área Educativa do Museu da Ciência, promove um amplo conjunto de iniciativas que
pretendem fomentar a divulgação e interpretação dos conteúdos abordados nos espaços
expositivos e de outros temas científicos pertinentes. Com forte componente interactiva,
a visita ao museu estimula o diálogo e discussão de ideias. Os monitores do Museu,
além de orientarem as visitas e de realizarem outras actividades ‘hands-on’, participam
activamente no processo conceptual e de implementação das novas actividades
educativas no Museu. O número de novos ateliers e de novas experiências tem vindo
sempre a aumentar ao longo do tempo de funcionamento do Museu, aumentando
concomitantemente a oferta. Todas as actividades são cientificamente validadas por
cientistas que colaboram activamente e de forma muito disponível com a equipa
educativa.
A presença na web
Um museu hoje não pode prescindir de uma presença forte na web, o que é
particularmente mais significativo num museu de ciência. A página web do Museu da
Ciência (www.museudaciencia.org) é um instrumento de diálogo e troca de informações
essencial com o nosso público, quer aquele que nos visita frequentemente, quer aquele
que o faz de forma mais esporádica. Procurámos que a página tivesse conteúdos
essenciais, apresentados de forma clara, simples e com um bom design. O sistema
funciona com umback-office que permite a actualização diária de conteúdos sem
30
necessidade de qualquer especialista de informática. Essa é uma condição necessária
para que a página se mantenha activa, actualizada e com conteúdos sempre renovados.
O crescimento exponencial das actividades do Museu tornou necessária uma revisão
de algumas secções para tornar o acesso à informação mais organizado, processo
que se encontra em fase de levantamento de necessidades.
O sítio web do Museu é também um repositório muito importante de conteúdos
museológicos, permitindo o acesso às colecções da Universidade de Coimbra, através
do Museu Digital (http://museudaciencia.inwebonline.net/), que constitui a maior base
de dados nacional de colecções científicas. Nela é possível pesquisar mais de 22 mil
objectos, categorizados por instrumentos científicos, história natural, objectos etnográficos
ou modelos. Este projecto, que tem mobilizado importantes recursos humanos, continua
a desenvolver-se e virá, dentro de algum tempo, a merecer uma substancial transformação
para tornar ainda mais acessível e apelativa a interacção com as colecções científicas
da Universidade de Coimbra.
Mais uma vez, trata-se de requalificar um importantíssimo edifício histórico, um dos
primeiros colégios jesuítas, que acolheu, no decurso da reforma pombalina da UC, os
primeiros gabinetes de física e de história natural, documentando, de forma marcante
o desenvolvimento da ciência moderna em Portugal, na altura acompanhando o
movimento dos centros mais desenvolvidos da Europa. A tensão entre história e
modernidade, entre história da ciência e a ciência tal qual se faz, serão o motor do
desenvolvimento da nova fase do Museu.
CIÊNCIA NA SOCIEDADE
A segunda fase do projecto do Museu da Ciência
O Museu da Ciência desenvolve-se em duas fases. Concretizada a primeira, trata-se,
ao mesmo tempo que se consolida a actividade, de proceder à recuperação do Colégio
de Jesus, edifício fronteiro ao Laboratorio Chimico, para aí agrupar todos os núcleos
museológicos dispersos, criando reservas para todas as colecções, uma grande área
de exposição permanente, áreas para exposições temporárias, programas educativos,
apoio à investigação e espaços associados, como loja e restaurante. A filosofia
museológica e os princípios de restauro e requalificação do edifício serão os mesmos
que foram testados com sucesso no Laboratorio Chimico.
31
Museus ao Alcance
das Nossas Mãos
MUSEUS, EDUCAÇÃO E CIDADANIA
Suzana Faro
33
Museus ao Alcance das Nossas Mãos
Suzana Faro
I.
O desafio lançado é o da abordagem dos “Museus e Sociedade”, dos museus e sua
função social, dos museus do século XXI e a sua responsabilidade social. Os museus
numa sociedade democrática, sistémica, fortemente mediatizada como a nossa.
