Você pode perceber que eu fiz isso ao montar os dois slides que

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Você pode perceber que eu fiz isso ao montar os dois slides que
ATENDIMENTO SISTÊMICO EM POLÍTICAS PÚBLICAS
Maria Otaviana Mindêllo Muschioni
1
Soraya Corgosinho Soares do Amaral
2
1
Psicóloga, Especialista em Atendimento Sistêmico e Redes Sociais, Sócia fundadora da Equipe Práticas
Sistêmicas, [email protected]
2
Pedagoga, Psicóloga, Especialista em Atendimento Sistêmico e Redes Sociais; Especialista em
Metodologia do Ensino Superior e Especialista em Psicopedagogia. Sócia fundadora da Equipe Práticas
Sistêmicas, [email protected]
.
Resumo
Neste artigo, apresentaremos práticas sistêmicas realizadas no campo das políticas públicas, abordando
duas situações-problema. Na primeira, em que crianças que tiveram seus direitos violados estavam
institucionalizadas em abrigo, foram atendidas as famílias, a instituição, a rede social e de serviços. Na
segunda, foi atendida a família de uma criança que foi abusada sexualmente, juntamente com a rede social
e de serviços. Em ambos os atendimentos, a rede social e de serviços, conjuntamente com as famílias,
buscaram a solução para a situação- problema por eles mesmos identificada. Em ambos os casos, o
sistema com o qual trabalhamos são pessoas em interação – conversando, linguajando, construindo
significados sobre algo que elas acreditam que não está como deveria estar, ou seja, o “sistema
determinado pelo problema – SDP”. Distinguimos que os atendimentos realizados vão ao encontro do que
está proposto na Constituição brasileira: a participação dos membros da sociedade como atores de seu
próprio destino.
Palavras-chave: Políticas Públicas, Pressupostos Sistêmicos,
Determinado pelo Problema – SDP, Processo de Coconstrução.
Atendimento
Sistêmico,
Sistema
Resumen
En este artículo, presentaremos prácticas sistémicas realizadas en el campo de las políticas públicas, y
trataremos de dos situaciones problema. En la primera, en que niños en situación de riesgo social estaban
en una casa de acogida, fueron atendidas la familias, la institución y la red social y de servicios. En la
segunda, en que un niño había sido víctima de abuso sexual, fueron atendidas la familia y la red social y de
servicios. En ambos atendimientos, la red social y de servicios y la familia habían identificado la situación
problema y tomaron la iniciativa de buscar ayuda. En ambos casos, trabajamos con personas en interacción
– conversando, expresándose, construyendo significados sobre algo que ellas consideraban no estar como
debería estar, o sea, el “sistema determinado por el problema” – SDP. Creemos que los atendimientos
realizados cumplen lo que está proposto en la Constitución brasilera: la participación de los membros de la
sociedad como actores de su propio destino.
Palabras clave: Políticas Públicas, Presupuestos Sistémicos, Enfoque Sistémico, Situación Determinada
por el Problema - SDP, Proceso de Co-construcción.
As Políticas Públicas, segundo Aun (2010),
“caracterizam-se por serem a forma de agir do Estado e por se referirem ao
espaço público da sociedade. O Estado, em cada um de seus três níveis –
federal, estadual, municipal – é o gestor das políticas públicas, o que não significa
que é o responsável por pô-las em práticas, providenciar recursos e condições
necessárias para sua realização”.
Sendo assim, como fazer com que o cidadão, na posse de seus direitos, usufrua das políticas
públicas e coconstrua com elas ações efetivas para a solução de seus problemas. Pensando neste aspecto,
é que trazemos duas experiências de Atendimento Sistêmico à família e sua rede social com o intuito de
evidenciar o efetivo do desenvolvimento das políticas públicas na sociedade.
