Método e os sete vídeos de “Red Carpet” - uma experiência
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Método e os sete vídeos de “Red Carpet” - uma experiência
Método e os sete vídeos de “Red Carpet” - uma experiência prático-teórica João Vilnei de Oliveira Filho ID+ - Instituto de Investigação em Design, Media e Cultura, Portugal LICCA - Laboratório de Investigação em Corpo, Comunicação e Artes / UFC, Brasil Paulo Bernardino Bastos Universidade de Aveiro, Portugal ID+ - Instituto de Investigação em Design, Media e Cultura, Portugal s Abstract “Maybe I will be able to write this article on my scooter. Maybe not!” In this paper, I will explore with ways of writing articles as a reflecting exercise of methodological strategies that I have experienced in articulation of the practical and theoretical components of my Ph.D. research, "the construction of the Impossible House". This is done based on an attempt to analyze a series of seven videos, named “Red Carpet”, made between April and July of 2013, as part of the artistic residency program "HomeBase Projekt", in Berlin. Among other subjects, I'm trying to explore the problems and possibilities of construction of a method, in academic research in art, thinking from making, from and with artistic practice. Thus, beyond presenting one of the time-based works that I developed in my research, my expectation is to use this experience of writing as a chance to explore some tools and “ways to think and say” using a strategic approach and complicity between author-text-reader at different levels. Therefore, crude sentences, almost streams of consciousness, as the opening one, come from my reflecting journal and will be interweaved in the main text when necessary. The article finishes with a reflection on its realization and the articulation between its writing and the construction of “the impossible house. Keywords: City, Game, House, Method, Practical-theoretical research, Prototype. Instruções de leitura para o leitor e regras de escrita para o autor Para a leitura deste artigo, convido o leitor a que ande por casa. O texto será dividido em blocos, com nomes que coincidem com divisões de uma casa e que aqui como um guião de cinema atuam no sentido de organizar a leitura e a escrita em três níveis: distribuindo a informação que é partilhada; funcionando como convite ao leitor de lugares ideais para a leitura; e apresentando detalhes da minha casa e os lugares onde cada um dos trechos será escrito. Sobre o primeiro nível não me parece ser preciso dar muitas explicações. A função dos títulos é normalmente organizar e minimamente apresentar o texto que os sucede e, aqui, eles também fazem isso. Os outros dois níveis estão intimamente ligados e dão mais ferramentas para a construção do texto e sua leitura. Haverá, em cada um desses blocos, o exercício de aproximar a informação que o texto apresenta do espaço onde ele é lido. Essa tentativa deverá ficar mais perceptível em alguns casos e noutros menos, mas é importante dizer-lhe aqui, leitor, que sua experiência de leitura deverá ser influenciada por esse movimento por casa, assim como a minha será influenciada durante a escrita. A não obediência a essa sugestão não impossibilita a leitura do texto, obviamente, já que nada o impede de ler o artigo onde bem entender, mas interfere definitivamente na minha intenção enquanto autor e cria, desde já, uma distância entre nós que eu não gostava que existisse, já que devo precisar da tua ajuda (se não te importares vou começar a trata-te por tu) em diferentes momentos do texto mas, e especialmente, na maneira como imagino que este texto deva ser lido. Como mais uma experiência construída em torno da minha pesquisa de doutoramento, gostava que este texto fosse parte do projeto dos sete vídeos do “Red Carpet” e, para fazermos juntos, preciso de ti. O exercício que nos proponho realizar, de usar os espaços da casa como lugares de leitura/escrita, aproxima-nos de uma experiência de casa que remonta ao Renascimento, numa altura em que essas divisões pareciam ser muito mais móveis e não eram definidas tão rigidamente como são hoje. Bryson, em sua história da vida doméstica, trata dessa questão ao escrever que: A segregação entre todos esses novos aposentos não foi, por muito tempo, tão rigorosa como agora. Todos eles eram, em algum sentido, “salas de estar”. As plantas arquitetónicas italianas do Renascimento, e mesmo depois, não denominavam os aposentos conforme o tipo, porque estes não tinham propósitos fixos. As pessoas circulavam pela casa à procura de sombra ou de luz solar, e muitas vezes levavam os móveis consigo; assim os aposentos, quando recebiam algum nome, geralmente eram marcados como “mattina” (para usar de manhã) ou “sera” (para tarde). Essa informalidade também vigorava na Inglaterra. O quarto de dormir era usado não só para dormir, mas também para fazer refeições privadas e entreter os visitantes mais considerados. (Bryson 2011, 77) Um problema que podes colocar, além de tantos outros como preguiça, falta de interesse nessa espécie de leitura-nômada, ou mesmo a impossibilidade de leres o artigo no interior de casa (o documento pode estar a ser consultado em uma biblioteca, por exemplo), é o peso do livro que tens em mão. Não o peso académico, já que não é esse tipo de artigo que estamos aqui a fazer. Falo do livro em que este texto deverá ser publicado. Gosto de pensar, como escreve Santos, que “cada texto exige do leitor um certo posicionamento. Todo texto ‘ativa’ o seu leitor.” (Santos e Oliveira 2001, 15) Portanto, decidas pela maneira que achares melhor. Gostava