Prefeitura de Mirassol

Transcrição

Prefeitura de Mirassol
Cleunice Orlandi de Lima
Mirassol 100 Anos
Prefeitura Municipal de Mirassol
Departamento de Cultura
Mirassol
100 anos de Histórias
Nas trilhas da Mata Una
Cleunice Orlandi de Lima
Volume 1
1
Mirasso l 1 0 0 A n o s
Cleunice Orlandi de Lima
Antes de tudo
N
os tempos que vamos descrever, as propriedades agrícolas eram imensas, muitos alqueires,
quilômetros de divisa entre propriedades. Os moradores confinados em suas terras eram separados dos vizinhos mais próximos por intermináveis capões de mata cerrada. Os veículos,
primitivos troles, carros de boi, charretes e carroças moviam-se com dificuldade por estradas
inexistentes. Melhor ir a pé.
Domingos e feriados eram passados como numa segunda-feira qualquer. Sem passeio, sem ver gente
diferente, sem lazer. Visitavam-se as famílias vencendo distâncias enormes por trilhas onde se caminhava
em fila indiana , so¬mente para sentirem-se ligados de alguma forma ao resto do mundo.
O surgimento de cidades acontecia como necessidade imperiosa de quebrar o isolamento. Um proprietário buscava consorciar-se aos proprietários vizinhos; cada um oferecia alguns alqueires na confluência de seus terri¬tórios formando ali um descampado, espécie de campo neutro. Sem dono, mas de todos.
Nesse espaço fincava-se uma cruz, erguia-se uma pequena capela e, quando a folhinha apontava o fim de
semana, ao invés de uma família visitar a outra em sua residência, o encontro de três, quatro ou mais
famílias acontecia neste campo comum, o que encurtava distâncias e aumentava o número de pessoas
envolvidas.
Namoros e depois casamentos aconteciam entre os filhos que se conheciam nessas reuniões. O novo
casal quase sempre ganhava um terreno na confluência das propriedades; construía ali sua casa, iniciando
uma vila ou patrimônio, conforme a fala dos antigos.
Uma casa, um boteco, um comércio...
Foi assim o nascimento de Mirassol.
2
Cleunice Orlandi de Lima
Mirassol 100 Anos
Capítulo 1:
FUNDAÇÃO DA CIDADE
A - OS FUNDADORES
I - JOAQUIM DA COSTA PENHA
(Capitão Neves)
a) Antecedentes
M
ineiro da cidade de Motuca, Joaquim da Costa Penha nasceu no
dia 7 de setembro de 1865. Eram seus pais José da Costa Penha e Bernardina Maria Barbosa – ela fluminense e ele mineiro.
Lavradores e mal sabendo escrever, criaram o menino do jeito
modesto que eles conheciam. No entanto, o garoto destinado a passar a vida
no anonimato tinha a alma de bandeirante, desbravador dos sertões, plantador de cidades. Revelou-se um rebelde corajoso, inconformado em apenas
ser. Ele queria fazer. Fazer grande, fazer bastante, fazer o melhor para deixar
ao mundo.
E fez. Fez bastante, e deixou ao mundo. Semeou cidades e deixou seu
nome, deixou o exemplo e o espaço pronto aos que vieram depois.
Em Ribeirão Preto, na Chácara das Pedras, morou com os pais. E ali,
Joaquim da Costa Penha
ingressou na Loja Maçônica, em 1890.
(Capitão Neves)
Para Ribeirão Preto, na Chácara das Pedras mudou-se talvez na adolescência, e ali morou com os pais. Nesta cidade, ingressou numa Loja Maçônica em 1890.
De mudança chegou a Jaboticabal, cidade onde morou por alguns anos; ingressou na extinta Guarda
Nacional e chegou a Capitão. O título de Capitão, pois, ele o obteve por mérito pessoal:
Neves não é seu nome. É apelido e foi em Jaboticabal que o recebeu, por ter sido amigo de Augusto
Neves, conhecido morador daquela localidade. Eram amigos tão iseparáveis, que muitos acreditavam que
fossem irmãos e passaram a chamar a ambos pelo mesmo sobrenome: Neves.
Tendo título de capitão e por causa do nome que lhe atribuíram, passou a ser conhecido por Capitão
3
Mirasso l 1 0 0 A n o s
Cleunice Orlandi de Lima
Neves.
Tendo título de Capitão
e por causa do nome que lhe
atribuíram, passou a ser conhecido por Capitão Neves.
Ainda em Jaboticabal construiu, em 1896, capela em louvor a N. Sra Aparecida. Ele era
devoto desta santa e de São
Pedro.
Em 30 de maio de 1896
saiu de ...
(Segue trecho manuscrito do
diário) Hoje foi um portador em
Joaquim da Costa Penha entre seus familiares
meu sítio avisar-me que estava
(?) um rapaz de idade de 25 anos
mais ou menos pelo nome João Venâncio. Roupa preta e lenço idem me esperando para assassinar-me em um
baile que eu tinha sido convidado no Luis da Serra.
E depois eu não quis mais ir no dito baile. Fui para meu sítio onde foi percebi o indivíduo perseguindo-me.
Agrediu bastante e este dissera que não há nunca mais de me fazer mal, em vista do trato em que eu lhe
estava dando. Dissera a um seu companheiro, pelo nome Malaquias, e o meu compadre João Cândido escutou
tudo – prometendo, porém este tal João de mesmo assim dar conta da empreitada que o Nico Nogueira tinha lhe
gratificado para ele me assassinar. Há muitas provas.
a) Joaquim da Costa Penha
Outro relato com teor semelhante:
Monte Azul, 25 de agosto de 1906
Na noite do dia 23 do corrente, às 9 horas da noite, no eu entrar em minha casa,
recebi pelas costas três tiros que, pelo que
afirmaram, dois são de carabina e outro de
garrucha. E bem assim do lado esquerdo,
raspando o bolso do paletó, uma punhalada de que felizmente nada acertou.
Não se sabe o motivo da discórdia,
nem de qual maneira ela acabou. Sabese que terminou bem, porque ele saiu
daquela cidade, mas depois retornou e
viveu ainda alguns tempos ali sem ser
molestado.
Anos mais tarde, partiu para Rio Preto e...
b) Fundação de Mirassol segundo seu fundador
Neste Diário, está escrita nota importante relacionada à fundação de nossa cidade. Ele escreveu:
4
Cleunice Orlandi de Lima
Mirassol 100 Anos
Monte Azul, 23 de agosto de 1910
Hoje, às 12 horas do dia, sigo viagem para
São José do Rio Preto e daquela cidade com destino ao meu sítio que é além duas léguas e 3
quartos mais ou menos. Ali vou com pretensão
de fundar a florescente e futurosa povoação de
Mata Una sita nos espigões das fazendas Três
Barras, Campos, Piedade e Sertão dos Inácios.
Hoje, às 8 horas assisti a uma missa na matriz desta vila, mandada celebrar ao Bom Jesus
pela senhora do Sr. Joaquim Nabuco, missa do
Padroeiro S. Bom Jesus.
Em 23 – 8 – 1910
Segue em minha companhia meu sobrinho
Aparecido Manoel do Nascimento.