Segundo Aun (2010), a Constituição de 1988, no que se refere às políticas sociais, coincide com no
novo paradigma de ciência, pois estabelece como princípios norteadores “a universalização dos direitos
sociais, a democratização e a descentralização administrativa e a participação da comunidade”. A partir de
então, abre-se a possibilidade de uma construção democrática com a participação da sociedade civil. Haja
vista, os movimentos populares que vivenciamos agora, em 2013, em todo o país, buscando mudanças no
campo das políticas sociais, da economia, etc. Podemos então dizer que estamos em um processo
constante de tornar-se e as regras de relação entre o Estado e a sociedade também estão em processo de
mudança.
As mudanças que vem ocorrendo, não apenas no campo social, como em vários outros campos da
atividade humana, refletem mudanças no âmbito da ciência.
A ciência desenvolveu-se a partir de compreensões fragmentadas das coisas, inclusive, levando
seus objetos de estudo para laboratórios, a fim de estudá-los separadamente de seus contextos, instalandose aí a “fragmentação do objeto de estudo, a compartimentação dos campos do saber, as especializações.”
(VASCONCELLOS, 2006, p.78). Tal forma de ver o mundo permaneceu inquestionável até o momento em
que acontece uma revolução paradigmática, ou seja, o mundo passa a ser visto e percebido através de
conjuntos de elementos em interação que formam um sistema. Sistema esse que possibilita que o foco
esteja nas relações entre os elementos do próprio sistema e dele mesmo com outros sistemas. A partir de
então, os cientistas passam a rever seus pressupostos, o que acarreta em “mudanças da nossa forma de
estar e de agir no mundo” (VASCONCELLOS, 2006, p.79).
Estamos diante de uma nova visão de mundo, que Esteves de Vasconcellos (2006) aponta como
uma revolução no olhar do cientista que até então se apoiava nos paradigmas tradicionais, constituindo-se
um novo paradigma para a ciência. A autora identifica três dimensões que sintetizam as mudanças que vêm
ocorrendo nas várias áreas da ciência. São elas:
Quadro 1: Pressupostos da ciência novo paradigmática
Complexidade, sistemas amplos,
ecossistemas, causalidade circular.
redes,
Só é possível compreender as situações
abordadas nos sistemas, se considerarmos o
seu contexto.
Instabilidade,
imprevisibilidade,
evolução,
incontrolabilidade, saltos qualitativos.
O mundo está em processo de tornar-se, de
forma que não é possível prever situações.
Intersubjetividade, inclusão do observador,
coconstrução, significação da experiência na
conversação.
É impossível dizer a respeito de uma
“realidade” ou situação, sem a interferência do
modo de olhar do pesquisador/ observador.
Fonte: Esteves de Vasconcellos, 2006, p. 102 (adaptação nossa)
Parece que as diretrizes apontadas pela Constituição Brasileira de 1988 para a construção das
propostas das políticas de assistência têm coincidido com esses pressupostos e são distinguidas por Aun
(2010) como coerentes com o pensamento sistêmico, quando a Constituição:
“1 - Prevê a articulação das políticas/programas, traz a possibilidade de
ultrapassar/romper com a fragmentação do sistema e viabilizar a desejada
articulação dos seus elementos.
2 - Prevê a descentralização do poder, distribuindo-o com a sociedade, traz à
consideração a imprevisibilidade dos rumos do sistema.
3 - Ressalta a importância da participação da sociedade na formulação de suas
próprias regras, reconhece-a e legitima-a como capaz e detentora de recursos
para colaborar na construção de solução para dificuldades que enfrenta”. (AUN,
2010, p.255).
Entretanto, tem acontecido que a implementação das políticas, por parte dos programas/serviços,
tem sido dificultada por não se usarem práticas que sejam coerentes com os pressupostos sistêmicos, que
contemplem as “orientações sistêmicas” estabelecidas pelas diretrizes que se encontra na Constituição para
as políticas.
Como desdobramento dessa mudança constitucional, as políticas tiveram um novo olhar sobre as
crianças na família, que foi normatizado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA (1990),
considerado um importante e inovador marco regulatório nas relações familiares e sociais das crianças e
dos adolescentes no Brasil. Foi elaborado para tratar com maior especificidade e cautela, dos cuidados
necessários e direitos pertencentes às crianças e adolescentes, assegurando o bem-estar de cidadãos que,
por si só, não teriam condições para fazê-lo. Define que as crianças são as pessoas entre 0 à 12 anos
incompletos e que os adolescentes são aqueles entre 12 e 18 anos completos e, ainda que são sujeitos de
direitos e pessoas em desenvolvimento.