que soubesses também que este texto é mais uma das minhas pesquisas, procurando destacar especialmente os problemas e caminhos da construção de um método montado e editado a partir do fazer, a partir da (ou sendo também) prática artística. Assim, ao mesmo tempo em que espero analisar um dos trabalhos que desenvolvi no âmbito da pesquisa, procuro fazer com que esta experiência de escrita seja, ela mesma, uma oportunidade para explorar algumas ferramentas e “modos de dizer” que planeio utilizar na tese, de aproximação e cumplicidade entre autor-texto-leitor em diferentes níveis. Além dessa aproximação, e também relacionado com o ato da escrita, vou aqui realizar alguns exercícios que partilho contigo, organizados na pequena lista que se segue, e que funcionarão para mim como regras de um primeiro jogo que aqui jogo sozinho: 01 - não usar notas. Normalmente, escrevo com muitas (muitas!) notas de rodapé. Neste texto, não usarei nenhuma. Toda a informação extra, por mais ilustrativa e possivelmente interessante que possa ser, não será incluída caso não caiba no corpo do texto. 02 - fazer com que o texto possa ser compreendido mesmo por quem não tem acesso ao conteúdo disponibilizados nos QR Codes: mesmo aproveitando as potencialidades de hiperligação e inserção de conteúdo extra à média papel que a publicação permite, procurarei fazer com que a sua visualização seja complementar mas não imprescindível ao texto. 03 - enviar até o dia 11 para o meu orientador. A data de envio do artigo para a Comissão Científica é dia 13 de abril e gostava de, pelo menos uma vez, não entregar no último dia ao meu orientador para a revisão e validação. 04 - tentar manter o tom. Se por acaso meu tom variar demasiado no decorrer da nossa caminhada, culpa principalmente do “recorte-cola” de diferentes textos que tenho escrito durante a pesquisa, por favor, não me leve a mal. Não te esqueças que sou sempre eu daqui deste lado e que isto, este texto aqui, só vai funcionar se o fizermos juntos. 05 - usar mais “falar” que “escrever”. Então, antes de começarmos a andar por casa, deixo-te com a parte final do prólogo de "Memórias Póstumas de Brás Cubas". Faço isso por partilhar com a personagem, neste momento, do mesmo sentimento que ele apresenta com as seguintes palavras: “a obra em si mesma é tudo: se te agradar, fino leitor, pagome da tarefa; se te não agradar, pago-te com um piparote, e adeus.” (Assis 1982, 11) Corredor No entretanto, ainda existem algumas estradas que podem ser percorridas com agrado, como se nos levassem a algum sítio, no qual parecem que não nos ligam a quase nada ou a lugar algum.” (Thoreau 2011, 31). Figura 01 - Link para vídeo com a apresentação da goteira do corredor da minha casa e espaço onde escrevo a primeira parte deste artigo. Pequena nota sobre as três pequenas notas de a construção da “Casa Impossível” Antes de falar sobre os vídeos de “Red Carpet”, é preciso que entendas melhor o que é a minha pesquisa, "a construção da Casa Impossível”. Para isso, deixo-te três caminhos, três possibilidades de leitura, “três pequenas notas”, ficando ao teu critério optar entre uma delas para continuares o texto. Se decidires ler a “pequena nota zero-um”, terás acesso ao artigo que escrevi no encontro de Avanca em 2013. Ele traz informações sobre o projeto, ainda atuais e suficientemente completas. A “pequena nota zero-dois” apresenta um pouco do que as pessoas que estão perto de mim pensam da “Casa Impossível”. São todos amigos queridos, com diferentes níveis de envolvimento na pesquisa, que respondem a um pedido meu de escreverem um pouco sobre o que acham que o projeto é. A terceira opção é a “pequena nota zero-três”, que mostra, mais-coisa-menos-coisa, o que tenho colado à parede da minha sala de trabalho. Frases escritas em post-its com cores berrantes, que compõem o meu até agora pequenino mapa mental. Este artigo é, dessa forma, pelo menos três artigos. No género romance, há vários textos organizados de modo a possibilitar diferentes experiências de leitura e uso por parte do leitor. Um exemplo interessante é o “O Jogo da Amarelinha”, no qual o leitor é informado dessa particularidade ainda no início do livro, ficando ao seu critério decidir entre um dos dois caminhos que o autor propõe: O primeiro livro deixa-se ler na forma corrente e termina no capítulo 56, ao término do qual aparecem três vistosas estrelinhas que equivalem à palavra Fim. Assim, o leitor prescindirá sem remorsos do que virá depois. O segundo livro deixa-se ler começando pelo capítulo 73 e continua, depois, de acordo com a ordem indicada no final de cada capítulo. Em caso de confusão ou esquecimento, será suficiente consultar a seguinte lista: 73 – 1 – 2 – 116 – 3… (Cortázar 2006, 5) Esse esquema de leitura, no qual o leitor precisa de decidir, por opção ou por capacidade, um caminho entre um determinado número de opções, pode ser relacionado com o que se propunha fazer Mallarmé em seu "Livro". Sobre ele, Umberto Eco e Haroldo de Campos fazem reflexões importantes. O primeiro, antes de abordar as especificidades do "Livro", apresenta a ideia de "obra em movimento": O fenómeno da obra em movimento, na actual situação cultural, não está de maneira nenhuma limitado ao âmbito musical, mas apresenta interessantes manifestações no campo das artes plásticas, onde encontramos hoje objectos artísticos que em si mesmos têm como que uma mobilidade, uma capacidade de se manifestarem caleidoscopicamente aos olhos do fruidor como permanentemente novos. Num nível mais restrito podemos recordar os mobiles de Calder ou de outros autores, estruturas elementares que