Que museus?
O museu do século XXI é um museu ao “serviço da sociedade e do seu desenvolvimento”
como o define o ICOM. É, por isso - ou deve ser - um museu de proximidade, um lugar
de pessoas e de conhecimentos, de envolvimento e de participação do cidadão, um
1
mediador cultural, um espaço de contacto e mesmo de “contaminação” , partilhando
universos vários de experiências humanas.
Um museu de vocação democrática…
… acessível, inclusivo, contribuindo para a formação cívica e para uma melhor cidadania.
Recordando que a cidadania é fundamentalmente uma questão de participação. Um
2
museu olhando através das paredes como nos recorda Richard Sandell , numa atitude
de proximidade e de disponibilidade, atento às necessidades das comunidades, sabendo
ouvir, fomentando parcerias, comunicando e comunicando-se. Sabendo ser ele próprio
comunidade, ciente de que acessibilidade – igual oportunidade de participação – é em
primeiro lugar uma atitude.
Um museu pautado por valores de interculturalidade…
… (comemorou-se em 2008 o Ano Internacional do Diálogo Intercultural) aprendendo
e instruindo para os valores da diversidade, assumindo que a globalização permite
potenciar a afirmação da “diferença” a uma escala nunca antes pensada, recusando
um suposto papel homogeneizador.
1
Na expressão de João Teixeira Lopes.
2
SANDELL, Richard – Means to an End: Museums and the Combating of Social Inequality. In SEMEDO, Alice et al. (orgs.) – A Cultura em Acção: Impactos sociais e território.
Porto: Edições Afrontamento, 2003. ISBN 972-36-0691-7.p.47-54.
MUSEUS AO ALCANCE DAS NOSSAS MÃOS
Um museu movendo-se num mundo sistémico…
… tecendo nesta teia de redes um enorme potencial comunicativo, associando à sua
capacidade de promover o conhecimento e a fruição, a possibilidade de o partilhar de
forma alargada.
35
Um museu espaço de criatividade e de inovação…
… (tema do próximo Ano Internacional – 2009), num mundo de forte concorrência de
estímulo dos sentidos, de promoção do conhecimento e acesso à informação,
recordando-nos a sua capacidade de se envolver nas designadas “indústrias criativas”.
Um museu num mundo que alterou as noções de espaço e de tempo
3
O museu será a heterotopia de Foucault enquanto espaço sem tempo de acumulação
4
de tempos. Um lugar antropológico que contraria os não lugares de Augé . A facilidade
de comunicação ao nível global, enquadrada pela redução das distâncias espaciotemporais e facilitada pelas ferramentas que a amplificam, vieram, inquestionavelmente,
contribuir para o surgimento de novos e mais alargados contextos de actuação,
potenciando cada um de nós como cidadão do mundo.
É, assim um museu atento às necessidades de populações de um mundo global (ou
glocal, como tantas vezes se refere), não desperdiçando essa imensidão de espaço
para a sua partilha, mas atento também ao excesso de tempo permitido pelo alargamento
da esperança de vida.
O museu do século XXI move-se num mundo de enormes potencialidades – diríamos
antes desafios. É um espaço de contacto e não um centro (já que centro é um ponto
gerando periferias). Desafios de identidade e de enraizamento das pessoas, das
comunidades, na capacidade de comunicação mediática e imediata, nas inúmeras
ferramentas e tecnologias que tem hoje ao seu dispor para amplificar a sua voz e tornar
mais apelativas as suas propostas expositivas, cativando as pessoas pela promoção
da experiência (hands on), da reflexão e debate até de temas da actualidade (minds
on), das emoções e da afectividade (hearts on). Partilhando um sentido de pertença,
de modo a “cultivar o horto comum e convertê-lo em carinhoso objecto do nosso
5
desejo” .
Porque os museus existem porque existem pessoas. Porque, como nos recorda Kenneth
Hudson, o mais importante será que cada pessoa leva ao sair do museu um pouco
mais do que tinha quando entrou. Porque os museus estão ao alcance das nossas
mãos.