O ECA reforça os papeis da família, do Estado e da sociedade na proteção das crianças e dos
adolescentes. Ele prevê, no seu artigo 5°, que “Nenhuma criança será objeto de qualquer forma de
negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punindo na forma da lei qualquer
atentado, por ação ou omissão, aos direitos fundamentais” e, no artigo 98, parágrafo II, que “As medidas de
proteção à criança e ao adolescente são aplicáveis sempre que os direitos reconhecidos nesta Lei forem
ameaçados ou violados: por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável”.
Considerando esses princípios apresentados, distinguimos duas situações-problema em que houve
violação dos direitos da criança estabelecidos, tanto na Constituição Brasileira de 1988, quanto no Estatuto
da Criança e do Adolescente.
A Metodologia de Atendimento Sistêmico, desenvolvida por Aun, Esteves de Vasconcellos e Coelho
(2010) viabiliza práticas coerentes com os pressupostos sistêmicos acima identificados. Assim, distingue
sistema como pessoas em interação, conversando, dialogando, linguajando e que, nessas interações,
muitas vezes, vivem relações contraditórias às que inviabilizariam a solução de seus problemas. São
conversas em que acontecem acusações e recriminações recíprocas em relação a algo que está
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acontecendo, o que, ao olhar do observador, produz o “sistema determinado pelo problema – SDP” .
Desta forma, nos Atendimentos Sistêmicos que descreveremos a seguir, abordamos os sistemas
constituídos em torno da situação-problema distinguida, que são respectivamente: “a promoção da família
para reinserção das crianças abrigadas” e “a coconstrução de um acolhimento e acompanhamento à família
de uma criança que teve seus direitos violados”.
Descrições dos Atendimentos Sistêmicos:
1º caso - A promoção das famílias para reinserção das crianças abrigadas
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O Abrigo atende crianças da grande Belo Horizonte, oriundas de famílias pobres e
multiproblemáticas. Foram 13 crianças de 6 famílias (uma delas em processo de destituição familiar) que
tiveram seus direitos violados por: abuso sexual, alcoolismo de um dos pais, negligência e abandono e
foram abrigadas, por autoridade competente.
Este trabalho teve como objetivo a promoção das famílias para reinserção nelas das crianças que
estavam abrigadas, para evitar o que tem ocorrido frequentemente: o tempo médio de abrigamento é de
três anos e meio, segundo levantamento da Prefeitura de Belo Horizonte - PBH – Seminário Política Social
do Município para Criança Pequena: Formulando novas ações, Belo Horizonte, 2000.
Quadro 2: Condições das famílias e das crianças do Abrigo
FAMÍLIA
FILHOS ABRIGO RESIDÊNCIA
MOTIVO
do Período
ABRIGAMENTO
ABRIGAMENTO
1 – Simone
F- 6 anos
Vila São José
Abuso sexual
10 meses
M - 4 anos
2 – Leandra
F - 8 anos
Cachoeirinha
Mãe alcoólatra
11 meses
3 – Laura
F - 7 anos
Betânia
Negligência
10 meses
M - 1,9 anos
4 – Sandra
M - 5 anos
Vila Joana D’Arc
Negligência
e 07 meses
1
Denominação utilizada por Goolishian e Winderman (1989/ 1988) e adotada por Aun, Esteves de
Vasconcellos e Coelho, na obra Atendimento Sistêmico de Família e Redes Sociais, para descrever a
situação abordada pela Metodologia de Atendimento Sistêmico.