possuem precisamente a capacidade de se moverem no ar tomando disposições espaciais diferentes, criando continuamente o próprio espaço e as próprias dimensões. (Eco 2009, 78) Na literatura, o exemplo que Eco apresenta é justamente o do "Livro", "as próprias páginas não deveriam seguir uma ordem fixa: elas deveriam ser relacionáveis em ordens diferentes segundo leis de permuta." (Eco 2009, 80) Campos completa: O que revela acentuar aqui, porém, é que o Livro de Mallarmé, ou bloc, como o poeta o denomina, refoge completamente à idéia usual de livro e incorpora a permutação e o movimento como agentes estruturais. (…) As folhas desse livro seriam cambiáveis, poderiam mudar de lugar e ser lidas de acordo com certas ordens de combinação determinadas pelo autor-operador (que de resto não se considera mais do que um leitor situado numa posição privilegiada, face à objetividade do livro que se anonimiza). (Campos 1977, 18) As "leis de permuta" que Eco menciona e as “ordens de combinação determinadas pelo autoroperador”, de que trata Haroldo de Campos, serão utilizadas aqui como regras em um segundo jogo que esta leitura propõe e que terá a ti, leitor, como jogador (não acreditavas realmente que eu jogaria sozinho, pois não?). Se juntarmos à essa liberdade dirigida, limitada por regras, uma participação consciente e livre de leitura; que o ato de ler não apresente nenhum interesse material, ou seja, que a partir dele não se possa obter lucro - Caillois clarifica essa questão, quando trata dos jogos de azar, ao escrever que neles "há deslocação de propriedade, mas não produção de bens" (1990, 25); e que a leitura aconteça inserida em um tempo e espaço definido; é possível resumir, assim, as características formais da ideia de jogo, de acordo com Huizinga. (2005, 16) Dessa forma, segundo Huizinga, e posso aqui incluir Caillois, "o jogo assenta indubitavelmente no prazer de vencer o obstáculo, mas um obstáculo arbitrário, quase fictício, feito à medida do jogador e por ele aceite" (1990, 18), e Gadamer, "somente então é que o jogar preenche a finalidade que tem, quando aquele que joga entra no jogo" (1999, 175), caso continues a leitura a partir deste ponto, terás começado a jogar também. Peço-te que, pelo menos da primeira vez que estiveres a ler esta frase, a jogar este jogo, escolhas a leitura de somente uma das pequenas notas. Acredito que será mais que suficiente para continuares o texto e perceberes o que foi feito em “Red Carpet”. E digo ‘acredito’ porque ainda desconheço o conteúdo completo que elas terão. Agora, enquanto escrevo este parágrafo, só finalizei a primeira nota, recebi resposta de somente uma pessoa para preencher a segunda e, quanto à terceira, tenho algumas dúvidas de que a informação dos post-its será realmente suficiente para se perceber o que é a "Casa Impossível"... As três pequenas notas são precedidas pelos “títulos de 3º nível”, em itálico, que seguem. Pequena nota zero-um No último encontro em Avanca, apresentei um artigo no qual tratava de dois trabalhos que foram desenvolvidos no decorrer da minha pesquisa, “Chico Gauba” e “Antonio Mascarenhas”. Na primeira parte desse documento, descrevo o que é a “Casa Impossível”, trato dos temas que a pesquisa pretendia desenvolver, apresento alguns dos referenciais teóricos com os quais trabalho e dou indicações de como a pesquisa estava naquela altura. Para o leitor que se decidiu por esta nota, o link apresentado na Figura 02 dá acesso a uma das últimas versões do artigo apresentado em 2013. Figura 02 - Link para download do “Jogo, Cidade e Comunidade – Experiências de reflexão para a construção da ‘Casa Impossível’ no jogo ‘The Sims 3’” (Oliveira Filho e Bastos 2013). Se é a primeira vez que lês este documento, salte as próximas duas pequenas notas e continue a leitura onde aparece o subtítulo Protótipos em negrito. Pequena nota zero-dois O projeto da “Casa Impossível” cria comunidades em seu redor. Não é só a tentativa de me aproximar dos espaços da cidade e transformá-los em divisões de uma grande casa, o que me obriga a relacionar-me com pessoas que utilizam esses espaços e me inserir em comunidades que já existem. O que também tem acontecido, e não estava planeado anteriormente, é a formação de pequenos grupos em torno das ações que precedem a realização da casa. Grupos de amigos e curiosos que trazem e partilham comigo todo o tipo de informação sobre casas e sobre impossibilidades, nos mais diferentes contextos e suportes (durante a escrita deste artigo, Luis mostroume a fotografia de Michael Wolf e André enviou-me o link para o trabalho chamado “Canções de Apartamento”, do músico Cícero). Para o leitor que decidiu fazer sua primeira leitura passar por esta nota, vou partilhar o que algumas dessas pessoas pensam que é a “Casa Impossível”. Escrevi para 12 amigos (Eduardo, Mariana, Edmilson, André, Fabiana, Eliseu, Luis, Rosemary, Nilda, Emídio, Mario e Wellington) um email com, basicamente, este conteúdo: Oi, no artigo que eu estou escrevendo vai ter uma parte em que coloco o que os meus amigos pensam que é a "Casa Impossível". a partir do que falámos sobre a minha pesquisa, gostava que escrevesses pra mim o que achas que isto é. fica à vontade para escreveres o que lembrares. agradeço muito a ajuda abraço As respostas que recebi estão separadas por dois asteriscos, que podem ser entendidos como um olhar. Procurei não alterar o conteúdo dos textos, realizando somente algumas pequenas mudanças na formatação, para que eles pudessem fazer parte deste documento sem problemas maiores, e somente quando isso foi realmente necessário. Deves perceber, já nas