36
3
Cit in SILVANO 2001 SILVANO, Filomena – Antropologia do Espaço. Uma introdução. Oeiras: Ed. Celta, 2001. ISBN 972-774-099-5.
4
AUGÉ, Marc – Los “no lugares” espacios del anonimato: Una antropologia de la sobremodernidad. 2ª ed. Barcelona: Gedisa Editorial, 1995. ISBN 84-7432-459-9.
5
GINER, Salvador – La urdimbre moral de la modernidad. In GINER, Salvador, e Riccardo SCARTEZZINI (eds.) - Universalidad e diferencia. Madrid: Alianza Editorial, 1996
(Alianza Universidad; 852). ISBN 84-206-2852-5. p.43-80,
II.
Neste contexto, partilhamos de seguida alguns dos projectos que o Museu dos
Transportes e Comunicações tem vindo a abraçar.
Onde?
Sedeado no edifício da Alfândega Nova do Porto, em Miragaia, junto ao Douro e
integrando o centro histórico da cidade, na periferia da zona histórica classificada pela
UNESCO como Património da Humanidade.
MUSEUS AO ALCANCE DAS NOSSAS MÃOS
Um edifício com estilo
Monumental na sua arquitectura e dimensões, sóbrio nas suas linhas neoclássicas e
no granito e ferro da sua construção, a Alfândega Nova viu iniciada a sua construção
em 1859, como resposta às exigências da burguesia portuense de fixar o comércio na
cidade. Edifício austero, representante do poder do Estado, abre-se para o rio enquanto
porta da cidade para entrada de pessoas e de mercadorias.
Fig.1 – Edifício da Alfândega Nova do Porto - © Pedro Canto Brum
37
O desafio de 16 anos da AMTC
Constituída em 1992 como Associação privada sem fins lucrativos e declarada de
Utilidade Pública no ano seguinte, abre-se à cidade como espaço de cultura e de
partilha, primeiro alicerçada num projecto educativo de dinamização de exposições
temporárias, para a partir de 2000 dar início à sua programação permanente –
inaugurando esse ano a exposição “O Automóvel no Espaço e no Tempo”, em 2002
a proposta interactiva “Comunicação do Conhecimento e da Imaginação” e em 2006
a exposição dedicada à memória do lugar “Metamorfose de um Lugar: Museu das
Alfândegas”.
O Museu
Neste contexto – Miragaia, Porto, transportes, comunicações, Alfândega, pessoas –
desenvolve o Museu o seu projecto cultural alicerçado em práticas de mediação que
se assumem como experiências válidas e aprendizagens permanentes.
38
III.
De entre os muitos projectos do nosso Museu destacamos alguns, selecção esta
porventura sugerida pelo tema da presente Conferência.
MUSEUS AO ALCANCE DAS NOSSAS MÃOS
Viajar com o Museu
Um projecto de exposição itinerante que mereceu o apoio da Rede Portuguesa de
Museus, promovendo parcerias e implicando o Museu no tecido social.
No seu percurso de itinerância aportou em hospitais, estabelecimentos prisionais, juntas
de freguesia, associações… para além de outros espaços já tradicionalmente associados
ao trabalho do museu, levando-o fora de portas para junto de públicos que, por motivos
vários, se encontram alheados, ou até mesmo impossibilitados de o visitar, procurando
interpretar diversas realidades, discursos e formas de agir.
Esta missão exigia novas posturas e diferentes abordagens das utilizadas no espaço
físico do Museu, ao mesmo tempo que assumia como espaços “naturais” de actuação
outros lugares e vocações, alicerçados no envolvimento de novos parceiros. Estes
constituíram, pois, os objectivos primordiais do projecto.
