Leia o artigo de Jurandir Macedo para a Revista RI na íntegra

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Leia o artigo de Jurandir Macedo para a Revista RI na íntegra
EDUCAÇÃO FINANCEIRA
EFICIÊNCIA
DE MERCADO
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REVISTA RI
Junho 2014
Imagine que você chega a uma cidade desconhecida e,
ao procurar um restaurante para jantar, percebe dois
estabelecimentos lado a lado. O primeiro está completamente
vazio - à exceção do garçom, que fica na porta convidando
clientes para entrar. O outro tem uma longa fila de espera.
O que você faz: vai ao restaurante vazio ou espera na fila?
por JURANDIR SELL MACEDO
Se você resolveu esperar na fila, agiu como um adepto da
eficiência dos mercados. Aqueles que esperam acreditam
que os clientes que estão na fila já testaram os dois estabelecimentos, conhecem pesquisas ou receberam indicações de
terceiros a respeito da qualidade do restaurante movimentado. Enfim, quem decide esperar confia que o movimento
é um indicador de que o segundo restaurante compensa, enquanto o primeiro não merece a visita.
ESCOLHAS FINANCEIRAS
Esquecendo a fome, vamos pensar em como ganhamos dinheiro para pagar a conta do restaurante. No mercado financeiro, ao escolher uma ação para investir, o que devemos
fazer? Acreditamos que o preço de mercado é a melhor previsão para os preços futuros, como defende o prêmio Nobel
de Economia Eugene Fama, ou nos lançamos em custosas
pesquisas para avaliar o preço das empresas?
Aqueles que acreditam na fila como ordenador das escolhas
estão se beneficiando, sem custo, do esforço de clientes que
de forma diligente frequentaram os dois ambientes e escolheram aquele mais interessante, merecedor de uma longa
fila de espera.
Muitos gestores ativos reclamam que incorrem em elevados
custos de pesquisa, que são indevidamente apropriados por
aqueles que depois acreditam nas escolhas dos demais. Caso
os free riders fossem apenas desavisados turistas em cidades
perdidas, talvez o incômodo não se justificasse. Mas aqueles que viajam sem pagar integram a classe de ativos que
mais cresce no mundo, os fundos passivos e os ETFs (fundos
negociados em bolsa), que atualmente têm um patrimônio
somado em mais de um trilhão de dólares.
Agora vamos imaginar que todos os clientes apenas acreditem que o número de frequentadores seja um bom orientador das escolhas. Mas pode ser que o primeiro cliente tenha
chegado, encontrado dois restaurantes vazios e aleatoriamente entrado em um deles. O segundo cliente pode ter visto o primeiro e suposto que aquele restaurante era melhor.
O terceiro, ao ver um estabelecimento com duas pessoas e
outro com mesas desocupadas, teria decidido por aquele restaurante. Mais alguns clientes e logo a fila estaria formada
a partir de um método de escolha totalmente ineficiente.
A má vontade contra os ETFs não é novidade. O primeiro ETF
surgiu nos Estados Unidos em 1989, atrelado ao índice S&P
500, e teve a venda suspensa por uma ação da bolsa mercantil de Chicago, a Chicago Mercantile Exchange. Em 1990 um
fundo similar foi lançado na bolsa de Toronto, com enorme
sucesso. Os americanos logo perceberam o potencial do proJunho 2014
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EDUCAÇÃO FINANCEIRA
Um ETF ou fundo passivo busca apenas colher o beta, ou seja:
cria uma carteira que segue um índice buscando retorno equivalente à média do mercado. Já um fundo ou investidor ativo
busca um retorno mais elevado do que o mercado, o alfa.
Um gestor ativo deve, então,
gerar um alfa suficiente para
pagar seus custos. E não
resta alternativa a não ser
se conformar com o fato de
que muitos apenas decidem
por se posicionar no meio
da “guerra” travada pelas
diferentes opiniões dos
investidores ativos. Apenas
lhes resta o consolo de saber
que quanto mais pessoas
acreditarem na eficiência
de mercados mais fácil
será localizar o alfa.
duto e, em 1993, foi lançado o SPDRs, conhecido como spiders
(aranhas). Este é atualmente o maior fundo passivo do mundo.
MERCADO EFICIENTE OU INEFICIENTE?
A crítica aos fundos passivos feita pelos gestores ativos, apesar de aparentemente pertinente, não sustenta uma análise
mais aprofundada. Os mercados só podem se tornar eficientes pela mão daqueles que não acreditam que a eficiência
exista. Quanto mais agentes duvidarem da eficiência dos
mercados, mais eficientes eles se tornarão.
As hipóteses da eficiência ou ineficiência dos mercados são
excludentes, mas interdependentes. Ou seja, o mercado se
torna mais eficiente à medida que mais agentes acreditam
que ele é ineficiente.
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Um gestor ativo deve, então, gerar um alfa suficiente para
pagar seus custos. E não resta alternativa a não ser se conformar com o fato de que muitos apenas decidem por se posicionar no meio da “guerra” travada pelas diferentes opiniões dos investidores ativos. Apenas lhes resta o consolo de
saber que quanto mais pessoas acreditarem na eficiência de
mercados mais fácil será localizar o alfa.
Alguém que compra um fundo passivo ou um ETF confia
nos preços de mercado – valores que resultam de milhares
de gestores ativos que sistematicamente se esforçam para
avaliar corretamente as diferentes opções de investimentos
disponíveis. Afinal, os negócios ocorrem no conflito de opinião de vendedores e compradores.
Acreditar que reclamações ou leis possam interromper o
crescimento dos fundos de gestão passiva é uma ilusão. Para
pagar os custos de tentar gerar alfa é fundamental que o
volume aplicado seja elevado. Afinal de contas, ganhar 10%
acima da média do mercado para um patrimônio de R$ 1
mil é muito diferente de ganhar sobre R$ 1 milhão.
Pode-se argumentar que a indústria de fundos faz justamente isto ao juntar milhares de investidores com milhares
de reais para construir um fundo com milhões ou bilhões.
Mas precisamos entender que a própria escolha do fundo já
é uma tarefa eventualmente mais custosa para o pequeno
investidor do que a escolha de uma ação. Portanto, para a
maioria dos investidores individuais, fundos passivos fazem
muito mais sentido do que fundos ativos.
Sempre haverá um desejável espaço para aqueles que abominam a eficiência dos mercados, ou que acreditam nos guias
de restaurantes ou nas próprias pesquisas e não apenas nas
filas, pois são exatamente eles que aproximam os mercados
da eficiência. RI
JURANDIR SELL MACEDO
é doutor em Finanças Comportamentais,
com pós-doutorado em Psicologia Cognitiva
pela Université Libre de Bruxelles (ULB) e
professor de Finanças Pessoais da Universidade
Federal de Santa Catarina (UFSC).
[email protected]

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