primeiras respostas, que muitos fizeram confusão entre a “Casa Impossível” que estou a construir e uma casa impossível qualquer. Depois de perceber isso, de ler com mais atenção o email que escrevi e constatar realmente que ele poderia ter sido um pouco mais claro, achei excelente que isso tivesse acontecido. O acaso e a impossibilidade de prever o resultado final de uma jogada é um importante componente da ideia de jogo. Como escreve Caillois, Um desfecho conhecido a priori, sem possibilidade de erro ou de surpresa, conduzindo claramente a um resultado inelutável, é incompatível com a natureza do jogo. (Caillois 1990, 27) As respostas que recebi aqui, como estão e da maneira como foram escritas, dão muito mais cor a esta pequena nota. Elas podem ser lidas a partir do QR Code da Figura 3. Figura 03 - Link para o ficheiro com a íntegra das respostas que recebi por emails. Se é a primeira vez que lês este documento, salte a próxima pequena nota a seguir e continue a leitura onde aparece o subtítulo Protótipos em negrito. Pequena nota zero-três Começo com uma hipótese, post-it rosa que está no centro da parede da sala: é preciso viver o lugar para conseguir trabalhá-lo. Quando usa a cidade como lugar de ação, pareceme que a relação que o artista quer desenvolver com o espaço que atua é muito semelhante ao que Barthes chama, em um contexto diferente, de idiorritmia: “todos os empreendimentos que conciliam ou tentam conciliar a vida coletiva e a vida individual, a independência do sujeito e a sociabilidade do grupo”. (Barthes 2003, XXXIII) O artista procura inserir-se em uma comunidade, que já tem sua maneira de funcionar, e sem deixar de ser artista, para construir, nessa e com essa relação, o seu trabalho. Parece-me que é somente assim que um “trabalho trabalha o lugar”. O nível e os limites de intimidade, com as pessoas e com o lugar, que essa abordagem exige parece-me ser difícil de definir de antemão. Benjamin faz uma reflexão que pode servir de ajuda para clarificar o que quero dizer com isso, quando, em determinado momento do livro que reúne as suas impressões sobre as experiências que realizou com estados alterados de consciência (no caso pelo uso de haxixe), comenta que: “a segunda impressão mais forte foi o jogo com a sala ao lado. Começa-se, aliás a jogar com os espaços. Geram-se tentações do sentido de orientação. Mas aquilo que, no estado de vigília, apenas conhecemos da deslocação muito desagradável que provocamos deliberadamente quando, de noite, num comboio, viajando na posição de costas imaginamos que viajamos na posição de frente e vice-versa, essa experiência, transposta do movimento para o estaticismo, acontece aqui como tentação.” (Benjamin 2010, 34) Como saber o que do viver, pensado, esquecido, consumido, pedido, lavado, cheirado… faz parte dessa relação, foi construído por essa intimidade? Como continua Benjamin, algumas páginas depois, “ainda ao regressar a casa, quando a corrente da porta da casa de banho não quer fechar, a suspeita: isto faz parte do método da experiência.” (Benjamin 2010, 38) Uma criação artística quotidiana, feita de idas e vindas, acasos e certezas, erros e acertos, em que não deixo de ser eu e não procuro mudar o outro nem resolver seus problemas e os da cidade. Tocá-los, raspá-los, mencioná-los, trabalhá-los talvez. Jogar com eles. Sobre essa relação, Canton argumenta que: “dialogar com esse espaço é também compor uma tapeçaria sonora, visual e tátil, vislumbrando a diversidade idiossincrática de seus habitantes, sua arquitetura, sua sinalização, seus códigos cotidianos. Conversar com tudo isso é abraçar o caos e se emocionar com o estranhamento.” (Canton 2009, 22-23) Essa postura do artista na relação que constrói com a cidade parece-me dialogar com a ideia de flâneur que Benjamin desenvolve: "a rua se torna moradia para o flâneur que, entre as fachadas dos prédios, sente-se em casa tanto quanto o burguês entre suas quatro paredes". (Benjamin 2000a, 35) É aqui, na sobreposição (ou nos interstícios?) entre a flânerie e a idiorritmia, entre ser a cidade e não deixar de ser o que sou, que procuro colocar-me durante a construção da "Casa Impossível". Em "Infância em Berlim por volta de 1900", Benjamin fala sobre uma experiência pessoal de se perder na cidade que se aproxima ao que estou aqui a tentar fazer: "Saber orientar-se numa cidade não significa muito. No entanto, perder-se numa cidade, como alguém se perde numa floresta, requer instrução. Nesse caso, o nome das ruas deve soar para aquele que se perde como o estalar do graveto seco ao ser pisado, e as vielas do centro da cidade devem refletir as horas do dia tão nitidamente quanto um desfiladeiro." (Benjamin 2000b, 73) A construção desta pesquisa coloca-me em uma situação que se aproxima a que Joseph Rykwert apresenta no início de "A casa de Adão no Paraíso" quando trata da dificuldade de pensar um objeto que sempre esteve perdido e por isso não poderia ser lembrado: "a natureza do meu tema, portanto, me induz ao paradoxo, pois o objeto primeiro de minha busca deve ser a memória de algo que não pode estar senão perdido". (Rykwert 2009, 6) E prossegue, afirmando que a memória com a qual vai trabalhar não é exatamente a de um objeto, uma coisa, mas a de um estado - "de algo que foi, de algo que foi feito, foi criado: uma ação". (Rykwert 2009, 6) Ele, de certa forma, (re-?)constrói a casa de Adão acedendo a essas memórias, eu construo a impossibilidade de uma casa impossível, promovendo memórias, esses encontros e intimidade, que algumas vezes beira à promiscuidade: "convivência muito próxima com pessoas de todo tipo; 'nos