2
O relato do Caso do Abrigo X está baseado no trabalho de conclusão de curso “Da institucionalização à
reinserção familiar: o desfio de garantir o caráter excepcional e provisório da medida de abrigo” (AMARAL,
S. C. S. RIBEIRO, K. R.; SILVA, A. F. B., 2005).
F - 4 anos
M - 8 anos
Serra
M - 6 anos
M - 5 anos
F - 4 anos
06 – Salete
M - 9 anos
Serra
(*)
F - 7 anos
(*) Família em fase de destituição familiar
5 – Sara
abandono
Mãe doente
8 meses
Abandono
19 meses
Equipe do abrigo: 2 auxiliares de serviços gerais, 1 governanta, 1 coordenadora – mãe social




Parcerias:
Banco de Alimentos da PBH
Juizado Especial Criminal de BH
Missionária americana – supre necessidades especiais – dentista, cabeleireiro, encaminhamento
para médicos especialistas.
Clínica – check-up anuais, consultas médicas, exames, diagnósticos e encaminhamentos.
Sob a ótica da coordenadora (mãe social), o convívio diário das crianças no Abrigo não é
satisfatório. “Por mais que queremos dar o melhor às crianças não é o melhor que elas precisam.
Insistentemente fazem pedidos para ir embora, voltar para a casa e morar com a mãe”. No que diz respeito
às famílias dessas crianças, a convivência do dia-a-dia é marcada pela falta dos filhos.
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O processo de coconstrução e o contexto de autonomia em que todos os participantes têm direito à
voz foi assim constituído:
1. Uma reunião do grupo de multifamílias em torno da situação-problema de buscar melhoria na
convivência do dia a dia das crianças com suas respectivas famílias para a reinserção, estimular,
legitimar, e fortalecer as posições e pontos de vista diferentes das famílias e crianças abrigadas;
2. Um encontro conversacional de rede em torno da situação problema de promoção das famílias para
a reinserção das crianças em suas famílias.
Quadro 3: Respostas – síntese das ações propostas na reunião do grupo de multifamílias.
PROPOSTA DE AÇÃO
RESPONSÁVEL
Pedir a Deus; fazer uma oração
Todos os participantes
Cooperar, obedecer, não falar palavrão, não fazer nada de
errado
As crianças
Falar sobre o Juizado da Infância e da Juventude
Técnica do Abrigo
Dar informações dos processos judiciais
Advogado
Dar informações do Serviço de Orientação Sócio Familiar SOSF
Representante do SOSF
Voltar ao tratamento psiquiátrico
Laura (mãe)
Dar informações do Centro Estudantil da Igreja Batista X
(cursos profissionalizantes)
Representante do Centro Estudantil
Refletir sobre os pontos positivos e negativos; sobre as
possibilidades e limites das crianças ficarem com as mães
nos finais de semana.
Mães, avó e mãe social
Importante ressaltar que no quadro acima, há propostas de ações: Dar informações dos processos
judiciais; Dar informações do SOSF- e responsáveis: Advogado; Representante do SOSF - que não
estavam no grupo e, somente, se houvesse a ampliação da rede é que estes autores apareceriam e
Aun (2006) define coconstrução como “processo conversacional em que todos os membros do sistema
atendido participam na construção de alternativas ou de novos significados que dissolvam o problema em
torno do qual o sistema se organiza”. E o contexto de autonomia é definido como um contexto
conversacional dialógico, em que todos seus membros têm igual direito à voz, exceto aquela pessoa ou
equipe que está na posição de coordenação e manutenção do contexto conversacional (AUN, 2010).
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poderiam se tornar agentes coconstrutores da solução da situação-problema. Desta forma, evidência a
necessidade de se trabalhar com a rede ampliada em torno da situação-problema e, então, passou-se a
constituir o encontro conversacional da rede em torno da situação problema – “a promoção da família para a
reinserção das crianças à família” – assim, representada na Figura 1:
Figura 1: Mapa de Rede em torno da situação-problema: Promoção da família para a reinserção
Representante da
secretaria de
Assistência Social
– PBH.
6 Famílias
Técnica do Juizado
da infância e da
Juventude
Representante do
Centro
Estudantil da Igreja
X
Promoção da
família para a
reinserção
Equipe de
Atendimento
Estagiaria de
direito
Coordenadora do
abrigo X
Representantes do
Colégio x:
a) Pedagoga;
b) Professoras;
A conversação da rede se deu em torno das propostas de ação e das informações dos técnicos
sobre as dúvidas das famílias.