Deixou registrado em seu diário como
foi feita a roçada para o plantio do cruzeiro e
quem dela tomou parte:
Município e Comarca de São José do Rio Preto, no lugar denominado Fazenda do Campo, Sertão dos Inácios, Três Barras e Piedade, onde se
resolveu (?) patrimônio com a denominação São
Pedro da Mata Una ou o nome que se denominar no dia 8 do corrente.
Hoje, dia da primeira reunião, reúnem-se para
se fazer o primeiro serviço de roçada, os seguintes cidadãos que gritaram em voz alta em primeiro de tudo, deram uma viva a São Pedro, Viva a Nossa Senhora
Aparecida.
Às 7 horas e 30 minutos da manhã do dia 5 de setembro de 1910. Os seguintes cidadãos com machado, com
foice e com trena:
Joaquim da Costa Penha (trena), Antonio Martins, Vítor Cândido de Souza, Manuel Francisco Nascimento,
Antonio Ramos, Joaquim de Souza, Joaquim dos Santos, Antonio da Costa Penha, José da Costa Penha, Joaquim
Francisco de Paula, Benedito José Gonçalves, Aparecido de Castro, Antonio Alves de Souza, José Augusto Moreira,
José Rufino Camacho, Ademar Camacho, Antonio Martins de Oliveira, Atílio Luchesi, José Feliz de Lima, Antonio
Camilo Gonçalves, Antonio Joaquim de Souza, Henrique Cândido de Souza, João Manoel Ramos, Antonio João da
Cruz (cozinheiro), ? Antonio, José Borges, Joaquim Mariano, Lucas.
E por fim, a ata do nascimento da cidade, também em seu registro no Diário:
“São Pedro da Mata Uma, 8 de setembro de 1910
Dia da fundação da nova povoação com a denominação de Mata Una
No cume dos três espigões que dividem as Fazendas Campo, Piedade, Sertão dos Inácios e Três Barras, aí foi
levantado o Cruzeiro para servir como Marco Perpétuo da nova e florescente povoação que acaba de receber o
nome de Mata Uma.
Devendo também ficar signatados os nomes das pessoas que vão cooperar com doações de terras e cruzeiro
e carreto, enfim, tudo quanto se diz respeito de bem estar e progresso de Mata Una.
Foi feito o buraco para assentar a Cruz o Sr. Sabino Antonio Pereira às 3 horas da tarde.
Na fundação foi colocada uma moeda de níquel no valor de 100 réis e uma prata no valor de dois mil réis,
sendo doada por Antonio da Costa Penha e jornais.
Jornal Popular de Araraquara; Jornal de Paris; Jornal de Rio Preto;Vanguarda de Bebedouro; Jornal de Bebedouro;
5
Mirasso l 1 0 0 A n o s
Cleunice Orlandi de Lima
São Paulo; Comércio;Vila Olímpia; Combate de Jaboticabal; Jornal de Aparecida; O País – Rio de Janeiro; O Repórter
– Ribeirão Preto; São Carlos.
a) Joaquim da Costa Penha
E 59 assinaturas de homens. E em folha separada, 28 assinaturas das “senhoras” (com aspas).”
Foram três as cidades que este homem deixou fundadas: em 1896, Monte Azul Paulista. Em 1910, Mirassol. Em 1922, fundou Neves Paulista. No entanto, não estava ainda contente. Queria mais. Fazia planos
para a fundação de mais uma cidade, na região de Avanhandava, para a qual chegou a tomar as primeiras
providências...
6
Cleunice Orlandi de Lima
Mirassol 100 Anos
II - VÍTOR CÂNDIDO DE SOUZA
a) História de Vítor Cândido de Souza escrita por ele mesmo.
S
ou natural de Ribeirão Preto, (SP). São meus pais: Adolfo Cândido
de Souza e Iria Morfiza do Espírito Santo. Nasci a 6 de outubro de
1874 e fui batizado a 16 de novembro.
Meu pai faleceu em 1879. Um ano depois, minha mãe voltou para
Mutuca, onde ela tinha mãe e irmãos. Eu fui com a idade de 5 anos.
Fiz até o 3º ano de escola. Deixei de estudar porque tinha mãe e irmãos
a sustentar. Vim para Ribeirão Preto trabalhar e mandava dinheiro para
eles. Na fazenda de meu padrinho Manoel da Cunha trabalhei como fiscal.
Voltei para Mutuca, comprei a casa que minha mãe morava, por 300.000
réis.........
Fiquei sócio com um moço de Congonhas de Cima, .................
............. Comprei um sítio de 8 alqueires com 4 mil pés de café e plantei
mais 4 mil, ficando com 8 mil pés. Depois que fiz a colheita e vendi o café,
vim para o sertão de Rio Preto, onde comprava gado e porcos e revendia
em Bca aum çpdU and ucal-
7
Mirasso l 1 0 0 A n o s
Cleunice Orlandi de Lima
Gomes, José Beijo, Olimpio Gordo e Lázaro Antonio.
Como eu tinha combinado com o Capitão Neves, ele apareceu nos primeiros dias de abril de 1910 e fomos
ver o lugar onde estava o marco, nas divisas das Fazendas e combinamos de ali ser colocado o cruzeiro.
Neves voltou e eu fiquei. Fiz um rancho coberto de sapé, paredes de madeira e barro. Terminado o serviço,
voltei para Monte Azul, onde vendi o sítio por 7 contos livrando a colheita e fui procurar o Neves.
Combinamos para ser feita a fundação no dia 8 de setembro de 1910, dia de Nossa Senhora, combinado para
ele vir de Monte Azul e estar aqui no dia 8 de setembro.
Saí de Monte Azul no dia 29 de agosto com a mudança. No dia 4 de setembro, os carros e as famílias chegaram. Ali já estava o meu irmão Henrique Cândido de Souza.
Onde hoje é a fazenda do Sr. Henrique Curti dizia o povo ter aparecido uma santa e colocaram um cruzeiro
lá, mas foi abandonado. Estando o cruzeiro no meio da mata, eu o pedi ao dono das terras. Ele me deu e fomos
lá com o carro meu, no dia 6 e trouxemos ele até a Fazenda São José, de minha propriedade.
No dia 7, fiz convites ao povo para tomar parte e conduzir a cruz até o lugar que estava marcado no espigão
da fazenda Sertão dos Inácios, Piedade, Três Barras.
No dia 8, o Neves almoçou comigo.
Esta é apenas parte resumida da narrativa de Vítor Cândido. O original completo de seu diário,
localizado em 2009, está sob a proteção do Departamento de Cultura e colocado à mostra no Museu
Municipal de Mirassol.
O restante destes escritos será transcrito de acordo com as passagens, num relato bastante abreviado de suas lembranças, narrativas de certos fatos por ele escolhidos e escritos num caderno. A última
narrativa de Vitor Cândido data de 1960, três anos antes de morrer.
Fato curioso é que, para não deixar dúvidas sobre a autenticidade dos escritos, ele as registrou em
Cartório, com firma reconhecida, conforme ilustração.
B – ANTES DO COMEÇO
Viajando numa nuvem branca daquelas que parecem carneirinho, duas almas masculinas admiravam o
chão aqui embaixo.