inferninhos há muita promiscuidade', 'vivem em total promiscuidade em barracos diminutos'." (Houaiss 2012). Um exemplo é "Clothes", uma das performances/ações que tenho vindo a desenvolver, na qual troco, primeiro com as pessoas que moram comigo, depois com amigos e no fim com desconhecidos da cidade, as minhas roupas, o meu guarda-roupa. Usar vestuário íntimo de alguém que não se conhece parece-me ampliar o limite do que se entende por intimidade. Voltando para a parede, em volta do post-it rosa há três amarelos, com ideias e possibilidades de caminho para validar essa hipótese. O primeiro diz “a relação que o artista desenvolve com o lugar é próxima a da idiorritmia, segundo Barthes”. O segundo, “a prática artística como espaço de produção de conhecimento”. E o terceiro, “a casa como assunto e espaço para juntar lugar e idiorritmia”. Em um círculo maior, em três post-its verdes, três palavras: performance, método, cidade. Por baixo, um outro grupo de post-its, com os trabalhos práticos que desenvolvi até agora, onde aparece o nome, data e local de realização, data e local de apresentação e produção académica relacionada. Figura 04 - Post-its da parede da sala. Protótipos A principal componente prática da pesquisa, e em volta da qual toda ela tem sido pensada, é construir uma casa tão grande quanto a cidade de Aveiro, e viver nela entre setembro e outubro de 2014. Até lá, procuro intercalar a pesquisa teórica à prática desenvolvendo uma série de trabalhos que chamo protótipos. Cada um deles destaca, trabalha e induz à reflexão sobre pelo menos uma característica que, acredito, voltará a aparecer durante a “Casa Impossível”. Esse método no desenvolvimento do projeto permite que a própria ideia de construção dessa casa seja construída aos poucos, e dá espaço para a sua redefinição constante. Os protótipos não são maquetas ou caricaturas da casa. Cada vez mais, direcionam as leituras e afinam o olhar para a cidade, interferindo diretamente na pesquisa que estou a desenvolver, mudando muitas vezes a direção das expectativas e das leituras, numa experiência de pesquisa que se converte, paulatina e insistentemente, de teórico-prática para prático-teórica. São, até agora, 21. Berlim Entre Abril e Junho de 2013, participei do “HomeBase BUILD V” da residência “HomeBase Projekt”, que me levou a viver 3 meses em Berlim com outros 18 artistas que também estavam interessados em trabalhar com a ideia de casa. Foi uma experiência incrível em muitos níveis. Meu orientador descobriu a residência alguns dias antes do fim do prazo para inscrições, o que me obrigou a preparar a candidatura em pouquíssimo tempo; a ultrapassar a insegurança durante as etapas de seleção, com entrevistas via skype e discussão do portfólio; a necessidade de pedir dinheiro emprestado para ir, para estar lá e para voltar; ter que aprender a conviver com as particularidades da vida em comunidade, numa casa com tantas pessoas de percursos diferentes; e, o que trouxe mais benefícios à construção da minha casa, a possibilidade de realizar mais protótipos (e refletir naqueles que já havia feito. Foi em Berlim, por exemplo, que escrevi o artigo para o congresso de Avanca 2013). Inserido nas atividades da residência, desenvolvi sete protótipos para a “Casa Impossível”. Um deles, “Red Carpet”, nasceu a partir de experiências em vídeo realizadas com uma trotinete que havia na casa onde vivíamos: o andar que ocupávamos era estreito e organizava-se basicamente em um longo corredor com portas em toda a sua extensão que davam acesso aos quartos e salas para uso comunitário. Essa trotinete era utilizada por todos os moradores e servia efetivamente como meio de transporte dentro da casa (tenho conhecimento da trotinete ter sido usada fora de casa somente uma vez durante o período que lá estivemos, quando uma das artistas em residência, Philippa Jeffery [2014], na altura ainda sem bicicleta, experimentou sair por Pankow com ela), característica que me fascinou desde o momento em que tomei consciência da sua existência. Queria aproveitar essa particularidade e registar a utilização dessa trotinete no interior da casa. A experiência que realizei foi então filmar, a partir de 7 diferentes perspetivas, o caminho que a trotinete fazia indo e voltando nesse corredor. Três problemas antes de irmos para o quarto Figura 05 - Organização dos espaços durante a residência. A zona escura, no topo à esquerda, é o meu quarto. No pequeno recuo que se pode ver logo depois da porta, normalmente, era deixada a trotinete que utilizei nos vídeos. Imagino que ela era deixada ali por estar muito próxima de um dos acessos do andar e, por estar no recuo, não atrapalhar a passagem de pessoas pelo corredor. A realização desse protótipo chamou a minha atenção para as potencialidades e a importância de integrar na experiência da casa os transportes públicos da cidade, além de poder discutir os problemas de mobilidade urbana de Aveiro. Na “Casa Impossível”, devem aparecer, além de uma outra trotinete, patins, skates, autocarros, táxis, bicicletas… Os sete vídeos de “Red Carpet” foram apresentados no meu telemóvel, preso a um suporte para GPS, na própria trotinete, durante o “Das Unmögliche Haus” (“A Casa Impossível”, em livre tradução do alemão), festival de encerramento das atividades da residência, em junho de 2013. Querido leitor, temos três problemas. Percebi há pouco que estamos muito próximos do limite de palavras que o artigo pode ter (já teríamos mesmo ultrapassado esse limite, caso estivesse a contar também com as palavras dos textos que estão fora daqui, nas pequenas notas zero-um e