Resultados:
Famílias, técnicos e instituição conseguiram conversar se colocando em um mesmo nível de poder
e buscando caminhos e soluções possíveis para a promoção das famílias. Denotaram interesse e
disposição empreendedora para enfrentar os desafios que tiverem no percurso que vão traçar.
O grupo externou a necessidade de um terceiro encontro, combinado para 30 dias depois, a fim de
dar tempo de buscarem as soluções coconstruídas.
Uma das famílias teve o redirecionamento do processo de adoção para a possibilidade de
promoção familiar entrando com um pedido judicial
A coordenadora do Abrigo encaminhou ao juiz um relatório solicitando o encaminhamento de uma
família que não estava sendo assistida por nenhum programa para possibilitar sua promoção – foi inserida
no Programa Família Acolhedora;
2º caso- Coconstrução de acolhimento e acompanhamento à família de uma criança que teve seus
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direitos violados :
4
Relato de um Atendimento Sistêmico realizado na Secretaria Municipal de Assistência Social de Campo
Belo, sob a gestão de Anália Maria Ferreira, Graduada em Economia Doméstica, especialista em
Atendimento Sistêmico de Famílias e Redes Sociais pela PUC/MG, conjuntamente com o Grupo de estudos
da Metodologia de Atendimento Sistêmico – MAS, que é composto por técnicos e educadores sociais dos
CRAS, CREAS, Serviço de Acolhimento Institucional, Setor de Benefícios e Serviço Social do TJ e
coordenado por Rogéria Maia, psicóloga da Proteção Social Básica.
Chegou ao Centro de Referência Especializado de Assistência Social – CREAS de Campo Belo/MG
um denúncia da equipe multidisciplinar de um hospital, encaminhada ao Conselho Tutelar, de um caso de
uma criança de 6 meses, a qual após avaliação médica, foi constatado ter sofrido abuso sexual e estar em
estado de desnutrição. O suspeito pelo abuso, pai da criança, foi detido e a mãe impedida de ficar com a
criança, pois foi conivente com o crime, uma vez que não denunciou antes.
A equipe do CREAS, incomodada com essa situação-problema, passou a questionar quem cuidaria desta
criança e, também, como poderia construir um acolhimento e acompanhamento satisfatório à família da
criança? Desta forma, o CREAS enquanto uma instituição responsável por resolver o caso e dá os devidos
encaminhamentos à rede de serviços identificou que juntos CREAS e rede de serviços poderiam coconstruir
um atendimento satisfatório a família da criança e, então, propôs Atendimentos Sistêmico em torno desta
família.
Foram realizados cinco encontros conversacionais do sistema constituído em torno da situaçãoproblema, definida como: “construindo acolhimento e acompanhamento à família da criança “sexualmente
abusada”.
Figura 2: Mapa de Rede em torno da situação-problema: Construindo acolhimento e acompanhamento à
família da criança (sexualmente abusada)
SDP/Rede: situação-problema de uma família
Hospital
Gestora da AS
CREAS
CRAS
CAPS
Construindo acolhimento e
acompanhamento à família
da criança (sexualmente
abusada)
PSF
Conselho Tutelar
Judiciário
Mãe
Avô
PM
Avó
MP Promotoria
Infância Juventude
Resultados:
Os Encontros Conversacionais viabilizaram a distribuição de ações necessárias à rede de serviços,
tais como:
•
Hospital: atendimento pediátrico à criança e psicológico aos avós;
•
Centro de Atenção Psicossocial- CAPS: acompanhamento psiquiátrico à mãe;
•
Centro de Referência Especializado de Assistência Social - CREAS: acompanhar família e
atendimento psicossocial à mãe;
•
Centro de Referência da Assistência Social - CRAS: visitas periódicas a família;
•
Judiciário: decisão judicial sobre proteção/segurança da criança;
- guarda provisória aos avós maternos;
•
Conselho Tutelar: visitas periódicas à família;
•
Mãe:- trabalhar (encaminhada para cursos Sistema Nacional de Emprego - SINE);
- requerer permissão judicial para ver a filha.