Era manhã. O vento soprava de leve e aquela nuvem andava devagarzinho, parecia que nem saía do
lugar. Os dois deitados sobre ela, de barriga para baixo, apoiados nos cotovelos, olhavam a terra e iam
mostrando coisas que passavam sob eles, fazendo comentários. Passavam cidades, estradas, rios, pontes,
plantações, tudo...
Uma cidade apareceu bem lá longe, no horizonte. Um deles apontou com o dedo e exclamou feliz
da vida:
- Veja Joaquim! É Mirassol! A nossa Mirassol! São Pedro da Mata Una, lembra?
O Joaquim fez que não com a cabeça:
-Você está enganado, Vítor. Mirassol é pequena, pouco mais que uma vila.
- É que faz tempo que a gente saiu de lá. As coisas mudaram.
- Foi em 1926 quando vi Mirassol pela última vez; não faz tanto tempo assim. Era um quase nada, ruas
de terra, casas poucas, poeirão danado, uns cavaleiros, uns carros de boi e mais nada. De bonito tinha a
igreja; não estava acabada ainda, mas prometia! Tão grande e bonita, que nem combinava com as casas em
volta.
- Quando você saiu, a cidade tinha só 16 anos. Já eu, não! Quando saí, Mirassol estava completando
seus 53. Deixei Mirassol menor do que é hoje, mas com jeitão de cidade.
O Joaquim apertou os olhos para enxergar melhor, depois exclamou todo alegrinho:
8
Cleunice Orlandi de Lima
Mirassol 100 Anos
- É Mirassol sim, uai! É Mirassol mesmo, reconheço a igreja!
Os dois se acomodaram melhor na nuvem para apreciar com maior conforto. Ficaram olhando o lugar sem
articular palavra. A cidade foi ficando maior aos seus olhos à medida que a nuvenzinha preguiçosa se aproximava.
Com a voz embargada, o Joaquim exclamou uma pergunta:
- Puxa vida, Vítor, você lembra quando a gente fundou Mirassol?
Engolindo o choro, o companheiro demorou a responder:
- Faz tempo, mas lembro bem. Puro mato. Floresta verde e mais nada... Quanto tempo faz isso?
Joaquim puxou pela memória e fez as contas em voz alta:
- Zero tira zero, zero. Um tira um, zero. Zero pede um emprestado, fica dez, tira nove, sobra um. Dois empresta
um fica um, tira um, zero... Cem! – arregalou os olhos e olhou pára o companheiro:
- Coronel do céu! Faz cem anos! Cem anos que fundamos isto aqui!
- Cem anos, já? Mirassol já tem um século? Um centenário inteiro?
- No oitavo dia de setembro de 2010, são cem anos sim senhor!
- Como passa o tempo, heim?
Depois de um minuto comprido que era pura emoção, a conversa passou a ser feita devagar, com certa demora
entre perguntas, respostas e comentários, pois o nó na garganta engrossava a fala, não deixava a voz falar direito.
- E veja hoje... Baita cidade! Prédios mais altos que a igreja, quantas lojas! Automóvel de montão, tudo carro
com traseira levantada, gente que não acaba mais. E olha lá, olha lá!! Semáforo na esquina, tá vendo?
- Sim senhor, que diferença! Tudo desmatado, prédio no lugar das árvores!
- O que você sente ao olhar?
- Um pouco de saudade, mas não muita. Aqueles tempos eram difíceis, Quim. Tudo era demorado, você lembra.
Tudo era longe, conforto nenhum, tudo feito no muque e valentia. Nossa obrigação nós fizemos. A gente sofreu,
enfrentou trabalho, enfiou o peito, aguentou zombaria até da família.
- Verdade. Se você não estivesse comigo, eu teria voltado correndo para trás. Mas um escorando o outro, cumprimos nosso dever nesta terra.
- Eita, nós! Veja só o que foi que fizemos! Nós plantamos Mirassol!
- Nosso sonho virou cidade!
Um minuto bem comprido de silêncio e depois falou o Vítor, imaginando uma coisa impossível:
- Joaquim, já pensou se a gente pudesse rever tudo o que fizemos desde que chegamos aqui?
- Que bom seria! E melhor ainda se pudéssemos ver até os dias de hoje, como foi o processo de crescimento
e transformação para chegar ao que é, cem anos depois!
Um anjo lindíssimo, vestido de cetim brilhante, que naquele justo momento ia saindo para a ronda diária, teve
de parar numa nuvenzinha ali perto, a fim de prender direito as asas nos ombros e, sem querer, ouviu a conversa
entre o Capitão e o Coronel. Depois de acertar as asas e ajeitar a coroinha na cabeça, deu uma voadinha para a
nuvem dos dois amigos e entrou na prosa:
- Vocês podem rever o que fizeram e podem saber como foi o crescimento da cidade, depois que saíram dela.
As duas almas arregalaram os olhos, ficaram de boca aberta, mudas, sem voz para nada. O anjo continuou:
- Tudo o que se faz fica gravado, como num filme. Nada se perde. Até pensamentos e sentimentos ficam
regis¬trados por todos os séculos e séculos, amém. Sempre que uma alma quer rever sua história ela lhe é mostrada em pormenores, para que possa avaliar tudo o que fez e o que deixou de fazer.
Os dois continuavam estátuas, só olhando a cara do anjo.
- Então vocês querem rever seus passos na fundação desta cidade? Querem ver a História de Mirassol?
Foi Joaquim quem conseguiu primeiro soltar a voz, que saiu no gaguejo:
- A gente quer sim, mas queremos ver Mirassol até que nossa nuvem acabe de passar sobre ela.
O anjo sorriu e explicou:
9
Mirasso l 1 0 0 A n o s
Cleunice Orlandi de Lima
- Não há necessidade. Sua nuvem pode ficar estacionada aqui fora, esperando. E enquanto assistem ao
filme, vão acompanhando a transformação e conferindo os resultados ao vivo. O que acham?
- A gente acha bom, não é mesmo, Vítor?
- Acha. – e voltando-se para o anjo, perguntou: - O que temos de fazer para assistir à filmagem?
- Nada. Esperem aqui que volto já. Vou ao Departamento requerer autorização e solicitar um anjo
estagiário para me substituir na ronda. Preciso também fazer solicitação do RPU ao Anjo Chefe e assinar
requisição.
- Uai! Tem disso aqui? – perguntou o Joaquim, que era mineiro e falava uai.
- Autorização e requisição? Tem sim. É que tem muito anjo descuidado que pega RPU e esquece de
devolver.
- Igual na terra. – falou o Vítor.
- Igual na terra – confirmou o anjo, batendo as asas enormes em direção ao Departamento dos Recursos Audiovisuais.
C – COMEÇANDOMIRASSOL
I - O PONTO DE PARTIDA
Numa sala de projeção lá no espaço, a uns 150 metros acima da cidade de Mirassol, os dois amigos
se sentaram nuns sofás deliciosamente macios. Tão macios que eles sentiam mais vontade de dormir, que
de conversar.
Antes de tudo, o anjo se apresentou.
Seu nome era Docel. Disse que era estudante de História e que seu atual foco de estudos eram as
cidades daquela região. Que era quase calouro acabado de entrar para a Hierarquia dos Anjos e tinha muito a aprender. Que queria acompanhar as reminiscências dos dois para instruir-se com eles e, por causa
disso, ia lhes fazer muitas perguntas sobre coisas do mundo, coisas da região, coisas que ignorava. É que,
além de ser estudante de História, fazia também Curso para ser Anjo da Guarda e, como Anjo da Guarda,
não pode ser orelhudo, era preciso apro¬veitar todas as oportunidades de aprendizagem.