zero-dois), segundo a coordenação do congresso. E ainda não saímos do corredor nem vimos nenhum dos vídeos de “Red Carpet”… O segundo problema é que hoje é dia 12 e o prazo para envio do artigo é amanhã, o que já me coloca a falhar uma das regras que criei no início do texto. Depois de o terminar, ele ainda deveria passar pela mão do meu orientador. E, o que me preocupa mais, a minha saúde. Há três dias tenho estado péssimo, com dor no corpo, a garganta muito inflamada, febre que vai e vem e uma vontade de dormir sem parar. Esse meu estado coloca em risco o protótipo que estou a desenvolver este mês, que chama “Não sair de casa durante um mês”, e influencia, obviamente, a escritura deste texto. Inclusivamente, acho que vou dormir um pouco agora. Continuamos quando eu acordar. Duas soluções para três problemas antes de irmos para o quarto e depois de eu acordar Não consigo continuar. Pensei até em três soluções e de decidir entre uma delas com uma jogada de dados (1-2 para primeira solução, 3-4 para a segunda e 5-6 para a terceira): fazer um passeio rápido por casa, com a trotinete que comprei; ficarmos pelo corredor, o que faz sentido já que os vídeos em Berlim foram realizados no corredor; ou desistir. Desisto. A febre subiu, a garganta está cada vez mais inchada e devo ir ao hospital amanhã pela manhã, coisa que destrói meu coração já que saindo de casa ponho fim ao protótipo que estou a realizar este mês. Deixo-te com três prendas: o compromisso de que levarei a trotinete para Avanca e farei a apresentação do artigo em cima dela, a playlist com os vídeos que fiz em Berlim e uma citação do Huizinga que tudo tem a ver com este final melancólico. E uma prenda extra: prometo-te que continuamos, se quiseres, esta conversa noutra altura. Figura 06 - Imagem que mostra o recuo onde a trotinete ficava "estacionada". É possível ver também o telemóvel no suporte e alguns equipamentos acoplados a ela, como a campainha e a lanterna. Para escrever este artigo, comprei uma trotinete. Tinha a ideia de escrever parte do texto a andar por casa com ela, mas não sei se vou conseguir. O jogo tem, por natureza, um ambiente instável. A qualquer momento é possível à “vida quotidiana” reafirmar seus direitos, seja devido a um impacto exterior, que venha interromper o jogo, ou devido a uma quebra das regras, ou então do interior, devido ao afrouxamento do espírito do jogo, a uma desilusão, um desencanto. (Huizinga 2001, 24) Figura 07 - Os sete vídeos de “Red Carpet”. Notas finais escritas bem mais tarde sobre o artigo e os vídeos de "Red Carpet Penso que o texto para a "Casa Impossível", a tese, precisa de refletir de alguma forma a experiência que vivi durante a sua construção. Assim como acredito que com os protótipos que desenvolvi usei e extrapolei conceitos como a intimidade, segurança, conforto, amizade, amor, jogo... todos pensados e trabalhados em volta da ideia de casa, gostava que o texto também me permitisse extrapolar com a minha forma de escrever. Imagino um texto que em que cada parte funciona como uma partícula separada, que pudesse ser alimentada de formas e em tempos diferentes, na medida da necessidade e da sua construção. Como se esse texto fosse sendo construído da mesma forma que a experiência de construção da casa: há um sentido que rege tudo, que está por trás de tudo, mas cada secção, cada parte, pode, e é, desenvolvida separadamente, no seu tempo e do seu modo, e utilizando ferramentas, fontes e métodos de diferentes áreas, numa costura que começa em mim, na minha experiência, mas que só se completa na mão do leitor, que decide como e em que profundidade está disposto a construir o texto comigo. Benjamin constrói uma metáfora que ilustra o que eu quero dizer: "O trabalho em uma boa prosa tem três graus: um musical, em que ela é composta, um arquitetônico, em que ela é construída, e, enfim, um têxtil, em que ela é tecida." (Benjamin 2000b, 27) A ideia era fazer deste texto um protótipo. Mais do que o relato e a reflexão sobre uma ação desenvolvida, meu principal objetivo aqui foi experimentar uma maneira de pensar/dizer que fosse mais afinada com aquela que quero que volte a aparecer na tese. Apresentar o trabalho prático e a base teórica unida, como reflexo de uma produção artístico-teórica que acontece concomitantemente, retroalimentando-se, e não como blocos separados e estanques. A particularidade é que aqui, diferente dos últimos artigos que escrevi, tentei assumir o próprio ato de escrita como uma ação prática para pesquisa que desenvolvo, uma espécie texto-experiência, artigojogo, paper-protótipo. Uma experiência de método que pensa os modos de fazer sem discutir diretamente metodologia, mas onde ela aparece, claro, de diferentes maneiras e sempre que é preciso. Trago conceitos do método cartográfico (Passos, Kastrup e Escóssia 2009), do Grounded Theory, e do método indutivo, sem propriamente dizer que o faço, ‘flerto’ com o método experimental, preparo entrevistas (viste que não tão bem como poderia...), acedo a documentos, realizo trabalho de campo. Enfim, há métodos aqui. E mais, se estiveres atento vais perceber que há, como que camuflado, uma organização "clássica", com introdução, desenvolvimento e conclusão (mesmo que os capítulos não tenham esses nomes), um argumento que é desenvolvido para responder a um problema, uma revisão na literatura, o diálogo com autores..., tudo isso está aqui, parece-me. Extrapolo (e talvez nem extrapole como deveria) um pouco, tanto pela linguagem, qua algumas vezes parece afastar-se do habitualmente usado na academia, quanto na abordagem. Gostava que soubesses que tudo isso