Fig.2 – Exposição Itinerante “Viajar com o Museu” - © Arquivo AMTC
39
Fig.3, 4 e 5 - Exposição Itinerante “Viajar com o Museu” - © Arquivo AMTC
Porto de Crianças
Projecto de parceria entre a Câmara Municipal do Porto, escolas e museus, desenvolvendo
projectos pedagógicos diversos no Museu a partir de um tema previamente definido
e que procura criar laços de proximidade com as comunidades, dedicando-se num
primeiro momento ao público escolar, para logo os convidar a voltar ao museu com
os pais, irmãos, avós…
Porto Desconhecido
Projecto desenvolvido pela ANILUPA – cinema de animação da Associação de Ludotecas
do Porto - em parceria com museus, fazendo pontes entre os mais velhos (através de
História Oral de recolha de histórias de vida) e os mais novos (que a partir destes
testemunhos são convidados a criar o seu filme animado).
40
Noite dos Museus – 17 de Maio de 2008
Em parceria com escolas artísticas da Área Metropolitana (dança e música) o Museu
proporcionou uma visita nocturna ao edifício da Alfândega, seguindo os trilhos da
memória do lugar, numa noite ímpar e amplamente partilhada que se prolongou
madrugada dentro.
Fig.6 e 7 – Noite dos Museus (2008) - © Arquivo AMTC
Fig.8 – Oficina de Natal (2005) - © Arquivo AMTC
MUSEUS AO ALCANCE DAS NOSSAS MÃOS
Pés e Mãos Sobre Rodas
Uma proposta para os mais novos nas férias de Natal de 2005 – construção de carrinhos
de rolamentos -, apelando a uma memória/ponte (com) dos mais velhos a partir do
tema de uma das exposições permanentes do Museu – os transportes e em particular
o automóvel.
41
Vamos arquitectar
Trata-se de uma proposta de grandes projectos para pequenos arquitectos, desenvolvido
em colaboração com a Secção Regional Norte da Ordem dos Arquitectos e ocupando
um período da pausa lectiva da Páscoa 2006.
Fig.9 – Oficina de Natal (2006) - © Arquivo AMTC
Encontros sobre Acessibilidade
No âmbito de uma candidatura intitulada “Saber Receber” e apoiada pela RPM (PAQM)
o Museu realizou em 2005 um ciclo de encontros sobre acessibilidade, direccionados
para profissionais de museus e com o apoio de diversas instituições vocacionadas para
as questões da “diferença” (Ensino Especial da DREN, Centro de Reabilitação de Vila
Nova de Gaia, Associação de Surdos do Porto, …). O objectivo, de resto cumprido,
era o contacto e aprendizagem sobre as necessidades “especiais” que a visita de cada
pessoa ao Museu pode implicar, aprendizagens estas que vieram promover uma maior
eficácia de comunicação do Museu com os seus públicos.
42
MUSEUS AO ALCANCE DAS NOSSAS MÃOS
Museus ao alcance das nossas mãos
Afirmando-se como um museu cada vez mais associado às questões/preocupações
da actualidade, mais interveniente, mais cívico, mais actuante no tecido social, mais
pertinente em termos de actuação prática, o Museu dos Transportes e Comunicações
procura, assim, tornar-se relevante para a vida de um número crescente de pessoas:
um museu ao serviço da sociedade e do seu desenvolvimento (conforme definição de
museu apresentada pelo ICOM).
43
A Criação do
Núcleo Museológico
do Centro Histórico
de Caminha
Sérgio Cadilha
45
A Criação do Núcleo Museológico do Centro
Histórico de Caminha
Sérgio Cadilha
Introdução
O Projecto de Criação do Núcleo Museológico do Centro Histórico de Caminha na
Torre do Relógio, Monumento Nacional emblemático e simbólico da Vila de Caminha,
foi uma aposta da autarquia que pretendeu, com ele, promover a recuperação física
de um dos seus mais importantes ícones culturais e arquitectónicos, devolvendo-o ao
usufruto da população, renovado, melhorado e comunicativo do valor e importância
histórica de Caminha.
O Monumento Nacional “Torre do Relógio” poder-se-á tornar, pelas razões históricas
ligadas à fundação da vila, pela sua arquitectura imponente e pela sua localização
central, um importante e estratégico pólo de atracção turística e de dinamização social
e cultural.