As duas almas masculinas também se apresentaram:
- Sou o Coronel Vítor Cândido de Souza. Mas pode me chamar só por Vítor ou Coronel, como quiser.
- E eu sou Joaquim da Costa Penha – ou Capitão Neves, como era meu apelido. Se preferir, pode me
chamar também por Quincas, Quinzinho ou Quim. Sou o fundador de Mirassol e o Vítor foi o meu braço
direito.
Docel apresentou a aparelhagem de RPU, esclarecendo que qualquer parte da História do Mundo fica
contida no éter universal e pode ser acionada através daquela aparelhagem, bastando que se digite época,
local ou nome dos personagens a serem analisados. O Vítor quis saber:
- Seu Anjo, o que significa RPU?
- Registro Permanente Universal.
Ambos os amigos ficaram impressionados com a explicação e ansiosos por ver o aparelho funcionando, mas o anjo tirou um pouco da vontade:
- Tem um problema: No Departamento dos Recursos Audiovisuais, me informaram que os RPU,
os bons mes¬mo, os originais, estão em uso noutras salas de projeção, em cursinhos de anjos ou conferências com os santos. Os que eles têm disponíveis são estes outros menores, montados por anjos
aprendizes. Não estão muito bons ainda, precisando de uns reparos, uns ajustes. Às vezes funcionam com
10
Cleunice Orlandi de Lima
Mirassol 100 Anos
som e imagem que é uma beleza. Outras vezes, só com imagem e de vez em vez só funciona o som. E há
momentos que apaga tudo, não funciona uma coisa nem outra.
E ofereceu uma opção:
- Se quiserem esperar uma ou duas semanas, poderemos requisitar um aparelho melhor. Ou se não
fizerem questão, poderemos nos arranjar com este mesmo. O que preferem?
- Prefiro agora, enquanto a curiosidade está quente. E você, Vítor?
- Agora também. Qualquer desarranjo a gente se arruma conforme pode, dependendo do defeito.
- Ótimo! Então, vamos lá.
Enquanto falava estas últimas palavras, o Anjo Docel já foi ajeitando o aparelho. Diminuiu a intensidade
da luz, digitou: História de Mirassol e as imagens começaram a aparecer. A diferença é que o RPU mostrava as cenas em terceira dimensão: altura, largura e profundidade, como se estivessem acontecendo de
fato, fora da tela. Terceira dimensão, sem precisar de óculos especiais! Semelhante ao cinema da terra, era
aquele som baixinho, igual cochi¬chado de peixe e rapidinho feito bater de asas de beija-flor:
- tetetetetetetet...
Na tela apareceu, vista de cima, Mirassol, cem anos atrás. Só mata cerrada, só copa de árvores. Tudo
verde. Verde escuro, verde azul, verde garrafa, verde musgo, verde piscina, verde claro... Verde. A câmera
foi descendo, foi se aproximando do chão; as imagens foram ficando nítidas e foi possível mais ouvir do
que avistar entre as árvores, uma tropa conduzida por vários homens. O som dos cascos se misturava às
conversas dos cavaleiros.
O Joaquim não se conteve e exclamou quase gritando:
- Uai, sô! Mas este troço fala!
- É, Quinzinho! Explicou o anjo - Você só conheceu cinema mudo, em preto
e branco! Hoje, os filmes são so¬noros e coloridos. Mas este das nuvens é mais
aperfeiçoado, quase dá para a gente tocar com as mãos.
- Benzadeus! Que diferença heim?
Vítor pulou do sofá explodindo de alegria por ver-se a si mesmo naquelas
cenas celestes. Apontava e falava:
- Veja eu lá, Quincas! Veja eu lá! Sou eu, tá vendo? Sou eu chegando com
meus camaradas!
- Pois não é que é verdade? Exclamou o Quinzinho. Você chegou antes de
mim, no final de março.
- Eu saí de Monte Azul no dia 28 de março, trazendo uma turminha de
camaradas: o Sabino Rosa, o Serafim Gomes, o José Beijo, o Olimpio Gordo e
Antonio Martins Oliveira
o Lázaro Antonio.Veio também o meu cunhado José Felis de Lima, lembra? Veio
morador da redondeza
ele e a mulher dele, que era minha irmã.
anterior à fundação
Neste ponto, o anjo fez uma pergunta:
- Mas se aqui só havia floresta, como é que se arrumaram até construir
casas?
- Boa pergunta – anuiu o Vítor. Na fazenda que eu comprei morava o Zé Curitiba. O rancho dele só tinha dois cômodos, mas ele cedeu um deles para a minha irmã. Na frente do rancho tinha uma árvore, uma
figueira grande, bem copada e ali nós, os homens, armamos nossas redes e nos arrumamos debaixo dela.
O Joaquim explicou por sua vez:
- Eu vim logo depois, em abril. Os camaradas do Vítor tinham construído uns ranchos cobertos com
sapé, pa¬redes de madeira e barro. Tinham feito derrubadas, plantaram roça do mantimento pro gasto e
estavam formando uma roça de café. Era gente trabalhadora que só vendo!
Noutra cena, viram-se a si mesmos indo até o alto do espigão, onde hoje está a Pra¬ça Dr. Anísio, para
11
Mirasso l 1 0 0 A n o s
Cleunice Orlandi de Lima
decidir onde espaçar a clareira, a fim de erguer o cruzeiro. A câmera abriu a imagem, fazendo tomada do
alto. Localizaram perfeitamente as quatro fazendas onde encravaram Mirassol: Piedade, Sertão dos Inácios,
Três Barras e Campo.
- Mas... Epa, epa! Peraí, o que é isso? O Vítor esticou o pescoço para ver melhor. Há uma casa entre as
árvores, lá na descida da Grota. Veja! Eu não lembro de morada nenhuma ali. Você lembra, Quim?
O Joaquim serenou o amigo:
- Tinha uma casa sim! E morava gente.
O anjo abriu um mapa antigo da cidade e os três se debruçaram sobre ele.
- Veja o lugar, disse o anjo. Esta casa tosca ficava bem aqui – e apontou com o dedo.
O Vítor fez cara como quem duvida, pensou um pouco e desanuviou as feições:
- Ah, lembrei! O homem que morava aí era um fazendeiro, lidava com roça de café. Parece-me que
Martins era o nome dele. Martins Não Sei do Quê.
O anjo consultou um livro enorme, espécie de dicionário, com um metro e meio de tamanho, e concordou:
– Está aqui no Registro Akáshico. Morador das redondezas, o nome era Antonio Martins Oliveira. Ele
tinha terras na Fazenda Campo e morava ali há 20 anos. Também seu genro morava ali, o Henrique de
Souza Lima.
O anjo correu o dedo naquelas linhas escritas, até que...
- Ei, há mais gente que morava na redondeza. Veja aqui: Atílio
Luchesi e seu irmão João Batista
Luchesi, moradores do lugar há
dois anos. E também José Victorio e Francisco Figueira, estes residiam aqui há um ano.