foi planeado e usado conscientemente, principalmente como ferramenta para seduzir-te e trazer-te junto de mim durante toda esta experiência de escrita/leitura, prática/teoria. A investigação sobre um modo de escrever que seja jogável, que não se limite às regras da academia mas que jogue com elas, use-as, conheça-as e ultrapasse-as de alguma forma. O descobrir (não criar, inventar, mas descobrir) de um método que procura aproximar o leitor do texto; mais do que isso, um método que procura aproximar o leitor ao fazer do texto, que o ativa e dá liberdade para decidir o que lê e autonomia não somente sobre o que leu, mas mesmo sobre o que está escrito (ou nem escrito está, como são os casos dos links nos QR Codes). Por falar em liberdade, parece-me que a autonomia que o leitor possui quando tem a possibilidade de ler parte do texto no telemóvel a partir de uma hiperligação é de outra dimensão daquela que todo o leitor tem de ler, ou não, a próxima palavra em uma linha de texto, ou a próxima linha de um novo parágrafo. Aqui, a construção do texto em níveis permite-me, enquanto autor, saber que o leitor, ao optar por um caminho ou outro de leitura, tem condições de chegar minimamente "pronto" em determinada altura do texto, diferente do que acontece quando o leitor salta parágrafos ou capítulos em um texto sem essa mesma preocupação. Nada aqui é à toa ou para "encher chouriças". A "pequena nota zero-um", por exemplo, não está aqui sem um propósito, mas para mostrar que esta maneira que experimentei aqui, de falar e pensar a construção da "Casa Impossível" não é obviamente a única possível, nem muito menos a única que eu sei fazer. O texto do ano passado tem semelhanças com este artigo, por tratar também de um protótipo já realizado, escrito dentro dos limites do template proposto pela Comissão do evento, mas os dois diferenciam-se grandemente pela abordagem que desenvolvem. A "pequena nota zero-dois", que fala da criação de comunidades em torno do projeto, também está aqui por permitir uma reflexão importante. Como menciono, em volta de grande parte dos protótipos, e em diferentes fases de desenvolvimento, pude notar a criação de grupos que dialogavam comigo e ajudaramme a dar vida às ações que construía. Em alguns, essa formação de grupos era promovida diretamente por mim e fazia parte do trabalho, como é o caso de "Pores do sol" (Oliveira Filho 2014b), "I like cakes" (Oliveira Filho 2013) e mesmo deste artigo. Noutros, isso aconteceu sem o meu incentivo ou controle, como em "A construção do quarto impossível" (Oliveira Filho 2012). Essa é uma das características da "Casa Impossível" que aparece em praticamente todos os protótipos, por isso o meu interesse de incorporar aqui a fala de pessoas sobre a casa que estou a construir, exercício que me ajuda a repensar o meu projeto refletindo sobre como falo a respeito dele e como as pessoas que estão ao meu redor percebem-no. Ainda sobre a "pequena nota zero-dois", a confusão que algumas pessoas fizeram no texto que me enviaram parece-me relacionada com a maneira pouco clara como fiz a pergunta. Talvez essa pergunta pouco clara seja também um reflexo sobre a dificuldade de encontrar a pergunta certa para a minha pesquisa. Já ultrapassei metade do tempo que tenho para finalizar o doutoramento e começa a ser hora de definir certas questões para que a "Casa Impossível" seja construída com bases fortes e aguente-se de pé contra os ventos fortes de Aveiro. Rever o artigo, nesta altura, permitiu-me aprofundar algumas questões, especialmente na pequena nota zero-três, como a inclusão de novas leituras e revisão de antigas. Parece-me que essa nota é o momento do texto que mais contributos trouxe para a maturação do desenho da "Casa Impossível", juntamente com a ideia do "texto-protótipo" que já comentei. Sobre os vídeos de "Red Carpet", só agora lembrei-me que a ideia nasceu de um vídeo anterior, tão longo quantos os vídeos da série, em que com a câmara parada gravei o som que fazia um dos radiadores quebrados que tinha no quarto que ocupei em Berlim. Sofri durante um fim de semana com aquele som que aparecera da mesma maneira que sumira, sem que eu percebesse como. No vídeo que o próximo QR Code apresenta, vê-se o recuo na parede onde ficava o radiador, parte de uma das janelas do meu quarto, a ponta da minha toalha pendurada e um pequeno pedaço da parede lateral pintada de violeta. Figura 08 - Link para "one minute of sound from my new room". O vídeo nunca foi o meu campo de expressão favorito e normalmente aparece na minha produção como registo das ações que realizo. Em "Red Carpet" isso também aconteceu. Na verdade foram sete performances que a Residência acompanhou, em maior ou menor intensidade: participando diretamente da sua produção, como é o caso do vídeo "03 - a scooter and the red carpet. And Pepe Again", em que Pepe Dayaw, um dos artistas da casa, opera a câmara (se voltares a ver os vídeos com auscultadores, deverás ouvir o assobio que dou e que é o sinal para que ele parasse de filmar), por aparecerem e estarem no corredor quando a filmagem acontece, ou simplesmente por quererem ver o vídeo pronto. Mesclam-se aqui mais uma vez componentes já mencionados no texto e que fazem parte da "Casa Impossível", como a intimidade e a formação de comunidades em torno do projeto. Como disse, os vídeos foram apresentados na própria trotinete em que foram filmados. Foi a maneira que eu encontrei de partilhar com as pessoas que visitavam a exposição a experiência de fazer os vídeos, que rodavam em loop no meu telemóvel. Havia, dessa forma, o convite de andar por casa com a trotinete