Partindo destes pressupostos, foi elaborado um projecto com o claro objectivo de
ultrapassar a simples recuperação estrutural e arquitectónica do edifício, pretendendose antes que esta fosse o mote para criar uma ponte de comunicação da história da
vila de Caminha com os públicos.
Identidade, História e Memória são assim os valores que regem o Núcleo Museológico
do Centro Histórico de Caminha, pois acreditamos que, na era da globalização, um
povo conhecedor das suas raízes históricas e culturais é um povo mais consciente da
sua identidade e preparado para os desafios que a “aldeia global” permanentemente
coloca.
A materialização do projecto foi alcançada com a aprovação de uma candidatura ao
Programa Operacional da Cultura, com um investimento total de 635.478.40¤.
A CRIAÇÃO DO NÚCLEO MUSEOLÓGICO DO CENTRO HISTÓRICO DE CAMINHA
Nascia assim o Núcleo Museológico do Centro Histórico de Caminha, com as premissas
de se tornar um local vivo, dinâmico, apelativo, moderno, ao serviço da divulgação e
dinamização cultural.
47
Missão.
O Núcleo Museológico do Centro Histórico de Caminha tem como missão a investigação,
divulgação, dinamização e comunicação da História da Vila de Caminha a todos os
seus visitantes e persegue os seguintes objectivos:
1. Promover o Centro Histórico de Caminha, assumindo a Torre do Relógio o papel de
ícone dessa divulgação;
2. Potenciar da ligação afectiva da população do Concelho com o seu património;
3. Diversificar os recursos turísticos presentes na Vila de Caminha, criando um novo
espaço de visita com condições para contrariar o carácter sazonal da procura turística
e visando captar e fidelizar novos públicos;
4. Realizar acções de animação associadas à história da Vila de Caminha;
5. Contribuir para o aumento do conhecimento do Centro Histórico de Caminha;
6. Documentar o Centro Histórico de Caminha, através da investigação histórica e
arqueológica, de modo a potenciá-lo como um importante instrumento educativo no
âmbito da acção do Núcleo.
O Núcleo Museológico do Centro Histórico de Caminha
Enquanto espaço museológico, este Núcleo deverá responder às exigências que
aparecem preconizadas na Lei-Quadro dos Museus (Lei n.º 47/2004 de 19 de Agosto):
o estudo e investigação; a incorporação; inventário e documentação; conservação;
segurança; interpretação; exposição e educação.
O Núcleo Museológico do Centro Histórico de Caminha encontra-se instalado na Torre
do Relógio, torre principal do castelo medieval de Caminha e palco de toda a sua
vivência secular, é Monumento Nacional classificado pelo Decreto N.º 38 147 DG 4 de
5 de Janeiro de 1951, tendo por isso necessidades e condicionalismos específicos que
tornaram a execução deste projecto um trabalho exigente, ao nível da preocupação
com as estruturas, com a arquitectura, com a compatibilização de materiais e na
iluminação e equipamentos instalados.
48
A elaboração do discurso expositivo obrigou à colocação de importantes questões
relativas à sua adaptação a um espaço físico que se encontrava estruturado à partida,
e que limitava o projecto ao nível da instalação de infra-estruturas que nunca poderiam
colidir com a capacidade do visitante percepcionar o monumento e sentir que se
encontra num espaço construído há cerca de 750 anos.
Foi idealizado um espaço que combinasse história com modernidade, numa convivência
harmoniosa, e num discurso expositivo dinâmico e cativante, alicerçado na comunicação
audiovisual de conteúdos numa sala especialmente criada para o efeito.
Para os visitantes que pretendam aprofundar conhecimentos acerca da Vila de Caminha
foram criadas ofertas ao nível de suportes escritos (catálogo e roteiro), visuais (DVD e
CD-ROM) e ainda ao nível de experiências e actividades educativas.