As conversações dos encontros viabilizaram ações da rede de serviços (CREAS, CRAS, CAPS,
PSF, Conselho Tutelar, PM, SMAS) em prol do acolhimento desta família, diante da complexidade do caso
– abuso sexual de uma criança de 6 meses, bem como possibilitou a coconstrução de encaminhamento
para está família – vide ações distinguidas acima
Contudo, cabe ressalta que a equipe sistêmica deste atendimento numa atitude reflexiva traz
questionamentos a cerca de como deve ser este acompanhamento, tais como: “Havia muitos serviços
fazendo a mesma coisa, visitando a família. Para quê? Como deve ser esta visita domiciliar? E quem fará?
Precisava ser organizado este acompanhamento para que não seja invasivo, para que não tire a
privacidade e autonomia da família no cuidado da neta”. Reflexões que foram trabalhadas muito bem no
quinto Encontro Conversacional, como ficam evidentes nas proposições construídas abaixo:
- Respeito ao desejo da família, visando sua autonomia, para que posteriormente seja feito o seu
desligamento do acompanhamento.
- As visitas foram organizadas para acontecerem mensalmente e em cada mês um dos programas: CAPS,
CREAS, Conselho Tutelar - seria o responsável pelas mesmas.
- Objetivo da visita: orientações à família, visando o bem estar da criança e da família, bem como os
cuidados ofertados a criança.
Considerações Finais:
A aplicação da Metodologia de Atendimento Sistêmico - MAS nos dois atendimentos acima
descritos mostra-se coerente com os pressupostos sistêmicos novo-paradigmático, como se pode ver no
Quadro 4.
Quadro 4 Distinguindo os pressupostos sistêmicos nos dois atendimentos abordados:
Pressupostos
Sistêmicos
Implicações
pressupostos
destes
Complexidade
- Manter o foco nas
relações;
-Trabalhar com o
sistema ampliado e
constituído em torno
da situação problema.
Instabilidade
- Criar contextos de
autonomia
- Auto-organização.
- Mobilizar os recursos
da rede.
Intersubjetividade
- Foco nas
conversações
-Co-construção de
soluções viáveis.
- Experiência de
autoria e envolvimento
com as mudanças.
5
Situação problema 1
Situação problema 2
Envolvimento do abrigo
X com a família e
comunidade local:
Centro
Estudantil da Igreja X e
Colégio X,
conjuntamente com a
rede de serviço:
Secretaria de
Assistência Social –
PBH; Juizado da
Infância e Juventude.
5
Famílias empoderadas
na busca da reinserção
das crianças à família.
Vinculação das famílias
a rede de serviços na
busca da reinserção da
criança à família
Famílias, técnico e
instituição conseguiram
conversar se colocando
em um mesmo nível de
poder e buscando
caminhos e soluções
possíveis para a
promoção das famílias.
Envolvimento da rede de
serviços e de
acolhimentos aos
cuidados necessários da
criança e de sua família
(CREAS, CRAS, CAPS,
PSF, Conselho Tutelar,
PM, SMAS, Hospital,
família)
Viabilização de uma
rede de apoio e
acompanhamento à
família. Respeitando seu
desejo, bem como
estimulando o laço
familiar com relação aos
cuidados da criança.
Equipe sistêmica
sempre em posição
reflexiva e, de
construtora de contexto
conversacional em prol
da coconstruções de
ações viáveis para
mudança.
Para Bronzo (2009, p. 177) empoderamento é algo que se processa no meio da relação entre usuários e
agentes públicos como produto emergente das relações que se estabelecem entre as famílias, os agentes,
as redes de políticas e as redes sociais. Sen, (1997) citado por Bronzo (2009), empowerment envolve
poder, implica alteração das relações de poder em favor daqueles que contavam com pouco poder para
manejar sua vida, no sentido de ter maior controle sobre elas.
Conforme vimos o mundo está em processo de tornar-se, e as regras de relações também estão
mudando. Entendemos que, para que ocorram as mudanças desejadas pelas políticas públicas sociais,
será necessário criar contextos de autonomia que propiciem processos de coconstrução.