O Coronel coçou a cabeça,
olhou de frente para o amigo, admirado:
- Puxa vida, eu nem lembrava destes todos. E você, Quincas,
lembrava?
- Agora que o anjo falou e
puxando pela ideia, a gente vai
lembrando. Mas se ele não falasse, já viu, né?
Agradecendo a explicação, o
Representação da fundação da cidade.
Coronel continuou:
Pintura em azulejo do pintor Júlio Bonfim, em parede externa do Museu Municipal
- Fizemos derrubada, plantamos roça, escolhemos o lugar
para começar a cidade, mas não pude ficar. Voltei a Monte Azul pra acabar a colheita, vender umas coisas,
dar fim noutras tranqueiras, buscar família e mudança.
Assistiram pela tela das nuvens que, depois de cinco meses, aconteceu a chegada da família de Vítor
e quatro carros de bois carregados com a mudança. Foram gastos 6 dias para percorrer 100 quilômetros,
conseguindo vencer 16 quilômetros por dia!
Era 1910.
As imagens iam aparecendo aos dois amigos que reconheciam cada voz, cada pedaço da mata, cada
atividade realizada pelo grupo inteiro e por cada um deles. Apareceu na tela uma estradinha franzina,
12
Cleunice Orlandi de Lima
Mirassol 100 Anos
passagem de carro de boi que vinha do sertão e seguia para Rio Preto. Este caminho vinha como quem
vem do Bairro S. José e subia reto onde hoje é a Rua Santo Antonio. No ponto em que chegava à altura
da Armando Sales de Oliveira, os fundadores e seus homens fizeram como que um braço de encruzilhada,
abriram uma picada até chegar ao alto do espigão, marco que dividia quatro propriedades: Fazendas Campo, Piedade, Três Barras e Sertão dos Inácios. Neste espigão onde hoje está o gramado redondo da praça,
a uns poucos metros da concha acústica, e entre esta e a igreja, foi aberta a clareira.
Joaquim e Vítor viram-se às sete e meia da manhã junto a outros 26 homens, todos eles dando vivas a
São Pedro e a Nossa Sra. Aparecida, antes de dar início à abertura do desmatado onde plantariam a cruz.
Assistindo ao filme, no ponto em que gritavam vivas aos santos, Joaquim e Vítor sentiram uma emoção que saiu do peito, sufocou a garganta, subiu por dentro do nariz, e jorrou dos olhos. Ficaram sem
graça e enxugaram a cara meio de banda para o anjo não perceber. O anjo percebeu, sorriu de leve e
fingiu de bobo.
Depois, com foice na mão, aqueles homens entraram a der-rubar árvores, fazer roçada, abrir um claro.
O próprio Joaquim me¬dia, com trena na mão, a área a ser roçada.
Era 5 de setembro de 1910 e a fundação estava prevista para daí a três dias, dia de N. Sra. Aparecida.
Docel fez cara de não ter en-tendido e perguntou:
- Por que o padroeiro da ci¬dade é São Pedro, se a fundação aconteceu no dia de N. Sra. Apa-recida?
Neves explicou:
-Eu queria que fosse no dia de São Pedro, mas no dia do santo, em 29 de junho, o Vítor viajou. Lembra
Seu Anjo, que ele voltou acabar a colheita, vender uns troços, buscar mudança e família? Pois então! Antes
de sair, me pediu que eu adiasse a funda¬ção, porque queria estar presente.
- Faz sentido!
II- O CRUZEIRO
Cheios de emoção, assistiram à procissão. Ela veio acompanhando o carro de bois que transportava a
pesada cruz, marco da fundação. Foi bonito ver o cortejo, da partida da casa do Coronel Vítor, onde houvera almoço fes¬tivo, até a chegada no descampado onde a cruz seria fincada. O terço foi rezado durante
o trajeto em voz alta, em louvor a São Pedro e a N. Sra. Aparecida.
Os dois amigos viram de¬talhes que nem lembravam, mas gostaram que eles tives¬sem existido. Foi
assim:
Naquele ponto onde a estradinha que levava a Rio Preto se bifurcava na picada à altura da Armando
Sales de Oliveira, o carro de bois foi descartado e a enorme cruz foi carregada nos ombros pe¬los homens que se revezaram naqueles 250 metros de subi-dinha leve, mas cansativa.
Foi feito o buraco pelo machadeiro Sabino Antonio Pereira, auxiliado por Joaquim Costa Póboa e
Joaquim Ca¬milo. A cova foi forrada de jornais pela menina Ernestina Martins de Oliveira, que des¬ceu
dentro do buraco.
Foram jogados na cavida¬de níqueis e pratas de 200 e 400 réis e levantado o cruzei¬ro pelos presentes.
A menina Maria Rufina de Carvalho, filha do professor José Rufino de Carvalho, reci-tou uma poesia.
Vivas a São Pedro, vivas a N. Sra. Aparecida foram grita¬dos e estes vivas ressoaram em ondas mata
afora, santifi¬cando o espaço de terra dedi¬cado aos santos. Eram 3 horas da tarde, 8 de setembro de
1910.
Mais um terço foi rezado de joelhos no local e assim
nasceu o vilarejo São Pedro da Mata Una.
13
Mirasso l 1 0 0 A n o s
Cleunice Orlandi de Lima
- Nossos homens descascaram um pau de jatobá, arrancaram um cepo de ma¬deira e nele esculpiram as palavras: “São Pedro da Mata Uma”. Este pau escrito foi fincado junto à cruz. O lugar exato da
colocação do cruzeiro, eu informei ao amigo Jezualdo D´Oliveira, que escreveu um artigo a respeito. Ele
escreveu assim:
O cruzeiro foi chantado nas proximidades da pérgula, entre esta e o poço exis¬tente na Praça da
Bandeira.
- Pérgula? O que é pérgula? A pergunta veio do Anjo Docel.
- São colunas de madeira ou cimento que servem de suporte a trepadeiras. São comuns em jardins.
O nosso coreto era uma pérgula formada por colunas de madeira... Ou seriam de cimento? Não lembro
o detalhe, mas serviam de suporte às trepadeiras de primavera. Este coreto foi o mais chorado dos três,
isto é, a popu¬lação antiga até hoje lembra e sente saudade do coreto de pérgula.
O anjo e ambos os homens perceberam que aquelas moedas atiradas no bura¬co da cruz despertaram a cobiça da meninada que assistia à cerimônia. E foi verdade porque a cena subsequente mostrava o
dia seguinte: Os garotos tentando arrancar o cruzeiro para apanhar as moedas! Por pura sorte, o Coronel
apareceu a tempo de impedir que a pesada cruz caísse por terra.
Assistindo às cenas, os três caíram na risada.
Fato que o anjo estranhou foi que não apareceram no filme os homens lapidan¬do o cruzeiro. Não
apareceram cenas da escolha da aroeira, não foi mostrado o ato de talhar a cruz. Ela já apareceu pronta
e foi o Coronel Vítor quem explicou essa:
- Sabe meu Anjo, a cruz já estava pronta há muitos anos.
- Como assim? Alguém sabia que vocês iam fundar a cidade e deixou pronta a cruz?