Apesar de se ter tido especial cuidado em facilitar o acesso ao núcleo, nomeadamente
através da adopção de novo desenho das escadas, com degraus mais baixos e longos,
foi impossível eliminar as barreiras físicas que impedem a visita a pessoas com dificuldades
motoras acentuadas devido às características arquitectónicas singulares do edifício.
Considerando o reduzido espaço existente no interior da Torre do Relógio, a par das
múltiplas oportunidades e acessibilidades que se pretendem disponibilizar ao público,
a recepção é mais do que um simples posto de venda de bilhetes. É um posto de
informação turística, é o local onde se efectua o controlo de acessos (importante para
manter um número controlado de pessoas a circular no interior da Torre), controlo da
vídeo-vigilância, controlo de conteúdos em exibição na sala audiovisual, cacifos e loja.
O visitante tem ainda à sua disposição um terminal informático onde pode aceder aos
vários outputs produzidos, aceder à internet e consultar o seu e-mail num espaço
totalmente user friendly.
A CRIAÇÃO DO NÚCLEO MUSEOLÓGICO DO CENTRO HISTÓRICO DE CAMINHA
Recepção
Sendo o local onde se estabelece o primeiro contacto entre a instituição e o visitante,
a recepção assume primordial importância na eliminação de barreiras psicológicas que
inibam a entrada dos visitantes e na transmissão de um sentimento acolhedor de bemestar.
49
Fotografia 1 A Recepção do Núcleo Museológico do Centro Histórico de Caminha.
A Sala Audiovisual
A exposição não convencional materializa-se numa sala audiovisual onde os visitantes
podem visionar os três filmes disponíveis.
Fotografia 2 A sala de audiovisual.
50
Estão disponíveis ao público três vídeos diferentes:
- “Caminha, das origens aos nossos dias” – Filme documental sobre a evolução histórica
e urbana da Vila de Caminha.
- “Era uma vez… Caminha” - A história da Vila de Caminha contada aos mais novos.
- “Criação do Núcleo Museológico do Centro Histórico de Caminha” – Filme que
documenta as várias fases de elaboração e execução do projecto.
A Torre do Relógio
Pelo seu significado histórico ligado à fundação da Vila de Caminha, pela sua imponência
arquitectónica e pela sua localização central, o Núcleo Museológico do Centro Histórico
de Caminha assume-se como um dos mais importantes pólos de atracção turística,
um ex-libris patrimonial e um dos locais de maior interesse cultural da vila.
Era necessário, pois, compatibilizar esta expectável diferença entre os diferentes públicos
tendo em atenção as suas necessidades e anseios, pelo que se tornou óbvio, desde
cedo, que a melhor solução seria a opção pelo recurso a equipamento tecnológicos
que libertassem as circulações e, ao mesmo tempo permitissem a exposição de
conteúdos.
Seguindo esta premissa, optamos por colocar em exposição permanente apenas 3
objectos, dois deles marcantes na história da vila de Caminha, e colocados
estrategicamente no percurso do visitante.
No patamar do primeiro piso, encontra-se exposta uma maquete da Vila de Caminha
nos sécs. XIII/XIV, o que permite ao visitante uma primeira panorâmica do aspecto da
vila aquando da sua fundação.
A CRIAÇÃO DO NÚCLEO MUSEOLÓGICO DO CENTRO HISTÓRICO DE CAMINHA
Por estas razões, é importante que o programa museológico consiga responder a todo
o tipo de públicos. O Núcleo tem de conseguir proporcionar uma experiência positiva
na visita àqueles que apenas pretendem usufruir do edifício (Torre do Relógio) como
daqueles que o visitam à procura de novos conhecimentos (Núcleo Museológico).
51
Fotografia 3 Maquete da Vila de Caminha no séc. XIII/XIV.
Após entrar na Torre os visitantes alcançam um patamar onde encontram o segundo
objecto. Trata-se de uma laje em granito onde se pode ler uma inscrição que data a
fundação da Vila de Caminha, no séc. XIII pelo rei D. Afonso III.
No último piso, antes de sair para o Caminho de Ronda, os visitantes podem observar
a máquina do relógio que acabou por dar o nome de Torre do Relógio à antiga Torre
de Menagem do Castelo Medieval da Vila de Caminha.