O contexto de autonomia é definido por AUN (1998: 02): “... um contexto que permite que as
pessoas definam o que é real para si próprios e que, na condição de seres humanos sociais, possam agir
de acordo com estas definições e assumir responsabilidade por essas ações, através de acordos
consensuais”. Este contexto possibilita trabalhar com o sistema ampliado, mantendo o foco nas relações e
dando e garantindo o direito à voz e decisão a todos os participantes sem distinção. No processo de
coconstrução, substitui-se a posição de saber, por uma posição cooperativa, possibilitando uma
conversação efetiva sobre a situação-problema em busca de sua solução.
Por isso, apontamos o Atendimento Sistêmico como um caminho alternativo para os programas que
são desenvolvidos nas políticas públicas de acordo com Esteves de Vasconcellos:
Aqueles programas sociais e assistenciais que enfatizam e incentivam a
participação ativa dos usuários: abrindo-lhes acesso ao nível decisório com
possibilidade de experimentarem um protagonismo real, viabilizando a emergência
da “pessoa sujeito”. Proporcionando ao indivíduo através de sua ação que se resitue; promovendo experiências auto-gestivas”. (ESTEVES DE VASCONCELOS,
1998:34)
Portanto, consideramos que os atendimentos aqui descritos, desenvolvidos com a Metodologia de
Atendimento Sistêmico, proporcionaram a cocriação de um espaço conversacional, no qual todos os
envolvidos com a situação-problema puderam falar e ouvir e coconstruir propostas de soluções e se
responsabilizarem pelos encaminhamentos das mesmas. Desta forma, os atendimentos estão de acordo
com o que está proposto na Constituição brasileira de uma participação da sociedade nas posições de
decidir, planejar, controlar e receber.
Ressaltamos ainda a importância das práticas com rede para restabelecer os vínculos de proximidade
familiares e sociais recuperando os recursos da própria rede e viabilizando a garantia do direito da criança e
do adolescente à convivência familiar e comunitária.
Referências:
AUN, J. G. O processo de co-construção em um contexto de autonomia. In: Aun, J.G, Esteves de
Vasconcellos, M. J.; Coelho, S.V. Atendimento Sistêmico de Famílias e Redes Sociais. Vol 3. Belo
Horizonte: Ophicina de Arte e Prosa, 2010.
_______________ AUN, J. G. Política públicas/programas sociais: a participação da sociedade. In: Aun,
J.G, Esteves de Vasconcellos, M. J.; Coelho, S.V. Atendimento Sistêmico de Famílias e Redes Sociais.
Vol 3. Belo Horizonte: Ophicina de Arte e Prosa, 2010.
______________. O processo de co-construção. Uma metodologia sistêmica para a “implantação” de
políticas sociais. In: III Congresso Brasileiro de Terapia Familiar, O individuo a família e as redes
sociais na virada do século, 1998, Rio de Janeiro. Anais ABRATEF e ATF.
Aun, J.G, Esteves de Vasconcellos, M. J.; Coelho, S.V. Atendimento Sistêmico de Famílias e Redes
Sociais. Vol 3. Belo Horizonte: Ophicina de Arte e Prosa, 2010.
BRASIL. ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente, lei 8069/90.
BRONZO, Carla. Vulnerabilidade, empoderamento e metodologias centradas na família: conexões e uma
experiência para reflexão. In: Concepção e gestão da proteção social não contributiva no Brasil.
Brasília: Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, UNESCO, 2009. 424 p.
ESTEVES DE VASCONCELLOS, Maria José. Pensamento Sistêmico: o novo paradigma da ciência. 5 ed.
Campinas, São Paulo: Papirus, 2006, 268p.
_______________. Rede Social: conceituação, importância e funções. In: Workshop “Trabalhando com
redes sociais”, Belo Horizonte, 1998, mimeo.
SAMPAIO, Cira Maria Barreto. Programa de Abrigo. In:ANAIS do Seminário – Política Social do Município
para Criança Pequena: Formulando Novas Ações. Belo Horizonte: PBH/SMDS/DPCA/Programa de
Creches/Novas Ações, 2000.

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