Forte do Presépio
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Forte do Presépio
44 ANO X / Nº 17 Forte do Presépio PAULO ROBERTO RODRIGUES TEIXEIRA ○ ANO X / Nº 17 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 45 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ O Forte do Presépio, ao longo da sua história, teve diversos nomes: Forte do Presépio de Belém, Forte do Senhor Santo Cristo, Forte do Castelo do Senhor Santo Cristo e Forte do Castelo. Atualmente é conhecido pelo nome original, escolhido pelos portugueses, no ano de 1616. A maior ameaça que tiveram os nossos colonizadores, nessa época, foram os índios tupinambás. No início, havia um convívio amigável entre eles, especialmente por terem ajudado na construção do forte. Entretanto, com o decorrer do tempo, as atitudes dos colonos mudaram e passaram a abusar das mulheres e escravizar os homens, despertando um ódio contra o invasor português, que culminou com uma sangrenta batalha que durou 12 horas, com muitas perdas para ambos os lados. Quanto aos invasores estrangeiros que sondavam a região nada ocorreu e nenhum combate travou-se. Somente no século XIX irrompeu a revolta chamada Cabanada. Tratava-se de um movimento civil contra a elite portuguesa. O forte serviu de aquartelamento para os revoltosos (18351840). Durante a troca de tiros com a armada do inglês John Taylor, contratado pela regência para dar fim à insurreição, a estrutura do forte ficou abalada, necessitando realizar restaurações, entre outras já ocorridas. Mais tarde foi usado como hospital militar, arsenal de guerra, círculo militar e, atualmente, é um dos pontos mais importantes do polo turístico da cidade de Belém, atraindo diariamente um grande número de visitantes. O Forte Está localizado na Ponta de Maúri, na confluência do Rio Guaianá com a Baía de Guajará, dominando a entrada do porto e o canal de navegação que costeia a Ilha das Onças, em Belém, 46 ANO X / Nº 17 ANO X / Nº 17 47 no Estado do Pará. Debruçado sobre o rio, tinha o domínio de fogos sobre qualquer embarcação que estivesse ao alcance de seus canhões, utilizando o acesso pela Baía de Guajará. Uma fossa profunda em quase toda a extensão do forte proporcionava proteção contra os indígenas ou qualquer ameaça de força militar externa. Uma ponte de madeira conduzia à porta de entrada, onde localizavamse o aquartelamento, o corpo da guarda e a casa do comandante. Hoje são ocupados pelo museu e administração do forte. De forma irregular, as suas muralhas eram compactas e ofereciam boa segurança contra os impactos dos tiros e também contra os índios. As peças de artilharia posicionavam-se nas plataformas à frente e na 48 ANO X / Nº 17 lateral esquerda. Em 1868, o forte dispunha de 52 peças de canhões de diversos calibres. O parapeito envolvia a maior parte do forte, de onde os soldados se posicionavam para observação e combate. História A chegada dos portugueses à Amazônia deu-se em 1616, após terem derrotado os franceses no Maranhão, no mês de novembro do ano anterior. Ingleses e holandeses, sabedores do potencial da região amazônica, iniciaram aproximação com os indígenas, negociando com eles e conhecendo gradativamente a riqueza da terra. Portugal, sentindo a ameaça, nomeou Francisco Caldeira de Castello Branco, ex-capitão-mor do Rio Grande do Norte, para comandar a expedição de exploração da área assediada pelos estrangeiros, na boca do Rio Amazonas, recebendo o título de Descobridor e Primeiro Conquistador do Rio das Amazonas. Partiu de São Luís do Maranhão em 25 de dezembro de 1615, com três navios e duzentos homens, atingindo a região habitada pelos índios tupinambás. Ao desembarcar, iniciou a construção de uma frágil fortificação de taipa, armando-a com 12 peças de artilharia, sendo chamada de Forte do Presépio de Belém, em homenagem ao dia de Natal, quando partira a expedição do Maranhão. No seu interior foram construídos alojamentos para a guarnição, cuja cobertura era de palha. O objetivo ANO X / Nº 17 49 FOTO: ADEMILDE SARTORI era o de conter eventuais agressões dos indígenas e ataques dos corsários ingleses e neerlandeses. Em 1619, os índios tupinambás, aliados dos portugueses na sua chegada e que os havia ajudado a construir o forte, enfurecidos, desencadearam um violento ataque ao povoado. Queriam expulsar os conquistadores portugueses que violentavam suas filhas e mulheres e ainda os escravizavam. O ataque ocorreu de madrugada, quando centenas de índios atiravam flechas incendiárias e venenosas, surpreendendo os colonos e a 50 guarnição do forte. A batalha durou quase 12 horas e só terminou quando o cacique Guaiamiaba, o líder do ataque, tombou depois de um tiro certeiro de arcabuz. Depois da guerra com os tupinambás, o forte não participou de qualquer ataque militar para repelir invasor estrangeiro. Danificada, essa primitiva fortificação foi substituída por outra mais sólida, de taipa de pilão. Em 1621, realizaram-se obras de restauração e ampliação do forte, sendo construídos um ANO X / Nº 17 FOTO: ADEMILDE SARTORI ANO X / Nº 17 FOTO: ALBERTO