- Não, não é isso e vou explicar: A poucos quilômetros de Mirassol, numa cla¬reira junto ao rio “Água
Amarela”, diziam os roceiros que anos antes apareceu uma santa. O lugar foi considerado sagrado; foi
roçado tudo em volta e plantada esta cruz.
Foi também talhada uma santa de madeira, Nossa Sra. Aparecida, e deixada num toco como se fosse
um altar junto ao cruzeiro. Diziam que as águas daquele rio curavam doenças do corpo e da alma e o lugar
passou a recinto de romaria. Ro-meiros iam pedir milagres e realizar atos religiosos. Muitas promessas
foram feitas e cumpridas no local. Com o tempo, porém, esta prática foi sendo enfraquecida. O cruzeiro
e a santa ficaram sozinhos na mataria que cresceu em torno.
Sabendo da existência da cruz abandonada, pedi autorização ao dono daquelas terras para aproveitálo como marco de fundação da nossa vila. Afinal, estava aban¬donada e era cruz já abençoada por tantas
rezas.
Meu pedido foi aceito e fui com uns camaradas buscar a cruz num carro de bois. Ficamos surpresos
por encontrarmos junto ao cruzeiro a imagem da santa! Nem sabíamos da existência dela! E veja que
interessante: O dia 8 de setembro, dia da fundação da cidade, é o Dia de N. Sra. Aparecida, e a gente encontrou, junto do cruzeiro, uma imagem dela! Nós a trouxemos também.
A imagem ficou sob a guarda do nosso amigo aqui, o Quinzinho. Depois, ele doou a santa para a primeira capelinha que foi erguida na praça. Aí, lá por volta de 51 ou 52, não lembro, o pároco fez doação
da santa ao Museu e ainda se encontra lá. Há poucos anos, alguém passou uma camada de tinta na santa.
Ficou colorida, mas a da cor original é cor de madeira, porque é feita de madeira.
III - RAZÃO DO NOME
O anjo achou lindíssima a história da santa e ficou arrepiado de emoção. Depois que desarrepiou,
procurou aclarar outra duvida:
- E por que a mudança do nome? Por que Mata Una virou Mirassol?
- Bem, Seu Anjo, a história é meio comprida – falou o Joaquim.
- Não temos pressa, posso ouvir.
14
Cleunice Orlandi de Lima
Mirassol 100 Anos
E o Joaquim começou, sendo aparteado vez ou outra pelo
Coronel:
- Foi assim: Há uns escritos do Cândido Brasil Estrela que
dizem que, antes de Mata Una, aquela mata tinha o nome de
Matarona. Depois pas¬sou a ser Mata Una. E mais um tempo
depois, demos à vila que fundamos o nome São Pedro da Mata
Una. Explica o resto pra ele, Vítor.
- Sim. São Pedro, porque a cidade foi dedicada ao chaveiro
do céu.
- E Mata Una, por quê?
Plantação de girassóis
- Porque era uma mata só. Mata espessa de quatro propriedades enormes se juntavam numa só floresta. Mata Una, que
significa mata unida, uma só mata.
- Tá certo. E por que mudou para Mirassol? O que tem a ver Mata Una com Mirassol, palavra tão
diferente?
Vítor continuou a explicar:
- A vizinha cidade de Rio Preto, muito irônica, e só para mangar com a gente, trocou o Mata Una por
“Mata Um”. Aí virou gozação, chamavam nosso povoado de São Pedro que Mata Um. Aí não dá, né?
O anjo quase morreu de tanto rir e risada de anjo parece o rir de um grilo. Assim: - Cricricricricri...
Quando o anjo acalmou a risada, foi o Joaquim quem continuou:
- A cidade mudou o nome pelo seguinte: Aborrecido por causa do “Mata Um”, resolvi trocar o nome
antes que o apelido pegasse. Passei dias pensando num nome bonito, curto e sem margem para troça.
- Fez bem. Mas por que a escolha do nome Mirassol?
- Ah, meu Anjo, se você soubesse o tamanho da controvérsia em torno deste assunto lá na terra! Há
uma briga cavalar entre as pessoas da cidade, como se a explicação para a origem do nome fosse condição
vital para a sobrevivência do planeta – brincou o Capitão Neves.
- Que interessante! E quais são as hipóteses que o povo levantou?
- Diz metade da população – a metade romântica – que eu passava a cavalo pela praça do cruzeiro,
que já es¬tava bem mais larga, com a clareira muito espaçosa, e os moradores roçavam ainda mais, abrindo
espaço em todos os sentidos e usando o claro do roçado para plantações.
Pois bem, os românticos dizem que o arroz estava cacheando e eu, a cavalo, desviava das ruas plantadas, quando um dos agricultores me chamou para mostrar um pé de flores lindas, enormes, amarelas que
nascera em meio à lavoura. Este pé de flores, segundo a opinião dos defensores desta teoria, teria nascido
no arrozal, mais ou menos no lugar onde depois foi erguida a casa do ex-prefeito Leopoldo Gotardi, à esquina da prefeitura. E, eu teria dito que o nome daquela flor é girassol – mas o roceiro teria me corrigido,
dizendo que o nome correto é mirassol. Daí, a origem do nome.
O Vítor levantou-se do sofá e deu uma explicação adicional:
- Esta flor é originária da América do Norte e tem ambos os nomes: mirassol e girassol, porque ela
acompanha o movimento do sol, adota o comportamento conhecido como heliotropismo, ou seja, “gira”
no caule de maneira a estar sempre com a face voltada para o sol.
Mirassol significa planta que mira o sol, que olha o sol. Girassol significa que ela gira acompanhando a
marcha do sol pelo céu. Portanto, os dois no¬mes para a flor são corretos. É chamada flor do sol.
- Curiosa a explicação dos girassóis e dos mirassóis. E a outra explicação para o nome da cidade?
- A segunda teoria, continuou o Costa Penha, vem da outra metade da população: a metade intelectual
formada por cientistas e estudiosos. Estes teóricos vão fundo e não sossegam até achar outra explicação.
Dizem que girassol é planta não nativa e que não nasceria sem ser plantada, acrescida da dificuldade de
vingar embaixo de árvores copadas. Dizem eles que uma flor que acompanha o roteiro do sol pelo céu
não nasceria em lugar onde não se pode ver o sol.
15
Mirasso l 1 0 0 A n o s
Cleunice Orlandi de Lima
Após uma pausa e mudança de tom:
- Neste ponto, estão certos. Girassol é planta que está sujeita à presença do astro rei e não sobreviveria sob árvores folhudas projetando sombras eternas. Para esta parcela do povo, a origem do nome teve
outra causa: Após a derrubada das árvores, ficava fácil ver o sol nascente, o sol andante e o sol morrente.
Daí a expressão: Mira o sol, porquanto o sol podia ser visto o dia inteiro desde cedinho até de tardezinha, de qualquer ponto do povoado, uma vez que não há montanha nem elevação interpondo-se entre o
sujeito e o sol. O próprio Cândido Estrela, quando escreveu a primeira história de Mirassol, não soube
explicar o motivo do nome. Disse ele:
- Derribadas as matas e divisando-se melhor o sol, lugar alto que aqui
é, talvez por isso hajam batizado de novo e desta vez, com um nome mais
bonito: Mirassol.
- Veja que o Cândido Estrela quase participou da mudança do
nome, porque conheceu Mirassol em 1908, antes ainda da fundação.