Fotografia 4 Provável réplica da laje fundacional da Vila de Caminha.
52
Saindo para o Caminho de Ronda, os visitantes
têm uma magnífica vista panorâmica sobre a Vila
de Caminha, o Rio Minho e a vizinha Espanha,
sendo este um factor importante de atracção ao
Núcleo Museológico.
Fotografia 6 Vista da Vila de Caminha desde o Caminho de Ronda do Núcleo Museológico do Centro Histórico de Caminha.
Após a visita ao interior da Torre do Relógio o passeio pelo Caminho de Ronda estimula
todos sentidos e acaba por dar aos visitantes a experiência sensorial de tudo quanto
aprenderam desde o início da visita. Aqui podem observar a implantação singular do
casco histórico, a sua forma circular, a ortogonalidade das suas ruas, o seu
desenvolvimento em época moderna, cujo símbolo máximo é o Terreiro frontal à Torre
do Relógio/Núcleo Museológico.
A CRIAÇÃO DO NÚCLEO MUSEOLÓGICO DO CENTRO HISTÓRICO DE CAMINHA
Fotografia 5 Máquina do relógio da Torre.
53
O Núcleo Museológico do Centro Histórico aposta nesta apropriação do lugar pelos
sentidos, por isso destacamos o espaço, a sua riqueza arquitectónica, a sua implantação
geográfica na Vila de Caminha, optando-se pela exposição minimalista dos objectos
mencionados e deixando para outros suportes a exploração mais exaustiva da informação,
como por exemplo o catálogo e roteiros do Núcleo Museológico do Centro Histórico
de Caminha e os filmes produzidos para o efeito.
Fotografia 7 O catálogo.
A exposição não se considera contudo fechada ou acabada. O discurso expositivo,
os objectos e os conteúdos expostos representam apenas um conjunto de conhecimentos
adquiridos acerca de Caminha que a investigação histórica e arqueológica, em contínuo
desenvolvimento e a seu tempo, se encarregarão de confirmar ou desmentir (ou ampliar),
sendo obrigação do núcleo interpretar, actualizar e expor todos os novos conhecimentos
e documentos que surjam sobre Caminha e a sua História. Desta forma é importante
que este núcleo museológico não seja entendido como um espaço tradicional de
exibição de uma colecção, sendo antes visto como um espaço de visita, interpretação
e reconstituição histórica de Caminha através dos tempos.
54
Serviços Educativos
Os serviços educativos são uma vertente essencial da nova museologia, visando
melhorar a experiência de visita, explorando as temáticas e os conceitos da mesma,
tanto em contexto de exposição como fora dela, pelo que se encarregam de desenvolver
acções educativas junto dos públicos.
Devido à importância que tem na transmissão da mensagem das exposições e na
aquisição de conhecimentos, sobretudo pelos públicos jovens e infantis, foi desenvolvido
um programa de actividades específicas sobre os conteúdos exibidos no Núcleo, que
são desenvolvidas na Torre do Relógio, no Museu Municipal de Caminha e no próprio
Centro Histórico.
A função educativa é de sobremaneira importante num espaço museológico, pois a
experiência de aprendizagem não se limita ao espaço físico de uma sala de aula ou a
uma determinada faixa etária, estende-se a todos os espaços de vivência ao longo de
toda a vida. É pois importante que o Serviço Educativo tenha a capacidade de aproximar
o núcleo museológico de todos os públicos, conduzindo a uma experiência de visita
gratificante e enriquecedora, numa visão democratizada da cultura.
A CRIAÇÃO DO NÚCLEO MUSEOLÓGICO DO CENTRO HISTÓRICO DE CAMINHA
Visitas guiadas, peddypaper, caça ao tesouro, concursos variados, celebração de dias
temáticos como o Dia Internacional dos Museus e o Dia Internacional dos Monumentos
e Sítios, Feira Medieval, concursos de pintura e fotografia, colóquios e conferências
são apenas algumas actividades que o Núcleo Museológico do Centro Histórico de
Caminha desenvolve numa perspectiva de exploração da história local.