BARCKERT FOTO: ADEMILDE SARTORI FOTO: ADEMILDE SARTORI baluarte, um alojamento para sessenta praças, um torreão e ainda foram trazidas quatro peças de artilharia, aumentando seu poder de fogo. Nessa época passou a chamar-se Forte do Castelo do Senhor Santo Cristo, mais tarde também Castelo São Jorge e, finalmente, Forte do Castelo, sendo atualmente chamado de Forte do Presépio, o seu primeiro nome. A Carta-Régia de 30 de maio de 1721, pelas más condições em que se encontrava o forte, autorizava a sua reparação, sendo contratado o pe- dreiro Francisco Martins, em Lisboa, para executar o trabalho, sob a direção do engenheiro e sargento-mor engenheiro Carlos Varjão Rolim, trazido de São Luís do Maranhão. Em 1753, o Forte do Castelo passaria a funcionar pela primeira vez como hospital, para atender mais de trezentas pessoas acometidas de um surto epidêmico na viagem da metrópole portuguesa para Belém. A partir de 1759, passa a funcionar como hospital militar, e a ser conhecido como Hospital do 51 FOTO: ALBERTO BARCKERT FOTO: ALBERTO BARCKERT 52 Castelo. Essa função não perdurou muito, uma vez que o Governador Fernando da Costa Ataíde Teivi comprou do proprietário do engenho, Domingos Bacelar, o imóvel que viria a sediar o Hospital Militar e hoje é conhecido como Casa das Onze Janelas. Em 1832, estando em más condições de conservação, foi desarmado, contribuindo para que o Movimento Cabanada tomasse as suas instalações, transformandoo em aquartelamento de resistência contra a dominação portuguesa. O movimento civil cobrava maior direito de liberdade e expressão e protestava contra a presença portuguesa na cidade (1835-1840). O forte foi ainda restaurado em 1850, acrescentando novas instalações, entre elas, novos quartéis para a tropa, casa do comandante, ponte sobre o fosso e portão com muralha de cantaria do lado ao Rio Guaianá. ANO X / Nº 17 Em 1868, o forte prosseguia em obras de restauração, ocasião em que dispunha de 52 peças de canhões de diferentes calibres. Em 1876, foi desarmado, sendo instalado nele o Arsenal de Guerra, por determinação do Ministério da Guerra, permanecendo em atividade apenas durante um ano. Em 1878, em virtude da quantidade de flagelados provenientes do nordeste, o forte os acolheu, voltando novamente a ser utilizado para fins hospitalares. Em 1907, o governo federal autorizou a empresa privada Port of Pará a se instalar no forte e fazer transformações que lhe fossem convenientes, desde que se comprometesse a devolvêlo com as muralhas reconstruídas e reformá-lo. Em 1920, voltou a ser administrado pelo Exército. Em 1962, foi tombado pelo IPHAN, já bastante descaracterizado, transformando-se em atração turística na cidade, acomodando o Círculo Militar de Belém. A partir de 1997, deixa de sediar o Círculo Militar e se inicia uma intervenção arquitetônica, transformando-o em espaço cultural com museu e aproveitando as suas instalações para apresentação de espetáculos musicais, teatrais, exposições temporárias e atividades sociais. ANO X / Nº 17 53 Encerramento O Forte do Presépio foi um marco na história da cidade de Belém, pois ela começou com a criação do forte em 1616. A cidade velha, de grande importância no cenário turístico atual, é o retrato do que ela foi, no início do século XVII, e mostra a importância que tinha o forte, proporcionando a segurança necessária para o seu crescimento, uma vez que havia uma grande ameaça ao povoado – os índios tupinambás. 54 Ao longo da sua existência, nenhuma agressão externa ocorreu, em que pese a presença de corsários holandeses e franceses na foz do Rio Amazonas. O inimigo principal foram os indígenas que, com o passar do tempo, se adaptaram e conviveram com a população que, por sua vez, passou a respeitá-los. Na Cabanada, revolta do povo contra a elite política do Pará, os revoltosos utilizaram o forte para aquartelamento, porém, o movimento civil foi derrotado. No decorrer dos anos, ao encerrar ANO X / Nº 17 as suas atividades operacionais de defesa da área estratégica, que exercia desde a sua criação, foi usado como hospital militar, arsenal de guerra, círculo militar e, finalmente, como um dos mais importantes pontos turísticos da cidade de Belém, passando a ser administrado pelo Estado. Hoje, visitado diariamente por inúmeros estudantes da rede de ensino público e particular, turistas nacionais e estrangeiros, oferece dados históricos valiosos, como peças e objetos dos índios e dos colonizadores. Tudo faz parte do preANO X / Nº 17 cioso acervo do museu, localizado no interior do forte, que ainda dispõe da beleza arquitetônica da fortificação, com suas muralhas debruçadas sobre o rio e os canhões de diversos calibres, com as respectivas munições, que ali sempre estiveram para defender o território contra o invasor. ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ PAULO ROBERTO RODRIGUES TEIXEIRA – Coronel de Infantaria e Estado-Maior, é natural do Rio de Janeiro. Tem o curso de Estado-Maior e da Escola Superior de Guerra. Atualmente é assessor da FunCEB e redator-chefe da revista DaCultura. 55