E mudou-se para cá em 1914, quando a cidade tinha só quatro anos
de idade. No entanto, nem ele sabia ao certo e usou a palavra talvez.
Interessante é que quando desenhou o Brasão de Armas de
Mirassol, o mesmo Cândido Brasil Estrela de¬monstrou certa neutralidade quanto a esta questão: Ele desenhou um sol no alto, bem
no centro. O sol bem visível pode significar que desta característica
poderia ter originado o nome da vila. Mas o autor do escudo, explica
de outra forma:
Girassol ou mirassol: flor muito conhecida, de que aqui havia bastante,
em moitas e de onde se originou o novo nome da cidade. Foi essa flor, de
que o Capitão Neves, fundador da cidade tanto gostava, que o inspirou e
o fez propor a substituição de “Mata-Una” por Mirassol. Trzata-se incontestavelmente de uma bela flor, sobretudo quando cultivada só, no meio O Escudo de Armas de Mirassol apresenta
de um matagal como aqui era então e assim, onde ela mais se destacava. um sol bem visível, demonstrando que desta
A flor do girassol é conduzida pelo sol e ela segue o astro rei de manhã característica poderia ter originado o nome
da vila. No entanto, aparece o girassol,
à noite.
simbo-lizando que a flor poderia ter dado
Jezualdo D´Oliveira, num artigo publicado em 1940 em edição
nome à cidade.
especial do “Correio de Mirassol”, diz:
O Neves era perito em cultivar girassol, conhecido também por mirassol, porque dizem que mira, olha o movimento do sol, acompanhando-o. E como atrás da atual igreja matriz
existisse uma moita dessa flor, essa foi a razão porque Neves, numa reunião havida em casa de Miguel Mendes
propôs e os companheiros aceitaram que se mudasse o nome de Mata Una para Mirassol.
Fazendo um gesto característico com mãos, ombros e olhos, Joaquim concluiu:
- São estas as duas correntes para a origem do nome. Há ainda hoje verdadeira polêmica em torno
do assunto.
- Interessantes ambas as teorias, mas prefiro aquela que o nome veio da flor. Que bonito o nome ter
nascido de uma flor, comentou Docel. Eu sou romântico sim, qualé, ô meu?
Os dois homens puseram-se a rir. no que foram acompanhados pelo cricri do anjo, que indagou:
- Agora, sem brincadeira. O girassol poderia ter nascido naquela praça e ter produzido flores?
Foi o Coronel Vítor a responder:
- Sim, poderia ter nascido um pé de girassol ali, porque fazia dois anos que o povo vinha derrubando
a mata, roçando, plantando e por conta disso já não havia ali árvore nenhuma a fazer sombra, fator que
deixava a planta livre para nascer, crescer, florescer e olhar o sol à vontade. É possível que, em meio às
sementes de arroz trazidas pelas pessoas que chegavam, viessem duas ou mais sementes desta flor. O
girassol não exige cuidados, nasce em qualquer greta, em qualquer solo, nem precisa de rega. Basta uma
16
Cleunice Orlandi de Lima
Mirassol 100 Anos
semente caída na terra para se ter um pé da planta. Tendo vindo alguma semente de girassol no meio às
sementes de arroz é natural que ela tenha nascido, crescido, florescido.
- Então, tanto os românticos quanto os teóricos podem estar certos?
- Sim! Mas o povo adora polêmica, fica discutindo o sexo dos anjos. Ah, desculpe, Seu Anjo!
Docel riu, não reclamou e opinou:
- Mas não é hora de desfazer a polêmica? Qual das duas versões é a correta? Deixar o povo discutindo um tema de fundo vazio por 100 anos é pura maldade.
- Meu anjo, o povo gosta demais de uma controvérsia; as duas metades da população se acham com
razão e não seremos nós a acabar com este saudável passatempo. Sabemos sim a versão correta, mas por
que estragar a distração do povo?
O anjo deu uma risadinha divertida e levantou outra pergunta:
- Foi trocado o nome da cidade assim, sem mais nem menos? Bastou sua vontade e pronto?
- Ah, não, fez o Joaquim. Fizemos uma reunião para de¬finir, pois era decisão a ser to¬mada não por
uma só pessoa. No dia da reunião eu propus aos companheiros a troca do nome e eles aceitaram.
- Como foi que a notícia da troca do nome se espalhou? Sim, porque os que moravam ali perto acabaram por saber, mas e os outros? Como foi que o resto da população, os vilarejos em redor tomaram
ciência da alteração?
- No dia de S. Pedro era rezado um terço em torno do cruzeiro, desde 1911, respondeu o Coronel. O
comer¬ciante Manoel Mendes veio se estabelecer ali pertinho, com sua vendinha olhando bem de frente
para o cruzeiro. Este vendeiro muito esperto e precisando de freguesia, passou a promover terços todo
primeiro domingo do mês. Acabava o terço, vinha um leilão de prendas para a igreja. O pessoal vinha em
peso.
- E o que tem isso a ver com a
divulgação do nome novo?
- Tem muito, porque a reunião
para a troca do nome foi feita num
domingo de terço. Era final de 1912.
Acabada a reunião e aproveitando
a presença do pessoal do terço, o
Quincas subiu numa cadeira e avisou
que daí em diante a aldeia passaria a
se chamar Mirassol. Explicou as razões e aí...
-... aí eu tirei o chapéu, joguei ele
Dois ângulos do mesmo pé de girassol. Girassol nascido no asfalto, à Rua Padre
para
o alto e gritei: - “Viva Mirassol!”.
Ernesto na quadra do cemitério, pouco abaixo do salão de cabeleireiro do Osvaldo
O povo repetiu o viva e pronto! Ese Adevaldo.
Girassol dispensa quaisquer cuidados; nasce e cresce em situações adversas, bas- tas mesmas pessoas se incumbiram
tando uma semente em contato com a terra.
de levar o aviso ao resto da redon(fotos colhidas por esta autora no dia 15/08/09)
deza. E tinha o Mané Mendes também, o dono da venda, que contava a
novidade aos viajantes que paravam ali para um trago e um descanso. E foi simples assim.
IV- O VALOR DAS TERRAS
- É bonita essa história, comentou Docel. Mas me sobrou uma dúvida. Não chega a ser dúvida, mas
curiosidade: Notei que as fazendas eram enormes, boas terras de cultura, com certeza terras caras. Como
é que os senhores compraram suas fazendas, parece que até sem esforço nenhum? Os senhores falam da
compra de terras assim como quem comprava uma dúzia de laranjas.
- Ah, entendi sua curiosidade, replicou o Capitão Neves. Não éramos ricos, não tínhamos herança de
17
Mirasso l 1 0 0 A n o s
Cleunice Orlandi de Lima
família, e mesmo assim compramos muitas terras, é verdade. Mas não somente nós dois conseguiu comprar terras; todo mundo que chegava podia comprar seu sitiozinho, sua fazendinha, seu pedaço de chão
e vou explicar:
Joaquim se ajeitou melhor no sofá; descruzou as pernas e cruzou de novo agora a de baixo colocou
em cima, deu uma respirada forte e começou:
- As terras de Mirassol pertenciam à comarca de Rio Preto. Eram glebas imensas que pertenciam a
poucos donos. Por volta de 1900 começaram as primeiras divisões de terras da comarca para serem colocadas à venda e uma das primeiras terras a serem cortadas foi a do Sertão dos Inácios, aqui de Mirassol.