55
Site na Internet
A presença na internet é, nos dias de hoje, essencial para qualquer instituição,
museológica ou não. Assim, foi preparada uma página na internet com o objectivo de
aumentar e potenciar os pontos de contacto com os públicos, sendo através dela que
se efectua muita da divulgação de actividades e através da qual recebemos muitas
solicitações de informações e serviços relativos ao Núcleo Museológico do Centro
Histórico de Caminha.
Site na Internet: www.torredorelogio.com
Fotografia 8 Atelier de Modelagem durante a comemoração do Dia Internacional
dos Monumentos e Sítios
56
Criação da Logomarca do Núcleo Museológico do Centro Histórico de Caminha.
Hoje em dia um Museu, ou qualquer instituição cultural, insere-se num “mercado” tendo
de “enfrentar” instituições similares que competem pelos mesmos públicos.
Desta forma a mentalidade que preside à criação destes novos espaços, é uma
mentalidade imbuída de sentido cívico, mas também de algum carácter competitivo,
pelo que a “imagem” que passamos aos públicos é, hoje, sobremaneira importante.
Aquando das primeiras reuniões com o designer, surgiram de imediato questões
importantes que concepção da imagem teria de ultrapassar:
- Como comunicar para um público indiferenciado e alargado, desde visitas colectivas
de escolas básicas e secundárias a visitas turísticas individualizadas?
- Como comunicar um projecto complexo de linguagem técnica de uma forma acessível
e descodificada?
- Como conseguir comunicar, através de uma imagem forte e marcante, os valores
patrimoniais e singulares da Vila de Caminha?
Foram realizadas diversas reuniões com o designer em que lhe foram comunicados os
valores patrimoniais da Vila de Caminha, a dinâmica do Núcleo Museológico do Centro
Histórico de Caminha numa tentativa de se desenvolver um conceito gráfico que
explorasse a relação entre os públicos, a Torre do Relógio a Vila de Caminha e a própria
história da Vila.
A CRIAÇÃO DO NÚCLEO MUSEOLÓGICO DO CENTRO HISTÓRICO DE CAMINHA
- Como criar uma imagem forte, expressiva, jovem, viva e dinâmica, tendo como temática
base a história?
57
Após este processo chegamos a uma logomarca cuja forma em “C” que procura
evidenciar:
-“C”de Caminha;
- A forma ovalada das muralhas medievais de Caminha com as suas 13 torres (3
grandes e 10 pequenas);
- A forma de roda dentada do mecanismo de um relógio (Torre do Relógio).
58
Foi tida ainda a preocupação de desenvolver uma logomarca que funcionasse eficazmente
em diferentes situações, suportes, meios e escalas, em que as opções cromáticas
reforçam a imagem e aludam simbolicamente à cultura patrimonial do “Lugar” tendose optado por duas cores, vermelho (símbolo) e azul (lettering), presentes no brasão
e bandeira da vila.
A identidade gráfica pretende criar alavancas de visibilidade para a dinâmica funcional
do edifício que potenciem a visibilidade e reconhecimento da imagem, potenciando a
motivação e sensibilização da comunidade para a visita e usufruto do monumento.
A CRIAÇÃO DO NÚCLEO MUSEOLÓGICO DO CENTRO HISTÓRICO DE CAMINHA
De forma a incrementar a ligação dos públicos ao monumento e à visita apostou-se
ainda na concepção de merchandising específico que apele ao consumo da imagem
do núcleo Museológico do Centro Histórico de Caminha – Torre do Relógio.
IN Diário da República, III série de 28/05/2003, Armas - Escudo de vermelho, um pé (ondado de trés faixetas de prata e azul, delas saindo trés ilhéus de negro, cada um
(encimado por uma torre de prata, lavrada de negro, aberta e iluminada do campo, sendo a (do meio mais alta. Coroa mural de prata de quatro torres. Listel branco com
a legenda a (negro: " CAMINHA".
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