enquanto os vídeos eram visualizados, o que ocasionou momentos de desequilíbrio e diversão em muitos dos que realizaram a experiência. No link que segue, é possível ver o vídeo "Jimmy?" que mostra uma das pessoas que utilizaram a trotinete durante a exposição. Figura 09 - Link para "Jimmy?". [Respiro profundamente] Imagino que por esta altura já não estejas no corredor e fico a conjeturar em que parte da casa estás (Calvino 2002, 21). Confesso-te também que não estou mais no meu corredor e que toda esta última secção foi escrita na minha mesa de trabalho que fica na sala. Fiz isso porque pra mim o fim do texto realmente está ali, naquela playlist com os vídeos, no fim do jogo que nos propomos jogar e que acabou prematuramente. As informações deste anexo poderiam estar espalhadas pelo texto, mas preferi que aparecessem aqui, claramente separadas, por terem sido escritas em um momento diferente daquele, como digo no título. Ainda agora, prefiro o fim melancólico ocasionado pela febre e pela dor no corpo, mas entre alterar o artigo, o tempo do artigo, e incluir estes parágrafos com cara de conclusão no final, prefiro isto. Bibliografia Assis, Machado de. 1982. Memórias póstumas de Brás Cubas | Dom Casmurro. São Paulo: Abril Cultural. Barthes, Roland. 2003. Como viver junto – simulações romanescas de alguns espaços cotidianos. Tradução do francês de Leyla Perrone-Moisés São Paulo: Martins Fontes. Bell, Kirsty. 2013. The Artist's House: from workplace to artwork. Berlim: Sternberg Press. Benjamin, Walter. 2000a. Charles Baudeleire um lírico no auge do capitalismo. Tradução de José Carlos Martins Barbosa e Emerson Alves Baptista São Paulo: Brasiliense. _____. 2000b Rua de mão única. Tradução de José Carlos Martins Barbosa. São Paulo: Brasiliense. _____. 2010. Sobre o haxixe e outras drogas. Tradução do alemão de João Barrento. Odivelas: Assírio & Alvim. Bryson, Bill. 2011. Em uma casa – Uma breve história da vida doméstica. Tradução do inglês de Isa Mara Lando. São Paulo: Companhia das Letras. Caillois, Roger. 1990. Os jogos e os homens – a máscara e a vertigem. Tradução do francês de José Garcez Palha. Lisboa: Edições Cotovia. Calvino, Italo. 2002. Se numa noite de inverno um viajante. Tradução do italiano de José Colaço Barreiros. Lisboa: Editorial Teorema. Campos, Haroldo de. 1976. A arte no horizonte do provável - e outros ensaios. São Paulo: Editora Perspectiva. Canton, Katia. 2009. Espaço e lugar. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes. Cortázar, Julio. 2006. O jogo da amarelinha. Tradução do espanhol de Castro Ferro. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira. Eco, Umberto. 2009. Obra Aberta. Tradução de João Rodrigo Narciso Furtado. Lisboa: Difel. Feyerabend, Paul. 1977. Contra o método. Tradução do inglês de Octanny S. da Mota e Leonidas Hegenberg. Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves Editora. Gadamer, Hans-Georg. 1999. Verdade e Método I: traços fundamentais de uma hermenêutica filosófica. Tradução do alemão de Flávio Paulo Meurer. Petrópolis: Vozes. Huizinga, Johan. 2005. Homo Ludens – o jogo como elemento da cultura. Tradução do alemão de João Paulo Monteiro. São Paulo: Editora Perspectiva. Lagnado, Lisette e Pedrosa, Adriano [org.]. 2006. 27ª Bienal de São Paulo: Como viver junto. São Paulo: Fundação Bienal. Oliveira Filho, João Vilnei de e Paulo Bernardino Bastos. 2013. “Jogo, Cidade e Comunidade – Experiências de reflexão para a construção da ‘Casa Impossível’ no jogo ‘The Sims 3’”. Comunicação apresentada na AVANCA | CINEMA 2013 – Conferência Internacional de Cinema- Arte, Tecnologia, Comunicação, 24-28 de julho. Passos, Eduardo; Kastrup, Virginia; Escóssia, Liliana Da. 2009. Pistas do método da cartografia: Pesquisa-intervenção e produção de subjetividade. Porto Alegre: Editora Sulina. Rykwert, Joseph. 2009. A casa de adão no Paraíso - a idéia da cabana primitiva na história da arquitetura. São Paulo: Editora Perspectiva. Santos, Luis Alberto Brandão e Silvana Pessôa de Oliveira. 2001. Sujeito, tempo e espaço ficcionais introdução à teoria da literatura. São Paulo: Martins Fontes. Thoreau, Henry David. 2011. A Arte de Caminhar. Tradução do inglês de Alberto Cardoso. Lisboa: Padrões Culturais Editora. Valente, António Costa e Rita Capucho, org. 2013. AVANCA | CINEMA 2013. Avanca: Edições Cine – Clube de Avanca. Webgrafia Global Sheepwoman Research Laboratory. 2014. Página da artista Philippa Jeffery. http://globalsheepwomanresearchlaboratory.blogspot.pt/. Acedido em 7 de Abril de 2014. HomeBase Projekt. Página da residência. http://homebaseproject.org/. Acedido em 7 de Abril de 2014. Oliveira Filho, João Vilnei de. 2012. Imagens do protótipo "A construção do quarto impossível" realizado em Guimarães em outubro de 2012. https://www.facebook.com/joaovilnei/media_set?set=a.43853 7459516710.91451.100000813807088&type=3. Acedido em 7 de abril de 2014. Oliveira Filho, João Vilnei de. 2013. Vídeo com o registo do protótipo "I like cakes" realizado em Berlim em julho de 2013. http://youtu.be/aR8ob8LXBOg. Acedido em 7 de abril de 2014. Oliveira Filho, João Vilnei de. 2014a. Página do Facebook. https://www.facebook.com/joaovilnei. Acedido em 3 de abril de 2014. Oliveira Filho, João Vilnei de. 2014b. Página do Facebook. https://www.facebook.com/dozeporesdosol. Acedido em 9 de junho de 2014. "promiscuidade", in Grande Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, 2012, http://houaiss.uol.com.br/busca?palavra=promiscuidade. Acedido em 7 de abril de 2014. Wolf, Michael. Página do artista. http://photomichaelwolf.com/#100x100-2/17. Acedido em 7 de abril de 2014.