A medição e o corte desta fazenda duraram de 1901 até 1904 e foi feito pelo Dr. José Teixeira Portugal
Freixo. Eram terras desvalorizadas, cujas qualidades não eram reconhecidas nem aproveitadas, nem cultivadas. Tá acompanhando?
- Sim, siga.
- Os caboclos donos do chão, pessoas simples e ignorantes, não faziam ideia do tesouro que possuíam. Man¬davam medir e cortar suas propriedades e depois, não tendo dinheiro para pagar o trabalho dos
agrimensores, entregavam-lhes suas posses em troco dos serviços. Depois se mudavam para mais longe,
ou ficavam morando na mesma terra que lhes pertencera – agora como empregados dos novos donos.
- Ô, coitados!
- Pois é. Era a lei de quem sabe mais engana mais. Mas esta lei vigora ainda hoje e me deixe continuar:
Por outro lado, Seu Anjo, as terras daqui valiam pouco, ou nada mesmo.
- Sem contar que as estradas que eram péssimas, completou o Coronel, que ouvia e concordava com
cada palavra do amigo. Quem seria o idiota a adquirir terras sem poder chegar nelas por falta de estradas?
Só nós mes¬mos, né, Quinzinho?
- Só nós. O Vítor falou bem: pela escassez de estradas, o valor das terras era ridículo e vou dar um
exemplo:
O Dr. José Teixeira Portugal Freixo, que vinha a ser tio do Sr. Cândido Estrela ofereceu sua gleba toda,
num total de 2.125 alqueires, por 15 contos de réis. E não achou quem quisesse tanta terra por tão pouco
dinheiro!
- As melhores terras eram oferecidas a 10 mil réis o alqueire, ajuntou o Coronel Vítor. Havia muitas
ofertas, mas não havia comprador. Só para comparação: poucos anos depois uma árvore de peroba era
vendida a 25 mil réis, enquanto que um alqueire de chão não encontrava comprador por este preço! Uma
árvore derrubada valia mais que um alqueire de terra! Foi por isso que pudemos comprar tantas terras
sem ficar devendo. Bastava tra¬balhar um tempinho para comprar um sítio. Mais um tempinho trabalhando e economizando, comprava-se uma fazenda das grandes.
V – QUATRO ÁGUAS DE MIRASSOL
Enquanto rolava a conversa, não perceberam que o tempo mudou. Nuvens grossas se formaram e
começou a chover forte. Chuva de vento, com raios e trovões, muita água, verdadeiro dilúvio. Docel exclamou:
- Oba! Adoro chuva! Venham, vamos ver a água caindo!
Desligaram o aparelho de projeção, saíram os três e puseram-se a admirar a água que desabava em
abundân¬cia. Todos os três estavam livres de se molhar porque não possuindo corpos físicos, os pingos
atravessavam-nos e caíam em queda livre. Isso os tornava confortáveis para permanecer enxutos embaixo
de qualquer toró.
Docel observou que a água que desabava em quantidade suficientemente volumosa para promover
enchente de grande proporção, não alagava. Ela caía, corria e se dispersava em grossas enxurradas sem
formar poça.
- Ô gente, fique olhando! Vocês percebem que a água não represa? Ela some rapidinho!
- Isso é verdade, afirmou o Joaquim. Esta cidade é abençoada até nisso. Mirassol jamais terá enchente
18
Cleunice Orlandi de Lima
Mirassol 100 Anos
neste núcleo central da cidade porque, preste atenção, olhe os contornos dela. O centro é elevado, fica
no alto, bem no espigão. Para se chegar ao miolo de Mirassol você tem de subir, não importa em que lugar
esteja. Vai ao centro? Vai? Então você vai subir. Não é nenhuma subidona, mas é subida cansativa, sempre.
Para quem vai ao meio da cidade, os calcanhares ficam sempre em posição mais baixa em relação aos
dedos dos pés. E para quem sai do centro, os dedos ficam mais baixos que os calcanhares, entendeu?
O anjo achou aquela explicação hilariante e pôs-se a rir antes de continuar a ouvir a explicação:
- A água que cai na praça escorre para as beiradas como se caísse sobre um ovo, que não tem onde
parar. É cair e correr para as baixadas.
- E corre para lados diferentes, veja lá! Onde é que estas águas vão se encontrar?
- Elas não se encontram nunca mais! Pode ser que se encontrem no oceano daqui a sabe Deus
quando. Elas caem juntas no centro da cidade e vão formar quatro bacias diferentes, porque correm para
quatro rios diferentes. Vou explicar:
- A água que se bifurca entre a Armando Sales de e a 9 de Julho e cai no Rio Fartura.
Outra água desce para o lado do cemitério e não pode fugir de cair no Piedade.
A terceira enxurrada passa pela prefeitura e deságua na Barra Grande.
A última parte, aquela que passa pela casa paroquial, corre para o São José dos Dourados.
São, pois, quatro águas diferentes alimentadas pela chuva que cai no centro de Mirassol: Fartura, Piedade, Barra Grande e São José dos Dourados.
O anjo estava boquiaberto.
- Do meio de Mirassol saem águas para quatro rios! Que coisa, heim?
- As gotas caem em grupo tão contentinhas conversando, planejando, dando risada. Quando tocam o
chão, o declive do terreno faz com que estas gotas se separem e cada uma parte para um lado. Pode ser
que nalgum dia num posterior remoto voltem a se ver no oceano, mas vão estar bem velhinhas, talvez
nem se reconheçam.
Os três acharam graça do símbolo e o anjo foi adiante com a perguntação:
- Mas me diga uma coisa: qual é o lugar, o ponto xis, o lugarzinho mais alto, o cume, o pico do ovo?
- A esquina do Banco Real, entre ele e a praça. Para checar o que estou dizendo, basta que num dia
de chuva você acompanhe a enxurrada morro acima. Vai dar no Banco Real, pode crer.
- E quando fundaram a cidade vocês já sabiam desses quatro rios?
- A gente sabia que não haveria inundação no centro da cidade porque é terreno alto e liso. Não há
nenhuma montanha, nenhum monte nem colina mais alta que o centro de Mirassol. Mas que alimentaria
quatro rios a gente não pensou nisso não. Foi São Pedro e a nossa Santinha Aparecida quem guiaram a
gente até aqui, não foi mesmo, Vítor?
- Foi, mas tem um porém: A cidade cresceu nas baixadas, veja lá, veja os quatro lados. Muita casa construída no baixadão! Aí não tem como segurar inundação longe delas! Aí há desbarrancamento e há perigo
para as famílias, porque a força da água na baixada é igual em todas as partes do mundo. O que dependeu
de nós, a gente fez. Daí em diante não depende mais de nós, mas de São Pedro, não é verdade, Quinca?
- Verdade.
(((Este é apenas um capítulo do livro que conta a história dos 100 Anos de Mirassol. A edição completa – 2 volumes – será lançada oficialmente ainda este ano, em data a ser definida. O primeiro volume
está pronto e revisado)))
19

Documentos relacionados